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Estratégias e constrangimentos nas trajetórias:
* “Diante dos problemas colocados pelas transformações históricas, pelas crenças e ideologias
e pelas relações de domínio e autoridade, tentei descrever a instabilidade das preferências
individuais, das ordens institucionais, das hierarquias e dos valores sociais. Em poucas
palavras, quis mostrar o processo político que gera mudanças sem deixar, porém, de abordar
as direções previsíveis que esse processo apresenta como fruto do seu encontro com
protagonistas ativos” (...) “Havia, portanto, alguma coisa que alterava os preços; e acreditamos
que o elemento perturbador deve ser procurado na complexa realidade social que estava por
trás deste mercado. Parentela, vizinhança, amizade, clientela e caridade modificavam os
preços; a solidariedade e os conflitos da comunidade tinham um peso determinante não só
para ativar as transações quanto para determinar-lhes o preço”. Giovanni Levi: A Herança
Imaterial: Trajetória de um exorcista no Piemonte do século XVII (1985). Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 2000, p. 49 e 155.
* “Seus ‘estudos etnológicos’ [de Bourdieu] têm um estilo próprio. Seria o violino de Ingres do
sociólogo mas, como todo violino de Ingres, um jogo mais sério que a profissão. Esses trechos
são executados com rara precisão. Jamais Bourdieu se mostra tão minucioso, perspicaz,
virtuose. Seus textos têm mesmo algo de estético, na medida em que um ‘fragmento’, uma
forma particular e isolada, se torna a figura de uma relação global (e não geral) da disciplina
com uma realidade ao mesmo tempo estranha e decisiva, primitiva. Este fragmento de
sociedade e de análise é primeiramente a casa que é, sabe-se bem, a referência de toda
metáfora. Seria necessário dizer: uma casa. Pelas práticas que articulam o seu espaço interior,
ela inverte as estratégias do espaço público e organiza silenciosamente a linguagem (um
léxico, provérbios, etc). Inversão da ordem pública e geração de discurso: estes dois traços
fazem também da casa kabilina a inversão da escola francesa, objeto onde Bourdieu, que faz
dela a sua especialidade, só descobre ‘reprodução’ das hierarquias sociais e repetição de suas
ideologias” (...) “O interesse de Bourdieu está na gênese, no ‘modo de geração das
práticas’. Não se interessa, como Foucault, pelo que produzem, mas por aquilo que as
produz”. (...) “Ele [Bourdieu] irá então encerrar essas astúcias [práticas, táticas,
estratégias] por trás das grades da inconsciência e negar pelo feitiço do habitus, o que
falta à razão para que esta seja outra coisa que não a razão do mais forte. Afirmará, com
o habitus, o contrário do que sabe ´tática popular tradicional – e essa proteção
(homenagem que se presta à autoridade da razão) lhe valerá a possibilidade científica de
observar essas táticas em lugares cuidadosamente circunscritos”. Michel de Certeau: A
Invenção do Cotidiano: 1 – As Artes de Fazer (1990). Petrópolis, Vozes, 2008, p. 119, 126 e
129.
* “Fernand Braudel construiu sobre bases sólidas uma imagem global do mundo mediterrânico
na época moderna, ao mesmo tempo, em que propunha uma série de pontos fundamentais a
partir dos quais podíamos estabelecer uma comparação em escala mundial” (...) “É
especialmente em As Estruturas do Cotidiano que a leitura de Braudel me parece menos
convincente, quando, em vez de procurar definir as configurações mutáveis das
transformações sociais e das transformações culturais, ele prefere privilegiar a transmissão e a
difusão, a inovação e a evolução” (...) “A segunda família presente no quadro é mais pobre e
tem um número maior de meninos. Ela confirma o que foi dito acima: uma diferença marcada
entre os filhos... (...) “É interessante notar a diferença entre seus três irmãos mais velhos; eles
se destinam a três ordens religiosas, o que implica uma diferenciação marcada das relações e
tradições no seio de uma estratégia familiar de diversificação, mesmo que seu destino pareça
ser comum. Eles implicam também custos e consumos diferentes conforme se trate de um
elegante convento de agostinianos, uma casa dominicana um pouco menos prestigiosa ou um
mosteiro franciscano; as despesas com os livros e as lições são elas também muito diversas”.
Giovanni Levi: “Comportamentos, recursos, processos: antes da ‘revolução’ do consumo” in:
Jacques Revel (org.), Jogos de escalas: a experiência da microanálise. Rio de Janeiro,
Fundação Getúlio Vargas, 1998, p. 205, 206 e 223.