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PÓS-GRADUAÇÃO

LATO SENSU EM
TEOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO

MITANÁLISE E
CRONOLOGIA DO
NOVO TESTAMENTO
Andre Moreira
Pindamonhangaba / SP – 2021
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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 3
1. BREVE INTRODUÇÃO À MITANÁLISE .................................................................................................... 5
1.1 Sobre os mitos ................................................................................................................................ 6
1.2 Mito e religião ................................................................................................................................ 8
2. IMAGENS E SÍMBOLOS CRISTÃOS EM MIRCEA ELIADE: UMA LEITURA COMENTADA DA OBRA
“IMAGENS E SÍMBOLOS” ........................................................................................................................ 10
2.1 Os símbolos cristãos e suas correlações com outras religiões ..................................................... 11
2.2 Batismo: a água como símbolo .................................................................................................... 19
3. A ORIGEM DE TUDO .......................................................................................................................... 24
3.1 Por que “cronologizar”? ............................................................................................................... 26
3.2 Problemas e controvérsias ........................................................................................................... 27
4. DA CRONOLOGIA BÍBLICA PARA A HISTÓRIA UNIVERSAL .................................................................. 30
4.1 O papel da profecia no desenrolar cronológico da História ........................................................ 31
4.2 Rachaduras no edifício ................................................................................................................. 32
CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 37
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 39
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INTRODUÇÃO

Por que estudar os mitos? Começo o presente trabalho com essa pequena,
mas importante pergunta. Sem compreender nossa motivação, a jornada poderia
parecer fútil e apenas mais uma tarefa ordinária, que meramente cumpre com a
obrigação de apresentarmos mais uma disciplina no curso de pós-graduação lato
sensu em Teologia do Novo Testamento oferecido pela FABAD. Compreender o mito,
principalmente a partir de um olhar cristão, se trata de uma gigantesca tarefa para a
qual quero convidá-lo nesse momento.

Ao longo de seus estudos é possível que você se depare com uma série de
informações e conteúdos aqui expostos que se opõem radicalmente ao pensamento
cristão reformado e contemporâneo. Nosso propósito nessa empreitada é sobretudo
oferecer perspectivas ao estudante sobre o tema, levando-o a conhecer como esse
assunto é enxergado pela humanidade, em especial por aqueles que não partilham a
mesma fé que nós e como ele se conecta com a fé reformada. Nesse projeto,
inevitavelmente faremos um retorno aos primórdios da humanidade, observando
como o mito surgiu e se desenvolveu e como sua influência perpassa as fronteiras
culturais até o dia de hoje.

Esse esforço panorâmico se faz necessário para compreendermos, por


exemplo, como o cristianismo dos séculos I a III foi afetado pelas culturas que o
cercavam e como ele influenciou essas tais culturas. Outrossim, compreender a
relação entre o cristianismo primitivo e as culturas dos séculos I a III nos permitirá
enxergar melhor o cristianismo da atualidade.

Assim, retorno à pergunta com a qual comecei essa introdução: por que
estudar os mitos? E resumo a resposta: estudaremos os mitos para compreender o
pano de fundo que deu cenário à nossa tradição. Veremos mais adiante que o
Homem, nas palavras de Cassirer, importante filósofo alemão do século XX,
“deveríamos definir o homem como ‘animal symbolicum’ e não como ‘animal
rationale’” (1994). Quer concordemos ou não com a classificação humana do homem
como animal, não podemos negar a relevância do simbolismo em nossas vidas.
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No entanto, responder à pergunta “o que é o mito”, dá sentido apenas a uma


parte daquilo que propomos no estudo dessa disciplina que chama “Mitanálise e
Cronologia do Novo Testamento”. O que, afinal de contas têm os mitos a ver com a
cronologia da narrativa cristã? E é aí que reside o grande desafio de nossa disciplina.
É característica marcante do mito que se expressa no campo religioso a busca
constante por uma reconexão com o sagrado. Essa busca se dá nos rituais e práticas
espirituais diversas. Quando tratamos do assunto “tempo”, vemos que a diferença
entre o cristianismo e as demais religiões do mundo está no fato de que esse
“reconectar” ocorre uma única vez no cristianismo quando o próprio cristo se manifesta
em auto sacrifício pela humanidade. Falaremos mais desse tema adiante, nas seções
três e quatro desse material.

Didaticamente dividimos o presente trabalho em quatro grandes seções. Na


primeira parte (Breve introdução à mitanálise) falaremos sobre a origem do mito e sua
relevância para a humanidade e como o mito e a religião se relacionam. Na seção
dois (Imagens e símbolos cristãos), abordaremos os símbolos cristãos e suas relações
com as culturas não cristãs. Na unidade três (A origem de tudo) trataremos da relação
entre a cronologia e o cristianismo, e concluiremos nossos estudos na unidade quatro
(Da cronologia bíblica para a História universal) refletindo sobre a relevância da
cronologia bíblica para a história universal.

Ao término desses estudos estará apto a compreender o que é o mito, seu


surgimento, suas manifestações, como os símbolos universais se relacionam com o
Homem, o cristianismo e a História. Para o presente trabalho, fizemos referências a
grandes autores, passeando por diversas obras clássicas da Humanidade. Nesse rol
de referências não poderíamos deixar de recorrer a pensadores como Freud, Joseph
Campbell, Ernst Cassirer, Sophia Caracuchansky, Rudolph Otto, Mircea Eliade, Kant
e outros. As obras que sustentam esses estudos são deveras específicas, mas
largamente conhecidas.

Bons estudos!

Prof. Andre Moreira.


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1. BREVE INTRODUÇÃO À MITANÁLISE

Nas palavras de Caracuchansky (1988), “a mitanálise repousa sobre umas


tantas ideias a respeito dos mitos (e dos destinos humanos neles contidos), de um
lado, e sobre determinadas descobertas no campo da psicologia do desenvolvimento
de outro” (1988). A partir dessa base prosseguiremos nosso caminho investigativo a
respeito da mitanálise, tendo sempre sob principal olhar os mitos, em especial sua
relação com o Cristianismo.

Desde o início, do estudo dos símbolos, as maiores dificuldades foram


encontradas pelos próprios filósofos, para explicar e descrever a verdadeira natureza
do espaço abstrato ou simbólico. O fato da existência de uma coisa como o espaço
abstrato foi uma das primeiras e mais importantes descobertas do pensamento grego.
No entanto, o próprio pensar desse espaço é por si mesmo uma ficção da mente
humana. Se pudéssemos voltar ao pensamento primitivo perceberíamos que ele não
é apenas incapaz de pensar um sistema de espaço; não pode sequer conceber um
esquema do espaço.

É impossível no momento “pré-primitivo” reduzir o espaço concreto a uma


forma esquemática. A etnologia mostra-nos que as tribos primitivas costumam ser
dotadas de uma percepção extraordinariamente nítida do espaço. Um nativo dessas
tribos tem olhos para os mínimos detalhes de seu ambiente. É extremamente sensível
a toda mudança na posição dos objetos comuns à sua volta. No entanto, se lhe pedem
para fazer uma descrição geral, delinear o curso do rio, ele não é capaz de o fazer.
Se lhe pedem que desenhe um mapa do rio e de suas voltas, ele dá a impressão de
nem mesmo entender a pergunta. Isso ocorre porque o símbolo no estado primitivo é
algo inconcebível. A partir dessa ilustração, fica clara a diferença entre conhecimento
concreto e simbólico.

Na história da cultura humana, essa grande definição / compreensão do que é


o símbolo, parece ter sido feita pela primeira vez na astronomia babilônica. Nela
encontramos o primeiro indício definido de um pensamento que transcende a esfera
da vida prática concreta do homem, que ousa abarcar o universo inteiro em uma visão
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abrangente. E por essa razão que a cultura babilônica foi considerada como o berço
de toda a vida cultural. Muitos estudiosos sustentaram que todas as concepções
mitológicas, religiosas e científicas da humanidade derivaram desta fonte. No entanto,
essa teoria carece de fontes e é questionada pelos estudiosos mais conservadores a
respeito do tema.

1.1 Sobre os mitos

Os mitos não são estórias aleatórias, contadas ao acaso para diversão ou


entretenimento. Possuem normas, regras e condutas morais em sua essência de vida.
Representam em sua primeira instância a moral humana, que olha
contemplativamente para a necessidade instintiva do Homem. Os mitos versam sobre
valores primários do Homem, instintivos, ligados aos aspectos biológicos do ser e do
mundo. Costumam ser interpretados de múltiplas formas e maneiras ao longo do
século. Antropólogos e sociólogos, por exemplo, frequentemente compreendem o
mito como a expressão do pensamento e das intenções de um agrupamento humano
(CARACUCHANSKY, 1988).

Para Frazer (2009), o mito pode ser a expressão de todas as coisas ao mesmo
tempo. O mito não é a representação pronta e facilmente interpretável de algo, mas
sim, fruto de uma imaginação popular, expresso e construído de maneira coletiva,
onde todos contribuem para sua existência. Para a psicanálise, os mitos são a
manifestação do inconsciente, herdados culturalmente e existentes em todas as
sociedades. Assim, sob essa perspectiva é que se justificam as repetições de
inúmeros mitos, em inúmeras sociedades, mas com linguagens diferentes, subsistindo
por séculos.

