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Copyright © 2021 Aline Damasceno

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de qualquer parte desta obra – física ou eletrônica -, sem autorização prévia
do autor. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei nº
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Capa e Diagramação
Jéssica Macedo

Revisão e Preparação de texto


Ana Roen

1ª edição

Livro digital

Damasceno, Aline

Selo segredo

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares


e acontecimentos descritos são produto da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais teve como intuito
ambientar e dar veracidade a história.
Sumário

Sinopse: 7
Prólogo 9
Capítulo Um 16
Capítulo Dois 23
Capítulo Três 30
Capítulo Quatro 37
Capítulo Cinco 43
Capítulo Seis 49
Capítulo Sete 57
Capítulo Oito 66
Capítulo Nove 72
Capítulo Dez 79
Capítulo Onze 87
Capítulo Doze 95
Capítulo Treze 102
Capítulo Quatorze 111
Capítulo Quinze 120
Capítulo Dezesseis 126
Capítulo Dezessete 135
Capítulo Dezoito 140
Capítulo Dezenove 154
Capítulo Vinte 159
Capítulo Vinte e um 165
Capítulo Vinte e dois 180
Capítulo Vinte e três 188
Capítulo Vinte e quatro 194
Capítulo Vinte e cinco 202
Capítulo Vinte e seis 209
Capítulo Vinte e sete 213
Capítulo Vinte e Oito 218
Capítulo Vinte e nove 228
Capítulo Trinta 232
Capítulo Trinta e um 239
Capítulo Trinta e dois 247
Capítulo Trinta e três 254
Capítulo Trinta e quatro 260
Capítulo Trinta e cinco 266
Capítulo Trinta e seis 277
Capítulo Trinta e sete 289
Capítulo Trinta e oito 296
Capítulo Trinta e nove 304
Capítulo Quarenta 311
Capítulo Quarenta e um 317
Capítulo Quarenta e dois 322
Capítulo Quarenta e três 328
Capítulo Quarenta e quatro 334
Capítulo Quarenta e cinco 340
Capítulo Quarenta e seis 346
Epílogo 354
Agradecimentos 357
Sobre a autora: 358
Conheça outros livros da autora: 359
Sinopse:

Bilionário conhecido por seu gênio controlador, sua arrogância e foco


nos negócios, o magnata Andrea Della Torre sempre conseguia o que queria e
não se importava de passar por cima de tudo para alcançar os seus objetivos.
E ele estava determinado a ter em sua cama a única mulher que nos últimos
anos despertou o seu interesse e que tinha seu respeito: sua secretária. Mesmo
que para isso tivesse que comprá-la, pois todos tinham o seu preço.

Adelle Beckett desde nova teve que assumir várias responsabilidades,


dentre elas a criação de seu irmão, após a morte de sua mãe em decorrência
de uma overdose. Conciliando o trabalho e os estudos, ela faria de tudo pelo
pequeno William, inclusive se vender ao seu chefe para pagar a cirurgia de
urgência que a criança precisaria fazer. Era isso, ou pegar emprestado com
um agiota, e a mulher não hesitou em assinar o contrato que faria dela a
amante exclusiva por tempo indeterminado do poderoso magnata.

Ele não queria se envolver emocionalmente, ainda mais com uma


mulher que achava que queria apenas o seu dinheiro, traindo-o. Ela não
desejava perder o seu coração e se apaixonar por ele, um homem rico que não
suportaria lidar com seus sentimentos.

Mas esse acordo selado por meio de cláusulas contratuais poderia ser
a ruína de ambos, principalmente a dele.
Para minha leitora Adelle, com amor
Prólogo
Seis meses atrás

Matias Barbosa

— Eles são lindos juntos — minha assistente comentou quando uma


valsa ressoou no salão de festas luxuoso que integrava os jardins e o ambiente
construído. Instintivamente olhei para ela, encarando seu perfil delicado
emoldurado por uma mecha do seu penteado. Seus olhos verdes brilhavam
com uma emoção que eu não conseguia compreender. Sem que me desse
conta, fui atraído pelos seus lábios pintados de um vermelho vivo que
destacava ainda mais a boca generosa e provocante que vinha me
atormentando há meses. Eu costumava manter meus desejos sobre um rígido
controle, tanto quanto comandava meus vários negócios. Porém aquela
mulher entrou na minha vida para testar todos os meus limites. Seu corpo
cheio de curvas, seus seios firmes do tamanho das minhas mãos, o cheiro de
chocolate que ultimamente emanava da sua pele, combinado com sua
inteligência e determinação, eram uma combinação completamente perigosa.
E eu estava cada vez mais tentado a extrapolar essas barreiras autoimpostas,
cedendo à atração que me consumia. Contudo, como a conhecia,
provavelmente levaria um não, ferindo meu ego. Contive a risada amarga ao
constatar que a mulher ao meu lado seria a única capaz de tal coisa. E a
respeitei ainda mais por isso.

Quando Fernando Matiazzi, um dos homens mais ricos do Brasil, e


meu parceiro de negócios há dois anos, fez uma mesura e levou sua esposa
grávida ao centro do salão, começando a se mover ao ritmo lento da música
clássica, minha assistente soltou um suspiro profundo, me tirando do transe.
E foi impossível não franzir o cenho, atônito. Adelle trabalhava para mim há
mais de um ano, e nunca a vi demonstrar nenhuma emoção além do seu
profissionalismo e eficiência.

— Dá para ver que eles estão completamente apaixonados um pelo


outro — continuou, para depois bebericar o champanhe da sua taça.

— Conto de fadas — o irmão de Adelle falou enquanto batia


palminhas. — A Bela e a Fera.

O comentário inocente do menino fez com que eu arqueasse a


sobrancelha, me divertindo. Porém eu não disse nada, bebendo uma dose do
whisky caro que era servido enquanto eu acompanhava a conversa. Quando
Adelle falou que eu tinha recebido o convite de casamento de Fernando
Matiazzi, que aconteceria no Brasil, aconselhando-me a ir, foi impossível
conter minha surpresa e minha gargalhada, ainda mais pelo fato do homem
ter se tornado um recluso, nem ao menos mostrava o seu rosto nas reuniões.
Como ele tinha conseguido uma noiva jovem e muito bonita - embora não
tanto quanto Adelle - eu não tinha ideia. A única certeza era que agora eu
estava na festa, em um outro país, com a minha secretária e seu irmão
pequeno, já que a mulher que costumava ficar com ele não poderia cuidar do
menino neste período por conta de outros compromissos.

Como eu odiava cerimônias de casamento, acabei a arrastando


comigo sem nem ao menos um convite, pois ela era bem mais diplomática
nesse aspecto do que eu e daria muito bem os devidos cumprimentos ao
casal. Sabia que estava tentando me enganar, pois a verdade era que me
sentia deslocado nesse tipo de evento que costumava transbordar
sentimentalismo, não gostava de ficar sozinho nessas ocasiões. Era cético
com relação aos finais felizes, embora não houvesse um motivo para sê-lo.
Talvez eu fosse o maldito ganancioso que meu irmão mais novo pregoava
que eu era. Mas pouco importava, eu não mudaria por isso.

— William! — ralhou. — É errado julgar alguém por sua aparência.


E se quer saber, ele é bastante atraente, mesmo com as cicatrizes. Ela é uma
mulher de sorte, e me parece bastante feliz com seu destino.

— Desculpa. — Encolheu os bracinhos na frente do corpo.


Minha diversão morreu na hora ao ouvi-la falar do quão bonito ela
achava que outro homem era. O comentário não tinha nada demais, uma
coisa casual, porém me atingiu como um coice. Tentei o ignorar, bebendo o
líquido restante em uma única golada. A queimação na garganta
proporcionada pela bebida era melhor do que a sensação que me percorreu.

— Não posso negar que tudo aqui parece um conto de fadas com o
felizes para sempre. Mesmo não os conhecendo, posso ver que eles se amam
profundamente — comentou com uma voz embargada, como se estivesse
emocionada com o fato, revelando um pouco o anseio do seu coração. E foi
somente ali que me dei conta de que ela não era tão diferente das outras
mulheres que acreditavam no amor, e essa nova imagem dela me
desconcertou momentaneamente, deixando-me sem reação, e eu olhei
imediatamente para Adelle, que continuava encarando o casal na pista. Não
sabia que minha secretária nutria esse tipo de sonho romântico. Mas parte
disso era culpa minha, já que eu via o mundo com certo cinismo. Tudo para
mim se resumia a poder e dinheiro.

— Ela parece uma princesa — William comentou.

— Que encontrou seu improvável príncipe encantado — disse em


meio a um suspiro, que me revelou que a mulher, que focava no trabalho e
em criar seu irmão da melhor forma possível depois que sua mãe faleceu de
overdose, escondia seu lado romântico.

— Você também é uma! — O menininho bateu palminha quando


ouviu o tom da irmã.

— Obrigada, querido. — Deixou a taça na mesa e pousou a sua mão


na do menino.

— Você vai encontrar um príncipe também e vai morar com ele num
castelo. — Soltou uma risadinha com o próprio comentário.

Contra todo o bom senso, senti uma raiva surda e desconhecida


tomando cada poro do meu corpo, sentindo o corpo tenso, e fiz de tudo para
manter minha expressão impassível, mesmo que ela não olhasse para mim.

Ciúmes? Andrea Della Torre não sentia ciúmes e nem perdia tempo
com tais frivolidades.

— Quem precisa de um quando se já tem um cavaleiro de armadura


brilhante? — comentou divertida, descontraída, e plantou um beijo na
bochecha do menininho que se regozijou no seu assento e soltou um gritinho,
chamando a atenção das senhoras em uma mesa próxima, que sorriram.

Porém sua brincadeira sobre não precisar de nenhum homem não


aliviou em nada meu humor sombrio.

— Sempre vou proteger você, Del — pousou sua boca no rosto da


irmã dando-lhe um beijo estalado.

— Contarei com isso, meu super-herói. — Sorriu para ele e se virou


para a frente quando uma salva de palmas soou no recinto. — Oh, perdemos
o fim. Agora já tem alguns casais na pista.

Apenas dei de ombros e quando um garçom se aproximou da mesa,


pedi outra dose dupla de whisky; só a bebida parecia diminuir um pouco do
sentimento estranho que me tomava. Meu gesto atraiu a atenção de Adelle,
que me encarou com seus olhos verdes.
— Tudo bem, Andrea? — Arqueou a sobrancelha bem definida,
parecendo surpresa.

— Por que não estaria? — Dei de ombros, tomando mais um gole do


líquido dourado.

— Você não é de beber tanto — comentou casualmente. — E essa é a


terceira dose.

— Estou apenas comemorando.

— Sei.

— Essa será a última, mamma[1].

— Você já é bem grandinho para saber seus limites, mio caro[2]. —


Sorriu para mim e pude ouvir William rindo da sua reprimenda, e novamente
acabamos sendo alvos de alguns olhares.

— Claro. — Chacoalhei a cabeça, concordando.

Ficamos em silêncio por longos minutos, até que um homem, que


reconheci como um dos acionistas da Matiazzi, se aproximou da mesa onde
estávamos. Ele tinha quase cinquenta anos, mais que o dobro da minha
secretária, mas o seu olhar era de predador. E eu quis apagar a lasciva que vi
com um belo murro na cara, tamanha raiva que me consumiu. Dio, o que
estava acontecendo com o homem controlado que eu era? Adelle tinha razão,
a bebida deveria estar fazendo estragos na minha mente.

— Dança comigo, senhorita? — Fez uma mesura e estendeu sua mão.

— Hm? Não falo a sua língua, senhor — murmurou.


O homem repetiu a pergunta em inglês com seu sotaque carregado.

— Claro, você se importa de ficar com William, Andrea? —


Questionou com a voz suave, provavelmente nem se dando conta que o
homem tinha segundas intenções.

— Vou me comportar, irmã.

— Pode ir. — Controlei minha voz para que ela não revelasse meus
sentimentos confusos. — Cuidarei dele.

— Obrigada. — Pousou a mão na do homem que a deixou ir na


frente, com certeza apenas para olhar a bunda perfeita ressaltada pelo vestido
verde justo. Quis bufar de irritação, mas não o fiz, apenas levando o resto do
meu whisky à boca. Contra toda a minha vontade, meu olhar não conseguia
deixá-los, que agora se moviam em meio a outros casais, próximos aos
recém-casados.

— E você? — A voz infantil me tirou do transe momentâneo me


fazendo olhar para ele.

— Eu o quê?

— Você não vai se apaixonar por uma rainha? Minha irmã disse que
você é tipo um rei.

Atônito pela pergunta, soltei uma risada estrangulada.

— Disse é?

O menininho assentiu, inocente.

— E então? — pareceu ansioso.


— Estou mais para o ogro solitário, piccolo[3].

— Tipo o Shrek? — Riu, deliciado.

Não sabia quem era esse, então apenas assenti, concordando, e vi que
o menino sorriu para mim, como se soubesse de algo que eu não sabia.

Sentindo-me desconfortável, voltei meu olhar novamente para Adelle


que dançava com o desconhecido. E estranhamente a ideia de ser um ogro
solitário não me pareceu tão atraente quanto minutos atrás.
Capítulo Um

Nova York

Suspirei fundo e olhei o meu relógio de pulso, verificando que estava


atrasada dez minutos devido a um acidente na ponte Verrazano Narrows que
ligava Staten Island a Ilha de Manhattan, fora o trânsito cotidiano para chegar
no centro financeiro da cidade que nunca dorme. Para minha sorte, o meu
chefe, o grande magnata Andrea Della Torre, reconhecido mundialmente por
aplicar o seu capital em diferentes investimentos, estava em uma viagem de
negócios do outro lado do mundo, não estaria ali para ver e questionar o meu
atraso. Ele era implacável quando o assunto era dinheiro e poder, um tubarão
que engolia sem dó nem piedade seus concorrentes e seus funcionários.
Cordialidade, paciência e bondade não eram palavras no vocabulário desse
CEO. Podia apostar que muitos só estavam ali pelo salário, não por lealdade
ao patrão.

Pegando minha bolsa, saí do carro e o tranquei, enquanto caminhava


sobre meus saltos pelo piso do estacionamento subterrâneo com as
lembranças do dia em que fui contratada, que ainda eram vívidas na minha
mente.

Dentre os vários candidatos que pleiteavam a vaga, somente cinco


candidatos foram selecionados para a entrevista com o temido empresário. Eu
suava frio enquanto esperava a minha vez, porém, quando o meu nome foi
chamado, fiz de tudo para aparentar calma e tranquilidade, ignorando o fato
de que tão cedo eu teria outra oportunidade grandiosa como aquela.

Contra todo o meu bom-senso, ergui meu queixo e fitei diretamente


seus olhos azuis frios, que muitos diziam que eram capazes de fazer qualquer
um tremer sob seu escrutínio. Porém, depois de tudo que passei, eu não teria
me deixado abalar como um ratinho assustado. Sentando-me à sua frente,
respondi suas perguntas com convicção e, para minha surpresa, pude
perceber um brilho estranho arder em seus olhos e com muito esforço contive
o arrepio que quis varrer a minha pele. Sem entrevistar os outros dois
candidatos restantes, ao fim da reunião, eu soube que tinha sido contratada e
começaria no dia seguinte. Mal tive tempo de comemorar, pois afundei-me
nas exigências do meu novo chefe e nas obrigações de cuidar do meu
irmãozinho, além de terminar o curso de curta duração que tinha me
matriculado na Fordham University. Mas, diferentemente de muitos, eu
adorava trabalhar para Andrea, por mais que ele exigisse nada menos que a
perfeição. E no que dependesse de mim, iria manter o meu cargo por muito
tempo, mesmo que tenha que ser como um autômato supereficiente. Um robô
que nem ele o era.

Perdida em pensamentos, saí do elevador no andar que era ocupado


apenas pelo escritório de Andrea, com uma copa e um banheiro acoplado e a
recepção onde eu ficava. Mesmo desatenta, quando olhei para baixo, vi que o
tecido da saia-lápis que usava tinha formado um pequeno vinco. Suspirando
pelo leve desmazelo, com as mãos, tentei desamarrotar minha veste enquanto
caminhava pelo corredor até que acabei colidindo com uma massa sólida de
músculos, fazendo com que eu perdesse um pouco do equilíbrio nos meus
saltos. Em uma tentativa de firmar-me, acabei segurando com força o terno à
minha frente, o calor se espalhando sob a minha palma com o contato. Tive
que conter o arrepio que percorreu toda a minha coluna com a proximidade
do corpo masculino ao meu. Dando-me conta da impropriedade do gesto em
ambiente de trabalho, afastei minha mão e recuei um passo para trás.
Estranhando o fato de que alguém estivesse ali, ergui meu rosto para fitar o
meu salvador, somente para dar de cara com o par de olhos azuis do meu
chefe me encarando.

Merda!

Sua expressão era praticamente ilegível, porém a chama que brilhou


em seu olhar, mesmo que por poucos segundos, já que ele a controlou
rapidamente, foi o suficiente para fazer com que algo ardesse em meu íntimo,
mas como ele, facilmente o suprimi. Não havia lugar para tal.

— Está atrasada — disse em tom arrogante, depois de levantar o seu


relógio e conferir as horas. Arqueou as sobrancelhas em desaprovação. —
Espero que isso não seja recorrente todas as vezes que estou fora, mia cara.

— Claro que não, Andrea. — Ajeitei o meu corpo, empertigando-me


em uma postura austera. Não iria me justificar, já que era minha obrigação
chegar no horário. E tentar fazê-lo somente irritaria o homem à minha frente.
Tinha aprendido observando os outros funcionários que o melhor jeito de
lidar com o magnata era assumindo os próprios erros e falhas, sem bajulação.
— Isso não acontecerá mais.

