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A RELAÇÃO AMOROSA QUE HÁ NA SANTISSIMA

TRINDADE PODE NOS AJUDAR NOS NOSSOS


RELACIONAMENTOS?

POR: JAZIEL C. CUNHA


DEDICATÓRIA

AO MEU DEUS

PARA MINHA MÃE

PARA MINHA ESPOSA


SUMÁRIO

SERÁ QUE NA RELAÇÃO INTRATRINITÁRIA TERÍAMOS


EXEMPLOS PARA UMA BOA CONVIVÊNCIA ENTRE OS HOMENS?

HA RELAÇÃO ENTRE A PERICORESE E A CRIAÇÃO?

O CARÁTER LIBERTÁRIO DO SENHOR

HÁ RELAÇÃO ENTRE PERICORESE E POLÍTICA?

CONCLUSÃO
SERÁ QUE NA RELAÇÃO INTRATRINITÁRIA TERÍAMOS
EXEMPLOS PARA UMA BOA CONVIVÊNCIA ENTRE OS HOMENS?

Como devo pensar política? Como devo pensar a relação em


família? E quanto ao meu trabalho? A preocupação da filosofia política
consiste nisto: como nossa sociedade é organizada? Ela tem funcionado?
Qual o critério para avaliarmos se funciona bem ou não? A liberdade
individual é algo inegociável em uma sociedade, no entanto, creio que esta
liberdade para ser vivida de forma responsável deve está subordinada a
mecanismos que delimitem o uso devido desta liberdade, para que não
ponha barreiras na liberdade dos outros. Todavia, é óbvio que quando falo
de liberdade parto do pressuposto que esta liberdade tem que vir de algum
lugar, ou seja, o conceito de liberdade que advogo é uma liberdade que
esteja submissa à Lei de Deus. E por ser assim, o objetivo deste trabalho é
ver se na relação que há entre as Pessoas da Santíssima Trindade, teríamos
algo que pudesse ser luz para nossa relação em sociedade, família e igreja.
Penso que se faz necessário passarmos aos conceitos.
Há um conceito interessantíssimo que precisa ser esclarecido:
pericóresis. O doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade
Gregoriana de Roma, Luiz Carlos Susin, diz que:
O teólogo grego João Damasceno, em seu escrito sobre
a Verdadeira Fé, teria tomado a palavra pericóresis, que
se pode atualizar por pericorese, de uma dança própria
das crianças em momento de brincadeiras. A palavra
grega se compõe de três radicais: Peri quer dizer “ao
redor”, como periferia ou perímetro. A palavra: coram,
de onde provém o meio de pericorese, significa “estar de
frente” ou “em face de” como o coro de cantores que
fica de frente para a plateia. E, finalmente, a ultima
parte- esis- significa “decorrência. Algo que jorra de
uma fonte.1

O termo pericorese, embora pareça sem sentido para nós, tem


dentro da Teologia Trinitária um significado de extrema relevância, ele
expressa a relação mútua das pessoas da Bendita Trindade. A ideia de
pericorese, como já foi citada vem de uma brincadeira de roda, e nesta
brincadeira, uma criança se posicionava no centro e as outras dançavam ao
seu redor, só que, aquela que estava no meio, não era excluída da
brincadeira, pelo contrário interagia com as outras crianças, então por
escolha ou verso recitado, a que estava no centro trocava de lugar com
outra criança, e aquela que estava no centro ia para a roda.
O Dr. Heber Carlos Campos diz o seguinte:

Para ilustrar essa “dança”, O Pai Criador, o Filho-Verbo


e o Espírito Sustentador estão envolvidos igualmente na
obra da criação; todas as três pessoas, que compartilham
eternamente a essência da divindade, conquanto distintas
e possuindo alguns atributos distintivos ou mais
enfáticos, elas participam igualmente (não
quantitativamente) em todas as opera ad extra, exceto a
obra da encarnação, que pertence unicamente a Segunda
Pessoa da Trindade2.