Em Campbell (1990), vemos que o mito surge como um desejo humano de dar
sentido à realidade, facilitando a compreensão de temas e aspectos complexos e
abstratos da realidade. Para Freud (2019), é visto como o denominador comum de
toda a Humanidade. É comum que, para dar sentido às experiências individuais, as
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pessoas façam referência a mitos ou estórias populares, ou ainda que associem sua
jornada à de heróis ou personagens bíblicos. Tudo isso para justificar a experiência
pessoal, seja ela um relato de sucesso ou de desencontros emocionais.
Caracuchansky (1988) afirma que apesar de múltiplos, é possível perceber que todas
as associações com mitos são repetitivas, ou seja, apresentam detalhes que são
comuns a todos os seres humanos. Curiosamente, conseguimos notar essas mesmas
similaridades quando observamos a manifestação do mito em uma determinada
cultura e o comparamos com as estórias de outras culturas.

De posse dessas informações preliminares sobre o símbolo, podemos concluir


que a composição humana vai além das configurações biológicas ou psicológicas. O
Homem é também, nas palavras de Cassirer, um ser simbólico (1994). A linguagem,
o mito, a arte e a religião são parte da configuração humana. O Homem não consegue
deparar-se com a realidade sem confrontar-se antes com os simbolismos pertinentes
à sua existência. Para Cassirer, o Homem está, de certo modo, conversando consigo
mesmo antes do contato que trava com a realidade; suas interpretações simbólicas o
acompanham e o moldam, assim como são moldadas por suas inferências e
experiências cotidianas. O Homem envolveu-se de tal modo com as formas
linguísticas, imagens, símbolos, mitos ou ritos religiosos que não consegue ver ou
conhecer coisa alguma a não ser pela interposição do fenômeno simbólico que na
maioria das vezes se trata de obra artificial da própria mentalidade humana (Cassirer,
1994).

Não podemos pensar, no entanto, que por ser tratar de algo imanente, ou seja,
que faz parte do pensamento humano mais primevo, que o mito é algo grosseiro, ou
um apanhado bagunçado de histórias mal fundadas. Apesar de por vezes parecer
caótico em sua narrativa, o mito, em todas as culturas e variações, possui uma forma
sistemática ou conceitual; o mito faz sentido para a cultura que dele se apropria. E
isso acontece porque há também na narrativa mítica a construção de uma identidade
emocional. Cassirer (1994) afirma que anterior à linguagem sistêmica, composta por
letras e alfabetos, há a linguagem afetiva e é nessa linguagem que nasce o mito. Isso
ocorre até mesmo nas religiões ditas “racionais” tais quais as descritas por Kant
(2015), pois mesmo nessa esfera, suas explicações se originam de narrativas que
possuem os mesmos moldes e características de uma narrativa mítica.
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1.2 Mito e religião

Ao comparar as religiões é certo que encontraremos mais diferenças do que


pontos em comum. Divergências doutrinárias, dogmas e origens diferirão
drasticamente. Apesar disso, quando observamos o transcendental conseguimos
enxergar aquilo que nos permite classificar uma tradição espiritualizante como
religião. É a partir dessa ideia que Rudolf Otto desenvolve uma análise sobre a relação
que o ser humano tem com o sagrado, com o elemento que “aparece como um
princípio vivo em todas as religiões. Constitui sua forma mais íntima e, sem ele, nunca
seriam formas da religião” (OTTO, 1992).

De todos os fenômenos da cultura humana, o mito e a religião são os mais


incompatíveis e resistentes a uma análise meramente lógica. Como dissemos, o mito
não é uma massa “sem forma e vazia” de ideias incoerentes, conectadas a esmo.
Não pense, contudo, que encontrar sentido no mito será tarefa fácil ou de respostas
imediatas. Sua leitura por vezes nos parecerá incompleta e até inconsistente.

A religião da mesma forma, se apresenta desafiadora e complexa. A religião é


um enigma não só no sentido teórico, mas também no sentido ético. A proposta
universal da religião de nos conectar com o sagrado, o divino, incansavelmente já
levou dezenas de homens e nações a incontáveis guerras e conflitos. Para superar
esses desafios não devemos olhar o mito ou a religião através do prisma de uma
cultura ou sociedade, mas sobretudo através da ótica transcendental do objeto de
estudo.

Não raras vezes pensamentos elementares foram encontrados em diversas e


distintas culturas por estudiosos. Artigos religiosos, credos dogmáticos e até relíquias
parecem se repetir em algumas sociedades de forma anterior ao sincretismo; os
símbolos e sua manifestação física muda, mas o princípio por trás dos objetos se
repete.

Determinar a verdadeira relação entre fé e razão foi uma das principais tarefas
da filosofia medieval. Nos sistemas do alto escolasticismo, o problema parecia ter sido
solucionado. Segundo Tomás de Aquino (1998), a verdade religiosa é supranatural e
suprarracional; mas não é "irracional". Com base apenas na razão, não podemos
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penetrar os mistérios da fé. No entanto, esses mistérios não contradizem, mas


completam e aperfeiçoam, a razão.

Por sua vez, o mito combina um elemento teórico e um elemento artístico em


sua formação. Cassirer (1994), destaca a relação íntima entre o mito e a poesia; a
mente do criador do mito é o protótipo do poeta. Mas a mente mítica, apesar de
conectada à poética, opera de modo diferenciado. O poeta descreve seu texto de
maneira independente, ou seja, dispensa o vínculo com o material, enquanto que no
mito está implicada uma crença num objeto. Se não houvesse crença, não haveria
mito.

Assim como o mito, antes de ser racionalizado pelo homem, o sagrado


antecede qualquer moralização humana, como as noções de bondade que
frequentemente são aplicadas às divindades. É justamente para escapar da carga
moral que a palavra “sagrado” possui que Otto cunha o termo numinoso para se referir
ao Totalmente Outro. Ele, porém, não se opõe à racionalização do sagrado, muito
pelo contrário, defende que devemos nos esforçar para tornar, através de
designações ideogramáticas e sinais duradouros, mais claro e estável aquilo que
antes só era conhecido sob a forma de puro sentimento (Otto, 1992).

Assim, Otto estabelece a essência das religiões como a reação emocional de


terror e fascínio intrínseca ao ser humano despertada pelo contato com um elemento
transcendental incognoscível, ao qual ele se refere como numinoso e que será
posteriormente racionalizado pelo homem. Mas essa conclusão nos leva a uma
pergunta: de que maneira poderia um elemento irracional, que transcende a natureza
e as categorias humana, se tornar visível para os seres humanos?

Eliade se esforça por dar resposta a essa pergunta numa tentativa de mostrar
que o transcendental se manifesta através da sacralização de elementos do nosso
mundo, transformando-os em símbolos. Em outras palavras, “graças aos símbolos, o
Mundo se torna transparente, suscetível de revelar a transcendência” (Eliade, 1992).
Para facilitar a compreensão, Eliade emprega o termo “hierofania” para se referir a
esses símbolos, que significa literalmente “manifestação do sagrado”.
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2. IMAGENS E SÍMBOLOS CRISTÃOS EM MIRCEA ELIADE:


UMA LEITURA COMENTADA DA OBRA “IMAGENS E
SÍMBOLOS”

Em sua obra “Images et Symboles: Essais sur le symbolisme magico-religieux”


(publicada originalmente em 1953 na França traduzida para o português em 1979
apenas como “Imagens e Símbolos”), Mircea Eliade faz uma interessante reflexão
sobre o símbolo no sagrado e sua relevância para o Homem. Esse livro pode ser
considerado a porta de entrada para o pensamento de Eliade sobre esse tema. O
pensamento simbólico faz parte do ser humano; surge antes mesmo da própria
linguagem e surge muito antes da manifestação da razão discursiva. As imagens, os
símbolos, os mitos não são criações irresponsáveis do psiquismo mas correspondem
a uma necessidade humana de dar sentido à existência, procurando revelar as
modalidades mais secretas do ser.

O estudo dedicado dos símbolos nos leva a conhecer melhor o Homem num
nível anterior à culturalização da contemporaneidade: compreender a universalidade
dos símbolos nos permite dar sentido àquilo que é imanente no Homem. Nesse
sentido, ao tratar do simbolismo cristão, Eliade recorre ao pensamento de Louis
Beirnaert, padre e psicanalista francês. Para Beirnaert (1987), as imagens e o
simbolismo do sacramentalismo cristão não remetem o crente “a mais mitos e a
arquétipos imanentes, mas à intervenção da potência divina na história”. Segundo ele,
o simbolismo do cristianismo não deve fazer desconhecer a permanência do sentido
antigo. Retomando as grandes figuras e as simbolizações do homem religioso natural,
o cristianismo retomou também as suas virtualidades e os seus poderes sobre a
psiqué profunda.

A dimensão mítica e arquetípica, não é, no entanto, menos real por conta de


suas características. O cristão pode muito bem ser um homem que renunciou a
procurar a sua salvação espiritual nos mitos e na única experiência dos arquétipos
imanentes mas isso não quer dizer que tenha renunciado a tudo o que significam e
efetuam os mitos e as simbolizações para o homem psíquico, para o microcosmos: A
adoção, por Cristo e pela Igreja, das grandes imagens como o sol, a lua, a madeira, a
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água, o mar, etc., significam uma evangelização das potências afetivas assim
designadas. Não deve reduzir-se a Encarnação apenas à tomada da carne. Deus
chegou a intervir até ao inconsciente coletivo para o salvar e para o realizar. Cristo
desceu aos Infernos. “Como poderá, pois, esta salvação atingir o nosso inconsciente
se ela não lhe fala na sua linguagem, se não retoma as suas categorias?” (Beirnaert,
1987).

