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Modelagem e Simulação de Processos Industriais

Aula 03 – Linearização de Equações

Frequentemente encontramos equações diferenciais não-lineares como modelos de sistemas físicos. Isso
impede o uso de ferramentas de descrição de sistemas tais como as funções de transferência que se
apoiam na Transformada de Laplace, um operador linear. Para que se possa fazer uso dessa e de outras
técnicas lineares de modelagem de sistemas, é preciso linearizar as equações originalmente não-lineares
em torno de alguma condição operacional estacionária do sistema sob análise. Desta forma, as novas
equações lineares podem descrever adequadamente a resposta dinâmica do sistema em alguma região
em torno das condições estacionárias adotadas no processo de linearização.

Mas, o que é uma equação (ou, de forma mais geral, um sistema) LINEAR? Vamos responder a esta
pergunta apresentando alguns exemplos...

● A equação 𝑦 = 𝑎𝑥 + 𝑏 é linear, com 𝑎 ≠ 0 e 𝑏 ≠ 0? Para ser linear, uma equação (ou um sistema) deve
obedecer duas regras: “fechamento” na soma e “fechamento” na multiplicação por escalar.
SE 𝑥1 gera 𝑦1 e SE 𝑥2 gera 𝑦2 , ENTÃO (𝑥1 + 𝑥2 ) DEVE GERAR (𝑦1 + 𝑦2 )
SE 𝑥1 gera 𝑦1 , ENTÃO 𝑘𝑥1 DEVE GERAR 𝑘𝑦1
Testando em 𝑦 = 𝑎𝑥 + 𝑏:
SE 𝑥 = 𝑥1 , então 𝑦 = 𝑦1 = 𝑎𝑥1 + 𝑏 SE 𝑥 = 𝑥2 , então 𝑦 = 𝑦2 = 𝑎𝑥2 + 𝑏
SE 𝑥 = 𝑥1 + 𝑥2 , então 𝑦 = 𝑎(𝑥1 + 𝑥2 ) + 𝑏 = 𝑎𝑥1 + 𝑎𝑥2 + 𝑏 ≠ 𝑎𝑥1 + 𝑏 + 𝑎𝑥2 + 𝑏 = 𝑦1 + 𝑦2
Portanto, 𝑦 = 𝑎𝑥 + 𝑏 NÃO É LINEAR!

● A equação 𝑦 = 𝑎𝑥 é linear?
SE 𝑥 = 𝑥1 , então 𝑦 = 𝑦1 = 𝑎𝑥1 SE 𝑥 = 𝑥2 , então 𝑦 = 𝑦2 = 𝑎𝑥2
SE 𝑥 = 𝑥1 + 𝑥2 , então 𝑦 = 𝑎(𝑥1 + 𝑥2 ) = 𝑎𝑥1 + 𝑎𝑥2 = 𝑦1 + 𝑦2
SE 𝑥 = 𝑘𝑥1 , então 𝑦 = 𝑎(𝑘𝑥1 ) = 𝑘𝑎𝑥1 = 𝑘𝑦1
Portanto, 𝑦 = 𝑎𝑥 É LINEAR!

● A equação 𝑦 = √𝑥 é linear?
SE 𝑥 = 𝑥1 , então 𝑦 = 𝑦1 = √𝑥1 SE 𝑥 = 𝑥2 , então 𝑦 = 𝑦2 = √𝑥2
SE 𝑥 = 𝑥1 + 𝑥2 , então 𝑦 = √𝑥1 + 𝑥2 ≠ √𝑥1 + √𝑥2 = 𝑦1 + 𝑦2
Portanto, 𝑦 = √𝑥 NÃO É LINEAR!

Generalizando: Equações lineares respeitam o Teorema da Superposição de Efeitos e são expressas


por combinações lineares:
𝑦 = 𝑎1 𝑥1 + 𝑎2 𝑥2 + 𝑎3 𝑥3 + ⋯ + 𝑎𝑛 𝑥𝑛

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Equações diferenciais lineares serão do tipo:


𝑑𝑦 𝑑2 𝑦 𝑑𝑛 𝑦 𝑑𝑥 𝑑2 𝑥 𝑑𝑚 𝑥
𝑎0 𝑦 + 𝑎1 + 𝑎2 2 + ⋯ + 𝑎𝑛 𝑛 = 𝑏0 𝑥 + 𝑏1 + 𝑏2 2 + ⋯ + 𝑏𝑚 𝑚
𝑑𝑡 𝑑𝑡 𝑑𝑡 𝑑𝑡 𝑑𝑡 𝑑𝑡

Neste curso, estudaremos dois métodos de linearização:

a) Emprego de variáveis incrementais (ou de desvios, ou de perturbações ou de flutuações): aplicável aos


casos em que ocorre a presença de termos aditivos constantes nas equações diferenciais que constituem
o modelo.

b) Uso de relações lineares advindas da expansão em Série de Taylor: aplicável aos casos de não-
linearidades nas variáveis das equações diferenciais que constituem o modelo.

