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UNiDADE .. 1F C H I
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Copyright © 1991, by Alain lJihr
BC! . Título original
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C 1:&':'.1 [) L:.-:: i
_._._ ."., ,.. Le mouuement outmereurop éen ert cn se
C. l-, 1 ft, Les Editions de L'atelier, Paris

Copyright © 1998 da traduçã o brasilei ra


Bouempo Editorial
SUMÁRIO
COI. E ÇÃü
C1'1'-00133103-3
Mundo do Trabalho
Coordenação
Ricardo Antunes

Tradu ção
Wanda Caldeira Brant

Revi são INTRODUÇÃO . 9


Alice Kobayasbi, Lucia Leal Ferreira e Priscíla Úrsula dos Santos
PARTE I - A herança .. . 17
Capa
Iuana jinkings e Flá vio valoerae Garottí Capítulo 1 - O modelo social-democrata do
(sobre reprodução de cartazes franceses publicados em movimen to operá rio. 19
Pou r l'histoire de notre temps, ja nv.vsept. 1988.) Capítulo 2 - O co mprom isso fo rdista . 35
Capítulo 3 - A "massificação do proletariado" 51
Diagramação
ZAP Desígn
PARTE 11 - Os desafios atua is .. 67
Fo toli tos Capítulo 4 .. A ru pt ura do com promisso for dista 69'
Post Scrtpt
Capitu lo 5 - A frag me ntação do proletariado 83
Impressão e acabamento Capítulo 6 - A trans nac io nalização do capital .... 105
Banira Gráfica e Editora Capítulo 7 - A crise ecológica . 123
Capítu lo 8 - A crise da sociabilidade .............. .. 143
ISlJN 85-85934-26-3 Capítu lo 9 - A crise cul tu ral ...... 163
Esta edição contou com apoio do Sindicato
dos Meta lúrgicos de Campinas e Região . PARTE III .. As vias de renovação ..... . . 183
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode Capitu lo 10 .. Os objetivos a perseguir. 185
ser utilizada ou reproduzida sem a autorização da editora. Capítu lo 11 .. A estratégia a seguir ..... 215
1 edição: agosto de 1998 . Ca pítu lo 12 - As o rganizações a (re)construir. 229
1ª reimpressão: fevere iro de 1999 Capítulo 13 - Rumo a um modelo neo-social-democrata
do movimento operário? 247
JINKINGS EDITOH ES ASSOCIADO S LTDA .
Rua Ministro Sinésio Roc ha , 785 - Perdi zes
05030-000 . São Paulo - SP CONCLUSÃO
Tclefax (01 I) 3865 6947 Atualidade do p rojeto comunista . ....... 273
E-mai l: bo itempo@ ensino .net
INTR ODU ÇÃO

Du rante os mais ou menos qua-


tro anos de tra ba lho q ue dediq ue i a es te es tu do , tive o p o r-
tunidad e de falar so bre ele co m um g rande núme ro de pessoa s,
na maior pa rte das vezes e m res posta a qu estões a respei to do
assunto at ual de minh as preocu pações. E qu and o eu lhes respo n-
dia: "Esto u prepa rand o uma obra sobre a crise do mo vimento
ar ao
o perário ", via na mai oria das vezes em sua Fi sio no mia um
marcad o por um "ah !" dos
mesmo tempo p ensativ o e irô nico,
mais ex press ivos. Os mais fran cos acres ce ntavam de uma maneira
falsame nte interrogativa: "Você acha que isso ainda vale a pe na?"
É que tudo o que tange ao movi me nto o perário , à su a sit u a-
ção atual O ll à s ua histó ria re ce nt e suscita , hoje , na melhor das
hipótes es, um desinte ress e ed ucado , q uando não uma hos tili-
dade de clarada . O cupa r-se do movi me nto o perá rio faz vo cê
pa ssar, gera lmente , por um u t ópi co atra sado que, co nfo rme seu
tempera mento e se u grau de co nform ismo político , seu inter-
lo cuto r inte rp reta rá co mo ca rac te rísuca de doce so nhad o r q ue
se pre nde nostalgicam ente às a nt igas ilusões , o u de per igoso
adepto da "luta de classes ", pro nto par a perturba r a q uietude da
pa z civil. De qua lquer man eira , co mo alguém "ant iq uado ", para
, q ue
co nsiderar u m dos vocábu los preferid os da " ide o lo gi a-soj?"

9
se rve como base d e pen sam ento pa ra u m bom número de nos- No entanto , se ess a co ntra-revol ução triunfou com ta nta fa-
sos con temporâ neos .' cilida de, se as o rganizações sindica is e políticas de es que rda pu -
Evid e nt emente , há forte s razões para lima sit uação como d e ram d e sempenhar tã o des preoc u pad ame n te se u pa pe l de
essa. Na Fran ça, assim como em outros lugares no Ocide nte, há fo rça su ple tiva do ca p ita l, não é d e se es pe ra r, aind a co m mais
un s quinze a nos (grosso modo, desde a abertura ofic ial da "cri- ra zão , q ue o mo vime n to o pe rário se encontre hoje co nsi dera-
se"), vi vem os um a co ntra-revo lução "moder ada", qu e le vou a velmente e nfra q uecido, na Fran ça e em to do o O cident e? Não
uma inversão co mpleta d a re lação d e forças que prevalecia no é d e se espe rar qu e e le atravesse uma d as crises mai s gra ves d e
início dos anos 70 . sua história já se cula r?
Lemhrein-se ! Na q uele momento, a o rde m so cia l desenvol- Do mesm o modo, é pos sível ad mitir sem rodeios : a situação
vida p elo model o oc ide n ta l do capitali sm o se d ebatia nã o só atual d o movime nto o perário ocidental nã o é b rilhante . Tom e-
cont ra a re volta d e uma parte d o prol e tari ad o , co nsti tu íd a mos uma visã o panorâmica , pa ssand o rapidamente em revista
sob re tudo por jo vens e imigr a nt es, q ue não es ta va m mais di s- seus principais ele men tos co ns titu tivo s aos quais precisar emos
posto s a "perde r sua vida p ar a ga n há- Ia", mas também con tra vo ltar detalhad amente no co rpo da obra.
o utros movimentos socia is - ecoló gicos, antinucleare s, regio - Do ponto de vista d o plano es tratégico, o mo vimento ope-
nalistas, urbanos , femini stas - , qu e co n tes tavam o co nju nto da rári o ocidental encontra -s e, hoj e , nu . As e stratégias re volu -
organizaçã o d o modo de vida cap italista. Foi e sse conjunto de cionárias (d e tip o anarco -sindicalista ou d e tip o leninista) , elabo-
movimentos que a crise econômica fre ou e definitivamente radas no final do século passado o u no início d este , não resisti-
rompeu . Jamais se rá suficien te me n te denunciado o pape l d is- ram à p ro va do com pro misso fordis ta q ue se rviu de fu nda me n-
ciplinar dessa crise, com se us co le tivos de trabalho e de vida to ao mo d elo d e dese nvo lvime nto d o ca pitalismo o cid en tal d o
di spersos ao sab o r d as re es truturaç õe s econô m icas, co m s eu periodo pós-gu erra . Mas a estratégi a reformista (de inspiração
fluxo cr esc ente d e d esempregados , de trabalhadores perdendo social-democ rata), ad o tad a pelo movimento o pe rário no cu rso
a estab ilid ad e , d e "n ov os pobres ", sobretudo com suas seqüe- d esse mesm o período dentro dos limit e s d esse co m p ro m isso,
las psi copolíticas: o medo do amanhã , o isolamento, a exa- também cad uco u co m a en trada em crise desse model o d e d e-
ce rbação da luta co nco rre nci al entre os indivíduos, a int ensi- senvolvimento" E essa ausência d e qualquer es tratégia eficaz co n-
fica ção dos processos d e exclusão que atingem certas catego- dena-o à impotência e provoca a deband ad a do "salve -se qu em
rias da populaçã o , a tentação de soluçõe s autoritárias, tudo puder" em suas próprias fileiras .
para maior benefício de nosso soberano, o cap ital. Nes sa s condi ções, não é de se espantar qu e as o rg an iza-
Sem dúvida, es sa co ntra-revo luçã o preventiva pôde contar çõ es (p o líticas, sindicais , associativas) do movimento o pe rá-
com intermediações e apoios aparentemente inesperados de rio ex perimen tem uma grave crise de representatividade, mar-
certas for ças sociais e políticas que haviam tido participação ativa ca d a pela diminuição de interesse p or ela s: a queda dos efe-
no s movimentos co ntestat óríos anteriormente evocados. Além tiv o s, a fraqueza d o mili tantismo, a in capacidade de mo bili-
di sso, mostrei como o trabalho de normalização da vida políti- za r os trabalhadores nã o cessaram de se agravar n o curso
ca e social fran cesa , por exemplo , encontrou zelosos agentes nos d esses últimos an os .
partidos d e es q ue rda , particularmente entre 198 1 e 1986 , mas Mas esses fenômenos também podem se r explicad os pel o
também de modo mais amplo na base sociológica desses últimos, papel d e inte gração d o proletariad o, de sempenhado por essas
a classe do staff administrativo capitalista .' organizações durante todo o periodo pós-guerra. Marcand o p ro-
fundamente su as formas de luta e d e o rganização, es se papel
torna-as hoj e incapazes de enfrentar os novos dados d a situação.
I Cf. F.-B. HUYGHE e P. BAIW"ES, La Scft -tdéot ogte, Paris, Laffont, 1987. E foi ele também que delas alienou uma boa parte das camadas
1 Cf. La Force Tranquille, Pa ris, Spa nacus, 1986; sobre a natur e za de classe do
qu a dro ad min is trat ivo ca pi talis ta , c f. Ent re bou rge oiste et prclétartcu.
prol etárias (as menos favor ecidas pel os "be ne fícios" d o compro-
l'en cadrement capttattste. Pari s, L'Harmattan , 1989 . misso fordis ta - operários especializados, mulheres, jovens, imi-

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g rantes - , a ntes mesm o das "vítimas da crise" -..:.-. desemprega- mot ivo , hoje , pa ra ca ir em um desespero rad ical em relação ao
d os, instáv e is, "novos pob res") . se u futuro , co mo logo após a derro ta da Comuna de Par is o u
Enfim, essa crise de re presentatividade das o rga nizações do como e m pleno triunfo da co ntra-re vo lução fascista na Eu ropa .
mo vime nto o pe rário depe nde de um ce rto núme ro de trans fo r- Todas as vezes, a part ir de se us pró prios esc o mbros, o movimento
mações mais ge rais qu e afe ta ram a sociedade em se u co nju nto o pe rário se reconstru iu sob novas formas, impondo um ríspido
so b a influência crescente das re lações sociais ca pitalistas : d isso- desmen tido a todos aq ueles q ue o haviam e nterrad o premat ura -
lução de identi dades coletivas , asce nsão do individu alismo , perda me nte .
ge ne raliza da de d ireção, etc. Além d isso, co mo pode ria se r de outro mo do? Como imagi-
De modo que, à ausência de qu alquer estratég ia e à crise de nar q ue as es trut ura s ca pitalistas de o pressão possam se manter,
representativid ade de suas o rga nizações, soma-se, e nfim, o de- so b fo rmas to do o tempo re nova das, se m q ue e las façam nasce r,
clínio irre versível de todas as referências ideo lógicas tradicio na is en tre suas principais vítimas, o desejo de lhes ofe recer resistên -
do mo vimento o pe rário. Assim, tod os os modelos sociopolíticos c ia e a vo ntade de aca bar co m el as po r meio da luta e da orga-
co m o s quais esse mo vimento se ide ntificou no curso de sua nização co letivas? Sem d úvida, as forma s e mo dalidades dess as
histó ria e nco ntram-se ho je : úl tima s só pode m se tra nsf o rma r, par a e nfre ntar a s pr ó p rias
co nd ições em mudança da luta de classes. Ao me sm o tempo , é
• seja esquecidos: é o caso, basica mente, dos d iferen tes mode-
inevitável q ue a histór ia do mo vimento ope rário seja regularme n-
los de autonomia pro letária enca rnados pelo an arqu ismo, pelo
te de co mposta em fases de crise, no curso da s quais o vel ho (as
sindica lismo revolu cionário, pelo "comunismo de co nse lhos";
anti gas formas de luta , de o rganização e de co nsciê ncia) morre
• se ja rejeitados: é o caso es pecí fico do "socialismo de Esta-
co nvulsiva mente enq ua nto o no vo (as no vas formas de luta , de
d o " (ou "socialismo b urocrático") q ue, após te r constituíd o
o rganização e de consciência) só chegam a se co nsolida r com
po r déca das intei ras um ve rdadeiro co ntras te, inclusive no
muito esfo rço . Mas, e mbo ra possam ser vividas todas as vezes
se io do mov imen to operário , ele mesm o rec o nhece sua fa-
co mo catástrofes , essas fases críticas não significam o fim do mo-
lência histó rica, precipitand o-se na via de um capitalismo à
vime nto o perá rio , e sim, no má ximo, o fim de uma de suas for -
moda oci de nta l;
mas his torica me nte determinadas .
• seja caducos: é o caso do refo rmismo social-democrata clás-
E a idéia d iret riz desta o bra é qu e nos enco ntramos precisa-
sico, co ndenado ao mesm o tempo por se u êxito (q ue o fe z
mente ho je em U !!13 dess as fases críticas, em q ue o movime nto
mostrar com clareza o q ue defende : uma part e integrante do
o perário es tá e nc urralado pela s transfor mações d o cap ita lismo
co ma ndo do capital sob re o pro letariad o) e po r se u fracasso
(nas qua is, além d isso , ele te rá participad o intensamente) para
(sua inca pacidade de prever a crise atual, e em seguida de se
mu da r comple ta me nte de ca ra, de ma nei ra radica l. Ma is pre ci-
o po r a ela) .
sa me nte , eu me pr o ponho a mostrar qu e uma página de sua
Decididam ente , parece q ue, para co ntinuar a ter interesse no história es tá prestes a se r virada , aqu ela qu e co meç o u a se r es-
movi me nto operário ocidental na fase atua l d e sua histó ria, é c rita no ú ltimo terço d o século XIX, com a fo rmação d o qu e
p reciso te r vocação para perd idas. E as reações ir ônicas chamarei se u mode lo social-d emocrata, do qual a social-de mo -
da ma io r part e de meus interl o cu tor es tinham to das uma apa rên- cracia no se ntid o es trito e o leninismo co nstituíram as d uas prin-
cia ,de serem de bom se ns o , cipais variantes. É esse mod elo qu e , hoje , entra defini tivam ente
Portan to , não se trata de nega r a s ituação d e crise q ue o em crise, ao mes mo te mp o qu e as sistimos ao na scim ento ainda ..
co nju nto do movimento ope rário ocidental at ravessa hoje . Mas tím ido, incerto, hesitante de uma nova for ma do mo vim ento de
tampo uco trata-se de cede r a esse pse udo-realism o q ue so men- e ma ncipação do proleta riado.
te capitula diante da realidade. A primeira parte , qu e intitularei "A herança ", distingui rá os
Pois essa não é a p rimei ra crise global (nem pro va velm ente traços est ruturais desse mod elo hoje ago niza nte d o movi mento
a ú ltima) que atravessa o m ovimento o perá rio . Não há mais o perário , suas va ria ntes histó rica s e geográficas, enfim, as con-

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dições que torna ra m possíve l su a formação e que favorecera m do pe nsame nto marxista, sem e ntre tanto a eles se limitar. Po is,
seu êxi to sobre seu modelo co ncorre nte (o sindicalism o re vo lu- se ess e pensamento não pe rmite , ne m de lon ge , resolve r o con-
cio ná rio) . Em segu ida , a na lisa rá a tra nsfo rmação no se io do junto dos problemas encontrados por toda a aná lise da realida-
co mpro misso fo rdista , que se rviu de estrutura e fundame nto ao de social co ntemporânea e por toda a política que procura trans-
de se nvo lvime nto do capitalismo pós-guerra , mostrando qu e esse formá-la e m um sentido eman cipador, tam bém é ce rto qu e uma
com p ro misso terá ao mesmo tempo assegu rado se u triunfo , aná lise e uma política como essas são sim plesmente inconcebí-
ap ogeu, ap erfei çoamento e aind a favorecido se u declínio, esva- veis fora de se u âmbito. E este estudo pret ende tam bém demons-
ziame nto , e degeneração . trar isso .
Intitulada "Os desafios atuais", a seg unda parte visa rá e ntão
elu cidar siste ma ticamente os prob lem as co m os qua is o movi- Este livro é a ve rsão resumida d e uma tese de douto rado em so -
me nto o pe rário oc ide ntal hoje se co nfronta , indo dos ma is ime- cio log ia, defendida na univers idade Paris-VII. Nela, pod er á se r enco n-
diatos e mais circunscritos aos mais distantes e gera is. Isolaremos trado um apa rato crítico co mp leto e uma bibliografia.
assim o conjunto de fatores de desestabilização que provocam sua
crise atual, e as disputas do período que ele precisa ass umir im-
pe rativamente se quiser renas cer enquanto for ça socia l e a fortiori
e nquanto força revolu cionár ia.
A última pa rte , que se intitula "As vias de re novação ", te n-
tará formu lar, co m base em an álises a nter io res, proposições para
trabal ha r po r um rena scimento , O ll mel ho r, p a ra u ma re for-
rnu la çâo da luta de e manci pação do proletariad o , exa mina ndo
se mpre a eme rgênc ia de elementos qu e prefigura m a ex ploração
de vias pa ralelas. Essas proposições ab ra nge rão todos os aspec-
tos da luta de classes: se us ob jetivos distan te s as sim co mo suas
re ivind icações imediatas, sua estratég ia e suas form as de luta , os
tip os de o rga nização a que o prole tariad o deve se dedi car, as
novas formas de sua co nsciê ncia de classe , e tc. Co nstatare mos
então que, apesar da enorme crise qu e atravessa , o mov ime nto
o pe rário oc idental disp õe hoje de uma conside rável expe riê ncia
h istó rica e de um rico sabe r adqu irido , nos qua is e le pode se
apo iar para resp on der aos desafios do pe río do .
Depo is dessa breve ap rese ntação, ainda cabe p reci sar que,
longe de co nsidera r a luta cla sse do prol etariado co mo uma
antiguidade histórica, este estudo se baseia no pre ssup osto de que
e la co ntinua rá a co ns titu ir o co m pone nte ce ntra l de to do o
movime nto de e ma nci pação hu man a nas próximas dé cadas. E,
co mo qu alquer pre ssuposto , este te rá de justificar-se pela pe r-
tinência das aná lises que ele subentende e cu jo de se nvolvime nto
ele perm ite.
De man eira mais ge ral, e co m o risco de parece r mais um a
vez medieval, min ha análise fará gra ndes ap elo s aos co nceitos,
hipót eses, diret rizes, métodos de an álises de dive rsas correntes

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PARTE I

A H ERA N ÇA
Capítulo I

o MOD ELO SOC IAL- DEM OCR ATA


DO MOV IME NTO OPE RÁR IO

P or modelo do movim ent o o perá-


a ao
rio, entend emos uma certa configu ração deste, caracteriz ad
mesmo tem po por formas o rganizacio nais, inst i tuciona is e ideo-
co m
lógicas determ inadas, assim como por seu arranjo de acord o
e esse arr an jo co r-
um a estru tu ra caracte ristic a. Essas fo rmas
respo nde m se mpr e a uma es traté gia domina nte na luta de clas-
se do pro leta riado, a um a concret ização histór ica parti cul ar de
seu projeto de emanc ipação , em relação a um aspe cto particu-
la r da luta de classes , dand o nasci me nto a u ma forma o riginal
de desenv olviment o do capi talísmo ,
O mo delo do mo viment o ope rário de que trata este ca pitu-
lo tira sua denom inação de suas o rigens histó ricas . Ele apa rece ,
nte
de fato , nas formaç ões capita li stas ocid ent ais (pr inc ip alme
XIX c antes
eu ro pé ias) em uma ép oca (o último qu arto do sécu lo
o
da Prim ei ra Guerra Mundia l) em que o conj unto do movi ment
po lít ic as
o perári o v ai ser p ro gressivam ente dominado por forças
de
e ideol ógicas que se identif icam , ent ão , na den ominaç âo
arnento s
socia l-d emocrac ia, apesar de suas div ergências e enfrent
freqü en tement e severos .

19
A partir dessa mes ma fó rmu la básica , facilm en te e nco nt ra-
Pois , desd e essa época , apa re cem im po rtante s pa rt íc u la- mos as duas var iantes fundamentaiSdo mode lo so cial-de mocra-
rid ade s nacio nais ne sse modelo. ligadas às particularidades das 1.1 do movi mento o perário citadas . A var ian te re fo rmista , antes
nacio na is ma is globa is da s quais o mo vimento ope- de mais nada , soc ia l-de mo crata no se ntido co rre nte do te rmo ,
r ário nao es ca pa . Esta hetero ge neid ade que. longe de colocar qu e limita suas ambições a "re fo rmas de e stru tura", se gundo
em ,q uestão o mo de lo. desdobra todas as suas potenc ialidades. ll'rmino lo g ia proposta pos te riormente por Henri de Man : nacio-
se ra ai nda ace ntuada, logo ap ós a Prim e ira Guerra Mund ial nalizaçõe s de monopóli os ind ustriais chave s, contro le mai s ou
:om a ecl osào da 11 In ternacio na l e do Komintern . Naque l; me nos d ireto de g randes grupo s financei ros, mun icipaliza ção
epoca , .m a mfesta ram-se conjunta ment e du as variantes funda - do so lo ; o rganização da assi stência social pel o Estad o ; legi sla-
mentais desse mesmo modelo , uma reformista e out ra "re- • o do trabalho visando regulamentar as co nd içõ es de exp lo-
Entre ta nto , só a pr imei ra co ntin ua rá, a partir de ração ca pita lista e conlraw alizar as re lações entre ca pital e tra -
a se va ler da so cial-de mocraci a enquanto , na ling uage m halbo : redu ção da s de sigualdades sociais por mei o da dernocra-
vei culada pelas forças políticas ligadas à seg unda ve rsão . esse uza ção do sis tema fiscal e do ensi no , e tc, Essa s reformas são ,
mesmo torna r-se -á progressivamente uma in júria co m em princípio, favoráveis a cenas interesse s imedia to s do pro-
d e a nátema, au tojus lifica çã o e sobretudo a d ege ne ra- IC13riad o (visto q ue, por exemplo , e las limita m a explo ração
çao de qualque r paternidade com a versã o decla rada do mo - ca pitalista o u ga rantem sua assis tên cia soci a l), cuidadosa me n-
de lo social-democra ta. te o rga niza nd o ao mesmo tempo , pelo menos, os ínreresses da
fração modernista da bu rgu esia . Poi s nã o se trat a , então , de
recolo car em q ues tão se u pod er , mas mu ito ma is de abri r o es-
1) Seus componentes estruturais paço de um com pro misso po ssíve l co m e la .
Nessas co nd ições , tenta-se co nqu istar o pode r de Estado pe la
Só p odem os Fala r de mod e lo do mo vim e nto o pe rá rio à via legal (ele ito ral). e se u e xe rcício é e fetuado em um q uadro
medida q ue é possíve l colocar e m ev idê ncia que suas diferentes instituc io na l burguês (pa rlamenta r). Daí as ca rac te rísticas da
caracte rísticas (estratégicas, o rgan izacio na is, ideológicas) respon- prá tica po lítica des sa variante reform isra ( Iega iisrno, jurid icidade ,
dem a uma mesma fó rmu la qu e ga ra nta sua estabilidade es - parlamentarismo pa ra o partido: bu sca de co ntratos co letivo s para
trutura l, apesar da s inev itáveis diferen ças c parti cu laridades h ís- os sind icatos) . Quanto ao sociali sm o , é pro gressivamen re red u-
t óricas e ge o po líticas. zido, nessa via , a u ma simp les demo crati zaçào da so cie da de
. Nesse sentido, a existência e a o rigina lida de do modelo 50 - cap ita lista , à co nc re tizaç ão , na socie dade civil, d os d ire itos e
cia l-dc rnoc rata está rela cion ada , e m pri me iro lugar, a seu curto- ideais da de moc racia polítiCa (libe rdade . igual dade . frate rnid ade).
projeto que propõe ao pro let a riado ema ncipar-se do cap ita - q ue as refo rmas de estrut ura s ante rio rmen te indi cadas deve m
lismo de Esta do. emancipando o Esta do d o cap ita lism o. Em
rea lizar progressi va mente .
pa lavras, projet o baseia-se na id éia de que o pro le- No que d iz res peit o à varian te "revo lucio ná ria" (da qua l o
tafiado pode se libe rta r de sua explo raç ão e sua domi naçào pe lo leninism o _ mais e xata me nte o bolchev ismo - co nstituiu a fo r-
capital (o u pode , pelo menos, em um primeiro mom en to aliviar ma acabada) , visa a exp ro priação da burguesia e de se us aliados
co nside rave lme nte se u pes o) co nq u ista ndo e exercendo (por (as outras cla sses propriet á rias) pela esta uza ção do co njunto dos
°
re prese ntantes po líticos inte rmedi ários) pode r do Estado, to- meios de prod ução, de stinada a lanç ar as bases de um dese nvo l-
mando esse pode r da burg uesia e de seus a liados po lít ícos. Ele vime nto autocentrado. planificado pel o aparelho de Esta do.
aprese ntará se m pre e por toda a parte o Estado como a via obri- Nessas co nd ições, a co nq uista do poder de Estad o su põ e um a
gat ôrtae ine vitável da emancipação d o p roletariado. E a soc ie- ruptu ra violenta com as fo rma s instituci onais da democracia
dad e sup ostamente resultante dessa rev olu çã o po lítica (o socia- parlamentar e na maior parte da s vez es s6 pode ser efetuada pe la
lismo) é então assimi lada a um proce sso mais ou menos radica- via insurrecional, por me io de uma mobi lização e de um enqua-
lizado de estattzação do capitalism o .

21
20

drarnento po lítico-m ilitares das massa s populares (principalmente hiera rqui zação b urocrát ica , segredo e m torno do s vértices da
o proletariado e o campes inato) . . o rganização, etc. Daí a preeminência da orga nização partidári a so-
Talvez cause espanto ver-nos apresentar, como duas vana ntes bre as o rga nizações sindic ais e os movimentos mut ualistas e coo-
do mes mo mode lo do movimento o perário, a soci al-de mocrac ia perativos.
(no se ntido corre nte) e o lenin ismo , uma vez qu e se co mbate- Não se pode dizer que o modelo so cial-de mocrata do movi-
ram tan to no curso deste séc ulo. Mas a as pe reza de sua rivalida- me nto o p erá rio não atribua uma gr a nde importância ao s in-
de se mpre foi a de dois irmãos inimigos alimentados no mesmo dica lismo , assim co mo ,aos mo vime ntos coo perativos e rnutua-
se io e que se o puse ram um contra o outro na pa rtilha da mes- listas co mo fo rmas de mobiliza ção e de organiza ção da classe.
ma herança. Pois é exatame nte a mesm a atitude em re lação à luta Mas sua ca racte rística peculiar, apesa r de tudo , é a co locação sob
de classe do proletariado (sua coloc ação sob tut ela política e es - tutela política dessas diferentes formas de organização, cuja ação,
tatal) e a mes ma finalídade propos ta para essa luta (a estatização co nside rada ins uficie nte, necessariame nt e deve se r substituída
do ca pitalísmo através da co nquista do aparelho d e Estad o) que co mp le tada e coroad a po r aq ue la do part ido político . Pois este
e ncontramos tanto em um a co m? na outra ve rsão do modelo últim o é exatame nte o único cujos diri gen tes podem co nqu ista r
social-demócrata do mov imen to o pe rário. o de Estado e ocupar os vé rtices de seu apa re lho , o úni-
Se nd o ass im, nad a d e surp re e nden te e m s e u co mu m fe - <":0 a pode r responder às e xigênci as estratégicas do mo vime nto

tichismo do Estado, apesa r das d iferenças de ê nfas e dada a este : pe rário , pelo me nos co mo sã o co nceb idas no q uad ro desse
últim o por cada u ma dessas ve rsões. A versão refo rm ista a pre- ::-:odel o do mo vime nto.
se nta o Estad o co mo um ó rgão neutro coloc ado aci ma das elas - Disso decor re , a hiera rq uização entre a açào d o pa rtido, de
ses, po rtan to co mo um instrumen to q ue pode se r co locado ind i- ..: ::-: lado, e a da s o rganizações sind ica is, co o pe rativas, mú tuas e
fere ntemente a se rviço de uma p o lítica burgu esa o u de uma associativas, de o utro, na p ráti ca e id eol o g ia d o mo vi me nto
po lítica prolet ária. A ve rsão re vo lucioná ria re toma em ce rto sen- : ;:-erário. Essa hierarquização não co rrespo nde àque la entre luta
tido es sa te máti ca , ao a prese ntar o Estado co mo transce ndente eccn õmlca e luta po lítica , como co m d em asiad a freq üê nci a se
e reso lve ndo as co ntrad ições inere nte s à a cu mulação do ca pital : :Sillma d ize r, mas àq uela ent re a luta d o p ro leta riad o por se us
(e m pa rticul a r, aquela entre a so cia lizaç ão cresce nte da produ- :-i.eresses imediatos (eco nô micos o u políticos) e sua luta po r se us
ção e a propriedade privada dos me ios de produção). Nos dois ».teresses bistoricos. E é evident e q ue essa última o pos ição se rá
casos, a iner ência do Estado ao capital co mo relação so cial é ig- e nfatiza da no seio d as va ria nte s refo rmi sta e
norada , ao mes mo tempo qu e o p róprio papel qu e ele des e m- ":--=-;o!ucio nária " desse mode lo.
penha na reprodu ção dessa relação (po rtanto na manutenção das fato , o q ue ca racte riza o modelo so cial-de mo crata do
rel ações capitalistas de explo ração e de dominaçã o ) é oc ultada . =: ·,-i:7lento o perário, e m última aná lise, é me nos a afirmação
De correm logicam ente desse pro jeto e dessa estrat ég ia , ca- .::.i ex istência de do is (ou vá rios) níve is de co ns ciê ncia (em si

racte rizados pelo felichismo do Estado , os traços organizacionais po uco discutíve l) - co nsci ência s ind ica l e co nsc iê ncia
próp rios desse mo del o do movi mento operá rio . :-1: : ::": .1. co nsciê ncia es po ntâne a e co nsci ência so cialista - do
Em ge ra l, es te ú ltimo rea g ru pa ria três d ife re nte s tipos de :t _,-= 1 lf:rmação da quebra entre as d uas, a p roc lama ção da im-
o rganização: pa rtidos políticos, sindicatos (esse ncialme nte sind i- ,::::h de do transdesenvolvi mento de uma em o ut ra (fo r-
catos da ind ústria e m o posi ção aos sindicatos de ofício) e, en fim, ::1-....i :i: devi da a Kautsky e inte gralm ente retomada po r Le nin).
uma abundância de movimentos coo pe rativos e mutualistas. En- : -:- ::- ;:"::::irio s e defensor es desse mo d el o do mo vimento o pe-
tretan to, da necessidade da conquista do pod er do Estado decorre :lr".J: de fato convencid os qu e, dei xado a si próprio , o pro-
a pr imazia dad a ã o rganização do proletariado em u m apare lho é inc a paz de ultra passar o nível da co nsciê ncia írne-
de tomada e de exercício do dito poder, em última a nálise à sua .i d e seus inte resses eco nômicos e políti cos imediat os) ,

o rganização em um co ntra-Estado que reproduz as caracte rísti- exprim ir á na organização e na p rática sind icais (o u co -
cas do próprio Estado : centralização da açã o, de legação do poder, -·-]. 5 e rnutualis tas ) .