A reflexão acima traz elementos preciosos e importantes sobre as relações


existentes entre os simbolismos “imanentes”, ou seja, aqueles que fazem parte da
crença primitiva humana e a fé. Mas a despeito da questão da imanência, a fé cristã
está suspensa em uma revelação histórica: é a manifestação de Deus no Tempo que
assegura, aos olhos do cristão, a validade das imagens e dos símbolos. A água
enquanto símbolo “imanente” e universal não foi abolida nem desarticulada em
consequência das interpretações locais e históricas judaico-cristãs do simbolismo
batismal. Simplificando: a história não consegue modificar radicalmente a estrutura de
um simbolismo “imanente”. A história acrescenta continuamente novas significações,
mas estas não destroem a estrutura primária do símbolo.

2.1 Os símbolos cristãos e suas correlações com outras


religiões

Eliade (1992) compara a mensagem salvífica da cruz à mensagem por trás de


Yggdrasil, a mitológica árvore nórdica que está localizada no centro do universo e
equilibra os nove mundos da mitologia nórdica. Para o autor, o cristianismo utilizou,
interpretou e alargou este símbolo. A Cruz, feita da madeira da Árvore do Bem e do
Mal, substitui a Árvore Cósmica; o próprio Cristo é descrito como uma Árvore por
Orígenes (2016), teólogo do século III. Uma homilia de Crisóstomo, outro teólogo do
século V, evoca a cruz como uma árvore que sobe da terra aos céus. Como planta
imortal, ela ergue-se no centro do Céu e da Terra: firme sustentáculo do universo, elo
de todas as coisas, suporte de toda a terra habitada, entrelaçamento cósmico,
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contendo em si toda a variedade da natureza humana... “E a liturgia bizantina canta


ainda hoje, no dia da exaltação da Santa Cruz, a árvore da vida plantada no Calvário,
a árvore sobre a qual o Rei dos séculos operou a nossa salvação”, a árvore que,
“saindo das profundezas da Terra”, “se elevou no centro da Terra e santifica até aos
confins do universo” (2010).

A Imagem da Árvore Cósmica conserva-se espantosamente pura. Pode ser


comparada à sabedoria descrita em Provérbios 3.18: “é uma árvore de vida para os
que a apreendem”. Esta Sabedoria, comenta o Padre de Lubac (2007), “para os
Judeus será a Lei; para os cristãos será o Filho de Deus”. Outro protótipo provável, a
árvore vista em sonhos por Nabucodonosor (Daniel 4.7-15): “Vi no meio da Terra uma
árvore de grande altura (...)”. Lubac ainda acrescenta que tal como o símbolo da
Árvore Cósmica das tradições nórdicas, a Imagem da Cruz prolonga no cristianismo
um “velho mito universal” (2007), mas apressa-se a pôr em evidência as inovações
trazidas pelo cristianismo. Nisso podemos ver a continuação da homilia de Crisóstomo
que afirma que o Universo é a Igreja: “ela é o novo macrocosmos, a que é análoga,
em miniatura, a alma cristã” (2007). Para Lubac, essas similaridades existentes entre
as linguagens ocorrem em virtude do desenvolvimento histórico de cada cultura /
civilização.

Assim, residirá aí efetivamente todo o problema? Estaremos de fato


condenados a contentar-nos unicamente com a análise exaustiva das “versões
particulares”, que representam, no fim de contas, uma história local? Não teremos
nenhum meio de abordar a imagem, o símbolo, o arquétipo na sua própria estrutura,
nessa totalidade que abarca todas as “histórias”, sem as confundir? Numerosos textos
patrísticos e litúrgicos comparam a Cruz a uma escada, a uma coluna ou a uma
montanha (Lubac, 2007). Estas imagens são, como bem se sabe, fórmulas
universalmente confirmadas e repetidas por outras culturas, inclusive pelo judaísmo.
A cruz foi apresentada pelos pais teológicos como símbolo do “Centro do Mundo”,
outra referência às mitologias em voga no século III, IV e V d.C., e assim assimilada
à Arvore Cósmica. É a prova de que a Imagem do Centro se impunha naturalmente
ao espírito cristão. E por meio da Cruz (que equivale ao “Centro do Mundo”) que se
realiza a comunicação com o Céu e que, ao mesmo tempo, salva toda a Humanidade.
Para Eliade (1979), a noção de “salvação” não faz mais do que retomar e completar
as noções de renovação perpétua e de regeneração cósmica, de fecundidade
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universal e de sacralidade, de realidade absoluta e, afinal, de imortalidade, todas elas


noções que coexistem no simbolismo da Árvore do Mundo (Eliade, 2016).

Nesse ponto é importante dizer que Eliade, assim como a Mitanálise cristã e
toda mitocrítica nela existente, não pretendem desconstruir a espiritualidade, ou
contestar a importância da história e, no caso do judaico-cristianismo, da fé, para julgar
no seu justo valor este ou aquele símbolo tal como era compreendido e vivido numa
cultura definida; o propósito dessas reflexões é olhar para a totalidade do símbolo,
explorando não apenas o que nos revela “versão particular” de um símbolo, mas a
totalidade do simbolismo. As diversas significações de um símbolo se encadeiam, são
solidárias, à maneira de um sistema; as contradições que se podem distinguir entre
as diversas versões particulares são, na maioria das vezes, aparentes: resolvem-se
desde que se considere o simbolismo no seu conjunto, como um todo (Eliade, 2016).

Qualquer nova valorização de uma Imagem arquetípica coroa e consome as


antigas: a “salvação”, revelada pela Cruz de Cristo, não anula os valores pré-cristãos
da Árvore do Mundo, símbolo por excelência da renovatio integral; pelo contrário, a
Cruz vem coroar todas as outras valências e significações. Essa nova valorização
trazida pela relação entre Árvore Cósmica e a Cruz de Cristo, resume a genialidade
do cristianismo que constantemente transfigura a História em teofania.

Podemos apresentar outro exemplo: nas tradições onde existe a figura do


xamã, ele desce aos Infernos para procurar e trazer a alma do doente que foi
arrebatada pelos demônios. Na mitologia grega, Orfeu desce também aos Infernos
para trazer sua mulher, Euridice, que morrera. Existem diversos mitos análogos que
fazem referência a tal tipo de jornada: na Polinésia, na América do Norte, na Ásia
central. Em geral, o relato é o de um herói que desce aos Infernos para recuperar a
alma de alguém amado. Os mitos polinésios e centro-asiáticos terminam em vitória;
já os mitos norte-americanos terminam com o mesmo fracasso experimentado por
Orfeu em sua busca.

Orfeu é o cantor domador de feras, o médico, o poeta e o civilizador; em resumo


ele reúne exatamente as funções que cabem ao xamã das sociedades ditas
“primitivas”. Este é mais do que curandeiro e especialista das técnicas milenares: ele
é também o amigo e senhor das feras, imita as suas vozes, transforma-se em animal;
é, além disso, cantor, poeta, civilizador. Não podemos esquecer que tais mitos se
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assemelham com a vocação de Jesus: ele desce aos Infernos para salvar aqueles
que se perderam, para restaurar a integridade do homem caído pelo pecado.

Teremos nós o direito (de considerar Orfeu como um “xamã” e de considerar a


descida de Cristo aos Infernos como descidas semelhantes dos xamãs em êxtase?
Tudo se opõe a isso: nas diversas culturas e religiões — siberiana ou norte-americana,
grega, judaico-cristã — estas descidas são valorizadas de maneiras muito diferentes.
É inútil insistir nestas diferenças que saltam à vista. Mas um elemento permanece
imutável e não deve perder-se de vista: é a persistência do motivo da descida aos
Infernos empreendida para a salvação de uma alma; a alma de um doente qualquer
(xamanismo strito sensu), da esposa (mitos gregos, norte-americanos, polinésios,
centro-asiáticos) da humanidade inteira (Cristo), pouco nos importa para já.

A descida, desta vez, não é apenas iniciática e empreendida para uma


vantagem pessoal: ela tem um fim “salvífico”: “morre-se” e “ressuscita-se” não já para
terminar uma iniciação adquirida, mas para salvar uma alma. Aqui, observa-se algo
interessante nesses relatos: a morte simbólica não serve unicamente para a própria
perfeição espiritual (ou seja, em definitivo a conquista da imortalidade), mas realiza-
se para a salvação dos outros. Não pretendemos de modo algum mostrar no xamã
primitivo ou no Orfeu norte-americano ou polinésio a pré-figuração de Cristo. Nas
palavras de Eliade:

Verificamos apenas que o arquétipo da iniciação


contém também esta valência da “morte” (descida
aos Infernos) em proveito de um outro. (Notemos de
passagem que a sessão xamânica, durante a qual
se verifica a “descida aos Infernos”, equivale a uma
experiência mística; o xamã está “fora de si”, a sua
alma deixou o corpo). (ELIADE, 2016).

