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(O Capitulo 3 estuda 0 desenvolvimento das principais indiistrias estabelecidas no periodo anterior & Primei vando em consideracs: a fatores determinantes desse desenvolvimento, em particular sua ppossivel relagao com a expansao do setor exportador. As indtistrias estudadas no Capitulo 4, por outro lado, sao as que se desenvolve- ram notadamente no perfodo a partir da Primeira Guerra Mundial, que representam o inicio da diversificacao da producao industrial inalmente, a Conclusao apresenta uma reinterpretacao geral das, origens do desenvolvimento industrial brasileiro e resume as prin- cipais evidéncias produzidas quanto as questées até entio pouco 1; Apéndice 2 so apresentados os dados basicos para a analise empreendida no Capitulo 2 sobre a protesio a industria interna de transformacao; e, finalmente, no Apéndice 3 estio listadas as fabricas de tecidos de algodao estabelecidas no Brasil no periodo anterior a 1905, quando foi publicado o primeiro levan- tamento estatistico sistematico da industria textil algodoeira. 2 1 Origens do desenvolvimento industrial brasileiro: principais interpretagdes e questdes em aberto LL Inrropugio op agbes, por outro lado, pressupde a existéncia de uma relagao linear entre a expansio do setor exportador (principal mente café) ea industrializacio; de acordo com essa interpretacao, 0 crescimento industrial ocorria durante periodos de expansdo das exportagdes (principalmente café) e era interrompido pelas crises no setor exportador, as guerras ea Grande Depressio da década de 1930. A interpretacao baseada no ” propde que 0 cres- 23 cimento industrial deu-se como parte do processo de desenvolvimen- todo capitalismo no Brasil. De acordlo com essa escola de pensamen- to, a acumulacdo de capital industrial ocorreu juntamente com a acumulagao de capital no setor exportador (café) nos perfodos de expansio das exportagées. Nesse sentido, essa interpretacao poderia ser confundida como uma “versio dialética” da industrializagao li- derada pela expansio das exportagées. Contudo, da vilti- ma ao propor uma relagdo nao-linear (ou “contraditéria”) entre 0 setor exportador (café) e a indiistria de transformacao: ao mesmo ‘tempo que a expansio da economia cafeeira estimulavao crescimen- toindustrial, também impunha limitesa esse crescimento. Argumen- ta-se que a acumulacao de capital industrial era limitada porque 1 setor exportador, € tiltima, por sua vez, estava subordinada & acumulacio de capi- tal nos paises centrais e & respectiva divisdo internacional do traba- Iho. Além disso, afirma-se que a relacio entre o setor exportador (café) ea indiistria de transformacao era contraditéria de duas outras ma- neiras: primeiramente, diz-se que os choques adversos de crises no setor exportador e da Primeira Guerra Mundial estimularam o cres- cimento da produgao industrial com base na capacidade de produ- « ex, por exemplo,o trabalho de Roberto Simonsen, A evolu fo industrial do Brasil, publicado em 1939 e reeditado em Simonsen (1973-52; ver particularmente, p. 20 e 25-6) 25 [ ea Segunda Guerra Mundial.’ Entretanto, a proeminéncia alcan- ada pelo argumento dos choques adversos em sua versao extre- ma decorreu da influente interpretacdo do desenvolvimento (ou subde: pal” 6 basta f, para os propésitos desta discussao, é resumida a seguir somente em seus aspectos econémicos funda- mentais, Abase da doutrina econdmica da Cepal reside no padrio de rela- ‘g6es de comércio exterior entre os paises do centro (industrializa- dos) e os pafses da periferia (América Latina). Esse padréo, segundo ‘© argumento, criou uma divisao internacional do trabalho que im- pés aos pafses da periferia a especializagao na producto de produ- tos primdrios para exportagao para os paises do centro, 08 quais, por sua vez, supriam de produtos manufaturados os pafses da peri feria. Nessa divisio internacional do trabalho, o padrao de cres. mento dos paises