22 23
Do ponto de vista de les, uma co nsciênc ia maior e mais pro- mo do d e pr od ução capitalista, lan çan d o as ba ses materiai s do
funda de sua situaçâo e de seus interesses, d as necessid ades e pos- socialismo ;
sib ilidades de sua luta de classe só pode chega r ao proletar iado • o "m ito" da classe fun din do -se co m o d a nação co mo su-
vinda de fora , dos famosos "i ntelectuais revo lucio nários", os úni- jeito salvado r da hu man idad e (além disso , na ma io r parte da s
cos q ue possuí am a ciê nc ia 'd a socieda de e d a histó ria e q ue , po r veze s Co m a 5ubo rd inaçã.o o u, pelo men os , a id e ntificação
isso, ao se junta rem às fileiras do prole tariad o, podiam legitima- d os interesses da pri meira aos da seg u nda , apesar da afirma-
mente asp irar à d ireçã o de sua lu ta . Daí, a ne ces- ção regu lar de po siçõ es teó ricas inve rsas) ;
sidade de um pa rtido dirigente, verdad eiro "estado-maior" do pro- • o "m ito "do pa rtido, reforçando o do Estad o co mo demiurgo
letariad o em luta, fo rmalmente d istinto da s o rganizações (sindicais, da históri a, he ran ça da co rre n te rad ica l da revo lução demo-
coo perativas ou mutualistas) que o proletariado pod e constituir p?r crático -b urg ues a (jacobinism o);
si 56 ou qu e podem ser desenvolvidas d iretamente so b a mcu a çao • e nfim, exata mente o "m ito "da reuoluç ão (mesmo en tre os
e o co ntrole do pa rtido . E, sob re esse ponto de cisivo , que resulta refor mistas o nd e esta imagem mítica é bran d ida para ser ime-
d iretamente d e sua o pção estratégica e de seu pro jeto esta tista, as d iata me nt e recusada) co mo apo ca lip se , inve rsão vio lenta e
d uas ve rsões do mo del o so cial-democrata do mo vim ento o perá- brusc a da antiga o rdem social, da qua l emergeria espontanea-
rio têm estado sempre perfeitamen te de acordo e ntre si. me nte u ma no va o rdem, de aco rd o co m um a representação ,
Da nd o as costas ao pr o jeto co mu nista de uma so ciedad e em _ela própria mistificad a , da Revol ução Fran cesa , send o a re-
q ue o pod e r político se ria co letiva e e xe rcido volução proletária sempre co nce bida confo rme o modelo de
pelo co nju nto de seus me mbros, o mo d elo do uma revo luçào bu rguesa reduz ida às suas pe ripécia s políti-
mo vim en to o perário não ultra pa ssa , d e fato , o ho ri zon te de u ma cas as mais espetaculares.
socied ade q ue , po r es ta r dividida em múltiplas esfe ras o postas
e riva is, não chega a reco nstituir sua própria unidad e se não na Econo m icismo (com seus corolários: O p rodut ivism o e o cien-
e pel a co nstrução de um aparelho de Estado fo ra e acima del a. .i fici srno) , estatism o (co m SUa so mb ra q uase inevitável p ro jeta-
Ho rizo nte q ue co nstitui, para se mp re , o da pr ática e pensamen- da . que é o nacionalismo) , e finalmente progressism o (se ndo o
to po lítico s pr óp rios d o uni verso capi talista . .prog resso ge ralmen te ass imilado , de um lad o , ao cresc imento das
É ló gico ta mbém q ue esse mo delo d o mo vimento o pe rário prod utivas , d e o u tro, à influê ncia d o Estado so b re a e co-
veiculará, co n te n ta ndo -se em d eslo cá-lo s e "d e fo rmá-los ", os :"". J :11: 3 e a SOcied ad e) con stituirão assimos ingredi entes mai s co-
gra ndes temas da ide ologia bu rguesa da idad e clássica , qu e co ns- =:: ': :15 da ideo log ia produ zid a pelo model o social-de mocrata do
tituíram tantas fetichizaçõ es das relaçõe s socia is capitalistas, entre ::::':ime nto o perário .
as q ua is o fetichismo do Estado ca pitalista é some nte se u resu -
mo . Ou seja:
2) Sua alternativa histórica: o sindicalismo
• o "m ito" da objetivaçã o histórica , a imag em d e u ma his- rev o lucioná rio
tori cidade auto mát ica , qu e imp lica a crença na ex istência de
le is e d e u m se ntido da história . A esse "mito " se incor po ra
:>e aq uele modelo co meça a to ma r fo rma no final d o
a afirmação d a ne cessidade d o desmo roname nto d o cap ita -
- ,. -:.: s éculo e leva rá décadas para co meçar a se firmar no seio
lismo e d a inevitabilidade d o socialismo e do co mu nismo
.:.: :7'.: '.'j rnento o pe rário o cid en tal, integ ran d o e/ o u neu trali zan -
co mo fim d a hist ó ria . O q ue é contrad itó rio co m o vo lun -
a : -= _t:7'. e:"'. to s que a p riori lhe eram ho stis o u simplesmen te es-
tarismo inerente à es tratégia estat ista dese nvolvida po r es se
E. flnal rne nte , só após a Segu nd a Gue rra Mundial, ele vai
modelo do movimento o perário ;
• o "m ito"dop rogresso, aq ui estendido ao mito do caráte r im- =-;.:: ampla e p ro fu ndamen te o bastante para se id entificar
pet uoso ti revolucio ná rio do desenvo lvimento da s fo rças pro- -= .;:,: . . : -. en to o perário , no co nju nto d o s pa íses ca pitalistas de-
- : -.. a t é as véspe ras da atua l crise d o cap italismo.
dutivas , qu e acabará fazend o ex plod ir o q uad ro es treit o do

24
Entretanto , nesse .intervalo de tempo , e le precisará e nfrentar letariado pa ra efetuar, em seu lugar, suas tarefas políticas, mesmo se
e vence r um o utro modelo do movim ento operário , qu e co oco:- e le pr6 prio vier a não cumpri-las. Qualquer te ntativa co nd uz ida
re u se ria me nte com e le , p e lo meno s a té 1914 , em um ce rto fora do proletariado e qu e pretenda ema ncip á-lo s6 pode ser uma
número de países do sul da Europa (França, lt ália, e principa l- enganação e leva, em última análise, a renovar, so b o utras formas,
me nte Espa nha ), mas também nos Estados Unid os (com os IWW: as estruturas de sua própria opressão. Do po nto de vista da história
In tern ational Worke,,; ofthe WorldJ, os famo sos wohblies. Trata- de ste sécu lo, esta advert ência lançada pe los sindicalistas no final do
se d o sin d ica lismo revolucionário, q ue re presentou a única al- século passado terá tido valor de verdadeira profecia.
ternativa que o movimento operário ocidental dese nvo lveu his- Quanto às modalidades prá ticas da ação direta , imaginadas ou
pra ticadas pe los sindicalistas revolu cion ários, eram mu ito variadas:
tor icamente ante o modelo social-de moc rata .
No p lano estratégico a nte s de mais, nada. Pois , de acordo além da g reve, evidenteme nte, que é sua forma eminente, eles
co m sua inspiração anarquista (de o nde também sua den omma- preco nizam o boicote (dos patrões mais severos) e o selo de quali-
ção impr ópria de anarco-sindicalismo), o sindicalismo revo lucio- dade assinad o pelo sindicato (que é o opo sto disso), a sabotagem
nário evide nte mente era rigorosamente contra qua lque r at o de , (prod ução dilap idada, produção defeituosa, etc.), à agitação, a ma-
recorrer ao Estad o para gara ntir a salva ção do pro letariado . De nifestação , sem exclu ir a sublevação popular, tudo dirigido não 56
se u ponto de vista , o Estado é um ó rgão parasitár io , e m relaç ão co ntra os inimigos d iretos dos trab alhadores, que são os pat rões,
ao co rpo social, q ue é preciso erradica r e su primir, se ndo o o bje- mas também contra se u ap arelho de rep ressão e de enganação que
tivo da revol ução p roletár ia fazer desapare cer de finitivam e nte é o Estado.
qu alqu er es pécie de apare lho de Estado . Além disso, longe de No pla no organiz acion al, o pr incípio da ação d ireta levava
se efet ua r pe lo Estado (a tomada e o exercício do pode r de Es- o sind icalismo rev o luci onário a pri vilegiar as formas em qu e o
tad o), ela de ve ao co ntrãrio se voltar co ntra o Estad o . Segu ndo proletariado te nde espo nta neamente a se o rga niza r, ou se ja, os
os sindicalistas revo lucionári os, não se poderia de for ma alguma mo vime ntos cooperativos e rnutu alistas e, evide nte me nte I sobre-
preparar e co nstruir uma socie da de ema nci pa da recorrendo-se tudo a organizaç ão sind ical. É ba sicam ente desta última q ue e le
a esse apa relho de opressão que é o Estado. e spe rava a emanci pação d o prolet aria d o ; daí I alé m d isso, sua
Ao princípio est at ista ,.que anima a e straté gia do modelo deno minação de sindicalismo revo lucio nário .
socia l-de mocrata , o sindicalism o revolu cio nário o pu nha, então , Nesse se ntido I duas idéias influe nte s d istingui am , de imedia-
o princípio da ação direta do prolet ariado co nfo rme a expres -
l
:0. o sind ica lismo revolucionário d o s ind ica lismo so b a hege-
são proposta porF. Pelloutier. Daí a den omina ção , também , de mo rna social-de moc rata:
sindica lismo de ação direta da qual ele se valeu . 1. O sind icato não era co nce bido por ele apenas co mo uma
Bem ant es da emergência do sindicalismo revo lucionário, o :rga nização qu e permitisse ao proletariad o se impor en q uanto
princípio da ação dire ta havia sido clara mente enu nciado por Flora so cia l: agru par-seI c rganiza r-se, lutar por se us inte resse s
Tristan , e m uma fala célebre retom ada no preâ mb ulo dos estatu- :.-:-,ediatos, educa r-se, etc. A estrutura sind ical era mais rad icalmente
tos da I Intern acional: "A ema ncipação dos trabalhadores será ob ra ,:o :1cebida c0f!lo o embrião da orga n izaç ão da f utu ra sociedade
dos próprios trabalh ado res". Estes não de vem esperar sua reden- s- iarqtusta-comuntsta. Pois, nesta, a o rga nização sindical es tava
ção de nenhum "Salvador su premo" externo a eles (Estado, par- zes tinada a se tornar o órgão de dir e ção, de ad ministração e de
tido , homem providencial ou pro feta genial) ; é somente de si ,:o c,::ole da produção social e do co njunto da vida socia l.
pró prios qu e deve m extrair as força s pa ra co nd uz ir sua luta de Daí a impo rtâ nci a qu e e le a trib u ía às es trutu ras int erpro-
:"' ;''C aa ís de base (co nfronte, por exempl o , as bo lsas de traba lho' ,
cla sse , e somente eles podem se da r os meios pa ra isso . Conse-
qü entemente, so me nte a e les cabe di rigir suas lutas, for mar e
co ntrolar suas o rganizações, garantir sua educ.". ação po lítica . • :': L'-lS de trabalh e são reun iõe s de membros de d iversos sindicatos de um a
Daí a recusa de qualquer "substítutísmo ": nada nem ninguém, odade ou região , co m o objetivo de se organizare m para defend er seus
nem mesmo um partido revolucionário, pode substituir o pro- ra e-es ses e de orga nizarem serviços de interesse co letivo . (N.T.)

26 27
d e o nde nasceu a CGT francesa), verdadeiro nich o da so lida rieda- te resses imed iatos e o rganização co m a res ponsab ilidade d os
de d e cla sse e cé lula fe d er ativa e aut o g erad a d a socieda de d e inte resses histó ricos do pro let ariad o , u m d os princí pios ca rd i-
aman hã. Essa prefe rên cia atribuída às "ho rizo ntais" ca- nais d o mo d el o soc ial-de mo crata. Nesse plan o , o sind ica lis mo
racter izará se mpre o sind icalismo revo lucio nário em o pos ição ao revo lucio nário ca rac te riza va- se pe la afirm ação d e qu e a pa ssa-
sindicalismo sob a hegemo nia socia l-d e moc rata, q ue favorecerá g em d e uns para os o ut ros podia ser ga ra n tida na e pe la ação
ao co ntrário as estru turas "ve rticais" (as federaçõ es profi ssionais, sind ica l, se m q ue fosse necessário re correr a uma me di açã o
seja m d e o fício sejam da indústria) , fonte intrínseca da hu ro cra- po lítica ex te rna ao p róprio prol e tar iado . A dife re nç a ra d ical
tíza ção dos sind icatos . e ntre si nd icalismo revo lucionário e sind ica lismo so cia l-d e mo-
2. Alé m d as lutas cotid ianas que a d efesa dos interesses ime- cra ta d ava-se , d e fat o , neste po nto esse ncial: a aut o no mia es-
diatos do pro letariado ex ige , a o rganização sindica l d ever ia pre- tratég ica , o rgan izacional e cultura l d os s ind icatos reconhe cid a
parar po r si mesma a revolução . E isso da única forma que uma pelo p rime iro e negada pel o segu ndo q ue, e m última análise ,
orga nização sindical. de acordo co m o princípio da ação direta, lhe redu zia os sindicatos à fun ção d e "co rre ia de tra nsmi ssão " do
pu desse dar, O ll seja , a greve geral insurre ciona l. Concebida como pa rtido, d e aco rdo co m a fórmula bem co n hecida d e Lenin , mas
o mei o da revo lução soc ial, esta última não era então en carada co- que a so cial-de mocrac ia an te rio r a 19 14 já so u be ra co loc ar e m
mo uma simples sus pe nsão ge ne ralizada d o trabalh o; ela de veria prát ica.
se r també m a ocas ião de derrubar o capi talismo pela reapropriaçào Ao mesm o tempo, o sind ica lismo revo luci onár io afirm ava
co letiva d ireta dos meios de pro d uç ão , e d e instaura r, so bre essa resolutame nte que nã o há separação intra nspon ível entre a co ns-
base , um a de mocracia direta dos produtore s associados, garantind o ciê ncia proletária es pontânea e a co nsciência revo lucionária que
toda a o rgan ização social: tratava-se , então, d e u ma g reve expro- seria O apa nágio d os "in te le ctua is re vo luci o ná rio s". Pa ra o
p riado ra e enca rregada da gestão, d e ca ráter necess ariam en te in- -ind icalis mo rev o lucioná rio, a rev o luç ã o p roletár ia só pode rá
su rrecio nal. I J.:o ntece r se o p role ta riado adq uirir por si só a co nsciê ncia ela-
Co nseq üe nte mente, u ma co nd uta co mo es sa só pode ria d ar :':l da situação de opressào no cap ita lismo e da necessid ade d e
as costas , d e ma neira de liberada , às me di açõ e s políticas d o .::na de rrubada revolucionária da s rela çõ es socia is q ue a geraram.
u nive rso capitalista , à açâo . se ja refor mista se ja "revo lucio nária", E ele pode adqu irir ta l consciência pela dinâmica e ex periência
d os partid os , à co nquista e ao exe rcício do po d er do Estad o . :t luta d e classe , assim como dese nvo lve ndo suas p róp rias
co ntrá rio , a g reve ge ral insu rrcciona l de veria te r co mo efe ito e instituições autôno mas. O pap el dos "intelec tua is
p rincipal o des man telamento do aparelho de Estado , não d eixan - revol uc io nários" só pode se r o de fav or ecer um p roces so co mo
d o subs istir o utro poder po lítico senão o d o pro leta riado o rga- 7:::-': . dele participan do , e nào d e reivindi car pa ra si a d ireção do
nizad o , q ue se reaprop ria ria dos meios sociais de produção e , ,::-. :·:imento d e e ma ncipação de classe.'
co nseqüe nte mente , reo rgani zar ia toda a vida so cial. Dos princíp ios de açã o e de orga nizaç ão anteriores decorriam
O u se ja, po r trá s dessa re cusa do primado político , o q ue se :-:. temas d ese nvo lvidospelo sind icalismo revo lucío-
recusava era a sepa ração e ntr e o rganização e nc arregada d os in- :-:...i:: : ;' 0 p lan o ideológico. Ainda nesse caso, es te último, co m

I Apesar do ar uagorusmo de seu meio e de se u fim, as co nce pçõ es da revolu- : " :'.;-.;;'::llistas re volucion ários não ignoravam ne m su best imavam o risco
ç ão desenvo lvidas pe lo sindic a lismo re vo lucioná rio , de u m lad o , e pelo
de deriva reformi sta do sind icalismo , Ine re nte à neces sária fun-
modelo soc ial-democ rata (pe lo men os , em sua versão "re voluc ton ârta") , de -.: .:-= cefe sa dos Inte resses imediatos do p rolera rlad o pel a orgarnzaç âo
outro, apresentam um po nto co mu m, que merece ser ressaltado . se u caráter -c . .;. : :: :-:0 ':; disso . defenderam a inda a necessidade da exísrê nc ía de uma
apocalipuco. Seja sob a forma 'd a greve gera l msu rre cíona l ou da tomada do -. polí tica. de inspi ração ou mes mo de cultura anarq uista, guardiã
poder de Estado , enco ntramos nos dois caso s mito da "Grande Non e'", a ":r:-< revoluc toná rtos, distinta ela o rgan ízaç âo sind ical, mas que não
imagem de um alo que instaura um corte radic al-na tempora lidade histórica. por isso desempenha r um pape l di rige nte e m rela ção a esta
no mod elo soci al-de moc rata ). Cf. as relaçõ es ent re a CNT e a
Legrand sair é uma exp ressão que se refe re à noite da re volução social. (N.T.) : ._- -: pré -franquísta.

28 29
freqüên cia, cõrres pond ia exatam ente ao o posto mode lo so- radas , poi s a iden tificaçã o do mo vim ento o perá rio Co m se u
cial-de mocrat a . modelo social-d emocra ta tem sido co ns ide rada ôb ví a.
Em parti cular, de acordo com sua inspira ção ana rquista , o O sucesso do modelo social-d emocra ta do mo vimento o pe-
sind icalismo revo lucionário caracte rizava-se por um antiestatism o rári o é e x p lica do, e m prim ei ro luga r, pela impreg naçào d o
de múltip las facetas : ant ilegalis mo e antipar lamenta rism o ev iden- f etich ismo do Estado no próp rio seio do proletariad o e do mo-
temente , mas também antimilita rismo e antipatrio tismo . De modo vime nto o perário, fetich ism o q ue, co mo vimos, co nst itu i o prin-
mais ge ral, o sind icalism o revo lucioná rio era portador de um es- cípio d ireto r do modelo so cia l-demo c rata.
pírito a ntiau to rítârio , qu e se e nco ntrava es pecia lme nte e m sua Em toda socied ade d ividida em class es, a un idade social toma
desco nfiança em relação a po líticos e intelectu ais, a todos aq ue- ne cessa riamen te a forma de um pod er de Estado formalm ente
les qu e, não fazen do parte do proleta riado e não particip and o de distint o da pró p ria socieda de. Do p o nt o de vista de todas as
sua s lut as cotid ia nas, pretendiam no e nta nto dar-lh e lições o u class es, o poder estatal ap arece , entã o , co mo a única forma de
í-
dirigi-lo , ainda que fosse no se ntido de sua suposta liberação. O .: ornín io de uma evoluç ão social que escapa ao co nt role colet
.,-"] precisa me nte po rqu e a soci eda de e nco ntra-s e di vidi da e m
que nem sempre aco ntecia se m um ce rto antiintelectua lismo nem
sem um pouco de demagogi a obreírista.' ':.a sses sociais com int e resses riva is. E d o ponto de vista das
Por o utro lad o , o sind icalism o revol ucio nári o não pa rava de ':....i5:;es do minada s, esse mesmo Estad o ap arece, entã o , co m fre-
en fatizar a importân cia da edu cação d o p roleta riado. Além do co mo o recurso supre mo co nt ra o excess o d e se us
-;:-: pri os do mina dores .
esforço de fo rmação po lítica e geral levada às o rganizações e
institui çõe s do p ro letariad o, na realida de, toda a ação de ste úl- :"0 modo de p rodu ção ca pi talista, essas ilusões são a inda
timo , se gundo o s indicalismo revolucionári o, devia sempre se r l o=c.:'cadas pelas forma s próp rias ao Estado capi talista. Especifi-
::L7 .:: ::te·
co nc ebida e co nd uzida de tal forma qu e tivesse tam bém, al ém
de se u próprio objetivo, uma extensão pedagógica mais geral, en- _: sua forma de p oder p úblico impesso al, que não pode
sina ndo es pecialme nte aos trabalh ado res a s ó co ntare m co nsigo . ravo rec er o fet ichi sm o de Estad o , sua apa rê ncia de poder
:' : l :''::::'::: 0 acima da socieda de, rep resentan do o
conj un to desta
A aut o-ativid ade do pro letariad o q ue ex prime o princípi o da ação se geral. E as
:;-:.: :-::::l.3ndo os interes ses part icular es ao interes
direta implica va também , pa ra eles , sua au to-edu cação po r meio pouco tem po
.igadas a essa fo rma pude ram em muito
de su a pró pr ia ação: e ra ne la e por ela qu e o p ro le tariado devia · l.-:..-,
plo viés:
no seio do pro leta riado po r um d u
não só to mar co nsc iência de sua ca pa cidade polí tica , mas a ind a
a pre nde r a del a se to rnar mestre e dela se servir co m eficácia. • :::= um lado, o dos apa relhos de inculcação ideológ ica, tais
=::::,) J imprensa ou a escola, pelos quais o proletariado pode
-c: cesvíad o da luta por se us interess es próprio s, sendo co n-
3) As razões de seu êxito ."".:::c''' o pa rticular mente da superio ridade da unidade do
so bre todas as d ivisões de classe o u de parti-
Por q ue o model o social-d e moc rata se imp ôs histori cam en- a: : .; CJ pr ima zia dos o bjetivos "pro gress istas" o u "demo -
[e ao movim ento o perário nas fo rm ações capitali stas oci dentais? sobre os objetivos p ro p riame nt e dos prolet ários.
Em pa rticu lar, por qu e triu nfou sob re se u rival diret o , o s in- .. ::: : ';::0 . 3 legaliza ção debu tante do mov imento
o pe rário,
dicalis mo revoluc ionário? Q uestões que rarame nte têm s ido tra- .:t:s:.:"'..:.:. =-:. .:. resolv er a "q uestão social" por vias pacífica
s: o re-
mas também a reg ulame nta ção do d ireito de
falhou , e ntr etan to . na e :-= -:C3.Ji Z30; o dese nvolVime nto do direito do traba-
O antí au to ruar tsmo do sind icalismo revoluci oná rio
de assistê ncia social (le is sobre as apos enta-
j
\
q uest ão da opressã o secu lar contra as mulh eres. LOnge de se p reocupa
r com h:: . _7.
o problema, o sindicalismo revolucio nário não estava isento de um certo anti- .3:r-l: : ,; -=:-..L-..1 S.). o u me smo uma assistê ncia social já
relativa -
mulhe res ol-
femin ismo , ao conside rar q ue a melhor mane ira de defen de r as =>= ==:::·":)1·"'00 (na Aleman ha, por exempl o); o desenv
era mant ê-Ias a certa distâ ncia da produção .

30 31
II lllO (o u se ja. de "so lução " e statal das contrad ições d o ca-
vímento da habitação social. etc. E co m a integração deb utante
pll ,llismo); most ramos també m po r q ue uma política co mo essa
de um a pa rte do movimento o pe rário na sociedade civil e no
llt ld e levar essa classe (o u, pelo menos, suas camadas o u frações
Estado, a o rgan ização d e estruturas d e ne goci ação iria favo re-
que se encarregam dos interesses do conj unto da classe) a fazer
ce r o processo de bu rocrati zação das o rganizações o pe rárias,
hança com o pro letariado, garantindo para si a hegemo nia no
o apa recimento de "uma burocracia operária" co m interesse s
l' IO dessa alia nça, em últim a análise, objetivando tomar a di re-
rapi damente d ive rgentes daqueles do restante da class e.
,. o do mov ime nto operário.
2. Aos efeit os anterio res se juntaram os ás fo rma paría men - Foi essa hegemo nia que, desde o úhi mo qua rtel do século
tar do Estado, impl icando q ue a ação das forças sociais (blocos 1'.lssado . com a cobertura da ideolog ia socialista (e m toda a di-
sociais com pos tos por alianças de classes, frações , camadas so- versidade de suas variantes , mas pnncipa lrnen te a de inspiração
ciais) (ornasse uma forma estatal, ou melhor, uma forma partidá ria marx ista), as elites polit icas do staf] administrativo e ti C US
implica ndo também qu e o Estado (e particularmente o Parlamen- ult'610gos orgânicos procuraram garantir para si. fo ram eles que,
t?) fosse considerado co mo o lugar "natural" da resolução pací- lorjando uma teo ria política ad hoc, imp useram a idéia de que
fica dos conflitos sociais (da co ntrad ição dos interesses de clas- emancipação do proleta riado passa pela via da co nquista e d o
se) no sentido da b usca de um "equ ilíbrio de com promisso" entre xc rcicio do poder de Estad o . Fo ram eles q ue. e m ligação com
elas. O sufrágio un iver sal, além de explicitamente concebido po r ,.t "burocracia operária" nascente no seio dos movtrnen tos coo-
algu ns de se us prom o to res (po r exem plo. Ga mbe rta, na França ) pcralivos e mutuahstas, mas também das organizações sindicais ,
como um elemento de paci ficação da vid a po lítica , e ainda as suscitaram a forma ção do s partidos socialistas o u social-democ ra-
lu tas para o btê-lo co ntrib uíram especialmente para esse pro ces- \, IS , toma ndo evidente mente sua direção e cuidan do de subordi-

so de in tegração do prole tariado e do movi mento o perário no 11;lr-lhes esses movimentos e o rganizações. Enfim, foram eles que,
jogo insti tuci on al da democracia represent ati va. certos de sua "ciência socialis ta" da sociedade e da histó ria, jus-
. ,. Todos esses efeitos conjugaram -se para [or nar p lausív el a ufícararn o co njunto desse pro cesso de ca ptação do poder pelos
id éia de qu e a so lução dos proble mas e nco ntrad os pela luta de pretensos " intelectu ais revo lucionários" (i sto é, po r seus pares) ,
cl asse do proletariado, e até a vi a de sua emanc ipação , encon- (micos aptos a gui ar o pr ol etariado em sua luta de classe, por
travam-se no Estado ; e que conv inha, então , dar forma po lít ica serem os ún ico s capazes de lhe fo rn ecer uma co nsciê nc ia de
(o u melhor, estatal) a ess a luta. classe adeq uada . Em resumo, fo ram eles qu e " invent aram" o
mod elo soc ial-democrata do movim ento operário , não algu mas
Mas o fetichismo do Estado jamais pod eria garantir uma in -
de suas formas o rgani zacio nais, institucion ais e ideo lóg icas que
fl uência com o essa no mo vime nto operário, se não tivesse en-
muitas vezes lhe preex istir am, mas sua articula ção orig inal em
co ntrado um intermedi ário de q ualidade na person ifi cação da
classe do slag- admin tstrauuo. Po is o triunfo do mode lo social- tor no do princípio estati sta.
No en tanro, é p reciso reconhecer que os d ois fato res prece-
democrata do mo viment o operá rio não pode ser compre end ido
dentes revel am limites que o desenvolvimento da auto-ativid a-
sem a intervenção dessa úl tima no mov im ento operário.
de do proleta riado pode encontrar, e mesmo contradições estru-
Mostramos, em outra pu b líca ção", qu e os int eresses pró pr ios
turais que ele precisou ultrapassar e nas quais pode tropeçar. Dois
do stag-a dm inistrativo ( mo dernizaç ão ca pita lista da soci edade
[at ores suple menla res refo rçariam essas dificuldades. T rata-se:
de seu desenvolvime nto econômico e
de sua di reção política , de moc ratização de suas estruturas e • de um lado , de u m caminho especí fico (Ornado pela luta de
part icu lar mente . dos apa relhos de Estad o ) leva m essa classe ; classes nas for mações capita listas ocidentais, após a Prim eira
apoia r, e até a impulsionar, um processo de estariza ção do capita- Guerra Mundial , do qual iriam resultar a possibi lidade e até
mesmo a necessidade de um comp romisso en tre o capital e o
proletariado, cujo quadro sócio-insÜwcional garantiu O tri un -
• cr. Entre bou rgeo tste et p rotétarta t. t'encaarement cap uauste• o p . c irI . , es pe _
clal meru e os capítulos VI e VII.
fo definitiva do modelo social -democ rata;

32 33
• de outro, da transform ação da composição do proletariado
no plano "técnico" (socío proflssíon al) co mo no
político, com a tendência ao desaparecim ent o do operário de
ofiClO: fig ura hegem ônica no seio do pro letariado até a véspera
da Pri meira Guerra Mun dial e ato r chave do sindicalismo re-
e a emergência do "operá rio-massa "que , ao (00-
trário, fornecerá os enormes batalhões das o rganizações de tipo Capítulo Il
social-democrata.

seus efeit os não se tenham manifestado plenamen-


te após o período histó rico que nos interessa diretamente
aqui 0 880-1930) , podemos avaliar retro specti vamente q ue esses
d OIS fatores, além de ligados estreitamente entre si, já atuavam o COMPROM ISSO FORDISTA
n o curso deste e nele desempenharam um pape l importante. Va-
m os ab ordá -los deta lhada rnente nos pr óximos capítu los.

o con ceit o defordismo nasceu


dll'" tra ba lhos de uma e qui pe de economistas franceses (M.
AHlicll a, R. Boyer, A. Lípie tz , etc.), reali zados a partir da segu n-
tl l metade da década de 70 para analisar o mod elo de desen-
vulv lmento seguido pejo cap itali smo ocidental no período pós-
uer ra. Co mo claramente indica a denomi nação que acabo u lhes
I mio atribu ída - "escola da regulaçào "- , esses economistas
i.ivam fundame ntalmen te preocupados em comp reender como
ti ra pita lis mo ocidental pudera conhecer três décad as de cres-

, uncnt o econô mico quase ininterrup to , mas também por que os


t1U' n lnismos reguladores q ue haviam tornado possível esse cres-
, nncnto pareciam agir no vazio .
Pod e-se d izer também q ue o co nce ito de fordi smo é co m-
prom etido pelo econom icismo. Isso se reve la espedalm en te
11 lo privilégio atrib uído, sistematicame nte, em suas análises, às
u.uisforrnações econômica s, em detriment o das tran sforma ções
oc rais, in stitucionai s e ideológ icas do cap italismo pÓs· guerra ;
o b retud o po r u m relativo d esconh ecimento do pr ocesso da
IUI:! de classes que, sozinho , explica, em úl tima aná lise, o nas-
I lI11 CmO , a din âmi ca e a crise final desse mod elo de desen vo l-

vuue nto .

