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2009

Fundamentos
Neotestamentários
Brian Gordon Lutalo Drumond Kibuuka
Material de Apoio (aula 2)

Curso: Evangelhos Canônicos e Evangelhos Apócrifos


Sociedade Bíblica do Brasil / Faculdade de Teologia Wittenberg
2 de junho de 2009 [FUNDAMENTOS NEOTESTAMENTÁRIOS]

Aspectos Introdutórios Para a Compreensão da Teologia do


Novo Testamento: Jesus Cristo e o seu Tempo

A Palestina é uma pequena região, marcada pela pobreza.1 Porém era uma região
geopoliticamente estratégica, devido à confluência de interesses políticos sírio-fenício-
palestinos.2 Os elementos físicos característicos da região eram o deserto, o rio Jordão e
os oásis. E geopoliticamente, era caracterizada pelos interesses comerciais e políticos,
contrastados com a consciência religiosa dos judeus e sua compreensão de ser um povo
liberto por Deus.
A prática religiosa judaica fundamentava as relações sócio-políticas na Palestina
do tempo de Jesus. A concepção de ser Jerusalém a cidade escolhida por Deus, e que a
terra da Palestina era a terra prometida por Yahweh constituíram os dois legados que
marcaram os episódios religiosos do Antigo e do Novo Testamento.3 As práticas rituais
dos judeus eram fundamentais na compreensão de sua cultura, já que a concepção
preponderante era que o pacto entre os judeus e a Divindade incluía a necessidade de
obediência às prescrições da Lei – a Torá.4 Os judeus entendiam ser fundamental o
cumprimento de todos os preceitos da lei, e isto de forma inflexível. Mudar a relação
com a Divindade significaria perder-se da dimensão pactual, perder a identidade
religiosa e, por conseqüência, a identidade cultural.5
De 160 a.C. até 63 a.C., ou seja, durante 67 anos, governaram a Palestina dois
reinados judeus diferentes: os Macabeus e os Asmoneus. Assim, a conquista da
Palestina pelos romanos ocorre em 63 a.C., marcando o fim da dinastia asmonéia, que já
padecia devido às crises internas que a assolavam. A dominação romana perpassou todo
o período neotestamentário . Hircano, chamado Antípatro, natural da Iduméia,
descendente de Simão Macabeu, foi nomeado procurador pelo imperador romano Júlio
César.6
E foi um dos filhos de Antípatro, Herodes, que acabou por fundar a nova dinastia
judia, a dinastia dos Herodianos, mantendo assim a região relativamente independente.
O governo de Herodes, o Grande, durou entre 37 e 4 a.C.. Governou sobre os
territórios da Judéia, Samaria, Iduméia, Galiléia e Peréia. Herodes, o Grande, teve o

poder de governar a Palestina delegado por Roma, embora não fosse judeu.7

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Após a morte de Herodes, seu reino foi dividido entre seus filhos. Herodes
Arquelau herdou de Herodes, o Grande, a Judéia, Samaria e a Iduméia, que governou

até o ano 4 d.C.;8 e Herodes Antipas governou as regiões da Galiléia e Peréia, de 4 a.C.

até 39 d.C.9 Este último é, dentre os soberanos herodianos, o mais mencionado no Novo

Testamento.10 Do ano 6 até 41 d.C, a Judéia, Samaria e a Iduméia passaram a ser


administradas diretamente por procuradores romanos. Agripa, descendente de Herodes,
governou esta região entre 41 e 44 d.C.. Após este período, a administração voltou às

mãos dos procuradores romanos.11


Os procuradores eram funcionários que respondiam diretamente ao imperador de
Roma. Este título era dado a diversos funcionários que possuíam atribuições diferentes.
Os procuradores palestinos estavam subordinados ao governador da Síria. Entretanto,
como representantes diretos do Imperador, detinham poderes civis, de exército e
jurídicos. Os procuradores da Judéia residiam em Cesaréia, mas em tempos de festas
religiosas se transferiam para Jerusalém, já que nestas ocasiões ocorriam o maior
número de conflitos.
A Palestina tem por característica ser uma região semi-árida, e por ser uma região
que não é densamente povoada. No tempo de Jesus, parte reduzida das pessoas, e
sobremaneira estrangeiros, detinham a posse da maior parte das terras, e havia uma
grande quantidade de camponeses pobres.12 Esta polarização econômico-social produzia
uma variação no campo ideológico. Não obstante a concepção teocrática de sociedade
unificar grande parte das convenções sociais.
No tempo de Jesus, a Palestina está imersa numa crise de identidade. De
Alexandre, o Grande, e no decorrer dos trezentos anos que se seguiram, a perseguição
cultural contra os judeus foi constante. Houve uma forte imigração de judeus que se
conformaram com os costumes e hábitos mediterrâneos orientais e egípcios – emigração
esta chamada Diáspora. Quase todos os emigrantes judeus eram artesãos e eles
voltavam ocasionalmente para Jerusalém, já que o culto sacrificial era restrito ao
Templo. Os judeus da Diáspora já não conheciam majoritariamente a língua hebraica, e
utilizavam a Septuaginta. Alguns só falavam arameu, que era o idioma corrente, o
idioma comum daquela época.13

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As duas facções de judeus tiveram disposições distintas no tocante às influências e


paradigmas ideológicos. Entre os helenistas, a tradição judaica foi mediada pelo esboço
da filosofia neoplatônica.14 A helenização, associada ao desenvolvimento da vida
urbana, fez colidir os judeus helenistas com a tradição do mundo hebreu. O efeito mais
visível desta influência era a proliferação destes nas cidades, fato que é refletido nos
“Atos dos Apóstolos.” A elite instruída dos judeus palestinenses foi substituída por uma
minoria intelectual, que tinha representantes como Teodoro, Oenomeu (estóico),
Nicolau de Damasco e Flávio Josefo entre outros. O resultado da helenização foi visto
na composição do grupo de discípulos após a morte de Jesus, marcada pela tensão
cultural entre os helenistas e os judeus, e entre as cidades helenas e os camponeses.
A linguagem oficial dos tribunais era o idioma grego, e não o hebreu, por ser
considerado o idioma da alta sociedade. No tribunal de Herodes, a aculturação
helenística era patente. Josefo afirma nos seus textos que Herodes ostentou ser mais
próximo da cultura grega que da judaica. Na Palestina, o grego passou a ser o 2º idioma,
sendo gerado por isto um conflito econômico e ideológico entre os mais pobres, que não
conheciam o idioma, e a minoria rica. A cultura imposta era oposta àquilo que fazia
parte da vida diária dos mais pobres, e estes eram majoritariamente camponeses. Isto
trouxe conflito entre a cidade e o campo.15
Esta grande diferença econômica acaba por culminar na tensão social que
provocou a guerra judaica entre os anos 66 e 67 d.C. Os camponeses fortemente
empobrecidos pararam de cultivar suas terras e emigraram para as cidades à procura de
uma oportunidade. O aumento da população, com a falta ascendente de infra-estruturas,
culminou em grandes problemas sócio-econômicos. Tudo isto foi conseqüência do
processo de dominação romano, segundo afirma Pixley:

Um dos propósitos do império em seu controle sobre


o território e a população da Palestina era obter riquezas
através de um complexo sistema de tributos e impostos.
Havia impostos sobre a terra, sobre a população, e direitos
de alfândega e pedágio para o uso de pontes e vias. Cobrar
os impostos era um negócio que se outorgava por
contratos a grandes empresários, que por sua vez
empreitavam aos coletores locais de impostos. Para a
população judaica existiam ainda os impostos do templo,
principal- mente o dizimo sobre a produção do campo e o
imposto anual da didracma sobre cada varão. A carga para

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o camponês comum devia ser verdadeiramente espantosa.


16

Este período também foi marcado pela violência, com vários tumultos e confusões
no ambiente urbano. Estas tensões entre as pessoas ricas e as pobres tiveram
imbricações políticas.17
O processo final dirigiu-se para a tensão religiosa entre o judaísmo e o paganismo,
principalmente entre os paganizantes do judaísmo e os adeptos do judaísmo tradicional.
O cristianismo foi influenciado por tradições pagãs, como a afirmação da não
necessidade da circuncisão para entrar no grupo de cristãos, e a adoção de um espírito
mais universalista. Outros elementos que foram somados ao cristianismo foi a visão
cosmológica, ou a identificação da Palavra de Deus, dotada de ação criativa, com o
“logos” do platonismo.18
Em um nível mais prático, o contato com o paganismo já significava que os
cristãos estavam transgredindo as normas de pureza: Comer com um pagão é um ato
sacrílego. Isto pode ser observado nos Atos dos Apóstolos. Esta situação inteira faz
parte do contexto em que o cristianismo surge e deve ser analisado. Especialmente
importantes são, neste sentido, a percepção teocrática do “self”, de Deus, da religião e
da vida cotidiana. O Cristianismo é mais uma resposta aos problemas e dilemas do
judaísmo do primeiro século, e consiste na flexibilização das questões mais radicais.19
A sociedade teocrática judaica é tão abrangente que os movimentos de reação e de
alternativa têm caráter religioso. Por isto, a primeira reação ante um problema é o
desapego (a emigração), elemento muito importante na Palestina e algo freqüente em
sua história. Outra reação foi a bandidagem cometida pelos movimentos sociais pré-
políticos que não apresentavam outra alternativa social por não se alinharem com o
poder político-religioso estabelecido, mas ao mesmo tempo terem exigências claras e
mobilização, por vezes dotadas de conteúdo religioso. Um exemplo é a menção da
Palestina, pelas autoridades romanas, a partir de grupos ou movimentos específicos,
reconhecidos por causa da sua postura diante do poder central. E estes grupos eram
referidos como agentes de bandidagem e como ladrões. Sobre isto, afirma Grelot:

“Os bandidos: era esse, sem dúvida, o nome dado


pelas autoridades a todos os opositores que lutavam na
guerrilha contra os partidários de Roma. Barrabás não era

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um ladrão, mas um guerrilheiro (cf Mc 15,7). Os sicários:


a arma favorita dos resistentes era a sica, punhal curvo,
fácil de esconder nas dobras das vestes,- daí o nome
sicarii, "homens do punhal". Os galileus: a Galiléia
sempre foi um foco de agitação. A designação "galileus"
se aplica especialmente aos partidários de Judas. Os
zelotas: simples transcrição do grego, esta palavra evoca o
zelo ardente que anima o grupo. Flávio Josefo só fala dos
zelotas a propósito da guerra judaica (66- 70 de nossa
era). Por isso os historiadores discutem sobre a
homogeneidade dos movimentos de resistência que se
manifestaram na Palestina.”20