Uma outra experiência xamânica fundamental é a da ascensão celeste: por


meio da Árvore Cósmica, plantada no "Centro do Mundo", o xamã penetra no Céu e
aí encontra o deus supremo. Todos os místicos como se sabe, utilizam o simbolismo
da ascensão para representar a elevação da própria alma humana e a união com
Deus. Nada permite identificar a ascensão celeste do xamã com as ascensões de
Buda, de Maomé ou de Cristo: o próprio conteúdo das experiências em cada desses
casos é diferente. Mas isso não impede que a noção de transcendência se exprima
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universalmente por uma imagem de elevação, e que a experiência mística, seja qual
for o berço religioso, implique sempre numa ascensão celeste.

Era comum entre os pais apostólicos a crença de que a vida mística consistisse
num regresso ao Paraíso. Uma das caraterísticas da restauração paradisíaca será
justamente o domínio dos animais, que constitui já o privilégio dos xamãs e de Orfeu.
Ora, a reintegração do Paraíso encontra-se nos místicos arcaicos e primitivos que se
tem por hábito englobar sob a designação de xamanismo. Mostramos algures que o
transe xamânico restabelece a situação de homem primordial: durante o seu transe,
o xamã recupera a existência paradisíaca dos Primeiros Humanos, que não estavam
separados de Deus.

De fato, as tradições falam-nos de um tempo mítico em que o homem


comunicava diretamente com os deuses celestes; escalando uma montanha, uma
árvore, uma liana, etc., os Primeiros Homens podiam subir realmente e sem esforço,
ao Céu. Os deuses, por sua vez, desciam regularmente à terra para se misturarem
com os Humanos. Em consequência de um acontecimento mítico qualquer
(geralmente uma falta ritual), as comunicações entre o Céu e a Terra foram cortadas
(a Árvore, a liana, foram cortadas, etc.), e o Deus retirou-se para o fundo do Céu. (Em
inúmeras tradições esta retirada do Deus celeste traduziu-se pela sua transformação
posterior em um deus otiosus, ou seja, um deus alheio à sua criação).

Mas o xamã, por meio de uma técnica de cujo segredo é detentor, consegue
restabelecer — provisoriamente e só para seu uso particular — as comunicações com
o Céu e retomar o diálogo com o Deus. Por outras palavras, consegue abolir a história
(todo o tempo que decorreu após a "queda", após a ruptura das comunicações diretas
entre Céu e Terra); volta para trás, reintegra a condição paradisíaca primordial. Esse
“regresso ao jardim” mítico opera-se no êxtase: o êxtase xamânico pode ser
considerado quer como condição, quer como consequência da recuperação da
condição paradisíaca. Em qualquer dos casos é evidente que a experiência mística
dos "primitivos" está dependente também da reintegração extática do "Paraíso".

Aqui Eliade (1979) não pretende explicar a mística judaico-cristã pelo


xamanismo, nem de identificar "elementos xamânicos" no cristianismo. Mas existe um
ponto cuja importância não pode escapar a ninguém: a experiência mística dos
"primitivos", tal como a vida mística dos cristãos, implica a recuperação da condição
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paradisíaca primordial. A tentativa do regresso ao Paraíso não é, portanto,


exclusividade do pensamento judaico-cristão, criado pela intervenção de Deus na
história; é um “bem” humano universal de incontestável antiguidade e anterior às
pressuposições sociais.

Notemos, ainda aqui, que a "intervenção de Deus na história", ou seja a


revelação divina feita no Tempo, retoma e reforça uma "situação atemporal". A
revelação que o judaico-cristianismo recebe unicamente num tempo histórico que
nunca mais se repete e que chega a fazer dela uma história de sentido único, a
humanidade arcaica conserva-a nos mitos; e todavia, tanto a experiência mística dos
"primitivos" como a vida mística dos cristãos se traduzem pelo mesmo arquétipo: a
reintegração do Paraíso original. Assim, para Eliade a História do ponto de vista
cristão, não inovou nada: a “volta ao jardim”, tanto nos primitivos como nos cristãos, é
sempre um regresso, um "salto para trás" abolindo o tempo e a história, que busca a
reintegração mística do Homem com o Paraíso e por conseguinte, com o divino.

Adiante, o simbolismo bíblico e cristão, mesmo permeado de particularidades


do pensamento judaico-cristão, permanece universal, como todo o simbolismo
coerente. Isso inclusive nos faz perguntar se parte da "acessibilidade" do cristianismo
não é devida em grande parte ao seu simbolismo; se as Imagens universais que ele
possui não facilitaram consideravelmente a difusão da sua mensagem. Essa pergunta
surge de forma perturbadora na reflexão do não-cristão: como é que uma história local
— a história do povo judeu e das primeiras comunidades judaico-cristãs — pode
pretender tornar-se modelo de toda a manifestação divina no Tempo concreto,
histórico?

Eliade, para responder a essa pergunta, estabelece que a “história santa”, essa
que vemos narrada ao longo do cânon sagrado e que aos olhos de um observador
estranho, não cristão, parece uma mera história local, é igualmente uma história
exemplar, pois ela retoma e torna perfeitas Imagens transtemporais dos símbolos
humanos. De onde vem então essa impressão irresistível, sentida sobretudo pelos
não-cristãos, de que o cristianismo fez inovações em relação à religiosidade anterior?
Para um Hindu simpatizante do cristianismo, a inovação mais espantosa
(desconsideremos aqui o poder salvífico da Mensagem do Evangelho), consiste na
valorização do Tempo, e finalmente na salvação do Tempo e da História9. No
cristianismo e diferente das demais simbologias da Humanidade não existe
17

reversibilidade do Tempo cíclico; o Tempo na fé cristã é irreversível, o sacrífico de


Cristo é único e não há a partir desse momento qualquer possibilidade de novas
revelações ou mudanças no plano da Salvação: foi uma só vez que Cristo viveu, foi
crucificado e ressuscitou e agora cabe à Humanidade aguardar sua volta Redentora
(Eliade, 1979).

A partir desse ponto, o tempo se transforma em uma eternidade; o Tempo


torna-se um valor na medida em que Deus se manifesta através dele, confere-lhe um
significado trans-histórico e uma intenção soteriológica: pois, em cada nova
intervenção de Deus na história, não se tratava sempre do problema da salvação do
homem, isto é, de qualquer coisa que não tem nada a ver com a história? O Tempo
torna-se plenitude pelo próprio fato da encarnação do Verbo divino; mas este mesmo
fato transfigura a história. Como poderia ser vão e vazio o Tempo que viu Jesus
nascer, sofrer, morrer e ressuscitar? Como poderia ela ser reversível e susceptível a
se repetir infinitamente?

Do ponto de vista da história das religiões, a tradição judaico-cristã nos


apresenta a revelação (hierofania) suprema, transformando o acontecimento histórico
em hierofania. Mas o cristianismo por sua vez vai além da revelação suprema no
Tempo; o Tempo sagrado é familiar a todas as religiões, mas no cristianismo um único
acontecimento histórico em si perpassa toda e qualquer historicidade: Deus não
intervém apenas na história, como era o caso do judaismo; ele encarna num ser
histórico para sofrer uma existência historicamente condicionada; aparentemente
Jesus de Nazaré não se distingue em nada dos seus contemporâneos da Palestina.

Exteriormente o divino saiu. ocultou-se da história: nada deixa entrever na


fisiologia, na psicologia ou na "cultura" de Jesus o próprio Deus Pai; Jesus come,
digere, sofre com a sede e o calor como qualquer outro judeu da Palestina. Mas, na
realidade, este "acontecimento histórico" que constitui a existência de Jesus é uma
teofania total; nela existe como que um esforço audacioso para salvar o
acontecimento histórico em si próprio, concedendo-lhe o máximo de ser.

Apesar do valor dado ao Tempo e à História, a tradição judaico-cristã não


desemboca no historicismo, mas numa teologia da História. Não é por si próprio que
o acontecimento é valorizado; é unicamente por causa da revelação que ele comporta,
18

revelação que o precede, anunciada desde muito antes pelos profetas e que ainda o
transcende, muito depois dos apóstolos.

Contudo, é possível dizer que o cristianismo se esforça por salvar a história;


em primeiro lugar porque reconhece o valor do tempo histórico, em seguida porque,
para o cristão, o acontecimento histórico, permanecendo tal como é, torna-se capaz
de transmitir uma mensagem que ultrapassa a história e o tempo cronos, revela-se no
tempo kairós. Pois, após a reencarnação de Cristo, supõe-se que o cristão vá procurar
as intervenções de Deus não só no Cosmos (chamando em seu auxílio as hierofanias
cósmicas, Imagens e símbolos), mas igualmente nos acontecimentos históricos. Esse
processo nem sempre é fácil; decifram-se sem demasiada dificuldade os "sinais" da
presença divina no Cosmos, mas "sinais" semelhantes estão também camuflados na
História.

Por conseguinte, para o cristão, a vida histórica em si própria pode tornar-se


gloriosa: testemunha, a vida de Cristo e dos Santos. Com o cristianismo o Cosmos e
as Imagens já não são os únicos encarregados de representar e de revelar — existe,
além disso a "pequena história", a que foi feita por acontecimentos aparentemente
destituídos de significado.

Não se deve perder de vista, no entanto, que o cristianismo interveio na história


para a abolir; a maior esperança do cristão é a segunda vinda de Cristo, que porá fim
a toda a História. De um certo ponto de vista, para cada cristão, individualmente, este
fim e a eternidade que o seguirá, o paraíso reencontrado, podem realizar-se
imediatamente. Esse tempo anunciado por Cristo é já acessível e, para aquele que o
recuperou, a história deixa de existir.