34 35
Ao co ntrário, na pe rspectiva que adota mos aqu i, é p rinci- Em terceiro lugar , esse com pro misso nã o se deu d iretarne n-
pa lmente por es se processo q ue vamos nos Interessa r, a pa rtir 14 ' en tre os mem bros das próp rias classes, mas entre int erm e-
da seguinte hipótese di retriz: o mo delo de de sen volvimento que di ários orga n iz ac io na is e in stitucion ais que lhes serv iram de re-
o ca pitalismo ocidental p ós-guerra seg uiu foi funda mentalmente prese ntanres o ficiais, adqu irind o o u reforçando esse sta tus nes-
co ndicio nado pel o co mpromisso entre bu rgues ia e prole ta ria- ,I ocasião: o rga nizaçõ es sind ica is e po líticas d o mov imen to

d o em que a p recedente c rise es trutu ral dos an os 30 e 40 de- o perário , de um lado, o rganizações profissiona is do patrona to,
sem bo ca ra. de outro, co m o Estado en tre ela s, p resente ao mesmo tem po
como juiz (responsável, árbit ro) e co mo parte interessada: fica-
1Ii\ encarregado de co locá-lo em prática visand o ao interesse ge ral
1) Os termos gerais do compromisso do capita l, cuidando par a que fosse apli cad o e res pe itado por
meio das o rga nizações re prese nta tivas de cada uma da s du as
Ce rta me nte não se deve comp reende r um comp rom isso classes em luta. Co nseqüe nte me nte , a for ma acabada e oficial
co mo esse co m base no mode lo da relação contratual en tre doi s desse co mpromisso foi a alternâ ncia, na direção do Esrado , de
ind ivíd uos, tal co mo é codificada pe lo direito civil: ele não é coalí zões do minadas às vezes por pa rtidos social-dernocra tas, ou-
resultado de duas vontades livres, que se engajam rec iprocame nte tras vez es por partidos "bu rgueses".
de man eira clara e refletida uma em relação à outra. Em último lugar, finalmente , esse co mpro misso não aca bou
Em prime iro lugar, esse co mpromisso foi imposto a cada um ro rn a luta de classes, co m o en frent amen to entre o prol eta riado
dos dois pro tagonistas pe la pró pr ia "16gica" do des envo lvimen- c a burguesia . No máx imo, ele te rá circunscrito a d isputa à ins-
to a nte rio r do cap italismo . Do mesmo modo qu e o foi, po r ou- r.i ura çáo do compro misso , defi nição de seus [e rmos e ti de -
à

tro lado , pelo equilíbrio relativo na relação de forças entre bu r- limitação de se u ca mpo de apl icação .
gu esia e pro letariado que ac abo u se instau rando no final de dé- Rer rospc crivarne nre, e co nside rando-o do po mo de vista do
cadas de lutas , cujo curso ge ral e vicissitudes particu lares co ns- prolcranado, esse co mpromisso pode ser com parado a uma espécie
tituíram a história p rópria de cada formação nacional durante a de imensa ba rga nha, pela qual o proletariado renunci ou à "aven-
primeira metade deste sécu lo .I tura histórica" em troca da garantia de sua "seguridade social".
Em segundo lugar, mesmo onde foi oficial e d eclarad o (es - Re nu nciar à "ave ntura his tórica'? É ren un ciar luta rev olu -
ã

pecialmente nos países da Europa setentrional), esse com prom is- cio nária, à luta pela tran sform ação comunista da soc ied ade ; re-
so res ultou de um processo m u itas vez es cego e, p ortanto, ta m - nu ncia r à co ntestação à legi timid ad e do poder da classe domi-
bé m ilu s ório para se us pr otagonistas. Ele ve io sanciona r certo es- na nre sobre a soc ied ade , es pecia lme nte sua a pr opriaçã o dos
tado da relaçã o de fo rças e ntre as duas classes, dep ois de áspe - meios sociais de produção e as finalida des assim impostas às
ras lutas, no final de multo tem po de incerteza , não foi o resu ltado forças produtivas. É, ao mesmo te mpo, aceita r as novas fo rmas
de barganhas e discussões em torno de uma dispu ta clara. As ne- capitalistas de do minação que vão se desenvolver pós-guerra, ou
gociações entre protagon istas 56 se produz iram mais tard e, para se ja, o conjunto das transformações das co ndiçõ es de trabal ho e ,
ocupa r o "espaço" aberto pe lo co mp romisso , para administrar em sentido mais amplo, de existência que o desenvo lvime nto do
suas con seq üên cias e fixa r suas part icu laridades, capita lis mo vai impor ao proletariado ne sse período .
Em contra p artid a a essas re núncia s, o proletar iado ob tinha
a gara ntia da seg urid ade soc ial. Quer dize r, não s6 sua assistên-
I Evide n tem e n te , é Impo ssíve l d ar co nta aqu i das especificidades na ctonats cia soc ia l, mas no se ntido ma is amplo, a satisfação de se us inte-
do comprom isso fordis ta, tant o do pon to de vista de suas co nd içõ es de es- resses de classe mais imedi a tos e, portan to, também mais vitais:
rabelecírnem o (l igad as às especificidade s da s hist óri as naciona is) , qu an to do
d e vis ta de suas imp licações e conseq üên ctas soc iopolilicas (em p ar-
lima relat iva est abili dade de em prego ; um crescime nto de se u
ucular no s b locos begemõ ntcos no se io dos qua is esse co mpro misso se de u "níve l de vida"; lima red ução de se u tempo de trabalho; a sa-
e que d e co ntrib u iu pa ra solda r) . tisfaç ão de um certo núme ro de suas ne cessidade s fundarnen -

36 37
n.ulos, e m ce rta medida , o dire ito de neg ociar as co nd içõ es de
tais ( hab itação, saúde , e du ca ção, formação profiss iona l, cu ltu- Il ,l domi nação . De o utro, essa d o minação só se rá reconhecid a
ra, la ze r, e tc .) . I orno legítima pe lo prolet ariad o à medida qu e garantir a realiza-

Em resumo, é a pe rs pectiva de sa ir da miséria, da instabili- \, () de se us ínreresses imediat os. Em ou tras palavras, o compro-
dade , da incerteza do futuro e da o pressão desen frea da , qu e ba- IIll!'iSO fordista só podia ser re novado e nq uanto o pró prio mede-
sicame nte caracterizaram até aqu ele mome nto a"con dição pro- 111 de desenvolvimento d o ca pitalismo oci de ntal q ue el e tor na-
letária . É junt amente a garan tia de adq uirir d ireitos, não só for- 11 ,_ pos síve l fosse viáve l.
mais (direitos cívicos e políticos) mas reais (direitos sociais) , cujo
respeito seria garantido pe lo Estado , e de ter acesso a uma vida
- se não agradável, pelo me nos su portável (aceitável). l ) Compro mi sso fordista e dinâm ica do capitalismo
Finalmente, assim poderia ser resum ida a ambi va lên cia do
co mp ro m isso fo rdista para O proletariado ocid ental : este perde, A parti r d o ú ltimo terço do século XIX, as co ndi ções de
co m e le, sua negatiuida de de "classe da sociedade civil que n ão exploração capitalista tend em sensivelmente a se tran sfor mar no
é um a classe da sociedade civi l, C.') de esfera qu e p ossui um seio da g rande ind ústria . Surgem d ois novos princíp ios de or ga-
cará ter unive rsal po r seus sofrim entos universais e não reivi ndi- nízação do processo de traba lho , q ue se ge ne raliza rão no co n-
ca um d ireito particula r'? e q ue po de, en tão , pensa r em liberta r [unto da ind ústria ca pitalista :
to da a humanidad e , ao se libertar de sua própria opressão; e isso ,
• o taylorism o, te rmo de rivad o do nome de seu inventor, o
para se a firma r positiva mente no qu ad ro dessa sociedade, no
engenhe iro a me ricano Taylo r (1865-1915) , basead o na estn-
limite dos inte resses e dos dire itos pa rticulare s que ela reconhece
la sep araçã o ent re as ta refas de con cepção e de ex ecu ção,
co mo dele e lhe permite satisfaze r. Assim se rá roda a amb iva-
aco mpa nhada de uma pa rce lizaçào da s últimas, de ve ndo cad a
lência da legalização d o prol etar iado q ue o compro misso fordista
o pe rá rio, e m ú ltim a aná lise , executar a pe nas algu ns gestos
to rnará possíve l: o Estado propo rc io nará satisfação ou suste nta-
çào a a lgu mas d e suas reivind icações na exata me d ida em qu e elementares;
• po r ou tro lado, co m bas e nos princí pios taylo ns tas , a me -
isso lhe permitir melhor integr á-lo na so ciedade civil e po lítica
can iz ação d oprocesso de trabalho, um verdadei ro siste ma de
e, po rtanto , melhor co ntrolá-lo .
máquin as qu e ga ra nte a unidad e (a re composição) do pro-
Mas esse co mp rom isso não será me no s a mbí vale n te para a
cesso de traba lho pa rce lado , dit ando a cada o pe rá rio seus
classe do minante; po is, e mbo ra e le lhe dê uma trég ua, la nça-lhe
tam b ém um des afio . Se m d úvida, permite-lhe sa ir da "zo na de gestos e sua cadê ncia (se nd o se mpre a cade ia de mo ntagem
a fo rma extre ma desse princí pio) . É o que poste rio rme nte
te mpesta des", es capa r da ameaça permanente so b a q ua l a ag i.
será de no minado "fo rd ismo", tendo sido He nry Fo rd o pri-
raç ão revol ucio n ária a fize ra vive r no cu rso das déc adas ant e -
meiro a introd uzir, a partir de 19 13, uma cade ia de mon tagem
rio res. De fato , esse co mp romisso permite à burgues ia neutrali-
em suas ind ústrias au to mobilí sticas de Det ro ít.
zar em boa pa rte o co nflito p ro letário , ao fazer da satisfação da s
necess idades fundamen tais do prolet ar iado não só fonte de sua Para o ca pital, po r um lado , trata-se de se aprop ria r do as-
legitimidade, co mo ta mb ém o próprio moto r do regime de acu- pecto intelectual do trabalbo operário, d o saber e da ha bilidade
mulação do capital, co mo ve re mos mais adia nte . até en tão req ueridos pe la manip ulação da ferramenta ou mesmo
E é exata me nte por isso que esse com promisso lança tam bém da máqui na, q ue o o pe rário de ofício possu ía e ass umia co m
um desa fio à classe dominante . Po is, de um lado, e le implic a que o rgulho e nos q uais ele se ap o iava pa ra co ntesta r o co mando
sua d o min ação nà o seja absol uta, que ela reconheça aos do mi- ca pita lista so bre o proce sso de traba lho . No tay lo risrno e no
lo rd ism o . ao co ntrário , o sabe r e a habilida de o perá rios te nd e m
1 K. MARX , Contrtbutcton à la crtuq ue dela p õttosopõ te b égélíenne du arott, a se r mono polizad os pel o stajJadmi nistrativo ou até mesmo a se r
tra du ção fran cesa de M. RUBEl. , Par is , Ga lt ima rd , "Btblt o tb êq u e de la d iretame nte incor po rad o s ao sistema de máq uinas , provocando
Pléiade ". tern o m, p. 396.

39
38
a expropriação dos o perários e m relação ao domínio do processo p rodut ividade , iria se choca r ime diatam ent e co m u m enorme
de tra ba lho e uma maior de pendência em relação à organização obstácu lo . Por definição, ele tende de fato :
cap ita lista do trabalho / _
Os operá rios de ofício não se d eixaram e nga na r com isso , .. por um lado , a inchar a demanda de meios de produçã o,
lutaram pa sso a passo contra a int rodução desses princípios de pela conve rsão de uma massa cresce nte de mais-valia e m ca-
organ ização d o pr oce sso de traba lho . Fo i pr e ciso es pe rar as pital constante (e especia lme nte fixo: máq uinas, instalações,
s ituaçõ es de exceção e ngendra das pel a Prim eira Guerra Mu n- etc.) adic iona l, únic o meio pa ra aumentar a produtividade do
dial (p ermitindo a ce nt ra lizaç ão do co ma ndo ca pita lista, a mi- trabalh o;
litarização da s ind ústrias de a rma me nto , o apelo à mâo-de-obr a • por outro , a lim itar a demanda de meios de consumo (es-
femin ina ao f!l esm o te m po menos qu alificad a e menos com- pecialme nte de meios de co nsumo essenciais ) em relação à
bativa), ass im co mo as pe rdas das ofe nsivas operá rias logo após ca pacidade de produção que se a.c umu la nesse se tor.
a g uerra , para q ue esses métodos de o rganizaç ão d o tra balh o Em ou tras palavras, a acumulação co m ca racterística domi-
pudessem generalizar-se durante a dé ca da de 20. Foi e ntão co n - nante inte nsiva tende a d ese nvolve r as fo rças pr odu tivas da
tornando o movime nto operário da Belle Epoque, estrut urado so ciedade sem levar e m conta as p roporções a sere m resp eíra-
e m to rno da figura do o perá rio de o fício, ap elan do par a um das entre os diferent es ramos da produção social, nem tampou co
neo p rolet ari ado de mu lhe res, de tra ba lhado res ru rais e de imi- a capacidade tota l d e co nsumo da soc iedade: de ma nda so lven te.
grantes qu e o taylor ismo e , de modo mais amplo, o fordism o Ela co rre pe rma ne ntemente o risco de dese mbocar em u ma cri-
puderam ser intr odu zidos. se de superprodução , de vido a uma insuficiência de meio s de ga-
E essa consolidação da dominação do capital sobre o proces- rantir a venda de produ tos.,1
so de trabalho vai pe rmitir, por outro lado , a intensificação da ex- E foi exatame nte o que -aconteceu nos an os 20. No curso des-
plo ração da força de trabalho ope rária. A parcelização do traba- sa década, co m baseem um a prime ira o nda de taylorização e de
lho ope rário permite au mentar a dest reza de cada operário, su a mecanização fordista , a produtividade d o trabalho cresce e m
habilidade na execução de alguns gest os elementar es, mas tam- ritmo extraordi nário, em uma média d e 6% ao ano nas econ omias
bém reduz o "tempo morto"; e m resum o, aumenta a inte nsidade ca pitalistas ocid entais (principalme nte nos Estados Unidos), rom -
do traba lho. Quanto ã mecaniza ção fordi sta do trabalho, acentua pe ndo com o fraco crescimen to da o rde m de 2% que co nhece ra
também esses,efe itos, mas seu objetivo específico é aume nta r a até entào . Mas, simultaneamente , po r sua vez , os sa lários ope-
produtividade do traba lho operário propriame nte dito . rários co ntinuam a crescer em méd ia ape nas 2%, seguindo a lon ga
Assim se instalam progressivamente as co ndições de um nov o tendência iniciada em meados do século XIX. Nessas condições,
regime de ac um u lação do capita l. O regime anterior e ra de ca - os lucros pode m a ting ir picos histó ricos (da ordem de 30% a
racterística don\inante extensiva, ba se ado e ssencialmente na 35%), le va ndo a um "boom espec ulativo" sem precede nte s e n-
fo rmação da mais-valia ab soluta : na ext ração d o traba lho ex ce - tre 1926 e 1929. Esses "anos loucos" iriam desemb ocar, entretanto,
dente pel o simples prolongamen to da du ração do trabalh o alé m ine vita velmente no crash de 1929-1930, exp ressão direta no
do te mpo de traba lho necessár io e pe lo aume nto de sua inten- plano fina nceiro da cresc ente disto rção entre as capacidades de
sidade . A ele sucede um regime com ca rac te rística d omi na nte produ ção acumu lad as e a de ma nda so lve nte , que ess a p rimeira
intensiva, prioritariamen te orientad o pa ra a fo rma ção da mais- tentativa de um regim e com carac te rística dominante intensiva
/ valia relativa: o au mento do trabalho excedente pe la dim inuição não so ubera desenvolver proporcionalmente.
do tempo de trabalho ne cessário ã re p rod ução da força de tra- A crise dos anos trinta ma rca , então, os lin--ü tes da o nda de
balh o d o proletari ad o , graç as ao aumento contín uo da pro- ac u mu laç ão co m ca rac terística dominante intensiva d a década
du tiyjdade média do traba lho social. de vinte . Esta , e m última an álise , fo i bloqueada pe la taxa de ex -
( Mas esse novo regime de acumulação inte nsiva "do capita l, ploração demasia da mente elevada que a tornara possível: por
ba seado na busca e obtençã o incessant es de nov os ga nhos de um cres cime nto dos sal ários reais insuficien te para equ ilib ra r a

40 41
acumu lação do ca p ital poss ibi litada pel o cre sc ime nt o abusivo A divisão d os ganhos de produtivid ade sup unha , de q ualquer
dos lucros . ma neir a, p rofundas transfor mações da relação sala rial: ou se ja,
Assim , essa crise, q ue ia se estend er funda me ntalme nte até das co ndições econômicas, sociais e jurídicas q ue regia m a tro-
logo apó s a Segu nda Guerra Mund ial, co locava bem em ev idência ca e o uso da força de trabalho do p rolet ariad o no pro cesso de
qu e um regime de acumu lação co mo aquele só é viável co m a trabal ho e também sua re prod ução fora desse processo , Espe ci-
co nd ição expressa de q ue o cresc ime nto dos lucros possibilita- ficamente , era preciso : J
do pelos ga nhos de produtividade se ja aco mpanhado de um cres- • garanti r a todo o perário um salá rio mín im o, correspo nden-
ci me nto p roporcional dos salários reais (p ortanto do "poder de te a uma norma de co nsumo co nsiderada irredutível; e sobre-
co mp ra" d os assalariados); em o utras pal avras, com a cond ição tud o um crescimento dos salários reais, por me io da indexação
de que os ganhos de produtividade se di vidam "eqü itativa men - d o salário nominal aos preço s (instituição da "escala móvel de
te " entre 'salários e lucros." salários") e levando em co nta, implíc ita ou explicitamente, os
Foi o que lo go co m pree nde ram os cap ita listas modernista s, ganhos de produtividade previstos na empresa, no ram o o u
e ntre os quais Hemy Pord, que não hesitou em pa ssar O salário mesmo em toda a econo mia naci onal; o que significava am -
diário de seus o pe rãrios de 3 para 5 d ólares ao mesm o tempo em pliar a norma de co nsumo do proletariado no ritmo d o de-
qu e intr oduzia, por outro lado , o trabalho e m ca de ia; se g unda se nvo lvime nto da produtividade do trabalho social;
razão de ligar se u nome a esse regime de acumu laçã o. Mas , no • instituir p ráticas epro cedim entos de negociaçã o coletiva por
co ntexto po lítico e ideo lógico da dé cad a de vinte , isso significava ramo s e em nível nacio nal, chegando à adoção de co ntratos
p regar no deserto . coletivos co m força co nstra ngedora para os age ntes econô mi-
Para pressionar a classe domi nante e co nve ncê-Ia a adotar o co s indi vid uai s (emp regado res e assa lariados) , de modo a
dispositivo insÚtucional suscetível de ga rantir a d ivisão dos ga n- permitir o controle pactuado (entre pa tro nato e sin d icatos su-
hos de produ tividade en tre salários c lucros, único me io de regu- pervisionados pelo Estad o) da massa sa larial global;
lar o reg ime de acumulação com característica d ominante inten- • pa ra gara ntir a regu lação da acum ulação intensiva (a conti-
s iva, foi preciso uma série de fato res: a ter rível experiência da nu ida de de seu processo de circula ção e, po rtanto , de seu pro-
"grande depressão" dos an os trinta; as lutas reso lutas do pr olet a- cesso de prod ução), instituirum salário indireto (ou sa lário
riado pa ra imp or reformas da relação sa larial tão essenc iais q ua nto soc ial) financiad o po r recolhim ent os ob rigatórios (im po stos el
a institui ção de um salário mínimo , a co nc lus ão de aco rdos co le- ou co tizações so ciais) ; o u se ja, um co njunto de bene ficios
tivos, a introdução dos primeiros elementos de sa lário indireto (se - sociais (e m es pécie ou in natura), co loca ndo o ass alariado e
g uros sa úde e ve lhice ); a vitória de forças políticas (o blo co os se us ao abrigo d os acasos naturai s ou sociais da existê ncia
rooseveltiano nos Estad os Unidos, a so cial-democracia na Euro pa (doença, invalidez, desemprego, ve lhice , sobrecargas ligad as
se tent rional, a Frente Popular na Fran ça) suste ntadas eleitoralmente ã ed ucação das crianças), ga rantindo-lhe a possibil idade de
pelo p roletariad o e capazes de impo r refor mas de es trut ura co mo rep rod uzir sua fo rça de trabalho (d e acordo com no rmas so -
essas; o co ntexto de am pliação e de aprofundamento da dem ocra- ciais determinadas ) e m to das as circunstâncias.
cia po lítica ligada à luta vitor iosa contra o fasc ismo; e nfim , os im-
pe rat ivos eco nô micos e soc iais da reco nstru ção d o períod o pós - Assim, se , de um lado , co loc ar em prática o modelo téc nico-
gue rra , acompanhada de uma no va o nda de luta s o perárias. o rganizacio nal da acumu lação intensiva su punha a aceita ção pelo
proletar iado da dominação do ca pital sob re o processo de traba-
lho (e de ma ne ira geral sobre to da a socie dade) , inversame nte ,
j So bre as co ntrad ições da acurnula ç âo do capital que leva ram à crise da dé- 3. reg ulação desse mesmo reg ime de ac umulação não só torna-
cada de 30, cf R. BOYER, " La crise actuelle : une míse au paiol co perspectíve ',' 3. possível, mas também necessária a satisfação de alguns de seus
hís to rtqu e" in Critiques de t économie po íittque . n. 7/ 8 , Paris, Masp éro . p. 31-
42 ; e LORE NZI , PASTRE, TOL ED ANü , La c rise du X.\"" siê cl e, Pari s,
interesses mai s imediatos: aqueles ligados pre cisamente à su a
Eco no rnlc a. 1980, p . 70-100. "se guridad e social" no sentido em que a inte rpretam os ante rio r-

42 43
mente . Em outras pa lavras , a acu mu lação com ca rac te rística que essas organizações se instituí ssem, cada uma em se u
domi na nte intensiva só podia de se nvolver s ua dinâmica de ex - nivel e em seu campo de atividade p rópria , diant e dos ca pi-
pa nsão co m base no quadro institucional definido pel o talistas ind ividua is, mas também diante de toda a classe ca-
co mp romisso entre bu rgues iae pro letariado , cu jos traços essen- pita lista , enfim perante o Estad o , co mo medi açõe s obrigató-
ciais es boça mos a nteriormente.' rias e m sua relação com o proletariado. O que imp licava a
conquista de sua legitimidad e co mo med iadoras, e o reconhe-
cime nto de se u papel pel os dive rsos protagoni sta s;
3) A integração do movimento operário • q ue essas organizações fossem assim progressivam ente in-
tegradas aos ap arelhos de dominação do capital so bre o pro-
Por e la, entendemos o processo pelo qual o moviment o ope - letariado e sobre 'toda a soc iedade (des de a empresa até o Es-
rário torna-se um a engrenagem do poder capitalista , inclusive em tad o), tornando-se ve rda deiros co-g esto ras do process o glo-
s ua capacid ade de se op or a e le e de limitá-lo . O qu e significa bal de reproduçã o do ca pital.
que , ao mesm o tempo que está fundament almente subordinado Em ce rto sentido, uma integração co mo essa não pôd e se pro-
ao co mando do ca pital, co nserva uma auto no mia em relação a
duzir se m o apoio, mesmo que parcial e co ntraditório, do próprio
ele. A inte gra ção do movimento o pe rário re p resenta assim uma pro letariado. De fato, ela terá correspondido ao qu e poderíamos
est rutu ra o rigina l do pode r ca p ita lista , d ifere nte ta nto de s ua cha mar a "estra tégia de integra çã o " ma joritariamente ad otad a
forma libera l cláss ica (na qual o mov iment o o perá rio é ex cluído pelo proletariado ocidental no qu adro do co mpro misso ford ista ,
de qu alqu e r pa rticipação da s estrutura s de co mando do capita l) q ue consistia basica mente em ampliar e apro fundar, por meio de
como de su as formas corpo rativistas, por e xe mp lo, fascista ou suas lutas, o comprom isso estabelecido co m a classe dom inan te.
populista (nas qua is o movimento oper ário é ce rtame nte integra- Inicialmente , pa ra ampliar se u campo de ap licação . No qua-
do a e ssa s est ru tu ras , mas p rivado d e qualqu er a uto nomia , d ro ge ral desse com promisso, foi nos seto res que se rvira m de
mesm o apa rente). motor à acumu lação inten siva <por exemplo, a indú stria auto mo-
Um p ro cesso como esse to rnou-se necessário devido a o
bilística, a fabricação clcrromc cânica, a meta lurgia, etc.) que a luta
co mpromisso fordista e ao regime de ac um u lação intensiva do
proletá ria pô de ; e m primeiro lugar, obter vantagens e adquirir ex-
ca pital a que ele de u orige m. De fato estes su punha m: per iê ncia e m benefício de ce rtas ca madas p rivilegia das do pro-
qu e as orga nizaçõe s co nst itutivas do mo vimen to ope rário letariado. A "estratégia de integração" consistiu aqu i em estende r
(pa rtidos, sindicatos, associações) impusessem a negociação dentro de ce rtos limites, pela aç ão sindical e política, essas van -
coletiva como modo de so lução dos co nflitos de classe ta n- tagens e ex pe riênc ias a ou tros setores da classe , suje itos a uma
to à sua/base pro letária quanto à classe do mina nte em suas relação de forças men os favorável.
di, /ntes instâ ncias de comando ; Do mes mo modo, duran te todo o período fordista, o prole-
tariado não pa rou de lutar para mel horar, a se u favor, os te rmos
4 Se m d úvida, a regulação da acumulaçã o com ca racte ríst ica dom inan te inte n-
do compromisso : para aume ntar sua parte na d ivis ão do "valor
siva, e co nseq üe nte me nte o for dismo co mo mod? de desenvolvimento do ad icionado"; para dim inui r se u tem po de traba lho ; para gara n-
ca pita lismo , req uereram OUl, d S co ndições ímpo na ntes. e ntre as qua is é pre- ::r. par a si, uma me lho r assistência socia l e , de modo geral, um a
ciso ass ina lar a instituição da moeda de c réd ito (co m o s iste ma bancár io =--= sponsa bilizaçã o mais com pleta , por pa rte da so ciedad e e do
cor res po nde nte) ; o papel regulado r do Estado (no q uad ro do qu e se te m
Estado, etc. por suas necessidade s co letivas. O que, por sua ve z,
ma is o u men os imp ro p ria me nte de no mi nado as po líticas ke yne sianas) :
e nfim, a hegem o nia ame rican a' gart.m undo um siste ma mo ne tário inte rna cio- r; quadro desse co mpro misso , tornava necessár ia a integração
nal estável (pe lo me nos , até a segund a meta de da d écada de 60) . Mas , po r .:-= suas o rganizações rep resentativas às estrutu ras de co ma ndo.
mais impo rtantes que fo sse m, toda s es sas co ndições era m sec undá rias em : :- cap ital. lima ve z que e las co nstituía m ta mbé m estruturas
relaç ão à qu estão social q ue acabamos de definir C' cuja tnstuu tçâo só o com- ;--:::::1anentes de (re) negoc iação desse co mpro misso .
promisso en tre burgues ia e proletariad o permitiu e ga rantiu .