Esta configuração social da Palestina proporcionou a emergência de partidos e


movimentos de natureza religiosa e política. Na sociedade judia existiam duas correntes
religiosas que expressam maior influência na religião judaica: os saduceus e os fariseus.
Junto a elas existem dois movimentos de natureza messiânica com posicionamento
oposto ao status quo religioso ou civil: os sicários, os zelotas, e os essênios.
Os saduceus são o grupo mais poderoso do período neotestamentário. Este grupo
teve origem na nobreza sacerdotal judaíta, que foi fortalecida na fundação da

comunidade pós-exílica em 539 a.C.21 Era um grupo conhecido particularmente por


reafirmar a centralidade do culto no Templo e por serem os legítimos representantes da

ortodoxia judaica conservadora.22


Os saduceus eram conservadores em suas propostas, porém conformados com o

status quo político.23 Eram membros geralmente da aristocracia laica (grandes


proprietários, comerciantes e artesãos) e eclesiástica; e descendentes dos que ostentaram
o poder no passado próspero de Judá. Quando perderam a preeminência política
sacerdotal, seguiram controlando a estrutura de poder vinculado ao Templo de
Jerusalém. Esta foi a causa do seu descenso: entre os anos 60 e 66 o Templo foi

destruído por causa da guerra.24


Os saduceus aceitavam o alistamento no exército romano, e por isto obtinham
algumas benesses na estrutura econômica do império. Nisto eles não eram
conservadores. Porém, no tocante às questões religiosas, os saduceus eram o grupo mais
conservador. Por estabelecerem uma dicotomia ideológica entre a religiosidade e a
dominação do estado, os saduceus vincularam ao seu corpo de doutrinas a idéia de que o

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Estado hebreu estava vinculado ao Templo, e seu poder de legislar passava pelo cuidado
e supervisão do povo no tocante à observância da Lei. As tentativas de reformas nas
crenças religiosas obtinham geralmente a oposição por parte deste grupo. Eles eram os

principais mantenedores do patrimônio religioso tradicional.25


Os saduceus não aceitavam a transmissão oral e, ao mesmo tempo, eles eram os
únicos, na esfera do Templo, que podiam interpretar os textos. Não reconheciam os
livros mais recentes da Torá, pois restringiam a idéia de perfeição e legislação ao

Pentateuco.26
Eram contrários também à idéia de promover a conversão de estrangeiros, pois
adotavam o conceito de que só os judeus eram o povo eleito. O judaísmo, nesta
concepção, era uma religião dos judeus, e não da humanidade.
Os judeus não entendiam ser o “logos” uma realidade física. Não acreditavam na
alma individual e, por conseguinte, não criam na ressurreição. Para eles, só o presente
existia, e a idéia da retribuição imanente: que os benefícios da vida presente são
conseqüência da fidelidade à Lei. Neste sistema teológico, Yahweh era o castigador, ou
doador de bens aos justos.
Os saduceus negavam a possibilidade de inovação na teologia, e por isto não
produziram textos literários, nem teológicos. Não acreditavam em interpretações,
contextualizações ou profecias. Por isto, o que se conhece dos saduceus é relatado pelos
“historiadores” da Antigüidade e pelos seus detratores. A razão dos saduceus terem
acumulado adversários foi esse posicionamento hostil diante dos adversários e sua visão
estrita da Lei, conforme afirma Tassin:

Eram muito conservadores em matéria de religião.


Na doutrina (Mt 16,12), admitiam apenas a Torá ou Lei de
Moisés, que está exclusivamente nos cinco primeiros
livros da Bíblia (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e
Deuteronômio. O conjunto desses livros se chama
Pentateuco). Eles se atêm estritamente à letra do que esses
livros dizem. São, portanto, fundamentalistas. Por isso
rejeitam qualquer desenvolvimento posterior dessa
doutrina; opõem-se principalmente àquilo que os fariseus
ensinam como 'doutrina oral", que interpretava essa Lei.
Conforme os saduceus, os sacerdotes são os únicos
intérpretes da Lei. Não querem que os fariseus 'leigos" a

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interpretem. Também suspeitam dos profetas. Todos eles


são fanáticos da observância do sábado. 27

Os fariseus são um grupo fundamental para se compreender o que se tornou o

judaísmo após a derrota de Jerusalém no ano 70 d.C.28 Este grupo é geralmente tratado
no testemunho dos evangelhos como sendo a encarnação de todos os males, devido ao
fato dos fariseus serem os mais constantes perseguidores dos cristãos. São tachados de
falsos (sepulcros caiados). Pelos essênios, eles eram chamados de “segregados”, já que
a comunidade também se posicionava diametralmente oposta aos costumes farisaicos.
Os fariseus constituem o grupo majoritário, dentre os grupos conhecidos pela sua
religiosidade. Não eram dirigidos pelos sacerdotes, ainda que existissem sacerdotes
fariseus servindo no Templo de Jerusalém. O grupo dirigente dos fariseus eram os
chamados “Doutores da Lei”.
Os fariseus não provocaram a ruptura com o Templo e com o sacerdócio
(distintamente dos essênios). Não exerciam papel determinante na regência do culto do
Templo e nem se colocavam em oposição à dominação romana. Suas propostas
religiosas estavam baseadas em esperanças dadas aos piedosos da época, o que fazia
deste grupo um partido bastante atraente. Havia entre os fariseus um consenso maior

que os saduceus sobre questões teológicas, o que tornava suas idéias mais claras.29

O Templo era um centro econômico.30 Os sacrifícios, em grande parte, eram


entregues ao Templo, e a produção de velas e demais utensílios cúlticos dava trabalho a
6 mil empregados e suas famílias. Era muito grande a afluência de peregrinos, já que as
sinagogas não são um lugar de culto, mas de leitura e discussão dos livros sagrados. Os
fariseus tinham seu foco de atuação neste momento secundário da religiosidade judaica:

sua influência principal estava localizada na sinagoga.31 Os saduceus, por sua vez,
dominavam no Templo - nos períodos em que o povo atendia às convocações (festas,
datas especiais) para ir ao Templo.
O segredo para tamanha influência foi a adoção pelos fariseus da tradição oral.
Esta era dotada de grande importância, pois a crença farisaica afirmava ter sido a
tradição recolhida desde os dias de Moisés e passada de geração em geração, até eles.
Os fariseus entendiam ser os fiéis depositários da tradição, e foram incrementando esta

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com o tempo.32 Por não existir um organismo que ditasse as leis ao povo, eles
estabeleceram os doutores da lei.
Dentre os chamados doutores da Lei, existiam alguns que adicionavam textos à
Torá, sendo estes os mais eruditos, pois criavam doutrinas e as transmitiam por meio de
parábolas para fazer entender os conceitos teológicos contidos nestas formulações, que
eram complexas e abstratas à população. Para os fariseus, Moisés tinha entregado as
tábuas da lei, mas junto com elas deixou as normas para a sua aplicação, e estas
convertiam aqueles que eram conhecedores destes conceitos em intérpretes da lei. Esta

função assumiu maior relevância, em determinadas ocasiões, até que o próprio culto.33
Quando o Templo foi destruído - o arco do triunfo de Tito comemora esta queda, e
nele estão representados a chegada do grande candelabro e o arca da aliança depois da
revolução judia - o culto se desenvolveu na sinagoga. Os fariseus mantiveram a tradição
através das fórmulas rituais com 248 mandatos e 366 proibições derivados dos Dez
Mandamentos. Os saduceus desapareceram com a destruição do Templo e foi
estabelecida a hegemonia farisaica na determinação das marcas do judaísmo a partir de
então. Encontramos assim, a seguinte afirmação:

Pode-se dizer que depois da catástrofe do ano 70,


três dos partidos religiosos mencionados por Josefo
desapareceram. Os zelotes revolucionários, com certeza,
no último combate de Massada, e os essênios de Qumran,
estabelecidos na vizinhança. Mas também os saduceus,
cuja organização estava toda ligada ao Templo. Restavam
os fariseus. Apesar da impossibilidade de estabelecer uma
clara continuidade entre os fariseus de antes de 70 e os
primeiros rabinos, a tendência farisaica acabará,
entretanto, por prevalecer no nascente judaísmo rabínico.
O movimento se formou em Jâmnia, na costa
mediterrânea a cerca de vinte quilômetros da atual Tel-
Aviv, sob a direção de Joanan ben Zakkai (entre 70 e 80)
e, depois dele, de Gamaliel 11 (80-90). Empreendeu-se,
então, o que pouco depois será percebido como uma
redefinição completa do judaísmo, em torno dos três
pilares fundamentais que subsistiam: o monoteísmo, a
eleição expressa pela aliança e a Lei. De fato, o Templo e
seu culto não foram esquecidos e os rabinos continuaram
a legislar a este respeito, como atestam grandes partes da
Mishna, na esperança de que o Templo seria restabelecido
como fora outrora depois do exílio da Babilônia.

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Entretanto, foi a Lei e suas aplicações práticas que se


tornaram a preocupação central dos rabinos da escola de
Jâmnia. Eles desenvolveram assim uma forma de
judaísmo capaz de manter sua identidade, até mesmo fora
do Templo e de um culto central. É claro que a unidade
deste judaísmo não se conseguiu de um dia para o outro.
Foi preciso esperar o fim do período talmúdico no Século
V, para que as comunidades de judeus do mundo... 34

A pregação de Jesus era diametralmente oposta às exigências farisaicas em relação


ao comportamento cotidiano não relacional, como as tradições referentes aos alimentos
etc. Muitas de suas propostas são tomadas deles. Só os doutores podiam discernir entre
o bem e o mal de qualquer fato ou coisa, por que as regras geralmente eram
desconhecidas. Cumprir a lei se traduzia no farisaísmo a um esforço positivo. As boas
ou más ações eram premiadas ou castigadas pela divindade.
No farisaísmo cada indivíduo era mensurado no tocante à sua honradez, segundo
as suas obras. Os pecados podiam ser expiados mediante o amor (a caridade), a
contrição (jejum) ou a punição individual ou coletiva. Yahweh era, segundo os fariseus,
um Deus vingativo. Para eles era melhor ser uma sociedade baseada em rituais de
pureza e denúncia dos pecados alheios - e expiação dos próprios – do que estar sujeito à

fúria de Deus.35
Os fariseus criam também na misericórdia de Deus e no advento do Messias,
responsável por estabelecer na terra o Reino de Deus, tendo fim toda a opressão, porém,
num futuro longínquo – conceito muito similar ao de outros movimentos messiânicos da
época. No entanto, não há um sentimento unânime sobre este tema. Outra questão aberta
para os fariseus era a questão da vida após a morte.A condição para esta vida, se os
justos a gozariam restritamente ou se esta era universal, se a alma dos injustos cessaria
ou seria condenada eternamente: são todas estas questões abertas no período de Jesus

para os fariseus.36 Além disto, os fariseus recusavam o messianismo (não obstante


crerem no advento de um Messias), consideravam-se a si mesmos o verdadeiro Israel ou
intérpretes da lei de Deus, e não aceitavam outras interpretações teológicas opostas as
deles, pois as consideravam distorções da verdade.
Os fariseus não entendiam, como os saduceus, ser a salvação exclusiva aos judeus
de Israel e não aberta também para os judeus estrangeiros. Alguns fariseus chegaram a