Pericorese trata de comunhão entre as Pessoas da Santíssima


Trindade, de um movimento de amor e graça para com toda a criação. Às
vezes uma Pessoa da Santíssima Trindade, pode parecer estar em mais

1
SUSIN Luiz Carlos. Deus: Pai, Filho e Espírito Santo. São Paulo-SP Paulinas, 2003. p.
141
2
CAMPOS, Heber Carlos de. A Pessoa de Cristo as Duas Naturezas do Redentor. São
Paulo-SP Cultura Cristã, 2004, p. 311
evidência do que as Outras, mas isto não anula o fato de que cada obra tem
a participação em cada ato opera ad extra de cada Pessoa da Santíssima
Trindade.
A pericorese nos faz entender que quando Deus age, não é Uma ou
Duas Pessoas que estão agindo, mas todas as Três Subsistências da Bendita
Mônada3.
Dito isto, cabe aqui uma pergunta:

HA RELAÇÃO ENTRE A PERICORESE E A CRIAÇÃO?

É claro que sim!


Quando o Senhor Deus nos criou estabeleceu uma aliança da
criação, nesta aliança Ele deu três mandatos ao homem: Mandato
Espiritual, Cultural e Social. Os mandatos que dizem respeito à questão da
convivência humana são o cultural e social.
É interessante começarmos a nossa análise pela família, pois é a
célula mater da sociedade. Como vimos, as Três benditas Subsistências
vivem em harmonia, em cada obra feita, não há manifestação egoísta e sim
uma manifestação amorosa, de sorte, que cada obra que Um faz, os outros
participam, com isto não queremos dizer que não haja distinção formal nas
obras de cada UM, ou seja, “Trindade econômica”. Sobre isto, o Dr. Heber
Carlos Campos diz o seguinte:

3
Mônada: substância simples, ativa e indivisível. Os Pais Capadócios diziam: Na Tríade, a
Mônada é adorada, assim como a Tríade é adorada na Mônada
A palavra economia diz respeito ao modo como as
coisas são feitas pelas pessoas da Trindade. Embora as
três pessoas co-essenciais trabalhem como uma unidade,
elas possuem um modus operandi que é próprio e
exclusivo de cada uma. Todas essas obras têm a ver com
a relação que as pessoas possuem com o mundo criado,
seja na esfera da criação, providência ou redenção. O Pai
sempre age através do Filho e do Espírito. Dessa forma,
o Pai é a fonte de atividade, que opera dentro de si
mesmo e por si mesmo. O Filho é o meio pelo qual o Pai
trabalha, que opera não por si mesmo, mas faz todas as
coisas a mandado do Pai, e o Espírito é o limite de
atividade, que opera não de si próprio, mas faz o que é
do Pai e do Filho.4

O modelo para uma família viver em paz é o modelo que existe na


Trindade: Amor, comunhão, respeito. Por isso a ação pericorética que é
vista na Santíssima Trindade tem muito a nos ensinar.
Quando Deus criou o homem, o Senhor estabeleceu os mandatos, de
forma bem sucinta, teríamos as seguintes definições: O mandato espiritual
envolve um relacionamento com o Deus; o mandato social consistia em
Adão se casar com a mulher que Deus lhe tinha dado e gerar filhos para
que povoasse a terra; O mandato cultural consistia em Adão trabalhar e
desenvolver a terra. Neste mandato reside à ideia do estudo, do trabalho, do
desenvolvimento tecnológico. Ao homem foi dada a função de dominar a
terra. Porém, essa dominação deveria ser amorosa, não destrutiva, o
homem está preso ao seu meio ambiente, destruí-lo, significa destruir a si
mesmo.

4
CAMPOS, Heber Carlos de. O Ser de Deus e os seus atributos. São Paulo-SP Cultura
Cristã, 2002, p. 137
As Escrituras nos falam do pecado, com a entrada do mesmo houve
a vandalização do shalom. Ou seja, do equilíbrio que havia. O amor e a
comunhão que é característica da vida da Trindade, que era o modelo para
o homem ter com a sua mulher e a criação, por causa do pecado, se perdeu.
O pecado entrou no jardim, o cumprimento perfeito do relacionamento do
homem com sua mulher e outros seres humanos, se corrompeu, houve
desequilíbrio na natureza, houve morte. Então, verificamos que por trás de
todo desequilíbrio na sociedade reside o pecado. O mandato Cultural
visava o domínio da terra, mas este domínio seria para benefício de todos,
domínio que proporcionaria sociedade justa, riquezas para todos e não para
poucos, mas por causa da avareza, do pecado social, que fornece estrutura
para a opressão. Isto não é realidade.
Vejam a triste realidade disto no texto de Ezequiel 22. 9-12 no qual
lemos:

Homens caluniadores se acham no meio de ti, para


derramarem sangue; no meio de ti, comem carne
sacrificada nos montes e cometem perversidade. No teu
meio, descobrem a vergonha de seu pai e abusam da
mulher no prazo da sua menstruação. Um comete
abominação com a mulher do seu próximo, outro
contamina torpemente a sua nora, e outro humilha no
meio de ti a sua irmã, filha de seu pai. No meio de ti,
aceitam subornos para se derramar sangue; usura e
lucros tomaste, extorquindo-o; exploraste o teu próximo
com extorsão; mas de mim te esqueceste, diz o
SENHOR Deus.
Estas acusações que o Senhor Deus fez denunciava a vandalização
do shalom e a fonte que proporcionou tal quebra dos princípios do mandato
social e cultural. Veja bem havia:
a- Homens caluniadores
b- Que derramavam sangue
c- Comiam carne sacrificada nos montes
d- Cometem perversidade
e- Descobrem a vergonha de seu pai e abusam da mulher no prazo da
sua menstruação
f- Comete abominação com a mulher do seu próximo
g- Outro contamina torpemente a sua nora
h- Outro humilha no meio de ti a sua irmã, filha de seu pai
i- No meio de ti, aceitam subornos para se derramar sangue
j- Usura e lucros tomaste, extorquindo-o; exploraste o teu próximo
com extorsão
Vejam o parecer do Senhor a respeito de tais atitudes: de mim te
esqueceste, diz o SENHOR Deus. Estas práticas constituíam em pecado, ou
seja, quebra dos princípios que visavam uma boa convivência dos homens,
estes princípios naturalmente vindos da parte de Deus refletem àquilo que
Deus considera bom, e logicamente, Deus por ser santo não pode aprovar
uma coisa e vivenciar outra. Ou seja, aquilo que Deus determinou nos
mandatos como conduta moral para família e sociedade é justamente sua
revelação de como os seres devem se relacionar, exemplificando de forma
pratica sua pericorese para com as criaturas.
As Escrituras falam que Deus como Criador e Dono de tudo que há
odeia toda forma de injustiça, miséria e pobreza, porque isto vai de
encontro ao que Ele experimenta em sua relação pericorética.
Será que o Senhor fica inerte diante de todo o mal que acontece na
criação? Será que nosso Deus só e transcendente? Ou também é imanente?
Certamente também é imanente. O Senhor se relaciona com seu povo e
através das suas atitudes, temos compreensão daquilo que devemos fazer.