44 45
Mas , por o utro lad o, através d e s ua integ ração, ° mo vime n-
b ítro dos confl ito s que nele pudessem su rgir, a um Estado inserido.
to ope rári o se ria prog ressivamen te trans for mado e m estrutu ra
qu e interviesse d iretamente nesse "jogo" para definir suas regras.' A
mediad ora do comando cio cap ital sobre o proletariado. Foi as-
°
sim qu e , ao lo ngo de todo período fo rdista, as organizações sin-
finalidade gemi d essa in terve nção cresce nte d o Estado , qu e teria
ca racte rizado o pe ríodo ford ista, e ra apenas garantir o estabeleci-
dicais e polít icas te ntaram canal iza r a co nfl itualid ad e proletária,
men to e a consolidaç ão dos termos do compromisso. E é com esse
p ro pond o -lhe e/ o u impondo -lhe objetivos e perspectivas com-
objetivo q ue o Estado tomar-se-á o ve rdadeiro mest re-de -obras do
patíveis co m o s ter mos do d ito co mp romisso, e co mbatendo vio-
processo de reprodução do capital, encarregando-se de fun ções tão
lentamente qualq uer te ntativa de explosã o do qua dro desse com-
diversas co mo estas: a produção de de terminados meios de p rodu-
p rom isso . Po r exemplo, as o rga nizações s ind ica is responderam
ção (por ex emplo , as infra-estruturas industriais ou a p rodução de
às lutas, que algum; elemento s d o pr oleta riad o oci de ntal conti-
ene rgia) o u d e co nsumo (os eq uipamentos e se rviços co letivos); a
nu aram a co nd u zir contra sua exp ropri ação crescente e m relação
reprodução d a força social de traba lho , ao ge rir o co njunto da rela-
ao pr ocesso de trahalho , co m reivindicaçõe s relati vas ao s sal á-
ção salarial; a regulação da acumu lação (p or suas políticas monetá-
rio s, cla ssificações, ca rreiras , et c., tornand o -se ass im aliadas, se
não cúmplices das direções cap italistas . Além disso, o mov imento ria e o rça mentária); enfim, a animação e o enquadrame nto pe rma-
o pe rário nã o po d ia se integ rar às estr utu ras de co mando d o ca - nentes do "d iálogo social", esforça ndo-se para manter um "eq uilí-
pital , se não co m a condição de provar sua capacid ade de "e nq ua- hrio de co mp romisso " entre "parceiros soc iais".
drar" o proleta riado. Nessas co nd ições, o exercício do poder de Estad o só podia
Assim , se em ce rto se ntido a integração d o movi me nto o pe- pa recer aos d ive rso s protagonista s d o compromisso fordi sta o
rário es tava de aco rdo com a estratég ia ma joritariame nte seguida meio pri vilegiado de mudar se u ru mo em di reção a se us pr óprios
pelo 'p ro letariado oc ide n tal dura n te a fase fo rdis ta , ao mes mo inte ress es. E isso era ainda ma is cert o pa ra o p ro let ariad o , pois
lcm ryo tra nsfo rmava suas orga ni zações e m "c ães guarda" d o os termo s do co mp ro misso tinha m reforçad o sua depend ência
ca p ital, a pa rtir do mo me n to em que o p ro let a ria d o tenta va p rát ica e id eol ó gi ca e m re laçã o ao Estad o, fa zendo d e ste o
rc dixcutir os te rmo s d o pró pr io compromisso fo rdista . instituidor e a ga rantia de sua "segu rida de social", O esta tismo
A inte gra ção d o mo vimento operá rio inere nte a esse co m- natu ral d o movime nto o perá rio de inspira ção social-d emo crata
p ro misso e ra e ntão um processo profundnmen te co nt rad itório. de via, ass im, necessariamente se r reforçado co m o s efei tos feti-
E essa co n trad ição vai fo rjar o destin o' cio mo d el o soc ia l-de mo- chistas d o Estado , q ue o co mp ro misso fo rdista não podia deixar
crata d o mo vime nt o o pe rário du rant e esse p eríod o : e m bo ra de d esenvolv er em seu se io, ass im co mo no seio de sua própria
te nh a mar cado seu ap og eu , garantind o seu triunfo d efinitivo , o base so cial.
com pro misso e m q uest ão marcari a ta m bé m se us limi tes, con- Simultaneame nte , as/armas de orga n izaç ão d o pr o letariad o
du zin d o- o à via do decl ín io L , e m pa rte , até da d egen era ção . p ró p rias d o mode lo so cia l-democra ta do movimento o perá rio
A id éia de q ue a co nq u ista do pod er de Estado permite , se enco n trara m na int egração d este último as co nd ições de se u
não se liberar do jug o do ca pita lismo, pelo me nos ali viar se u dese nvolvime n to pleno . O cará te r p ro priame nte es tratég ico da
peso, só podia recebe r u m grande refo rço no contexto socio- co nq uista e d o exe rcício d o poder de Estado just ificava ao mes-
ins titucio na l d o fo rd ismo. Assim , en co nt rava -se apare ntemen te mo te mp o a existê nc ia d e partido s políticos de massa , represen-
co nfirmad a e co nseq üe m c me ruc reforça da a legitimidade do [ando os interesses do mundo salaria l (m istu rando o proletaria-
estatismo co ns titutivo do p roje to e da estrat égia d o mode lo so- do co m o staff adm inistrativo), suas p r áticas legalistas (e le ito-
cia l-demo crata do movi me nt o o p e rá rio , ralisrno , parlamentar ism o , jurid icídade) c , po r fim, ev idente men-
É qu e o co mpro misso fordista torn ava ne cess ária a passage m- :e, sua preeminência sobre as organizações sind ica is.
de u m Estado circunscrito, aparentem ente co lo cad o e m situacão
d e exteri oridade em rela c ào ao livre "jogo " de mercado e da so cie-
Tomo emprestado os con ce itos de Estado ctrcunscrttoe d e Estado inserido
d ad e civil, simples garantia do respeito às regras desse "jogo" e ár- de A:"JDRE e R. CHIai et l 'économte. Paris, Le Se uil, 1983.

46 47
Essas últimas não foram entreta nto redu zidas à mera so bre- d ivididos. Por o utro lad o , aca ba mos de ve r que alg umas co ndi -
vivência pelo com prom isso fordista . Muito pelo co ntrário , ao ele - ções favo ráveis be neficiaram o cu lto d o Estad o e das med iações
var a negociação co letiva à condição de princípio institu cio nal, políticas em ge ral, dando a imp ressão de qu e o "crescimento" d o
ta nto no nível de cada e mpresa como no nível dos ramos pro- Estado garantia o crescim ento eco nômico e vice-versa. E esse du -
fiss io nais e me sm o de toda a forma ção naciona l, ele abria-lhes plo cresciment9 pa recia co nstituir a imagem moderna do progres-
um campo de a tivida de co ns ide rável. E da va ao mesmo tem po, so, associa do ao acesso ao bem-esta r mate rial, a um a redu ção das
aos ope rários, um forte mo ti vo par a ader irem aos sind icatos c, desigualdad es fund ada na redistribu ição de renda , enfim à ga ran-
de modo mais ampl o , co locarem-se so b sua de pendência orga - tia de assistê nc ia soci al. Tamb ém o economicism o , o estatismo
ni zaciona l e ideológica. e o re formismo evoluci o nista pud era m se desenvolve r à von ta-
Simultaneamente, o compromisso fo rdista terá acentuado os de no movimento operário ocide ntal durante toda a fase fo rdista.
asp ec tos mais detestáveis dessas o rganizações, ao transfo rma r a E, ao mesmo tempo, a ideolog ia veic ulada por esse último não
nego ciaçã o e m fina lidade exclus iva de sua prát ica e "instru- iria mai s se distingu ir essencialmente da ideologia d ominant e ,
mentalizando-as" co mo engrenagem d o co mando capitalista sobre qu a ndo não se confun d ia pura e simples me nte co m ela.
o proletariad o. Assim , por su po r uma centralização da atividade sin-
dica l em todos os níveis; porque , por defin ição, so me nte os diri-
ge ntes sind icais neg ociam; enfim, por implicar uma tecnicidade e
um profissionalismo cada ve} ma iores d os negociadores (e m
matéria jurídica, co ntável o u econômi ca), a prática sistemática da
negociação só po dia favo rece r as te ndências à se pa ração entre a
base e o topo inerentes a ess as o rga nizações, a crescente au tono-
mia das d ireções e a conseqüente redu ção das iniciativas da base ,
em síntese, a burocrat ização das organi zaçõe s sindicais. Do mes-
mo modo , a prática de negociação necessariamente favo recia o
co rpo rativismo, lima vez q ue tinha te ndência a se e fetua r empre-
sa por empresa ou ramo a ramo .
Q uanto à sua integra ção nos aparelhos das e mp resas ou nos
a pa relhos de Estad o , ge rindo a re produção da for ça de trabalh o
(por exe mplo , os co mitês da e mpresa o u os ó rgãos de ass istên-
cia social), só podia dar lugar ao c/iente/ismo e, o qu e é pio r, à
corrupç ão. Enquanto as o rga nizações se burocratizavam, os d i-
rige ntes não eram ma is co locados sob o co nt role d e sua base,
ten d iam a se to rnar membros remune rad os inamovíve is dos s in-
d icatos, e , co m isso, adqu iriam interesses próprios di stintos dos
de sua ba se .
Enfim , nesse co nte xto socioins titucio na l, o s temas ideológi-
cos veiculados pelo model o social-democrata do movime nto
ope rário encontraram assunto pa ra se alimenta re m. A sustenta-
çào da da a um crescimento inco nd icio na l e ilimitado das fo rças
prod utivas (med ido pelo vo lume do PNB e pelos ín d ices de
produtividade) co rria menos risco de ser co ntestada porqu e St:US
frutos era m ma is a mplamente (s e não mais igu alit ari amente )

48 49
Cap ítulo IJI

A "MASSI FI CA ÇÃ O " DO
PROLETARIADO

E nfado de d iscurso, degene-


ra ção bu roc rática de suas organiza ções, evol ução de suas pr áti-
cas de compromisso em direção ao compro metime nto, co rrupção
de a lgu ns de seus dirigentes: se o co mpromisso fordísta assegu-
rou, em certo se ntido, o triunfo do modelo social-democrata do
movim ento o perário , também precipitou se u declínio e criou al-
gumas das co nd ições de sua crise posteri or. Particularme nte . ele
o to rnou incapaz de se adaptar às novas for mas d a luta do pr o-
leta riad o oc ide ntal que resultam do próprio fordi smo .

1) As transformações da cond ição proletária

Através do mod elo de dese nvolviment o do capitalismo qu e ele


tomou pos sível, o compromisso ford ista de fala transfo rmou pro-
fundame nte a própria co nd ição pro letár ia em diversos aspecto s.
a ) A parcelizaç ão e a meca nização do p rocesso de trabalho
alteraram profundamente a co mposição socioprofission al (ali "téc-
nica") do proletariad o oc ide ntal: a antiga dupla formada pe lo

51
ão ao conjunto da classe, só podia
tifO mediado ra para a identi ficaç
especializad o é sub stitu ída por rio d e ofício , o trab alho pod ia
co nsti -
contram estre e seu ope rário não 'I 'f aba lada. Para o o perá
eiro o u técn ico (po rtanto , po r um or valo r em torn o dos qua is se
uma nav al fo rmada pelo eng enh tuir a mai or refe rência e o mai
e pelo o pe rá rio es p ec ializ ado, ão em suas rela çõe s co m os
me mb ro d o staf ] adm i nis trativo) con struía sua pró p ria rep rese ntaç
tência fo i red uzid a, pela taylo- Isso não era mais o caso para o
o pe rário desq ua lificad o , cu ja co mpe outros e com o mu nd o soci al.
os elementares que definiam um m o trab alho era sim p lesm e nte
nza çâo , ao domínio de algun s gest operário especi alizado, para que
profissio nal, d otad o d e qua lific a- onde o mel hor era mesmo fugi r
"po sto de trab alho" , O o perá rio l 11m "gan ha-pão", um "infe rno
" de
subsiste, senão a títul o margina
ção técn ica redu zida , não mais ús- Il ;l pri mei ra o por tun
idad e.
siste ma de máq uina s) nas ind ções do proc esso de trab a-
(pa ra a man uten ção ou repa ro do b) Porém , mais que as transfo rma
seja acima dessas últ ima s (nos se- sso de cons umo que vão mod i-
trias fo rd ístas , ou se co ncentra lho, sã o as que afetaram o pr oce
máq uina s abso rvid os po r ela s) , o perí od o ford ista, co m a in-
tore s que prod u zem os siste mas de llcar a con diç ão prol e tária durante
(nos ram os ou seto res em que os o de consu mo dop role tari ado à rela
ção
seja à mar gem dessas indústrias h'graçã o total do process
ser intro duzidos) . mo tem po:
m étod os for distas não pude ram sala ri a l. O que im pli co u ao mes
rcad o po r u m desd obr ame n-
O perí o d o ford ista é , ass im, ma dom éstic a no seio do pro -
lado , a ca ma da d o s ope rá- • o desapa recimen to da prod u ção
to da an tiga classe ope rária. d e um fase pr é-fo rdís ta, q uan do a
operá rio s de ofíc io, constitu indo letariad o , ainda imp ortante na
ri os qua lificados, herde iros dos n iti vamente um a unid ade
r ser a p rinc ipal ben efic iá ria do fam íl ia pro letária deixa de ser defi
uma "aristoc racia o perá ria" po para torna r-se essencialmen-
n tada e be m d efen dida pe las de produção (artesanal e ag ríco la)
co mpr o misso fo rd ista, b e m rep rese rcan til) :
forma a base; de outr o, O cont in- re uma unid ade de co nsumo (me
organizações sindicais das qua is ia de consumo, estru turada
qualificados, que sup ortam roda • a imposição de uma no rma méd
gente crescente dos operá rios des de alguma s mer cad orias pi -
ben efi ciam -se mu it o pou co de em torn o da hab ita ção social e
a carga do fordi smo na fábr i ca, móv el e os ele trod omésticos) ,
e são mal integrados nas orga
- lotos ( fund amentalmente o auto
suas van tage ns fora da fábr ica, encial do con junto das p rá-
os por el as. Di v isão que se agra - imp licand o a sub ord inação tend
niza çôes sind icais e mal defendid o às relações mer canti s;
binad a co m d ifer enç as de sexo , rícas de cons um o do pro letariad
vará ainda mais, qu and o com ão do rend imen to sala rial,
• co m a reg ularização e a progress
id ade, naci on alidade ou raça. mo, necessário à sus tenta ção
nde as fron teira s do prol eta- o acesso C/o créd ito para o consu
Paralelamente, o ford ism o este efeitos de esta nda rd izaç ão da
da antiga classe o perária, nela do con sum o de massa, co m os
riado além dos li mit es trad icio nais lóg ica que co nhecemos ;
pregado s do com ércio e de es- ex istê nc ia e de integ ração ideo
integrand o bo m núm ero dos em rio, graças ao desenv olvi m en-
dos pela sub missão diret a de • enfi m, a socializ açã o do salá
critó rio s, rapi dam ente prc lerariza chave do com pro misso social
à dom inação do cap ital el ou pela to do "salário indi reto ", elemento
uma part e do seto r de serv iços i sta, e que per mite ao pro-
to d o s ca p itali st as de tra ba lho e da regu lação da acu mul ação ford
in tro duç ão ne s se seto r d o s m é abili dade consutuuva de sua
letariad o escapar, em parte, à inst
( pa rce liza ção e me cani za çã o) .
u a um enf raq ueci men to da con dição.
O co njun to desse pr ocesso levo
rtado, uma vez que sua for ça rm acó es parece ter sido uma
fun ção socioecon âmica do proleta A resu ltan te geral dessas tra ns fo
esso de trabalho , até entã o ba - vida do proleta riado: um recu o
soc ial de age nte ime d iato d o p roc relativa prtu atizaç áo do modo de
fo i recol ocada em que stão . Ain- o , nào tão ind ivid ual qu anto
sead a em sua fun ção prod utiva, para a vida priv ada mas, no fund
da mais que esse mesm oprocesso
tend ia a d issolver as a ntigas iden- iliari zação" do mo do de vid a do
fami liar. E a influ ência dessa "fam
stitu tivos de rede s de sociali - consciência de classe parece ter
tida desp rofi ssio nais. os ofí cios, con a pro le t ário em sua luta e em sua
e se apo iavam a o rganiz ação e levar a uma atom iz açã o dop ro-
zação e de sol id arie dad e em qu rio r. sido esse ncialme nte negativ a. Ao
com bati vida de do con junto da
classe dur ante a fase ante da soli dariedade de classe intei-
letar iado, ela cria um relaxam ento
içõe s, a iden tida de ideológi ca , até e n tão co ns- ização e à sua luta de classe.
Nessas co nd
o ramente prejud icial sua o rgan
alho e do amo r ao ofício, serv ind
à

tiruída em torn o da étic a do trab


53
52
\

\
Além disso , essa privatização do mod o de vida do p roleta-
listas, e também o da p roletanzação dos ope rários e dos
riad o serviu d e co ndi çã o e de est rutura à sua moralização. Po is
é no universo fam ilia r qu e ga nha se ntido (e vid e n te me nt e um leva m ao dese nvolvime nto de grupos de qu ad ros
sent ido alienante) a aceitação pe los p roletários da expropr iação m édi os e de superviso res, inch ando os e fe tivos do staff admi-
n istrativo. ' .
d e su a existê ncia , resultan te d a p ro d u ção tayl o rizada e d o co n-
sumo de massa . Esses dois process os co njugados te nder am a em baralha r as
Observemos, enfim, que o acesso do proletariado ao universo fro nteiras en tre as classes, n ão de modo a suprimir a d ivisão da
do cons umo mercanti l também co ntribuiu para agravar a tendê n- . sociedad e em classes (co mo gostava m de a nunciar alguns ideó-
cia à dissolução da consciê ncia de classe tradicion al: a afirmação logos do pe ríodo), mas a to rná-Ia ma is dificil de se r per cebida
I d o p rol e ta riad o co mo produtor coleti vo foi p ro gr essi vamente soc iais. Ao mesmo tempo , torn ou -se mais problemá-
e limina da p elo a ument o e m se u se io de lima co nsciê ncia d e uco o sentime nto de pert en cer a uma classe e m geral. Pois, ao
consu m idor' individu al. se t,orna r um conjunto de fun cionários anô nimo s do cap ital, e m
c) O p eríodo for d ista levou ain da o proletariado a um a "mo- mu itos casos a classe dominant e perdeu qu alq uer fisionomia ní-
bilizaçã o ge ral ", tanto geográfica qu a nto profiss iona l. A influên- tida e identificáve l; ao mesmo tempo, o de se nvolvime nto das di -
cia de uma transforma ção ca pitalista junto a lima agricu ltura que ferentes categorias e camadas do staffadm inistrativo tornava mais
re co loca va e m mar cha o êxodo de um a im po rta nte popu lação di fíce is a p er cep ção prát ica e tamb ém a definiçã o teórica dos
de ne o p rolet ârios rurais pa ra os ce nt ros urba nos; efei to do de- do proletariado, uma vez que essas cam adas e categ orias
se nvolvime n to de no vo s ra mo s mot ore s d a acu mula ção do se mistu ravam na ma ioria das vezes a e le nas o rganizações sin-
capital, imp licando sempre a formação de novos ce ntros de acu- d icais e políticas do mo vimento operário . _
mulação e o relati vo de clínio de ce ntros mais a ntigos; as tra ns- e) Enfim, o períod o fordista significou para o proletariado um
fo rmações ocorridas nos processos de trabalho - de tud o isso au m:nto da dependência , tant o prática q ua nto ideológ ica, e m
re su lta ra m importan te s des loca me ntos da p opu la ção pr ol e - relaçao ao Estado, so h a forma do famoso "Estado cio bem-estar".
ta rizad a dos cam pos pa ra as cidades , e ntre as regiões, de um De no q uadro do ford ismo, es te representa , p ara o
ramo de ativida de para outro e de lima pr ofissão pa ra o utra, de a ga rantia de sua "seguridade social" e m sua q ua-
u ma ge raç ão à se guin te ou no interior de um a me sm a ge ração. lida de de ge stor geral da relaçã o sala rial: é o Estad o qu e fixa o
O q ue contrihu iu para d isso lve r a s identidades e as so lidarie - estatuto mín imo de todo assa la riado (pelo direito do trabalho
dade s locais c p rofissionais, sup o rtes ind ispensáve is à organ i- de lima narin a de con sumo irre dutível); é e le
zação e à lu ta d e classes. irnp ulsiona a conclusão e gara nte o respeito aos co ntratos cole-
d) E mais, alé m da fision omi a do proleta riado , o fordismo tivos; é e le qu e gere d ireta ou ind ire tame nte o "salário indi reto ".
transform ou as das duas outras classes fundame ntais da sociedade Desde então , o pr oletar iado oc ide ntal pôde deixar de conside-
ca pitalista: a bu rguesia e o s/ai/ad ministrativo . o Estado co mo um ó rgão pura mente re pressivo a se rviço
Do mesmo modo qu e esten de u as fron teiras do prole tariad o apenas dos ca pitalistas , para nele ve r o instru me nto do "be m
a lé m d os limites trad icio na is da classe o per ár ia , o fo rd ismo co le tivo". O que le vo u a refo rçar e m seu seio um fetichismo do
amp liou as da bu rguesia, integ rando à classe dominante diferen - EAstado, os ideais dem ocrá ticos (in clusive o qu e eles
tes catego rias de age ntes que , por suas fun ções, personificam o te m d e ilus ório ) , aos qua is o "Estado d o b e m-est ar" de u u m
co mando do ca pital, ou se ja, ad ministram a sociedad e subrneten- co nte údo conc reto (garantindo mais, ou menos, o direito ao tra-
do-a às necessidad es de sua acumulação, sem se re m, no entan- balho, à ha b itaç ão , :1 saúde, à educa ção e à formação pro fissio-
to , eles mesmos pro prietários dos meios de produção: quad ros nal, ao la zer, etc.). .
super iores de empresas que garantem sua direção co leg iada; alto
pessoa l ad minis trat ivo dos a pa re lhos o u q uase -a pa re lhos do
:--S.a e?t re 1954 e 1975. a proporç ão d e me m b ro s d o q ua dro ad mí-
Esta do, Por outro lado, a soc ialização das antigas funções capita-
rusrranv o da po pulação at iva dobra, passan do de 8% pa ra 16%.

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L
Aqui deve se r feita uma menção particular ao sistema esco- le rado processo de urbanização do conjunto das formações oci-
la r. O aumen to da mo b ilidade geográfica e sobretudo pro fissio nal de ntais du rant e ess e pe ríodo. O gigantismo das un idad es de pro-
do proletar iado , mas també m sua pres sã o po lítica , obrigara m a d ução e a proliferação das co nurbações ind ustriais e comerciais
classe domi na nte a au me ntar seu nível médio de fo rmaçào ge - sã o símbo los desse pe ríodo.
rai e profissional. Abrindo de repente (amplas) esperanças e pos- Essa co ncentração, qu e afeta o proletariad o tanto fora qua nto
sibilidades ( muito mais restritas) de pro moção social (es pec ia l- dentro d o trabalho , va i tirá-lo de sua dispersão geogrãfica (mas
' mente em direção às camadas inferiore s do s/af/ad ministrativo : também soc ial, cultural, e até mes mo nacional) a nterior. Pro vo-
emp regados nà o-pro letarízados, técn icos, quadros adm inistrati- ca ndo , se m dúvida, incontes táve is efeitos de desenraiza me nto e
vos médios, professores, et c.) às ge rações proletárias d o perío- de perda de ide ntidade; mas criando, ao me smo te mpo , condi-
do pós-guerra. O que só podia modificar as co nd içõ es da socia- ções favoráve is ao seu agrupamento, à sua organiza ção e à sua
lização dos jo ve ns ope rários, re1ativiza nd o os modelos familia - luta de cla sse . Pois, ao co nce ntrá-lo e m linhas de montagem ou
res e , através dele s, as normas p ró p rias aos mei os prol etários , nos co njuntos habitacionais, o for d ismo permite a esse proleta-
leva ndo ; co nseqüe nte me nte , ao rel ax amento d os laço s e ntre ge - riad o desa rra igad o ( rejto rnar quase fisicam en te co nsciê ncia de
rações no inte rio r da classe. sua existê nc ia , de sua impo rtânc ia numé rica e de sua força so-
cial. E é assim qu e a fábr ica fo rd ista to rnar-se- á, co m O tem po ,
"fo rta le za o pe rária".
2) Uma nova f igura proletária: o operá rio-massa b) O o pe rário-massa é também o proletariado bomogeneiza-
d o, ou seja , desqualificad o por se r de signado para as tarefas par-
Desse co nju nto de transformações iria e mergi r fina lmente celadas e repetitivas da prod ução em massa fo rd ista, o proleta-
uma nova fig ura hegemônica no se io do proletar iado oc idental: riado red uzid o à forç a de trab a lho sim ples, ho mogê nea , inter-
a do op erário-massa. camb iáve l, que vê negad a q ualquer identidade profission al p ró-
Tomamos empresta do ess e te rmo do s es tudi oso s do opera- pria. Mas é também a massa dos co nsumido res an ônimos, co m-
riado italiano (principal me nte A. Negri e M . Tro nt i) , Segundo es - posta de indi vídu os iso lados pelo universo reificad o das relações
tes últimos, a cada mod elo de desen volvimento do cap italismo (ca- me rca ntis. É, então , o pro letariad o unifor mi zado pe la p erda de
racte rizado po r um processo de tra balho dom ina nte, um regime antigas identidades ind ividuais e co letivas, basead as nas particu-
de acumulação e um mo do de regulação) corresponde um tipo de larida des de profissã o e de luga r (de inserção em um es paço e
pro letár io , qu e desempenha um pa pel central na luta de classe, um g rupo social da do) que caracte rizava m os operá rios de ofí-
ass im como na identificação da class e co nsigo próp ria. E a figu ra cio e gara ntiam sua solidariedade e sua força co letiva .
hege mô nica co rrespondente ao período for dista é a do o pe rário- Mas é ta mbém precisamente o p roletariado desembaraçado
mas sa , substituindo a anti ga figura do operário de ofício. da estreiteza das pa rticu larid ades de lugar e de profissão , q ue
A figura do o perário -massa conce nt ra, ao co nduzi-los a seu logo pode estabelecer laços de solidariedade de classe ma is am -
ponto de desenvolvimento ma is ex tremo, os d ife rentes proces- plos. A massificação la nça assim as ba se s de uma nova ide ntida-
sos ante rio res, em pa rticular no q ue eles tive ram de destruidor de, de uma subjetividade mais rad ical, ba sea da na recusa da ex-
e m relação ã ide ntid ade prática e id eol ó gica d o pro letari ado pro p riação ge ne ralizada , pelo ford ísmo, e m re lação ao
co ns tituída na fase prê-fordista e centrada na figura do o perário de su as co nd ições de exi stê ncia.
de ofício . Mas e la representa igualmen te o ponto de reviravo lta c) Da massa, o prolet ariad o fo rd ista poss ui ainda a inércia,
de sses proce sso s, ass im como a mo la de uma nova co ntlitualida- e ta mbé m a rigide z . O operário pr é-fo rdi sta , especialm e nte o
de prol et ária . o pe rário de ofício, proveniente d a produ ção pré-ca pita lista (o
a) O ope rá rio-massa é as sim cha mado devido à sua concen - artesa nato) ou arqu eoca pitalista (manufatura) possuía ainda uma
tração no espaço social. A acumulação fordísta im plica uma maio r gra nd e aut o no mia em rela ção ao capital, tanto em seu trabalho
co ncentração e centralização do capital social, levando a um ace- co mo fora dele.