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propor que alguns gentios justos também podiam desfrutá-lo, porém estes constituíam
um grupo minoritário. Podiam-se incorporar os gentios à religião judaica e alguns
conversos, depois de aceitar o batismo – a travessia do mar Vermelho – deveriam
praticar a circuncisão, e este era um grande obstáculo para os estrangeiros. As mulheres

gentias não podiam se agregar à comunidade.37


Os movimentos religiosos messiânicos apresentam maior complexidade, já que
suas expectativas são complexas e difusas, e as interpretações apresentadas às suas
doutrinas são diversas, e suas características são mutáveis com o tempo. Distinguem-se
dois grupos principais: os zelotes e os essênios.
Os zelotes são grupos messiânicos caracterizados por ter uma intencionalidade
política devido à interpretação que apresentam de que a chegada do Messias é iminente.
Os zelotes associam esta chegada a uma mudança política (a expulsão dos romanos).
Estes movimentos são acompanhados de uma atividade militar e desejo de controle de

territórios.38
Os zelotes – que têm representantes no grupo de Jesus – compartilhavam das
idéias dos fariseus e essênios, cujo ponto central é a interpretação do primeiro
mandamento do decálogo: “o Reino de Deus é Israel” ou “nada que seja temporal e
mundano é compatível com o Reino de Deus.” Estes discípulos são os seguintes:

“Os evangelhos mencionam, inadvertidamente


talvez, o nome de quatro discípulos que têm ligações
coma ideologia revolucionária dos nacionalistas: Simão,
um zelota confesso, e Judas Iscariotes (Mt 10,4; Lc 6.15) ;
Pedro, cujo caráter nos é apresentado como sendo
impetuoso e dominado por explosões emotivas (Lc 22.33.
49-50); e Tiago e João, que são denominados
eufemisticamente ‘Boanerges’, ou seja, ‘filhos do trovão’
(Mc 3.17).” 39

Quando falam de liberdade, os zelotes estavam fazendo referência à liberdade


religiosa – e esta, na visão zelote, dependia da intervenção divina. Mas os zelotes

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também defendiam a necessidade de liberdade política em relação aos romanos. Mas

esta última só podia ser obtida a partir do sacrifício e do martírio voluntário.40


Este martírio, idéia existente no judaísmo primitivo, que foi legada ao
cristianismo, traz como recompensa a salvação da alma. Não era uma idéia restrita aos
zelotes, já que os fariseus adotavam a mesma idéia no tocante à guarda dos rituais. Este
fanatismo religioso, ligado à sincera crença nos valores defendidos pelos grupos,
explica em parte a sublevação judaica contra os romanos e a posterior capitulação dos

mesmos.41 Da parte dos fariseus, a entrada na cidade santa com imagens ou estátuas era
proibida, sob risco de morte.
A idéia contida na necessidade vista pelos zelotes de liberdade política é a crença
na imposição, por parte do Senhor, da redistribuição da propriedade, pois os pobres
eram os eleitos por Deus. A situação de miséria na Palestina era interpretada como um

sinal de que o fim era iminente.42


A crucificação era o destino dos inimigos políticos dos romanos. Os zelotes,
quando eram presos e ordenada a sua execução, eram equiparados aos ladrões. Jesus foi

considerado um zelote ao ser crucificado ao lado dos ladrões.43


Em suma, são zelotes aqueles que respondem à situação de crise que se vivia no
século I a.C. Vão-se a distinguir por serem constituídos por setores marginalizados que
consideram a salvação como algo iminente, e que é equiparado com a liberdade, por
intervenção divina. Isto é, uma transformação imediata da situação de Palestina e a

libertação do domínio romano. Serão os instigadores da revolta dos anos 60 d.C.44 Estes
se agregam em torno de um líder carismático que canaliza as opiniões do grupo e influi
fortemente neles. Remontam-se ao Êxodo e o elegem como a etapa mais perfeita do

contato entre Deus e o povo eleito.45


É importante analisar, portanto, a proximidade e identificação do grupo de Jesus
com os zelotes. Por serem movimentos contemporâneos, existem analogias entre estes e
o grupo de Jesus, como podemos ver nos textos de Flavio Josefo, que ainda não
distingue entre os diversos movimentos e suas diferenças. Os cristãos se consideram os
portadores da segunda aliança com Deus e enfocam a salvação individual. O grupo de
Jesus, por sua vez, é similar ao movimento de João Batista, que se assemelha aos

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profetas escatológicos do tempo do exílio. Estes estão convictos de que o juízo está
próximo, a novidade é que Batista oferece o batismo como sacramento de salvação. Era
de se supor que Jesus era seu seguidor, e seu batismo seria a prova de sua ligação com
este grupo. Na tradição cristã, João é o precursor que anuncia a chegada do “Filho do

Homem” profetizado no livro de Daniel e que Jesus é o cumprimento da profecia.46 O


mesmo livro será interpretado como testemunha da pessoa e obra de Jesus, mas não
mais com uma explicação política como muitos criam, mas espiritual. Não se refere à
luta entre hebreus e romanos, mas entre o bem e o mau. Com esta idéia, vai se
delineando, pouco a pouco, uma teologia que terminará por conformar uma religião
diferente.
Os essênios surgiram dois séculos antes de Jesus, e estão incluídos entre os
movimentos messiânicos de natureza sacerdotal, já que grande parte do grupo é

formado por membros do baixo clero.47 O grupo foi formado em torno de um líder
carismático (o Mestre da Justiça), e seus membros gozam de certo bem-estar (mantém
boas relações comerciais e econômicas), e têm obsessão pela pureza ritual. Acreditam
radicalmente na predestinação, tendo tendências fatalistas, o que os faz permanecerem
afastados do convívio de outros grupos. Sobre isto afirma Michaud:
“Os qumranianos teriam seguido um sacerdote de
alta categoria chamado Mestre de Justiça que teria
recebido por revelação divina a correta interpretação dos
textos bíblicos. Com a força desta inspiração, ele
apresentava essas idéias novas sobre a prática da Lei, a
irninência dos últimos dias, o antigo calendário bíblico
solar (oposto ao calendário lunar adotado à época
helenística), a imperfeição do Templo atual e do culto que
nele se celebrava. Esta teoria, que é sem dúvida a última
palavra sobre o assunto, resolve a maioria das
dificuldades levantadas contra a hipótese essênia. Deste
ponto de vista, se os sectários de Qumran constituíam
urna das formas do essenismo, não se pode dizer que
todos os essênios viviam em Qumran ou em comunidades
semelhantes. Josefo (GJ 2, 124) e Filon de Alexandria
(Hypothetica ou Apologia pro Judaeis 1 1, 1) já haviam
notado a presença de essênios fora de Qumran. Presença
até mesmo em Jerusalém, onde Josefo (Gf 5, 145)
menciona a existência de uma Porta dos Essênios,
indicando que essênios ocupavam talvez todo um bairro
da cidade. Mas também num bom número de
aglomerações do país. O número de quatro mil membros

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aventado por Filon (Quod omnis probus, 75) e Josefo W


18,20), e que se aproxima dos seis mil fariseus
mencionados por Josefo no tempo de Herodes, ultrapassa
evidentemente as capacidades do próprio local de Qumran
e de seus arredores. O fato de terem sido encontrados
esqueletos de mulheres e de crianças em cemitérios de
Qumran (na verdade, foram encontrados três cemitérios
em Qumran: um grande, de mais de mil túmulos,
contendo somente restos masculinos, e dois pequenos,
onde também foram encontrados restos de mulheres e de
crianças), quando os essênios, segundo Fílon, Plínio e
Josefo, viviam num completo celibato, também pode ser
explicado por este desvio do movimento (...).48

Os essênios denominam a si mesmos de “pobres de espírito”, acreditam na

imortalidade (junto a Deus), mas não acreditam na ressurreição do corpo.49 Para eles, a
alma é uma parte de Yahweh. Acreditam no valor precioso para a salvação da morte por

meio do martírio em nome de Deus.50


O messianismo essênio cultivou relações com o movimento de Jesus de forma
mais íntima num período posterior à morte do mesmo, e a ressurreição passou a ser um
elemento essencial da crença essênia. Os essênios criam que o novo mundo imergiria,
trazido pelo próprio Deus, e surgido através da luta e vitória dos Filhos da Luz contra os

Filhos das Trevas.51


Ainda que as diferenças entre os essênios e o grupo de Jesus sejam numerosas,
existem analogias entre os grupos, devido ao contexto em que se inserem e porque
procedem de um tronco comum. Alguns essênios, ao ser destruída Qumran e o Templo
nos anos 60 d.C., uniram-se ao movimento de Jesus; é por isso que alguns autores
explicam as similitudes em expressões e rituais, mas é difícil delimitar quais são as
influências essênias e quais as judaicas no cristianismo.
Depois da queda do Templo, o judaísmo tornou-se mais dogmático e, a partir do
ano 70, os judeus foram mal vistos pelos romanos devido à revolução. A concepção
romana de que os judeus eram traidores fez os cristãos começarem a querer se
diferenciar dos grupos judaicos, inclusive dos essênios.
Além das influências dos grupos religiosos, o Cristianismo também tem, em seus
elementos ortopráticos e ideológicos, pontos de contato com o judaísmo normativo, e

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isto porque o próprio Jesus não rompeu definitivamente com o judaísmo.52 No


princípio, o cristianismo foi um fenômeno intrajudeu, mas depois se tornou
independente, devido às diversas tendências que se criaram entre os cristãos. É um
fenômeno sócio-religioso que deve ser analisar não apenas pelo desenvolvimento da
teologia cristã, mas também pelos caminhos sociológicos e antropológicos do
cristianismo.
Jesus é um judeu observante da Lei, que se comporta como um doutor da lei ou
um profeta itinerante, cujo fim era fazer chegar os textos sagrados aos pobres (bem-
aventurados) com propostas radicais dentro de seu círculo. Não recusa aos impuros, pois
entende que não estava dentro das suas possibilidades econômicas ascender
socialmente. Não tratava questões meramente rituais com rigor, como a questão dos
alimentos, e a forma como a lei exigia que fossem tratados. Não foi herético, nem
rebelde, mas zeloso com algumas normas de pureza judaica.
Jesus também pode ser visto como um polemista judeu por sua alta compressão da
Torá, que está no nível da compreensão dos fariseus sob o ponto de vista dos seus
contemporâneos, com a diferença que ele podia ter optado por mover-se num espaço

privilegiado, mas preferiu dedicar-se aos marginalizados.53


Os evangelhos apresentam Jesus introduzindo nenhuma teologia distinta da que já
existia no judaísmo, nem em sua vida pública, até sua morte. Por isto, o cristianismo
não consistia num novo culto, nem um atentado contra a lei estabelecida, e nem uma
nova visão cosmo-histórica como a da comunidade de Qumran, nem propunha outro
calendário (até aquele momento). No início, o cristianismo era uma parte do judaísmo e
era herdeiro do mesmo. As etapas mais importantes da vida de Jesus eram vistas de

forma semelhante a de outros personagens bíblicos.54


Quando o Cristianismo se cindiu do judaísmo e descobriu suas próprias respostas
à crise desta religião depois da destruição do Templo, assumiu outras influências de
tradição clássica como a grega (por exemplo, o “logos”, sendo posta em segundo plano
a figura de Yahweh e também de outras comunidades como as de Qumran).
Por fim, o movimento de Jesus é uma renovação explicável. Jesus se separou do
grupo de João Batista antes de sua morte e também levou seguidores com ele. A
destruição do Templo será sempre um ponto de referência pois supôs a separação da