O CARÁTER LIBERTÁRIO DO SENHOR

Entre os atos pelos quais o Senhor se dá a conhecer, sua


identificação com a justiça e punição aos injustos se manifestam
claramente nas Sagradas Escrituras. Na narrativa que encontramos em
Êxodo 3. 1-22 percebemos de forma clara a manifestação de sua graça,
justiça e punição.
Eis o texto:
Apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro,
sacerdote de Midiã; e, levando o rebanho para o lado
ocidental do deserto, chegou ao monte de Deus, a
Horebe. 2 Apareceu-lhe o Anjo do SENHOR numa
chama de fogo, no meio de uma sarça; Moisés olhou, e
eis que a sarça ardia no fogo e a sarça não se consumia.
3 Então, disse consigo mesmo: Irei para lá e verei essa
grande maravilha; por que a sarça não se queima? 4
Vendo o SENHOR que ele se voltava para ver, Deus, do
meio da sarça, o chamou e disse: Moisés! Moisés! Ele
respondeu: Eis-me aqui! 5 Deus continuou: Não te
chegues para cá; tira as sandálias dos pés, porque o lugar
em que estás é terra santa. 6 Disse mais: Eu sou o Deus
de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus
de Jacó. Moisés escondeu o rosto, porque temeu olhar
para Deus. 7 Disse ainda o SENHOR: Certamente, vi a
aflição do meu povo, que está no Egito, e ouvi o seu
clamor por causa dos seus exatores. Conheço-lhe o
sofrimento; 8 por isso, desci a fim de livrá-lo da mão
dos egípcios e para fazê-lo subir daquela terra a uma
terra boa e ampla, terra que mana leite e mel; o lugar do
cananeu, do heteu, do amorreu, do ferezeu, do heveu e
do jebuseu. 9 Pois o clamor dos filhos de Israel chegou
até mim, e também vejo a opressão com que os egípcios
os estão oprimindo. 10 Vem, agora, e eu te enviarei a
Faraó, para que tires o meu povo, os filhos de Israel, do
Egito. 11 Então, disse Moisés a Deus: Quem sou eu para
ir a Faraó e tirar do Egito os filhos de Israel?12 Deus lhe
respondeu: Eu serei contigo; e este será o sinal de que eu
te enviei: depois de haveres tirado o povo do Egito,
servireis a Deus neste monte. 13 Disse Moisés a Deus:
Eis que, quando eu vier aos filhos de Israel e lhes disser:
O Deus de vossos pais me enviou a vós outros; e eles me
perguntarem: Qual é o seu nome? Que lhes direi? 14
Disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse
mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me
enviou a vós outros. 15 Disse Deus ainda mais a Moisés:
Assim dirás aos filhos de Israel: O SENHOR, o Deus de
vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o
Deus de Jacó, me enviou a vós outros; este é o meu
nome eternamente, e assim serei lembrado de geração
em geração. 16 Vai, ajunta os anciãos de Israel e dize-
lhes: O SENHOR, o Deus de vossos pais, o Deus de
Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó, me
apareceu, dizendo: Em verdade vos tenho visitado e
visto o que vos tem sido feito no Egito. 17 Portanto,
disse eu: Far-vos-ei subir da aflição do Egito para a terra
do cananeu, do heteu, do amorreu, do ferezeu, do heveu
e do jebuseu, para uma terra que mana leite e mel. 18 E
ouvirão a tua voz; e irás, com os anciãos de Israel, ao rei
do Egito e lhe dirás: O SENHOR, o Deus dos hebreus,
nos encontrou. Agora, pois, deixa-nos ir caminho de três
dias para o deserto, a fim de que sacrifiquemos ao
SENHOR, nosso Deus. 19 Eu sei, porém, que o rei do
Egito não vos deixará ir se não for obrigado por mão
forte. 20 Portanto, estenderei a mão e ferirei o Egito com
todos os meus prodígios que farei no meio dele; depois,
vos deixará ir. 21 Eu darei mercê a este povo aos olhos
dos egípcios; e, quando sairdes, não será de mãos vazias.
22 Cada mulher pedirá à sua vizinha e à sua hóspeda
jóias de prata, e jóias de ouro, e vestimentas; as quais
poreis sobre vossos filhos e sobre vossas filhas; e
despojareis os egípcios.

Deus vê a aflição do povo (versos 7,9) O Senhor diz: “Certamente


vi aflição do meu povo”, Ele ouviu o clamor de seu povo, a palavra para

clamor é ~t'Ûq'[c] ; a ideia é clamar por ajuda, por estar muito aflito, a

ideia é de trovejar, soar como trovão, por causa da opressão. Por que eles
clamavam? O texto responde: Por causa dos seus exatores, a ideia de
exatores era de alguém encarregado pelo Faraó para aplicar penalidades e
ver se o trabalho estava sendo feito. ver Êxodo 1. 11-14. Deus conhece o

sofrimento deles, o texto diz wyb'(aok.m-; ta, a ideia é de dor física e dor

psicológica. Isto hoje é muito familiar a nós, quem não sofre com alguma
coisas? O povo no Egito certamente estava experimentando dor física e sua
situação era motivo de aflição. No verso 9 diz: Que Deus via a opressão
que os egípcios estavam fazendo, Deus vê o que estar acontecendo no
mundo, vê a aflição do opresso! Deus toma um atitude e é isto que
diferencia Ele dos falsos deuses.
Deus desce e salva o seu povo (versos 8, 10-18) Deus ouviu o seu
clamor. Aqui é importante observamos uma coisa: Ao contrário dos deuses
falsos, Deus ouve, conhece a aflição do seu povo e toma uma atitude que