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o o pe rá rio-mass a, ao co ntrário , perdeu to d a a a uto nom ia Mas tamb ém nesse caso o processo va i se inverte r no es paço
e m relação ao ca pital; to rno u-se uma sim p les e ng re nage m e m de lima o u, no máx imo , dua s gerações. Po is, ao adq uirir a exp e-
se u mator p erp etu u m . No trabalho , não pa ssa do apê ndice do riên cia de seu no vo universo, esse me smo o perário vai relativiza r
siste ma mecâ nico de prod ução, do corpo mo rto do ca pital. e co m isso e nriq uece r sua cultura ante rior, d o me sm o modo q ue
Q ua nto à re pr odu ção de sua fo rça de traba lho , é inte ira me nte vai poder, assim, dela se d istanciar. Em resumo, o operário-mas-
dependente de seu salário e do mer cad o capitalista , fen ômeno sa é um ind ivídu o ao qu al o confronto de dois un iversos vai pe r-
ainda agra va do pelo des en vo lvime nto d o créd ito ao co ns umo mitir "desentorpecer-se ", ao adquirir capacidade crítica em relação
e do salário indi reto. a ambos. Assim, se o o pe rário-massa se enco ntra privad o , pel o
Mas o operá rio- massa é também ao mes mo te mpo uma for- fo rd ismo , de suas antigas redes de solidariedade e de suas an tigas
ça de trabalh o que se tornou rigida por sua própria integração ao referênci as ideológicas, isso lhe permite inversam ente reconstituir-
unive rso ca pita lista: rigidez do nível de em preg o , rigidez co m a se de novo, me lho r adap tado à co mpreensão crítica e à luta co n-
di minu ição d o cus to sa larial, rigid e z dos di reitos e va ntage ns tra o novo un iverso capitalista.
adquiridas , rigidez da no rma social de co nsumo sã o ao mesmo O proces so de massificação mostrava-se , e ntão, con trad it á-
tempo as cond ições da regulação da acumulaçã o fordi sta e os rio e m toda a sua ext ensão. Concentrand o o proletar iado e m um
te rmos do comp ro misso social q ue lhe se rve m de ba se . es paço soci al, el e tend ia, po r o utro lad o , a a to mizá-lo, ho rno-
_ d ) Além di sso , o o perário-ma ssa é o op er ário subdivid ido: o ge neiza ndo suas co ndiçõ es de exis tê ncia , ge rava , ao mesm o
o perário ato mizado tanto pela organização fordista do tempo , as co nd ições de um processo de perso naliz ação; red uzin-
qu anto pelo processo do co nsumo mercan til (q ue, por d ef iniç ão , d o a auto no mia ind ividual, es timulava inve rsame nte o desejo de
só se destina aos ind ivídu os) . E já tive mos oportunidade de res- uma a uto no mia co mo essa , dese nvolve nd o as co nd ições pa ra
sa lta r o e nfraq uecime nto das redes de so cializaç ão e de so lida- isso; exigindo o aume nto de sua mo bilidad e ge og ráfica , p rofis-
ried ade de class e, e també m o d a co nsc iê nci a d e classe q ue sio nal, so cial e psico lógi ca , enri je cia entreta nto sua s ituação de
resu ltam d isso . fa to , etc. Seme lhante acumulação de co ntrad ições, co m o tem-
Mas, ao mesm o te mpo , o o pe rário se individualiza , o u me- po, só pod eria ex plod ir.
lho r, se personaliza . Atrav és do acesso ao co nsumo mercantil, à
"se guridade so cial ", ao ex ercício dos d ireitos políticos , à cultura
e sco lar e à infor mação, ele co nqu ista e, mais' do q ue isso , reivin- 3) A revolta do operário-m assa
d ica uma existência, uma autonom ia, uma co nsciê ncia e nq uan- .
to indi víd uo privado. Portanto , ele pas sa a des env o lver reivind i- A explosão deu-se no final da década de 60 e no início dos
cações relativ as à sua ex istência e à sua au tonomia ind ivid ua is, anos 70, so b a fo rma de um a onda de lutas p rolet árias que nã o
q ue pode m se tornar d iretamente co ntrad itó rias à massificação poupou nenhuma das fo rmações capitalistas de se nvo lvidas, Essas
pelo traba lho taylorizado e pelo consumo mercantil. lutas an unciav am os limites histó ricos do co mp ro misso fo rd ista .
e) Enfim, o o perá rio-mass a é o op erá rio acultu rado. Co m Essa explosã o to mo u basicam ente a fo rma de uma verdadei-
mui ta freq üê ncia estrang ei ro , gera lmente de o rige m rural, e le é ra revolta d o operá rio-m assa contr a os mét odos taylo ris tas e
um proletá rio q ue não tem ou te m pouca exp e riência ant erio r no .ord ístas de produ ção, epicentro das principais contradições do
trabalh o assa lariado, pelo menos na grande ind ústria , e no uni- -;: recesso de massificação .
verso capitalista em ge ral. Encontra-se , e ntão, inicia lme nte e m Co m efeito , o fo rdism o exig ia a ma is extre ma expro p riaç ão
s ituação de emigrado , q ue te m suas re lações fa miliares e co mu- : per ário-rn assa no p róprio int erior d o pr o cesso de traba lho ,
nitárias origi nais ro mpidas , desa rraig ad o so cial e cu ltu ralme nte : c ua l e le perd ia todo o do mínio e no qua l só partici pava por
é um ind ivídu o "esto nteado " po r um un ive rso q ue lhe é pro fun- ::".-=:-:> de alguns ges tos indefinida me nte repe tidos e des tituídos de
da me nte estran ho e em relação ao q ual ele não tem re ferência . .\13S simu lta ne a mente su pu n ha sua implicaçã o ne sse
a lguma , no q ua l se se nte , e ntão, " pe rdido". p roc esso do qua l co ntin ua va a se r o agente di re to: o

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o pe rár io-massa devia tom ar pa rte em u m processo que , de seu a co nd ição de assa lariado e volta às for mas pré-ca pita listas
ponto de vista , não tinha mais nem sentido nem valor, o q ue , com de produção (peque na produção me rcantil , artesana l e/ou
o tempo , é precisamente insu stentável e inaceitável. Essa co ntra- agrícol a). As rei vindica çõ es dominantes sã o e nt ão as de'
d ição tomav a ainda outra form a : o produtor diret o devia subme- auto no mia individu al e pelo fim do trabalho;
ter-se peri n de ac-cadaver[como um cadáve r (N .T.)] à o rganiza- • ou de lutarpela reconqu ista de u m po der sobre o p rocesso
ção do processo de trabalho conceb ido pela d ireç ão e pe lo s!aI! d e tra balho e co nseqüent emen te pela transformação desse
adm inistra tivo , co rrigindo constante e inteiramente as disfun ções. processo . A revo lta toma, neste caso, for mas mais co letiv as :
Essa co ntrad ição e ntre het eronomia e auton omia interna no greves parciais, operações-tartaruga , ataq ues ao staff ad mi-
processo de traba lho fo rd ista era redo b rada po r aqu ela e ntre as n istrativo e à d ivisã o ca pita lista do tra balh o , formação de
duas faces do fordis mo , seu lad o "f áb rica " (as técnica s disci p li- co nse lhos de oficinas e de co nse lhos de fábri ca; difu são das
nares próprias à ex plora ção inte nsiva da força de traba lho) e seu palavras de o rdem de autoges tão, de co ntrole e até mesmo
lad o "su pe rme rcado" (a exa ltação narcisista do ind ivíd uo no ato de po de r operário . E as reivindi caç ões d om inantes são e n-
de co nsumo , do "tempo livre " e do laze r) . O universo da produ- tão as da au tonomia co letiva e da liberação d o traba lho (de
ção fo rdista , baseando-se na negação brutal de qualqu er auto no- formas não aliena nte s 'de trabalh o) .
mia ind ivid ua l, só podia entrar em contrad ição com o p roce sso
As dir eções ca pitalistas das e mp resas procuraram co ntra por
de pe rso na lização es tim ulado pel o desenvo lvim ento do co nsu -
a ofensiva proletária no terren o da prod ução , proc ede nd o a uma
mo mercantil e , de modo ge ral, pel o co njunto da socialização
reorgan ização dos méto d os tay loristas por me io da ampliação e
própria ao fordisrno . . en riqueci men to da s ta ref as. A ampliaçã o da s tarefas limitava-se
Essa dup la co ntrad ição e ra a rigo r su po rtáve l pela primeira
a subs titui r a ta refa ún ica po r tarefas d iversificada s. O enrique-
geração do operário-massa , para a qu al as do fordismo
cimento das tarefas mostrava-se mais ambicioso , pr opondo-se
co mpe nsava m o "p reço" a pagar para lhe ter ac esso. Mas ce rta-
del egar a resp onsabilidad e de um segme nto do p roce sso de tra-
me nte esse não era mais o caso da segunda gera ção. Formad a no
bal ho a peq uen os g rupos de operários ou de empregados, p ro-
qu adro do próprio fordism o , es ta não estava ma is d is posta a
voca ndo um cu rto-circuito no co ntrole .
"pe rde r sua vid a para ga nhá- Ia ": a troca r um traba lho e uma exis-
Entretanto, no co njunto, essas fórmulas co ntin uaram no es-
tência desprovidos de sentido pelo simples cresc ime nto de seu
tágio experime ntal. Po is se sua introdução levava , em ge ral, a um
"po de r de co m pra", a privaçã o de ser po r um excede nte em ter.
restabe lec imento es petacular da produtividade , ao me sm o tem-
Em poucas pal avras, a se sa tisfa ze r co m os termos do co mp ro-
po elas ame açava m a estrutura hierárquica da em pres a: ao ce de r
misso fo rdista co ncluído por sua a ntecesso ra ,
ao s prolet á rios um a pane , mes mo mínima, d o co ntrole d o pro-
Assim nasceu o q ue foi de nom inado 'c rise do trabalho li, afe-
ce sso de traba lho, el as os Inci tavam a reivindicar um contro le
ta nd o ao mesm o tempo a natureza do trabalho for diz ado (rec u-
ma ior so bre o proces so de decisão na e mpresa. Por o utro lad o ,
sa de um trabalho alienante) e o lugar do trab alho na existência
ess a reo rganizaç ão das fo rmas taylo ristas do processo de traba-
indi vidual e so cia l (re cusa de fazer do trabalho o centro de su a
lho de ixava pe nde nte outro problema co m o qu al o cap ita l co -
vida) . Trata-se , en tão, para o o pe rário-massa:
meç ava a se cho car: o aumen to de su a co mposição (técnica e o r-
• ou de exace rbar a "lógica" de sua exp ropriação no p rocesso gânica) ligado ao tipo de tecnologia utilizada pel o fo rdism o; em
de traba lho, bl oqu e and o a o me sm o te m po seu funci o - outras pa lavra s, u ma reor gani zação d o processo de trab alho não
nam ento . Esse tipo de rev o lta to ma formas fun damentalmen - pod ia se dar se m redefi ni çâo da bas e tec no lógica do ca piral.-
te individua is (e mesmo individu alistas) e de a lgu m modo Enfim, o dese ncadeamento e o desenvo lvimen to da crise iam
de fe ns ivas, cujo denominador co mum é x fuga do trabalho :: m ecer, co m o desemprego cresce nte, um "maravilho so" pro-
e da p rod ução: absenteísmo e turn-ooer cresce ntes, busca de .edí rnento d isciplinar pa ra restabe lecer a ordem e a auto ridade
"peq ue nos trabalhos" ocasionais, e até mesmo ru ptura com :".3.5 empresas ; mas ne m po r isso as di reções ca pitalistas es ta ria m

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poder no p róprio seio da empresa , ao d esen vol ve r um a o rga ni-
dispe nsa das da ne cessidade de inova r em matéria de o rgan iza- zaç ão co ntra o pr o cesso d e trabalh o , ao multiplica r as ações d e
ção do trabalho . oc u pação d a em p resa, os seq üe stros de patrõ es e d e adm inistra-
No entanto, a revo lta do operário-massa não podia d e ixar d e d or es , ao se opor às demissões co let ivas po r .rnc io da tenta tiva
recoloca r também e m questão o modelo social-de mocrata do mo- de re to mada de em presas com auto-ges tão, etc, essas lutas re s-
vimen to o perári o , parte ativa 'd o co m p ro misso fordista. tabelecia m relações co m a tradi ção de a ção dire ta do proletariad o
Na realidade , esse mod e lo do movimento o pe rá rio não es- p ré-fordista e p u n ha m co ncre ta mente e m ev idê ncia (ainda q ue
capava às co ntrad ições do processo de massificação . De um lado , em uma escala red u zida) as uirtudes emancipat óriasda au to-ati -
sem dúvida, esse modelo estava pe rfeitame nte adapta do figu- à
vidad e dos trabalhadores, Ass im , es sas lutas situavam-se no
ra proletá ria produzida pe lo fordismo , particularmente a um ope- extre mo oposto da perspectiva estati sta e legalista da es tratégia
rário atornizado e acu lturado ao qual as organizações do movi- soci al-d emoc rata, Esta imp licava a subord inação da ação au tôno -
mento operário tinham for necido o único lugar de ressocialização ma da classe às o rga nizações política s, visa ndo à co nq uista e ao
po ssível. Mas, do outro, essas o rganizações só podiam se encon- exercício d o pode r de Estad o, assim como a suho rd inação às or-
tra r em u ma situ ação instáv el em relação às asp irações de auto- ga nizações s ind ica is, que er am enca rrega da s d o dese nro lar no
nomia indiv idu al e co letiva q ue, co ntrad ito ria me n te, a din â mica co tid iano .
de des envo lvime nto do fordismo ia fazer nascer no p ró p rio o pe - Po r out ro lad o , a ex ig ê ncia d e m; is au to no no rnia ind ividual
rári o-massa . e co letiva só pod ia reco locar em qu es tão a de o rgani-
De fato , a revolta do operário-massa, expressão dessas asp i- zações burocratizadas co mo essas , iso ladas de se us su postos ma n-
rações , de cret o u o d ivórcio entre a a la mais ag itada d o pro leta- da tá rios, Tamb ém nesse GISO, as lutas o perárias situa ra m-se no
riad o oci de ntal e os o rganismos sind icais e políticos co nsti tuti vo s extremo o posto , ao multiplicar J S estru turas d e au to-organização
d esse modelo , Apta s apenas para co nd u zir neg o ciaçõ es no qu a- da class e; co mitês de grev e s inter-trans-párassi nd icais; co nse lho s
dro ins titucio na l p re visto para esse efeito , essas orga nizações de ofici na s e de fábri cas ; co nse lhos de bairros e de usu ário s d o s
e ram evid ente mente incapazes de o rga nizar e d irigi r u m mo vi- se rviços p úblico s (po r exempl o , dos trans po rtes); te nta tivas d e
mento proveniente da base , mal d efinid o em se us objetivos ime- fed e ração dessa s estrutu ras au tô nomas de base.
diatos , mas d e q ua lq uer ma neira imp ossível de se r integrad o no Enfim, nad a hav ia em com u m en tre a cu ltura inve ntad a o u
quadr o do co m p rom isso fo rdi sta ao q ual elas estava m lim itad as. red esco bert a por ess e mo vime nto, essencia lme nte es pontan eísta
Além do mais , to das essas orga nizações se co mportaram co mo e antiau to ritário , e as re ferênc ias ideo ló gicas do modelo social-
°
perfei tas gua rd iãs d o ca pital, algu mas tenta nd o sabo ta r mo vi- d e mo c rata d o mo vime nt o o pe rá rio : ao cu lto do Estado , da s
me n to , co laho rando at é mesmo , eventua lmente , para sua repres- mediaçõ es políticas, d os "chefes" e dos "com pete ntes" , propo s-
são física ; outras ten tando recuperá-lo em benefíc io' pr ó p rio, re- po r este modelo , esse movimento o pun ha lim a vontade de de-
tornando , em u f!1 p rime iro mo me nto , as pal avras de o rdem e as moc racia diret a, de au togest ão, de reapropriaç ão imed iata pela
_p ráticas do mo viment o para mel ho r co rrompê-lo no final .' p role tá ria das condições so ciais d e sua exi stência e , an tes
Fo i, e ntão, basica mente sem e até mes mo contra as orga ni- :': :: mais nada , d o ato so cial de traba lho . De modo mais a mplo,
zações sind icais e po líticas co nstitutivas d esse modelo social-de- -= ...... J:' lutas p roletárias testemu n hava m a vo nta de d e "vive r de
mo crata do mo vimento operário que as lutas p roletárias da é poca °
c.u tra ma nei ra ", d esejo d e inve nt ar no vas re laçõ e s s ocia is,
se desenvolve ram. Além dis so , essa s lutas se opunham a esse mo - ,... .1... ead as na igualdad e dos ind ivíd uos c na so lida rieda de social
del o pe lo conjunto de seus aspec tos . Ao co locar a auto-o rganiza- .;;':J rr o ra nd o ass im espontaneamente as reivindicações e os
çã o d o de tra balh ad o re s permanente me nte co n tra o d os "no vo s mov ime ntos so ciais" ql!C su rgiram
i.: -=:'l0ca, se mp re na estei ra d as lu tas p ro letá rias.
1 Para nos limitarmos ao caso da França, ioenrifiCJ.mos respt:ctivamente a tática Em su ma, a revo lta do o pe rário -massa significava claram en te
da CGT e do PC, a da CFDT e d o -esquerdís mo" leni nista durante o per lo-, =. _ -= 3. qu estão em jo go para o pr o letar iad o oci de ntal nas déca-
do j e 1968-75.

63
62
/

da s se gu intes se ria inven tar u m nov o modelo para sua luta de menos impor tant e do qu e a ante rior, e m sua capaci dade de criar
e manter formas de o rganização permanente s alternativ as aos sin-
emancip ação . .
Entreta nto no momento , essa e ra, uecididamen te , lima tarda dica tos e partidos polí ticos . As práticas de aut o-organi zação, ape-
acima de suasfor ças. E embora suas luta s do final da década de sar das ino vações que, como vimos, co nq uistara m em relação ao
60 e in íci o d os a nos 70 emitisse m chamas de urna rev ol ta rad i- período ford ista, pe rma ne ceram na maioria das vez es limitadas
ca i tive ram tamb é m curta duração . es pacialme nte (a uma oficina , u ma empresa, um bair ro, uma lo-
_ ' Entre as razões desse fracasso , podemos se m dúvid a incluir calidade) , e temporalm ent e : nascidas de lutas de co nte údo e obje-
o pa p el contra-revo luci o nár io de sempenhado , durante esse tivos específicos rarame nte a elas sobrev iviam . Daí o ca ráte r dis-
pe río d o , pel as organ izaç ões do model o socia l-d emocrata d o pe rso e fragmentário de lutas des providas da ínte rmed ia ção e do
mo vimen to op erário que .acabamos de menci on ar. No a poio de o rganizações q ue poderiam ter ga rantido sua co o r-
uma ve z q ue esse papel revelava a influ ência prática e denação e co nvergê ncia . Assim se explica ta mbém a relativa fa-
pe rsisten te dessas o rganizações, el e re me te , de fato , para os 11- ci lidade com qu e as ún icas o rga n izações permanentes esta-
mir es internos do moviment o .
be lecidas, as cio model o social-de moc rata d o movimen te o pe rá-
Durant e toda a d uraç ão desse ciclo de lutas, a contlituaHdade rio , chega ram a combater o movimento {especia lmente tira ndo
proletária n ão ultrapassou, senão raramente , os limites do qua· p roveito d o iso lame nto p rogressivo das lutas) o u a recuperá-lo
dro imediato da empresa. Se, por. um lado , ela so ube reco locar em benefício pró pri o (mostra ndo-se co mo único recu rso pa ra
e m qu estào a orga nização taylorista e fordista do pro ce sso de tra- ga rantir suas conqu istas).
halho , po r o utro , só raram ente chegou à crítica d o modo de Por n ão sup erar esses doi s limites, o movime nto estava co n-
senvolvi men to ,ind ustrial ine rente ao fo rdismc, cujo custo SOCIal, de na do a se enfraq uecer e a reflui r, apesar de sua radic a lidade.
e também ecológico, e ra , toda via, cada ve z ma is pesad o. Tarn- Na verdade , es se refluxo tev e início antes mesm o qu e a presen -
pouco vim os as lul as d o p rolet ari ad o da época ataca r.em.' a nào te crise do ca pitalismo ociden tal se ab risse oficialmente, crise qu e
ser ve rba lme nte, o "modo de vida " indu zido pel o capitalismo , a 'ia ao mesmo te mpo permitir à classe domina nte ret o mar a o fen-
sociabilidade resultante da su bo rd inação cada vez mai s estreita s iva , manifes tar claramente o enfraquecimento definitivo do
de to da a vida social às ex igências da re prod ução do ca pita l: a modelo soci al-democrata do mo vimento operá rio e e ncosta r na
co ntesta ção do pod er do ca p ital so bre o trabalho não foi est e n- pa rede o p rolet a riad o oc ide ntal.
d ida a seu pode r fora d o trabalho ."
As lutas do proletar iado esu veram , ass im , iso lada s das que
se de:-;envo lveram, na me sma época , fora do trabalho t da pro-
du çã o, por iniciativa dos ch am ados "no vos movimentos socia is"
_ ecológ icos , antinucleares. regi ona listas, u rba no s, fe ministas,
et c. O qu e de mo nstrava , em últim a a ná lise, a rmp rcgnacâo do
q uad ro institucional e ideoló gic o definido pelo compromi sso
fo rd ista, no seio mesmo con tlitualidade p roletária , q ue , no enta n-
to , se encontrava e m ruptu ra co m esse qu adr o .
Essa co ntlítua lida de dernonstraria uma segunda fraq ueza, não

Du rante o lo ngo "Maio rastejante' Italíau o, ho uve no e ntan to nígurn as ten -


pa r;l art tcular. e m uma base de classe . as lutas no tra balho e as lu tas
I
fora do tra balho <por ex emplo. so hre a s qu cstôc:-> de habuacâo. de transpor -
tes públicos . etc.). Sob re assunto , cf. O. GHISO NI e t H. POHTELLI. tutres
ulwri eres en /w/tc! de 1960 ti 19 76 , Pa ris , Aubte r-Mo ruatgne , 1976.

65
PARTE II

OS DE SA FIO S AT UAI S

A crise que o co njunto do rnun-


: 0 capitalista at ravessa atua lmente é, de aco rdo co m uma te r-
:':"..1nologia dorav a nte co nsagrada , um a crise estru tu ral: d u radou ra
sua s premissas remo ntam a mead os da década de 60), glo bal
põe em jogo o co njunto das instâncias d o mo d o de produ -
::lo). e de solução essencialmente incerta.
Ent retanto, a mai or pa rte da s a ná lises privilegiam , em sua
so me nte os problemas que e la im põe ao ca pital. E,
dúvida , es sa crise é , e m primei ro lugar, uma cris e da re pro-
• ::'_"'; l J dessa relação social que é o capital. No e ntanto , visto q ue
: é u m a relação socia l co ntraditória , uma crise como
só pode ser simultanea mente crise desse pólo antagon is-
:l : : . capital, q ue é o prolet ariad o , e portanto crise do mo vím en -
lo: : c er ário .
:105 propomos, aqui, a fazer uma inversão de perspectiva,
li: nossa a nálise da atual crise do capitalismo não tan-
1: , :-, c= 05 pro ble mas que ela impõe ao capital, mas sobre os de-
'::''':-= ela lança ao moviment o o perário ocid e ntal. E, na reali-
..:::õ.i.J:::: de safios são de dois tipos relativamente dife rentes.
. ;::-:ZTIeiros ligam-se dire tame nte à crise do ford is mo e às
_:.... :-l·ções co ndu zidas pelo capitalismo ce nt ral para tentar

67
sup erá-la. Essas crises contribuem pa ra reco loca r em qu estão
todos os ele me ntos co nstitutivos (est ratégicos, o rga nizacio nais e
ideoló gicos) do modelo so cial-de moc rata do mov imento o perá-
rio e, conseqüentemente, para desestabilizá-lo. De um lado, trata-
se da ruptura do comp romisso social do período pó s-guen'a, no
qu al se baseara m ta nt o a di nâmi ca d o fordi smo q ua nto o triunfo Cap ítu lo IV
do mo delo so cial-de mocrata do movimento o perário ; do o utro ,
da f ragmel1tação do p roletariado, que resulta das transformações
em curso da rela çã o sa larial; e nfim, da transna cionalização do
cap ital, q ue pa rece co nstituir a úni ca saíd a capi talista possível
(embo ra altame nte problemática) pa ra a crise atual da acumula-
ção em nível mund ial. A RUPT URA DO COM P RO M'ISS O
Crise ecológica, crise da sociabilidade, crise cu ltu ra l: o s F ORDI STA
desafios d o seg und o tipo pa recem co mparativame nte mais radi -
ca is qu e os a nte rio res.
Po r um lado, e les não derivam so mente da crise do fo rdismo ,
r
ou se ja, de uma fo rma histori cam ente de terminad a do modo de
produção capitalista , mas co locam muito ma is fundame ntalmente
e m q ue stão esse pró prio mo do de produção , em sua e ssência e
não mais so me nte em uma de suas fo rmas histó ricas: na ma ne i-
ra co mo el e o rganiza, em qualq uer tem po e luga r, tanto as re la-
ções dos ho mens com a natu reza co mo as relações dos homens E ssa ruptu ra fo i pro vocada pela
entrada e m crise do regime de acumu lação do capital q ue ha-
ent re si.
Po r o utro lad o , ao co ntrário dos anterio res , esses desafi os não ·: 13 se rvido de base mat e rial para o co mpro misso fo rdista .-
dize m respeito especificame nte ao proletariado, mas à so cieda-
de (e até mes mo à hu ma nid a de) inte ira . Por isso me s mo , o mo-
vime nto operá rio é ob rigado a ressa ltá-los , se prete nde reconqu is- 1) O enfraquecimento do fordismo
tar um pape l hege mônico no se io da sociedade e te r a possibi-
lida de de exerce r sua missão histórica de co nstrução de uma so- c _ Esse enfraqueci mento vai aco ntecer entre o final da década de
ciedade comu nista. Ora, co mo ve remos, re ssa lta r se me lhantes : '. e o início d os ano s 70, em conseqüên cia de q uat ro fato res.
desafios leva tam b ém a reco locar e m qu est ão o s el emento s a) D i m i nuiç ão dos ganbos de p rodu tivida de. Diferent es es-
constitutivo s do modelo so cial-de moc rata do movim e nto o perá- :-"'; :'0 .5 mostraram q ue, em todo o perío do pós-gue rra , nas prin-

rio , agravando ao mesmo tempo sua de sest ab ilização . for maç õ es ca pitalistas, a uma fase caracte rizada por um
Finalm ente , os doi s gru pos de desafios se co njugam para ':lme nto co ntínuo dos ganhos de prod utividade sucedeu uma
assina r o decreto de mo rte des se mo delo secular do mo vime nto : '_::-::' . ma rcada po r sua q ueda . Essa inversão de te ndê ncia o cor-
o pe rário, determinando as co ndiçõ es e as vias de renovação deste _ :"Cais ce do nos Estados Unidos (desde meados dos anos 60)
:u e na ex-Alemanha Ociden tal e no Japão (início da década
último.
::..-: -.)\ mas paí s capita lista dese nvo lvid o dela escapo u.
se explica pe los limites, tanto técn icos qu anto sociais , en-
,.: a parti r des se pe ríod o pe los métodos taylo ristas e

69
68
fordistas de produção . Os grandes gan ho s de produtiv idad e qu e men te s p rodutivos), graças aos ga nhos de produtividade realiza-
o fordis mo conhec eu em sua fase asce nde nte foram obtidos, e m dos na pro du ção desse s e le me ntos, mas també m graças à sua
pa rte, graças à ampliação desses métodos a mais !Jas se- obsolesc énc ia ace lerada e planificada ; de outro, a generalização
mel ha nte movimento extens ivo nã o po de, po r oeftntção, do traba lho por turnos (tra ba lho em equi pes), que perm ite ao
seguir indefinida mente . Q uanto ao desses me- mesm o tempo diminuir a composição orgânica do capital e ace-
todos nos se to res em que já tinh am sido intr oduzidos, passado lerar a rot ação do cap ital fixo .
um ce rto lim iar, revel a-se contraprodutivo, limitando a fluide z Mas essas ·contratendê ncias ine vitavelmente pe rde riam sua
(mu ltip licação dos tempos mo rtos, prolongamento do te mpo de força a partir do mo me nto em q ue os ganhos de produtividade
circulação dos produtos e ntre os difer entes postos de trabalho , diminuísse m. Enquant o isso , ao co ntrário, para te ntar co mpen-
estocagem no final da cadeia) e a flexibil idad e (gr ande vu lne- sar essa dim inuição , as econo mias capitalistas avançadas acele-
rabilidade ao menor incidente: pa ne , quebra de estoque , mudan- ravam a difusão das técni cas e dos modos de produzir fordistas ,
ça de produção, greve parcial, etc.) do processo de trabalho .. também a obsolescê ncia dos equipame ntos produtivos , ace -
Além d isso, esse aprofu nda me nto levou a uma oerdadeira lerando ao mes mo tempo a alta da composição téc nica média do
reoo íta co ntra esses métodos de exp loração do traba lho , po r par- cap ita l. Ao que vieram se jun tar os limite s tanto físicos co mo
te das ca madas proletárias. qu e eram suas principais vítimas. mar- socia is do trab alh o por turn os. Pois as jornadas n âo tin ham se-
cada po r um aumento do absenteísmo, do da dil a: nã o vinte e quatro horas também para as máquinas . E, co mo as
pidação , da sa botagem, das greves , etc. E essa "crise do trabal ho outras fo rmas de trabalho desenvo lvidas pelo fordism o , o traba-
não teve co mo única co nseqüência um aume nto do custo salarial lho por tur nos e sua expansão se chocara m, a pa rtir da segunda
(sob forma de de spesas ocasionais sup lementares para garantir a meta de da década de 60, co m uma resistência operária cada ve z
continuidade do processo de prod ução). Ela desorgan izou també m :nais forte.
direta me nte a pro duçã o capitalista, faze ndo baixar sua produ tivi- c) Sattt ração da norma social.de consu mo. A regul ação do
ro rd ísm o implicav a que o pr oce sso d e cons umo privado se
da de. Em resumo , a retomada da co mba tivida de prol etár ia da , ,
década de 60 e as formas assumidas por essa com batividade es- zentrasse e m ce rto número de bens duráve is (a uto mó ve is, re-
tão relacionadas á diminuição dos ganhos de produtividade regis- sid ências, eletrodomésticos). O ra, o mercado desses bens vai
trada , na mes ma é poca, por todas as econo mias capi talistas de se n- ;::-og ressivame nte satura r-se no cu rso das décadas de 60 e 70,
.ev and o a uma co ntra ção das pe rspe ctivas de ve nda pa ra as
volvidas .
b) Elevação da compos ição orgânica do capital. A obtenção .:"'. :iúsrrias e m ascen são , no momento em que a d iminuição dos
co nsta nte de ganhos d e produtividade te m co mo condição uma de p rodutividade ter ia , ao co ntrári o , ex igido um aumen-
elevação da co mpos ição té cnica do capital: d a relação entre a ' ,: ':.1 produç ão e m série para rea liza r eco nomi as de es cala e
massa do traba lho mo rto (ma té rias-primas e me los de trabalho) _::-.:.1 amortização ma is ráp id a do s equ ipa me ntos pr odutivos .
e a do trabal ho vivo que e le mobiliza. O ra, se todas as outras dísso, dev ido à sua sat uração, ess es mer cados vão tende r
co isas perma necem iguais, qualqu er elevação da composição .i :ornar flutuantes (por se re m ligados à re novação de eq u i-
n íca do ca p ital tende a provoca r uma e levação de sua co rnpos r- O·2..."-." ,,tos já adquiridos) e a se fragmentar (com a massificação
ção o rgânica (da relação e ntre a massa do capital co nsumido e =.t: ::::::su mo engendrando, em re ação , uma d e ma nd a ma is d i-
o valo r criado pe lo trabalh o vivo), mas ta mbém um aumento do '::::--:::-.da d a e cap richosa), o qu e não convinha a um apa relho
capital fixo em relação ao ca pita l circula nte e , portanto, u ma d i- : ("'": ·:' _::'; 0 que requeri a, ao co ntrário, uma de ma nda ao mes mo
minu ição da rotaç ão do ca p ita l, dois fatores qu e diminuem ine- ·.. :. nifo rme e contínua.
vitavelmente a taxa de lucro. . :550 ainda nã o é o principal. Pois, co mo vimo s, a o rigí-