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arca da aliança. O cristianismo foi para Roma, já que na urbe passava mais despercebida
a fé cristã.
Utilizamos a palavra movimento para definir a um grupo que tem um líder
carismático e situa-se à margem das estruturas políticas – e às vezes é contrário a elas –
e do funcionamento econômico, com princípios excêntricos, com os quais se preocupa
de forma imediata. É um grupo socialmente qualificado e com uma breve duração no

tempo, a não ser que se institucionalize, como foi o caso do cristianismo.55


Quando os sociólogos falam de movimentos, costumam definir os mesmos através
de naturezas diferentes. Para definir o cristianismo, é comum a utilização da
classificação deste como movimento milenarista. Os movimentos milenaristas surgem
em situações de crises e de brusca mudança social, pois as velhas estruturas não são
capazes de assimilar as mudanças (o caso da Palestina, com a irrupção do domínio

romano).56 Expressam os anseios e interesses dos judeus, dos grupos marginalizados


economicamente que têm outras necessidades ao perder paulatinamente seus elementos
de identidade, e ao sofrer graves carestias, que conduz a uma tomada de consciência e à
busca de um passado ideal.
Os movimentos milenaristas também protestam contra a ordem estabelecida e
anunciam uma nova ordem de forma iminente. Quando Jesus anuncia o Reino de Deus,
anuncia um futuro novo e próximo. O Reino de Deus é o futuro próximo, mediado pelo
drama escatológico, pela iminência do fim. Conforme afirma Steggemann:

“A palavra-chave "reino de Deus" acentua a nova


situação com que Jesus e seu séquito se viam
confrontados no drama escatológico, porque "ela
corresponde ao ideal tradicional e contemporâneo do rei,
que é auxiliador e benfeitor, e não administrador de
coisas". Portanto, na concepção do estabelecimento do
reinado de Deus aparece, em primeiro plano, o ele- mento
positivo da dominação, o auxilio.” 57

Os movimentos milenaristas também são marcados pela crítica à ordem


econômica, já que socialmente está presente junto às classes mais pobres, onde estes são
chamados de bem-aventurados. Jesus se apresenta crítico com a lei da proibição da
comida no šaBBat, com a imposição dos sacerdotes.

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O profeta que interpreta todos os elementos não é uma autoridade tradicional (nem
hereditária, nem legal, que não é um sacerdote ou juiz), mas tem como principal
qualidade pessoal estar em contato com a divindade. A eleição do mesmo é decisiva e
também simbólica, já que este tem uma grande influência diante do resto do grupo. É
por isso que quando este desaparece, a sua figura é mitificada. O cristianismo, ao
endossar os livros proféticos, mostra Jesus como o cumprimento dos mesmos. Jesus é

transformado numa figura mítica.58


O movimento milenarista também dá aos pobres maior relevância. Concede a eles
uma nova identidade. Ser cristão é sentir-se renovado, é o começo de uma identidade

em nível pessoal e comunitário.59


Não existe inicialmente no cristianismo uma elaboração teológica que primasse as
suas atividades vitais. Em geral, as comunidades com caráter milenarista são de curta

duração, salvo o caso de se institucionalizem – o que foi o caso.60 O cristianismo, no


princípio, também não possuía um corpus teológico, e foi sensivelmente subversivo, e
só se desenvolveu teologicamente quando se institucionalizou, aceitou a ordem
estabelecida, convertendo-se numa igreja com um dogma e um corpus teórico.

1
A Palestina fo i duramente penalizada no período dos romanos. O empobrecimento progressivo da
Palestina foi intensificado devido ao sistema de tributação e dominação romana, que não possibilitava a
sobrevivência dos pequenos proprietários. É preciso entender, neste sentido, que “as mudanças
econômicas na Palestina desde a supremacia romana podem, pois, ser caracterizadas, conforme
Applebaum, como "falta aguda de solo", isto é, “como redução da área de cultivo agrícola per capita da
população." Cada vez mais pessoas eram forçadas a sobreviver com cada vez menos terra. Em
conseqüência disso, desfizeram-se as formas tradicionais de assentamento. Embora a área do solo
cultivado se ampliasse continuamente, um número crescente de pequenos agricultores cultivavam cada
vez menos terra. Endividamento e desapropriação dos pequenos agricultores são, pois, a característica
desta época romana.” In: STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN, Wolfgang, História Social do
Protocristianismo : os primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad.
Nélio Schneider). São Paulo: Paulus, 2004. p. 136. Não havia defesa nem previdência para o povo da
palestina. Em caso de doença, má colheita, pragas ou outros desastres, o povo ficava sem ajuda. No
sistema anterio r havia o clã, a comunidade, que era a proteção das pessoas e das famílias. No sistema
implantado pelo governo de Herodes Antipas, isto já não existia mais, ou cada vez menos. Agora, a
primeira preocupação do agricultor era esta: juntar o necessário para pagar os impostos ao governo e os
dízimos ao Templo, e separar da colheita à parte que devia servir como semente para a próxima colheita.
Ao todo, mais da metade da produção. O pouco que sobrava tinha que ser o suficiente para manter a
família. A conseqüência disto foi o empobrecimento progressivo da região.
2
A posição geopolítica das cidades e regiões faz delas lugares potencialmente propensos à invasões.
Objetivos estratégicos, econômicos e políticos: servem para guardar passagens de grandes vias de
comunicação, tornam-se lugares de comércio e atraem os nômades para as suas vizinhanças, fazendo
deles camponeses que sustentarão as cidades. Todos estes elementos estavam presentes na Palestina. Um
exemplo claro é o período de dominação grega. Sobre este, afirma Sicre: “A Palestina, dada sua

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excelente posição estratégica e comercial, será vítima das invejas e lutas entre estas famílias que
disputam sua posse. Durante o século III dominam os Lágidas- durante o 11, os Selêucidas.” In: SICRE,
José Luis, Introdução ao Antigo Testamento. (trad. Wagner de Oliveira Brandão). Petrópolis : Vozes,
1999. p. 316.
3
A partir desta consciência, são estabelecidos os dois tipos de líderes judaítas desde a época de Davi. Há
os "anciãos de Judá" (ziqnê y'hûdâh), líderes tribais das várias cidades e aldeias judaítas e os "anciãos da
casa" (ziqnê bayit), representantes do poder da corte davídica de Jerusalém. Diferente do norte, onde o
poder real se constitui a partir das lideranças tribais, o poder de Jerusalém constrói sua própria base,
independente dos líderes tradicionais. BETTENZOLI, G., Gli Anziani in Giuda, em Biblica 64 (1983), pp.
211-224; Gli Anziani di Israele, em Biblica 64 (1983), pp. 47-73. Esta liderança servia para divulgar a
ideologia da centralidade do culto e Jerusalém.
4
A Lei fundamenta a religião judaica, sendo marca da identidade cultural e ideológica na Palestina. Na
sua formação, a Lei foi dotada de dinâmica, em conformidade com as necessidades sociais, conforme
afirma Claus Westermann: “Do retrospecto sobre a evolução legislativa no Antigo Testamento têm-se
compreensão mais adequada da relação entre preceito e lei. Ligadas à história, as leis estão sujeitas à
alteração constante conforme é provado em face dos adendos e complementos a muitas leis. Em momento
nenhum existiu em Israel lei transcendental. Nem mesmo a subordinação das leis sob a teofania sinaítica
anulou a vinculação com a história concreta na sua evolução até arrematar na comunidade cultual.”
WESTERMANN, Claus, Fundamentos da Teologia do Antigo Testamento. (trad. Frederico Dattler). São
Paulo: Academia Cristã, 2005. p. 204. A sedimentação da Lei deu-se diante do desafio da cristalização da
identidade cultural da Palestina, diante dos desafios do exílio e do pós-exílio. A partir daí, a tradição
veterotestamentária afirma que não obedecer a lei é descrito, em Dt 13.14 ("Por esses dias apareceu em
Israel uma geração de perversos (paránomoi) que seduziram a muitos com estas palavras: 'Vamos,
façamos aliança com as nações circunvizinhas, pois muitos males caíram sobre nós desde que delas nos
separamos'. Agradou-lhes tal modo de falar. E alguns de entre o povo apressaram-se em ir ter com o rei,
o qual lhes deu autorização para observarem os preceitos (dikaíōmata) dos gentios") perder a
identidade..O termo paránomoi indica, segundo Dt 13,14, pessoas que fazem propostas de apostasia da
Lei. Daí que "fazer aliança com as nações" indica renegar a Lei e seguir costumes gentios. Também o
dikaiômata tôn ethnôn (preceitos dos gentios) é significativo. Dikaíōma é usado pelos tradutores da LXX
para traduzir o hebraico deºrek ou mišPä† (caminho, direito) s ignificando obrigações legais. Observar os
preceitos dos gentios significa, portanto, abandonar as normas da Lei e seguir leis gentias Cf.
SAULNIER, C., Histoire d'Israel III, pp. 110-111. Não obstante isto, a observação estrita da Lei concede
aberturas para o entendimento da misericórdia de Deus em caso de inobservância, e também da
possibilidade de adoção da Lei por parte dos gentios. Segundo Otto, “mesmo se Israel fracassar no
cumprimento da vontade divina (Lv 17-26), a expiação, como dom gratuito de Deus, lhe é acessível (Lv
16), Em Dt 4, como conjugação de Dt com o Tetrateuco (de redação sacerdotal), prepara-se (Dt 4,6) urna
identificação entre a Lei e a Sabedoria, que será desenvolvida em Sr 24. A sabedoria de Deus, já ao lado
de Deus na Criação, encontra em Sião a sua morada e na Lei de Israel sua mais válida expressão. Com
isso colocou-se o fundamento pane ultrapassando o Sirác ida, afirmar a validade universal da Lei para
todos os povos.” OTTO, E. , Lei (In: BAUER, Johannes B., Dicionário Bíblico-Teológico. (trad.
Fredericus Antonius Stein). São Paulo: Loyola, 2000. p. 230.
5
Provavelmente o exemplo mais marcante de confronto advindo do risco da perda da identidade cultura l
tenha sido a repressão à cultura judaica feito por parte de Antíoco Epifanes IV. Este, “não satisfeito com
estas medidas repressivas, Antíoco IV construiu ao sul do templo uma cidadela chamada Acra, colônia de
pagãos helenizantes e de judeus renegados, com constituição própria; até Jerusalém era considerada
provavelmente como território desta 'polis'. Além d isso, erigiram-se santuários pagãos por todo o país e se
ofereceram neles sacrifícios de animais impuros; os judeus foram obrigados a comer carne de porco sob
pena de morte, bem como a participar de ritos idolátricos. Como coroamento de tudo, em dezembro de
167 foi introduzido no templo o culto a Zeus Olímpico. Os judeus piedosos não puderam suportar estas
ofensas contínuas à sua religião e se negaram a obedecer estas normas. Antíoco respondeu com uma cruel
perseguição. É quando estoura a revolta dos Macabeus. Líder inic ial é o ancião Matatias, apoiado pelos
'hassidim' (os 'piedosos', de que descendem os fariseus e os essênios). Quando morre, depois de poucos
meses, sucede-lhe o filho Judas (166-160), e mais tarde os irmãos deste, Jônatas (160-143) e Simão (143-
134). A dinastia se completa com João Hircano 1 (134- 104), Alexandre Janeu (103-76, Salomé
Alexandra (76-67) e Aristóbulo 11 (67-63).” In: SICRE, José Luis, Introdução ao Antigo Testamento.
(trad. Wagner de Oliveira Brandão). Petrópolis: Vozes, 1999. p. 317. A revolta foi motivada porque estas