A transformação do Tempo em Eternidade começou com os primeiros crentes.


Mas esta transformação paradoxal do Tempo em eternidade não é propriedade
exclusiva do cristianismo. Encontramos simbolismo semelhante na Índia. A ksana
corresponde ao kairós: tanto um como outro pode tornar-se o "momento favorável"
pelo qual se "sai do tempo" e se chega à eternidade... Em última instância, pede-se
ao cristão que se torne contemporâneo de Cristo: o que implica uma existência
concreta, na história, e a contemporaneidade da exortação, da agonia e da
ressurreição de Cristo (Eliade, 1979).
19

2.2 Batismo: a água como símbolo

Eliade (1979) prossegue suas análises tratando sobre a água e a simbologia


por trás do batismo. Entre os grupos de símbolos solidários, o batismo é de longe o
mais vasto e complexo. As águas simbolizam a soma universal das virtualidades; elas
são a fonte, o reservatório de todas as possibilidades de existência. A imagem
exemplar de toda a criação é a Ilha que subitamente se "manifesta" no meio das
ondas. Em contrapartida, a imersão na água simboliza a regressão ao pré-formal, a
reintegração no mundo indiferenciado da preexistência. A imersão repete o gesto
cosmogónico da manifestação formal; a imersão equivale a uma dissolução das
formas. É por isso que o simbolismo das Águas implica tanto a Morte como o
Renascimento. O contato com a água comporta sempre uma regeneração: por um
lado porque a dissolução é seguida de um "novo nascimento", por outro lado porque
a imersão fertiliza e multiplica o potencial da vida.

A cosmogonia aquática traz à tona a origem da vida e por vezes o seu declínio.
(mitos do tipo "Atlântida") remetendo à "segunda morte" da alma, ou a morte iniciática
pelo batismo. Mas, tanto no plano cosmológico como no plano antropológico, a
imersão nas águas equivale, não a uma extinção definitiva, mas a uma reintegração
passageira no indistinto, seguida de uma nova criação, de uma nova vida ou de um
homem novo, conforme se trate de um momento cósmico, biológico ou soteriológico.
Do ponto de vista da estrutura, o "dilúvio" é comparável ao "batismo", e a libação
funerária às lustrações dos recém-nascidos ou aos banhos rituais primaveris que
proporcionam saúde e fertilidade.

Em qualquer conjunto religioso em que se encontrem, as águas conservam


invariavelmente a sua função: elas desintegram, anulam as formas, "lavam os
pecados", simultaneamente purificadoras e regeneradoras. O seu destino é preceder
a Criação e reabsorvê-la, incapazes que são de ultrapassar a sua própria modalidade,
ou seja, de se manifestar em formas. Tudo quanto é forma se manifesta sobre as
águas, destacando-se das águas.
20

Em contrapartida, desde que se destaca das águas, e deixa de ser virtual, toda
a “forma” cai sob a lei do Tempo e da Vida; adquire limites, participa no futuro
universal, submete-se à história, corrompe-se e acaba por se esvaziar da sua
substância, a menos que se regenere através de imersões periódicas nas águas e
que repita o "dilúvio" com o seu corolário "cosmogônico". As lustrações e as
purificações rituais com a água têm como finalidade a atualização do momento
intemporal em que se deu a criação; elas são a repetição simbólica do nascimento
dos mundos ou do "homem novo".

Recordando as linhas mestras do simbolismo aquático, podemos perceber a


nova valorização religiosa das águas, instaurada pelo cristianismo. Os Padres da
Igreja não deixaram de explorar certos valores pré-cristãos e universais do simbolismo
aquático, correndo o risco de os enriquecer de significações inéditas relacionadas com
o drama histórico de Cristo. Para Tertuliano a água foi em primeiro lugar

(...) a sede do Espírito divino que a preferia então a


todos os outros elementos... Foi à água, antes de
mais nada, que foi ordenado que produzisse
criaturas vivas... Foi a água a primeira a produzir o
que tem vida, a fim de que o nosso espanto cessasse
quando um dia ela desse à luz a vida no batismo. Na
formação do próprio homem, Deus empregou a água
para consumar a sua obra... Toda a água natural
adquire portanto, pela antiga prerrogativa com que
foi distinguida na sua origem, a virtude de
santificação no sacramento, desde que Deus seja
invocado para esse efeito. Mal se pronunciam as
palavras, o Espírito Santo, descido dos céus, paira
sobre as águas que santifica pela sua fecundidade;
as águas assim santificadas impregnam-se por seu
turno de virtude santificante... O que outrora curava
o corpo cura hoje a alma; o que dava saúde no
tempo dá a salvação na eternidade…
(TERTULIANO, De baptismo, 2014).

O "homem velho" morre por imersão na água e dá nascimento a um novo ser


regenerado. Este simbolismo é admiravelmente expresso por Crisóstomo (2010) que,
falando da multivalência simbólica do batismo, escreve: “Ele representa a morte e a
sepultura, a vida e a ressurreição... Quando mergulhamos a cabeça na água como
num sepulcro, o homem velho é mergulhado, desaparece por completo; quando
saímos da água, o homem novo aparece simultaneamente”. Como se vê, as
interpretações dadas por Tertuliano e Crisóstomo harmonizam-se perfeitamente com
21

a estrutura do simbolismo aquático. Figuram nessa valorização cristã das águas,


inúmeros elementos novos ligados a uma "história", que nesse é a dita “santa
História”.

O batismo é também valorizado como oposição do dilúvio. Cristo pode ser visto
como novo Noé, saído vitorioso das águas, tornou-se chefe de uma outra raça
(Danielou, 2010). Assim o dilúvio figura tanto a descida às profundidades marinhas
como o batismo. Segundo Irineu, ele é a imagem da salvação por Cristo e do
julgamento dos pecadores:

O dilúvio era portanto uma imagem que o baptismo


acaba de realizar... Tal como Noé enfrentou o mar
da morte, no qual a humanidade pecadora tinha sido
afogada, e dele tinha emergido, também o novo
batizado desce à piscina baptismal para enfrentar o
dragão do mar num combate supremo e daí sair
vencedor... (IRINEU. Patrística, 2021).

Por outras vezes, Cristo também é colocado em paralelo com Adão. O paralelo
Adão / Cristo ocupa já um lugar considerável na teologia do apóstolo Paulo. Há
também sobre isso as reflexões de Tertuliano, que afirma que pelo batismo, “o homem
recupera a semelhança com Deus" (2014). Para Cirilo, "o batismo não é apenas
purificação dos pecados e graça da adoção, mas também antitipo da Paixão de Cristo"
(2015). A simplicidade vestial do batismo também possui um significado ritual e
metafísico simultaneamente: é o abandono da "velha indumentária de corrupção e de
pecado que o batizado despe após Cristo, aquela com que Adão foi vestido a seguir
ao pecado" (1993), mas também o regresso à inocência primitiva, à condição de Adão
antes da queda.

O simbolismo batismal não limita aí a riqueza das suas referências bíblicas e


sobretudo das suas reminiscências paradisíacas, mas estes poucos textos bastam
para o nosso objetivo. Tanto mais que aspiramos menos a um enunciado do
simbolismo batismal do que a um estado das inovações trazidas pelo cristianismo. Os
Padres da Igreja primitiva encaravam o simbolismo quase unicamente como uma
tipologia: preocupavam-se em descobrir correspondências entre os dois Testamentos.

Os autores modernos inclinam-se para este exemplo: em vez de recolocar o


simbolismo cristão no quadro do simbolismo "geral", universalmente confirmado pelas
22

religiões do mundo não cristão, eles persistem em relacioná-lo unicamente com o


Antigo Testamento. Segundo estes autores, não seria o sentido geral e imediato do
símbolo que dispararia no simbolismo cristão mas sim a sua valorização bíblica.

A atitude explica-se perfeitamente. O progresso dos estudos bíblicos e


tipológicos ao longo do último quarto de século, denota uma reação contra a tendência
para explicar o cristianismo pelos mistérios e gnoses sincretistas, uma reação
igualmente contra a confusão que apresenta em certas escolas comparatistas. A
liturgia e a simbologia cristãs ligam-se direta e imediatamente ao judaísmo. O
cristianismo é uma religião histórica, com raízes profundas noutra religião histórica: a
dos Judeus. Por conseguinte, para explicar, ou melhor, compreender certos
sacramentos ou certos simbolismos, basta procurar as suas "figuras" no Antigo
Testamento. Na perspetiva historicista do cristianismo, nada de mais natural do que
isso: a revelação teve uma história; a revelação primitiva, operada na aurora dos
tempos, sobrevive ainda entre as nações, mas está meio esquecida, mutilada,
corrompida; a única via de aproximação passa através da história de Israel: a
revelação só foi plenamente conservada nos livros santos do Antigo Testamento.
Assim podemos dizer que a tradição judaico-cristã portanto, esforça-se por não perder
contato com a história santa que, ao contrário da "história" de todas as outras nações,
é a única real e a única com um significado: pois é o próprio Deus quem a faz.

Preocupado antes de mais em ligar-se a uma história que fosse ao mesmo


tempo uma revelação, atentos para não serem confundidos com os "iniciados" das
diversas religiões com mistérios e com as múltiplas gnoses que pululavam no fim da
antiguidade, os Padres da Igreja eram obrigados a isolar-se nesta posição radical: a
recusa de todo "paganismo" era indispensável ao triunfo da mensagem de Cristo.