Para luta r co ntra ess a tendê ncia , o fordis mo recor reu a dois da norma de co nsu mo fordista foi inclui r u m co n ju nto
pa liativos: de um lado , a desvalor ização de do =-=:-.-::flci os tanto em es pécie (d iferentes s ubs ídios) qua nto in
tal cons ta nte (e particularmente de sua parte fixa : o s equipa- r : u:":: conjunto de eq uipamentos e de serv iços coletivos co-

70 71
locados ãdisp osição gratuita, o u q uase gratuita, dos consumido- d) Desenvo lvime nto do tra balho imp roduti vo p rincipalmen-
te d o trabalho q ue ga ran tia a ci rculação d o capita l (g es tão, co -
res indiv id uai s) . O ra , o cus to d esses el eme nto s socializados do
processo de co nsu mo não vai parar de au me ntar em todos os paí- me rcia lização , banco s e segu ros) a li o co nju n to d as co ndições
socia is, institucio nai s e .id eo lóg icas d a rep ro dução do capi ta l
ses ca pitalistas dese nvo lvidos, a partir do início da década de 60,
Isso é su ficie nte me nte co nhecido no q ue di z res peito aos (principalmente co ncentrado nos apa relh os de Estado), Repre-
be nefícios e m espécie: o custo crescente da ass istência socia l se nta ndo um co nju nto de "d e spesas eventua is" ine vitáveis pa ra
to rnou-se u m dos leitmotiue cic d iscurso político . Mas não é m e- a produção ca pitalista, o trab alho imp rodutivo limita a valori-
nos ve rdadei ro no que conce rne aos equipame ntos e aos servi- zação do capital e a escala d e sua ac u mulaç ão, se todas as ou tras
ços coletivos: consideremos so mente o custo cresce nte das infra- co isas pe rm an ecem iguais.
est rutu ras necessá rias à circul ação au rom obilística . Aí es tá uma Ora , durante o período fordista, em todos os países capi ta-
das razões fundamentai s do famoso aumento dos gastos pú bli- listas dese nvo lvidos, a massa do trabalho improd ut ivo cresceu
cos e , co nseq üe nte me nt e , dos recolhimentos obrigató rios que mais do q ue a do trabalho p rodut ivo ; é o q ue de man eir a muito
basicame nte lhes serve m d e fina nciame nto. . co nfusa fo i reco nhecido sob a no ção de "te rce irizaç ão da socie-
O aume nto d ess es cus tos é resu ltad o d e três p ro cesso s in- dade". Do is processos se co njuga ram para gerar esse fe nô me no .
timame nte ligados à d inâm ica e aos próprios lim ites do fordismo : Por u m latia , o p róp rio fo rdis mo foi co nd e nad o a uma inflação
, d os " CUS(QS d e organizaç ão ", sub or d ina ndo to d a a p rática social
• "a internalização " crescente d o processo de re p rodução da às me dia ções merca ntil e es tatal. Po r outro, pelas razões mencio-
fo rça de trabal ho : embora esse processo permane ces se rel a- nadas acima, a pr o du tivid ad e d o traba lho imp rodutivo au men-
tivam e n te exte rno ao fo rdismo dura nte sua fase d e insta la- to u m uito menos qu e a do trabal ho pr odu tivo .
ção, sua própria expa nsão va i o b rigá-lo a assu mir ca d a ve z O co nju nto d o s qu a tro fa tores an te rio re s va i se co nju gar,
mais se u custo. Pe nse mo s , po r exe mp lo, no "au me nto e m
pa ra provoca r uma redu ção da taxa média de luc ro. O movi -
pot e ncial" d o s reg im es de apo sentadoria; . r nen to co m eço u mai s cedo e m a lguns paíse s (Grã-Bre ta n ha,
• um deslo camento de p ráticas de co nsu mo d e ben s du ráveis
Estados Unidos) do que em outros (japão, ex-Alemanha Ociden-
e se mídu r áve is de caráter priv ad o para o co nju nto de equ i-
::11. Fra nç a), mas o movimento é geral no O ci de n te, no início
p amentos e serviço s d e ca ráte r co le tivo, so b o e fe ito da
":3. déc ad a d e 70, significando claramente o enfraquecimento da
socialização da sociedade e da manifesta ção d e nov as aspi-
': i::â mic a d o re gime de acumu lação es ta beleci do no final d a
ra çõ e s co le tivas: ne cessidad e de as sistê ncia ind ivid u al e
Gu erra Mundial.
so cial, aspiração ao benefício d e co nvivê ncia fam ilia r e so-
E. para sinte tizar a análise p re ceden te , d ire mos qu e o pr ó -
cia l, ao ben efício de te mp o livre , e tc. ;
;:-1 0 fo rdismo fina lmente caiu na 'a rmad ilha" d a massificaç ão e m
• enfim , o fo rdismo não estava munido para co mpe nsar esse
ele pegara o pro letariado e que acabará impon do-lhe seus
au me nto da massa dos meios so ciais de co nsumo co m um au -
_"':".i:es. Li mites su bjetivo s, co m a revo lta do o pe rário-mass a co ntra
mento d a pro d utivid ad e do trabal ho : ten d o co nce ntrad o to -
l.; ;o rmas fordistas de produção (traba lho em cadeia e traba lho
dos os seus esforços na produ ção em grande esca la de bens
:-.: tu rno s), mas ta mbé m co m o d es lo camen to d as p ráticas de
de consumo privados, escapou-lhe uma boa parte da produ-
_: para for a d a norma fordista . Limites objetivo s, co m a
ção dos meio s so cia is de co nsu mo, depe nde ndo de se tor es
do cap ital cp nstante (e, particularmen te , fixo), levan-
p ré -fordi sta s (e xe m p lo : a construção civ il e d e u tilidade
púb lica) quando não simplesmente de seto res pré-capitalis- " : 1 diminuição dos ganhos de produtividade e alta da com- à

tas (exe mplo: o exercício liberal da medicina), E, de qualquer ; .> :,;1 :> o rgânica do cap ita l, enqua nto a massifi cação d o capital
maneira , o s mét o d o s fo rd istas baseado s na parceliz ação e '1_-_1".' ,,1(força de trabalho) traduzi a-se pela saturação dos mer-
me canização do trabal ho , na maiori a das ve zes , não se adap- que sustentavam o cresci mento ford ista e pelo au me nto dos
tam à produção d esses be ns e se rviços coletivos. soci ais".

72
73
2) A dinâmica d a crise Interna mente, isso significa manter e até es tender (no que d iz
res pei to ao seguro-des e mprego) os mecani sm os institucionais de
Assim , a partir d a se gu nd a metad e d a década d e 60, os el e- aume nto dos salários reais , mas também re correr aos gastos pú -
ment os de uma en orme crise de valo rização do capital se acu- blicos (mes mo à custa de fortes déficits o rça me ntár ios) e conce-
mul am em lodo s o s países capitalistas d esenvo lvid o s. der facilidad es de crédito às empresas e aos co nsumidores ind ivi-
Entretan to , du ra nte uma primeira f ase, essa crise co ntinua d ua is (me sm o ã custa de um ag ravame nto da inflação ) , Exter-
latente. Sob a aparência da co ntinuidade do "crescime nto", alguns n a men te, trat a- s e d o e s ta be leci me nto d e u m a es pécie d e
sinais perm ite m supo r, noentanto, a invo lução do regime de "ke ynesianisrno mundi al": os países ocidentais se e ndi vidam, es-
acu mulação: pecialme nte diant e da OPEP, pel a emissão de moeda de créd ito
• a aceleração da inflação por me io da qu al as empresas inte rnacio nal que, reciclad a, principalmente pel os 'bancos oc iden-
tentam fazer os. co ns umidores finais (então essencialme nte [a is, so b a forma de empréstimos aos paíse s d o Terceiro Mundo ,
assalariados) pagarem a prog ressão conco mitante dos salá- mas ta mbém a alguns países d o Leste , inc ita-os a importar eq ui-
rios e d os lucros que a diminuição d os ga nhos de produtivi- pa me nto s ind ustriais dos paí ses oc identa is, permitindo a esses
dad e n ão permite mai s fina nciar; ú ltimos co mpens arem , assim, seus dé ficits em relação à OPEP.
• o end ividamento cresce nte das empresas, qu e procuram Frág il círculo virtuoso que permitirá a alguns países da periferia
co mpe nsar essa dimi nui ção po r meio de progra mas ambicio- pró xima ou lo ngínqu a desenvolverem o u co nso lida rem se u a pa-
sos de investimento, me sm o se sua ca pa ci dad e d e auto- relho industrial, ma s que só se podia fechar co m a co nd ição de
fina ncia me nto d iminui no ritmo de sua taxa de lucro; que esses mesmos países pud essem, po r sua ve z, reembolsar suas
• uma rápida internacio nalização dos mercados e da produ- dívidas, exportand o os produ tos de suas jo ve ns indústrias pa ra
ção, cujo sinto ma é então o dese nvo lvimento das e mp resas os pa íses da O PEP ou para os países o cide ntais. Veremos um
multinaci o nais, co m o objetivo de transmi tir para os pa íses po uco mai s adiante o que aco nteceu...
co nco rre nte s as d ificuld ades com as qua is co me ça m a se Pois, embora essa "eco no mia de superendiv idarnent o", em últi-
debater todas as ec o no mias ce ntrais; :":13 a nálise , ev itasse um ag rava mento da recessão mu nd ia l, em
• um len to mas inexor ável aume nto do desemp rego, devido crnpcnsação era incapaz de reco locar e m marcha a d inâ mica da
ao au me nto co ntínuo da população ativa e a um a substitui- nas bases fordistas pe rsiste ntes. Muito pel o contrário,
ção acelerada do trabalho pelo cap ital. :u rante toda essa fase da crise, o esgotamento dof ordismo se con -
É, então , em uma situação já suficientemente deteriorada que
:=.. .n)<1: os ganhos de produtivi dad e co ntinua m a d iminu ir; o custo
::: investimentos aumenta; se o med o do desemprego permite
de repente se dá , no final de 1973 e início d é 1974, a quadru-
plicação do p reço do petróleo bruto no mercad o mundial, que progressivamente a "disciplina do trab alho " e, co nse-
transfo rmará a crise latente em crise manifesta. Pois, em um contex- recuperar em certa medida a taxa de mais-valia, essa
.--=- pe ração está compro me tida, por outro lado, pelo crescimento
to de dete riora ção da taxa de lucro, esse brusco encarecimento da
renda d o petróleo vai provocar a primeira recessão ge neralizada da retiradas obrigató rias que se mantém. Nessas co nd ições, a me-
'-J: -r.,1 da taxa de lucro o bservada é insuficiente para reestimu lar o
econo mia ca pitalista desde o fina l da Seg unda Guerra Mun d ial:
q ueda da produ ção, aume nto brutal do desemprego , co ntração do .' "::'::":.:.mento: a pro d ução não en contra em pa rte alguma seu nível
l:'"..t=:".:-: e. co nseqüentemente, o desemprego aum enta .
co mércio mun dial, des mo ronamento da cotação na Bolsa, etc.
Todavia , patro nat os e governos o cide nta is apostam que é resum o , as economias ocide nta is vege ta m na "estag-
possível sair dessa situa ção sem modi ficar fund am entalmente O re- ':... -. qu ando surge o segundo "ch oque d o pet ró leo " (início de
gime anterior de acumulação, apeland o pa ra as trad icionais receitas
keyn esian as: tratar-se-á então de perseg u ir o for d ismo a créd ito, _r ;j :l econ ômica ca racterizada pela estagnaç ão da prod ução e pela in-
co nfiando na reto mada dá acumulação pa ra ree mbo lsar as dívidas. :bdo: c r s preços . (N.T.)

74 75
\ 1979). Mas, dessa vez , e ra ma is difíc il que ele se desven cilhass e
-
reconh ecer que.a crise ab erta algu ns anos antes nã o é uma sim-
ples flexão conjuntural, mas utra 'crise estru tu raí. cuja saída supõe
p rorr og an d o o ford ismo a crédito: to rn o u-se e vidente . para os di
de um beco-se m- um re mane jame nto total do modo de prod ução .
rigente s oci de nta is, que essa via não passava
Isso significa qu e a ofens iva liberal abriu caminho para um a
saída. Estes vão, ao contrário, proced er a um a verdad eira in uer-
saída ca pitalista da crise? Nada indica qu e sim. Sem dúvida , ela
são de sua p olítica econô mica, marcan do assim a entrada em uma
teve êx ito, parcialme nte , de um po nto de vista capitalista. Em par-
terceira fase da crise. Seu objetivo princip al será , a partir de e ntão ,
ticular, per mitiu, no cu rso desses últimos anos , recupe rar de ma-
sa nea r a s ituação , o u se ja , resta b el ecer u ma taxa de lu c ro sa-
neira significativa a taxa de mais-va lia (fu nda me ntalme nte po r
tisfatór ia, condição ne cessária (se nã o suficien te) para uma reto-
meio da co mp ressão dos cus tos salariais) e , co nseqüe nte me nte,
mada da acu mula ção. a taxa de lucro , melh oran do a rentabilidade dos cap itais manti-
Isto exige um a juste de co ntas en tre os ca p italistas . De fato,
dos e m função .
qu ando a taxa de lucro diminu i, é no senti do de haver excede nte
Mas isso só poderia se r uma vitóri a de Pi rro. à crise de va-
de capi tal na soc iedade . Conseq üenteme nte, é precis o dest ruir
lorizaçã o do capital, que só resolveu parcialment e , ela finalme nte
um a parte do capital so cial: elimina r as empresas me nos rentá-
ac resce ntaria um a crise de realizaç ão pot en cial, comp romete n-
ve is, faze r reestru turaçõe s té cnicas, finan ceiras, jurídi cas . Essa
do na me sma p rop orçã o as chances de saída ca p italista da crise .
"repa rtição de perdas " e ntre ca pitalista s efetua-se normalmente
Pois, ao provoc ar o agravam ento do dese mp rego , a d iminuiç ão
por intermé dio da co ncorrên cia, mas a po lítica econô mica pode
do poder de comp ra dos assalariados, a comp ress ão dos gastos
tamb ém co ntribuir para isso , através da restriçã o do créd ito, da
e públicos , a alta das taxas de juro, ela ag ravaria a crise latente de
co mpress ão de subvenções de co missõe s pública s, da det e rmi-
superp roduç ão co m a qua l se deba te o ca pita lismo ociden tal
na ção da taxa de câmb io, e tc.
desde o início da déca da de 70.
Po r outro lado , o sanea me nto da situaçã o ex ige "fazer os tra-
De finitivam e nte , a situação prod uzida pe lo "ê xito" da ofen-
balh ad ores pagarem a crise", ba ixa nd o os salários rea is d iretos,
-iva libe ral é cheia de riscos maio res. Ao co ntrair a de ma nda fi-
redu zind o _o financi ame nto dos eleme ntos socializados do p ro- o fensi va libera l
:"'.3.1 e p rov oca r a a lta das taxas de juro rea is, a
cesso de consumo , de for ma que ele seja me nos oneros o para o on âria e , porta nto, as
reuniu co ndiçõe s para um a espiral deflaci
ca pital, de modo ge ral de sorde na ndo p rogress ivam ente o co n- catastró fico da década de
.cndíçô es para a reed ição do cená rio
junt o da relação salarial fordista . amento de ssa es-
: 1) . :-\0 mome nto de ssa o fe nsiva, o desc ncadc
Ea qu ase totalidade dos gove rnos oc ide ntais vai se pro por pôde ser evitado , no p lano inte rno , graças à ma nute nção
o bjetivo s bem se mel hantes, inclusive aqueles que a priori lhes co nstitue m e , no
- .::..J. "rede de seg urida de " q ue as re ndas socia is
e ram os mais distan tes, po litica me nte faland o (por exemp lo, os e privado
;-.an o exte rno , ao de scomu na l endivid amento público
social-de moc ratas alemãe s o u frances es). A ofe ns iva se rá leva-
::: ; Estado s Unidos (no nível de uns 8 b ilhõ es de dólares ), que
da so b a bandeira do liberalism o em suas dife re ntes varian te s
:---: :-; iria de "locomo tiva" pa ra a e co no mia mundia l no curso da
(rnone tarisrno, econo mia de merca do, etc .) e terá co mo cavalo
.ada de 80.
de ba talha a luta cont ra a infl ação (por meio da restriçã o ao c r é-
Apesar disso , pe lo me nos duas vezes a econom ia mundial
dito qu e visa a imped ir qualq ue r engajame nto ine ficie nte de ca-
be m pe rto d a catástro fe. Uma p rime ira ve z, du rante o
pital, po r meio da de sind ex ação dos sa lários e preços, etc.) e a e nte segui-
",,:-i :J e o outo no de 1982, quando o México , rapidam
desestatiza ção da econo mia; atacand o o Estad o fordísta , trata-se na, e de pois por u ma boa de ze na de
:c Brasil e pela Argenti
na .ve rdade de des ma nte lar todo o q uadro instituci o na l qu e ha- se de clarara m e m estado de
país es do Ter cei ro Mundo
via servido de arcab ouço reg ulador ao crescim ento fordista . , colocan do o mun -
de pagam ento da dívida externa
Ruptura de caráte r histórico : se , d urante três dé cadas inte i- Revelav am, assim, qu e as
:c r-eira de um cras b internacional.
ras, o fordismo co nstituíra a base so cío econôr nica de seu pode r ociden ta is estra ngu-
71: i:::.."':l5 de aus teridad e liberais do s Estados
político , é do rava nte em sua de struição qu e a class e do minante o Mund o , tornan-
:;. :':::'1ncei rame nte os devedo res do Terceir
aposta pa ra garan tir sua salvagu arda. O que , para ela, significa

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\ E o espetácul o da impotê nc ia da s classes domina ntes para
do-os incapa zes de pagar suas dív idas.. Desde en tão, apesar de
sa ir de sua crise ter ia ce rta me nte co mo nos alegra r se , sim ulta-
sucessivos paliativos (reesca lonarne nto, abertura de um "merca do
\ secu ndá rio" da dívid a, plano Back er, etc.), o mundo cap ita lista
neam ente , o movim ento o perário tivesse , por sua vez, se mo s-
trado à altura da sit uação. Mas, tamb ém desse lado , havia muita
se instal ou em u ma situaçã o de crise fina nceira interna cional
co nfusão: se o fordism o já havia den otado os limites e.o esgo-
latente, devido à acumu lação de títul os de créd ito cada ve z mai s
tam ento do model o socia l-de mocrata do movim ento o pe rário, sua
duvido sos pelo sistema ba ncá rio internacional. crise anuncia se u fim .
Um segund o ale rta mu ito sé rio fo i o crasb da Bo lsa no o u-
Po is a crise atua l do capitalismo ociden tal, em sua próp ria d i-
tono de 1987, qu e afet ou todos os mercad os finan ceiros. Esse
nâmi ca, assim como nas escolhas de po lítica econôm ica às qu ais
crasb resu ltou basicam ente da descon ex ão ent re a "esfe ra real"
ela levo u a classe do minant e, implica a ruptura do compro misso
e a "esfe ra finan ceir a", pro vocad a pelos efe itos contrad itó rios da
social do p enadopôs-guerra. Rupt ura se m dúvida parcial, gradual,
po lítica liberal: en quanto recuper ava a taxa de lucro, ela co ntraía
co medida , men os marcada pelos fatos qu e pel os d iscursos , mas
simulta neame nte o mercad o , desvian do ass im o capital-di nhei-
ne m po r isso me nos real e co nsumad a.
ro do inv estimen to prod utivo pa ra as a plicaçõ es fina nceiras, ali-
É que os termos desse compro misso (d istribui ção dos ga-
mentan do um hoom da Bo lsa se m q ualque r rela ção co m o es ta-
nhos de produtividade entre sa lários e lucros, cresci me nto dos
do mo roso persist ente da econom ia, que co mo todo boom só
salá rios reais, co ntratua lização e legaliza ção da relação salarial ,
podi a ter minar em u m crasb. E so me nte a inte rvenção o rganiza da
ga rantias co le tivas sobre a re pro d ução d a força de trabalh o ,
do co njunto dos Bancos centra is ev ita ria q ue esse último dege-
etc .) , bases da acu mulaçã o do ca p ita l, tornara m-se o bs tác u los
nerasse e m re cessão ge neraliz ada das eco nomias oci denta is. os
à s ua co ntin u ida de, a partir do mo mento em que os mod
Entreta nto , isso não foi suficie nte pa ra afastar definitivam ente
fordista s de explora ção e de do minaçã o do trabalh o Ce tam bé m
seu fan tasma , como demon stra m, ao longo de todo 1990, a d imi-
de co nsu mo) chegar am a seus limites . Ora , em g rande me dida ,
nui ção do cres ciment o eco nô mico dos Estados Unidos e da CEE,
no curso dos últimos cinq üen ta anos, as o rga nizaçõe s co ns ti-
a retoma da da inflação, a red ução co ntín ua dos fluxos nos pr in-
tutivas do movi men to o pe rário (sindic atos e partido s) de ve ram
cipais mercad os finan ceiros, o desm or oname nto de diverso s pa í-
sua existê nc ia, sua eficácia e sua le gitimid ade simples mente ao
ses do Terceir o Mun do , tudo isso ante s mesm o q ue a "crise do
pa pe l q ue manti veram de mediad oras entre o ca p ital e o tra ba-
Go lfo" viesse també m ag rava r esse s dife rentes fato res - prov as
lho. Tudo nel as - est ra tég ia, for mas de o rgan iza ção e de lu ta ,
da fragilid ade do restabel eci mento da s ituação econôm ica nos
ideolog ia - fo i progr essiva mente co locado e m fun çã o desse
países capitali stas desenv olvidos , qu e estão bem longe de já te-
pa pel. E fo i esse pape l de mediad oras da rela çã o sa larial, co m
rem e!,!contrado a "saída da crise", co m tanta freqüên cia anuncia -
o qual elas se iden tificaram int ei ra mente no p erí odo pós-gu e r-
da p rematu ram ente.
ra, qu e , com a ruptura do comp ro miss o fordista , essas o rgani-
zações nã o mai s assu mira m.
Ness as co nd ições, entend e-se co mo essa ruptura por inic ia-
3) O movim ento operá rio desno rteado
tiva da classe domina nte tenha podido peg ar de su rpresa essas
o rganiza ções: após décadas de "guerra de posição " em um q ua-
Assim, a partir da abe rtura oficia l da crise , as classes do mi-
dro sócio-ins titucion al familiar, vo lto u-se bruscam ente para uma
nan tes ocide ntais procura ram sucessivame nte um a saída po r dois
"guerra do movim ento ", implica nd o o progressivo aba ndono das
caminh os opostos, e ambos pareceram se r simples me nte becos-
-regras do jo go" anterio res. Desde en tão , dia nte dessa modific a-
se m-saíd a. Se as trad icionai s receita s keynes íanas se revelar am
ção rad ical dos dados estratég icos da situação , as o rganiza ções
inca pazes de reco locar em marcha o mo tor qu e cada ve z fun cio-
co nstitutivas do modelo socia l...demo crata do movime nto o perário
na va menos co m a acumu lação for di sta , por o utro lado , a vo n-
.c rnararn-se ca da vez mais i n a d ap ta das, se ja em suas prática s,
tade liberal de rompe r co m as regras do jogo da regu lação fordista
:: =ia em suas es tru turas, se ja e m suas represe ntaçõe s.
levou as econo mias ociden tais à beira do abismo .

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ace ita r a de te rminaç ão capitalista de "faze r a crise ser paga" pe-
Essa inadap tação vai se manife star, em primeiro lugar, em
los trab alhad ores (pe nse-se na herói ca greve dos min eiros britâ-
suas reações , pe rante a crise e a ofensiv a que dela resulta co n-
nicos em 1984-1985), essa es tratégia se co ndena ao fracasso, a não
tra as co nq uistas do prolet ariado durante a fase fordista . Reaçõ es
ser q ue crie uma relação de forças tal, qu e permita ir além do co m-
marcad as por uma divisão , em si mes ma já prejudicial, entre duas
prom isso qu e procura manter.
estratégias, ambas impote ntes, levando a u ma nova ret omada da
Ao co ntrário, os Modern os (a CPDT na Fran ça , a CGIL na It á-
qu erela dos Antig os e Modernos.
lia , a DGB na Alem anha , a AFL-CIO nos Estado s Unidos )" qu e
Os Antigo s são partidá rios da manuten çã o do status quo, da
co nsta tara m a impossibili dade de renova r os ter mos do a ntig o
defesa intransigente das posiçõe s co nqu istadas e dos di re itos e
com p romisso so cial "s em modificá-los, procura m negoci ar co m a
ben efícios adquiri dos pe lo proleta riado no quadro do co mpro-
classe do minant e um novo comp rom isso: em contrap artida à acei-
misso social pós-gu erra . Estratégia defens iva aco mpa nhada , co m
tação de rediscu tir a rela çã o sala rial fordista (por exe mp lo, a
freqü ência, de um program a de política econôm ica , implican do
um papel a inda ma ior do Estado (progra ma de na cionalizaç ões indexa çã o dos salários ao s preços, a "rigide z" lega l e co ntra tua l
do uso da for ça de tra balho, etc.), ess as organiz ações procur am
indu striai s e bancá rias, co ntrole do investim e nto privad o, me d i-
d as p ro tecio nistas a favor do aparelh o produtivo nacion al, et c .). o bte r nov os benefíc ios em termos de reduçã o do tempo de tra-
Foi basicam ente a es tratégia da es q ue rda frances a antes de 1981; ba lho , de "pa rticipaç ão dem ocrática " na vida da e mpresa (co n-
e la perm anece a estratég ia oficialm e nte precon izada pelo PCF e trole das co nd ições de traba lho, relac ionada s à introd ução das
pela CGT, ass im co mo pelo T UC b ritâni co . novas tecn o logias) , ele fo rmação pro fissiona l, de direito de su per-
Estraté gia crit icável por d ive rsos mot ivo s. Ela não aconte ce visão sind ica l das o rie ntaçõ es micro e macroe co nô micas, etc.'
sem fetichism o dos benefícios e dir eitos adquiridos pel o prole- Estra tégi a a p rio ri audacios a e sed utora: ao co nt rário da a n- "
ta riad o no quadro do antigo compro misso social , co mo se estes te rio r, tenta enfren tar os p roblem as que a crise e as reestru -
constit uíssem o nec plus ultra da co nd ição proletár ia so b o ca- turaçõe s do capitalismo co loca m hoje para o proletariado ocide n-
pitalism o . Por o utro lado , e la deixa de se interes sar pelo q ue tal. Mas es tratég ia perigosa e finalme nte catastró fica, uma vez qu e
emerge de nov o na situaçã o de crise atual: os novos problem as leva es sas organiz ações a troc are m um pássaro na mão por do is
co m os -q ua is as re estrutu rações ca pitalistas co nfro ntam o pro le- voa ndo, a sacrificare m as conqui stas do co mpro misso anteri or
tariado (po r ex emplo , a introd ução elas novas tecn ol ogi as rni- sem co ntrapartida sig nifica tiva , a se to rnare m, em última aná li-
croelet rônica s, o desenvol vim ento do tra ba lho instável ) , ma s se . cú mp lices da classe capitalista em sua ofensiva co ntra o p ro-
ta mbém as novas asp irações q ue nasce ram no se io do proleta - le rariado. É possíve l pensa r, po r exemp lo, na evo lução di reitista
riad o no cu rso da fase fo rdista (relativas, po r exe mplo, à redu- :narcan te da CFDT. Pois a institu ição de um novo co mprom isso
ção do tempo de tra balh o ). Além disso , a defesa dos ben efí cios co m a classe domina nte passa necessa riamen te pel a criação de
e di reitos adquiri dos le va , co m freqüên cia , a defend er ape nas u rna rela çã o de for ça s pel o menos um pouco favorável ao pro-
aq ueles qu e del es se bene ficia m, prati cam ent e abando nando letaríad o, e essas o rganizaçõ es não se preocu pam em fazê-lo, p ro-
aque les qu e n ão se benefic iaram ou se be neficia ram pouco e , .,:-urand o na maio ria das vezes nego ciar esse co mp romisso de irn-
so bretudo , aq ueles que nã o se benefic iam ma is. Em o utras pa - ? ,o \'iso (no táve l ex ce ção : a grev e e nca minhad a em 1984 , pel a
lavra s, a defend er as camad as e categorias já "privilegiadas " do :G víe ta ll, pela s 35 hor as na ex-Ale manha O cide ntal) .
proleta riado em detrim ento da s outras. Ou se ja : di an te da crise do fo rd ism o , as o rganiza çõe s atua is
Enfim, e acim a de tudo, essa es tratég ia simp lesme nte esqu e- : :' movim ento o pe rário reprodu ziram as mesma s estratég ias e e n-
ce q ue , para elabo rar, ampliar o u ma nte r um co mpro misso, é p re- t-a-am nos mesmo s becos -sem-sa íd a que as bu rguesi as ocide n-
ciso ha ver pelo menos dois interess ados, e qu e atu alment e a classe
capitalista não qu er mais esse co mpro misso porque ela não p ode novo
fi nal desta obra, retomarem os de talh ada menr c ess e esboço de um
mais pagar seu preço . Conseq üentem ente, apesar da intransigênci a r- mpromts so ent re cap ital e p ro letariad o .
q ue , às ve ze s, é ca paz de mo strar e m sua louváv el recusa e m

81
80
tais: umas procurando manter, a qualquer preço , os termos de um
co m pro misso qu e a as fixia do regime de acu mulação co nde na
inexoravelmente , as outras pensando que um novo equilíb rio
social só pode nascer dos esco mbros do antigo compro misso, ao
desmantela me nto do q ua l prestam ativame nte
assistência . Cabe dize r também q ue , diante dessa crise , o movi- Capítulo V
mento operário encontra-se nu e desarmado: privado de qu alq ue r
estratég ia própria, red uzido à imp ot ência, co nde nando ao mes-
mo te mpo o proletariado à esco lhe r entre uma revolta estéril e
2
uma res ignação av ilta nte .