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afrontas feitas por Antíoco, é, “aos olhos dos judeus fiéis à lei, um sacrilégio horrendo (1 Mac 1.16-28; 2
Mac 5.15s.).” In: DONNER, Herbert, História de Israel e dos Povos Vizinhos: da época da divisão do
reino até Alexandre Magno. (trad. Cláud io Molz e Hans Trein). São Leopoldo: Sinodal, 1997. p. 506. A
razão da inserção de Zeus por parte de Antíoco foi motivada pela necessidade de desagregar
culturalmente os judeus e manifestar sua autoridade, já que “Zeus representava os valores do poder e da
autoridade; o epíteto Olímpico recordava suas prerrogativas sobre as outras divindades e seu aspecto
uraniano (isto é, de deus do céu); na Síria ele fora assimilado a Ba’al Shâmin, deus soberano, senhor das
tempestades e da fecundidade. Tais aspectos podiam aparentemente aproximá-lo de IAHWEH que, desde
a época persa, era designado nos textos judaicos como "o Deus dos céus". Nestas condições, podemos
admitir que Antíoco IV quisesse introduzir em Jerusalém uma divindade sincrética, que permitisse a
judeus, sírios e gregos reconhecer nela a emanação de um deus soberano" SAULNIER, C., A revolta dos
Macabeus, p. 26. A introdução deste culto no Templo foi nominada "abominação da desolação", segundo
Dn 11,31. 1Mc1,54-57.64 assim descreve a "abominação da desolação" e fez nascer a revolta contra o
sistema político de Antíoco.
6
Há grande controvérsia quanto à identidade de Antipater. Flávio Josefo, citando Nicolau de Damasco,
diz que Antipater seria um dos judeus descendentes dos exilados babilônicos. Mas Josefo mesmo
considera falsa esta informação. É a seguinte a informação de Flávio Josefo: "Nicolau de Damasco fá-lo
descender de uma das principais famílias de judeus que vieram da Babilônia para a Judéia, mas ele o diz
em favor de Herodes, seu filho, que a fortuna elevou depois ao trono de nossos reis, como veremos a seu
tempo" JOSEFO, F., Antiquitates Iudaicae XIV, 9.. Nicolau de Damasco é um historiador nascido, por
volta de 64 a.C., em Damasco, de uma família importante, pois sabe-se que seu pai exerce altas funções
políticas na cidade. Nicolau torna-se, em 14 a.C., amigo e conselheiro de Herodes Magno. Além de
escritor prolífico, Nicolau é também retor e diplomata, representando Herodes em negociações decisivas.
A partir desta sua ligação com Herodes Magno, um idumeu que se torna rei dos judeus, compreende-se
sua colocação a respeito de Antipater. Cf. STERN, M., Greek and Latin Authors on Jews and Judaism I,
pp. 227-260; SCHÜRER, E., Storia del popolo giudaico al tempo di Gesù Cristo I, pp. 56-62. . Flávio
Josefo acredita que Antipater seja mesmo um idumeu, de origem nobre: "Ele era idumeu e o mais
poderoso de sua nação, quer pela sua descendência, quer pelas suas riquezas e por seu próprio mérito"
JOSEFO, F., Bellum Iudaicum I, 123. . Há outras notícias sobre este personagem. Segundo Eusébio de
Cesaréia, c itando Júlio Africano, Antipater é da cidade de Ascalon, mas acaba sendo criado entre os
idumeus, o que confirma a opinião de Josefo a respeito de sua nacionalidade, embora divirja quanto a
outros dados. Diz Eusébio: "Salteadores idumeus chegaram de surpresa a Ascalon, cidade da Palestina,
e levaram da capela de Apolo, construída perto da muralha, o pequeno Antipater, filho de um hieródulo,
Herodes, com o resto dos despojos, e o mantiveram preso. Como o sacerdote não podia pagar o resgate
pelo filho, Antipater foi educado segundo os costumes idumeus e, mais tarde, Hircano, sumo sacerdote da
Judéia, interessou-se por ele"[43]. Ainda segundo Flávio Josefo, Antipater é, na época do conflito entre
Hircano e Aristóbulo, o estratego (= governador militar) da Iduméia, como o fora seu pai, também de
nome Antipater, este nomeado para o posto por Alexandre Janeu. EUSÉBIO, Historia Ecclesiastica I,
VII, 11. Eusébio vive entre 263 e 339 d.C. e é bispo de Cesaréia, na Palestina. Escreve uma importante
"História Eclesiástica", em 10 livros. Sobre a origem de Antipater, cf. também SCHÜRER, E., Storia del
popolo giudaico al tempo di Gesù Cristo I, pp. 300-301, nota 3.
7
Cf., para o que se segue, KIPPENBERG, H. G., Religião e formação de classes na antiga Judéia, São
Paulo, Paulus, 1988, pp. 109-116. Três coisas marcavam a política de Herodes e tiveram consequências
profundas na vida do povo da Galiléia do tempo de Jesus, servindo para sua manutenção não obstante não
ser ele um judeu: Herodes Antipas construiu uma nova capital, chamada Tiberíades, para ser o novo
centro econômico da Galiléia. Chamou assim em honra Tibério, o imperador de Roma. Ele atraía para lá
judeus não praticantes e gente que não era judeu. Para atraí-los oferecia facilidades, privilégios e terra, em
parte tirada do povo através de altos impostos. Era lá que vivia Herodes com “os magnatas, os generais e
os grandes da Galiléia”(Mc 6,21). Era lá que moravam os donos das terras, os juízes muitas vezes
insensíveis (Lc 18,1-4). Era para lá que iam o produto do povo e os impostos, e que Herodes fazia suas
festas e orgias de morte, como foi o banquete em que mandou matar João Batista (Mc 6,21-29). Jesus
andou em todas as aldeias e cidades da Galiléia. Chegou a morar em Cafarnaum (Mc 2,1). Mas não consta
nos evangelhos que ele tenha entrado em Tiberíades. Jesus se distanciava dos “palácios dos reis” (Mt
11,8). Ao longo daqueles quarenta anos de governo de Herodes Antipas, criou-se na Galiléia toda uma
classe de funcionários fieis ao projeto do rei: escribas, comerciantes, fiscais do mercado, publicanos ou
coletores de impostos, militares, policiais, juízes, promotores, magistrados, chefes locais, e outros. Em
cada povoado, aldeia ou cidade havia um grupo de simpatizantes que dependiam do governo. Vários