— Estou contando com isso. — Fitou-me por alguns segundos com


bastante intensidade, depois deu as costas para mim e começou a andar pelo
corredor, obrigando-me a segui-lo.

— Não estava esperando pelo seu retorno, já que não recebi nenhuma
instrução para adiantar o voo para sua chegada — comentei, estranhando o
fato de não ter ciência do fato, já que eu era responsável por cuidar dos
aspectos operacionais das viagens que ele realizava pelo mundo.

— Conseguimos fechar os detalhes da compra da empresa de


transporte marítimo, que estava indo à falência, mais rápido do que eu
imaginava. Em breve iniciaremos a reestruturação e retomaremos suas
atividades — explicou quando chegou ao ambiente em que eu ficava,
parando com as mãos no bolso. — Por isso retornei mais cedo.
— Hummm, que bom que deu tudo certo — murmurei ao colocar a
bolsa em cima da minha mesa e olhei para ele. Foi impossível não sorrir para
o homem que exalava poder por todos os poros.

— Fazer o transporte da soja que a América produz para a China será


bastante lucrativo para nós de acordo com os cálculos que fiz. — Pausou. —
A projeção é muito boa.

— Tenho certeza que sim.

Diferentemente dos outros investimentos, Andrea não tinha procurado


um investidor ou seus conselheiros; pelo contrário, pouco falou sobre o
assunto. Desde que eu havia começado a trabalhar para ele, ainda me
surpreendia o fato do magnata conversar comigo sobre os seus negócios tão
abertamente. Definitivamente, não era uma postura que eu esperava do meu
chefe, ainda mais que ele era feroz no que tangia aos seus negócios e
dinheiro, e não tinha imaginado que ele falaria sobre isso com alguém que
fosse apenas sua secretária. Um acionista sim, mas uma funcionária
qualquer? Improvável. Mas me sentia contente por Andrea fazê-lo,
demandando algumas vezes minha opinião.

Sentei-me em frente ao computador e o liguei, soltando um suspiro.


Seu olhar acompanhava cada movimento que eu fazia, o que me deixava
subitamente consciente dele, e tive que conter o prazer feminino que senti ao
ser alvo do seu interesse, mesmo que profissional. Não fazia ideia do que
estava acontecendo comigo hoje, mas estava agindo como uma adolescente
perante o garoto mais popular da escola. Simplesmente ridículo.

— Podemos sondar o negócio que foi fechado recentemente entre a


China e os Estados Unidos para a compra de milho. Dizem que foi o maior já
feito, mais de um milhão de toneladas. Talvez se vocês conseguissem
acelerar o processo de reorganização administrativa, poderíamos negociar
com as empresas envolvidas para realizar o transporte dos grãos — sugeri
depois que um silêncio se instaurou entre nós, fazendo-o arquear a
sobrancelha. — Como você diz, atravessar os concorrentes é sempre válido.

— Realmente. — Um brilho surgiu em seus olhos, deixando-os ainda


mais intensos. — Podemos dar uma olhada nisso mais tarde — respondeu.
Sua voz tinha um quê de admiração, mas depois deu de ombros, chamando
minha atenção para essa parte do seu corpo modelado pelo terno bem
cortado. Céus, além de rico, o homem era perfeito. Desviei meu olhar para a
tela à minha frente e tentei me concentrar no trabalho.

— Claro. — Assenti enquanto digitava algo no computador.

— Tem alguma coisa para mim hoje, Adelle?

— Uma teleconferência com Fernando Matiazzi, às 11 horas.

— Certo.

— Sua mãe também ligou querendo falar com você, já que não
conseguiu contatá-lo no seu número. Ela parecia desesperada — repreendi-o
suavemente ao me lembrar da risada gostosa da senhora, bem como do seu
sotaque forte ao falar inglês.

Mesmo que não a tenha visto pessoalmente, adorava quando ela


puxava assunto comigo e, particularmente, não conseguia entender como
Andrea mantinha certa distância dela. Se minha mãe tivesse sido assim, eu
não a largaria nunca. Pensar na mulher que deu à luz a mim e ao meu
irmãozinho fez com que um bolo surgisse no meu estômago, porém recordar
da mulher não me ajudaria em nada, então afastei-a da mente, focalizando na
lista de e-mails não respondidos à minha frente.

— Depois eu ligo. — Franziu o cenho. — Você gostaria de dar uma


olhada nas projeções que fiz para a soja? — mudou de assunto e eu não
insisti.

— Seria ótimo — respondi, erguendo meu olhar, sentindo o


entusiasmo me dominar. Um sorriso largo se formou em meu rosto. — Farei
meus apontamentos e sugestões, se você me permitir.

— Realmente gostaria de uma segunda opinião — sua voz soou


rouca, deixando seu sotaque italiano ainda mais charmoso. — E se realmente
for viável atravessar nossos concorrentes, precisarei de outra perspectiva e
ver o que posso fazer para acelerar a reestruturação antes que percamos essa
oportunidade.

— Seria ótimo ajudá-lo. — Sorri ainda mais. — Você já tomou o seu


café da manhã, Andrea? — Assumi meu tom profissional, controlando a
felicidade que sentia por ele compartilhar comigo as informações desse
projeto.

— Ainda não, peça o de sempre.

— Okay.

Ouvi os seus passos se afastando e o barulho da porta de vidro, que


separava o local onde eu ficava e o seu escritório, que tinha vista para toda a
Wall Street, se fechando, e então peguei o telefone para fazer um pedido de
donuts cobertos com calda de chocolate para Andrea. Eu era uma chocólatra
assumida, e meu chefe também se mostrava um grande viciado no doce. O
que era surpreendente, já que ele era um grande apreciador de comida
salgada, e o italiano nunca tinha pedido tal sobremesa. Maneei a cabeça,
discando o número da confeitaria. Provavelmente era apenas um capricho
seu, com o tempo, ele mudaria de gosto. Apesar de que algo dentro de mim
me dizia que ele não era tão volúvel assim…
Capítulo Dois

Passei a mão pelo meu cabelo, jogando os fios que caiam sobre meus
olhos para trás, assim que adentrei no meu escritório. Suspirei fundo
enquanto caminhava até a janela que dava vista para o edifício onde operava
a bolsa de valores de Nova York e fiquei o contemplando por alguns minutos.

Tudo estava saindo conforme eu planejara e finalmente eu teria minha


vingança contra uma das maiores empresas de transporte marítimos dos
Estados Unidos, que realizava boa parte do comércio com a China e outros
países próximos. Os faria pagar por terem atrasado no mês passado a entrega
da minha carga no porto de Xangai, fazendo-me ter um enorme prejuízo
financeiro. Isso eu não poderia deixar impune! Ninguém lesionava Andrea
Della Torre sem sofrer as consequências disso, mesmo que para tal eu tivesse
que usar meios pouco ortodoxos, para não dizer ilegais, mobilizando todos os
meus contatos. E tinha melhor forma de vencer do que conquistando parte
dos clientes de um rival?

No mundo dos negócios devemos estar prontos para fazer de tudo se


quisermos ser bem-sucedidos, e eu não tinha limites para ganhar mais
dinheiro e poder. Em um primeiro momento, pensei em manter as
informações sobre o negócio somente para mim, porém o comentário de
Adelle sobre a possibilidade de atravessarmos nossos concorrentes e oferecer
um preço menor para realizarmos o transporte de outros grãos para além da
soja fez com que, impulsivamente, eu a envolvesse em meus planos, já que
minha secretária tinha se especializado em comércio internacional e estava
sempre atualizada dos fatos. Não a deixaria a par do meu objetivo final,
obviamente, mas poder discutir as informações e o modo como poderia
acelerar a reestruturação da companhia para fazer com que todas suas
operações estivessem em funcionamento com ela, me abriria outras
perspectivas para ampliar a minha vingança, causando danos maiores na
minha “atual” concorrente.

Pagava muito bem aquela mulher de corpo perfeito e mente aguçada,


que era capaz de mexer com cada terminação nervosa que eu tinha e deixava-
me em constante estado de alerta e excitação, e eu iria usá-la, embora não da
forma que tanto queria. Não ainda. Cada dia que passava desejava mais e
mais enterrar meu pau bem fundo nela, ouvindo-a gemer enquanto eu entrava
e saía de dentro dela, experimentando a fricção das nossas carnes com os
meus movimentos. E sentir seu corpo contra o meu... Sua mão pequena
tocando meu braço sobre o terno só me fez ansiar por ela ainda mais.

Assim que o meu plano de vingança terminasse, tomaria Adelle para


mim como fazia com tudo aquilo que eu queria. A deitaria na minha mesa
todas as manhãs antes de começar a trabalhar, fazendo-a remexer e rebolar
contra a superfície, querendo chegar ao ápice. Tinha certeza que, mesmo
Adelle sendo uma romântica, ela sabia que eu não era dado a
sentimentalismos e não lhe ofereceria nada além de prazer até que meu corpo
estivesse saciado do seu, mantendo, assim, nossa relação profissional intacta,
esquecendo-nos depois que um dia estivemos envolvidos intimamente. Nos
importávamos demais com as nossas carreiras e objetivos para nos deixar
levar por ilusões tolas.

Ciente disso, maneei a cabeça e dei as costas para a vista do centro de


poderio econômico dos Estados Unidos e caminhei até a minha mesa,
jogando-me na minha cadeira presidencial enquanto puxava uma pasta e
corria o olho nas informações impressas no papel. Tinha muito o que fazer
até a reunião com Fernando Matiazzi para perder tempo com coisas como
sexo e o desejo desenfreado que sentia por Adelle.

***

— Andrea? — A voz suave e feminina soou por detrás da porta,


roubando a minha concentração. — Posso entrar? Seu café da manhã acabou
de chegar.
— Entre.

Ergui meus olhos da tela do computador e observei o momento em


que ela empurrou a porta com o quadril com curvas generosas e entrou no
recinto, carregando em suas mãos uma pequena caixa e um copo descartável
de papel com o que presumia, pelo cheiro, ser latte macchiato com uma
grande dose de leite morno, do jeito que eu costumava apreciar. Sob meu
escrutínio, a morena deliciosa caminhou até a minha mesa e sorriu para mim,
atingindo as minhas vísceras, porém mantive minha expressão ilegível.

— Você quer tomá-lo aqui ou na copa?

Empurrando minha cadeira com o corpo, afastando-me da mesa, olhei


para o relógio e constatei que faltava um pouco mais de uma hora para a
minha reunião, decidi fazer uma pequena pausa nas informações do meu
novo empreendimento.

— Na copa.

— Certo. — Assentiu com a cabeça, fazendo com que seus cachos


balançassem suavemente.

Ainda segurando meu pedido, Adelle girou em seus saltos e deu as


costas para mim e foi impossível conter o meu olhar que a percorreu da
cabeça aos pés. Seu cabelo castanho ondulado e longo batia
provocativamente um pouco acima da bunda, chamando minha atenção para
as nádegas redondas e empinadas evidenciadas pela maldita saia justa.
Obriguei-me a engolir em seco quando a minha imagem de joelhos abrindo o
fecho da peça e removendo lentamente pelas suas pernas, expondo a calcinha
perigosamente pequena, tomou a minha mente. Sem resistir, enterraria meus
dedos na carne macia para depois mordê-la, deixando minha marca em seu
corpo.

Dio[4], afastei esses pensamentos lascivos da mente que me levariam


ao descontrole e uma meia-ereção indesejada. Além de que, Andrea Della
Torre não se curvava e ajoelhava perante a ninguém, e não começaria a fazê-
lo perante os glúteos perfeitos da minha secretária. Pelo contrário, ela que se
postaria de joelhos enquanto tomava-me em sua boca.

— Você não vem? — A voz doce ecoou do outro cômodo.

— Já estou indo, mamma — respondi grosseiramente.

Mantendo a minha postura mais rígida e austera, ergui-me da cadeira


e ajeitei o meu terno antes de seguir até a pequena cozinha privativa, que era
utilizada apenas por mim e Adelle, já que não gostava de me misturar com os
outros funcionários, para não ser alvo de suas bajulações. Encontrei tudo
disposto de maneira ordenada na mesa e sentei-me, evitando olhar para a
mulher que detinha o poder indesejável de me desestabilizar somente com a
sua presença, o que me era inaceitável. Mas estava completamente alerta aos
sons que ela emitia ao programar a cafeteira para fazer aquele café horrível
que ela tanto gostava. Ignorando-a, abri a caixinha, revelando três donuts
cobertos com chocolate, que ultimamente tinha se tornado minha obsessão
talvez por me fazer lembrar dela. Sem perder tempo, peguei um e o mordi,
bebericando do meu macchiato. Perfeito!

— Posso? — Se aproximou de onde eu estava, segundos depois que


eu ouvi o barulho da máquina alertando que a bebida dela ficou pronta.
— Claro. — Dei mais uma mordida, devorando a rosquinha.

— Está bom? — perguntou com a voz suave e não me contive e olhei


para ela. Adelle passava a ponta do dedo na borda da caneca, chamando
minha atenção para sua unha pintada de um vermelho vivo. Porém, quando
ergui minha vista e fitei seu rosto, tive que conter a onda forte de lasciva que
me dominou quando vi o seu meio-sorriso travesso para mim, que continha
várias promessas. Canalizei todo o meu autocontrole para não reagir a
mulher. — Você parece estar no paraíso ao comê-las.

— Razoáveis — menti, mantendo minha voz firme, dando de ombros


e empurrando a caixa na sua direção. — Pegue uma.

— Não, não. Não posso ceder à tentação logo pela manhã, embora um
pouco de chocolate seja sempre sedutor para mim. — Maneou a cabeça e
olhou para o conteúdo dentro da caixa. Segundos depois, deu de ombros,
pegou um pedaço do donuts e o colocou na boca, deixando-me hipnotizado
pelos seus movimentos. — Posso lidar com isso depois.

— Tenho certeza que sim — comentei enquanto bebericava o líquido


que esfriava na minha frente e a via pegando mais um pedaço —, mas essa
quantidade não faz mal nenhum, Adelle.

— Para você é fácil falar, Andrea. — Fez uma careta e uma sombra
pairou em seus olhos verdes. — Além de tirar tempo, não sei de onde, para se
cuidar, já que é um grande viciado em trabalho, tem a genética familiar ao
seu favor. — Deu uma pausa e mordeu mais um pedaço do donut,
terminando-o. — Qualquer um morreria de inveja.
— Não consigo ver nada de mau em você, mia cara[5]. Na verdade…

— Diga isso para o Washington, da contabilidade — continuou, sem


se preocupar com o fato de que estava me interrompendo. — Toda vez que
me vê, ele aponta uma gordurinha aqui, outra ali, ou uma nova flacidez. —
Suspirou, dando uma risada a seguir, fazendo-me erguer uma sobrancelha. —
Não que eu me importe, já que tenho mesmo.

— Hmm… — Atônito com o discurso dela, não sabia muito bem o


que dizer sem ser grosso ou extremamente obsceno. Ela poderia até possuir
tais imperfeições, mas isso não diminuía em nada minha vontade de tê-la
embaixo e em cima de mim, completamente nua, gemendo, suada e ofegante
enquanto transávamos.

Cazzo[6]! As imagens que com dificuldade eu suprimi anteriormente,


voltaram a minha mente, fazendo-me xingar a mim mesmo por tamanho
descontrole.

Como ela não disse mais nada, ficamos em silêncio por alguns
minutos enquanto terminávamos de comer e, após olhar seu relógio, Adelle
se levantou com a caneca em mãos e caminhou até a pia. Por hábito, vi as
horas no meu, constatando que em cinco minutos teria a reunião com o meu
principal sócio.

— Fiquei de enviar alguns documentos para o departamento de rh e


preciso ver se o jurídico já os redigiu.

— Claro.

— Depois eu limpo tudo.


Sorriu e quando assenti com a cabeça, concordando, ela saiu da copa
me deixando sozinho. Enquanto eu saboreava o último pedaço de donuts,
estava pensando na reunião que eu teria a seguir, pois, excetuando os meus
familiares, que eu preferia manter distante para que não desviassem o meu
foco em obter mais poder e influência, nada mais importava para mim a não
ser os negócios. Essa breve conversa casual com minha secretária nada
significava, e não seria eu que aumentaria sua importância.
Capítulo Três

— Senhor Tahiro, infelizmente só na semana que vem que terá um


horário na agenda do senhor Della Torre. Posso agendar para o senhor…

— Mas eu preciso falar com ele urgentemente, menina — rosnou e eu


contive um suspiro. Estava há mais de cinco minutos explicando a mesma
coisa, mas ele insistia em querer uma reunião o mais rápido possível. — Dê
uma desculpa e cancele o horário de alguém, e me marque no lugar.

— Bem, senhor Tahiro, eu não posso fazer isso. — Tentei ser


paciente com o homem do outro lado da linha.
— Claro que pode, nada te impede. — Bufou.

— Não seria certo, senhor — franzi o cenho quando ouvi um barulho,


como se alguém tivesse se infiltrado no ramal —, não seria justo com a outra
pessoa e o senhor Della Torre não me permite proceder dessa maneira.

— Fará, sim! Tenho uma proposta irrecusável que o tornará ainda


mais rico — gritou e eu afastei o telefone da orelha. — Se ele souber que
perdeu uma grande oportunidade por sua causa, menina… — me ameaçou.

— Senhor…

— Ele não fará nada — a voz do meu chefe ecoou do outro lado da
linha e eu pude ouvir Tahiro engolir em seco. — Independente do que tenha a
me dizer, você pode esperar até a semana que vem, isso se eu não decidir te
atender só daqui a um mês. Agora preciso da minha secretária. — Sentenciou
friamente, e mesmo que não tenha sido comigo, senti os pelos da minha nuca
se arrepiarem.