A FRAGMENTAÇÃO D O
PRO LETA RIADO

\
D urante o período for d ísta, de-
vide à dinâmica deste último e à "estratégia de int egração" se-
guida pelo.pró prio proletariad o , as ten dê ncias à homogen ei zação
da classe pred ominaram (malgrad o heterogeneidad es e desi gual-
dades co ns ta ntes). A partir d o início da crise e, mais particular-
mente , a partir d o fina l da décad a de 70, temos assistido a uma
f:-agme ntação crescente d o prolet ariad o oc ide nta l, que tende a
? 3.ralisá-lo enqua nto força so cial.

1) O proletariado em todos os seus estados

\" 0 esp ectro atu al das image ns proletá rias, três grandes co n-
..:::.t05 se delinei am:
3.) Os p ro/etá rios está veis e com ga rantias. Seja por razõe s
-..:::d icas (caso da mai oria dos que são assalariados no se io do
1 Os únicos exe mp los de luta s ope rárias de massa qu e tive ram êx ito no cu r- de Estado), se ja po r razões econô micas (caso dos ass a-
so desses últimos a nos "s ão p roveni enl cs de paíse s o nde o mo vime nto ": -:3.dos de empres as ou de seto res que puderam escap ar da crise
operá rio não e ra (aindaê) org aniz ado de 'acordo com o modelo socia l-de mo -
c rata: Pol ôni a 0980-1981), Brasil 0 982-1984) , África d o Sul 0 984-1986) , : .: :.u e a su pe raram), ele s não têm s ido , o u têm s ido pouco,
Cor éia do Sul (987).

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---
a meaçados p e la re di scussão da rel ação sa la ria l fo rd ista . São A essa catego ria, po demos juntar os tra balhadores em domi-
prole tár ios q ue tê m mais o u me nos ga ra ntido um e mprego , o cilio , e nvolvidos em uma forma apa rente me nte arcaica de
aume nto o u , pel o menos, a manute n ção de nível d o sa lário real, su bmissão d o traba lho ao ca pital, à qu al no entanto a crise
ne go ciação co letiva das co nd ições de trabalh o , proteção e e x- co nfe riu um novo vigor e m certos ramos;
p ressão sindica is, po ssi b ilidad es ma is o u me no s e xtensas de • os trabalhadores em temp o parcial, po r o pção o u im posi-
"ca rre ira" e de pro mo ção social na e mpresa, et c. ção, por defi nição mal integ rad os ao co letivo de trabal ho de
Entretanto, à medida q ue a crise se pro lo nga e se aprofund a , sua e mpresa e q ue, co m freqüência , não se bene ficia m dos
esse n úcl eo de traba lhad ores es táve is tende a se es tre itar e suas benefíci os so ciais rese rvados aos trabalha dore s em tempo
tendem a se restring ir. Além d isso , a re laçã o sa la rial integra l. Essa forma de trabalho "atípica" não pa ro u de se
fo rd ista encontra-se alterada, e até mesmo recolocada e m q ues- desenvolve r desd e o início da crise : na França, entre 1982 e /
tão , pelo me nos parcialmente , també m por eles (por exe mp lo , 1986, o núme ro de assalariados e m tem po parcial cresceu
no se ntido de uma maior flexibilidade do co ntrato de trabalho ). 21,35% (atingindo os 2,1 milhões) e cerca de 25% no caso da s
b ) Os proletá rios exclu ídos d o trabalho, e até d o mercad o de mulher es (q ue representam mais de 80% d os assa lariad os e m
traba lho esp ecifi ca mente . A crise jo ga- os por muito tempo , o u te mpo pa rcial);
mes mo definitivame nte , no o lho da rua (é o caso e specialme n- • os trabalhado res temp orá rios, q ue r se trate de trab alh ad o-
te d os trabalhador es idosos o u dos trabalha d o re s po uco qu alifi- res inte rinos o u de trab alhado res co m co ntrato de duração
cados de se to res e m de clíni o) , ou simp les me nte lhes proíbe o deter minada (CDD) q ue , port anto , não tém q ua lquer garan-
acesso à vida ativ a (é o caso es pecialme nte dos jo ve ns) . Tan to tia d e e mpre go p e rm ane nte (p o d e mos a e les ju nta r o s
un s co mo o utros são, então , co ndenados ao desem prego de lo nga fo lguistas e os aux iliares das ad ministrações e dos serviços
dura ção' e , po rtanto, à dependên cia-da segurida de social, per- pú blicos) , Qu as e desco nh ecid as antes da crise, ess as fo rmas
co rrendo um cami nh o e ntreco rtado por d iversos es tág ios qu e , no de tra ba lho instáve l estã o ag o ra e m co nstante cresc ime nto.
fina l, para um nú mero cresce nte d eles, sig nifica o me rgulho na Embora se u nú mero ainda perman eça modesto e m termos de
pob reza e na miséria . es toq ue , é d ua s a trê s vezes- mai s importa nte e m termos de
c) Entre esses do is pó los, a massa flu tua nte de tra balhadores
fluxo . Tra ta-se , e ntão, de u ma catego ria de tra balha dores
ins táveis, no seio da qu al co nvé m distingu ir diferen tes catego rias: pa rticula rmente m óveis, passando co m freqü ência da ativi-
• osp roletá rios das emp resas que opera m por su bcontratação da de ao desemprego e vice -versa ;
(te rceiriz ação) e por encomenda, geralme nte e m peq uenas • os estag i ários, basicame nte jo ven s, ma s q ue inclue m tam -
e méd ias em presa s, trab alha nd o no ritmo das enco me nd as bé m cada vez mais trabalhado res mais ve lhos, "be neficiá rios"
d as e mp re sa s d oad oras d e o rde m , mais s e nsíveis às flu- de múltipl as fórmu las de estágio (d e inserção , de qu alifica-
tuações econô micas. Desde o início da crise , a subco ntratação ção, de adap tação , de reciclagem , etc.) q ue os governos oc i-
dese nvolveu-se particu larmente e m ce rtos ram os indu striais dentais mu ltiplicam , me nos para luta r contra o desemprego
(tê xtil-vestuário, fab rica ção mecânica, tran sforma ção de plás- do q ue para mascarar o u ev itar 0 5 riscos sociais e polí ticos
ticos). de le deco rrentes;
· e nfim, no cú mu lo da instabi lidade , os trabalh adores d a
"econ om ia subterrânea ", que ten tam es capar ao desempre-
1 o au me nto do número absoluto de desempregados mascara. gera lmente, um
go trabal hando "clandestiname nte " (se ndo, além disso , fre-
fen ômeno mais impo rtante aind a: o au mento do desemprego de fatiga du-
ra çâ o (mais de um ano) e de Iong u ísstma duração (ma is de três a nos) . No qüe nte me nte co loc ados em situação de subco ntrataç ão em
conju nto da CEE, mais da metade do s desemp regados o s ão há mais de um re lação à ec o no m ia oficial), o u entrega nd o- se à pequ e na
an o e cerca de um terço há mais de dois an os (cifras extraídas de L 'Eur op e produção me rca ntil (p rincipalmente no setor de se rviços
etT cb tffr es. pub licação da s Co mu nid ad es européia s , difu são La Doeu -
p res tad os a particulares) .
mentatio n Françatse. Paris, 1988).

84 85
- - - - ----".
, Essas diferentes categorias de trab alh ad or es têm em comu m engendra: as transformações da relação salarial em curso des-
a su bmissão a um co njunto de constrangimentos: instab ilidad e de °
de iníc io da crise, seja no processo de p rodução se ja no pro-
. emprego e, portanto, de renda; des regulamentação mais ou me- cesso de cons umo.
nos for çada de suas condições jurídicas de emprego e de traba-
lho (e m relação às normas legais ou convencionais); conquistas
e direitos sociais em reg ressão; com freqüência , ausência de 2) A nova ordem produtiva
qua lquer benefício convencional; a maior parte do tempo, ausên- /
cia de q ualque r proteção e expressão sindicais; enfim, tendên- Do capítulo an terior resulta q ue toda saída capitalista para a
cia à ind ividu alização extrema da relação sa larial. crise supõe ir além dafáhrica fordtsta por me io da Instauraç ão
Um processo de cisão do proletariado como esse é ainda mais de novas formas de exploração e de domi nação do tra ba lho. Ou
grave porque os três conjuntos anteriores tendem a se separar uns seja, ao mesmo te mpo novos me ios de trabal ho (uma nova
dos out ros e a se isolar. tecnologia), novas fo rmas de organização do processo de traba-
lho (emancipa ndo -se d os lim ites da organização tay lo rista e
Assim, entre os trabalhadores estáveis e com garantias, ass is-
te-se ao desen volvimento de reações corporativas em relação aos ford ísta), no vas formas de contrato de trabalho, novos modos de
trabalhado res instáveis e aos desempregados de longa d uração, mobilização (de envolvimento e de integração) da força de tra-
decorrentes da vontade de p reservar, em termos de ca tegoria, as ba lho na e mpresa e, como co nseqüê ncia, novas fo rmas de "dis-
posições co nquistadas e m detrime nto da unidade de classe. cipli na de trabal ho ", etc.
Po r outro lado, se , para os recé m-fo rmad os, o trabalh o ins- É exatame nte a isso que se dedica o capital desde o início da
tável (principalme nte provisó rio) é co m freqüênc ia apenas tra n- crise , dese nvolvendo a "nova ordem p rodutiva" de três form as:
sitó rio e preparatório para uma inserção d uradoura no trabal ho, a) A fábrica difusa? Ela invert e o processo de concentração
o utras categorias de trabalh ad or es (mu lheres, ho me ns adu ltos , prod utiva que o ford ismo o rigina ra. Para isso, há duas razões bá-
jove ns se m fo rmação) tendem, ao contrário, a se fechar e m um sicas:
ciclo ini nterrupto de trabalho instável/desemprego ou inativida- • passado um ce rto limiar, lo nge de ga rantir as economias de
de/trabalho instável , e até mesmo a saírem da instab ilidade por escala previstas, a concentração produtiva gera custos exce-
baixo mergulhando no desemprego de lo nga duraç ão dentes em te rm os de d ila p idação (de espaço-te mpo, de
A ex periência mostra enfim que, passado certo te mpo, o energia, de meios de traba lho, de mão-de-obra);
desemp rego provoca verdadeiros fe nôm enos de exclusão e de • mass ificando-o, isto é, concentrando -o e hornoge neizando-
auto-exclusão em relação ao mercado de traba lho, ainda que se ja o. as eno rmes unidades produtivas engendradas pela produ-
simplesmente pelo fato da desvalorização de u ma qualificação ção em massa fordista d otaram o proleta riado indus trial de
profissional já fraca inicial mente. Os desempregados de lo nga uma capacidade objetiva e su bjetiva de luta q ue lhe permi-
d uraçã o são ass im progress ivamente encerrados em um ve rda - tiu, durante alguns anos, bloquea r o u pelo menos entravar
de iro gueto social e instituciona l. se riame nte o processo de sua exploração.
Assi na le mos, a lém d isso, que todos os estudos efetuados
sobre o desenvo lvimento do desem prego e da instabi lidade Assim, a "centra lidade" da grande indústria não é abolida: ela
mostram que estes te ndem a reatívar e a refo rçar as an tigas d i- .:_-=-.;:desmente se transfo rma . Em vez de concentrar 'e m um mes-
visões e desigualdades de status no seio do proletariado: atinge m = .: lugar o máx imo de funções prod utivas e administrativas, o
mais os traba lhadores não-qualifica dos que os qualifica dos, as
mulhe res q ue os ho me ns, os jovens ou idosos que os adu ltos, os exp ressão foi p roposta pelos estudiosos do operariado italiano, a partir
estrangeiros que os nac ionais. ce -": ::". 3 análise da ree strut uraç ão dos grandes centros ind ustriais da Itália do
No entanto, é preciso ir alé m da simp les consta tação anterior ::t;':"': e e do centro. Cf as contribu ições italianas em J.-P. 'GAUDEMAR ed..
°
da fragmentação do proletariado e investigar processo que a et ou vrters, Par is, Maspéro , 1980.

86 87
ca pital te nde ho je, ao co ntrário , a espalhar a produçã o e o po- co mb ina-se uma "auto maç ão de int egra ção ", q ue co ns iste e m
der através de to do o es paço social. Po is a fáb rica d ifusa su põe uma ges tão informa tiz a d a d os flu x os p rodutivos no nível de
. se mp re u ma unidade central q ue coordena, planifi ca , o rganiza cada seção. O o bjetivo disso é ot imizar a co mb inaç ão. no es pa-
a produção de tod a uma rede de unidades peri fé ricas, qu e po- ço e no tempo , das matérias-p rimas, das energias, d os equi pa -
dem ating ir o núm e ro de vá rias ce nte nas , e até de vários milh a- mentos , dos ho mens, da info rmação , etc., redu zind o ao mínimo
res. A concent ração piram idal do pod er é substi tuída pelo pode r os tempos no encadeam ento das o perações produtiva s.
resu ltante da gestão fluida e flexíve l de uma rede . O qu e assegura ao ca pi tal, além de no vos ga nhos de inten sida-
O q ue significa "exte rnalizar" um a parte das fun ções prod u- de e de pro d utividade, econo mia de capital co nstante (ta mo fixo
tivas o u ad m inistrativas· at é e ntão in cluídas no ca mpo o rga- q uan to circu lante) por unidade produ zida .
nizacional da g rande ind ús tria; No nível mais simples, trata-se da Mas, para tira r pa rtid o das 'po te nci a lid ad es co ntida s na
desconce ntração e até me smo da desaglom era ção das grandes auto maçã o de integração, e m term os de fluidez do processo de
unidades produti vas, da descent ralização de sua gestão (cujo trabalho, é preciso também modificar brutalmen teas fo rmas de
co ntrole pel a matriz torna-se possível graças ao dese nvo lvime nto orga niz aç ão do trabalho e, co nseqüente me nte, da divisão social
das redes de informática) e do desenv olvimento das filiais, de tod os do tra ba lho, a rela ção o perário especializado/ máq u ina es pe-
os mo vim entos qu e tive ram u m bel o impulso no curso desses cializada, cé lula da organização fordista, deve se r então substituí-
últimos anos , so b a proteção do slogan "small is beautiful", e que da po r lima relação equipe polivalente/ sistema de máqu inas au-
não são de fo rma alguma co ntraditÓrios co m um a ce nt ralização to ma tizadas (e , port an to , também
, poli valentes) . A utilizaçã o da
finan ce ira maior do cap ital. automação de integração em ben efício do ca pital supõe , então, a
Ta mb ém está ligado a ess e mo vimen to de d ifusão o au me n- co nstituição de equi pes de trabalho reunindo todas as q ualidades
to da ut ilizaçã o da terce iriza ção e d o trabal ho po r enco menda: necessárias à pilotagem, à supervisão ma s tam bém à manutenção
co nse rva -se o "co ração" do pro ce sso de traba lho e de gestã o , e dos sistemas au tomatizados, e nas qu a is cada trabalhador deve rá
subco ntrata-se todo o resto ( p rod uç ão es pecializada o u extraor- se r ca paz de int erv ir em vá rias máqu ina s di ferentes ao mesmo
di nária, segurança e limp e za, man uten ção es pecia lizada , et c.). tempo. A t1uidez do processo de traba lho requer, assi m, a da pró-
Mas do mesmo mo do, evide nte me nte, a utilizaç ão das "fo rmas pria o rganização do traba lho , e conseqüenteme nte o abando no da
marginais" de traba lho. trab alho em dom icílio, traba lho "clan des- orga nização do trabal ho em postos fixos e especializados.
tino ". Enfim, a "exte rna lização" de um a part e do pessoal realiza- Além d isso, o trab alho de execu ção neces sá rio em uma "ofici-
se por meio do ape lo à mão -de-obra temporária (interina e CDD). na flex ível" muda singula rme nte de co nteúdo em relação àqu ele
b) A fábrica fluida. Pro cura realizar uma produção em um mo bilizado pe la oficina fordista: a produç ão aut om atizada em um
con tín uo id e al, se m tempo mor to nem int erru pçõ es, qu e os co ntínuo su bstitui as tarefas parcelad as e re petitivas do o pe rário
mo d os es pecificame nte fordistas de produção só real izavam de especializado , qu e não ex igiam nen hu ma habilidad e nem expe-
. modo mu ito imperfei to , mul tiplica ndo , de Ul11 lad o, os te mpos riência pa rticulares, po r um outro tipo de taref as triuiais. reduzidas
mortos e ntre as diferentes sé ries de o perações pa rceladas e , do .'l capacidade de leitura e de interpretação de dados forma lizado s,
o utro, os "de percurso ": peças à es pera , es to q ues, peças defei- pe rmitindo enfrenta r os acasos e incidentes da produção e, porta n-
tuosas para co nsertar, etc. Trat a-se , então, de o bte r 110 VOS ga nh os :0 . reagir ao imprevisto, nele intervindo co nseqüentemente.
de intensid ade e de p rodutividade tio trabalbo , que supõe po r parte do operador de base ao mes mo tempo
É essa um a d as mai ore s razõ e s d o m o vim ento atua l de . e rta libe rda de de mo vimento e um a ca pacidade de inici ativa;
auto maç ão do processo de trab alh o nessas indústrias. A introdu- ert a poliva lência (pois é preciso saber inte rvir em diversos tip os
ção de nov os eq uipa mentos ro bót icos não é feit a sim plesme nte mate riais) e ce rta pol iatividad e (mescla ndo tare fas de fabri-
para e liminar o pe ra ções efetuadas manual me nte e su bstitu í-Ias, .10. de dis cussão, de man utenção trivial, e até mesmo de ges-

int e iram e nte ou não, po r um a ativida de regu lada de ma ne ira prod utiva); portanto, igualme nte, ce rta co mp ree ns ão dos me-
eletrô nica . A essa "a uto mação de su bst itu ição" supe rp õe-se e .rrusmos utilizados pelos sistemas integ rados; enfim, uma co ns -

88 89
sobre
pr ego e be ne fícios em m at éri a d e salários , d e contro le
ciência pro fissiona l se m a qu al não são gara ntidas nem a rapi dez
suas co ndições de traba lho , de for mação co ntínua e de pe rspe c-
e a pertinê ncia das intervenções, nem a qualida de do produt o e de
tivas de carreira , co nstituin do finalme nte um a nova espécie
a preserva ção do material.
"o per árío de ofício " do ano 2000.
Daí lima reescalada das qualifica çõe s e do nível de formação
uma c) A f á brica flexível. Essa nova exigência de flexibílidade está
geral e profissional dos operad ores de hase. Mas também 60 e 70,
li gad a à saturação progressiva , no curso das décadas de
tran sformação das fun ções do staff admini strativo nas equ ipes deu origem a uma de man da
o lu- da norma de cons umo fordista qu e
po liv alentes , o co ntro le e a superv isão dos homens cedend tempo mais flutuan te
de be ns de co nsumo du ráve is ao mesmo
gar à assistência técnica e à mo nitoração das equ ipe s produtiva s.
por fo r- e ma is d iversificad a e, portant o, mercad os m ais incerto s e het e-
U m controle de tipo mil itar pode assim ser substitu ído ca ráter
rogêne os, entrand o dire tament e em contrad ição com o
mas de selfcon trai em equipe s, que passam a ser responsáve is
rigido do processo de produç ão em sua fo rma fo rdista. cadeia
A
po r ob jetivos de prod utivida de e de qu alidade (o que supõe um es-
sua in- for d ista é adapta da apenas à produç ão contínua em grande
forte envolv ime nto dos traba lhado res em seu traba lho e cas va-
cala de um ún ico produt o, do qu al ela tolera ap ena s fra
tegraçã o à e mp resa e ao "espírito da casa"), e de soft contra i . o espe-
integra- riações, e im põe uma organiz ação em postos de trabalh
informá tico por sistem as de te lesupervi são diretam ent e mais, o nerosa em capi tal fixo , a fábrica for-
cializados e fixos. No
dos ao ma terial p rodu tivo . produç ão em massa, co ntínua, para garan tir a
di sta exige uma
Em po ucas palavras, a oficina flexível parece desemb ocar em ida dos eq uipame nt os. A q ue se ju ntam , ainda,
re- amortiz ação ráp
lima certa supera ção d o tay lorismo, atrav és de uma relativa ao for-
nce p- os efe itos pr ópri os do compro m isso que serv e de base
co mpos ição das funções de execução e da s fun ções de co salá rio mí nimo , estab el eci me nt o das
d ismo: ge ne ralizaçã o do
ção . E, de fato , nos ra mos em q ue ela é introd uzida (p or exe m- de contrat os coletivo s, men -
cion a, grades de qu alifi cação, instauração
plo , o automo bi lístico) , a automaçã o de int egração revolu sind ical do salário e das
açõe s instaur adas no pr o- salização do salário operário , defesa
a partir de entã o , o sistem a de qualific
odelan d o a compo sição co ndiçõ es de trabalh o, etc.
letariado por d écad as de fordismo , rem ma
Tai s rigor es torn am-se insuste n táveis no qu adro d e u
soc ioprofissional ("técnica") da classe . mais incerta de -
co njuntura eco nômica que se tor nou cada vez
Assim, algumas catego rias do p role tariado são excluíd as (re- pe la inte rna -
vido a um a concor rência exace rbada p ela crise,
duzida s ao de sempre go e à instabilid ad e). É o caso d os ope rá- revisíve l
ra a cion aliza ção crescente dos me rcados, pela evo lução imp
rios especia lizados, porque sua ativi da de desapa re ce (embo
po rq ue sua ex pe- das taxas de câm bio, etc.
rob óti ca a deix e subsistir) e ao me smo tempo
A flexibilid ad e do p rocesso de trab alh o supõe , ass im, em
riência profissional, re du zida à experi ê ncia da mecani zação os para
primeir o lugar, a introdu ção de m eios de trab alh o apt
tayloris ta, não é conversível no novo conte xto tecnoló gico e o r- ade prod ut iva a li m a deman da va riável em
aju sta r a capaci d
ganizac ional. m posição . Eis aí ta mb ém toda a im port ância dos
nea- volume e em co
O utras catego rias do pro leta riado encontram-se simulta
eq uipa mentos produz idos pela eletrôn ica prograrn ável, flexíve is
mente desesta bilizad as por essas transformaçõe s. É o caso es- nto de
por sua capacid ade para memorizar e exe cutar um co nju
pecialme nte dos antigos o pe rários qualificado s que a autom ação serem rapidam ente reprogr ama dos
op erações d iferentes o u para
desesta biliza, Pois, pa ra o capita l, trata-se de se a pro priar e de Gra ças a ele s, o process o de
amea- para uma série de tarefas diferentes.
objetiv ar sua experiência nos novos sistemas au tomáticos, istos do process o de circu-
pro du ção pod e adap tar-se aos imprev
çando ass im desqu alificá-los.
pe- lação . Disso resulta lima aceleração da rotação do capital (tant o
Enfim , outras categor ias são p rom ovidas. É o caso dos o
tiza dos , cha ma dos a constit u ir uma fixo quanto circulante). Mas també m ga nhos de tempo (de inten-
radore s em sistem as automa
s de sidade e de prod utividad e do traba lho), co mp rimindo os tem pos
nova categor ia de operár ios altame nte qualificados, capaze as de
ona l, seu envo lvi mento no mortos entre as diferentes séries produtivas. -Enfim, econ omi
cap itali zar sua qualific ação pr ofissi
em estabili dade de em - ca pital co nstante (particu larme nte fixo), com a flexibil idade dos
trab alho , sua co nsciê nci a pr ofission al

91
90
menos pa ra ce rtas cat egorias de traba lhadores (os joven s, por
apa relhos produtivos, evitand o que se jam desclassificados a cada exemp lo). Mas tam bém pela abo liçã o dos mecanism os de in-
muá ança de ga ma de produtos. Todos os fato res favo recendo a dexaçã o dos salários aos preços e à produ tividad e, que datam da
recuperação da taxa de lucro . época ford ísta , e em lugar desses a adoção de novos mecanismos
A fiexib ilidade do processo de trabalho requer simu ltanea- de formação do salário direto , de natu re za mais co ncorrencial,
mente uma organiz aç ãojlexível do tra balho, ou se ja, o trab alha -
considerando ao mesmo tempo a situação econô mica gera l, resul-
dor deve se r ca paz de ocupa r difere ntes postos de traba lho, de tad os es pecí ficos da empresa e , po r fim, o "desempe nho" ind ivi-
intervir em diferentes tipos de materiais, de inse rir-se e m d iferen- du ai de cada assalariado. Pois a fiexibilizaçáo do salário, afinal, im-
tes seg me ntos do processo de trabalho , etc. A e xigê nc ia de fie - plica sua máxima indiv iduali zação , a dete rioração de sua negocia-
xib ilidade co njuga-s e , assim, co m a de fluidez pam req ue rer uma c ão coletiva ou , pelo me nos , seu co nfiname nto no nível da em -
mão-de-obra polivalente, qualificada, bem for mada, operando presa. Assim, comprova-se qu e, mais do que a exigê ncia de fluidez,
e m equipes que ligam estreitamente o perários , téc nicos, ad m i- a de flexib ilidade é um fato r de he teroge neização e de cisão do
nistradores, inte grando os obj etivos de produtividade e de qu a-
pro letariado .
lidade , etc . Co m os e feitos con hecidos sobre a co mposição 50 -
cio p rofissio nal do proletariado e a cisão qu e del a resulta entre
as dife rentes figuras proletária s. 3) A nova norma social de consumo
Esse processo de cisão acentua-se ainda de vido àflexjbi/ida-
de da fo rça d e trabalho, que p ode se ju nta r aos fa to re s p re- A a ná lise da crise do fordismo mostrou-nos qu e , assim como
ce de ntes e/ o u su bs tituí-los, para garantir a flexibi lidad e do pro- no processo de produção , as no rmas fo rd ístas man ifestaram seu s
cesso de trabalho . Trata-se , inicialmente , do afrouxa mento das limites no processo de consumo. De um lado , os me rcados dos
co nd ições juríd icas (le gais ou co nvenciona is) qu e rege m o con- meios de co nsumo privados (principalment e o auto mobilístico e
trato de trabalho (ba sicamente as co nd ições de co ntratação e de dos elet rodo m ésticos), que de sempenharam u m papel motor no
dem issão), implica ndo especialme nte a possib ilidade de se re- se io do crescimento fordista , hoje não são ma is do que mer ca-
co rrer facilme nte ao trabalho em tempo parcial e ao trabalho te m- do s de ren ovação que não mais se ampliam ou se amplia m muito
porário : aqu i, flexi bilidade 'r ima diretam ent e cô m instabilidade . pouco . De outro, o reg ime fordista de acumulaçã o chocou-se , a
Mas isso co nduz tam bé m ã fle xibilidad e do te m po de traba lho ,
partir da década de 60, com o cu sto cresce nte ele eq uipa me ntos
ou se ja, d a o rganização do te mpo de trabalho e m funçã o do s e de se rviços co letivos, requeridos a título de co ndições sociais
imprevistos da produ ção , por meio da ad oção de mú ltip las fór-
do p rocesso ele co ns umo privado .
mu las de "horários variáve is" e de se recor re r, co m mais freqüên - Conseqüe nte me nte , a instauração de um a nova no rma socia l
cia, ao trab alho em tem po pa rcial. de consumo é um a co ndição tão necessár ia para um a saída ca-
Sem dúv ida , o conjunto dos fatores prec edentes contribu i
pitalista da crise quan to a de uma nova o rde m produtiva. Em qu e
d ire tame nte par a a fiexibilidad e do processo de valorização . No me dida o ca pital já es tá enga jado nessa via? E em que med ida as
e ntanto, esta ú ltima pod e ainda apelar para outros meca nismos, tra nsformaçõ es assim int roduzidas no p rocesso de co nsumo re-
e ntre os quais o recu rso à su bcontratação e ao trabalho por en -
fo rça m a fragme ntação do proletariad o'
co menda ocupa o primeiro luga r, o que pe rmite variar o investi- .
Do lado do processo de con sum o privado, é preciso qu e o
menta de capital (constante e variável) em função das fiutuações
ca pital, e m primeiro lugar, abra novos mercados re ntáveis, susc i-
do me rcado e da co njuntura econômi ca ge ral, fa ze ndo os sub-
[e novas de mandas so lventes para produtos (be ns ou serv iços) de
co ntratados dese mpenharem o pa pel de "amo rtecedo res" em re- .§!rande consumo. Mas é preciso tam bém que esses novos meios
lação às sacudidelas da produção qu e pode m delas resulta r. de co nsu mo se artic ulem co m as tran sfo rmações e m curso no
É à mesma exigê ncia que respo nde aflexibi/ização d o salá-
proc esso de produção (des e nvo lvime nto de eq uipamentos de
do di reto, isto é, do capita l variável. Esta pass a pe la ab olição dos info rmá tica, robóticos, burocráticos, telemáticos), de maneira qu e
limites mínimos de salário, quer sejam legais ou conve ncioais, pelo

