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Faculdades Integradas Hélio Alonso

Bacharel em Publicidade & Propaganda

C503C – Comunicação & Design


Prof. Marcelo Alves

AV2 – O que resta da Bauhaus: A comparação entre o funcionalismo do design de


ativismo entre o grupo Guerrilla Girls e o design contemporâneo.
Por Joana Crokidakis – 20184002

Rio de Janeiro
25/11/2020
1. Caracterização da Bauhaus
O manifesto da escola Bauhaus surge em 1919, em Weimar na Alemanha, escrito por
Walter Gropius, famoso arquiteto alemão. A frase de abertura usada pelo arquiteto é “O
objetivo final de toda atividade plástica é a construção!”

A arte da década de 20, estava envolta pela classe artística luxuosa, lentamente se
separando de um momento romântico proporcionado pela Art Nouveou. O movimento
Bauhaus se inicia com a intenção de resgatar o trabalho artístico ao artesanato. Em seu
manifesto, Gropius descreve a importância da relação dos artistas com a arquitetura, que
apenas com essa ligação pode-se construir uma nação para o futuro, e que para isso, era
necessário ter os ensinamentos básicos dado pela escola.

Esses ensinamentos seriam construídos por artistas já reconhecidos, que tomariam como
princípio a utilização, dando total prioridade a capacidade de um objeto cumprir a sua
função principal.

Não só na arquitetura, a Bauhaus vai ter o seu reflexo dentro do design de


interiores, que até então, não era reconhecido como uma forma artística. Posteriormente,
esses móveis padronizariam a construção dos eletrodomésticos de hoje.

O design gráfico foi a principal mudança entre as escolas, tendo uma alteração
drástica entre a comunicação da Art Nouveau com a arte da Bauhaus. Incorporando os
elementos geométricos, respeitando o fluxo de leitura entre as linhas horizontais e
verticais, herdadas das obras de Mondrian, e dando mais ênfase aos elementos
bidimensionais assim como o uso das cores primárias, a arte gráfica da nova escola
entrega toda a ênfase de seu material ao lado informativo, priorizando a legibilidade e a
função de um anúncio. Aqui, começamos a entrar no conceito integral da Bauhaus.

Com a instalação da ditadura nazista, a escola é fechada em 1933 quando Hitler


assume o país. Conhecido por ser um entusiasta da arte clássica, o ditador tinha aversão
a qualquer tipo de arte que poderia ser considerada “futurística”, interrompendo qualquer
ação em prol desse movimento.

Mesmo fechada, a escola de Bauhaus resistiu com seus estudantes, sendo


futuramente reinaugurada por um deles, Max Bill, que resgata uma nova perspectiva para
o movimento.

O designer, encarando uma Alemanha pós-guerra completamente destruída, traz


uma nova proposta de restauração, que radicalizaria a base da escola. Através do conceito
de utilitarismo e funcionamento, o novo conceito também visava baratear o custo de
produção em si, otimizando da melhor forma os processos de economia para reconstrução
do país.

A arquitetura ia em busca de materiais que tornasse a construção o mais ágil


possível, as construções passam a ser regidas por um processo mercantil, com agilidade
e busca pela lucratividade rápida.

As peças constituintes dos novos prédios verticais, como portas, janelas e


estruturas elétricas, passam por um processo de uniformização, sendo compatível com
toda a produção industrial.

Mesmo que estes elementos fossem iguais, cabia ao trabalho do artista de saber
compor as peças, diferenciando uma obra da outra.

2. A contemporaneidade

Embora o reflexo do design da escola de Bauhaus tenha marcado o mundo todo


por muitos anos, com o avanço tecnológico global, a conectividade cedeu espaço para o
marketing avançar dentro dos sistemas comunicativos.

O design contemporâneo passa a ser produzido com outra intencionalidade, não


deixa de priorizar totalmente o funcionalismo da escola, dando importância para a
legibilidade e entendimento da informação, mas cede mais espaço para a arte da
persuasão.

Onde o Bauhaus priorizava o uso da racionalidade do consumidor de arte, o design


contemporâneo brinca com o lado emotivo desse espectador, dando voz a sensação de
prazer emitida. Porém, essa busca pela experiência do prazer é propiciada pela figura da
informação em si.

O design aqui já não se limita mais ao seu aspecto visual. Com o avanço
tecnológico, as possibilidades de gerar uma experiência multissensorial expandiu o
alcance da arte, explorando outras áreas como músicas, estratégias audiovisuais, e até
mesmo em alguns casos surpreendentes, a experiência olfativa.