— Cla… claro, se-nhor Del-la To..rre — gaguejou. — Ligo


confirmando mais próximo a data.

— Certo — obriguei-me a responder, mas o homem nem esperou que


eu falasse, desligando o telefone. Sem que eu me desse conta, soltei um
suspiro, mas não sei se de alívio ou pela intromissão dele.

— Quando for assim, desligue na cara — sugeriu cortante e eu arfei


com tal ideia.

— Andrea — ralhei com ele como se estivesse falando com o meu


irmãozinho —, não podemos fazer isso.
— Como sou eu que mando aqui, mammina[7], você fará como eu
quiser — murmurou com uma voz perigosamente aveludada, que me dizia
que era melhor não o contestar, mesmo que eu não fosse cumprir sua ordem.

— Okay. — Fiz uma pausa. — Você precisa de algo?

— Como está quase na hora de você sair, peça meu jantar e mande
entregar aqui no escritório. Hoje irei trabalhar até tarde.

Não estranhei o fato, já que Andrea, na maioria das vezes, costumava


ser o último a deixar o edifício. Podia apostar que ele não se permitia mais do
que poucas horas na semana para relaxar, fazendo algo que não esteja
relacionado a trabalho. Até mesmo as festas oferecidas pela sociedade nova
iorquina em que comparecia tinha esse objetivo, nunca por mero prazer ou
diversão. O único tempo que parecia tirar para si mesmo, era para cultivar o
seu físico bem definido que deixaria qualquer uma aos seus pés. Della Torre,
em todos os sentidos, era quase que uma máquina sobre-humana, implacável.

— Alguma preferência de prato?

— Flores de abobrinha frita com muçarela do meu restaurante


preferido. — Pareceu refletir por um momento. — Um bom vinho branco
para acompanhar.

— Certo — anotei o pedido em um pequeno bloco —, mais alguma


coisa? Sobremesa?

— Não, apenas isso.

— Posso fazer algo mais por você antes que eu vá embora? — Lancei
o meu olhar para o relógio, constatando que estava quase na hora de buscar o
William na creche, que ficava a poucos quilômetros dali.

— Não agora, mas se puder começar a olhar os dados da empresa de


transporte que te passei ainda hoje seria bom. — Embora soasse como um
pedido, eu sabia que não o era e as palavras frias a seguir confirmaram minha
intuição: — Pagarei o valor que você estipular para tal.

— Pode deixar que o farei. Amanhã pela manhã já terei algo a discutir
com você.

Sabia que, assim que William dormisse, eu passaria horas e horas


debruçada sobre os relatórios e planilhas sobre a companhia recém adquirida
por Andrea, acompanhada por uma bela garrafa de café. O dinheiro que sabia
que ele me pagaria para tal ajudaria e muito e, no final, a noite mal dormida
valeria a pena. Pagando hipoteca e outras despesas, dificilmente poderia dar
um futuro melhor ao meu irmão sem essas horas extras.

— Ótimo, Adelle.

— Agradeço a confiança, Andrea. — Sem saber o porquê, senti que


precisava agradecê-lo por mais uma oportunidade, porém, como me era
esperado, ele não disse nada. — Algo mais?

— Só isso. — Desligou o ramal antes que eu tivesse chance de falar


qualquer coisa.

Ainda segurando o telefone na mão, suspirei enquanto procurava o


número do restaurante no computador. Faltando meia hora para o final do
expediente, tinha muito o que fazer para dar importância para as grosserias de
Andrea. Eu já deveria estar mais do que acostumada com isso.
***

— Oi, meu amor, como foi o seu dia hoje? — Agachei-me para ficar
na sua altura assim que ele saiu pelo portão com a pequena mochila nas
costas, a fim de ser envolvida pelos seus bracinhos que eram o meu refúgio.

William era a única pessoa que eu tinha no mundo e vice-versa.


Desde que ele nasceu, tive que assumir o papel de mãe em sua vida, já que a
nossa progenitora pouco se importava com algo além dela mesma e as
drogas.

Não que eu a culpasse completamente por procurar consolo na


heroína depois que minha avó veio a falecer, quando eu tinha em torno de
dezesseis anos, e meu pai, como o covarde que era, a ter trocado por uma
vizinha. Um sentimento pungente de abandono, vez ou outra, me dominava,
afinal eu era vulnerável, menor de idade e me sentia completamente confusa
e perdida, com uma responsabilidade nas costas que nunca tinha sentido
antes. Por sorte, na época, um psicólogo voluntário trabalhava em uma ONG
próximo a casa em que morava me ajudou a sobreviver. Porém nada tinha me
preparado para a gravidez inesperada da minha mãe e o fato de que ela pouco
se importava com a criança que crescia em seu ventre, e se afundava cada vez
mais no vício.

Considerava um milagre o fato de meu irmãozinho ter apenas asma e


episódios de bronquite como consequência. Por sorte, ele nasceu quando eu
já tinha dezenove anos e sua guarda foi diretamente para mim. Arrumei um
emprego em uma vendinha, e fiz de tudo para que o estado não o tomasse de
mim. Quando Will ainda era um bebê, nossa mãe decretou o seu destino ao
ter uma overdose, restando somente eu e ele. E eu sempre irei protegê-lo e
cuidá-lo.

— Del— deu um tapinha nas minhas costas —, me solta. —


Começou a contorcer-se, tentando se soltar.

— Desculpe, querido, estava no mundo da lua. — Plantei um beijo


em sua bochecha fofinha e o soltei, para ficar de pé em meus saltos.

— Eu adoro a lua, mas tanto, Del, que dicidi que vou vira astonauta
— comentou enquanto caminhávamos até o meu carro.

— Astronauta, é? — Sorri para o menininho que se parecia tanto


comigo, embora sua feição tivesse um quê de não familiar; provavelmente
puxou ao pai, um desconhecido, que fugiu para o mundo. — Mas para isso
vai ter que estudar bastante.

— Ah, Del. — Fez uma carinha emburrada enquanto eu abria a porta


do carro e, depois de ajudá-lo a retirar a mochila, coloquei-o no assento
booster e deixei que ele se ajeitasse. — Estuda é tão chato!

— Mas se quiser se tornar um astronauta, terá que fazê-lo. Além de


tirar notas boas.

— Tá. — Pareceu contrariado. Eu apenas maneei a cabeça e fechei a


porta, dando a volta no veículo para assumir o volante. — A Dalila disse que
eu vou vira médico.

— É mesmo, querido? — Desviei brevemente meu olhar para o


retrovisor, encarando-o através do espelho, para depois focar no trânsito
pesado de Nova York para o subúrbio.
— Sim. Agora eu quero ser médico e astonauta.

— E de onde vocês tiraram essas ideias? — Gargalhei, deliciada com


a articulação do meu menininho. No que dependesse de mim, ele teria todas
as escolhas possíveis.

— Foi a professora que mostrou na aula, aprendi um tantão hoje. —


Fez uma pausa. — Ela pediu pra gente contá o que o papai e a mamãe faz
pros coleguinhas …

Engoli em seco e o riso morreu em mim, fazendo com que uma


tristeza súbita me dominasse. Tive que segurar com força o volante para não
deixar nada transparecer na minha expressão. Essas datas comemorativas e
atividades que envolviam pais e mães sempre me incomodavam, ainda mais
por não conseguir amenizar a dor que via nos olhinhos do meu pequeno
mesmo que ele não falasse nada sobre isso.

— Tinha que contá duas — continuou — aí falei o que você é.

— Humm… — Não sabia bem o que dizer, isso sempre me


desconcertou.

— Aí como não tenho um papai, eu contei do Andrea. — Seu


comentário fez com que eu olhasse para ele pelo retrovisor, surpresa. Dentre
as pessoas que ele poderia ter citado, o fato dele lembrar do meu chefe era
surreal.

— É mesmo, querido? — perguntei suavemente.

— Sim, mas todo mundo riu de mim. — Sua voz soou fraquinha e eu
quis parar o carro e abraçá-lo.
— Por quê?

— Eu disse que ele era um rei!

— Oh, querido. — Fiz de tudo para suprimir a risada que quis brotar
na minha garganta. — Ele não é um rei.

— Mas você disse que ele era um rei… — Soltou um barulhinho


infantil e depois um bocejo, pelo jeito, as brincadeiras do dia deixaram ele
esgotado. Não era muito comum, já que ele tinha energia para dar e vender.

— Era só modo de falar.

— Então o que ele é? — Pelo retrovisor vi ele fechando os olhinhos.

— Um grande empresário, meu bem.

— Hm…

Não falou mais nada e, minutos depois, quando estava no sinal nas
proximidades da ponte Verrazano, olhei para trás e vi que ele tinha caído no
sono, seus lábios formando um biquinho lindo. Assim, durante o resto do
percurso fiquei em silêncio, pensando no que ainda teria que fazer hoje e
torcendo para que meu menininho conseguisse dormir logo depois do jantar
para que eu pudesse trabalhar.
Capítulo Quatro

Dispensando o porteiro que tinha subido com a minha comida com


um aceno de cabeça, vi o homem, que parecia um pouco receoso, desaparecer
do meu escritório. Sabia que eu causava medo em meus funcionários,
principalmente nos de alto escalão, porém naqueles que estavam na base da
cadeia era um pouco demais até para mim, mas era algo que tive que me
acostumar a conviver. Ignorando o fato, depois de saber que eu estava
sozinho, levantei-me da cadeira para remover o paletó, jogando-o em um
canto qualquer, fazendo o mesmo com a gravata, que parecia me sufocar
sempre que eu a utilizava. Só a colocava porque era necessário na minha
posição.

Caminhei até a janela, observando a vista, e querendo ficar mais à


vontade, enrolei as mangas da minha camisa social até o cotovelo e abri os
botões, deixando meu torso nu. Sem que me desse conta, passei a mão pelo
meu peitoral, descendo pelo meu abdômen definido, sentindo as pequenas
ondulações, o que tornou impossível para mim não me lembrar de Adelle
falando nas entrelinhas sobre o meu corpo.

Madre di Dio, estava agindo como um maldito obcecado que não


tinha prazer a muito tempo. Uma risada amarga brotou na minha garganta,
ecoando pelo silêncio ao constatar que de fato estava há mais de um ano sem
fazer sexo. Depois que Adelle entrou em minha vida, nenhuma mulher foi
capaz de despertar uma centelha do meu interesse como a minha secretária o
fazia com apenas sua presença. Talvez meu desejo por ela se deva à novidade
que ela representa, já que, diferentemente das outras que trabalhavam para
mim, em momento nenhum se insinuou ou demonstrou interesse em ter algo
a mais comigo.

Ergui minha mão e toquei os pelos que formavam minha barba,


sentindo-os pinicar. Pensando bem, vários dos meus executivos e
funcionários do alto escalão tentaram sutilmente algo com ela, porém foram
devidamente rechaçados, com uma frieza cortante que os deixava
constrangidos. Como ela nunca chegou a abrir uma queixa de assédio contra
eles, não podia fazer nada a respeito juridicamente, mas, pouco a pouco, eu
dava um jeito de afastá-los da minha companhia. O cúmulo da hipocrisia, já
que eu também não tinha boas intenções para com Adelle. Não a forçaria a
nada, mas isso não me impedia de jogar sujo para conquistar o que eu queria,
a seduzindo lenta e deliberadamente quando possível.

— Em breve — disse para mim mesmo, colocando um ponto final nos


meus pensamentos.

Sentindo meu estômago reclamar de fome, girei o meu corpo e sentei-


me na minha cadeira, puxando o pacote para mim e tirando o seu conteúdo.
Quando ia dar uma garfada na comida que me deixou salivando, meu celular
começou a tocar estridentemente. Suspirei cansado, pois não poderia mais
evitar, eu teria que atender mia madre[8], Ana, embora já soubesse o que ela
falaria. Desde que meu irmão mais novo, um grande playboy, disse que iria
se casar com uma das modelos mais badaladas da Sicília, a mulher não sabia
falar de outra coisa, me perguntando quando eu iria fazer o mesmo. Pelo fato
de ser feliz em seu casamento com meu papà[9], ela acreditava que todos
deveriam encontrar a felicidade em outro alguém, principalmente os seus
filhos.

Eu a amava, porém odiava ser pressionado a fazer algo que nunca


levaria a cabo, mesmo que eu soubesse que Ana não fazia por mal. Mas era
difícil convencê-la que estava muito bem sozinho com os meus negócios para
que uma mulher caprichosa adentrasse no meu mundo, exigindo meu tempo,
dinheiro e atenção, e que deixaria isso para os outros…

Antes que a chamada caísse na caixa postal, me sentindo resignado,


peguei o aparelho e atendi:

— Madre, como vai? — perguntei em italiano, pois sempre que podia


eu gostava de conversar na minha língua materna.
[10]
— Mio figlio desnaturado — ralhou comigo e pude imaginar a
mulher baixinha e morena irritada —, esse tempo todo ignorando a própria
mãe…

— Estava ocupado, madre. — Suspirei profundamente e uma pontada


de dor surgiu em minha cabeça.

— Mas isso não é motivo para você não atender as ligações di sua
madre[11]. Seu pai e seu irmão nunca deixaram de retornar meus telefonemas.
— Fez uma pausa. — Eu te amo, mio figlio, e fico preocupada com você. —
Sua voz soou maternal e senti um pouco de culpa por tê-la ignorado
deliberadamente.

Eu tinha sorte em ter uma família que me amava e deveria ser grato
por isso. O simples pensamento fez com que eu me achasse um merda.
Engoli em seco, sabendo o que eu deveria dizer.

— Eu também te amo, mammina. Me desculpe, não queria preocupá-


la.

— Tudo bem, mio figlio, como foi a viagem? Aquela menina doce
disse que você tinha ido para a China.

— Foi ótima…

— Eu já te falei que adoro a sua secretária? — interrompeu-me com


suas divagações, falando em seu italiano rápido, e eu franzi o cenho. — Ela é
tão atenciosa no telefone, eu adoro conversar com ela. Um dia você deveria
trazer ela e o irmãozinho dela para a Itália, adoraria conhecê-la pessoalmente.

— Acho isso muito difícil, madre... — Tentei cortá-la, sabendo onde


iria dar aquilo tudo, porém a determinação da mulher era maior do que a
minha.

— Ela é perfeita para você, Andrea. — Suspirou romanticamente e eu


revirei os olhos, fechando a cara. — Linda, inteligente, uma excelente
profissional, provavelmente tão focada no trabalho quanto você… — Deu
uma pausa, como se uma ideia povoasse sua mente. — Ela tem namorado?

— Dio, madre, não — respondi rápido demais, atordoado com a


velocidade que ela falava.

— Ótimo, pois vocês dois ficariam lindos juntos, igual eu e o meu


Loreto. Você sabe que eu era apenas uma empregada quando o conheci e me
apaixonei por ele…

— Madre!

— Adelle daria uma excelente nora…

— Você nem a conhece… — cortei-a, irritado, sentindo minha cabeça


latejar ainda mais.

— Mas sinto aqui dentro — fez uma pausa, provavelmente apontando


para o lado esquerdo do peito, e eu quis rosnar, exasperado — que seremos
excelentes amigas.

— Ela é apenas uma funcionária — respondi mais grosso do que


deveria.

— Não fale assim com sua madre, Andrea. — Ralhou novamente


com uma voz severa, ao mesmo tempo que tinha um toque de humor.

— Não foi para isso que você me ligou, não é, mammina? — mudei
de assunto, sentindo-me desconfortável. — Para falar da minha secretária?

— Não, eu só queria avisar que eu e seu pai vamos viajar na semana


que vem para um resort nas Maldivas. Esse ano não comemoraremos nossas
bodas de casamento com vocês, então não precisa voar para cá.

— Acho justo que vocês passem um tempo sozinhos. — Dei de


ombros, mesmo que ela não pudesse ver. — Mais do que ninguém, vocês
dois merecem…

— Conhecendo o seu pai, ele preparará algo bastante romântico para


nós — comentou, soltando um suspiro que indicava que ela ainda era
completamente apaixonada pelo homem que tinha jurado amor eterno há
mais de trinta anos.

— Tenho certeza que sim.

— Você deveria aprender um pouco mais com o seu pai, mio


bambino[12]. Sobre como ser mais romântico, quem sabe assim...

— Dio, madre[13]. — Estava cada vez mais irritado, e sem que me


desse conta, levei a mão aos cabelos, bagunçando-os.

— Okay. — Fez uma pausa. — Só quero ver você feliz.

— Estou bem assim…

— Vou fingir que acredito. Bem, vou deixar você voltar a fazer o que
estava fazendo. — Pareceu desanimada e novamente senti uma pontada de
culpa.

— Mamma, ti voglio tanto bene[14] — sussurrei para ela.


— Eu também te amo, Andrea.

— Ligo depois.

— Ficarei esperando. — Desligou a chamada e eu fiquei olhando para


o aparelho por um tempo, sentindo-me estranho.

Odiava saber que de alguma forma eu magoei ou decepcionei a minha


mãe. Mas, naquele assunto, eu nada poderia fazer, e ela teria que se contentar
com a esposa escolhida pelo meu irmão.

Jogando o aparelho na mesa, olhei para a comida à minha frente e me


forcei a comer, embora o meu apetite tivesse se esvaído por completo.
Tornou-se difícil de engolir com as palavras dela ecoando na minha mente.
Adelle poderia ser quase igual a mim, o que a tornava uma companheira
perfeita, porém ela só ocuparia um lugar em minha cama, nada mais.
Capítulo Cinco

Gemi, mal acreditando que estava na hora de levantar. O alarme


estridente do meu celular ecoava pelo cômodo fazendo minha cabeça pulsar
pela noite mal dormida. Porém cada minuto que me privei de sono,
debruçada sobre o trabalho, tinha valido a pena, já que consegui dar uma
primeira olhada em boa parte.