● Emprego de variáveis incrementais, ou de desvios, ou de perturbações ou de flutuações:

𝑥̂(𝑡) = 𝑥(𝑡) − 𝑥̅
ou
𝑥(𝑡) = 𝑥̅ + 𝑥̂(𝑡)

𝑥̅ : valor nominal da variável 𝑥 em regime (ou estado) estacionário;


𝑥(𝑡) : valor da variável 𝑥 no instante 𝑡;
𝑥̂(𝑡) : incrementos (ou desvios, ou perturbações, ou flutuações) da variável 𝑥 em torno de seu valor
estacionário 𝑥̅ .

● Quais os benefícios da linearização?

❶ Os termos das equações diferenciais que contenham apenas constantes aditivas desaparecem;
❷ As condições iniciais para as variáveis incrementais são nulas se o ponto de partida da simulação é
a condição estacionária nominal.

Exemplo 1: Equação diferencial ordinária (EDO) de 1ª ordem não-linear.


𝑑𝑦 Não-linearidade!
𝜏 + 𝑦(𝑡) = 𝐾𝑥(𝑡) + 1
𝑑𝑡
Inicialmente, vamos definir as varáveis incrementais, admitindo valores estacionários 𝑥̅ e 𝑦̅:
𝑦̂(𝑡) = 𝑦(𝑡) − 𝑦̅ (1)
𝑥̂(𝑡) = 𝑥(𝑡) − 𝑥̅ (2)

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Substituindo (1) e (2) no modelo não-linear:


𝑑
𝜏 (𝑦̂(𝑡) + 𝑦̅) + 𝑦̂(𝑡) + 𝑦̅ = 𝐾(𝑥̂(𝑡) + 𝑥̅ ) + 1
𝑑𝑡
𝑑𝑦̂(𝑡)
𝜏 + 𝑦̂(𝑡) + 𝑦̅ = 𝐾(𝑥̂(𝑡) + 𝑥̅ ) + 1 (3)
𝑑𝑡
Agora, procura-se o modelo estático ou modelo de regime estacionário do processo. Para isso, assume-
se que o processo tenha atingido o estado estacionário (ou regime permanente) nas condições nominais
de operação:
𝑥(𝑡) = 𝑥̅ e 𝑦(𝑡) = 𝑦̅ ⇒ 𝑥̂(𝑡) = 𝑦̂(𝑡) = 0 (4)
Substituindo (4) em (3):
𝑦̅ = 𝐾𝑥̅ + 1 (5) [Modelo estático]
Substituindo (5) em (3):
𝑑𝑦̂(𝑡)
𝜏 + 𝑦̂(𝑡) + 𝐾𝑥̅ + 1 = 𝐾𝑥̂(𝑡) + 𝐾𝑥̅ + 1
𝑑𝑡
𝑑𝑦̂(𝑡)
𝜏 + 𝑦̂(𝑡) = 𝐾𝑥̂(𝑡) (6) [Modelo (de desvios) linearizado no ponto (𝑥̅ , 𝑦̅)]
𝑑𝑡
A equação (6) só é válida para 𝑥̂(𝑡) → 0 e 𝑦̂(𝑡) → 0 nas vizinhanças do ponto de operação (𝑥̅ , 𝑦̅).

● Linearização por expansão em Série de Taylor:

 Funções de uma única variável. Uma função 𝑓(𝑥) pode ser expandida em Série de Taylor em torno de
um ponto estacionário 𝑥̅ de seu domínio como:

𝑑𝑓 1 𝑑2 𝑓 2
1 𝑑3 𝑓 3
1 𝑑𝑖 𝑓
𝑓(𝑥) = 𝑓(𝑥̅ ) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + ⋯ = ∑ | (𝑥 − 𝑥̅ )𝑖
𝑑𝑥 𝑥̅ 2! 𝑑𝑥 2 𝑥̅ 3! 𝑑𝑥 3 𝑥̅ 𝑖! 𝑑𝑥 𝑖 𝑥̅
𝑖=0

Desprezando-se os termos de ordem superior ou igual a 2, teremos uma descrição aproximada de 𝑓(𝑥):
𝑑𝑓
𝑓(𝑥) ≈ 𝑓(𝑥̅ ) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) para 𝑥 → 𝑥̅ (1)
𝑑𝑥 𝑥̅
A equação (1) é a equação da reta tangente ao gráfico de 𝑓 no ponto de abscissa 𝑥 = 𝑥̅ .