periféricos era “voltado para fora", isto é, 0 setor exportador era predominante no processo de crescimento da renda interna, com a procura extema funcionando como 0 “motor do cres- cimento”. Nos termos da economia politica da Cepal, o “centro de decisio” da economia dos paises periféricos ficava fora desses pi ses, caracterizando-os como economias “reflexas e dependentes”. A ‘especializacio na producao e exportacZo de produtos primarios era incapaz de estimular o desenvolvimento industrial. Porém, danga para um novo padrao de crescimento, “voltado para de: somente seria possivel por meio da industrializacio. Essa m ga, de acordo com a doutrina da Cepal, ocorreu & medida que as dos paises periféricos se ajustaram aos sucessivos dese- a externos causados pelos choques adversos da Primeira Guerra Mundial, da Grande Depressao da década de 1930 e da Se- gunda Guerra Mundial. No novo modelo de crescimento — volta- do para dentro —, a varidvel endégena investimento industrial substitui a varidvel exégena procura externa como principal fonte de dinamismo e crescimento. Com essa mudan¢a, 0 centro de deci- so da economia dos paises periféricos foi transferido para dentro Juma resenha. Ascriticas deDean, trabalho, 1 Prebisch (1949). w ce esses paises. Assim, a industrializacio traria mudangas ndo apenas econdmicas, mas também politicas e sociais.’ Subseqientemente, argumentou-se que a industrializagao substitutiva de importagoes no efetuou mudancas substanciais, dando ocasiao, assim, & emer- gencia da teoria da dependéncia para explicar 0 desenvolvimento (ou subdesenvolvimento) latino-americano® Essa versdo extrema do argumento dos choques adversos certa- mente pode ser, e tem sido, criticada como uma teoria geral p: explicar o desenvolvimento industrial na América Latina, pri palmente no Brasil” Nao apenas houve crescimento industrial du- rante ciclos de expansio das exportacdes no perfodo de crescimento voltado para fora, como também os efeitos dos choques adversos sobre a produ¢ao ¢ 0 investimento industrial no foram tao diretos quanto subentendido nesta versio extrema do argumento dos ques adversos. Na verdade, h4 muita controvérsia entre as vai escolas de pensamento sobre, por exemplo, os choques da Primeira Guerra Mundial, da crise do café e da Grande Depressio da déc ses-perfodos.sio discutidos em maior detalhe 213.3 adiante). Entretanto, deve-se deixar claro desde ja que i inerpretayaordo desenvolvimento industrial brasi- leiro por dois expoentes do pensamento cepalino (Furtado, 1963 1970, e Tavares, 1972) nao corresponde a essa versao extrema do argumento dos choques adversos. Ao contrério, a interpretagao desses autores pode ser considerada como uma versio diferente esse argument, aplicada especificamente a década de 1930— Tanto Furtado quanto Tavares fazem clara distingo entre 0 tipo > Prebi Mello (1975) ¢Versian de “Adi também Besser Pereira (1982) sobre oconceito de “nova dependéncia”,ea subsecio 123 adiante > Ver, particularmente, trabalho de Mello (1975). a sultante da expansio do setor exportador, principalmente de café. O desenvolvimento industrial que ocorreu a partir da década de 1930, or outro lado, é caracterizacio como industrializasao substitutiva Depressio e pelas politicas econémicas adotadas para combater a crise. Antes dos anos 30 havia clara interdependéncia entre a expan- sto do comércio exterior ¢ 0 desenvolvimento de atividades econé- micas internas (Furtado, 1963:267-8). O crescimento da renda propiciado pela expansio das exportagées criou mercado para pro- dutos manufaturados, ocorrendo enti crescimento industrial para fabricar bens de consumo para esse mercado. A principio, a produ- cresceu rapidamente para ocupar os mercados previa- mente satisfeitos por importagbes, dentro do processo que (1961, cap. 7) conceituou como import scoallowing (devor Ges). Subseqtientemente, o crescimento da produgao industri nou-se dependente do crescimento do mercado interno, sua ver, dependia