Pelo que eu entendi, Andrea tinha comprado a companhia por um


valor bem abaixo do mercado, aproveitando a briga interna que se instaurou
entre os donos pelo mal gerenciamento. O dinheiro sempre causava
discussões e Andrea soube se aproveitar disso. Pelo que pude constatar, em
breve ele teria que modernizar parte da frota, mas, a longo prazo, ele poderia
triplicar seu investimento. Já tinha algumas sugestões onde ele poderia cortar
custos, porém iria com mais calma para apresentar algo mais concreto.

Suspirando fundo, levantei-me meio sonolenta e caminhei até o


banheiro social que compartilhava com o meu irmãozinho e tomei uma
ducha, deixando que a água morna me acordasse e ao mesmo tempo relaxasse
meu corpo. Sentindo-me um pouco mais alerta, vesti minha roupa de trabalho
e fui até o quarto de William e, abrindo a porta devagar, vi que ele ainda
dormia tranquilamente, como o pequeno anjo que era. Ver o seu semblante
suave, o biquinho que fazia em meio ao sono, deixava meu coração
transbordando de amor, ao mesmo tempo que uma pontinha de culpa tomava-
me por ter que acordá-lo. Infelizmente ele tinha que ir para a escola e eu
trabalhar.

Nas pontas dos pés, aproximei-me da cabeceira da cama e, me


curvando, plantei um beijo em sua testa.

— Está na hora, querido — sussurrei e, gentilmente, o sacudi.


William se mexeu um pouco, porém não acordou. — Anda, dorminhoco. —
Falei mais alto, fazendo com que ele abrisse seus olhinhos verdes.

— Quero dormir, Del. — Sua voz estava sonolenta e eu senti um


aperto no peito por negá-lo. — Mais um pouquinho…

— Vamos nos atrasar…

— Só mais um pouquinho… — pediu com uma vozinha tão sonolenta


que não tive como recusar. Perante ele, eu era feita de gelatina, uma grande
molenga.

— Certo! Só uns minutinhos a mais. Depois, banho.

Não obtive nenhuma resposta e, com um suspiro, deixei o quarto a


fim de preparar o café da manhã. Um café forte e preto e panquecas com
xarope de bordo era tudo que eu precisava.

Estava terminando de colocar o resto da massa na frigideira quando


meu irmãozinho apareceu no ambiente, fazendo-me franzir o cenho. Ele tinha
ido dormir mais cedo do que de costume e, ao contrário de parecer
descansado, seu semblante estava abatido. E eu não gostei nada de vê-lo
assim.

— Está tudo bem? — perguntei, olhando-o se mover até a bancada e


se sentar.

O menininho assentiu com a cabeça.

— O que você quer na sua panqueca?

— Pode calda de chocolate e morango?

— Claro, meu amor. — Não deveria estar permitindo que ele comesse
tanto açúcar pela manhã, mas queria animá-lo. — Achocolatado para
acompanhar?

— Ebaaaa! — soltou um gritinho que me fez sorrir.

Servi nós dois e sentei ao seu lado, puxando assunto sobre algum
desenho que ele assistia junto com os coleguinhas de classe.

— Não vai terminar de comer? — inqueri, depois de dar uma última


garfada no meu prato e levar a massa encharcada de xarope à boca.

Ele balançou a cabeça em negativa.

— Tô sem fome, Del.

— Então só termine de comer os morangos e tome o leite.

Suspirei, preocupada. William costumava ter um apetite normal para


sua idade e o fato dele não estar com fome hoje me deixava em alerta.
Esperava que fosse apenas um pequeno mal-estar comum em crianças, mas
ficaria atenta.

— Ah, Del. — Resmungou, cruzando os bracinhos.

— Isso não está em discussão. — Tentei manter uma postura severa,


mas falhei miseravelmente. — Coma, por favor. Um astronauta ou um grande
médico precisa se alimentar.

Fez uma careta e, sob meu escrutínio, comeu as frutas e bebeu o


achocolatado, que para meu coração coruja, por sorte, era repleto de
vitaminas. Mas, mesmo assim, pediria que dessem algo mais tarde para ele.

— Pronto. — Virou-se para mim e pude ver o seu bigodinho de leite,


e não contive uma gargalhada, dando um beijo estalado na sua bochecha.

— Agora vai lá terminar de se arrumar.

— Tá bom. — Deslizando pelo banco, ele me obedeceu.

Depois de jogar fora o que ele não comeu e colocar os utensílios na


lava louça, encontrei William sentado no sofá e corri para o banheiro para me
ajeitar. Estava terminando de calçar minhas sapatilhas quando ele apareceu
na porta.

— Vamu logo, Del. — Olhou para mim com uma cara sapeca e eu
olhei o relógio, constatando que se eu não saísse logo, iríamos nos atrasar.

— Vamos então — disse, depois de pegar minha bolsa e colocar um


sapato de salto dentro dela.

— Tá bom… — Deu de ombros, parecendo emburrado, mas logo um


sorriso se formou no seu rostinho. — Hoje é dia de filme, eeeee!!

— Você não vai querer perder, né?

Fez que não e saiu correndo do cômodo, parecendo mais animado e só


restou a mim segui-lo, trancando a porta do nosso apartamento depois de
pegar a mochilinha dele, pedindo para que fosse mais devagar.

Descemos de elevador até a garagem subterrânea e tive que segurar


sua mãozinha para que ele não aprontasse, seu abatimento de meia hora atrás
parecendo evaporar. Nunca poderia entender completamente como as
crianças mudavam da água para o vinho, mas não me deixaria enganar. Ser a
única responsável por William me fazia ficar atenta a cada aspecto que o
envolvia.

Abrindo o carro, o coloquei no assento booster e William terminou de


se ajeitar. Dando a volta no veículo, sentei no banco do motorista, jogando
minhas coisas no outro assento, e coloquei a chave na ignição, porém nada.
Franzi o cenho e tentei novamente, e nada. Eu fazia manutenção constante e
nos últimos dias não tinha visto nada que indicasse um problema no
automóvel.
— Que foi, Del? — o menininho me perguntou e momentaneamente
foquei minha atenção nele, que parecia agitado no banco de trás.

— Não quer ligar.

Tentei novamente e nada. Era só o que me faltava. Suspirando, puxei


a alavanca e saí, levantando o capô, porém meus parcos conhecimentos não
me permitiram identificar nada fora do comum.

Merda! Como uma obcecada pelo tempo, olhei meu relógio


constatando que eu teria que lidar com o mecânico depois. Não iria me
atrasar pela segunda vez no mesmo mês.

— Del? — Senti alguém me puxando.

— Oi, querido?

— Não vamu pra escola? — perguntou, parecendo contente pelo fato.

— Vamos sim, pegue sua mochila. — Ordenei, fechando a tampa do


capô e caminhei até o local onde estava minha bolsa. — Pegaremos um táxi.

— Ah… — Fez biquinho.

— Lembre-se do filme — procurei animá-lo, embora eu mesma não


conseguisse me sentir entusiasmada.

— Então vamu logo — saiu me puxando quando eu peguei minha


bolsa e tranquei o carro.

Sentindo-me subitamente cansada, deixei-me ser arrastada pelo


estacionamento por um pinguinho de gente. Algo me dizia que hoje seria um
dia daqueles, embora o fato de que um táxi não tenha demorado a passar
tenha me enchido com um pouco de esperança de que não seria tão ruim
assim.
Capítulo Seis

Apoiei-me no balcão da copa privativa de Andrea enquanto


bebericava o líquido escuro, amargo e bastante forte, tentando me manter
desperta, o cansaço pesando sobre os meus ombros. Pelo visto, todos os
problemas que poderiam acontecer decidiram aparecer hoje. Além de toda a
burocracia para acionar o seguro, de ter que ligar pedindo para liberarem a
entrada do mecânico no prédio, surgiram vários erros em relatórios feitos
pelos departamentos, o que deixou Andrea irritado e com uma fúria fria, que
cortaria qualquer um que estivesse em seu caminho.
Para ajudar, nossos servidores ficaram indisponíveis por cerca de uma
hora, e tive que me desdobrar para acionar os técnicos enquanto meu chefe,
mascarando sua frustração, atendia algumas ligações no seu número
particular, provavelmente de alguns outros empresários que não tinham
conseguido contato pelo nosso ramal, usando de todo o seu autocontrole. Por
sorte, se é que posso chamar assim, não tinha nenhuma reunião agendada no
horário.

Sempre que solucionava uma coisa, aparecia outra, parecendo que o


dia nunca teria fim. Tive que engolir minha comida mais cedo enquanto
trabalhava e só agora pude respirar, apreciando o café quente, que parecia me
oferecer um alívio ilusório enquanto olhava pela janela larga que dava vista
para um prédio tão imponente quanto o que eu estava. Tentei não pensar em
nada, mas minha mente vagava para o trabalho que teria que fazer daqui a
poucos minutos.

Redigindo mentalmente o documento que Andrea teria que assinar


ainda hoje para ser enviado para o departamento comercial de um dos
conglomerados do grande império gerenciado por ele, me assustei quando o
próprio homem adentrou na pequena sala de refeições e levou a mão aos
cabelos jogando-os para trás, passando a mão na barba cerrada e bem-feita
que deixava seu rosto ainda mais másculo e atraente.

Sem que me desse conta, peguei-me por alguns segundos imaginando


como seria ter aqueles pelos roçando na pele sensível do meu pescoço,
enquanto ele deixava uma trilha de beijos por toda a extensão da minha
garganta. Suspirei tentando me recompor internamente, pois estava mais
cansada do que imaginava ao pensar numa coisa dessas, tal pensamento era
um disparate ao meu profissionalismo. Ele era atraente, mas não era o
primeiro e não seria o último que tinha visto.

— Tudo bem? — perguntei enquanto o observava se sentar


displicentemente, mais controlada.

Seus olhos azuis brilhavam com irritação e, sob meu escrutínio, tirou
o blazer do terno, jogando-o na cadeira, para depois retirar a gravata e abrir
os primeiros botões da sua camisa social, deixando à mostra parte do seu
peitoral definido. Tive que fazer um esforço sobre-humano para não engolir
em seco e manter minha expressão neutra perante a ânsia que me assolou,
não deixando evidente o desconserto momentâneo que senti. Forcei-me a
olhar para o seu rosto enquanto bebericava um pouco mais de café.

— Irritado, cansado e o dia nem começou direito ainda — soltou um


suspiro, se remexendo na cadeira inquieto e passou a mão novamente em seus
cabelos.

Fiquei surpresa pelo seu comentário, pois Andrea Della Torre não
costumava revelar seus sentimentos, ainda mais aqueles que estavam no
extremo oposto da postura implacável que sempre apresentava. Mas por trás
do magnata, existia um homem de carne e osso, sujeito à exaustão. Como eu,
provavelmente ele passou a madrugada inteira trabalhando.

— Tenho uma série de reuniões das seis até as dez, por conta do fuso
horário… — continuou.

— Faz parte. — Dei de ombros. — Nada que você não esteja


acostumado.
— Sim.

— Café? — perguntei, me virando para colocar minha caneca na pia,


mas logo me voltando para ele.

— Não essas porcarias de máquina que você toma — desdenhou e eu


apenas ignorei.

— Certo.

Assenti e girei em direção ao armário, pegando o caneco e o pacote de


pó de café produzido no Brasil, que deveria custar os olhos da cara. Enquanto
eu iniciava o preparo, podia sentir seu olhar sobre mim, algo que vinha
acontecendo com cada vez mais frequência, mas que eu dizia para mim
mesma que não era nada. Eu tinha consciência que, embora o Washington da
contabilidade sempre apontasse minhas imperfeições, eu era uma mulher
atraente; os outros homens e suas cantadas baratas eram a prova disso. E
Andrea era como qualquer outro exemplar do sexo masculino, e, com certeza,
olhar para mim era melhor do que para o prédio lá fora. Eu não poderia
negar, o fato dele fazê-lo alimentava meu ego feminino, que tinha sido
massacrado pelo meu profissionalismo e responsabilidades, coisa que me
permitia poucas vezes. O farfalhar dele se movimentando fez com que eu me
virasse para ele enquanto esperava a água ferver.

— Aconteceu algo? — questionei, mesmo sabendo que não era da


minha conta.

— Parece que precisarei fazer uma viagem para o sul da Itália nos
próximos dias, mesmo que a contragosto. Aconteceu um probleminha com os
vinhedos da família e preciso ver com os meus próprios olhos — a voz
autoritária e gelada retornou.

— Ninguém pode fazê-lo por você? — Arqueei a sobrancelha.

— Dessa vez não.

— Começarei os preparativos, é só você me passar as informações


necessárias.

— Só vou resolver alguns assuntos que ainda preciso por aqui e irei.

— Okay. — Virei-me para o fogão e, desligando o fogo, comecei a


preparar tudo para passar o café.

O pó cheirava divinamente bem, mas quando preparado, o cheiro


forte exalava por todo ambiente, algo completamente delicioso. Foi
impossível conter o gemido, que foi ouvido por Andrea, o que me tirou do
transe quando falou:

— Sirva-se de um pouco.

— Eu já tomei, obrigada — disse, enquanto servia uma xícara, sem


açúcar, e colocava na frente dele, que me olhava com grande intensidade.

— Não falarei de novo…Faça-o, você quer. — Ordenou com a voz


fria, porém seus olhos continham um calor que nunca imaginei ver,
contrariando seu tom. Pela segunda vez hoje, tive que me controlar perante a
intensidade de Andrea. — E pela sua aparência, você precisa de mais uma
dose.

Fiz uma careta e assenti, mesmo que ele tenha soado rude. Pelo jeito,
estava escondendo muito mal meu cansaço e o fato me incomodou um pouco.
Servi-me uma xícara com uma dose de açúcar e sentei-me à sua frente,
pousando a louça na mesa para passar a unha pintada sobre a borda do
recipiente.

— Porque sempre que você está fazendo sua refeição aqui, eu acabo
roubando algo de você? — Ele franziu o cenho de leve com o meu
comentário, porém não disse nada, apenas bebericou seu café. — É estranho
e antiprofissional, por ser sua secretária.

— Não vejo problemas nisso e você não deveria se importar com o


fato.

— Me parece…

— Isso não me deixará mais pobre, Adelle — cortou-me secamente,


embora uma chama ardesse em seus olhos azuis. — Considere como um
bônus pela sua eficiência e pela carga de trabalho que ainda te darei.

— Certo. — Foi impossível conter o sorriso que brotou em meus


lábios. Levei a xícara aos lábios e experimentei o líquido, sentindo-o bastante
encorpado e saboroso ao paladar. — É maravilhoso. — Beberiquei mais,
quase tomando-o em um único gole.

— Não vou falar sobre o processo de produção, pois pode parecer


pouco agradável… — comentou suavemente, finalizando o conteúdo da sua
louça.

— Acho que prefiro não saber, destruiria toda a experiência.

Ficamos em silêncio por algum tempo até que ele o quebrou enquanto
eu terminava minha dose de café.

— Noite em claro? — perguntou, me deixando surpresa. O seu


esgotamento parecia fazê-lo propenso a falar, algo nada comum nele.

— Estava trabalhando naquilo que você me pediu.

— Promissor, não é?

— A primeira leitura que fiz diz que sim. Tenho algumas ponderações
sobre o assunto, mas preciso de mais tempo para analisar tudo com calma.

— Quanto? — Exigiu, voltando a ser o magnata frio e rígido que era.

— Acredito que o meu final de semana será bem produtivo.

— Fico contente em ouvir isso.

Quando ia abrir a boca para falar algo, o som do meu celular começou
a ecoar no bolso do meu blazer. Franzi o cenho, pois poucas pessoas tinham o
meu número e eu era bem severa no uso do aparelho no trabalho.

William! A simples hipótese de que algo tenha acontecido com ele,


me fez paralisar, o pânico e o medo me tomando por completo.

— Atenda — o homem à minha frente ordenou, me tirando do transe


e, com as mãos trêmulas, peguei o telefone aceitando a chamada.

— Alô — sussurrei com a voz embargada.

— Senhorita Beckett?

— Sim.

— Aqui é da Escola High Five, gostaria de solicitar que você venha


buscar o aluno William Beckett.

— O que aconteceu? — Quase gritei, sentindo o horror me dominar.


Pensar que meu pequeno não estava bem ou que algo tinha acontecido, me
deixava nervosa ao extremo. Estava completamente histérica, e sem que me
desse conta, Andrea levantou-se da sua cadeira e apoiou sua mão no meu
ombro, como se com esse gesto pudesse me oferecer algum consolo.

— Fique calma, senhorita. William apenas não se sente bem. Pode ter
sido algo que ele comeu… A enfermeira o está avaliando e…

— Certo. — Tentei puxar ar para os meus pulmões, tentando me


acalmar. — Pegarei um táxi e estarei aí em breve.

— Cuidaremos dele até senhorita chegar.

Bamba, desliguei o telefone e me levantei de súbito, fazendo com que


Andrea desse alguns passos para trás.

— Está tudo bem, Adelle? — perguntou com a voz séria.

— Meu irmão está passando mal…

William já tinha ficado doente outras vezes, porém todas as vezes que
acontecia eu me desesperava até ter a certeza que ele ficaria bem. Eu sempre
fazia tempestade em copo d’água perante a sua saúde. Meu irmão era tudo o
que eu tinha, e a possibilidade de perdê-lo me deixava sem chão. Sem me
importar com o meu chefe, caminhei para fora da cozinha e do escritório
dele, pegando a minha bolsa.

