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ARQUITETURA

SUSTENTÁVEL

Agatha Muller de Carvalho


Uso de energias limpas
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Diferenciar as fontes de energia.


 Avaliar as vantagens do uso de energias limpas.
 Aplicar as energias limpas em projetos sustentáveis.

Introdução
A sustentabilidade é uma questão que envolve inúmeros fatores que têm
como objetivo a redução de impactos e a preservação ambiental. Muitas
são as formas de praticar a sustentabilidade com o intuito de promover
uma sociedade mais justa e com respeito ao meio ambiente. Uma dessas
formas é por meio da geração e do consumo de energias limpas.
Neste capítulo, você vai conhecer um pouco mais sobre as energias
limpas e os fatores envolvidos na questão energética. Além disso, vai
aprender as diferenças entre as fontes de energia com base na renovação
ou não de seus recursos. Você também vai conhecer algumas energias
limpas e entender suas vantagens e algumas questões sobre o tema. Por
fim, você vai compreender como as energias limpas podem e devem ser
aplicadas em projetos de edificações sustentáveis.

Fontes de energia
A energia elétrica é a forma de energia mais usual e difundida em todo o
mundo: pode ser gerada por meio de fontes e métodos variados de produção
de energia. No entanto, mesmo antes da invenção da eletricidade, as civili-
zações já utilizavam outras fontes de energia, como na pré-história, quando
a humanidade aprendeu a manipular o fogo, que passou a ser utilizado na
iluminação e no aquecimento de suas moradias.
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A eletricidade é utilizada como fonte energética para a iluminação, para o


funcionamento de equipamentos e também para o aquecimento e resfriamento
de ambientes. Sua criação possibilitou o avanço de novas tecnologias, como
a da iluminação artificial e a do condicionamento de ar, que modificaram os
hábitos culturais e, consequentemente, os projetos das edificações (Figura
1). Com isso, o conforto ambiental das edificações passou a ser transferido
para essas novas tecnologias, o que gerou também o aumento considerável
do consumo energético, causando impactos no meio ambiente (KELLER;
VAIDYA, 2018).

Figura 1. Os principais acontecimentos da iluminação artificial e do condicionamento de ar.


Fonte: Keller e Vaidya (2018, p. 108).

O alto consumo energético pode gerar impactos ambientais das mais va-
riadas formas. Por isso, uma das práticas sustentáveis utilizadas nos projetos
de edificações é a busca por alternativas de redução do consumo energético.
Além disso, a energia pode ser gerada por meio de fontes diversas, e cada
uma delas pode produzir impactos ambientais distintos. Nesse sentido, além
da redução do consumo energético, a sustentabilidade está relacionada com
a forma de produção de energia e a fonte escolhida.
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Existem dois tipos de fontes possíveis para a geração da energia a ser


consumida em uma edificação: as fontes estão caracterizadas pela utilização,
ou não, de recursos passíveis de renovação e, por isso, são denominadas fontes
renováveis e fontes não renováveis. A seguir, serão analisados, definidos e
exemplificados esses dois tipos de fontes de energia.

As fontes renováveis
A fontes renováveis são as formas de produção de energia que utilizam recursos
renováveis, ou seja, “que se regeneram ou se mantêm ativas permanentemente
e que, mesmo que o homem as utilize, não se esgotam” (MÄHLMANN et al.,
2018, p. 140). O não esgotamento dos recursos das fontes renováveis faz com
que elas sejam mais indicadas para o processo de geração de energia. Nesse
sentido, é mais indicado o uso de recursos que se renovam.
A inesgotabilidade dos recursos não é fator de garantia da sustentabilidade
e da não geração de impacto ambiental causado pela fonte. A avaliação da
sustentabilidade de uma fonte de energia deve levar em consideração, também,
os custos e os efeitos ambientais causados pelo seu processo de produção.
A energia hídrica ou hidrelétrica é um exemplo de como a análise de uma
fonte de energia deve ser feita de forma mais complexa e levando em considera-
ção todo o ciclo de produção energética. Esse tipo de fonte utiliza o movimento
da água de rios na geração de energia. Apesar de ser uma geração de energia
não poluente, outras questões ambientais devem ser analisadas sobre a fonte
hidrelétrica. Uma delas é a intervenção em um curso hídrico para a instalação
de uma usina que envolve uma grande obra de engenharia (Figura 2). Além
disso, a usina hidrelétrica produz uma área de inundação e represamento de
água, afetando a região da instalação (MÄHLMANN et al., 2018).

Leitores do material impresso, para visualizar as figuras deste


capítulo em cores, acessem o link ou o código QR a seguir.