da expansio do setor exportad posterior, o crescimento industrial também contribuiu para o cresci- mento da renda interna, ampliando assim o mercado interno. Esse crescimento industrial, no entanto, € considerado, tanto pot Furtado quanto por Tavares, como meramente uma extensio da economia da exportagdo; seu desenvolvimento era limitado porque dependia, em ailtima instancia, do desempenho da economia agricola-exportado- ra, Para sobrepujar essa dependéncia, 0 setor industrial teria de di- versificar sua estrutura a fim de criar sua propria demanda, isto é, estabeleceras indtistrias produtoras de bens intermediarios ede bens de capital. Porém, essa diversificagdo somente poderia ter ocorrido durante o perfodo de crescimento voltado para fora com apoio de ‘medidas adequadas de protecao e incentivo pelo governo, mas essas medidas nao foram adotadas.* Portanto, jue de Furtado e Tavares € essencialmente igual Furtado (1970, caps. 10€ 1) Tavares (197229-34e 59). Ver 20-7). 28 iferenca basica de que, para os dois primeiros autores, a relagao entre osetor exportador e as atividades internas é de interdependén- cia endo de antagonismo, de modo que péde ocorrer um crescimen- smia primério-exportadora/Entretanto, fava ligado ao crescimento da demanda externa por produtos primérios, o que caracterizava a ‘economia agricola-exportadora como “reflexa e dependente” (Tava- res, 197231), do setor externo da economia brasileira em 1929-1932, causada pela crise do café @ pela Grande por Furtado e Tavares como um ponto de inflexao no desenvolvi- mento industrial brasileiro. Em contraste com 0 periodo anterior, a industrializagéo posterior a crise foi induzida sobretudo pelas mu- dangas estruturais causadas pelo deci i ciente, do setor exportador (Furtadc De fato, o papel do setor exportador mudou: sua importancia relativa como principal jeterminante do crescimento da renda interna diminuiu, mas tor- nou-se estratégico para criar a capacidade de importar os bens de capital essenciais para o investimento na indiistria de transforma- festimentos puderam ‘gumentar na década dé 1930, quando a capacidade de importar de- clinou, é explicado pela reducao do coeficiente de importagdes em ‘e também pelas mudangas na composicao das importagdes como resultado da industrializacdo substitutiva de importagGes, com 1uma redusio na participasio de importagdes menos essenciais e um aumento na patticipagio das importagées de bens intermedisrios.e bens de capital destinados aos setores ligados ao mercado interno (Furtado, 1963:267-70 e ‘Tavares, 1972:32-8). Portanto, € especifica- ‘mente essa industrializacio substitutiva de importagdes que Furta- ‘especifico, ou seja, a crise do café e da Grande Depressao da década de 1930. ‘Aevidéncia produzida neste trabalho (Capitulos 2, 3 4) oferece fortes indicagées de que as andlises de Furtado e Tavares so essen- cialmente corretas, embora algumas qualificagdes possam ser fei- 29 is de construgio, como sugerido por Furtado (1970) —, mas inclufa também. producéo de insumos bens de capital leves para 0s setores agricola-exportador e de transportes tagdo. De fato, o desen- volvimento industrial ocorrido no perfodo talvez possa ser mais ade- quadamente descrito pela teoria do crescimento induzido por produtos basicos de exportacao (ver segao 1.4). Em segundo lugar, embora a énfase na crise da década de 1930 como um ponto de infle- \e20 da produgao industri- al durante o perfodo de crescimento voltado para fora jé havia avan- ado significativamente, implicando que o crescimento industrial j& havia adquirido certo grau de auto-sustentacio, ou seja, que a de- ‘manda néo dependia inteiramente do crescimento da renda relacio- nado as exportagdes (ver Capitulo 3). Portanto, embora retendo a ctise do café e da Grande Depressio da década de 1930 como um ponto de inflexio na transico para uma economia industrial, defen- de-se aqui o ponto de vista de que essa transicio comecou antes da década de 