Podemos perguntar-nos se esta atitude radical deve se impor atualmente de


forma tão radical. Não temos a responsabilidade dos Pais apostólicos de combater as
heresias do século ou a necessidade constante de argumentar sobre a autenticidade
da fé cristã. Para alguém que não se sente responsável pela fé dos seus semelhantes,
é evidente que o simbolismo judaico-cristão do batismo não contradiz de modo
nenhum o simbolismo aquático universalmente difundido.

Tudo lá está: Noé e o dilúvio têm como par, em inúmeras tradições, o


cataclismo que culminou com o fim da humanidade, à exceção de um só homem que
23

se tornou o antepassado de uma nova humanidade: As "Águas da Morte" são uma


fórmula repetida em diversas culturas e mitologias orientais, asiáticas e oceânicas. A
água "mata" por excelência: ela dissolve, anula todas as formas. Justamente por isso
ela é rica em recriar. O simbolismo da pureza ritual equivale à integridade e à
plenitude; o "Paraíso" implica na ausência de "vestuário", ou seja a ausência da
"usura" (imagem arquetípica do Tempo). Quanto à nostalgia do Paraíso ela é
universal, se bem que as suas manifestações variem quase indefinidamente (Eliade,
2016). Toda a nudez ritual implica um modelo intemporal, uma imagem paradisíaca.
24

3. A ORIGEM DE TUDO

Como vimos, símbolos e tempo estão intimamente conectados. A ciência da


cronologia bíblica nos séculos XVII e XVIII era parte integrante da fé cristã e da
exegese bíblica. Os cronologistas bíblicos frequentemente discordavam entre si sobre
datas precisas, mas compartilhavam um objetivo comum de usar as informações das
Escrituras para criar uma cadeia cronológica ininterrupta desde a criação do mundo
até o nascimento de Cristo, ligando, ou harmonizando, Antigo e Novo Testamentos,
enraizando a vinda de Cristo na história e profecias do Antigo Testamento.

As dificuldades envolvidas em tal projeto diziam respeito principalmente ao


texto bíblico em si e à medição do tempo usada até então, não só pelos judeus, mas
por outras civilizações cuja própria cronologia foi cada vez mais assimilada pela
cronologia bíblica para formar uma história universal. A secularização que tal mudança
causou, aliada às novas evidências de fontes não textuais sobre a possível datação
da criação, gradualmente começaram a lançar dúvidas sobre a primazia da Bíblia no
campo dos estudos cronológicos.

James Ussher, Arcebispo de Armagh e primaz da Irlanda, o mais famoso dos


cronologistas bíblicos britânicos, ao publicar seu famoso “Annals of the World” pela
primeira vez em 1658, afirma em oposição a outros pensadores de destaque como
Ptolomeu (c. 90 dC – c. 168 dC), Julius Firmicus Maternus (século 4 dC), e Denis
Pétau) (1583-1632) que era possível chegar a um conhecimento preciso da cronologia
bíblica e, portanto, da história do mundo (Ussher, 2003).

Nesse esforço, Ussher calculou que o mundo tinha sido criado ao meio-dia de
domingo, em 23 de outubro de 4004 aC. Sua cronologia foi baseada, como a de tantos
outros cronologistas cristãos, na premissa de que as informações contidas nas
Escrituras possibilitariam o conhecimento do nascimento do mundo com uma precisão
que os filósofos profanos nunca poderiam aspirar. Além disso, se tal conhecimento foi
disponibilizado por Deus para o homem, era dever do homem usá-lo. A cronologia
bíblica era assim não apenas um acessório para a compreensão das verdades
contidas no Antigo e Novo Testamento, era parte integrante de tais verdades. O que
25

pode às vezes parecer apenas (como de fato às vezes era) uma tarefa para ocupar o
tempo de clérigos aposentados, foi acima de tudo uma parte essencial do estudo da
Bíblia e da compreensão do propósito de Deus.

Apesar de tantos esforços, os cronologistas discordavam sobre a data em que


Deus criou a Terra. Thomas Hearne (2012) fornece uma longa lista de diferentes
autores e as datas que eles propõem, variando de 3707 AC a 6984 AC . A data de
Ussher de 4000 AC é tida por Hearne como completamente desprovida de
probabilidade por não apresentar em seu resultado quaisquer cálculos detalhados.

Porém, mais do que a data de criação do mundo em si, importava saber o


intervalo entre a criação do mundo, e a vida de Cristo. O que distinguiu, e ainda
distingue, as leituras cristãs do Antigo Testamento a partir de leituras judaicas do
Tanakh, (a Bíblia judaica), é a forma como os cristãos veem o Antigo Testamento,
como uma antecipação, profetizando e levando ao nascimento de Cristo e, portanto,
a era cristã. A criação do mundo foi a criação do mundo em que Cristo nasceria, um
nascimento que explicaria e justificaria toda a História do Antigo Testamento. Isso
significa que a cronologia das Escrituras trabalhou simultaneamente para a frente
desde a criação e para trás desde o nascimento de Cristo.

Profecias e história desempenharam um papel fundamental na cronologia


bíblica. O título completo da obra de Ussher era “Os Anais do Mundo, da origem até
o início do reinado do imperador Vespasiano, e a total destruição do templo e abolição
da riqueza comum dos judeus”. A razão pela qual Ussher continuou sua cronologia
até a destruição do Segundo Templo em 70 DC foi que este evento foi considerado
um dos mais importantes profetizados no Antigo Testamento (Ussher, 2003).

A cronologia escrita por Ussher foi a mais famosa de uma longa lista de
cronologias escritas ao longo da História. Mas lista de grandes nomes da cronologia
dos séculos XVI a XIX incluía figuras como o holandês Joseph Scaliger, o francês
Denis Pétau (Dionysius Petavius), Isaac Vossius, outro holandês, e o francês
Calvinista Jean Le Clerc.

3.1 Por que “cronologizar”?


26

Em seu Ductor historicus (2018), Thomas Hearne lista os três fundamentos


para se alcançar certeza na cronologia: o testemunho de fontes escritas, observação
astronômica e a existência de eras ou épocas “tão constantes e evidentes na História,
que nunca passou pelos nos pensamentos de qualquer homem questioná-los”
(Hearne, 2018). Em 1730, Arthur Bedford apontou para a ligação entre o os dois
primeiros:

Aquele que considera os movimentos exatos dos


corpos celestes, e especialmente do Sol e da Lua,
pode assim ser totalmente convincente que o
ordenador deles é um Ser mais sábio e poderoso;
ou, como costumamos dizer, que existe um DEUS.
E quem deve considere, como exatamente estes
movimentos correspondem a várias passagens
notáveis nas Sagradas Escrituras, além de todas as
possibilidades de artifício humano, não pode deixar
de ser igualmente sensata, que essas Escrituras
foram comunicadas a nós por aquele DEUS, que deu
as Leis do Movimento a esses corpos celestes; e
isso desde a criação deles, ele infalivelmente previu
tudo o que deveria acontecerá no Tempo, até que a
Estrutura deste Mundo seja dissolvida. (BEDFORD.
The Evil and Danger of Stage-Plays: Shewing Their
Natural Tendency to Destroy Religion, and Introduce
a General Corruption of Manners, 2010).

A Sagrada Escritura e a natureza, ambas criações de Deus, foram obrigadas a


concordar nas informações cronológicas que forneceram: “é surpreendente ver e
observar a Harmonia que existe entre os movimentos dos céus, quando comparados
com os eventos terrestres, a partir dos tipos e Profecias bíblicas”, continua Bedford.
Observar e relacionar essa harmonia foi uma das principais tarefas dos cronologistas.

3.2 Problemas e controvérsias


27

Para que a cronologia pudesse ser aceita, era preciso que houvesse harmonia
entre o Antigo e o Novo Testamento. Era essencial que os elos da cadeia cronológica
e a periodização construída fossem bem claros. Muitas das controvérsias entre os
cronologistas pousava sobre as divergências a respeito das divisões de tempo em si,
bem como qual seria o melhor método de divisão do tempo, se as Escrituras bíblicas
ou relatos históricos profanos. Outro ponto de discórdia residia também na escolha
dos textos que se utilizava para iniciar as investigações.

Apesar da declaração pública de Ussher afirmando que ele utilizava a Bíblia


Hebraica (a mesma que foi adotada para a tradução “King James”), a Septuaginta,
supostamente traduzida da Torá para o grego por tradutores judeus sob as ordens do
rei grego Ptolomeu II do Egito, ganhou muitos leitores no início do século XVIII.
Adeptos da Septuaginta afirmavam que o texto da Bíblia Hebraica tinha sido
corrompido por tradutores judeus posteriores. William Whiston (1702, 1712), Thomas
Brett (1729) e Charles Hayes (1736, 1741), todos argumentaram em favor da
cronologia da Septuaginta, que aumentou o tempo entre a criação e o nascimento de
Abraão em pelo menos mil e quinhentos anos!

Uma razão para preferir esta escala de tempo mais longa foi porque com ela a
cronologia bíblica a se aproximava mais da cronologia egípcia registrada na lista de
dinastias egípcias de Manetho. Mas aproximar as unidades de tempo usadas por
judeus e cronologistas “profanos” se mostrava sempre um trabalho extremamente
complexos. Todas as tentativas de definir, em meses e anos a cronologia exata dos
eventos bíblicos, precisava levar em consideração que calendários seriam usados no
projeto, se utilizariam, por exemplo, o calendário solar ou o lunar.