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Figura 2. Usina Hidrelétrica de Itaipu, na fronteira entre o Brasil e


o Paraguai.
Fonte: Mykola Gomeniuk/Shutterstock.com.

O Brasil, por ser um país com muitos recursos hídricos, utiliza em larga escala a energia
hidrelétrica. É o caso da Usina de Itaipu, construída entre as décadas de 1970 e 1980.
No link a seguir, você pode conferir um documentário que conta um pouco da história
da construção da maior obra de engenharia do Brasil e dos seus impactos ambientais
e sociais.

https://qrgo.page.link/6ADb8

Além da água do rio, outros recursos renováveis podem ser utilizados


como fonte de energia. É o caso dos ventos, que geram energia eólica
através de turbinas, e do calor do sol, que produz energia solar através de
placas fotovoltaicas. A queima de matéria orgânica, ou seja, de biomassa,
também é uma fonte geradora de energia. A partir da biomassa, também
se pode produzir o biogás. Essas formas de energia ainda não são predo-
minantes do mundo, mas estão ganhando espaço devido aos seus impactos
ambientais reduzidos.
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As fontes não renováveis


Fontes não renováveis estão relacionadas com a geração de energia por meio
de recursos que não se renovam e, por isso, estão passíveis de esgotamento
conforme o uso e a exploração contínua (MÄHLMANN et al., 2018). Esses
recursos são os denominados combustíveis fósseis, como o petróleo, o carvão
e o gás natural, e ainda o minério urano e seu núcleo radioativo.
Os recursos não renováveis estão relacionados com a produção da energia
termoelétrica, ou seja, com a geração de energia produzida pelo calor e pela
combustão do recurso. No caso do urânio, a geração de energia é desenvolvida
em usinas termonucleares, o que envolve o aquecimento de um núcleo reator
(AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2008).
Além da preocupação com a não renovação e o esgotamento dos recursos,
o uso desse tipo de fonte de energia também é preocupante, pois gera outros
impactos negativos no meio ambiente. Uma das questões é que, para serem
usados como fonte energética, os recursos precisam ser extraídos da natureza.
É o caso do carvão e do urânio, extraídos pela mineração, que causam grandes
impactos ambientais (Figura 3). Além disso, o carvão, quando extraído, libera
e dispersa micropartículas nocivas para a saúde.

Figura 3. (a) Minas de extração de carvão e (b) urânio.


Fonte: JVrublevskaya/Shutterstock.com; John Carnemolla/Shutterstock.com.

Além dos impactos da extração, os recursos não renováveis necessitam de


transporte para as respectivas usinas, o que gera impactos ambientais relativos
ao transporte e ao beneficiamento do recurso bruto nos componentes a serem
utilizados.
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No entanto, os impactos não param por aí. A queima e o consumo dos


combustíveis fósseis liberam gases responsáveis por efeito estufa e pela po-
luição do ar (MÄHLMANN et al., 2018). Da mesma forma, a radioatividade
do urânio utilizada pelas usinas nucleares é controlada, mas, em casos de
acidentes, provoca impactos sociais e ambientais gravíssimos.

O maior acidente nuclear já registrado ocorreu em 1986, na Rússia. Uma explosão


na usina de Chernobyl provocou um grande desastre radioativo que causou efeitos
drásticos — alguns deles ainda perduram. Conheça a história completa do desastre
de Chernobyl e dos seus efeitos acessando o link a seguir.

https://qrgo.page.link/tTRJu

Energias limpas
A possibilidade de esgotamento dos recursos não renováveis e dos impactos
ambientais do uso dessas fontes são fatores preocupantes, e a dependência
de toda a humanidade por essas fontes de energia não parece ser uma forma
de vida inteligente. No entanto, é exatamente assim que vivemos atualmente:
consumimos em larga escala os combustíveis fósseis, e não apenas para a
geração de energia elétrica, mas como energia para transporte, nas indústrias,
na pavimentação de estradas, nos produtos químicos, nas calefações (AYRES;
AYRES, 2012).
O gráfico da Figura 4 mostra as fontes mais utilizadas no mundo para
geração de energia elétrica nos anos de 1973 e 2006. Como podemos perceber,
as principais fontes utilizadas são provenientes de recursos não renováveis e
combustíveis fósseis altamente poluentes. A única fonte renovável com algum
destaque de produção é a hidrelétrica, que, como pudemos acompanhar no
item anterior, apesar de pouco poluente, causa alagamentos, gerando impactos
ambientais.
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Figura 4. Percentual das principais fontes de energia elétrica geradas no mundo nos anos
de 1973 e 2006.
Fonte: Agência Nacional de Energia Elétrica (2008, p. 52).