— Preciso pegar um táxi, meu carro está estragado, como você sabe
— continuei mecanicamente, pois em algum lugar da minha mente ouvia
Andrea me seguindo. — Tomara que encontre um logo.

— Adelle — pousou as mãos sob os meus ombros me fazendo virar


para ele, suas feições estavam rígidas, seu olhar severo —, eu te levo. Só vou
pegar as chaves do veículo na minha mesa.

— Não precisa, você tem as reuniões mais tarde, o trabal… — Um


rosnado dele me interrompeu.

— Tenho tempo livre agora. — Sua expressão ficou ainda mais


medonha. — Você ainda é a minha funcionária e não manda nada aqui. —
Sua voz soou tão cortante que arrepiou os pelos da minha nuca.

Eu já o tinha visto falar assim com muitas pessoas, mas nunca


comigo, e por um minuto estaquei no lugar e, soltando-me, ele entrou no seu
escritório rapidamente, demorando pouco tempo para voltar.

— Vamos — segurou o meu braço e fez com que eu me


movimentasse em direção ao elevador.

Sem que eu me desse conta, uma lágrima sorrateira escorreu pelo meu
rosto, extravasando o meu cansaço, frustração e, principalmente, o medo.
Capítulo Sete

Cazzo!

Em questão de minutos eu tinha ido do céu ao inferno.

Como qualquer homem com sangue nas veias, eu tinha aproveitado


cada minuto em que estava sozinho com Adelle enquanto ela estava escorada
na bancada ou preparava o meu café, deixando que meu olhar estudasse cada
traçado do seu corpo, que estava louco para provar com a minha língua e
lábios bem lentamente, sem deixar nenhum pedacinho clamando pelo meu
toque. Não sei por quanto tempo eu fiquei olhando para as curvas macias das
suas nádegas, imaginando como seria tê-la completamente empinada para
mim, chocando contra minha pelve. No que tangia a ela, eu só tinha
pensamentos lascivos. E algo no seu olhar me dizia que Adelle tinha
consciência disso, e sentia algum regozijo por tal.

Mas o que de fato me surpreendeu era ter me aberto para ela, falando
pelos cotovelos, revelando minha fraqueza. Estava sentindo um misto de
sentimentos, que iam do cansaço por andar trabalhando mais de doze horas
por dia, passando pela frustração por não conseguir controlar o desejo que
sentia pela minha secretária toda vez que a via ou lembrava-me dela, e
culminando na raiva de alguns funcionários incompetentes que tinha sob meu
comando, mas aos poucos minha ira foi arrefecendo.

E sobre compartilhar com ela minha comida e bebida, eu realmente


não me importava, tinha dinheiro e poderia gastá-lo da forma que eu
quisesse, e iria utilizar para me dar prazer. E por mais que eu não quisesse
admitir e nunca o faria para ninguém, eu gostava de conversar de igual para
igual com ela e ver o pequeno deleite que Adelle sentia ao degustar do
melhor, ambos agindo como um afrodisíaco nas minhas veias, fazendo-me
imaginar como seria dar a ela outra espécie de prazer: o êxtase. Quando ela se
tornasse minha amante, iria levá-la nos melhores lugares de Nova York só
para ouvi-la gemer depois.

Mas agora, depois da ligação, deixei-me levar pela angústia que senti
perante a reação de pânico da Adelle ao receber a notícia que o irmão não
estava passando bem, o que definitivamente não queria sentir. Mas ver a
mulher sempre controlada perdida, presa no próprio medo, fez com que eu
agisse por impulso e oferecesse ajuda, algo que nunca fazia. Até mesmo a
toquei nos ombros tentando acalmá-la, indo contra todo o meu bom-senso,
suportando a corrente elétrica que me percorreu ao aproximar-me tanto dela,
sentindo o calor que emanava de seu corpo transpassando o tecido fino da sua
blusa social. Meu intento de consolá-la não fez nenhum efeito enquanto ela
terminava a ligação.

Não pensei nos relatórios que teria que ler antes das reuniões de mais
tarde e nos documentos que teria que assinar, jogando-os às favas. Tudo que
senti durante o dia veio à tona, e eu acabei explodindo, soando mais severo
que deveria com alguém estando tão frágil. Não seria hipócrita em afirmar
que se fosse qualquer outra pessoa eu não me importaria de ter sido rude.
Mas Adelle era a Adelle, o meu braço direito, a mulher que eu respeitava e
uma funcionária que não poderia ser substituída facilmente. E diferente de
mim, ela tinha apenas o irmão...

Saí do meu escritório porta afora e segurei-a pelo braço, obrigando-a


a acompanhar os meus passos rápidos enquanto uma ou duas pessoas nos
olhavam estranho enquanto percorríamos o estacionamento, até pararmos
diante do meu Porsche novinho em folha. Soltando-a, destravei o veículo e
abri a porta do carona, olhando para ela. Ver o rastro de uma lágrima em seu
rosto foi como se eu tivesse levado um soco na boca do estômago, porém
como tudo o que fazia, o suprimi.

— Entre — disse suavemente e dessa vez ela me obedeceu,


deslizando pelo banco de couro e colocando o cinto. Bati a porta e dei a volta
no veículo para fazer o mesmo, ligando o carro e ouvindo o ronco silencioso
do motor, e pus a manobrar o esportivo para sair dali.

— Qual o endereço? — perguntei quando passamos pela cancela e


subimos a rampa que levava a Wall Street.

Ela me passou a localização com a voz muxoxa e programei-o no


GPS, me sentindo incomodado. Infelizmente, o trânsito estava mais caótico
do que o comumente, e eu soltei um suspiro, irritado. Eu a encarava pelo
retrovisor, vendo-a parecer cada vez mais ansiosa, o silêncio dela tornando-se
cada vez mais sufocante, mas para minha sorte estava sem a minha gravata.
Ansiava por tocar a sua mão que estava pousada sobre a coxa, oferecendo
algum tipo de conforto, porém não o fiz. Não poderia negar que imaginei tê-
la sentada ao meu lado naquele mesmo banco, porém nas circunstâncias eu
estaria levando-a para um lugar mais privado e meus dedos levantariam sua
saia lentamente, até que minha palma estivesse em contato com a sua pele
macia nua sob o meu tato. Demonstrando a minha posse… Porém a realidade
era bastante diferente dos sonhos, e não a queria daquela maneira.

Um suspiro profundo escapou de seus lábios e eu olhei para ela,


enquanto o sinal estava fechado.

— Vai ficar tudo bem, tesoro [15] — obriguei-me a dizer e o olhar dela
encontrou o meu, vazios e preocupados. — Pode ser algo que costuma
acometer as crianças. Todos nós sofremos com um mal-estar qualquer…

— Eu sei disso… — Sua voz soou fraca e tive que desviar minha
atenção para o trânsito quando uma buzina soou. — Não é a primeira vez que
isso acontece e não será a última, mas… Toda vez sinto um medo absurdo,
por mais banal que seja. Eu não gosto nem de pensar em perdê-lo, Andrea.
— Não precisa pensar assim — disse o mais suave que pude, embora
eu não fosse bom nisso.

Eu não era sensível. Pelo contrário, era um ogro grosseiro.

Meus pais me deram uma educação primorosa, porém não poderia


afirmar que o praticava no meu dia a dia. Para o completo desespero da
minha mãe, à medida que fui crescendo, fui tornando-me cada vez mais
inescrupuloso para obter o que eu queria, parte disso incentivado pelo meu
avô paterno. Deixava o refinamento e traquejo social para o caçula, que desde
menino conquistava a todos com seu carisma, principalmente a mídia, algo
que sempre evitava. E agora forçava-me a ser gentil com Adelle.

— Você deve me achar uma fraca por fazer uma tempestade com algo
que pode acabar sendo somente um mal-estar passageiro. — Uma risada
amarga escapou de sua garganta e eu não gostei nada de ouvi-la, fazendo com
que eu apertasse o volante com força. — E sei o quanto você reprova isso.
Céus, nem quero imaginar o que você está pensando de mim agora. — Pelo
retrovisor pude ver suas unhas bem-pintadas deslizando pelo painel do meu
carro, distraidamente.

— Dio, Adelle. Eu não estou pensando nada de mal, apenas que é


natural você estar assim — disse uma meia-verdade, escondendo o fato de
que sua frase me incomodou mais do que deveria.

— Ambos sabemos que você não aprovaria em nada alguém surtando


dessa maneira no trabalho. — Suspirou profundamente. — Se é que não a
demitiria por isso…

Fiquei em silêncio, sem saber o que responder. Precisei admitir que


ela tinha um pouco de razão naquilo que ela dizia, pois eu não seria tão
complacente com outra pessoa nem mesmo estaria tendo essa conversa. Mas
Adelle era uma mulher com uma mente que rivalizava com a minha, aquela
que eu queria em minha cama completamente entregue.

— Vire à direita — sussurrou para mim, quando consegui sair do


trânsito, antecipando o GPS.

Não demorou muito mais para que chegássemos ao nosso destino.


Assim que parei o Porsche, Adelle removeu o cinto e, apertando sua bolsa
com força, sem me esperar, saiu do veículo e começou a andar até o prédio de
fachada colorida da escola. Praguejando, fiz o mesmo, trancando o automóvel
e andei a passos largos até ela, alcançando-a na recepção.

— Boa tarde. Posso ajudá-los? — O porteiro perguntou


educadamente.

— Me ligaram pedindo que eu buscasse o aluno William Beckett que


não se encontra bem. — Adelle respondeu, aflita.

— Deixaram-me um aviso. Documento de identificação, por favor.


— Com as mãos trêmulas, Adelle abriu a bolsa, procurando pela sua carteira.

— E o senhor?

— Andrea Della Torre, e estou com ela.

O homem arregalou os olhos, reconhecendo-me, porém apenas


assentiu, ainda parecendo atônito.

— Documentos também, por favor.

Adele passou sua carteira de motorista para o homem e eu fiz o


mesmo, que anotou os dados em um papel, devolvendo-nos para abrir o
portão para que pudéssemos entrar.

— Certo. Sabe onde fica a enfermaria, senhorita Beckett?

— Não.

O homem passou as instruções e assentimos, seguindo cada vez mais


para dentro do prédio, até chegarmos em uma espécie de ambulatório.

— Dell? — A criança de cabelos escuros cacheados e olhos tão


verdes como o da irmã, sentado na maca, deu um gritinho fraco assim que
nos viu entrar.

— William… — disse com a voz embargada.

Sem perder tempo e não se importando com a enfermeira que estava


próxima a ele, Adelle correu nos seus saltos altos, fechando a distância entre
eles e o abraçou, dando-lhe um beijo na bochecha. Eu permaneci escorado no
batente da porta, contemplando a cena fraternal.

— Oi, meu amor. Como você está? — perguntou suavemente ao


menino sem soltá-lo, passando a mão no rosto dele, que parecia um pouco
abatido.

— Pode ser uma virose, senhorita Beckett — a mulher comentou e


Adelle suspirou profundamente. — Ele está com ânsia de vômito e indo ao
banheiro com frequência. Dei um pouco de soro e um remedinho para
segurar.

— Obrigada — olhou rapidamente para ela, mas sua atenção se


voltou para a criança, que jogou os bracinhos em torno dela.
— Ele chegou a comer algo diferente no café da manhã? —
questionou.

— Dei panquecas com calda de chocolate e morangos… — Pareceu


culpada pelo fato e uma fúria cega me tomou. Ela fazia o que podia e não
gostei nem um pouco dela se sentir assim. — Eu não deveria, mas…

— Não estou aqui para julgá-la, senhorita. Mas recomendo que faça
uma sopa de legumes ou canja para ele, ajudará. Melhor não o trazer para a
escola esses dias, para que não transmita as outras crianças, caso seja algo
contagioso.

— Certo.

— Dê soro também — continuou. — Se caso persistirem os vômitos,


procure o pediatra dele.

Virou-se e pela primeira vez a mulher reparou em mim e se


aproximou.

— O senhor é...? — Lançou-me um sorriso e um olhar de desejo,


deixando-me irritado. — Em que posso ajudá-lo?

— O companheiro dela e em nada — menti em um tom baixo e


cortante, para que minha secretária entretida com o menininho não ouvisse
aquilo que tinha acabado de dizer, fazendo a mulher engolir em seco.

Sob seu olhar, caminhei até Adelle e pousei as mãos em seus ombros,
ignorando o desejo que senti ao tocá-la novamente, deixando bem claro por
quem eu me interessava. A única mulher que me incendiava só por existir,
minha futura amante.
— Vamos, tesoro? — falei em voz alta e Adelle soltou o irmãozinho
e olhou para mim com seus olhos verdes que pareciam mais aliviados, nem se
dando conta de que eu a tocava. De alguma forma, preferia vê-la mais serena
e tranquila. O porquê disso, eu morreria antes de analisar.

— Claro. Podemos ir, William, ou quer ir ao banheiro primeiro? —


passou a mão no rostinho dele e eu retirei minha mão dela, recuando um
passo a fim de dar espaço para os dois.

— Banheiro.

— Certo.

Ajudou ele a descer da maca, colocando-o de pé, e virou-se para a


enfermeira.

— Obrigada, senhora.

— Não foi nada. Só estava fazendo o meu trabalho. — Fingiu falsa


modéstia e eu quis rosnar de irritação.

— Mesmo assim, agradeço. — Deu um sorriso para mulher, que não


o merecia, enquanto pegava a mochila próxima a cama. — Me dê a mão —
pediu e assim o menininho fez.

— Boa tarde. — A enfermeira respondeu e Adelle agradeceu


novamente. Eu apenas a ignorei e segui os dois em direção a um banheiro
próximo na qual Adelle entrou junto com ele. Enquanto aguardava, checava
minha caixa de e-mail, constatando que quando eu chegasse na empresa eu
teria mais problemas para resolver. Passei a mão na barba enquanto abria e
fechava as mensagens e soltei um suspiro. O dia tornava-se cada vez mais
comprido e eu previa que seria mais uma noite mal dormida.

— Tudo bem, Andrea? — A voz doce dela tirou-me do transe, e


bloqueando o celular, devolvi o aparelho para o bolso da minha calça social.

— O de sempre… — Dei de ombros, não estendendo o assunto. —


Prontos?

— Huhum… — Balançou a cabeça e uma mecha escapou do coque


firme que ela costumava usar, emoldurando a curva do seu rosto. Dio, ela
ficava mais linda assim… Ignorando o pensamento, comecei a caminhar sem
me importar se meus passos eram mais largos do que os dela e do menino.

Precisava colocar um pouco de distância, mesmo que ela durasse


apenas poucos minutos, já que teria que levá-la para casa.
Capítulo Oito

Depois de tocá-lo, beijá-lo, sentir o cheirinho infantil do seu sabonete


e olhar para o seu rosto, mesmo que um pouco abatido, meu coração deu uma
acalmada no peito e suspirei de alívio, o pânico que eu anteriormente sentia
se dissolvendo lentamente embora a preocupação ainda existisse. Tinha
aprendido minha lição de maneira mais dura, não poderia dar nada a ele de
chocolate pela manhã nem outro tipo de doce. A culpa ainda dava suas
pontadas, mas eu agora agiria de maneira correta.

Ficaria alerta e seguiria todas as recomendações da enfermeira e, se


precisasse, marcaria uma consulta. Moveria o mundo por William. Eu tive
que conter uma risada seca ao olhar para o homem que se afastava a passos
largos, a personificação do poder e do dinheiro. Merda! Agora que podia
pensar com mais racionalidade e estava mais calma que me veio a
consciência de que acabei envolvendo o meu chefe em uma situação que
cabia apenas a mim resolvê-la. Andrea era um homem ocupado, com vários
negócios para gerenciar, e eu tinha o arrastado até ali. Tudo bem que foi ele
que se ofereceu, mas, mesmo assim, eu deveria ter sido mais firme como a
profissional que era. Perdida em pensamentos, tomei um susto quando Will
soltou um pequeno gritinho.

— Uau! — Soltando a minha mão, se aproximou do veículo e de


Andrea que nos esperava encostado na lataria. — Um carro da Hot Wheels.
Tenho um igualzinho, não tenho Del? — William pareceu empolgado, dando
saltinhos em torno do veículo, nem parecendo o menininho doente que acabei
de buscar na escola e por aquele quem eu estava surtando minutos atrás.

Para minha surpresa, Andrea riu alto, seus olhos azuis brilhando com
diversão. Aproximou-se de Will, mexendo nos cabelos dele.

— Fico feliz que gostou, piccolo.

Pela primeira vez olhei o carro luxuoso e esportivo que o magnata


usava. Era um veículo bonito e parecia ter sido adquirido recentemente, mas
confesso que não me importava com isso. Eu estava contente com o meu
sedan popular até que ele me deixou na mão de manhã. Não dava a mínima
se era estiloso ou não, apenas que o carro funcionasse.

— Acredito que sim. — Dei de ombros me obrigando a responder o


menino. — Não que eu ligue para essas coisas de estética automobilística.

— Assim você ofende a minha nova aquisição, mammina. —


Arqueou uma sobrancelha para mim, um sorriso pairando em seus lábios. Era
sempre surpreendente vê-lo relaxado daquela maneira, pois não era tão
recorrente assim.

— Tá, mio caro.

— Posso dirigi? — meu irmão perguntou na inocência e fez cara de


pidão. — Eu sei dirigi.

— Quanto tiver idade suficiente e tirar carteira, por que não? — Foi a
vez dele dar de ombros e desencostar da lataria.