1930. Um comentario final refere-se a impropriedade de crticas a0 ar- gumento dos choques adversos com base no impacto da Primeira Guerra Mundial sobre a economia brasileira, tais como as feitas por Dean (1976, cap. VI). Fica claro, com base na discussao acima, que Dean estava de fato criticando a versio extrema do argumento dos chogues adversos, incluindo indevidamente a andlise de Furtado rnessas criticas, 1.2.2 A OTICA DA INDUSTRIALIZAGAO LIDERADA PELA EXPANSAO DAS EXPORTACOES A interpretacdo do desenvolvimento industrial brasileiro ante- ior a década de 1930 por Furtado e Tavares poderia, em prin. ser considerada como idéntica a interpretacao desse desenvolvimen- to como uma industrializacio liderada pela expansio das exporta- 30 ‘Bes. No entanto, atltima interpretagao difere da de Furtado e Tava- res ao estabelecer uma relacao direta entre o desempenho do setor exportador e o desenvolvimento industrial (significando que a in- diistria se desenvolveu durante perfodos de bom desempenho das. exportagies e se retraiu durante perfodos de crise no setor exporta- dor) e ao caracterizar esse desenvolvimento industrial como um processo abrangente de industrializacdo, e néo limitado a producao de bens de consumo como extensio do setor exportador. Quatro contribuigées prineipais a essa escola de pensamento po- dem ser mencionadas: as de Dean (1976), Nicol (1974), Peléez (1972) e Leff (1982), embora apenas as duas primeiras sejam realmente re- levantes. O trabalho de Peléez. pode ser considerado como uma in- terpretacdo de industrializagao liderada pelas exportagdes apenas no sentido em que critica 0 argumento dos choques adversos. No entanto, ele concentra-se na década de 1930 apenas, e especifica- mente na interpretacao de Furtado sobre o impacto da crise do café e da Grande Depressio sobre a economia brasileira e nas p ‘econémicas adotadas para combater a crise. O objetivo de Peldez do argumento dos choques atingi discutido acima, a década de 1930 cot pode ser satisfatoriamente analisado nos termos do argumento dos choques adversos (ver subsecio 1.33, pata discussao da para anilise detalhada da discussio originada pela contri Peléez). Sobretudo, Peléez nao oferece explicitamente uma i pretacio alternativa do desenvolvimento industrial brasileiro, con- sistente com sua critica ao argumento dos choques adversos, Ao contrario, argumentando com base em taxas relativas de retorno entre investimentos no setor exportador e nas atividad: Peldez conclui que os programas de valorizagao do café distorce- ram essas taxas relativas de retorno em favor do setor exportador, atrasando assim 0 desenvolvimento industrial brasileiro. ‘A contribuigio de Leff (1982) também é contradit6ria, pois ele afirma claramente que a expansdo das exportagées e 0 desenvolvi- mento industrial no Brasil apoiavam-se mutuamente, ¢ que “o de- senvolvimento industrial do Brasil ndo necessitou de «choques externos» como 0 rompimento das relagdes normais de comércio durante a Primeira Guerra Mundial” (p. 178-9 e 194). De acordo com 0 mesmo autor, a expansio do setor exportador estimulou 0 31 desenvolvimento industrial, fomnecendo os meios para importagdo de insumos industriais complementares e os recursos para o desen- volvimento da infra-estrutura (notadamente ferrovias) e promoven- do o crescimento da renda interna, criando assim mercado interno ara produtos manufaturados. Os choques extemos nao foram fa- {ores determinantes, porque a imposi¢do de tarifas aduaneiras so- bre as importagées alterou “a relacao interna de precos relativos em favor da indiistria sem um colapso nas condigées de comércio inter- nacional” (p. 195). Entretanto, Leff continua sua andlise fazendo as seguintes argumentagées: que o Brasil nao dependia das condicées ‘econdmicas externas (p. 203-04); que o setor exportador nao tinha Brande participacio na procura e oferta agregadas da economia bra- sileira (p. 195-6); que a Primeira Guerra Mundial estimulou a