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escribas e fariseus estavam ligados ao sistema e à política do governo. Nos evangelhos, os fariseus
aparecem junto com os herodianos (Mc 3,6; 8,15; 12,13). Durante o governo de Antipas cresce o
latifúndio em prejuízo das pequenas propriedades comunitárias que eram a característica do sistema
tradicional dos judeus. A produção agrícola da Galiléia começa a orientar-se não mais a partir das
necessidades das famílias como antes, mas sim a partir das exigências do mercado. A arqueologia provou
a existência de grandes propriedades que visavam um maior excedente de produção para poder exportar.
Os muitos impostos faziam diminuir a rentabilidade das pequenas propriedades. O Livro de Enoque,
escrito nesta época, denuncia os poderosos donos das terras e exprime a esperança dos pequenos: “Então,
os poderosos e os grandes já não serão mais os donos da terra!” (Hen 38,4).
8
Arquelau é deposto por Augusto no ano 6 d.C., por causa das numerosas arbitrariedades que comete,
entre elas a troca indevida de sumos sacerdotes. Uma delegação de judeus influentes vai a Roma falar
com o Imperador e é atendida. A Judéia, a Samaria e a Iduméia passam, então, a ser governadas
diretamente por procuradores romanos. A capital da província passa a ser Cesaréia.
9
Herodes Antipas constrói, no ano 17 d.C., a capital de sua tetrarquia às margens do lago de Genezaré e
chama-a de Tiberíades, em homenagem ao Imperador Tibério. É muito amigo dos romanos e parecido
com o pai. Casado com uma filha do rei nabateu Aretas IV, Herodes Antipas acaba por repudiá-la e casa-
se com Herodíades, mulher de seu irmão Felipe. Isto lhe custa uma represália do rei nabateu Aretas IV,
que, para vingar a filha, ataca Antipas, derrotando-o em 36 d.C.
10
Cf. Lc. 3:1; 9:7-9; 13: 31-32; 23: 7-12; Mt. 14: 1-12.
11
Herodes Agripa I, amigo de juventude de Calígula (37-41 d.C.), recebe deste a tetrarquia de Felipe,
com o título de rei (37-44 d.C.). Dois anos depois, ao ser desterrado Antipas, recebe sua tetrarquia e as
terras de Abilene, tetrarquia de Lisânias. Em 41, quando Calígula é feito Imperador, Herodes Agripa I
torna-se também rei da Judéia, Samaria e Iduméia. Torna-se, assim, rei de um território tão grande quanto
o de seu avô, Herodes Magno. É judeu observante e piedoso, amigo dos fariseus. Começa a construção da
terceira muralha de Jerusalém, que tornaria a cidade simp lesmente inexpugnável. Contudo, não pôde
concluí-la, pois o Imperador, alertado pelo governador da Síria, proíbe-o de continuar a obra. Morre
repentinamente no ano 44 d.C., em Cesaréia.
12
“A expressão mais clara desse desenvolvimento é a concentração da posse da terra na mão de poucos
latifundiários. Ela determinava - talvez com uma exceção parcial na época hasmonéia - a situação
econômica da Palestina inclusive no período romano.” STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN,
Wolfgang, História Social do Protocristianismo: os primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo
no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São Paulo: Paulus, 2004. p. 131.
13
Tassin afirma que as causas da Diáspora são muitas e variadas: “As causas da Dispersão, deportações,
superpopulação, perseguições, decorrem das leis habituais da emigração. Entre os motivos, estaríamos
errando se insistíssemos no ‘gênio comercial’ do judaísmo; este traço quase não é enfatizado antes da
Idade Média. Em contrapartida, evitemos negligenciar o fator militar: numerosas colônias judaicas, semi-
soldados, semi-agricultores, foram colocadas nas fronteiras dos impérios sucessivos, como a colônia de
Elefantina, ao sul do Egito, cuja existência atestam papiros que falam de sua presença ali desde o século
VI: Elefantina fala o aramaico, possui seu templo e seu clero, para um culto mais sincretista, e mantém
com a Palestina relações de dependência religiosa. É que a Diáspora olha para Jerusalém (Dn 6,11).” In:
TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo :
Paulinas, 1988. pp. 14-15.A comunidade judaica da Diáspora manteve, em termos gerais, uma identidade
com o judaísmo, o que permitiu a existência deles como povo não obstante estarem fora da Palestina.
Segundo Volkmann, a unidade entre os judeus da Diáspora e os demais foi preservada por vários
elementos de identificação cultural. Diz Vo lkmann: “O que mantém a unidade desta comunidade tão
diversificada e tão dispersa são cinco fatores, que se desenvolveram justamente a partir do exílio e da
constituição da comunidade templária, especialmente sob a influência de textos elaborados entre os
exilados, com destaque para o grupo sacerdotal: a) tributo e ofertas para o Templo; b) peregrinações para
Jerusalém; c) o culto nas sinagogas aos sábados; d) calendário de festas; e) ligação organizada entre
Jerusalém e a Diáspora, princ ipalmente através da entrega do tributo e das peregrinações.” VOLKMANN,
Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal, 1992. p. 8. Soma-se a estas vinculações entre os judeus
da Diáspora e os da Palestina, elementos de diferenciação do grupo em relação ao ambiente social em que
estavam inseridos: “O domínio e a pureza do corpo supõem estreitos limites sociais não só para os judeus
que mantinham fidelidades sectárias especiais e que por isso se isolavam dos outros, judeus latitudinários,
mas também até certo ponto para todos os judeus que desejam preservar sua identidade em cidades de
Diáspora. Filon expõe sucintamente a situação deles em sua interpretação (citada anterio rmente no
capítulo 1) da profecia de Balaão: Israel não poderá ser prejudicado pelos seus adversários enquanto for

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"um povo que habita sozinho" (Nm 23,9), "porque, em virtude da distinção decorrente de seus costumes
peculiares, eles não se misturam com outros, evitando afastar-se dos caminhos de seus pais”. Os mais
importantes Acostumes peculiares" eram a circuncisão, kashrut, a observância do sábado e a proibição de
rituais cívicos que implicassem o reconhecimento de deuses gentios.” MEEKS, Wayne A., Os Primeiros
Cristãos Urbanos: o mundo social do apóstolo Paulo. (trad. I.F.L. Ferreira). São Paulo: Paulinas, 1992. p.
153. O foco da diferenciação social era a Escritura, que sempre foi “o núcleo principal para a
interpretação da própria sobrevivência de Israel na d iáspora, a fonte necessária para reler a história à luz
dos acontecimentos presentes no mundo.” In: SCARDELAI, Donizete, Movimentos Messiânicos no
Tempo de Jesus: Jesus e Outros Messias. São Paulo: Paulus, 1998. p. 43. Esta era lida e compreendida no
ambiente sinagogal, que “consolidava particularmente a unidade dos membros da Diáspora, assegurando-
lhes lugar público de expressão da sua fé, de educação para a Lei e para as práticas judaicas.” In:
TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo :
Paulinas, 1988. p. 49.
14
“Sob tais pressões, muitos judeus abandonaram o apego a uma identidade distinta como povo da
aliança, assimilando-se à cultura greco-romana. Esse fato se mostra de maneira superficial já na adoção
de nomes gregos - prática que encontramos entre muitos cristãos das origens, inclus ive alguns discípulos
de Jesus.” In: KEE, H. C., As Origens Cristãs: em perspectiva sociológica. (trad. J. Rezende Costa). São
Paulo: Paulinas, 1983, p. 35.
15
“Como as cidades crescessem em número e poder, suas relações com o campo se foram tornando cada
vez mais ambivalentes. Uns dependiam dos outros, mas sob todos os aspectos de vantagens físicas e
sociais a simbiose era unilateral e sempre favorecia a cidade.” MEEKS, Wayne A., Os Primeiros Cristãos
Urbanos: o mundo social do apóstolo Paulo. (trad. I.F.L. Ferreira). São Paulo: Paulinas, 1992, p. 29.
16
PIXLEY, Jorge, A História de Israel a Partir dos Pobres. 6 a Ed. (Trad. Ramiro Mincato). Petrópolis :
Vozes, 1999, p. 123.
17
Pixley afirma que estes conflitos alcançaram tanto a cidade quanto o campo. Ele afirma: “Nos anos
seguintes houve diversos incidentes em que a população, tanto urbana como rural, protestou contra os
abusos de poder por parte das autoridades. Tibério Alexandre, procurador de 46 a 48 d.C., sentenciou e
crucificou Tiago e Simão, filhos de Judas o Galileu, ainda que Josefo não nos informe sobre suas
atividades revolucionárias (Ant XX, 102).” Ver: PIXLEY, Jorge, A História de Israel a Partir dos Pobres.
6 a Ed. (Trad. Ramiro Mincato). Petrópolis: Vozes. 1999, p. 130. Scardelay ainda afirma que a Galiléia era
o principal centro de resistência, sendo: “(...) considerado o centro centrífugo de movimentos da
resistência judaica, cujas manifestações mais radicais e organizadas ocorriam em Jerusalém durante as
festividades do calendário religioso judaico. Entre os focos de movimentos rebeldes mais conhecidos
estão situados os zelotas, cujo aparecimento ocorreu durante o início da conquista da Judéia pelos
romanos, em 66-67 d.C.” Ver: SCARDELAI, Donizete, Movimentos Messiânicos no Tempo de Jesus:
Jesus e Outros Messias. São Paulo: Paulus. 1998, pp. 240-241. Ou seja: a dominação romana causou
desde o princípio descontentamento tanto na cidade quanto no campo, tanto na Galiléia quanto em
Jerusalém. Porém os mais pobres se mobilizaram mais freqüentemente. Esta mobilização é comentada por
Theissen: “Quando, porém, uma sociedade se sente ameaçada e insegura, ela geralmente recorre a
comportamentos tradicionais. Valores sagrados da nação são enaltecidos de forma provocadora.
Intensifica-se a separação de tudo o que é estrangeiro.” Ver: THEISSEN, Gerd, Sociologia do
Movimento de Jesus. 2 a ed. (Werner Fuchs e Annemarie Höhn). São Leopoldo: Sinodal. 1997, p. 91.
18
A influênc ia helenista no judaísmo e no cristianismo foi conseqüência inevitável do contato com a
cultura dos dominadores. Tanto os gregos, quanto os romanos, estabeleceram sua influência cultural,
numa iniciativa que buscava diminuir as resistências dos povos dominados. O início desta influência
cultural não foi pacífica, mas foi realizada através da mudança de paradigmas culturais importantes.
Pixley afirma: “A organização secular dos camponeses em aldeias, com seus próprios conselhos de
anciãos, foi violada no século III com a fundação de cidades de estilo helenístico no território da
Palestina e a introdução da propriedade privada da terra.” Ver: PIXLEY, Jorge, A História de Israel a
Partir dos Pobres. 6 a Ed. (Trad. Ramiro Mincato). Petrópolis: Vozes. 1999, p. 119. Além disto, até mesmo
a expressão “judaísmo” foi estabelecida a partir do contraste da cultura dos judeus e dos gregos. Segundo
Tassin, “o termo judaísmo parece ter sido forjado pelos judeus de língua grega para se definirem em face
do helenismo. Encontramos o termo pela primeira vez em 2 Mc 9 por volta de 150 a.C.). Em 2 Mc 2,21 o
autor evoca ‘os que generosamente realizaram façanhas pelo judaísmo a ponto de porem em fuga as
hordas bárbaras’. Ironia da linguagem! Pois são os judeus que os helenistas qualificam de ‘bárbaros’.
Aqui, como em 2 Mc 8,1, o termo ‘judaísmo’ abrange a fé, os costumes e o enraizamento étnico que
caracterizam a identidade judaica. 2 Mc 14,37-38 apresenta certo Razis que ‘havia incorrido em