Apesar da padronização que a Bauhaus propiciou, principalmente no âmbito do


mobiliário, a padronização técnica pode ter vindo a limitar a composição, moldando
padrões a serem seguidos durante as construções.
Com o avanço tecnológico, hoje é possível ter diferenciação personalizada dentro
de cada produto, convidando o consumidor a participar da construção de seu objeto de
consumo. Se um dia o design caminhou por uma era de padronizações, hoje, a
customização é cada vez mais desejável e alcançável.

3. Objeto de análise: O desenvolvimento do design gráfico de ativismo,


comparando o grupo Guerilla Girls com o ativismo de internet

O objeto de estudo a ser analisado, será a partir da comparação entre o design


concebido como forma e ativismo durante os anos 80, e o design ativista contemporâneo
utilizado como forma de posicionamento de mercado.

Em 1985, o Museu de Arte Moderna dos Estados Unidos abre sua exposição “An
International Survey of Recent Painting and Sculpture” (“Uma pesquisa internacional de
pinturas e esculturas recentes”), onde celebrava os artistas mais renomados da época.
Dentre os cento e sessenta e cinco artistas, selecionados para a exposição, pertencentes
de dezessete países diferentes, treze eram mulheres, e nenhuma delas negra.

Com uma desproporcionalidade tão grande, a exposição chamou a atenção de


grupos ativistas pela falta de representatividade dentro da classe artística.

Surge então, o grupo “Guerrilla Girls” (“Meninas da Guerrilha), um grupo


artístico criado para criticar o lugar das mulheres e da população negra dentro dos espaços
de museu. As suas principais obras, contam com “The advantages of being a female
artist:” (As Vantagens de ser uma Mulher Artista; Figura 1) e “Do women have to be
naked to get into the Met. Museum?” (As mulheres devem estar nuas para entrarem no
Met. Museum?; Figura 2).

A linguagem utilizada por estas obras condiz com aquilo descrito pela Bauhaus,
onde a funcionalidade da obra tem maior importância dentro da composição, tendo o
entendimento da informação como prioridade.

Além da legibilidade simples utilizada pelo grupo ativista, investindo em uma


tipografia clássica, cores contrastantes para agregar atenção, e elementos visuais que
brincam com o nome do coletivo (Guerrilla, tendo a sonoridade parecida com o animal
gorila), o grupo preza pelo anonimato. Tendo como pseudônimos nome de outras artistas
mulheres que já faleceram, em seu manifesto o grupo defende que o foco deve ser
direcionado nas críticas em questão, e não nas personalidades por trás das obras.
Hoje, o Guerrilla Girls continua ativo, tendo exposições internacionais em
diferentes países, e presente em acervos fixos de alguns museus, inclusive no Museu de
Arte Moderna nos Estados Unidos.

Sua obra “Do womem have to be naked to get into the Met. Museum?” recebe
alterações conforme o número de mulheres artistas expostas e o número de obras com
mulheres nuas são alteradas dentro do Met. Museum. A última alteração feita foi em 2012
(Figura 3), tendo 4% da exposição toda com mulheres artistas, e 76% com nus.

Como analisado anteriormente, o design gráfico contemporâneo se volta para a


emocionalidade de seu público, trazendo uma experiência multissensorial com o
propósito de estimular o consumo.

Com o desenvolvimento da internet, a presença online deixou de ser uma opção e


se tornou uma obrigação dentro da estratégia de marketing. De forma cada vez mais
visual, o design gráfico incorporou o posicionamento das marcas dentro dessas redes
sociais, seguindo o padrão estético estipulado por elas.

Porém, o consumidor de 2020 está cada vez mais preocupado com o impacto
social que as marcas têm, e sua transparência perante o mercado, demandando o
posicionamento dessas empresas em questões sociais.

Recentemente veio à tona o vídeo da audiência do caso de estupro da blogueira


Mari Ferrer, onde ela é humilhada perante a justiça pela defesa do acusado, e o promotor
de justiça cria uma sentença fora da lei, o “estupro culposo”, onde não há a intenção de
estuprar.

Publicado pela plataforma de notícias The Intercept, a revolta na internet foi


imediata, com diversos manifestos defendendo a vítima e afirmando que não existe
estupro culposo. Rapidamente, as mídias voltadas para ativismo desenvolveram designs
gráficos para serem compartilhados, e logo em seguida, marcas voltadas para o público
feminino também tomaram o lado da vítima publicando suas artes de revolta.

Ao analisar estas publicações muitas delas tinham algo em comum: a estética


utilizada para a propagação da mensagem. Usando tons rosas e grafismos exagerados, as
artes desenvolvidas como forma de manifesto se mesclam e dão mais valor ao padrão
estético agradável aos olhos e ao compartilhamento, do que a informação contida.