ex- Pansio da indtistria de transformacdo brasileira (p. 206); e que o menor impacto da Grande Depressdo da década de 1930 sobre a economia brasileira e sua rapida recuperac&o resultaram da adocio de politicas monetéria e fiscal expansionistas (p. 206), 0 que, em ‘esséncia, corresponde exatamente & anélise de Furtado para a déca- da de 1930, embora Leff nem sequer mencione a politica de defesa do café. Ele se contradiz ainda mais ao afirmar que “a experiéncia do Brasil durante a guerra [Primeira Guerra Mundial] demonstrou que, muito antes da década de 1930, o desenvolvimento econdmico do pais poderia ser mantido apesar de uma forte contragdo no setor externo” (p. 207). Portanto, a anélise de Leff sobre 0 desenvolvi- ‘mento industrial brasileiro é bastante inconsistente, podendo ser deixada de lado na presente discussio, Dean (1976) e Nicol (1974), por outro lado, oferecem contribui- es consistentes e substanciais, pois estabelecem uma relagio dire- {a entre a expanso das exportacies de café e 0 desenvolvimento industrial no estado de Sao Paulo. Afirmam que, em anos de bom desempenho das exportagies, o desenvolvimento industrial avan- ‘sou e que, em anos de fraco desempenho das exportacdes, o desen- volvimento industrial atrasou-se. Ambos concluem que a Primeira Mundial interrompeu um processo de desenvolvimento in- dustrial que estava em andamento antes da guerra (ver subseco 1.32, sobre a controvérsia a respeito da Primeira Guerra Mundial e * A tese de Nicol foi trazida ao meu conhecimento por Luiz + Carlos Breser Pereira, pelo que the agradeco. 32 © desenvolvimento industrial). Entretanto, eles tém pontos de vista diferentes quanto a década de 1930, Para Nicol, arelacao direta entre © desempenho do setor exportador (café) e o desenvolvimento in- dustrial é valida para o periodo anterior a década de 1930; esta ultima, embora nao estudada pelo autor, ¢ vista como um periodo de industrializacao substitutiva de importagées. O enfoque de Dean, por outro lado, & mais radical. Ele estende a relagao direta entre café € desenvolvimento industrial a década de 1930. Consistente com seu ponto de vista, Dean afirma que a crise do café e a Grande De- pressiio “quase paralisaram as indkistrias de So Paulo” em 1930 (p. 194) e critica a idéia de que a crise mundial favoreceu o crescimento industrial durante a década de 1930 (p. 1 ‘A forma como 0 setor exportador (café) estimulou o desenvolvi- mento industrial é similar, ¢ claro, nas andlises de Dean e Nic comeércio do café langou as bases para o desenvolvimento indus or varias razSes: em primeiro lugar, ao promover a monetizacio da economia ¢ 0 crescimento da renda interna, 0 café criow um mer- cado para produtos manufaturados; em segundo, ao promover 0 desenvolvimento de estradas de ferro e o investimento em infra- estrutura, ampliow e integrou esse mercado; em terceiro, ao desen- volver 0 comércio de exportagdo e importagdo, contribuiu para a criagéo de um sistema de distribuigao de produtos manufaturados; ¢, em quarto, ao promover a imigragao, aumentou a oferta de mio- de-obra. Além disso, a exportagao de café supria os recursos em moeda estrangeira para a importagio de insumos e bens de capital para o setor industrial (Dean, 1976, cap. 1, e Nicol 1974, passim), Entretanto, Nicol enfatiza o papel do Estado nesse processo, a0 pas- so que Dean (p. 17) 0 minimiza. ; A mais significativa contribuigdo de Dean, no entanto, € 0 seu estudo das origens do capital e do empresariado industrial. Ele sa- lienta que os cafeicultores investiram em bancos, estradas de ferro, promogao de imigracao e, em menor escala, na indtistria de trans- formagao. Contudo, o papel mais importante coube aos importado- res e imigrantes (“burgueses imigrantes”, de acordo com Dean), € principalmente ao grupo social formado pela superposicao dessas duas categorias. Segundo Dean, o capital estrangeiro nao teve par- importante fonte adicional de recursos para formagao de capital Dean afirma que