Na Grã Bretanha, por exemplo, o calendário usado como base para o trabalho
dos cronologistas era o Juliano, que só foi abandonado em 1752, quando da adesão
do calendário gregoriano. Haviam também outras questões como por exemplo, o
cálculo necessário para equalizar as diferenças entre o calendário lunar e o calendário
solar. Mesmo com todos os cuidados para incrementar a confiabilidade dos estudos
cronológicos, uma diferença de 23 anos entre os vários estudos da época, emtre os
vários cronologistas.

Essas questões foram abordadas em detalhes por Isaac Newton em seu “The
Chronology of ancient kingdoms” (cronologia dos reinos antigos), de 1728, mas que
28

havia sido escrito muitos anos antes. Newton começa por diminuindo a relevância dos
cálculos gregos, latinos e egípcios de Tempo. Os gregos usaram gerações e as
olimpíadas (mesmo quando eles professaram usar anos) para contar o tempo; a
cronologia romana é complicada pela obscuridade da data da fundação de Roma e os
egípcios exageravam constantemente a antiguidade e a duração de suas dinastias.
“Elaborei a seguinte Tabela Cronológica,” ele explica, “de modo a adequar a
Cronologia ao Curso da Natureza, com Astronomia, com História Sagrada, com
Heródoto, o Pai da História…” (Newton, 2007). Ele admite, no entanto, que seria
possível existir uma margem de erro de vinte anos ou mais. Seu trabalho está dividido
em duas partes. A primeira é uma breve cronologia começando com a saída dos
Hebreus do Egito (por volta de 1125 aC) e terminando em 331 com a morte de Dario,
o último rei da Pérsia. Na segunda parte, a cronologia dos reinos antigos corrigida,
Newton continua a explorar as deficiências e inconsistências de cronologias profanas.
Ele dedica atenção especial ao uso dos meses lunares pelos egípcios e gregos
demonstrando o quanto isso faz com que seja difícil chegar a uma medição de tempo
em anos solares, impedindo que as observações astronômicas dos antigos sejam
verificadas (Newton, 2007).

Algo que é profundamente desconcertantemente para seus leitores modernos


e admiradores, é o uso que Newton faz das observações astronômicas transmitidas a
Jasão durante a viagem dos Argonautas para tentar estabelecer uma cronologia mais
confiável do que aquelas já registradas por cronologistas antigos e consagrados. Ele,
portanto, constrói uma cronologia a partir de um relato literário mítico que vê como o
único relato textual válido, associando-o a observações astronômicas para datar a
viagem dos Argonautas em trinta anos após a morte de Salomão (morto em 931 aC),
enquanto os cronologistas gregos datam esse evento como ocorrido quase 300 anos
antes. Newton, portanto, deu igual crédito ao mito grego, astronomia e cronologia
bíblica, desacreditando as cronologias dos antigos reinos.
29

4. DA CRONOLOGIA BÍBLICA PARA A HISTÓRIA


UNIVERSAL

O trabalho de Newton atraiu críticas consideráveis de cronologistas que, ao


contrário dele, se preocupavam em conciliar o bíblico com cronologias profanas. Esta
tinha sido a prática cronológica padrão do século XVI e deu origem à prática de traçar
tabelas cronológicas da história universal que incluíam eventos históricos de
cunhagem bíblica e eventos históricos profanos. A cronologia bíblica sempre foi
apresentada de forma superior, de modo que consideráveis distorções foram
necessárias para fazer as cronologias egípcia, caldeia, grega e romana se encaixarem
na cronologia bíblica. O resultado foram tabelas cronológicas que começaram com a
datação da criação do mundo e da descendência de Adão até o Dilúvio, mas que
gradualmente introduziram eventos históricos profanos à medida que humanidade se
multiplicou.

Na cronologia detalhada contida em “Uma visão abrangente, ou cosmográfica


e geográfica”, de Thomas Porter, publicada pela primeira vez em 1659, a queda de
Troia, o reinado de Enéias e a fundação de Londres fazem sua aparição pouco antes
do nascimento de Samuel (Porter, 1998), enquanto James Anderson e sua “Royal
Genealogies” de 1732 esforçaram-se para conectar a genealogia bíblica à história das
civilizações vizinhas e subsequentes (2012). Os autores desse momento histórico
elaboravam representações tipográficas sofisticadas e cada vez menores para
permitir ao leitor abraçar visualmente a correspondência entre as diferentes
cronologias que surgiam. Infelizmente é comum que se pense que a possibilidade de
tal a representação visual às vezes constitua uma prova adicional de sua exatidão.

O exemplo mais espetacular dessa tentativa de trazer uma cronologia inteira


para o escopo de um quadro abrangente é a folha única intitulada “A plenitude dos
tempos dos judeus e gentios” publicada em 1680, onde o autor (desconhecido)
estabelece uma correspondência entre a cronologia bíblica, as dimensões da Arca de
Noé, o tabernáculo e o templo de Salomão, as profecias do Antigo Testamento de
Ezequiel e Daniel, e as profecias do Novo Testamento.
30

Compreender a história do mundo em um trabalho único, em uma única tabela


ou mesmo em uma única página, torna-se um metonímia tanto para o comando divino
ao longo do tempo quanto para a tentativa do homem de compreender e pesquisar
sua própria história (Hopes, 2014).

4.1 O papel da profecia no desenrolar cronológico da


História

As cronologias bíblicas funcionaram tanto para trás quanto para frente. A tabela
elaborada por Thomas Allen (Hopes, 2014) dá o tempo decorrido desde a Criação do
mundo e o tempo que antecede a vida humana de Cristo. Para a cronologia bíblica
inicial, as idades dos patriarcas forneceram muitas informações, mas após o Dilúvio,
a datação dos reinados dos reis de Judá e de Israel se tornou um desafio
extremamente difícil de estabelecer. A Escritura, no entanto, foi vista como sendo a
chave para superar essas dificuldades graças às profecias que versavam a respeito
da vida e morte de Cristo, assim como também sobre os eventos posteriores.

Nesse contexto, o texto mais importante foi a profecia transmitida a Daniel pelo
anjo Gabriel a respeito das setenta semanas (sempre interpretado como setenta anos)
que ocorreriam antes da reconstrução de Jerusalém e a vinda do Messias. Como
alexandre Cooper explicou em “Um ensaio sobre a cronologia do mundo” de 1722,
esses 490 anos tratam de um período de tempo que termina com o nascimento de
Cristo e que as cronologias profanas, deixam sem explicação (Hopes, 2014).

Curiosamente, no entanto, nenhum outro cronologista defendeu tal leitura


literal da profecia de Daniel como se ela tratasse da vinda do Messias. Joseph Mede
(1643), Sir John Marsham (1649) e, em século XVIII, o deísta Anthony Collins (1724)
todos argumentaram que a profecia, como o Livro de Daniel, datava da época de
Antíoco Epifânio, portanto, entre 175 e 165 aC, muito mais tarde do que os 490 anos
anteriores ao nascimento de Cristo, postulados por aqueles que colocaram a profecia
durante o reinado de Dario, o Grande.
31

Hopes (2014) citando Collins, afirma que a profecia de Daniel dizia respeito à
vinda de Cristo, embora a tratasse de um modo alegórico e não num sentido literal.
Benjamin Marshall em 1712, foi um dos muitos que responderam a este aspecto do
Discurso de Collins com uma obra intitulada “Os fundamentos e razões da religião
cristã” em 1724, defendendo a leitura literal da profecia. Um tratado anônimo de 1744,
inteiramente dedicado à profecia, contestou sua aplicação ao nascimento de Cristo.

Em uma leitura que lembra a exegese judaica do texto bíblico, o autor


argumenta que a profecia não se aplica ao nascimento de Cristo, mas literalmente à
reconstrução da cidade de Jerusalém. A palavra “messias” indica “o nomeado”, uma
palavra usada para descrever um rei ou um sumo sacerdote. O ponto final das setenta
“Semanas” é, portanto, a retomada da Babilônia por Ciro e a libertação da nação
judaica em 141 aC. “O nomeado” é, portanto, Ciro ele mesmo e as profecias de
destruição de Daniel, inundações e deflagração referem-se às perseguições
posteriores perpetuadas por Epifânio (Hopes, 2014).

4.2 Rachaduras no edifício

Além dos debates habituais entre cronologistas, tais trabalhos, como os


argumentos dos deístas em favor de uma leitura alegórica das Escrituras, sinalizam
uma crescente pluralidade de interpretações da cronologia bíblica, levantando assim
a questão da confiabilidade dos textos bíblicos. A Bíblia foi cada vez mais vista como
uma entre uma série de fontes que poderiam ser usadas na escrita da história
universal. Como contas egípcias ou gregas, também foi considerada pelos deístas
como frequentemente obscura e aberta à interpretação.

Enquanto o quadro geral da narrativa da criação do mundo e a cronologia da


humanidade permaneceu intacta, os detalhes dessa narrativa estavam cada vez mais
abertas à discussão. As razões para tal mudança foram encontradas em parte nos
ataques de Spinoza e seus seguidores à credibilidade da Bíblia, ataques que
alimentaram o ceticismo e o deísmo do início do século XVIII na Inglaterra. Em outro
32

lugar na Europa, escritores como os materialistas franceses estavam cada vez mais
questionando o relato bíblico da Criação. No entanto, também foi a expansão da
própria erudição bíblica que mudou o foco da interpretação literal das Escrituras, cuja
cronologia foi um caso a parte.