Como exemplo, a plataforma de ativismo Mídia Ninja, e a agência de publicidade


Obvious Agency, ambas suas publicações apresentam características muito semelhantes
(Figura 4 e Figura 5), na segunda tendo até um aspecto humorístico dentro de sua
abordagem em um esquema de infográfico

Ao se analisar sua plataforma de comunicação principal do objeto de análise para


design contemporâneo, o feed da Obvious Agency (figura 6), pode-se perceber toda linha
estética percorrendo os outros designs elaborados, priorizando a consistência das artes
mais do que a revolta.

A jornalista estadunidense da plataforma Vox, Terry Nguyen, questiona se


questões sociais, como o caso também recente de racismo e violência policial contra
George Floyd, devem ser aplicadas dentro de um padrão estético para apresentação nas
plataformas de mídias sociais, já que o conteúdo dentro dessas artes poderia ser
facilmente substituído.

Assim como Barthes descreveu o uso do registro conotativo dentro da publicidade,


o design gráfico contemporâneo se alinha nesse mesmo princípio, desenvolvendo a partir
do entendimento imediato do seu público-alvo. O uso de imagens e elementos gráficos
simbólicos, como as tonalidades de cor que se alinham com a marca como um todo, não
são vistas como manifesto, e sim como publicidade.

Além disso, associado as leis de Gestalt, o direcionamento dessas mensagens


sublinhado justamente pelos tons de rosa, alinhado com os códigos culturais de
fragilidade e feminilidade, encaminham a informação para o público feminino, e não
direcionam para o público responsável pela violência contra mulher, os homens.

Num mundo totalmente globalizado pelos algoritmos de propaganda, e uma


comunicação totalmente visual e estética, fica cada vez mais difícil de separar o que é
revolta do que é marketing.

ANEXO
Figura 1 – Obra “The advantages of being a woman artist:” feita em 1988 pelo grupo
Guerrilla Girls

Figura 2 – Obra “Do women have to be naked to get into the Met. Museum?” feita em
1989 pelo grupo Guerrilla Girls
Figura 3 – Última atualização da obra “Do women have to be naked to get into the Met.
Musuem?” feita em 2012 pelo grupo Guerilla Girls

Figura 4 – Arte postada no Facebook do coletivo ativista Mídia Ninja no dia em que o
jornal The Intercept publicou o vídeo de audiência de Mari Ferrer
(https://www.facebook.com/MidiaNINJA/photos/2037774743047327)
Figura 5 - Arte publicada no Instagram da agência de publicidade Obvious Agency no
dia em que o jornal The Intercept publicou o vídeo de audiência de Mari Ferrer
(https://www.instagram.com/p/CHJKquIF-Rp/)
BIBLIOGRAFIA

KALKA, Laís; GROPIUS, Walter. O Manifesto da Bauhaus de 1919. Goethe Institut


Brasilien. Disponível em:
<https://www.goethe.de/ins/br/pt/kul/fok/bau/21394277.html>. Acesso em:
22 Nov. 2020.

NAKED THROUGH THE AGES — GUERRILLA GIRLS. Guerrilla Girls. Guerrilla


Girls. Disponível em: <https://www.guerrillagirls.com/naked-through-the-ages>. Acesso
em: 22 Nov. 2020.

SCHIRLEI ALVES. Julgamento de influencer Mariana Ferrer termina com


sentença inédita de ‘estupro culposo’ e advogado humilhando jovem. The Intercept
Brasil. Disponível em: <https://theintercept.com/2020/11/03/influencer-mariana-ferrer-
estupro-culposo/>. Acesso em: 22 Nov. 2020.

NGUYEN, Terry. How social justice slideshows made by activists took over
Instagram. Vox. Disponível em: <https://www.vox.com/the-goods/21359098/social-
justice-slideshows-instagram-activism>. Acesso em: 22 Nov. 2020.

women’s rights movement | Definition, Leaders, Overview, History, & Facts |


Britannica. In: Encyclopædia Britannica. [s.l.: s.n.], 2020. Disponível em:
<https://www.britannica.com/event/womens-movement>. Acesso em: 22 Nov. 2020.

WIKIPEDIA CONTRIBUTORS. Guerrilla Girls. Wikipedia. Disponível em:


<https://en.wikipedia.org/wiki/Guerrilla_Girls>. Acesso em: 22 Nov. 2020.

Obvious. Instagram.com. Disponível em:


<https://www.instagram.com/obviousagency/?hl=pt-br>. Acesso em: 22 Nov. 2020.

Facebook. Facebook.com. Disponível em:


<https://www.facebook.com/MidiaNINJA/photos/2037774743047327>. Acesso em:
22 Nov. 2020.

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