— Eeeeeeee.

— Vamos? — perguntou, dando a volta no veículo, destravando o


alarme.

— Podemos pegar um táxi daqui — tentei soar profissional —, já te


atrapalhamos demais. Sei que aconteceu algo na empresa que você precisa
dar atenção.

— Ah, não, Del… — meu irmão protestou, mas apenas o repreendi


com o olhar.

— E deixar que ele perca a diversão? — Disse em um tom que sabia


que não permitia ser contestado. — Não seja chata.

Suspirei fundo e acabei concordando com a cabeça, dando-me por


vencida.
— Certo.

— Ebaaaa.

Sem me esperar, William abriu a porta do carona e entrou, e eu o


ajudei a ajustar e colocar o cinto, já que não tínhamos um assento apropriado
conforme a lei americana. Mas agora era tarde demais. Fechei a porta com
delicadeza e sentei-me no banco ao lado do motorista. Enquanto gentilmente
Andrea conversava com Will sobre automóveis e velocidade, me permiti
imaginar como seria ter alguém que dividisse comigo o peso de se criar uma
criança, tendo que trabalhar e estudar nos minutos livres para estar sempre
atualizada na área que escolhi. Eu amava e muito o meu irmão e amava
cuidar dele, ele era quase como um filho para mim, mas as responsabilidades
de criá-lo muitas vezes pesava nos meus ombros, e era impossível não
questionar se eu estava fazendo as escolhas certas. Nesses momentos, uma
ponta de ressentimento me dominava pela minha mãe ter se envolvido no
mundo das drogas e pelo meu pai por induzi-la a isso ao abandoná-la.

Eu poderia deixar Will com a minha vizinha mais de idade, que fazia
as vezes de babá e sair para curtir, conhecer homens interessantes em bares e
boates, ou até mesmo dar uma oportunidade para alguns dos caras que me
cantavam no trabalho, porém não encontrava nada dentro de mim que ansiava
por algo assim, então sempre desistia. Eles provavelmente só queriam transar,
não dividir tal fardo. Eu não era boba por pensar tal coisa, não era a primeira
e nem a última mulher com uma criança para cuidar a ser encarada pela
sociedade dessa forma…

— Adelle? — A voz grossa e estranhamente terna do meu chefe me


tirou do meu transe de pensamentos.

— Sim? — Virei-me para ele, percebendo que ele me fitava


intensamente enquanto estávamos parados em um sinal.

— Ela vive no mundo da lua — meu irmãozinho comentou antes que


Andrea falasse algo, e soltou uma gargalhada.

— É mesmo, piccollo? — Andrea franziu o cenho e eu me encolhi no


banco, envergonhada. — Não sabia que era dada a divagar — sussurrou para
si mesmo.

— Vou virá um astonauta pra buscá ela lá — riu ainda mais.

— Então temos que providenciar sua vaga em um foguete da Nasa —


sugeriu ternamente e um sentimento que não pude reconhecer me percorreu.
Ver o homem rude, grosseiro e frio tratar meu irmão daquela forma era algo
completamente novo e desconcertante.

— Vô comê comida espacial.

— Essa eu passo…

— Eu também — comentei, entrando na brincadeira. — Você estava


falando comigo, Andrea? — perguntei, chamando sua atenção quando ele
voltou os olhos para o tráfego.

— Você precisa passar em algum lugar? Para comprar algum legume


ou algo que precise para a canja?

— Acho que não é necessário, qualquer coisa peço pelo aplicativo. —


Sorri. — Obrigada por perguntar, Andrea.
Ele não disse nada, e a voz do meu pequeno voltou a soar, falando de
comida espacial e Andrea passou a contar o que sabia sobre aquilo,
principalmente sobre o processo de desidratação e como eles faziam para se
alimentar, encantando ainda mais o meu irmãozinho. Estávamos quase
chegando ao bairro em que morávamos, nem tendo percebido que já
tínhamos passado da ponte, quando constatei o óbvio:

— Oh, você sabe nosso endereço…

— Sim, deixei registrado na minha agenda caso precisasse de algo. —


Manobrou o automóvel e entrou na rua em que ficava o meu apartamento.

— Faz sentido.

— Del, Del… — Virei para trás quando William me chamou aflito,


ao mesmo tempo que Andrea estacionava o carro rente ao meio-fio.

— O que foi, querido? — Soei preocupada.

— Tô querendo ir no banheiro, vamu logo. … — Fez uma careta.

— Oh! Vamos. — Soltei o cinto e abri a porta, descendo do carro e


indo para onde Will estava. — Você quer entrar, Andrea? — perguntei, aflita,
enquanto retirava meu irmão do veículo.

— Acho que é melhor não. Cuide dele e fique de home-office nos


próximos dias. — Sua voz saiu tão suave e preocupada que não iria contestá-
lo. Uma vez na vida, senti que alguém realmente me apoiava em algo, mas
logo tratei de suprimir essa sensação.

— Certo. Ligarei assim que puder.

— Qualquer coisa, é só chamar.


— Obriga...

Antes que eu terminasse de agradecer, William me puxou e não tive


outra escolha que não fosse correr para que ele usasse o banheiro. Me
desculparia e agradeceria a Andrea mais tarde.
Capítulo Nove

Observei-a quando ela deu a mão a William enquanto se afastava com


passos apressados e entrava no prédio antigo. Poderia ter arrancado o carro
assim que eles pisaram na calçada, como um grande idiota sem coração, mas
apenas esperei, como um homem protetor o faria, uma verdadeira tolice.
Culpando o cansaço pelas minhas atitudes, respirei profundamente e o cheiro
suave de chocolate, resquício de Adelle, adentrou as minhas narinas,
infiltrando-se em mim, torturando-me, mesmo sem saber. Daria uma boa
soma de dinheiro para senti-lo diretamente da sua pele, saciando minha
vontade. Maneando a cabeça, conectei meu aparelho celular no sistema de
bordo do carro, ativando o comando de voz, e, girando a chave na ignição, saí
dali, colocando no fundo da mente tudo o que tinha acabado de acontecer.

— Conecte-me ao Washington, do setor de contabilidade — disse


para o computador quando estava saindo do bairro tranquilo onde ela morava,
que automaticamente fez a ligação. Tinha problemas maiores para resolver do
que me deixar envolver pelo cheiro bom da minha secretária e as sensações
que despertava em mim.

Para a minha irritação, o homem não atendeu nos primeiros toques.


Confesso que o tolerava porque, até hoje, ele estava fazendo um bom
trabalho à frente do departamento de contabilidade, embora me desgostasse
profundamente o fato dele ousar criticar o corpo dela para ela. Por mais que
Adelle dissesse que não se incomodava, eu sim, sem saber o porquê. Tá,
talvez eu soubesse, pois o contador também se encontra na fila dos rejeitados
por ela. E o imbecil provavelmente a criticava por não aceitar a rejeição.
Tolo.

— Senhor Della Torre? — A voz nervosa do homem ecoou pelo alto-


falante do carro e seu tom me indicava tudo o que eu precisava saber.

— Que merda foi essa? — Falei o mais frio que pude e o ouvi
engolindo em seco. — Não posso admitir erros dessa magnitude, muito
menos passar tal constrangimento perante meus sócios ao enviar uma
planilha com dados que não batem. — Rosnei. — E eu odeio que me façam
passar por idiota.

— Peço desculpas, senhor. Estamos trabalhando freneticamente para


refazer os cálculos, e até às sete enviaremos o documento correto. —
Hesitou. — Já repreendi Mindy severamente por isso…

— Era dever seu ter revisado antes — cortei-o, enquanto aumentava a


velocidade do meu Porsche, aproveitando que o tráfego milagrosamente
estava menos intenso na ponte. — Ainda vou decidir o que farei com vocês
dois.

— Senhor…

— Quero que envie a planilha no meu e-mail até as seis. — Ordenei,


para depois apertar um botão no painel, encerrando a ligação.

Não precisava ouvir desculpas esfarrapadas. Washington sabia muito


bem para quem trabalhava e que pouca coisa na vida me era tão importante
quanto a minha imagem e poder frente aos outros, ainda mais perante a
homens tão importantes quanto eu. Não sabia ao certo o que faria, e, sem me
dar conta, me questionei o que Adelle sugeriria. Eu quase pude ouvir a voz
suave e doce dela dizendo que essas coisas aconteciam e que toda a equipe do
departamento contábil estaria debruçada sobre a planilha para corrigi-lo,
embora seu tom me revelaria que não era uma defesa dos funcionários. Se
absteria de qualquer comentário de cunho pessoal, principalmente sobre o
meu ego ferido. Diferentemente de mim, antes de agir, ela ponderaria sobre o
conjunto, não apenas em cima de um único erro. Nesse sentido, ela era muito
mais racional do que eu…

Cazzo! Balancei a cabeça em negativa sentindo as têmporas pulsarem,


me indicando que em breve a enxaqueca seria minha companheira.

Sem que eu quisesse, um suspiro involuntário escapou pelos meus


lábios.
Merda!

***

Estava exausto! A última reunião do dia tinha exaurido todas as


minhas forças restantes. Minha cabeça estava prestes a explodir, e nem
mesmo o analgésico mitigou um pouco a dor. Adelle não tinha voltado a me
ligar como disse que faria, e presumi que William podia ter tido alguma
piora. Mesmo não querendo, senti uma pontinha de preocupação, porém não
iria incomodá-la. Contudo, para minha surpresa, no horário vago entre as
reuniões, minha secretária tinha mandado entregar o rosbife do meu
restaurante favorito, na certa tentando facilitar a minha vida, além de um
pedaço de brownie de chocolate amargo, que instantaneamente me lembrou
dela. O seu cheiro. Sua pele.

Será que Adelle era tão sedosa quanto o chocolate mais puro?

Contive o gemido ao pensar nela enquanto a água quente deslizava


pelo meu corpo, sentindo meus músculos cansados relaxarem. Hoje não me
aliviaria com as mãos ao fantasiar com ela nua e seus cabelos soltos no meu
escritório em cima da minha mesa, o que vem acontecendo com bastante
frequência. Adelle era a minha maior perversão. E eu queria e muito senti-la
e desvirtuá-la. Sentindo meu pênis crescer quando várias depravações
passaram pela minha mente, fechei o registro e sequei-me em uma toalha
felpuda, para depois colocar um short, sentindo um alívio por não precisar
usar nada além dele.

Estava inquieto, embora cansado, então peguei meu aparelho celular


em cima do móvel de cabeceira e, sem pensar muito, joguei-me na minha
king, ajeitando-me. Sentindo minha ereção aos poucos diminuindo, pus a
olhar algumas notícias dos principais jornais de economia do mundo,
principalmente do mercado financeiro. Era quase que um hobby que eu tinha
antes de dormir, isso para não dizer que eu era um maldito viciado em
trabalho e que minha vida girava quase que só em torno disso. Estava lendo
uma notícia sobre a queda do mercado imobiliário novaiorquino quando o
nome da minha secretária apareceu no visor fazendo-me franzir o cenho. Era
quase meia noite, tarde demais para que ela me ligasse. Será que aconteceu
alguma coisa? Uma sensação que nunca senti antes me invadiu, porém tratei
de ignorá-la.

— Adelle? — Minha voz saiu completamente rouca e eu me odiei por


isso. — Tudo bem?

— Está sim — ouvi um farfalhar do outro lado da linha e imaginei


que, como eu, ela poderia estar deitada na cama. Tal pensamento fez com que
o meu corpo todo entrasse em alerta, e eu contive o gemido quando minha
mente fértil começou a criar uma série de imagens lascivas. Nunca poderia
sonhar que receber uma ligação pudesse me soar tão íntimo e deliciosamente
bom. — Desculpe a hora, Andrea, mas não conseguiria dormir sabendo que
fiquei de ligar e não o fiz. Ainda mais depois de sair daquela forma…

— Não tem problema, tesoro — forcei-me a dizer enquanto sentia um


arrepio percorrer a minha pele sem razão alguma. — Você estava ocupada
cuidando do seu irmãozinho… é natural.

— Eu sei, mas…

— Sem mais, mammina — repreendi-a suavemente. — Você não se


esqueceu de mim, completamente — lembrei-a do meu jantar.

— Eu sabia que você acabaria não jantando em meio aos relatórios e


reuniões. — Soltou um suspiro. — Você se esquece de tudo quando está
trabalhando… — Riu baixinho do próprio comentário. — E sua mãe puxaria
a minha orelha se eu não alimentasse o bambino dela.

— Hey — franzi o cenho —, agora você deu uma de vigiar-me para


ela, contando dos meus hábitos? — Soltei uma risada que me surpreendeu.

— Nem preciso, ela conhece o filho que tem… — Estalou a língua.


— Dona Ana só se preocupa com você, e como está longe, pede para eu ficar
de olho no seu bem-estar.

— Humph! — Uma pontada de culpa me invadiu por preocupar a


minha mamma[16], por mais que eu tivesse idade o suficiente para cuidar de
mim mesmo. Não podia negar que muitas vezes priorizava o trabalho, mas
não queria desgastá-la por isso. Ela era uma mulher muito zelosa, e saber que
ela pedia para a minha secretária estar atenta a isso, como se fosse uma
namorada atenciosa, era desconcertante. Namorada? Dio, de onde tirei essa
ideia? Minha mente, literalmente, parecia não estar mais funcionando.

— Como William está? — perguntei, externando minha preocupação


depois de um tempo em que ficamos em silêncio, onde pude ouvir sua
respiração suave e cadenciada.

— Um pouco melhor. Faz algumas horas que ele não precisa ir ao


banheiro com frequência. — Suspirou fundo, seu tom revelando-me toda a
sua preocupação e necessidade de desabafar. — Ele estava bastante inquieto,
ao contrário de ontem que parecia bastante cansado, e faz um pouco mais de
meia hora que foi dormir.

— Ele vai ficar bem… — Não sabia o que dizer, e duvidava que
tivesse algo que pudesse oferecer alento.

— Assim eu espero. — Fez uma pausa. — Nem pude te agradecer


corretamente por seu auxílio. Não sei o que teria feito sem você naquela hora.
Obrigada, Andrea — sussurrou meu nome com tanta doçura que me arrepiei
por inteiro.

Engoli em seco, ignorando a reação do meu corpo.

— Você teria conseguido do mesmo modo. — Minha voz saiu


irreconhecível até para os meus próprios ouvidos.

— Mesmo assim, sou bastante grata por isso. Principalmente por você
me fazer reagir.

— Hum…Duvido que você irá me agradecer quando vir a pilha de


trabalho a ser feito.

A gargalhada baixa dela ecoou dentro do meu peito e eu remexi na


cama, me sentindo inquieto.

— Certo. Por falar nisso, preciso do meu HD externo e notebook para


que eu possa…

— Assim que chegar no escritório, mandarei um motoboy entregar no


seu endereço.

— Okay — murmurou. — Agora deixarei você descansar, Andrea, já


que precisa acordar ainda mais cedo do que de costume. Desculpe pela
ligação…

— Sem problemas… — Por um momento, desejei que não


estivéssemos nos despedindo, para que eu pudesse continuar ouvindo sua voz
sonolenta, que, ao mesmo tempo, que me despertava, me fazia relaxar como
nenhuma outra coisa antes. Porém, balançando a cabeça, forcei-me a dizer:
— Boa noite, Adelle.

— Boa noite, Andrea, e obrigada.

Sem dizer mais nada, ela desligou a chamada e por poucos segundos
senti o vazio me preencher. Fiquei olhando para o aparelho na mão e, depois
de travá-lo, coloquei-o em cima da mesa de cabeceira. Esquecendo-me das
notícias que eu tanto apreciava, apaguei as luzes e fitei o quarto escuro pelo
que me pareceu longos minutos enquanto repassava a breve conversa. E foi
com a risada e a voz de Adelle ecoando na minha mente que me permiti,
pouco a pouco, a sucumbir ao sono e ao cansaço.
Capítulo Dez

O resto da semana passou como um vendaval enquanto conciliava os


cuidados do meu irmão com o home office. Mal piscava e um turbilhão de
coisas apareciam para serem resolvidas, inclusive sobre a inesperada
mudança de função, para não dizer rebaixamento de cargo, de Washington e
Mindy, pois coube a mim comunicar ao chefe do RH, amigo de ambos, que
tomou as dores deles, fato que exigiu bastante tato e paciência da minha
parte.

Mas o que importava para mim era que o meu irmãozinho se sentia
bem melhor e pôde voltar a sua rotina. Embora ainda não parecesse estar cem
por cento recuperado, podia ver mais animação em seu semblante quando o
deixava na escola e buscava, diferentemente daquele fatídico dia.
Provavelmente a dor de barriga foi realmente causada pela calda de chocolate
que tinha dado a ele.

E também, para minha felicidade, se é que poderia chamar assim, ter


voltado para o escritório. Diferentemente de Andrea, que conseguia trabalhar
em qualquer lugar do mundo, definitivamente, eu era uma pessoa que
precisava separar o ambiente de trabalho e pessoal. Então tive que me
desdobrar, principalmente no fim de semana, para dar conta de tudo,
principalmente organizar todos os aspectos da viagem de Andrea, o que
incluía desmarcar e reagendar reuniões. E ouvir por minutos o Senhor Tahiro
reclamar que o magnata não poderia conceder a ele uma nova entrevista na
semana. Não, não tinha desligado na cara dele como meu chefe o tinha feito
anteriormente, eu me demitiria antes de fazer tal coisa.