Em qualquer caso, como Kevin Killeen comenta em seu estudo sobre Thomas
Browne, as obscuridades históricas das Escrituras não apenas colocaram um desafio
para os cronologistas, eles os forçaram a especular, pois, por mais que procurassem
também manter a primazia da verdade bíblica: "a historiografia comparada caminhou
por uma linha tênue entre aceitável e presunçosa dúvida (Killeen, 101).

Em última análise, no entanto, foi a evidência histórica de fontes não


contextuais que mais contribuíram para minar toda a narrativa bíblica. O estudo de
vestígios arquitetônicos e sobretudo geológicos, a descoberta de itens como restos
fósseis ou o estudo de sedimentação em sítios antropológicos, aumentaram a
possibilidade de uma escala de tempo completamente nova, remexendo na ordem
geral da história, reposicionando civilizações inteiras em diferentes era já que não
parecia mais necessário encaixá-las numa história ocorrida entre um ato de criação
declarado escrituristicamente e o nascimento de uma figura histórica, como há muito
tempo estava convencionado fazer.

O cientista chinês Schen Kuo tinha visto no século XI que as evidências


geológicas e astronômicas apontam para uma história imensamente longa do mundo.
Mais recentemente, o geólogo dinamarquês Nicolas Steno também produziu
evidências que apontavam na mesma direção, embora Steno, um dos primeiros
seguidores de Spinoza que mais tarde se tornou cristão devoto, teve o cuidado de
reivindicar, nem sempre convincentemente, que suas observações eram compatíveis
com as Escrituras (Israel 43-44). “Dissertationis prodromus” de Steno (1669) foi
traduzida para o inglês em 1671 como “O pródromo de uma dissertação em relação
aos sólidos”, estabelecendo uma base para a renderização de uma acomodação
racional tanto da moldura quanto das várias mudanças da massa da terra: como
também das várias produções no mesmo.

Embora nunca tenha sido reeditado ou referido pelos estudiosos da Bíblia, o


interesse pela história natural da Terra aumentou. Em inglês, as obras mais influentes
neste domínio foram A Teoria da Terra (1684) e um ensaio de John Woodward para
33

uma História Natural da Terra e dos Corpos Terrestres, especialmente dos Minerais
(1702). Woodward, que foi ridicularizado por sua coleção de fósseis por Gay, Pope e
Arbuthnot na peça “Three Hours after Marriage” (1717), argumentou que o Dilúvio
havia dissolvido a terra que então se ressolidificou depois que as águas baixaram,
explicando assim a existência de fósseis e seu deslocamento para longe de quaisquer
mares ou oceanos.

Steno vai mais longe, observando incisivamente que a Escritura parece ter
respostas para problemas que a natureza era incapaz de elucidar. Ele levantou a
possibilidade de que afinal, os dois podem não concordar. No final de seu trabalho,
projetado para ser a introdução de um muito maior que nunca viu a luz do dia, ele
observa laconicamente que “é evidente que em 4000 anos aconteceram muitas e
várias mutações no mundo” (Steno, 108). Estes estudos geológicos marcaram um
afastamento significativo de uma abordagem puramente logocêntrica da história
universal da qual a cronologia bíblica se tornou separado.

A extraordinária quantidade de tempo, trabalho e impressão dedicados ao


estudo da cronologia bíblica deixa o leitor de hoje suspenso entre a admiração e a
incredulidade. Entre os séculos XVI e XIX, datar o mundo cristão foi uma busca
incansável pela verdade e ardente desejo de busca de harmonia na criação de Deus.
Aqui a pretensão era que todos os cristãos, qualquer que fosse sua igreja ou
denominação, pudessem concordar. Católicos, anglicanos, puritanos, todos
participaram de um empreendimento que os uniu em um fervoroso debate intelectual.

E, no entanto, a cronologia bíblica também foi um assunto de controvérsia


intensa e muitas vezes amarga. Os textos nos quais os cronologistas trabalharam,
fossem bíblicos ou profanos, eram fundamentalmente os mesmos do século
dezesseis ao século dezenove, mas deram origem a interpretações amplamente
diferentes que revelaram não tanto dissensão doutrinária dentro da erudição cristã
quanto a dificuldade e a incerteza de todo o projeto. Apesar do postulado inicial de
que a vontade e a criação de Deus eram claras e evidentes, as lacunas e contradições
dentro da cronologia das Escrituras e entre ela e as cronologias de outras fontes
históricas eram muito óbvias.

John Milner comentou sobre essa incerteza em uma defesa da cronologia de


Ussher publicada em 1698:
34

se essa incerteza tivesse sido devidamente


considerada, o mundo não teria sido sobrecarregado
com muitos escritos tediosos e volumosos, como
Scaligers duas edições de seu De emendatione
temporum e seu Canones Isagog. & c. Também os
dois Volumes De doctrina Temporum de Petavius.
Finalmente, por falta de consideração sobre isso,
não poucos passaram grande parte de sua vida no
estudo da Cronologia, e muitos deles homens de
partes extraordinárias e grande diligência; de modo
que se o tempo e a indústria, que eles estabeleceram
sobre as sutilezas cronológicas, tivessem sido
implantados em estudos mais úteis, eles poderiam
ter sido muito úteis tanto para a época em que
viviam, quanto para as gerações futuras. (Hopes,
2014).
Nada disso impediu Milner de entrar na briga e propor sua própria cronologia
bíblica. É muito fácil colocar os cronologistas bíblicos na categoria dos “antigos”, que
logo serão banidos pela marcha da ciência e filosofia modernas. No entanto, como
Joseph M. Levine (1991) mostrou, os antigos têm muito em comum precisamente com
aquelas ciências que associamos hoje a uma modernidade emergente, em particular
uma obsessão por medidas, genealogias, exatidão matemática e representação
diagramática.

Mais do que a pré-condição ou a necessária cúmplice da história, a cronologia


constituía uma tentativa estupenda de representar e medir o tempo. A cartografia
temporal que resulta da cronologia bíblica e suas tabelas cronológicas
extraordinariamente elaboradas, demonstra uma aplicação de métodos científicos
modernos ao estudo de textos bíblicos que faz a contribuição de Newton parecer
distintamente menos estranha. Se o projeto inicial dos cronologistas foi perdendo
gradativamente sua pertinência, os métodos que usaram e o aprendizado que
desenvolveram permanecem um monumento ao conhecimento cunhado entre os
séculos XVI e XIX.
35

CONCLUSÃO

Relacionar à religião e analisar o mito, conectando e evidenciando sua


relevância para a história cristã, não é tarefa fácil ou ordinária. Nesse processo, o
estudo comparado das religiões é essencial para revelar de que maneira o elemento
universal que fundamenta a religião se manifesta, demonstrando que, por detrás da
imensa diversidade cultural que torna os mitos tão diferentes, residem sentimentos e
intuitos comuns a todos os seres humanos. Os autores apresentados nesse material
propõem apresentar de maneira concisa e não exaustiva aquilo que pretendíamos
expor sobre o mito em sua relação com a religião: uma perspectiva de conectividade
de onde se defere que mito e religião caminham lado a lado.

O erro dos homens que deslegitimam os mitos estaria em tentar entendê-los


como descrições literais de acontecimentos históricos. Não importa que os inúmeros
mitos sejam descrições diferentes sobre a origem do universo, nem que não estejam
de acordo com as descobertas da ciência moderna, o importante é que eles deixam
evidente uma necessidade existencial dos homens de buscar pelas próprias origens.

À medida que buscou o racionalismo, o Homem não só se desconectou da fé


como também degradou a relação humana com o simbólico. Infelizmente definiu-se
erroneamente que o Homem moderno caminha independentemente de qualquer
contato com o simbólico, o que acarretou em uma crise de identidade do próprio
fenômeno humano existencial (TAYLOR, 1997).

Diante desse problema, se torna necessário encontrar, nos componentes do


mundo contemporâneo, vestígios de comportamento religioso e reconhecer que o mito
não morre, mas adquire uma nova roupagem. Por ser essencial que as imagens de
um mito sejam compreensíveis para o seu povo, é natural que ele assuma diferentes
formas em diferentes épocas. Como consequência, os mitos das grandes religiões
são reatualizações de mitos de tradições anteriores e, de maneira semelhante, é
possível encarar as narrativas artísticas contemporâneas como versões atualizadas
de antigas narrativas míticas.
36

Não podemos nos esquecer, no entanto que toda substituição demanda uma
compensação. É impossível destruir uma crença sem colocar em seu lugar outras
crenças: pois é somente através do estabelecimento de certas afirmações que uma
afirmação contrária, previamente válida, pode ser abalada. Isso significa dizer que
para provar que o mundo não foi feito em seis dias, é preciso mostrar que ele surgiu
de outra forma. Para cada crença falsa e ignorante que tenta se estabelecer, é preciso
que surja um complexo de conhecimentos reais, corrigindo e reagindo sobre toda a
concepção de pensamento anterior. De fato, pode ser possível estabelecer uma
metafísica da negação que paralisa todas as convicções; mas esse procedimento, nos
tempos modernos felizmente tem sido refutado pela sociedade empenhada em
restabelecer a crença na ação atemporal de um Deus sobre as ruínas daquilo que
antes passava por “realidade”.
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