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a de ma nda de tais be ns de co nsumo ve nha sus tenta r a produção No que co nce rne , neste caso , aos equi pamen tos e se rviços
de equipam entos p roduti vos correspo nde ntes. Enfim: é preciso qu.e co letivos, vimos qu e o fordism o revelou -se inca paz de dim inui r
o capital tente integrar e m termos d e mod os de co ns u mo e, ma is a qu antidade de trab alho (mo rto e vivo) necessário àsua produ-
ge ne rica me nte, de mo dos de vida as novas as p irações q ue se çào . Uma saída capitalista para a c rise su põe, portanto , que esse
manifes taram no curso dessas duas últimas d écadas e que se e lem ento de e nca recimento do custo da força de trabalh o se ja
centram na habitaçã o , no convívio , na saúde, na cu ltu ra e no lazer. co ntido e red uzido . Para isso , o capital deve transformar o con-
No q ue d iz resp eito a esse conjunto co mplexo de exigê ncias, junto das co ndiçôes de produ ção e de co nsumo (uso) dos equi-
os avanços realizad os no curso desses últimos anos par ecem ex- pamentos e dos se rviços coletivos.
tremamente modestos, para não dizer insignifican tes. Sem d úvida, Isso supõe, e m primeiro lugar, aume ntar a inten sid ade e a
a "revo lução microeletrônica" abr iu novos me rcados para o co n- produtivídad e do trab alho produtor de tais equipamentos e se rví-
sum o privado, desde prod utos de info rmá tica doméstica (calc u- ços, apoiando- se nas po tencialidades tecnológicas abe rtas pela
lad o ra s, jog os eletrôni cos, micro computad or es) até os da te le- aut omação e letrônica , mas també m alterando significativamente as
mática domést ica , pa ssando pe los novo s mater iais audiovisuais co nd ições de traba lho , o status pro fissiona l e social , os determi-
(videocassete, vídeolase r, tele visão a cabo, o u por sa té lite , etc). nantes institucionais (por exemplo, jurídicos) dos age ntes prod u-
Sem dúv ida, ess a mesma "revolução" pode também acelerar a tores desses eq uipame ntos e serv iços. Transformações fundamen-
ren ovação dos ele trodomésticos clássicos, enc he ndo-os de "mi- tais, pois se dar iam nos se to res que , em muit os casos, tinham até
crochi ps" e de apa re lhos de co ntrole e letrônico . Mas esses no- o present e geral me nte esca pado dos métodos ca pitalistas de orga-
vos meios de consumo privado estão ainda muito longe de poder nização do trabalho, atingindo classes, frações ou camadas sociais
su bstituir o autom óvel ou o eletrodoméstico clássico como motor tradicionalmen te aliad as à burguesia (em particula r o staff admi-
do cresci me nto . E o dese nvolvime nt o desses e qui pamentos nistrativo , a pequen a bu rguesia e os profissiona is liberais), serv in-
microeletrôni cos privados está longe de ter engendrado a "revo- do-lhe de suporte ou de inte rmediári as à sua hegemonia, e cujos
lução" dos modos de consumo e , men os ainda , dos modos de vi- privilégios se ria preciso apa rar o u mesmo co rtar radic almente.
da que a lguns esperam deles : o nde est ão hoje , por exemplo, as Enfim, a redu ção do custo dos equi pamen tos e se rviços
experiências de teletrabalho para as quais, há uma dé cada, era coletivos supõe submet er, na medida do possível, a oferta a uma
pr ognosticad o um dese nvol vimento fulguran te? lôgi ca capitalista de ren tab ilidade e a dema nda a uma regulaçào
É q ue a inflexão das pesadas tendên cias anteriores e a abe r- me rca ntil; e m resumo , subs tituir o Estad o pel o mercado co mo
tura dos nov os mercad os tornaram -se ainda mais difíceis, de vido forma de socialização . O qu e se tradu ziria, inevitavelmente , em
às políticas de au steridade praticadas pelos governos ocidentais a gra us d iversos de aco rdo co m os casos, na priva tiza ção de su a
parti r do final da dé cad a de 70; man ifesta-se aqui um a contradi- produçã o e na monetariza ç ão de seu cons umo .
ção entre o curto pra zo (a ne ces sidade, para o cap ital, de sa nea r Bas ta evocar essas exigências para compreender que elas
a situa ção econômica com a ajuda de políticas de austeridade) e imp licam mudan ças significativas de mu ito ma ior amp litude que
o longo prazo (a necessidad e , para e le, de tran sformar a norma a tran sforma ção do s mo do s d e co ns u mo p rivado s, e q ue os
social de consumo) , Por outro lado, um do s maiores o bstáculos avanços ne ssa dire ção estão ainda mais distantes do final do q ue
co m os qu ais se choca, no momento, a transfo rmação dos modos no caso de sses últim os. O setor da med icina , não obstante est ra-
de consumo é a ausência de qualque r red ução significativa do tégico na pe rsp ec tiva aq u i colocada , ilustra bem a timidez da s
te mpo de trabal ho . Pois o uso desses novos produtos e serviços transformações ent abuladas.
exige "tempo livre", e conseqüe nte mente uma nova organização As te cnol ogias info rm áticas permitem co ns ide ra r a a u-
do tempo social, com base na reduçào do tem po d\, trab alho . Ora, to rnaçã o , pelo me nos parcial, da prática médica e m se us diferen-
na aus ê ncia de um nov o co m pro m isso social qu e substitua o res as pec tos: e xa mes , diagnóstico, ter apêu tica , s upe rvisã o e
co mpro misso fordista, qu alquer ava nço em dire ção a uma redu- acompanha me nto do doe nte , economizando co nseq üente me n-
çào sig nificativa do tempo de trab alho parece excl uíd o . te traba lho vivo e , com isso, au menta ndo sua produtividade. Mas,

94 95
salvo no qu e se refere aos labor atórios de exa mes, isso ainda se o capital mant eve basicam ente as normas fo rd istas, revisan do-as
e nco ntra em estágio experim enta l; a au tomaçã o do co ns ultó rio por baixo . O q ue torna incerta a pers pectiva de um a saída ca pi-
méd ico o u do hosp ital não é pa ra já' talista pa ra a crise atual.
Isso sem falar qu e tal auto mação se ria aco mpanh ada de mo- Entr et anto, po r mais insu ficiente qu e se ja, do po nto de vista
difica ções radica is do sla tu s p rofissio nal, social , juríd ico dos mé- do capita l, essa revis ão por baixo da s normas forclista s de co n-
d icos, rep e rcu tindo em suas co nd içõ es de trabalh o, no nível de sumo tem co nseq üê ncias para o proletariado . Ela co ntribu i pa ra
sua re munera ção, em se u prestígio soc ial, etc. A exigência da eco- ag rav ar o proce sso de sua frag men tação.
nomia sup õe, de fato, socializar o trabalho méd ico no seio de uni- É assim que o desenvo lvimen to de um seguro -saúde de "d u-
dades co letivas de tra tam ento , nas quais reina riam cooper açã o pla (o u mesmo tripla) face" (sistem a de assistêncla pública míni-
e d ivisão de trabalh o entre as diferen tes catego rias de pes soa l ma + seguro co m p le m entar p rivado o u mutualista + terce iro
di co e pa ram édíco , inte rliga das a um uso int ensivo de eq u ipa - pagante ) reforça globalmente as desigualdades sociais e ratifica es-
mentos méd icos. Em resumo , tratar-s e-ia de criar verdadeiras em - pecialm ente o abis mo entre trab alhad o res "estáve is" e "garantido s",
presas cap italistas de prestaç ão de sennço s m édi cos, das q uai s so- de um lado , desemp regados e instáve is, do outro. O mesmo acon-
men te os HMO am e ricanos e algumas "redes de tratame ntos co- tece no q ue diz respeito ao desenvolvimen to de um seg uro-velhice
or den ados" francesa s co nstituem , hoje, raros exemp los no mundo de dupla fa_ce (mínimo público + aposent adoria complementar por
cap italizaç ão). se m co ntar q ue os de sempre ga d os e os instáveis
ocide ntal'
É finalm ente na di reção da subs titu ição d o co ntro le estatal vêem diminu i r a d uraçã o de sua co tização e,
o montant e de sua apose nta doría so bre fundos público s. Qu ant o
pe lo me rcado , enquan to me canism o de regulaç ão da deman da
ao seg uro-des empreg o de dup la face (inde nizações UNEDIC, de
social de tra ta m en to s, q ue foram reali zados os a va nços mais
um lado , indeni zaçào de fim de dir eito den o minado "solida ried; -
signi ficat ivos . Com a instau ração pro gressiva de uma assistê nc ia
de ", de o utro), ratifica pura e simples mente, no plano institucional
social "de dup la face ", confirm a-se o abando no do princíp io do
a sepa ração entre instávei s ("desem pregado s tempor ários") e
fina nciame nto público integr al e unive rsal dos tratame ntos mé-
se mp regado s de lo nga du ração , sem falar ev ide ntemente do s
d ico s - princípi o qu e havia servido de "ideal regulad or" d urante
excluíd os do seguro- de se mp rego (ent re os quais os jovens e as
o perí odo fordista - te ndo co mo decorrê ncia qu e o doen te se mulheres que jamais tenh am trabalhado).
encarre gue de uma parte cada vez mais import ante da des pe sa' de u ma renda m ín im a ga ran tida (RMG), já
A
(recorrendo , eventu almente , a um sistema de se guro privad o ou
co nq u.Jstad a.s o b diferen tes fo rma s em um certo número de paí-
mutualista) ... quand o se us rendim entos lhe permit e m isso . Vão
ses o cidenta is (na Grã-Bret anha, na Irlanda , nos Estados Unidos
no me sm o sentido a libe ração dos preços do seg uro obrigatório,
na Bélgica , na Ho landa , na Dinama rca, na Norueg a e, recente -
estabel ece nd o a co ncorrê ncia dos difere nte s siste mas de segu ro
mente , na Fran ça) p ode lev ar a efeitos semel hant es, pois pode
(privad os , público s, mu tualistas) e a liberação do s preços dos pro-
favorec e r o de senvolv imento de uma ge stào ultra liberal da mão-
d utos e servi ços méd icos, estabelecendo a livre co nco rrência des-
de -obra. Libe rando os capitalistas de qu alque r resp ons abilida de
sas mercadorias. em de po lítica social. Incitan do-os, ao me sm o tempo , a
Assim, ao contrário do qu e se pa ssa no processo de produ- demitír ma is facilme nte, a aumen tar a instabilidade (es pecialme n-
ção, no qu a l o capital dá impuls o at ua lmente a tran sforma ções te recor re ndo ao traba lho tempo rário), a faze r p ressão sobre os
d eci sivas, q ue instauram pro gr ess ivamen te uma "no va ordem salários baix os (por exe mpl o, para esto ura r os mínimos legais o u
prod utiva", procur ando ultrapa ssar os limites do fo rdism o , no co nvencio nais) , e nfim, a restrin gir ainda ma is os benefícios de as-
pro ce sso de co nsu mo as tran sfo rmaçõe s par ecem pou co nume- sistência social.
rosas e a inda tím idas. Ness a seg unda ve rte nte da relação salarial , Pior ainda , a instit uição de uma RMG co rre o risco de ins -
titu cion alizar a marginalização , e até mesmo a excl usão em rela -
, Sob re os HMO, cf artigo de junho de 1987 do Le Monde dtpto
ma ttque. ção ao mercad o de trabalho e, de modo geral, vida social de cer-
à

97

- -=
tas categorias de traba lhadores, fechando-os no gu eto do des em- ainda é muito cedo para se p ro nu nciar sobre as p robabilid ades
preg o de lo nga d uração ou da instab ilidade de vida. Por isso , de de realização de difere ntes pos sibilidad es, visto qu e ess as tran s-
fato, a "dualizaçâo" da soc iedade e prin cipalment e a do proletaria- formações es tão longe de se r concluídas e q ue uma forma d o-
do torno u-se tolerável tanto econô mica co mo po liticame nte . min ante de re la ção sa laria l pode se r acom pa n ha da de fo rmas
su balte rnas q ue dela se diferenciam.
No entanto, já po de mos observar qu e toda s as transfo rmações
4) O movimento operário solapado dos processos de produção e de consumo converge m para um
mesm o efeito global: a frag me ntação do proletariado .
' Assim , de sde o início da crise, em tod os os países ca pitalistas Se m d úvid a , isso não é real me nte nov idade . Em todos os
desenvolvidos, assiste-se a uma red iscuss ão da r elação sala rial te m pos, desde qu e ex iste m as relações cap italistas de prod ução ,
fo rdista em tod os os seus componentes. No pla no tecnológico , é o bservo u-se ao mesmo tem po um a tendên cia à hornogene ízação
o aha ndo no progressivo da linha de prod ução fo rdista , co mposta dos sta tus no se io do pro le ta riad o e uma te ndência , co ntrá ria, à
po r máq uinas es pecia lizadas , em benefício de sistemas de e qui- hc tc rogc nci zaçào , es pecialme nte sob o efeito de um a dist ribui-
pamentos automa tizados, garantindo a fluidez e a flexibilidade do ção des igua l (de acordo com a idad e , o sexo, a catego ria pro-
processo de trabalho : No plano da o rganização do trabalho , é a fissional, a fo rmação, a naci o nalidade) da incerteza e da instabi-
ruptura co m os pnnclpl os tayloristas e a recomposição do co leti- lidade , q ue são dados est rutura is e, po rtanto , permane ntes da
vo de trabalho no se ntido de uma maio r po livalência e autono mia relação salarial (e até me sm o do trab a lho e m d o mic ilio e "avô"
das eq uipes e de uma maior po liatívidade e e nvo lvime nto dos in- do trabalho interino : o traba lho de empreitada).
divídu os. No plan o d o co ntrato de trabalho, são a rediscussão do No e nta nto, d ura nte o período fo rdista, a tendên cia à ho-
"p rin cí p io" d o e m p re go d e tempo int e g ral e c o m du raç ão °
mogeneizaçào dos status entre proleta riad o triunfo u sobre as
indeterminada e o desenvo lvimento de mú ltiplas formas de traba- heterogeneidades co nstante s (des igualdades entre qualificados e
lho instável. No plano da formação de salá rios d iretos, é a volta não- qu alificados, hom en s e mu lhe res, naci o na is e es trange iros ,
pa ra uma ce rta fo rma de reg ulação co ncor rencial (reg ulação pel o etc.), especi alme nte devido à redu çã o tendencial do trabalho prole-
me rcado) pel a des ind exação , flexibilidade e indi vid ualização dos tário a um trabalho simples, ao desenvo lvimento da s gara ntias de
sa lários. E é , enfim, a revisão por bai xo dos di fe rentes be nefícios emp rego em um co ntexto de crescimento co ntínuo e sustentado ,
q ue co mpõem o "salário ind ireto " contra a lógica fo rd ista de seu ao desenvolvimen to dos co ntratos co letivos que hom ogeneizavam
cresc ime nto e exte nsã o co ntínuos. as situa ções ind ividu ais e loca is, à mensalização do salário operá rio,
O co nju nto dev e ser co mpreend ido co mo "pesq uisa exp eri- \ à extensão da assistên cia social, ele. Em resumo , em con seq üência
me ntal", feita de tentativas e e rros co rrigidos, do qu e poderiam da din âmica do fordisrno tal como resu ltava do co mp romisso social
ser os contornos de u ma nova relaç ão salarial, co nd ição de uma ' pós-guerra. E o resultado do conjunto desse proces so foi, co mo vi-
saída cap italista para a crise nas formações cap italistas desenvol- mos, a e mergê ncia do operário-massa, fo rma es pecificamente
vidas. Entre tant o , esses co nto rnos não po dem se r precisad os no fordista de hom ogen eização do proletariado.
momento. Na ve rdade, as transfo rmaçõe s ind icadas esboçam toda A s transformações q ue afetam atualmente a re lação sa la rial
uma ga ma de poss ibili dades co ncorrentes e co ntraditórias. E revelam, ass im, sua ló g ica profunda: at ravés del as, o ca pital pro-

Em Les Saturn íens (Pa ris, Découverte , 1987), Philippe MESSINE a nal isa (rês trabalho e um co ntrato de trabalho flexível . e nfim , a u a satur nta na (do pro·
de ssas poss ibilidad es co m ba se no exemplo da s e mp res as a me rica na s: a uta [eto SATU RN da GM) qu e combina o e nvo lvimento co lenvo dos (....a ba lha -
neotayl ortsta, q ue co mb ina uma se pa raç ão a inda ma io r entre fu nçã o d e dores. nego ciad o por inter méd io da s o rga ni zaç ões sindi cais , co m um co n -
co ncepç ão e fu nçã o de execução, ex cl ui nd o qua lqu e r e spéci e d e e n - trato de traba lho rígido (ga ra ntia de e mp rego) . De fato, ess as três fó rmulas
volvímento nó processo de tra ba lho e no co ntra to de tra ba lho flexí ve l: a via nã o são nece ssartam enre inco m patíve is e rure elas , uma vez que cada uma
cattforrua na. q ue comb ina um e nvolvím e nto ind ividua l no pr oces so d e pod e ser aplica da a diferentes segmentos d o proleta riado.

98 99
por e les de no mina do "operár io social", esteja destina do a su plan-
cura desfaz er a massifi cação do pro letaria do teali za d a p el o
tar o "o pe rário -massa " d o pe ríodo fordista em se u papel de figu ra
ford ismo e à qual ele mesmo acabou sucu mbindo .
he ge mônica no se io d o movim e nto operário (figu ra em tomo da
O o perário-massa era o p ro letariad o concen trado no es paço
qual vai se reali zar a u nidade política d o p ro letar iado)? É prec í-
p ro d ut ivo e , de modo ma is amp lo , no espaço social; ho je , ao
pita r as co isas, o mitindo ou subestima ndo uma d ifere nça esse n-
I

contrário, trata-se de d iluí-lo no espaço socia l, ex plodind o a fábrica-


cial e ntre o "operá rio- mass a" e o "ope rário socia l": enquan to o
fo rtal ez a d a idade fo rdísta e m um teci do prod ut ivo d ifuso . O
p rime iro resul tava de u m p ro cesso d e relativa homo genei zação
o perá rio- massa era o proleta riado bomog eneizad o em suas fo rmas
do pr olet a riad o e podia, en tão, arrastar e m sua luta o co nju nto
de ex ploraçã o e se us sta tus; hoje , ao contrár io, o desenv ol vimento
d a classe, o se g undo resulta, ao co ntrário, d e um p roc esso d e
d o desem p rego e da instabil idad e, o des man telamen to parcial do
fragm en tação d o proleta riad o , que decidid ame n te é p reciso su-
Estado d o bem-es tar, a inst ituição d a assis tê nc ia social de "d upla
perar, pa ra permitir que o proleta riad o se reafirm e como força so-
face " te ndem a beterog eneizar os status no se io do p role ta riad o .
cial un ificad a . As transfo rma çõ e s da relaçã o sa la ria l lançam ,
O operário -massa era o proleta riado inerte, isto é, privado de qu al-
ass im, u m duplo de safio ao mov imen to o pe rário: elas o ob rigam
q uer au tonomi a no pro cesso de traba lho, redu zido à po sição de
sim ul ta nea mente a se ada p ta r a um a no va base so cial (a u ma
simples engren agem d o "co rpo mort o" do capital; ho je, ao co ntrá-
nova co mpos ição "técnica " e "polític a" da classe) e a fazer a sín-
rio, o ca pital bu sca reenvol ver, re mo bilizar os traba lhadore s no pr o-
tese en tre ca tego rias a p rioritão hete ro gê nea s como as dos "no-
cesso d e traba lho, apeland o pa ra sua iniciativa e experiê ncia, ga-
vo s q ua lificado s" e d os "instáve is", síntese muito mais d ifícil de
ran tin do-lhes au to nomia e q ua lificaçã o . O o perário- massa era ,
se reali zar d o que aquela entre o pe rários especia lizados e o pe-
e nfim, o p roletari ado rígido, d evido sua integ ração ao u niverso
à

rário s 'q ua lificad o s, d ura nte o perío do ford ista.


d a prod ução e m massa e do co nsumo de massa ; ho je , ao co n trá- te n ta tivas , co nd u zid as
O pouco res ulta d o d as
rio , o capita l procura impo r-lhe um a flexibil idade mu ltidi men- viment o si ndical, o rganiza r instá-
particu larmen te pelo mo
sio na l: da o rganiza ção do trabalh o, do tempo de trabalh o , do es- mp rova ess as d ificu ldad es. Há causas
ve is e desemp regado s, co
tatu to d o trabalh o , do salário. s. A co me çar p elas reaçõ es de
sé rias nesses fra ca sso s re petido
_ De fato, as transfo rmaçõ es da relação sa larial em cu rso, co m ad e d os tra balhad o res "com
ind iferenç a c a té mes mo de hostilid
seus efeitos globais de fragme ntação e de "d es rnassifica ção" do , não sem razão , a p resença
. ga ran tias " e "estatu tá rios" q ue ligam
proletariado, operam um verdad eiro trabalho de destrui ção e m re- o e de in tensific a-
d o s ins táve is a u m p ro cesso de de sq ua lificaçã
lação ao modelo so cial-demo crata do mov imen to o perário .
ção d o trab alho .
Antes d e mais nada , por meio de profund as mo d ificaçõe s na
Mas o essenci al não está exa tame nte aí. Resid e na instabili-
co mposição "técnica" e "po lítica" d e sua base pro let ária . Mais pre-
d ad e co nstitu tiva dos instáve is e do s d esemp regado s , q ue torna
cisa me nte, elas ten de m a d isso lver as d ua s figu ras pr oletária s que
q uase imp ossível sua integra ção em es trutu ras sindica is, tais co mo
fornece ram se us grande s batalhõ es durante o pe ríodo ford ista: de
uma seção de emp resa o u mesmo uma fede raçã o de ram o . O
um lado, a do operári o q ua lificado, q ue as transfo rmaçõ es atuais
si nd icalismo "ve rtica l", qu e privileg ia a dimens ão de ca tego ria e
mod ifica ra m pr o fun d a mente , te nd e nd o a extingu i r as an tigas
p rofis sio nal, herdad a do pe ríodo for dista , en contra- se aq ui to tal-
categorias do ope r ário qua lificado ligadas ao fo rdismo , enq ua nto
mente inadap tad o . So mente u m sind icalism o co m es trutu ras "ho-
novas categori as de "qualifi cados" su rgem ligadas ao s novos p ro-
rizonta is", que pr ivilegia a d ime nsão inte rpro fissional, é adeq uado
ces sos de trabalho au tomatizad os; de o utro , a do o perário espe-
p a ra organ iza r ao me sm o tempo trabalh ad or es perman en te s,
cia lizado, po nta de lança da ofe nsiva pro letária das década s d e 60
instáve is e d esem p reg ado s.
e 70, sendo os operários es pecializados p rog ress ivamen te e limi-
Alé m d isso , instabilid ade e desemp rego co nfro ntam desde
na d os e substitu ídos po r tra balha do res instáve is dentro desses
logo os trabal hado res co m co ndições de d ominação mais amplas
mesm o s pro cesso s d e trabalh o au to mat izad os.
do q ue simples me nte as co nd ições de. traba lho; por exem p lo ,
Nessas co nd içõ es, co mo pro põem os es tudiosos d o o pe ra-
com _q uestõ es de hab itação, de acesso aos meio s sociais de co n-
riado italia no , é possível consid e ra r que o "trabalh ad o r instável ",

101
'100
su mo, e tc . Em o u tras palavr as, as pre ocupa çõe s e as rei vin - cação dos co nt ra tos co le tivos. Assim e ntra nos resultados da
dicações q ue podem mobilizá-los e permitir o rga nizá-los, sem p rát ica s ind ica l a cisão jurídi ca do co letivo de trab alho em co n-
d úvida, são maio res do q ue as co nce rne ntes às sim ples co nd ições se q üência do desenvo lvim e nto do traba lho ins táve l.
de troca e de uso da força de trab alho sobre as qu ais as o rgani- E a fragme ntação do p role ta riado exerce efeitos igualmen te
zações sind icais se fech ara m du ran te o período fo rd ista . Ainda negativos sobre a prática de greve, reduzind o singularmente sua
nesse caso, some nte organizações q ue se e ncarre gam da defesa e ficácia . O recurso à su bcontratação (principa lme nte d as empre-
do co njunto das co nd ições de existê nci a do proletariad o , tanto sas de se rviços) permite, co m freqüên cia, que a empresa que ut i-
fora qua nt o dent ro d o traba lho, podem esperar reun ir todos os liza essa mão-de-obra evite q ualquer risco de conflito desse gê -
.elementos de um proletariado hoje cind ido . nero, o u que repasse o risco à empresa q ue a fo rnece. Do mes-
Em síntese, a o rganização sindi cal não mais pode desempe- mo modo , a cisão jurídica do co letivo de trabalho resultan te do
nh ar se u papel tradicional de u nifi ca çã o do proletariado (d e desenvo lvimento do trabalho tra nsitó rio torna mai s difícil qual-
su peraç ão de sua divisão concorrencial e de sua se gme ntaç ão), que r eventual ape lo à greve, que se proponha a fazer valerem
se não com uma co nd ição: romper radi ca lmente co m sua organi- re ivind icações cOI1)uns. Sem co ntar qu e os traba lhadores tempo-
zação co rpo rativa e profissional atual e retomaras relações co m rári os podem às vezes fur ar a greve . Vê-se , aqui, co mo o desen-
a in spiração do sindicalismo revolucionário, privilegia nd o as vo lvimento do desemprego e da instab ilidade , além da chanta-
es truturas int e rprofiss io na is (a exe mpl o das a ntigas bolsas de gem e da ameaça permanente qu e permite , ce rta mente enfraque-
traba lho ) e es tabe lecendo a identidade política e cu ltural d o ce ma is a capac idad e co nflitua l dos trabalhado res d o q ue os
proletariado em uma base des de logo mais am p la do q ue so men- re petidos ataques sustentad os nesses ú ltimos anos ao próprio
te a empresa . di reito de greve e m ce rto n úmero de pa íses capitalistas dese n-
Em certo se ntido, a ofe ns iva ca pita lista, tal co mo se desen- volv idos (po r exemplo, na Grã-Breta nha),
vo lve hoje através da s trans for mações da rel ação salarial , afron- Minan do o movim en to operário na base, "pegand o por trás "
ta me nos o mo vimento o perá rio do qu e o pega po r trá s. E isso , s uas o rganizações (pa rticula rme nte sindicais) , enfraquece ndo
co loc a nd o um a massa cresce nte d e proletá rios fo ra das co ndi- suas práti cas re ivindi cativas e co nflitua is, as tran sformaçõe s atua is
ções que pe rm ite m sua o rga nização (es p ecialme nte s ind ical ), da relação sa larial, com seus efei tos globais de fragme ntação e
pelo me nos nas fo rmas po r e la tornadas no perío do fo rd ista e de "desmassificação" do proletari ad o, 'c o nstitue m enfim g randes
L'qu e co ntin uam a do m ina r o mo vim ento o pe rá rio. Co ns eqüe n- a meaças à int egridad e da consci ên cia d e clas se : fav orecem o
I temente , o isolamento crescente des sa s o rganizações cada vez deslize de certas camadas ou categorias do proletariado em dí-
mais co nfinadas ao nú cleo d os trabalhador es es ta tu tá rios, aque- reção à ex trem a direita.
les q ue precisam ente teriam menos necessidade de se re m de- É qu e o dese nvo lvime nto do desemprego e da instabilidade
fe nd idos . Co ns eqüe nteme nte, também, a aparê nc ia qu e cada dá orige m, entre o proletariad o, a um sentime nto ge ral de insegu-
vez mais toma o mo vim ento s ind ica l: uma de fesa dos "p rivile- rança, que a ideolog ia de seg urança das form ações de extrema
g iados", dos "abastados ". Daí riscos reai s de vê-lo ca ir no co r- dire ita pode facilme nte expl orar. Além d isso, agravando a co ncor-
po rati vismo. rên cia e as desigualdades de status, o desemp rego e a instabilidade
Mas não são so mente a representat ivid ad e e a legit imida de rea tivarn as atitudes de excl usão e de segregaç ào (racismo, sexis-
dessa s o rgan izações qu e se e nco nt ram as sim aba ladas: a eficá- mo e pa terna lismo). Sem co ntar que o enfraquecimento, ou me s-
cia de seus mo dos de ação trad icionais também está co locada e m mo o quase desaparecimento em ce rtas lo calida des, e até mesm o
q uestão. A co meçar pela prática da negocia ção coletiva, desen- t"fl1 certas regiões - precisamente naq ue las e m q ue o desernpre-
vol vida no nível da e mpresa ou do ram o , que mostra cada vez e a instabilidade assolam ma is gravemente - , de redes de
mai s se us limites em sua te ndência a não mais co nce rnir nem aos socialização e de solidariedade ligadas ao movimento o pe rário
trabalhador es temporários (particula rme nte aos interinos) nem : cganizado, deixam populações proletárias em p leno desespero e
ao s su bc o nrra tados. na mai or parte das ve zes ex cluídos da a pli- assim, às organizações de extrema di reita ga nharem

102 103
terreno ." Enfim , o efe tivo do p roleta riad o , devi-
do à sua fragme.ntação, provoca , entre o co njunto dos proletár ios,
um enfraquecime nto do se ntimento de pertence r a uma classe, e
assim pode ab rir caminho para a recomposição de uma ide ntida-
de coletiva imaginária em outras bases (po r exe mplo, o se ntimento
nacio nal). . Capítulo Vl

A TRANS NAC IO NALIZ AÇÃO


DO CAP ITA L

D esde sua formação no último


°
te rço do sécuio XIX e, em tod o caso, desde fim da Segunda
Gue rra Mundia l, o movime nto o pe rário ocidental sob hegemonia
so cia l-de mo crata retraiu-se no es pa ço naciona l, trans forma ndo-
o e m qu adro estrut ural de sua ação. O ra, é esse me smo q uadro
q ue 'o re cente de se nvolvime nt o transnacio nal do ca p ita lismo
ocide ntal tend e hoje a reco lo car e m qu estão .

1) Da internacionalização à transnacionalização

Na histó ria já secular do ca pita lismo, o for dismo ter á trazido


uma so lução o riginal ao clássico "prob le ma de perspectiva s". Do
início do capitalismo até a Seg unda Guerra Mundial, o fraco cres-
cime nto do me rca do interno , devido em última aná lise à fraca
par cel a dos sa lá rios reais na re nd a naciona l e a se u au me nto
demasiada me nte fraco , obriga ra todas as economias ca pitalistas
a buscarem uma so lução para esse problema na co nquista inces-
S CL,.para este assu nto , o testemu nho de Anne TH.1STAN em A II / remt, Paris, sa nte de no vos me rcados exte rnos. O q ue constitu iu uma das
Gallimard, 1987.

105
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