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condenação por professar o judaísmo e pelo judaísmo se expusera com toda constância já no período
precedente à revolta’. Encontram-se aí as mesmas harmonizações. Acrescentemos ainda 4 Mc 4,26
(escrito no século I d.C. ou anterior) onde comer alguma coisa impura equivale a ‘abjurar ao judaísmo’.
Em todos estes textos, o contexto é polêmico: ele não evoca apenas a fidelidade à autenticidade judaica,
mas também a luta contra aquilo que a ameaçaria.” Ver: TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao
tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo: Paulinas, 1988, p. 25. Para mais exemplos do
intercâmbio cultural e conflitos entre o judaísmo e o helenismo, ver as seguintes obras: a) Le Goff, J., El
Nascimiento del Purgatorio, Madrid, Taurus, 1981, pp.18, 69-80. b) Lévêque, P., O Mundo Helenístico,
Lisboa, Ed, 70, 1988, pp.123-148. c) Eliade, op. cit., pp. 42-71. d) Simon e Benoit, Judaísmo e
Cristianismo Antigo. São Paulo. Pioneira/Edusp. 1987, pp.237-43.
19
Uma destas questões é a relação ente homens e mulheres. No judaísmo, esta era uma questão por
demais drástica. A comunidade cristã, por ser menos restrita, valorizava a figura feminina de forma
paralela àquela que era feita nos cultos gregos. Cf. Robin Scroggs, "Entrar na comunidade cristã significa,
portanto, filiar-se a uma sociedade na qual funções do tipo homem-mulher, e avaliações baseadas nestas
funções, têm sido descartadas" ("Women in the NT" em The Interpreter’s Dictionary of the Bib le, volume
suplementar [Nashville: Ab ingdon Press, 1976] 966).
20
GRELOT, P., Jesus. In: VVAA, Libertação dos Homens e Salvação em Jesus Cristo: 1a parte. [trad.
Benôni Lemos]. São Paulo: Paulinas. 1981, p. 64.
21
Segundo Stegemann, os saduceus são um grupo influente e ligado ao Sumo-Sacerdote, o que não
permite que se afirme com exatidão aqueles que pertencem ao grupo. Sabe-se que fazia parte do grupo
dominante da religião judaica, e que membros da elite econômica também eram saduceus, e na elite
política também. Steggemann afirma: “O enquadramento dos três grupos principais nos estratos da
sociedade judaica é relativamente claro no caso dos saduceus, pois tanto os testemunhos de Josefo como
do Novo Testamento sugerem que os saduceus pertenciam ao estrato superior dominante de Jerusalém.
Eles são mencionados pela primeira vez por Josefo sob João Hircano, que rompeu com os fariseus e se
aliou aos saduceus (Cf. Ant 13,293ss.). Isso, em todo caso, indica que os saduceus estavam próximos do
estrato dominante, algo que, ademais, é corroborado pelo fato de que, segundo Josefo, eles não
encontravam seus adeptos entre o povo, mas entre as pessoas ricas e afamadas (Ant 13,298). Igualmente
está claro que alguns membros da alta aristocracia sacerdotal se consideravam integrantes do grupo;
Josefo menciona nominalmente, contudo, apenas o sumo sacerdote Ananias (Ant 20,199ss.). Isso,
entretanto, não nos permite deduzir que todo sumo sacerdote ou até todos os membros do estrato superior
tenham sido saduceus. Mas nada impede a conclusão inversa. Também de acordo com o Novo
Testamento, os saduceus, como grupo influente do Sinédrio, fazem parte do estrato superior e são
mencionados de um só fôlego com o sumo sacerdote (Cf. apenas Ai 5.17).” Ver: STEGEMANN,
Ekkehard W. e STEGEMANN, Wolfgang, História Social do Protocristianismo: os primórd ios no
judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São Paulo: Paulus.
2004, p. 185. Particularmente, é aceitável a tese de que “os saduceus se apresentam como descendentes de
Sadoc, sumo-sacerdote do período de Davi e Salomão (Ez 40.46, 44.15).” Cf. SCHUBERT, Kurt,
Partidos Religiosos Hebraicos da Época Neotestamentária. (trad. Isabel Fontes Leal Ferreira). São Paulo :
Paulinas. 1979, p. 15.
22
“Em termos teológicos se evidenciam como conservadores pelo fato de defenderem apenas a validade
da Torá, sem aceitar a trad ição oral dela derivada, como o fazem os fariseus'. Em conseqüência também
não aceitam idéias novas desenvolvidas principalmente em conexão com esta tradição oral: continuidade
da vida além da morte, ressurreição dos mortos, participação de Deus na definição do destino.” Ver:
VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal. 1992, p. 119. Ver também: MOULE,
C.F.D., As Origens do Novo Testamento. (trad. Josué Xavier). São Paulo : Paulinas. 1979, p. 25.
23
“Diferentemente desses dois grupos [fariseus e essênios], que haviam se originado do protesto contra
a restauração nacional-territorial sob os asmoneus e especialmente contra a realeza sacerdotal destes,
os saduceus surgiram dos círculos sacerdotais que "eram favoráveis e apoiavam explicitamente a
dinastia asmonéia", pois viam nesta uma garantia de seus ideais nacionalistas-particularistas, no centro
dos quais deve ter estado o templo com o seu culto.” Ver: ROLOFF, Jürgen, A Igreja do Novo
Testamento. (trad. Nélio Schneider). São Leopoldo: Sinodal, 2005, p. 22.
24
O grupo dos saduceus, que era conformado com o status quo político e vinculado principalmente ao
Templo, desapareceu após a ruína das relações dos judeus com os romanos após as Guerras Judaicas, e
após a destruição do templo, que era seu contexto vital. Neste caso, as suas tradições desapareceram e a
supremacia farisaica se estabeleceu, já que o contexto da existência farisaica não era restrita ao templo,

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mas alcançava também a sinagoga. Sobre isto, ver: VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São
Leopoldo: Sinodal. 1992, pp. 119,120.
25
Não obstante serem os defensores do patrimônio religioso tradicional, os saduceus paradoxalmente
assumiram uma mentalidade secularizada, associado ao ritual sacrificial promovido e defendido pelo
grupo, provocando a dissociação entre a vida religiosa e a práxis. Ver: MOULE, C. F. D., As Origens do
Novo Testamento. (Trad. Josué Xavier). São Paulo: Paulinas. 1979, p. 141.
26
Este conservadorismo foi a causa do posicionamento dos fariseus diante de Jesus. Afirma Goppelt:
“Também os sumo-sacerdotes e os saduceus têm que insistir na eliminação de Jesus; pois todo o
movimento messiânico põe em perigo a sua posição. A revolta messiânica do ano 66 trouxe o fim tanto
para o templo quanto para eles.” Ver: GOPPELT, Leonhard, Teologia do Novo Testamento. 3 a ed. (Trad.
Martin Dreher e Ilson Kayser). São Paulo: Teológica. 2002, p. 233.
27
MORACHO, Félix, Como Ler os Evangelhos: para entender o que Jesus fazia e dizia. (trad. Iv
Storniolo e José Bortolini). São Paulo: Paulus. 1994, p. 61.
28
Afirma Michaud: “A origem dos fariseus também é obscura. Após duas décadas de novas pesquisas, os
especialistas são cada vez menos categóricos sobre tudo o que diz respeito aos fariseus. Geralmente eles
são relacionados com os hassidim, aqueles piedosos" ou "devotados à Lei", que se reuniram a Matatias,
seus filhos e seus companheiros, por ocasião da insurreição dos Macabeus em -167 (I Mc 2,42). Seu
nome significa "separados", sem que se possa dizer com certeza de que eles se separaram. De certos
judeus muito pouco escrupulosos na observância da Lei, especialmente do povo simp les ou "povo do
país: "am-ha-arets" cuja fidelidade às leis sobre os dízimos e as purificações continuava duvidosa? Ou
simplesmente dos pagãos? Sob João Hircano (-1341-104), eles aparecem como um grupo solidamente
organizado e politicamente influente. Mas foram rapidamente suplantados pelos saduceus e, se
excetuarmos o breve intervalo favorável do reino de Salomé-Alexandra (-76/-67), seu papel político
sofrerá um declínio constante a partir da intervenção romana em -63. Entretanto, após 70, essênios e
saduceus, corno grupos, tendo sido levados pela tormenta, eles continuarão sozinhos na arena e
reconstruirão o judaísmo em torno da Lei e de sua interpretação. Portanto, antes de 70, esses leigos
piedosos não faziam parte da classe governante que se reunia em torno dos sumos sacerdotes e do grupo
dos saduceus, e não tinham muita influência política. Pelo contrário, o zelo piedoso de que davam prova,
a integridade de sua vida e o ideal religioso...”. Ver: MICHAUD, Jean-Paul, A Palestina do Primeiro
Século. (In: MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia
Mathilde). Petrópolis : Vozes. 2002, p. 46.
29
Segundo Michaud, os fariseus tinham “um crédito considerável junto à população. Josefo sublinha
diversas vezes essa popularidade W 13, 288; 18, 1 5; 18, 17).”(Ver: MICHAUD, Jean-Paul, A Palestina
do Primeiro Século. (In: MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e Ambiente do Novo Testamento. (trad.
Lúcia Mathilde). Petrópolis: Vozes. 2002, p. 47.
30
Na Judéia, o centro da vida litúrgica é o templo: a pregação de Jeremias e de Ezequiel, a última
formulação do Deuteronômio desenvolveram uma teo logia da unicidade do lugar do culto, exigida por
Deus. Na época macabaica, trata-se do que chamam de o segundo templo, que fora reconstruído, depois
de muitas vicissitudes, durante o período pós-exílico. Os trabalhos tinham começado desde a volta,
conforme o edito de Ciro: primeiro reconstruiu-se o altar, em seguida, limpou-se e nivelou-se o terreno
(Esd 3,3.10); a despeito do projeto de restauração. SAULNIER, C., A Revolta dos Macabeus. (trad. I. F.
L. Ferreira). São Paulo: Paulinas. 1987, p. 44.
31
As sinagogas podem ser comprovadas na época de Jesus na Galiléia e na Judéia com base em “(...)
inscrições gregas na diáspora da segunda metade do século 3 a. C." Na terra de Israel, os testemunhos
mais antigos são a inscrição de Teódoto de Jerusalém, assim como os achados arqueológicos de Garffla,
do Herodeion e da fortaleza de Massada, da metade do século 1 d. C." Supôs-se, por isso, que, na terra
de Israel, as sinagogas surgiram mais tarde, talvez apenas no período pós-macabeu. 11 Em Josefo, no
Novo Testamento, bem como por fim também na Mishnah, encontram-se numerosas menções a sinagogas
em Jerusalém e na terra de Israel, ou seja, em Tibérias, Dor, Cesaréia (marítima), Nazaré e Cafarnaum.
Diferentemente da diáspora, entretanto, o número de sinagogas na Palestina antes de 70 d. C. deve ter
sido pequeno. Mas as raízes das sinagogas não devem se encontrar, como se presume amplamente, no
exílio babilônico, mas numa instituição pós-exilica "que estava encarregada de realizar tarefas públicas,
entre as quais se incluíam também funções religiosas. Só por volta do final do segundo templo e
sobretudo após a sua destruição, cresce sempre mais a importância das funções cultuais.” (Cf.
STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN, Wo lfgang. História Social do Protocristianismo: os
primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São
Paulo: Paulus. 2004, p. 168. As sinagogas são chamadas por vários termos. Na Diáspora, “a palavra grega