Apesar de os recursos não renováveis predominarem no quadro da pro-


dução de energia mundial, sabemos que seu esgotamento necessitará de uma
mudança de comportamento e do investimento em novas fontes de energia.
É necessário priorizar a produção e o consumo de energias limpas, ou seja,
energias oriundas de fontes renováveis e que geram baixo impacto ambiental.
Uma opção de energia limpa que tem ganhado espaço no mercado de produção
energética é a energia solar (Figura 5), que se desenvolve por meio de painéis
fotovoltaicos, que são de fácil integração com as edificações e as cidades e não
emitem gás CO2. A energia solar apresenta a vantagem de poder ser instalada
na própria edificação, com fornecimento e consumo de energia no mesmo
local, evitando desperdícios decorrentes de transmissão (ROAF; CRICHTON;
NICOL, 2009). Além da geração de eletricidade, a energia solar também pode
ser utilizada no aquecimento de água no sistema de calefação de ambientes.
Apesar da boa eficiência na produção de uma energia limpa, algumas
considerações necessitam ser feitas sobre o sistema de placas fotovoltaicas.
Uma delas é que a energia solar é uma ótima solução para a geração de
energia de uma edificação, porém, para suprir um consumo energético alto
e com aparelhos de alta potência, o sistema pode ser inviável ou muito caro
(ROAF; CRICHTON; NICOL, 2009). Além disso, ela necessita de condições
de temperatura e irradiação específicas para seu melhor funcionamento e, por
isso, pode ter a produção reduzida em determinadas regiões ou épocas do ano.
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Além do sol, os ventos também são recursos renováveis que permitem a


produção de energia considerada limpa. Assim como a energia solar, a energia
eólica (Figura 5) também vem sido difundida em todo o mundo. Ela pode ser
gerada em usinas eólicas ou até mesmo de forma doméstica e relacionada com
uma edificação. Por mais que seja uma boa opção em relação aos combustíveis
fósseis, a energia eólica não é capaz de ser a única alternativa de substituição
desses recursos, pois depende dos ventos que não predominam em todas as
regiões (ROAF; CRICHTON; NICOL, 2009). No entanto, o Brasil tem um
bom potencial eólico, principalmente em sua costa litorânea.

Figura 5. Turbinas de geração de energia eólica e placas de captação


de energia solar.
Fonte: hrui/Shutterstock.com.

As energias eólica e solar são fontes de energia limpa que estão muito
relacionadas com as condições climáticas e, por isso, não se adaptam a qual-
quer região do planeta. Isso não significa que essas regiões estão fadadas aos
recursos não renováveis.
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A biomassa é uma possibilidade de geração de energia que não depende de


fatores do clima e é entendida como “Qualquer matéria orgânica que possa ser
transformada em energia mecânica, térmica ou elétrica é classificada como
biomassa. De acordo com a sua origem, pode ser: florestal (madeira, principal-
mente), agrícola (soja, arroz e cana-de-açúcar, entre outras) e rejeitos urbanos
e industriais (sólidos ou líquidos, como o lixo)” (AGÊNCIA NACIONAL DE
ENERGIA ELÉTRICA , 2008, p. 67).
Por produzir energia a partir de compostos orgânicos e até mesmo buscando
o reuso de rejeitos, a biomassa é um tipo de fonte de energia com grande po-
tencial de expansão. Seu recurso é amplamente disponível e, caso as matérias
orgânicas sejam insuficientes, podem ser plantadas para determinado fim.
Embora a energia da biomassa seja produzida através da queima, a liberação
de dióxido de carbono produzida nesse processo é inferior à liberada pela
decomposição natural dos compostos orgânicos queimados. Por isso, ela
é considerada uma forma de energia virtualmente neutra e limpa (ROAF;
CRICHTON; NICOL, 2009).

Energia limpa e arquitetura sustentável


A sustentabilidade de uma edificação deve ser pensada não apenas nas fases
de concepção e construção, mas também durante toda a sua vida útil e por
meio do seu uso. Por isso, as energias limpas podem estar presentes das mais
variadas formas em um projeto sustentável.
Uma forma muito direta e prática de pensar a aplicação de energias limpas
em projetos sustentáveis é a substituição da energia convencional por energia
solar ou eólica. Esse tipo de prática é relativamente simples de ser executada
e pode ser feita em edificações já construídas. As energias eólica e solar
podem ser domiciliares, permitindo que a mudança de atitude seja individual
e particular, não precisando depender das grandes entidades públicas e corpo-
rações. Outra vantagem é que a produção excedente de energia não significa
desperdício, mas, sim, crédito, visto que pode ser distribuída para a rede da
cidade (Figura 6) (MÄHLMANN et al., 2018).
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Figura 6. Os painéis solares (1) produzem a energia fotovoltaica, que


é transformada em energia elétrica (2) e distribuída na edificação (3)
para ser utilizada em equipamentos e iluminação (4). A energia exce-
dente é enviada para a rede de distribuição e pode gerar créditos (5).
Fonte: Mählmann e colaboradores (2018, p. 39).