aqui no texto é descrito pelo verbo descer drEúawe " a ideia é descrever a
ação de Deus, é como se Ele deixasse sua morada e viesse para comunicar-
se com o homem, no caso para socorrer seu povo, que clamava. Aqui temos
uma importante lição: Deus virá socorrer seu povo, Deus ouve o clamor de
seu povo, Deus conhece o clamor de seu povo. Quando Deus vem, Ele vem
com propósito: Livrar da mão dos egípcios e tirar eles daquele lugar e levá-
los para outro.
Deus usa seus instrumentos de libertação, aqui o instrumento da
libertação foi Moisés. A Igreja é chamada para ser o agente discursivo que
denuncia o pecado e a opressão. Neste aspecto devemos ser instrumento de
libertação para o nosso semelhante e não de opressão, Quando estiver na
nossa mão que não sejamos mesquinhos e nem opressores. Moisés aqui vai
com uma função especifica: Tirar o povo do Egito.
Moisés faz uma pergunta a Deus, pergunta que se assemelha às
nossas quando o Senhor nos chama para uma obra: Quem sou eu Senhor?
Não somos nada, porém o Senhor é tudo! Somos instrumentos da ação de
Deus e é isto que o Senhor deixa bem claro tanto para Moisés quanto para
cada um de nós: “Eu serei contigo”. E como prova desta companhia, Deus
dá um sinal a Moisés de que quando saíssem do Egito, serviriam a Ele e
fariam liturgia naquele lugar.
Moisés pergunta: de quem falarei?
E é aqui que Deus se revela, Ele diz: “EU SOU O QUE SOU”. Ele
manda Moisés dizer: EU SOU me enviou a vós.
Deus fere o opressor de seu povo e honra seu povo (versos 19- 22)
Deus sabia que o faraó não iria deixar ir, até porque foi o próprio Deus que
endureceu o coração dele para este fim. Ver: Ex. 4.21; 7.3; 9.12; 10.1; 20,
27; 11.10; 14.4,8.
Veja como Deus libertou o povo e levou-o para o fim que havia dito
a Moisés. Da mesma forma como Deus libertou seu povo de um local
geográfico conhecido, O Senhor nos libertou de uma realidade espiritual
terrível. Todavia, esta libertação produzida pelo Senhor nos conduz a
verdadeira comunhão que deve ser baseada na relação pericorética que há
na Santíssima Trindade. A comunhão entre os homens, só podem existir
quando os princípios da solidariedade mútua, do querer bem ao outro,
estiverem nos corações dos homens. Jesus disse: “Tudo quanto, pois,
quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles; porque
esta é a Lei e os Profetas” (Mt 7.12), Jesus fala do padrão da boa
convivência entre os homens. Será que o Mestre iria falar de como as
pessoas deveriam viver, se isto não fosse o correto? É logico que não!
Ricardo Barbosa de Sousa traz a seguinte reflexão:

O desafio que a Trindade impõe sobre nós hoje é o do


resgate das relações pessoais e afetivas entre o homem e
Deus, bem como entre o homem e seu próximo. Temos
visto que as tendências do mundo moderno apontam
para uma direção completamente oposta, negando as
bases de uma relação trinitária, criando uma imagem e
um conceito do homem e de Deus que negam a
revelação bíblia. É neste sentido que a doutrina da
trindade hoje tem um caráter absolutamente
revolucionário 5

5
SOUSA Ricardo Barbosa de. O Caminho do Coração Ensaios sobre a Trindade e a
Espiritualidade Cristã. 2. Ed. Curitiba-PR ENCONTRO PUBLICAÇÕES 1998 p. 92
Pois é justamente na relação da Trindade que iremos achar um
modelo ideal para a nossa sociedade, um modelo que irá nos incomodar
diante de tanta injustiça. A pobreza é uma realidade que é explorada. A
igreja precisa denunciar isto como pecado. Todos aqueles que amam a
Deus e defendem a verdadeira justiça social, devem regozijar-se na
liberdade e procurar remover a causa da pobreza ou pelo menos aliviá-la
mediante a aplicação do remédio indicado pela Palavra de Deus. Que a
injustiça social é escandalosa não há dúvida.
YAHWEH se revela como Deus que escuta o sofrimento, que odeia
a injustiça, como Aquele que Liberta o povo da opressão, aquele que criou
céus e terra, que providencia alimento para toda a sua criação, que odeia a
exploração, que se revelou a seu povo lá no Egito dentro de um contexto de
opressão.

HÁ RELAÇÃO ENTRE PERICORESE E POLÍTICA?

Claro que sim! Faz-se necessário definirmos, o que vem a ser


política.