nao houve répida acumula- cipacao do capital estrangeiro foi importante e que o Estado também desempenhou papel importante, notadamente no desenvolvimento das estradas de ferro e da inchistria sidertirgica Essa interpretacao, especialmente a opiniao mais radical de Dean, é certamente to inaceitavel quanto a versio extrema do argumento dos choques adversos. Ao admitir a existéncia de relagdo linear en- tre o desempenho do setor exportador e o desenvolvimento indus- Dean ignora as mudangas estruturais fundamentais causadas pela crise do café e da Grande Depressio da década de 1930, 20 como mencionado, aplica a interpretacio da in- liderada pelas exportagdes apenas ao periodo ante- rior década de 1930, Porém, ambos deixam de notar as mudangas qualitativas estimuladas pela Primeira Guerra Mundi cutido adiante (subseco 1.3.2). Em favor de Dean ¢ café eo desenvolviment interpretacdo baseada n (ou 0 “capitalismo ta qual visualiza o desenvolvimento in- dustrial como parte do processo de acumulacdo de capital no setor cafeeiro, e os cafeicultores e os importadores-imigrantes como os agentes sociais desse proceso, como discutido a seguir. 123. OrICA DO “CAPITALISMO TARDIO” Uma grande contribuicgo para 0 estudo do desenvolvimento in- dustrial brasileiro 6 a prestada pela interpretacao desse desenvolvi- mento no tocante & evolucao do capitalismo no Brasil. A andlise baseia-se na expansdo da economia exportadora de café, principal- mente do estado de Sao Paulo. As contribuigées sao as de Silva (1976), Mello (1975), Tavares (1974), Cano (1977) ¢ Aureliano (1981). A discussao que segue enfatiza 0 contraste entre esta interpretagio e: 1) a tradicional doutrina da Cepal; ¢ 2) a inter- 34 ppretacao da industrializacao liderada pela expansao das exportacoes, bem como o processo pelo qual ocorria a acumulagao de capital in- dustrial e as caracteristicas do desenvolvimento industrial alcanga~ do. A interpretacao do desenvolvimento industrial brasileiro segun- do a ética do capitalismo tardio é essencialmente uma revisao da doutrina cepalina tradicional. Embora reconhecendo a importancia desta doutrina para o entendimento da peculiaridade do desenvol- vimento econémico latino-americano, e mesmo aceitando o postu- lado de que o desenvolvimento industrial la especifico (isto é, de uma economia periférica), mo tardio refuta o caréter reflexo atribuido as economias latino- americanas pela doutrina da Cepal. Incorporando o conceito de dependéncia" formulado por Cardoso & Faletto (1979), a ética do smo tardio sugere que o desenvolvimento latino-americano -ularmente 0 brasileiro) ¢ um desenvolvimento capitalista, determinado primeiramente por fatores internos e secundariamen- te por fatores externos. Assim, salientando que a transi¢ao do traba~ Iho escravo para o trabalho assalariado na economia primério- exportadora marca a emergéncia de um novo modo de producao— capitalista —, a dtica do capitatismo tardio substitui a tradicional dicotomia fatores externos versus fatores internos como motores do crescimento, por uma interpretacao que visualiza o crescimento industrial como primordialmente um resultado do processo de acumulagéo de capital no setor agricola exportador, o qual, por sua ver, depende da procura externa. Da mesma forma, a tradicional periodizacao cepalina, que prope um perfodo de crescimento vol- tado para fora até 1929 e a transigao a partir dos anos 30 para um crescimento voltado para dentro em conseqiiéncia da crise no se- tor exportador, ¢ substitufda por uma periodizacao que enfatiza a transigao da economia colonial para a mercantil nacional baseada no ios que interessam & presente discussao. Uma resenha detalhada dessa interpretacio no podera,é claro, ser feta de modo ade- ‘quado dentro dor limites deste trabalho. " Particularmente a visio de Cardoso & Faletto com relagdo 420 desenvolvimento econdmico laino-americano como sendo o desenvolvimento

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