As placas de geração de energia solar podem ser desenvolvidas e instala-


das de maneiras diversas. Elas podem ser sobrepostas às lajes e coberturas
(Figura 7) ou, ainda, ser a própria cobertura da edificação. Além disso, as
placas fotovoltaicas podem ser incorporadas à pele das edificações, sendo o
próprio revestimento ou algum elemento de proteção da fachada, como brises
(ROAF; CRICHTON; NICOL, 2009).

Figura 7. Edificação com painéis fotovoltaicos sobre telhado e


turbinas eólicas.
Fonte: Diyana Dimitrova/Shutterstock.com.
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A energia solar, além de poder ser convertida em energia elétrica, também


pode ter outras finalidades na geração de energia limpa de uma edificação. O
calor do sol é uma boa fonte para implementação de um sistema de aquecimento
de água e para a calefação dos ambientes da edificação (Figura 8). Assim como
os painéis fotovoltaicos, o sistema de aquecimento de água possui coletores de
calor que ficam expostos ao sol e que circulam a água a ser aquecida (ROAF;
FUENTES; THOMAS-REES, 2014). A água quente pode ser direcionada para
um reservatório ou direcionada para o ponto de uso. Essa água quente pode
ser utilizada no aquecimento de pisos e ambientes.

Figura 8. Sistema de aquecimento de água com energia solar.


Fonte: Costazzurra/Shutterstock.com.

O uso de energias limpas em projetos sustentáveis pode transcender a escala


da edificação e alcançar a escala urbana. Para isso, não bastam iniciativas
individuais e particulares: é necessária uma mudança sistêmica nas políticas
públicas e nos incentivos da sustentabilidade em larga escala. Alguns países
desenvolvidos já estão buscando alternativas mais sistêmicas para a redução
dos combustíveis fósseis e uso de energias limpas. É o caso do Reino Unido,
que se comprometeu e estabeleceu metas para a transformação de 20% da
energia do país oriunda de fontes renováveis (ROAF; CRICHTON; NICOL,
2009). Os números parecem poucos, mas a mudança já é relevante e inicia
pela base da geração energética, ou seja, pela mudança política.
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A mudança de todo o sistema energético de um país é um acontecimento que deverá


ocorrer a longo prazo. No entanto, as energias limpas podem ser aplicadas em projetos
urbanos por meio de passos menores e mais pontuais. A busca por um transporte
público eficiente e de qualidade reduz o uso de veículos particulares e a emissão de
gases poluentes. O próprio transporte público pode priorizar o consumo de energia
oriunda de fontes renováveis e que dispensam o combustível fóssil. A energia limpa
também pode ser adotada para o consumo de elementos e equipamentos públicos,
como iluminação, bombas, semáforos. O projeto do espaço público também pode ser
um fator positivo para a sustentabilidade, incentivando o contato entre as pessoas, o
uso das calçadas, da caminhada e da bicicleta (KELLER; VAIDYA, 2018).

Fonte: canadastock/Shutterstock.com; Fahkamram/Shutterstock.com; Gyuszko-Photo/Shutterstock.com.


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AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Atlas da energia elétrica do Brasil. Brasília:


ANEEL, 2008.
AYRES, R. U.; AYRES, E. H. Cruzando a fronteira da energia: dos combustíveis fósseis para
um futuro de energia limpa. Porto Alegre: Bookman, 2012.
KEELER, M.; VAIDYA, P. Fundamentos de projeto de edificações sustentáveis. Porto Alegre:
Bookman, 2018.
MÄHLMANN, F. G. et al. Conforto ambiental. Porto Alegre: Sagah, 2018.
ROAF, S.; CRICHTON, D.; NICOL, F. A adaptação de edificações e cidades às mudanças
climáticas: um guia de sobrevivência para o século XXI. Porto Alegre: Bookman, 2009.
ROAF, S.; FUENTES, M.; THOMAS-REES, S. Ecohouse: a casa ambientalmente sustentável.
4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2014.

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