É derivação grega a palavra “política”, que em seu


sentido original significava “Politikos” que esta
relacionada à cidade, porém ao conceito de polis que é
mais abrangente do que cidade, entre os séculos 8 e 6 ac.
Surgiram na Grécia as “polis”, cidades-estado, estas
eram quase que como países atuais, Esparta e Atenas são
as mais famosas, inicialmente a palavra política fazia
referencia a tudo o que é urbano, civil, público, este
significado expandiu-se com a obra Política de
Aristóteles (384-322 ac.), onde passou a designar-se
política como a arte ou ciência do governo, durante
muito tempo passou a designar os estudos dedicados a
atividade humana que de alguma forma se relacionam ao
governo, porém em na atualidade representa as
atividades praticas relacionadas ao exercício do poder do
estado; sendo assim esta intimamente relacionada o
conceito de política ao conceito de poder, segundo
Bertrand Russerll (1872-1970), filósofo britânico
“conjunto dos meios que permite alcançar os fins
desejados”. O domínio da natureza pelo homem seria
um desses meios o outro é o domínio do homem sobre o
próprio homem, o poder político é apenas uma das
formas de poder do homem sobre o homem, existe ainda
o poder econômico, o ideológico. No poder político é
possível valer-se da força como meio para exercer a
vontade diante disto este pode ser considerado o poder
supremo, para tanto o poder político conta com o apoio
da sociedade, onde por intermédio do estado se exercita
as punições quando estas são necessárias, ainda pode se
destacar no poder político a universalidade e a
inclusividade; o poder político possui limites, porém
estes variam de acordo com o tipo de Estado, a política
tem como objetivo a ordem pública e a defesa do
território nacional e o bem social da população, este
assunto mesmo não estando explicito nas conversas
diárias é fundamental a vida de todos, pois através da
política se constrói a vida da população, não podemos
ingenuamente nos abster, cabe a população a discussão e
pressão dos governantes.6

Hoje em dia, a concepção do domínio é a que mais nos parece


comum. O homem tem inclinação para o domínio, isto em si, não é mal,
pois foi o próprio Deus que colocou isto no homem, isto faz parte do
mandato cultural, o problema é quando este domínio é opressor. Nos dias

6
O que é Política? Disponível em: http://pt.shvoong.com/social-sciences/political-
science/1636126-que-%C3%A9-pol%C3%ADtica/ Acesso em: 29 de julho de 2019
de Jesus a situação política era geradora de injustiças, exemplo disto é o
que nos é dito a respeito de Herodes.

Ele não hesita tampouco em instituir jogos quadrienais


em honra de Augusto, em Cesareia e até mesmo em
Jerusalém. Rodeia-se de eruditos formados nas letras
gregas, (...) Para satisfazer aos judeus, incrementa a
reconstrução do templo e o faz embelezar; por esta
ocasião, teve de mandar ensinar o ofício de pedreiro a
mil levitas, para evitar que simples operários
profanassem os locais reservado aos sacerdotes 7

Eis um exemplo de um governador ímpio, a política é uma benção


de Deus, é o meio ordenado para que o estado seja administrado. O
problema, poderíamos dizer, não é com o fato de termos homens
governando, mas sim, com o tipo de homens que estão no poder. Deus
poderia ter criado os homens separados, não dispostos para viver em
sociedade, mas não foi isto que Ele fez, sendo assim, a política faz parte de
seu plano para o homem, e da mesma forma como a pericorese deve
influenciar a sociedade, também deve influenciar a política, até porque o
senso de política está presente em Deus, O Senhor governa todas as coisas
e estabeleceu leis, Os céus e toda a terra lhe pertencem, sendo assim, Ele é
administrador.
Com a entrada do pecado no mundo, foram criados alguns
mecanismos para que a vida humana tivesse condição de existência, e um
desses mecanismos foi o magistrado. Kyper diz: “Pois, de fato, sem pecado
não teria havido magistrado nem ordem do estado; mas a vida política em

7
SAULNIER, Christiane. ROLLAND, Bernard. A Palestina no Tempo de Jesus 6.ed São
Paulo-SP. PAULUS 2002 p.23
sua inteireza teria se desenvolvido segundo um modelo patriarcal de vida” 8
Não haveria cadeia, nem policia, nem forças armadas, nada disso teria
sentido no mundo onde não houvesse pecado.
A Política é algo que Deus colocou no seio de sua criação, Ele criou
seres racionais para governar a criação, seres estes que são os vice-gerentes
de sua criação, sendo assim, o homem, tanto em estâncias menores como
seu lar, quantos em estâncias maiores como uma nação, é chamado para
governar, dirigir. A Confissão de Fé de Westminster no cap. XXIII Seção
II, diz:

Aos cristãos é licito aceitar e exercer o oficio de


magistrado, quando para ele são chamados; na
administração da mesmo, como devem especialmente
manter a piedade, a justiça e a paz, segundo as leis justas
de cada comunidade, eles, sob a dispensação do Novo
testamento, e para esse fim, podem licitamente fazer
guerra, havendo ocasiões justas e necessárias 9

A política é vocação, o problema é quando homens não


vocacionados querem governar a criação de Deus, da mesma forma, que é
um desastre um homem não vocacionado administrar a Igreja, também é
um desastre não vocacionados administrarem cidades. Infelizmente, esta
percepção da política como vocação não existe nas mentes da maioria das
pessoas e esta deficiência se manifesta na falta de compromisso quando se
vota. Até mesmo crentes votam sem seriedade, depois que Deus traz juízo
através de maus governantes, as pessoas ficam sem entender os motivos
disto acontecerem e reclamam.
8
KUPER Abraham. Calvinismo, São Paulo-SP Cultura Cristã, 2002 p.87
9
WESTMINSTER Confissão de Fé Ed. São Paulo-SP OS PURITANOS 1999 p. 399
Governantes que professam a fé têm como função primordial levar
nações ao reconhecimento da soberania de Deus e que elas existem com o
propósito de prestar honras e louvores a Deus. Kuper tem a seguinte
opinião:

Elas existem por Ele e são sua propriedade. E por isso


todas estas nações, e nelas a humanidade, devem existir
para sua glória e consequentemente segundo suas
ordenanças, a fim de que sua sabedoria divina possa
brilhar publicamente em seu bem-estar, quando elas
andam segundo suas ordenanças10

Tudo deve redundar em glória para Deus, a criação não existe


independente de Deus. Porém os homens anseiam por eliminar o conceito
de Deus da sociedade, outros já disseram que até que Ele já tinha
morrido.11 Por isso, o homem está perdido e nosso mundo está um caos. A
Igreja precisa mostrar ao mundo qual o modelo de política correto. “A

10
KUPER, Abraham. Calvinismo, op. cit p. 89
11
Friedrich Nietzsche, filósofo alemão do final do séc. XIX (1844-1900) foi quem
diagnosticou o niilismo como a “doença do século” e o tomou como eixo temático e
problema capital expresso na “morte de Deus”. Para responder o que é o niilismo?
Explica: “Falência de uma avaliação das coisas, que dá a impressão de que nenhuma
avaliação seja possível”. “Niilismo: falta a meta; falta a resposta ao “por quê?”; o que
significa niilismo? – que os valores supremos se desvalorizam”. Visto como um longo
processo, o niilismo alcança seu auge na morte de Deus. Que marca o momento de
constatação da perda de sentido e validade por parte dos valores superiores da cultura no
Ocidente. Representa assim, o fracasso de uma interpretação da existência que por muito
tempo auxiliou o homem a suportar a dor. Deus morreu! Deus continua morto! E nós o
matamos!! Como nos consolaremos, nós, os assassinos dos assassinos? O que o mundo
possui de mais sagrado e possante perdeu seu sangue sob a nossa faca. O que nos limpará
deste sangue?... Este evento enorme está a caminho, aproxima-se e não chegou ao ouvido
dos homens... É preciso tempo para as ações, mesmo quando foram efetuadas, serem
vistas e entendidas. Nietzsche e a morte de Deus. Disponível em:
http://www.eticaefilosofia.ufjf.br/8_1_giuliano.html Acesso em: 21 de janeiro de
2015
pericorese é a resposta.” Qualquer política pública que não leve em conta a
justiça, equidade, equilíbrio e ordem não pode prosperar. Os homens
precisam entender que em Deus é que reside a estabilidade política e a
administração voltada para a justiça.
A Igreja deve dar o norte para que a sociedade tenha um modelo
político que espelhe traços da comunhão que há entre as Pessoas da
Santíssima Trindade, pois ela é a melhor comunidade que existe. Qualquer
forma de governo que gere opressão, não honra a Deus, é uma afronta aos
céus. Através da pericorese como modelo devemos questionar nossas
posições, preferências e candidatos políticos.
Vejamos um exemplo bem simples: Posso votar ou apoiar um
candidato, ou partido, ou programa de governo, que tenha por finalidade
algum objetivo que desonre a Deus? Ou então, que provoque mais exclusão
social? Sabedor que Deus é contra a injustiça, a opressão, a violência, ao
desvio de verbas e a todas as sortes de mazelas sociais que acabam
trazendo sobre as pessoas exclusão social levando-as a serem exploradas?
Lógico que não!
Será que uma comunidade onde há jogo de interesse, desonestidade,
injustiça, soberba e domínio opressivo respeita a Deus? E se esta
comunidade for a nossa igreja? Será que ela respeita a Deus? E se for a
minha família? Será que respeita a Deus? Claro que não!