Beberiquei meu iogurte enquanto finalizava a redação de um e-mail


que precisava encaminhar para o setor de marketing, enviando-o a seguir com
uma cópia para Andrea, que provavelmente nem olharia. Faltavam poucas
horas para terminar o expediente e para buscar meu mocinho na escola.
Estranhamente tudo estava mais calmo depois que Andrea viajou, e como
tinha um tempinho livre, decidi finalizar o trabalho extra que ele tinha me
passado e encaminhar para ele, já que por conta de Will, não consegui
terminar no prazo estipulado. Só esperava que a calmaria não precedesse a
tempestade.
Tomei o resto da minha bebida e joguei o recipiente fora, repassando
meus apontamentos e as informações que achava de maior relevância.
Claramente o maior problema da empresa envolvia a parte administrativa e
contábil, demandando que Andrea substituísse todos os integrantes desses
departamentos sem exceção, ainda mais por não podermos vivenciar
cotidianamente na companhia. Ele precisava de uma pessoa de confiança e
seria interessante colocar alguém na liderança que já estivesse acostumado
com sua forma de conduzir os negócios. Podia pensar em um ou dois nomes
que seriam interessantes e que não ocupavam cargos de tanto destaque assim,
porém quem era eu para sugerir algo dessa magnitude. Além disso, era algo
totalmente fora da minha alçada e competência, além de que caberia a ele
defini-lo com o RH.

Revisando tudo novamente e me dando por satisfeita, encaminhei


para o e-mail pessoal de Andrea, soltando um suspiro por ter conseguido
terminar o mais rápido e o melhor possível, o que significavam uns dólares a
mais no meu orçamento.

Pensando nele, olhei para o relógio do computador, constatando que


estava alguns minutos atrasada, o que significava pegar um trânsito ainda
mais intenso para chegar na escola, intensificado pelo fato de que seria o
feriado do Memorial Day, em homenagem aos soldados da União que
morreram na Guerra Civil americana, com paradas militares e lojas todas
abertas, data que também marcava o início da temporada de verão.
Desligando meu computador, sem nem ao menos checar uma última vez
minha caixa de mensagem, peguei minha bolsa e tranquei a porta que dava
para todo o escritório, dando o expediente por encerrado. Estava distraída
dentro do elevador, até que as portas de metal se abriram e Washington
entrou, apertando o botão do andar inferior ao meu, com cara de poucos
amigos. Não o tinha visto desde que Andrea decidiu rebaixá-lo de cargo, o
motivo, não fazia ideia.

— Tem dedo seu nessa história, não é? — rosnou para mim e eu não
entendi tamanha hostilidade.

— Não entendi — murmurei enquanto olhava minha unha que estava


começando a descascar.

— O rebaixamento. Não sabia que você pudesse jogar tão baixo só


por causa de umas brincadeiras bobas que fiz com você… — Fez uma pausa
e eu o encarei. — Foi apenas um erro e rapidamente consertado.

— Não sei do que você está falando, Washington. — Dei de ombros,


doida para sair dali. Mas o elevador parecia mais lento do que o normal e
nunca chegava ao andar do estacionamento.

— Não se faça de sonsa, Adelle. Eu e Mindy achamos que você usou


sua influência com o todo poderoso só para me prejudicar e por nada…
Porra, era apenas um erro idiota!

— Primeiro, eu não fiz nada — suspirei fundo, não me rebaixaria ao


nível dele —, segundo, continuo sem saber que erro foi esse. Terceiro, você
trabalha aqui tempo o suficiente para saber que ninguém influencia o senhor
Della Torre, ainda mais eu, uma mera funcionária. — Pausei, e para minha
felicidade era o andar subterrâneo que eu desceria. — Por último, nunca mais
jogue suas merdas e erros para cima de mim — finalizei, deixando o elevador
que tinha se tornado sufocante.

A vida estava boa demais para ser verdade, mas não iria me deixar
abalar por aquele absurdo sem sentido. Tinha um feriado inteiro pela frente,
apesar de estar sempre a postos caso Andrea precisasse de mim. Além disso,
tinha prometido a William que faríamos a noite de cinema e sanduíche, sua
programação favorita, e tinha que admitir que a minha também. Adorava
nossos momentos irmãos, repleto de gargalhadas e diversão.

Entrando no meu veículo, que agora funcionava maravilhosamente


bem com as trocas de fusíveis - motivo pela qual meu carro tinha me deixado
na mão -, pus-me a enfrentar o trânsito, ligando uma música country num
volume bem alto, nada NY, abafando o barulho das buzinas ao meu redor.

***

— Del? — Ouvi uma voz me chamando e acreditei que estava


sonhando. Remexi na cama e continuei a dormir, já que meu irmãozinho
nunca acordava mais cedo do que eu. Principalmente em um domingo.

— Hm…

— Del? — chamou-me mais alto, com um tom choroso, e dessa vez


senti mãos pequenas tentando me sacudir. — Tá doendo, Del.

Essa última frase fez com que eu abrisse os olhos de súbito e desse
um saltinho na cama, assustada. Acendendo a luz no interruptor que ficava
próximo a minha cama, encarei o menininho a minha frente, que tinha uma
expressão de dor em suas feições, seus lábios formando um biquinho trêmulo.
Isso fez com que uma sensação de alerta me invadisse mesmo que estivesse
sob o torpor do sono.

— Dói, Del — choramingou e pude ver uma lágrima escorrer pelo seu
rostinho, seguida de outras. Seus lábios tremiam, fazendo com que meu
coração se apertasse instantaneamente.

— Aonde, querido? — Ajeitando-me na cama, suspirando fundo,


tentando controlar o pânico que queria me invadir, e passei a mão no seu
rostinho molhado, procurando acalmá-lo.

— Aqui — apontou para a barriguinha. — Dói muito, Del.

— Vou te dar um remedinho.

Tentei me controlar, pois sucumbir ao medo em nada me ajudaria,


ainda mais estando sozinha. Não poderia me dar a esse luxo.

William já tinha sentido algumas vezes essa mesma dor, que


normalmente vinha acompanhada de outros sintomas. Quando levei ele ao
pediatra, a médica disse que eram apenas gases, que eu não deveria me
preocupar tanto. Mas Will nunca tinha se sentido mal com essa recorrência,
então precisei me segurar para não sair correndo com ele como uma louca até
a clínica que eu costumava levá-lo.

Levantando da cama, estiquei um pouco o corpo e, calçando os


chinelos, aproximei-me dele e constatei que ele também estava um pouco
febril, o que me preocupou ainda mais.

O peguei no colo sem me importar que meus braços ficariam todos


doloridos depois. Isso fazia parte de ser responsável por uma criança.
Consolei-o da maneira que pude enquanto caminhava pelo pequeno corredor,
com ele choramingando, até que o coloquei no banco alto da ilha.

— Não, Del. Não me solta. — Seus bracinhos se agarraram ao meu


pescoço, não me deixando afastar.

— Só por alguns minutinhos, está bom? — Afastei-o suavemente e


ele resmungou, mas acabou concordando e colocou a mão na barriguinha.

Ignorando o molhado da minha camiseta pelas lágrimas dele e o


aperto no peito por vê-lo sentir dor, dei a medicação a ele, tanto para a febre
quanto para os gases, e ele soltou um som de desagrado pelo gosto amargo de
ambos os medicamentos, por mais que eles fossem adaptados ao paladar
infantil.

Coloquei também água para ferver, iria preparar um chá de erva doce
que era bom para diminuir um pouco os gases e a cólica que ele poderia estar
sentindo.

— Ah não, Del. Chá não — sua voz fraquinha ecoou pela cozinha
quando o cheiro da infusão tomou o ambiente.

— Vou adoçar com um pouquinho de mel — tentei convencê-lo,


porém pela sua careta percebi que falhei miseravelmente.

— Só se você tomar também… — Fez uma pausa. — Ai! — Soltou


um gritinho e começou a chorar, com manha, e eu o senti no fundo da alma.

Sem que me desse conta, desliguei o fogo e deixei esfriar um pouco a


bebida. Dando a volta no balcão, aproximei-me dele e o peguei no colo
novamente e o levei até a sala, ligando a tv em um canal infantil, esperando
que o desenho tirasse um pouco do seu foco enquanto o antigases fazia efeito,
bem como o analgésico. Da última vez que isso aconteceu, demorou um
pouco mais de uma hora para aliviar. Pousando-o no sofá, ajeitei-me ao seu
lado e o puxei para o meu colo, levantando um pouco a blusa do seu pijama a
fim de massagear a região da barriga que parecia um pouco inchada.

— Não, Del — remexeu-se, inquieto, e eu afastei as minhas mãos. —


Está doendo mais assim…

— Tá bom, querido. — Soltei um suspiro sofrido e acariciei os


pequenos cachinhos dele, seus olhos verdes ainda lacrimejavam. — Olha só,
Will, vai começar o seu desenho favorito. — Gemeu e fez um barulhinho
desanimado e eu quis me encolher, mas me mantive firme.

Depois de passados alguns minutos, ele parecia ter se acalmado um


pouco, ao menos as lágrimas cessaram por completo, então levantei para
buscar o chá que deveria estar um pouco mais frio. Em uma bandeja, servi
duas canecas e coloquei algumas torradas para acompanhar, apesar de
faltarem ainda algumas horas para o café da manhã. Colocando-o na mesinha
de centro, ajudei Will a se acomodar sentado no sofá, e pegando sua xícara,
levei-a aos seus lábios, que se recusaram a beber.

— Não — balançou a cabeça.

— Sim — minha voz foi firme, embora por dentro morresse um


pouco por forçá-lo a tomar o chá. — Vai te fazer bem.

Mesmo a contragosto, tomou pequenos goles até que, comigo


insistindo, tomou o que achei suficiente enquanto eu fazia o mesmo.

— Quer uma torradinha?


— Tô sem fome — murmurou baixinho.

— Certo.

Depois de colocar os recipientes no lava-louças, voltei para perto do


meu irmãozinho e vi que seus olhinhos estavam fechados, seus lábios e corpo
tremiam ligeiramente e ele estava encolhido em posição fetal. Quando toquei
sua testinha, percebi que ao invés de abaixar, ele continuava com febre.

Merda!

Acordando-o gentilmente, dei um banho morno nele, porém, uma


hora depois, ao checar o termômetro, percebi que de nada tinha adiantado.
Sentindo-me à beira de um ataque de pânico, com o coração batendo apertado
no peito por saber que tinha algo de errado com ele, respirei fundo várias
vezes enquanto me ajeitava minimamente. Vestindo algo mais apropriado,
peguei meu irmãozinho, que resmungava e ainda parecia sentir dor, no colo,
enquanto trancava o apartamento e equilibrava a minha bolsa no ombro.

Não esperaria mais nenhum minuto, o levaria na emergência da


clínica pediátrica 24 horas, sem me importar com mais nada, nem com o fato
de ser domingo.
Capítulo Onze

— William Beckett — a técnica de enfermagem me chamou e eu


suspirei aliviada. Os gemidos e o choro baixinho de Will pouco a pouco me
matavam por dentro, os minutos de espera pareciam se tornar horas para
mim, ainda mais com a emergência lotada. Odiava vê-lo sentir dor e não
poder fazer nada, assistindo seu sofrimento impotente. Tentei distraí-lo com
um joguinho no celular, vídeos de canais infantis, mas nada o conseguia.

Olhei para a mulher de sorriso bondoso e levantei-me, fazendo com


que ela anotasse algo na prancheta.
— Siga-me.

— Vamos — disse para o menininho quando ajeitei minha bolsa no


ombro e estendi a mão para ele, que ignorou.

Respirando fundo, peguei ele no colo enquanto Will emitia alguns


barulhinhos de dor, e segui a mulher pelo corredor branco até chegar ao
consultório, que gentilmente abriu a porta para mim.

— Obrigada — disse em uma mistura de gratidão e cansaço.

— Não tem de quê. — Deu um sorriso. — Aguarde um pouco, que a


doutora Shutz só foi ao banheiro.

— Claro.

Assentindo, a mulher lançou-me um último olhar antes de fechar a


porta atrás de si. Aproximei-me da mesa e quando ia colocar William sentado
numa das cadeiras, ele choramingou.

— Não, Del. — Segurou meu pescoço com força e choramingou. —


Não me solta. — Sua voz fraquinha me matava por dentro, porém não iria
ceder completamente

— Shiu. — Com uma mão, soltei as suas mãozinhas e, deslizando seu


corpinho, fiz ele se sentar para fazer o mesmo na cadeira ao lado dele. —
Estou aqui, está bem?

Passei a mão no rostinho molhado pelas lágrimas, sentindo-o um


pouco quente, e plantei um beijo em seus cabelos.

— Tá doendo muito… — resmungou.


— A médica está vindo — sussurrei e peguei suas mãozinhas entre as
minhas. — Vai passar — disse quase que para mim mesma.

Não demorou muito e a doutora Shutz, uma mulher de


aproximadamente cinquenta anos e com um semblante sereno, entrou no
consultório carregando uma garrafa de água.

— Bom dia — disse a médica ao sentar-se de frente ao computador e


olhar a ficha do meu irmãozinho que tinha feito na recepção. — Em que
posso ajudar esse mocinho, senhorita Beckett?

Sua voz calma me ofereceu certo conforto, pois pude ver que ela não
era aquele tipo de profissional que costumava escarnecer das possíveis
dúvidas que uma mãe ou um pai teria, ou que trataria com desdém nosso
desespero. Infelizmente tinham pediatras que deveriam ter escolhido outra
área de atuação, tamanho descaso.

— Tá doendo — meu irmãozinho respondeu choroso e apontou para a


própria barriga.

— Certo. — Ela digitou algo no computador. — Começou quando?


— A mulher perguntou para mim.

— Mais cedo. William também está um pouco febril. — Fiz uma


pequena pausa. — Como ele já sentiu algo parecido, pensei que eram apenas
gases, então o mediquei.

Falei os nomes dos remédios que dei a ele e a médica assentiu, sem
me recriminar por ter automedicado o menininho. Contei também sobre o
pequeno mal-estar que Will sentiu na semana passada e ela registrou no
computador.

— Quando foi a última vez que ele fez exames de sangue, urina e
fezes? — perguntou clinicamente.

— Faz uns três meses, doutora.

— Alguma anormalidade?

— Não, não.

— Okay. — Digitou algo no teclado. — Vamos examiná-lo, está bem,


garotão? — Pegou o estetoscópio de um estojo, colocando-o ao redor do
pescoço e calçou um par de luvas de látex, se levantando.

Mesmo a contragosto, William deu um pequeno salto na cadeira e eu


me ergui, pegando-o no colo e o sentei na maca coberta por um papel
descartável. Quando me afastei um pouco para não atrapalhar a médica, Will
soltou um protesto.

— Pode ficar.

— Obrigada, doutora.

Pedindo licença, a médica auscultou o peito e as costas de William,


constatando que não tinha nenhum chiado anormal, e usando um palito de
picolé, olhou a garganta pelo otoscópio e depois os ouvidos, em um exame
geral.

— Tudo certo por enquanto. Agora vamos olhar essa barriguinha e


resolver logo esse problema — comentou tranquilamente. — Tire a camisa e
deite, por favor.
Ajudei um William irritadiço a remover a peça e o deitei suavemente
na maca, arrancando um gemido do meu irmão. Pedindo permissão a mim e a
ele, a médica começou a apalpar e dar leves apertões na barriga dele.

— Aiiii — meu irmão soltou um gritinho estridente quando a médica


tocou a região próxima ao umbigo dele.

— E aqui também dói? — Apertou o lado inferior direito do abdômen


dele.

— Dói muito. Ai, para. — Várias lágrimas surgiram dos seus


olhinhos verdes e meu coração pesou no peito.

A médica continuou o seu exame, acostumada a lidar com o choro


infantil, até dar-se por satisfeita, removendo as luvas e jogando-as fora.
Enquanto isso, ajudei Will a vestir a blusa e peguei-o no colo, confortando-o
da maneira que podia, como uma mãe faria com um filho.

— E então, doutora Shutz? — perguntei, ao sentar-me na cadeira com


o pequeno ainda agarrado a mim.

— Pelo local onde o paciente sente dor, e pela minha experiência,


creio que possa ser uma inflamação do apêndice, mas sem exame de sangue e
um ultrassom, não posso diagnosticá-lo corretamente.

Fez uma pausa e escreveu algo no computador, seu semblante um


pouco preocupado foi como uma adaga afiada cravejada no meu peito. Tinha
ouvido falar que a apendicite era algo muito doloroso e que se não fosse feita
uma cirurgia, que era bastante onerosa, para retirar o órgão, o caso poderia
até se tornar fatal se esse se rompesse. E pensar nessa possibilidade, mesmo
que remota, fez com que meu coração desse um salto no peito e tive que
conter o pânico que quis se assomar dentro de mim. Não, isso não iria
acontecer, eu daria minha vida e até mesmo faria um pacto com o capeta para
garantir que William ficasse bem.

Com esse pensamento, respirei fundo e tentei não revelar meu pavor
ao meu irmãozinho, que já estava sofrendo.

— Até mesmo com os exames em mão é difícil afirmá-lo cem por


cento, então encaminharei ele para o nosso laboratório de urgência —
continuou e olhou para mim.

— E a dor de barriga? — perguntei quando a possibilidade de que eu


poderia ter procurado o médico antes, diminuindo o sofrimento dele, passou
pela minha cabeça.

— Provavelmente foi apenas a comida que fez mal, pois a apendicite


pode causar prisão de ventre e não o contrário. Nos últimos dias ele tem ido
ao banheiro regularmente?

— Sim.

— Certo.

— Ele precisará de cirurgia urgentemente? Digo, de um dia para o


outro. — externei minha preocupação ao recordar de um caso de uma
conhecida, que fez o procedimento de urgência.