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mais comum para a sinagoga é, em contrapartida, proseuchḗs (lugar de oração).” (Cf. STEGEMANN,
Ekkehard W. e STEGEMANN, Wolfgang. História Social do Protocristianismo: os primórd ios no
judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São Paulo: Paulus.
2004, p. 168. “Porém, os vocábulos que serviam para designar a sinagoga evocam lugar de oração
(proseuchḗ), de reunião (synagogḗ) e também o sábado (uma vez sabbateíon na pena de Flávio Josefo),
porque a sinagoga devia influir muito na regularidade da observância deste dia santo. A leitura da Torá
era o elemento central da reunião; a pregação explicava, exortava, sendo o primeiro elemento de
interpretação da Torá a leitura de uma passagem dos Profetas, uma leitura comparada: desta imantação
mútua dos textos nascia uma espécie de tradição bíblico litúrgica em que a Bíblia comentava a Bíblia.”
In: TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo :
Paulinas. 1988, p. 49. A sinagoga consolidava particularmente a unidade dos membros da Diáspora,
assegurando-lhes lugar público de expressão da sua fé, de educação para a Lei e para as práticas
judaicas.” In: TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira).
São Paulo: Paulinas. 1988, p. 49.
32
VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal. 1992, p. 121.
33
Por isto, o povo simples, que não podia compreender ou até mesmo não era instruída no sem-número
de prescrições, era desprezado pelos fariseus, e Jesus também o era, já que ele “...negligencia as
purificações rituais e os jejuns de devoção, e freqüenta cobradores de impostos e pecadores (Mc 2,15-17;
Lc 15,2), devia provocar uma oposição feroz de sua parte.” MICHAUD, Jean-Paul, A Palestina do
Primeiro Século. In: MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia
Mathilde). Petrópolis : Vozes. 2002, p. 49.
34
MICHAUD, Jean-Paul, A Palestina do Primeiro Século. In: MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e
Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia Mathilde). Petrópolis: Vozes. 2002, p. 61.
35
VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal. 1992, p. 122.
36
A escatologia farisaica tinha elementos particulares. “Os fariseus mudaram da política para a piedade,
como sucintamente o expressou Jacob Neusner, ao passo que os essênios emigraram para o deserto.
Apesar deste distanciamento, ambos os grupos persistiram no senso de inelutável obrigação de alcançar e
manter a integridade do povo da aliança. Embora variassem nos detalhes de suas expectativas, estavam
unidos na confiança de que Deus haveria de se manifestar por intermédio do seu Agente eleito para
estabelecer a sua soberania no mundo e vingar o seu povo fiel. Diferiam sobretudo quanto às fases e ao
clímax do drama escatológico. Os essênios e outros grupos de tendência semelhante mantiveram-se
confiantes de que Deus lhes revelara os passos pormenorizados, pelos quais iria cumprir o seu desígnio
para com o seu povo.” Cf. KEE, H. C., As Origens Cristãs: em perspectiva sociológica. (trad. J. Rezende
Costa). São Paulo: Paulinas. 1983, p. 33.
37
Alguns têm sugerido que Jesus não escolheu mulheres para o colégio apostólico por que estava restrito
pela cultura da sua época: mulheres apóstolas não seriam aceitáveis para os judeus da época, e colocariam
em perigo a missão de Jesus (Cf. G. Bilezikian, Beyond Sex Roles [Grand Rapids: Baker, 1985] 236).
Mas este argumento é somente especulativo, e ao final, coloca Jesus numa situação difícil. Veja sua
refutação em Piper e Grudem, Recovering, 221-222. Outros exemplos: Paul K. Jewett, Man as Male and
Female (Grand Rapids: Eerdmans, 1975) 142. Cf. Robin Scroggs, "Entrar na comunidade cristã significa,
portanto, filiar-se a uma sociedade na qual funções do tipo homem-mulher, e avaliações baseadas nestas
funções, têm sido descartadas" ("Women in the NT" em The Interpreter’s Dictionary of the Bible,
volume suplementar [Nashville: Abingdon Press, 1976] 966).
38
“Os sicários, portanto, diferentemente do banditismo social, não eram um movimento restrito ao
estrato inferior, mas se recrutavam justamente também do grupo do séquito do estrato superior. A isto
corresponderia tanto o seu programa político-religioso como o fato de que o seu terror se voltava contra
a elite sumo-sacerdotal em Jerusalém.” STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN, Wolfgang.
História Social do Protocristianismo: os primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo
mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São Paulo: Paulus. 2004, p. 210.
39
SCARDELAI, Donizete. Movimentos Messiânicos no Tempo de Jesus: Jesus e Outros Messias. São
Paulo: Paulus. 1998, p. 243.
40
In: MAINVILLE, Odette (Org.). Escritos e Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia Mathilde).
Petrópolis: Vozes. 2002, p. 50.
41
O movimento zelota, ao procurar a promoção da renovação do Templo e conserto do mesmo.
Volkmann afirma que nesta intenção, os zelotas “ (...) habitam de preferência os povoados e evitam as
cidades por causa da licenciosidade inerente às cidades. Uns cultivam a terra, os outros se ocupam em
diferentes ofícios pacíficos. Os zelotas, no início do levante contra os romanos, promovem uma reforma

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no Templo, elegendo, por sorteio, um novo sumo sacerdote, originário do campo, em substituição à
aristocracia sacerdotal. Também os zelotas têm sua origem no interior, especialmente na Galiléia; Josefo
os chama de `salteadores vindos do campo.” VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo:
Sinodal. 1992, p. 98. Esta atuação periférica possibilitou o crescimento do movimento, exceto alguns
levantes ocorridos de tempos em tempos, conforme afirma Ladd: “O Novo Testamento fala da revolta de
Judas e Teudas (Atos 5:36,37), e uma outra revolta sob o comando de uni egípcio incógnito (Atos 21:38).
Josefo fala de um outro movimento revolucionário não mencionado no Novo Testamento. Ele não dá
nomes a esses revolucionários, mas na última rebelião acontecia no ano 132 A.D., o líder, Bar Kokhba,
foi denominado de Messias por Akiba, o rabino mais famoso da época." Os zelotes foram líderes judaicos
radicais, que não se contentavam em esperar calmamente pela vinda do Reino de Deus, mas desejavam a
sua vinda através da espada." É possível, e até mesmo provável, que toda a série de revolta contra Roma
fosse messiânica, isto é, que eles não tenham sido motivados pela consecução de objetivos puramente
políticos ou nacionalistas, mas, sim, religiosamente, para apressar a vinda do Reino de Deus." LADD,
George Eldon, Teologia do Novo Testamento. (trad. Darci Dusilek e Jussara Marindir Pinto Simões). São
Paulo: Exodus. 1997, p. 60.
42
MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia Mathilde).
Petrópolis: Vozes. 2002, p. 49.
43
A crucificação de Jesus não deixa dúvidas de que ele é tratado pelos romanos como zelota.
GOURGUES, M., Jesus Diante de Sua Paixão e Morte. (Trad. Monjas Dominicanas). São Paulo :
Paulinas. 1984, p. 28.
44
VOLKMANN, Martin. Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal. 1992, p. 123. Ver também:
STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN, Wo lfgang, História Social do Protocristianismo: os
primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São
Paulo: Paulus. 2004, p. 204.
45
GRELOT, P., Jesus. In: VVAA, Libertação dos Homens e Salvação em Jesus Cristo: 1a parte. [trad.
Benôni Lemos]. São Paulo: Paulinas. 1981, p. 64.
46
Na perspectiva histórica, porém, a realidade é uma vinculação entre o movimento de Jesus e do Batista.
Stegemann afirma: “João Batista deu origem a um movimento profético-escatológico de penitência sui
generis. Diferentemente dos movimentos carismático-proféticos que acabamos de tratar, destruídos
pouco tempo após o seu surgimento e cujo impulso carismático "entrou em colapso", João Batista, pelo
visto, não só atuou por um tempo maior, como tampouco o fogo carismático se extinguiu com seu
martírio. Pois, aparentemente, o carismatismo joanino continuou a existir, por um lado, em grupos
batistas e, por outro, sobretudo através de seu adepto Jesus de Nazaré.” STEGEMANN, Ekkehard W. e
STEGEMANN, Wolfgang, História Social do Protocristianismo: os primórdios no judaísmo e as
comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São Paulo: Paulus. 2004, p. 196.
47
LAPERROUSAS, E. M., Os Manuscritos do Mar Morto, São Paulo. Ed. Cultrix. 1983, pp. 166-168.
48
MICHAUD, Jean-Paul. A Palestina do Primeiro Século. In: MAINVILLE, Odette (Org.), Escritos e
Ambiente do Novo Testamento. (trad. Lúcia Mathilde). Petrópolis: Vozes. 2002, p. 54.
49
VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: Sinodal. 1992, p. 98.
50
KEE, H. C., As Origens Cristãs: em perspectiva sociológica. (trad. J. Rezende Costa). São Paulo :
Paulinas. 1983, p. 33.
51
“No fundo trata-se de uma rivalidade entre grupos sacerdotais. Em última análise, a comunidade se
mantém factualmente pura e preparada para a batalha final entre os filhos da luz e os filhos das trevas e
para, após a vitória, reassumir o culto no Templo'. A isso está associado o outro aspecto: a expectativa
messiânica. Os "homens da aliança" se encontram no meio do combate entre a luz e as trevas "até que
venham o profeta e os messias de Arão e de Israel"'. Essa tripla esperança messiânica - também o
profeta é uma figura messiânica, porque os profetas, como os reis, são considerados "ungidos" - é um
aspecto peculiar dos essênio (s...).” VOLKMANN, Martin, Jesus e o Templo. São Leopoldo: S inodal.
1992, p. 125.
52
O próprio Jesus foi, portanto, “(...) judeu e, como tal, manteve relações diretas de obediência à Lei de
Moisés, ao Templo, além de estar essencialmente ligado ao povo e à Terra de Israel, os quais Jesus amou
tanto e no meio do qual ele exerceu toda sua atividade.” In: SCARDELAI, Donizete, Movimentos
Messiânicos no Tempo de Jesus: Jesus e Outros Messias. São Paulo: Paulus. 1998, p. 238.
53
MANSON, T. W., Ética e Evangelho. (Trad. Daniel Costa). São Paulo: Novo Século. 2000, p. 56.
54
VELASCO, Rufino, A Igreja de Jesus. (Trad. Nancy B. Faria e Wagner de Oliveira Brandão).
Petrópolis: Vozes. 1996, p. 38.

B ria n G o rd o n L u ta lo Dru mo n d K ib u u k a
2 de junho de 2009 [FUNDAMENTOS NEOTESTAMENTÁRIOS]

55
TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo :
Paulinas. 1988, p. 25.
56
SCARDELAI, Donizete. Movimentos Messiânicos no Tempo de Jesus: Jesus e Outros Messias. São
Paulo: Paulus, 1998. pp. 240-241. Ver também: TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de
Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo: Paulinas. 1988, p. 50. Ver também: KEE, H. C., As Origens
Cristãs: em perspectiva sociológica. (trad. J. Rezende Costa). São Paulo: Paulinas. 1983, p. 33.
57
STEGEMANN, Ekkehard W. e STEGEMANN, Wolfgang, História Social do Protocristianismo: os
primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. (trad. Nélio Schneider). São
Paulo: Paulus. 2004, p. 236.
58
Esta reconstrução é baseada no artigo de Douglas Moo, "What Does It Mean Not to Teach or Have
Authority Over Men?" em Recovering Biblical Manhood & Womanhood: A Response to Evangelical
Feminism, eds. John Piper e Wayne Grudem (Wheaton, IL: Crossway Books, 1991) 180-2.
59
ELIADE, M., O sagrado e o Profano, A Essência das Religiões, Lisboa, Livros do Brasil. 1981, pp.187-
188.
60
TASSIN, Claude. O Judaísmo: do Exílio ao tempo de Jesus. (trad. Isabel F. L. Ferreira). São Paulo :
Paulinas. 1988, p. 21.

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