CONCLUSÃO
Deus age na história. Ao homem cabe ver e perceber a extensão
deste agir. O homem pós-moderno com seu relativismo e ceticismo não
percebe a teleologia da história e por não percebe-la entra no vácuo
existencial, cai abaixo da linha do desespero e se agarra aos pressupostos
mais absurdos possíveis. Por isso é que as Escrituras dizem que o tolo diz
em seu coração que não há Deus Salmo 14.1
Já imaginastes se o Sagrado não existisse? Se não existisse uma
lógica final que desse sentido a tudo? Já imaginastes se não houvesse uma
ideia de recompensa ou punição final? Do que adiantaria toda correria?
Todo o clamor por justiça dos parentes daquele que foram assassinados? Já
imaginastes quão sem sentido é a vida de alguém que acha que encontrou
sentido aqui? Enquanto sua vida se enquadrar no sonho encantado cor de
rosa, tipo “princesas e príncipes encantados” ele se iludirá pensando que
achou o sentido. No entanto, penso que além de ser uma aposta alta é louca
e sem sentido.
Sociedade, Pecado e Política. O que estas três coisas tem haver?
1- O homem é um ser social e por natureza agente de interação.
Ninguém vive sem interagir uns com os outros.
2- Pecado é algo que é natural em todo ser humano. Não há ninguém
que não fora contaminado pelo pecado original e consequentes
manifestações: culpa e corrupção
3- Política, “me deixa colocar desta forma” é a arte de estabelecer
cosmovisões.
Bom, o que se percebe disto?
Não há ninguém que não tenha pecado e por natureza o pecado é
algo ruim, contrário aos pressupostos divinos. O homem é um ser racional
e como tal luta todo instante para que seus pareceres sejam aceitos, suas
premissas, sua cosmovisão. Entretanto, a racionalidade do homem é
contaminada pelo pecado e desta forma é obvio que sua política
manifestará o que ele pensa. Todavia, a questão é que por sermos sociedade
organizada, sujeitos de direitos e deveres, por estamos inseridos numa
sociedade onde o pecado fora legitimado através de leis que por terem uma
origem que vai de encontro as Escrituras, jamais revelarão a boa e perfeita
vontade de Deus.
Qual é a fonte da ética? A razão? Pensemos: Quem é que pensa?
Senão o homem, quem pode duvidar? O homem. Recordo-me o filósofo
francês René Descartes: “Penso, logo existo”. Todavia, o homem é
perverso, egoísta e outras coisas a mais. Logo, toda ética que provenha
unicamente da razão humana será perversa, egoísta e outras coisas a mais.
A sociedade que existe na Santíssima Trindade e a ética que há
nesta relação é o melhor caminho para o homem.
O temor do SENHOR é o princípio do saber, mas os loucos
desprezam a sabedoria e o ensino. Provérbios 1.7

BIBLIOGRAFIA

SUSIN, Luiz Carlos. Deus: Pai, Filho e Espírito Santo. São Paulo-SP
Paulinas, 2003
CAMPOS, Heber Carlos de. A Pessoa de Cristo as Duas Naturezas do
Redentor. São Paulo-SP Cultura Cristã, 2004
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SOUSA Ricardo Barbosa de. O Caminho do Coração Ensaios sobre a
Trindade e a Espiritualidade Cristã. 2. Ed. Curitiba-PR ENCONTRO
PUBLICAÇÕES 1998
SAULNIER, Christiane. ROLLAND, Bernard. A Palestina no Tempo de
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KUPER Abraham. Calvinismo, São Paulo-SP Cultura Cristã, 2002
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SITES

http://pt.shvoong.com/social-sciences/political-science/1636126-que-
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