Inclinação
𝑑𝑓
|
𝑑𝑥 𝑥̅

 Funções de duas variáveis. Uma função 𝑓(𝑥, 𝑦) pode ser expandida em Série de Taylor em torno de
um ponto estacionário (𝑥̅ , 𝑦̅) de seu domínio como:

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𝜕𝑓 𝜕𝑓 𝜕2𝑓 (𝑥 − 𝑥̅ )2 𝜕 2 𝑓 (𝑦 − 𝑦̅)2
𝑓(𝑥, 𝑦) = 𝑓(𝑥̅ , 𝑦̅) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + | (𝑦 − 𝑦̅) + 2 | + 2| +
𝜕𝑥 (𝑥̅ ,𝑦̅) 𝜕𝑦 (𝑥̅ ,𝑦̅) 𝜕𝑥 (𝑥̅ ,𝑦̅) 2! 𝜕𝑦 (𝑥̅ ,𝑦̅) 2!

𝜕3𝑓 (𝑥 − 𝑥̅ )3 𝜕 3 𝑓 (𝑦 − 𝑦̅)3
+ | + | +⋯
𝜕𝑥 3 (𝑥̅ ,𝑦̅) 3! 𝜕𝑦 3 (𝑥̅ ,𝑦̅) 3!

Desprezando-se os termos de ordem superior ou igual a 2, teremos uma descrição aproximada de 𝑓(𝑥, 𝑦):
𝜕𝑓 𝜕𝑓
𝑓(𝑥) ≈ 𝑓(𝑥̅ , 𝑦̅) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + | (𝑦 − 𝑦̅) para (𝑥, 𝑦) → (𝑥̅ , 𝑦̅) (2)
𝜕𝑥 (𝑥̅ ,𝑦̅) 𝜕𝑦 (𝑥̅ ,𝑦̅)

A equação (2) é a equação do plano tangente à superfície 𝑓(𝑥, 𝑦) no ponto (𝑥̅ , 𝑦̅).

Exemplo 2: Linearização de uma função raiz.


𝑓(𝑥) = 𝑘√𝑥 Não-linearidade!

O polinômio de Taylor de primeira ordem calculado em torno de 𝑥̅ é:


𝑑𝑓 1 1
𝑓(𝑥) = 𝑘√𝑥 ≈ 𝑓(𝑥̅ ) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) = 𝑘√𝑥̅ + (𝑥 − 𝑥̅ ) = 𝑘√𝑥̅ + 𝑥̂ para 𝑥 → 𝑥̅
𝑑𝑥 𝑥̅ 2√𝑥̅ 2√𝑥̅
1 1 1
𝑑 𝑑 1 1 1 1
Lembrete: 𝑑𝑥 (√𝑥) = 𝑑𝑥 (𝑥 2 ) = 2 𝑥 2−1 = 2 𝑥 −2 = 1 =2
2𝑥 2 √𝑥

Resta agora empregar o método das variáveis incrementais para eliminar a constante aditiva 𝑘√𝑥̅ .

Exemplo 3: Linearização de uma função produto.


𝑓(𝑥, 𝑦) = 𝑥𝑦 Não-linearidade!

O polinômio de Taylor de primeira ordem calculado em torno de (𝑥̅ , 𝑦̅) é:


𝜕𝑓 𝜕𝑓
𝑓(𝑥) = 𝑥𝑦 ≈ 𝑓(𝑥̅ , 𝑦̅) + | (𝑥 − 𝑥̅ ) + | (𝑦 − 𝑦̅) =
𝜕𝑥 (𝑥̅ ,𝑦̅) 𝜕𝑦 (𝑥̅ ,𝑦̅)

= 𝑥̅ 𝑦̅ + 𝑦̅(𝑥 − 𝑥̅ ) + 𝑥̅ (𝑦 − 𝑦̅) = 𝑥̅ 𝑦̅ + 𝑦̅𝑥̂ + 𝑥̅ 𝑦̂ para (𝑥, 𝑦) → (𝑥̅ , 𝑦̅)


Resta agora empregar o método das variáveis incrementais para eliminar a constante aditiva 𝑥̅ 𝑦̅.

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