Um brilho cruzou o olhar da médica e a expressão, antes gentil e


carinhosa, foi substituída por uma impassível. Um sinal de alerta percorreu
meu corpo, arrepiando meus pelos. Devem ser apenas os meus nervos em
estado caótico vendo coisas onde não existiam, disse para mim mesma
tentando me controlar. A doutora estava sendo tão atenciosa que esse meu
receio era infundado.

— Dependendo, se for um caso mais leve em um estágio inicial, os


antibióticos poderão ser suficientes. — Falou em tom gentil, sua expressão
carinhosa me indicava que tinha sido uma mera impressão da minha mente
conturbada. — Ministraremos o medicamento primeiro se confirmado o
diagnóstico, mas deixaremos a cirurgia marcada. Vou te passar o contato de
um colega meu que é um excelente cirurgião.

Franzi o cenho com sua última fala, uma dúvida se assomando a


minha mente. O tratamento estava me parecendo bastante ambíguo.

— Se esse for hipoteticamente o caso, doutora Shutz, por que já


preciso marcar a cirurgia?

— É só uma precaução, querida. — Deu um sorriso.

— Entendo, doutora. — Internamente, pedi aos céus que, no caso


dele, não precisasse fazer uma cirurgia de emergência, mesmo que não
estivesse cem por cento convencida da fala dela. Por mais que várias outras
crianças já tivessem passado pelo procedimento, sabia o quão difícil era para
os pequenos e os seus acompanhantes, tanto o durante e o pós-operatório.
Nenhuma criança deveria passar por isso e meu coração doeu ao pensar que
meu irmão poderia ter que enfrentar algo do tipo.

— Mas não se preocupe, eu farei todo o acompanhamento necessário,


por skype e presencialmente.
— Obrigada.

— Mas agora deixe-me encaminhá-lo para fazer os exames. A nossa


clínica oferece todos eles. Ele tem algum seguro de saúde que cobre as
despesas médicas? Por exemplo, para a cirurgia, você tem que pagar as
despesas básicas antecipadas.

— Não sei se cobre todas as despesas, mas dou meu jeito. — Contive
um tremor que percorreu o meu corpo.

Eu não ganhava mal, pelo contrário, meu salário era muito melhor do
que muitas secretárias recebiam por aí, porém pagando hipoteca, a escolinha
do meu irmão e algumas dívidas da minha mãe, não sobrava muito dinheiro.
Contudo, por sorte, a empresa que eu trabalhava oferecia um seguro saúde
que cobria alguns custos dos funcionários e familiares, não todos, mas alguns
exames e consultas. Mas eu sabia que não tinha cobertura para cirurgias desse
porte, então realmente tinha que começar a ver a possibilidade de pegar um
empréstimo. Pelo que ouvi falar, era inevitável não ficar um pouco cética
quanto ao tratamento somente com antibióticos se caso ele tivesse apendicite,
mas quem era eu para contestar uma médica?

Deu-me os papéis de encaminhamento e peguei com meus dedos


trêmulos.

— Receitei também um remédio que irá diminuir um pouco a febre,


você pode passar na enfermaria para ele tomá-lo. Qualquer coisa, estarei de
plantão o dia todo.

— Obrigada, doutora Shutz. — Sorri, não era todo o médico que dava
tanta atenção a um paciente.
— De nada, senhorita Beckett.

Colocando os encaminhamentos na bolsa, levantei-me com Will ainda


no colo, parecendo um pouco mais calmo pelo meu contato, e saí do
consultório depois que a mulher me falou onde ficava o laboratório. Estava
tirando forças não sei de onde para não sucumbir ao medo e preocupação.

***

O resto do dia tinha passado como um relâmpago e com ele toda a


minha esperança de descansar e curtir um pouco meu tempo livre com o meu
irmãozinho.

Eu estava devastada, por mais que tenha tentado me preparar para o


diagnóstico desfavorável, era inevitável não me sentir assim. Me custou
muito não chorar na frente dele quando na clínica, depois de William fazer
vários exames de urgência, a pediatra constatou que ele realmente estava com
apendicite em estágio inicial, sem perfuração, pústulas e abscessos. Depois de
medicá-lo por intravenosa por vinte e quatro horas, ela me garantiu várias
vezes que o tratamento com antibiótico seria o suficiente para combater a
leve irritação e não deixaria que inflamação evoluísse, combatendo as
bactérias. Mas eu ainda estava receosa e realmente não via tal como certo,
embora uma parcela de mim quisesse acreditar na médica, mesmo ela já
tendo deixada marcada a cirurgia. Afinal, ela era a especialista, eu só sabia
aquilo que as pessoas comumente falavam.

Agora, só me faltava o dinheiro, e eu sofria em pensar em não o ter


em mão quando a data chegasse, mesmo que não fosse necessário o
procedimento. Preferia pecar pela precaução do que chegar o momento e eu
não ter o recurso.
Capítulo Doze

Há dois dias que eu alternava entre cuidar de William, que parecia


reagir bem à medicação, e trabalhar de casa. Pelo menos ele não vinha
reclamando da dor intensa, apenas de alguns desconfortos que o deixava
irritado. A médica tinha me atentado que, se a dor persistisse, mesmo que a
medicação intravenosa tivesse dado algum resultado, eu teria que levá-lo
imediatamente ao hospital onde o cirurgião colega dela atuava.

Cansada, triste, preocupada e confusa, nem ao menos tive a coragem


de avisar diretamente a Andrea do fato, já que ele nunca ligava para o ramal
da empresa quando estava viajando, somente tinha notificado o departamento
de recursos humanos. Não sei por que omiti tal coisa dele, ainda mais que ele
foi tão solícito quando me deu aquela carona, mas me encontrava tão perdida,
sem apoio e sem norte, que decidi guardar o problema só para mim, embora
achasse que ele fosse bastante compreensivo. Além disso, Andrea tinha
outras preocupações para se envolver com os problemas familiares de uma
funcionária. Não cabia ao meu chefe oferecer o suporte e apoio emocional
que eu fazia de tudo para não desejar. Tinha aprendido, da maneira mais dura,
que eu teria que ser forte sozinha pelo meu irmãozinho…

Tive que me segurar para não desmoronar ainda mais quando comecei
a sondar com os bancos a possibilidade de financiamento para o
procedimento menos invasivo, que ele poderia precisar fazer e estava
marcado. Todos os pedidos negados pelas dívidas que eu já possuía e pela
pouca flexibilidade que eu tinha no meu orçamento como mulher solteira
com uma criança para cuidar. E eu precisava, mesmo que ele não fosse fazer
a cirurgia, pagar um sinal por ter alocado funcionários, sala e medicamentos.

Suspirei fundo olhando mais uma rejeição por parte de uma financeira
famosa da cidade, e não contive mais as lágrimas que se assomavam em
meus olhos, me sentindo derrotada, o cansaço pesando feito chumbo sobre
meus ombros mesmo que a necessidade da cirurgia não fosse uma certeza.
Não me importei com o fato do choro, pois não tinha ninguém mais para ver
meu sofrimento. Eram pouco mais de dez da noite e William já tinha ido
dormir fazia algum tempo.
— Deus, o que eu vou fazer? — disse em meio às lágrimas, soluçando
baixinho, o desespero me consumindo por dentro como o mais puro ácido.

Estava falhando em proteger e cuidar daquele que mais amava no


mundo. Por mais que eu tentasse fazer o meu melhor, trabalhando
exaustivamente, fazendo horas extras, meu esforço me parecia
completamente em vão. Tinha usado minhas economias para pagar os exames
complementares que a médica solicitou e a medicação que não eram cobertos
pelo seguro saúde. Pensar na minha impotência diante disso fez com que eu
chorasse ainda mais. Para muitos poderia parecer melodrama, mas em mim
doía e muito.

Não sei quanto tempo fiquei chorando em frente ao computador, só


sei que, em meio ao torpor das lágrimas, deixei que o cansaço e a tristeza me
dominassem e, fechando os olhos, dormi ali mesmo, em frente ao
computador.

***

Uma vibração e um ruído vindo de longe se infiltravam lentamente no


meu sono sem sonho, incomodando-me, tornando-se cada vez mais
estridente, fazendo minha cabeça pulsar. Por um momento ele cessou, mas
logo o barulho retomou e lentamente obriguei-me a abrir os olhos, para
identificar a origem do som, e ergui a cabeça, sentindo minha nuca doer pela
posição que tinha dormido, além de um incômodo nas costas e ombros. Um
pouco mais desperta, percebi que era o meu celular e peguei o aparelho que
tinha parado de tocar, olhando primeiro as horas e desativando o alarme que
em breve soaria. Embora tivesse dormido desconfortavelmente por algumas
horas, o cansaço ainda pesava sob minhas pálpebras. Constatei, segundos
depois, que tinha cerca de três ligações perdidas de Andrea.

Merda!

Eu não era obrigada a atendê-lo sempre, ainda mais fora do horário de


trabalho, e faltavam algumas horas para tal, mas como acordava sempre cedo
não via nenhum problema, ainda mais que eu precisava do emprego, e não
custava nada. Passando a mão na nuca para tentar aliviar um pouco o
problema muscular, retornei a chamada que foi atendida poucos toques
depois.

— Te acordei, Adelle? — Sua voz saiu mais desgostosa do que eu


poderia imaginar.

Mas não me martirizaria por isso, nem sei se era por não o ter
atendido. Tinha problemas mais reais para lidar do que o possível
descontentamento dele. Pensar na minha situação e nas negativas da
possibilidade de empréstimo, fez com que um aperto surgisse no peito e uma
ânsia de cair no choro me invadisse, porém não desmoronaria mais, não
agora, no telefone com o meu chefe.

— Não tem problema — forcei minha voz a ficar o mais neutra e


profissional possível —, em breve o despertador me acordaria, de qualquer
forma. Em que posso ajudá-lo?

Soltou um suspiro exasperado e eu franzi o cenho, não


compreendendo em absoluto o seu comportamento diante das minhas falas.
Talvez eu estivesse mais cansada do que imaginava e estava deixando algo
passar.
— Quero que você ligue para meu piloto particular e organize minha
viagem de volta — soltou, irritado. — De preferência que o voo parta o mais
breve, com a menor escala possível.

Um pouco atordoada, balancei a cabeça mesmo que ele não pudesse


ver e anotei em um bloco de papel, frisando a palavra urgente.

— Aconteceu algo, Andrea?

— Essa viagem foi uma perda de tempo — rosnou.

— Entendo…

Agora podia compreender o motivo de ele se encontrar tão irritadiço.


No mundo dele, todo minuto representava muito dinheiro e ele odiava mais
que tudo que o fizessem viajar por motivo fútil. E por um momento, mesmo
envolta com minha própria dor pelo sentimento pungente de ter fracassado
com a pessoa que mais amava, senti compaixão pela pessoa que fez Andrea
se deslocar até a vinícola da família. Com certeza ele tinha despejado toda a
sua fúria, isso se não tivesse feito coisa pior, como demiti-lo.

— Mais alguma coisa? — perguntei, depois de ficarmos alguns


segundos em silêncio.

— Quero que você me ligue assim que confirmar o horário e que


marque uma reunião com Bernard Jackson, vice-diretor de uma das empresas
que invisto no Canadá, para depois de amanhã. — Seu tom não deixava lugar
para questionamentos.

— Certo, algum assunto em específico?

Rabisquei o nome, que me era familiar pelos inúmeros relatórios que


passavam pela minha mão para serem organizados por ordem de prioridade
para Andrea, mas não consegui identificar onde ele trabalhava. Enviaria um
e-mail ao RH pedindo o contato do tal de Bernard.

— A transferência dele para a empresa de transporte marítimo.

— Okay. — Anotei rapidamente. — Quer que eu redija a pauta da


reunião e encaminhe um resumo com os principais pontos da empresa? —
Me antecipei em algo que ele poderia pedir, demonstrando iniciativa. Não
teria sobrevivido tanto tempo no cargo se eu não mostrasse proatividade, e
mesmo com todos os meus problemas, eu não me importava de trabalhar e
assumir tarefas.

— Eficiente como sempre, tesoro. — Sua voz saiu bem mais suave
dessa vez, como se fosse uma carícia, e não contive o arrepio que percorreu o
meu corpo, meus pelos se eriçando. Estava acostumada a ele me chamando
de várias coisas em italiano, inclusive de tesoro, mas nunca o seu tom me
pareceu tão íntimo, tão pessoal. Mas tratei de ignorar. Eu estava sensível
demais, vulnerável e cheia de problemas e ele furioso, uma combinação
perigosa para maus entendidos.

— Faz parte das minhas obrigações — soei o mais casual que pude,
enquanto passava para outra folha do bloco, rabiscando algumas palavras sem
sentido.

— Sei… — sussurrou com a voz rouca e baixa, e por um momento


imaginei que ele estava falando consigo mesmo.

Ficamos em silêncio por alguns segundos e quando ia dizer algo, ele


falou:
— Mais uma coisa, mammina…

Muitos, depois de um voo de mais de dez horas, certamente gostaria


de descansar, mas não Andrea, ainda mais quando estava irritado. Trabalhar
parecia o seu jeito de diminuir a tensão e a raiva.

— Sim, Andrea?

— Quero discutir pessoalmente com você os detalhes da empresa,


depois do expediente amanhã.

— Eu… — Não esperou eu terminar de falar e desligou a ligação,


fazendo eu soltar um suspiro e meu aparelho sobre a escrivaninha.

Não que, de qualquer forma, eu pudesse recusar as horas extras, mas


não dependia somente de mim. Tinha que ver se minha vizinha poderia
cuidar do William alguns dias para mim até que as coisas se acalmassem um
pouco depois do retorno do Andrea, para que eu ficasse no home office. Teria
que tirar licença não remunerada, conforme a legislação trabalhista americana
permitia, se Will necessitasse fazer a cirurgia e precisasse de cuidados pós-
operatórios.

Meu coração doeu ao pensar em como faria para pagar a operação se


o tratamento com antibióticos não funcionasse. Minha única opção era
continuar tentando encontrar algum banco ou financeira disposta a me
conceder um empréstimo com juros altos, alguma delas teria que aceitar.

Acabei perdendo o fôlego quando uma ideia insana cruzou os meus


pensamentos, uma a qual muitas pessoas acabavam recorrendo por não terem
alternativas e se sentirem completamente desesperadas para tal: contatar um
agiota e pedir empréstimo, se for preciso. Não sabia onde poderia encontrar
um, mas tinha ouvido falar de algumas lojas de penhores de fachada que, por
trás da suposta legalidade da atividade de penduro, ofereciam esse tipo de
“serviço”. Com certeza a senhorinha mais fofoqueira da rua poderia conhecer
ou ter ouvido alguém comentar sobre alguns desses lugares administrados por
gente perigosa, inclusive traficantes. Senti um calafrio e o suor banhando a
minha pele só em pensar que eu poderia me envolver com pessoas dessa
índole, que poderiam me machucar, mas se fosse necessário, eu o faria sem
pestanejar. Pensar no motivo pelo qual eu o faria algo assim me daria a
coragem necessária. Nada além do bem-estar de Will deveria me importar. E
eu faria de tudo para estar com os pagamentos e prazos em dia.

Com isso em mente, levantei da cadeira e me pus a caminhar em


direção a cozinha para tomar um relaxante muscular. Depois fui ao banheiro,
para um banho bem quente e demorado, torcendo que a água ajudasse a
dissipar um pouco minha tensão, um luxo que me daria já que hoje eu não
precisaria enfrentar o trânsito caótico até o centro de Manhattan. Aproveitaria
que William só acordaria daqui a algumas horas, o que normalmente
acontecia quando ele não tinha que ir para escola, e me colocaria para
trabalhar, acompanhada de uma bela xícara de café expresso.
Capítulo Treze

Eu sentia meu pulmão queimar à medida que o ar adentrava as minhas


vias respiratórias quando eu emergia na superfície, mas não parei de dar
braçadas e mover as pernas, sentindo a água morna da piscina aquecida em
contato com a minha pele. Quando cheguei do outro lado, girei o meu corpo
e, pegando impulso com os pés, pus-me a nadar de costas, aumentando ainda
mais a velocidade dos meus movimentos, gastando assim mais energia do
meu corpo. Tentava queimar a frustração e a raiva que sentia. Porém o
esporte que algumas vezes me ofereceu certo tipo de alívio em nada diminuía
minha fúria.
Tinha adiado o máximo de tempo que consegui essa viagem aos
vinhedos no sul da Itália herdados dos meus avós, tentando convencer o
playboy do meu irmão a fazê-lo no meu lugar, já que metade também era
dele, mas foi inútil. O idiota alegou que, como nossos pais, ele decidiu levar a
sua noiva para uma ilha paradisíaca e romântica, que ela precisava relaxar,
pois andava estressada com todos os preparativos do casamento do ano, que
contará com as pessoas mais ilustres de toda península. E nada me pareceu
mais fútil e ridículo do que isso. Eles estavam gastando uma soma
exorbitante para que empresas e cerimonialistas cuidassem de todo o
planejamento, então fazia mais sentido para mim trabalhar para pagá-lo.

Não teria Ana Della Torre que me impediria de esganar o meu irmão
se eu o visse na minha frente, por não ter ido pessoalmente ver os danos
causados em uma pequena parte da safra por uma praga que estava difícil de
controlar.

Embora o administrador fosse um homem experiente e que trabalhou


também para o meu avô quando este era vivo, o que sem dúvida me fez
hesitar em como proceder com o homem, estava em dúvida, mesmo com a
opinião dos técnicos qual o melhor caminho a ser adotado. Como tinha pouco
conhecimento em viticultura, algo que nunca tive tanta vontade de aprender,
precisei ficar mais tempo do que realmente gostaria percorrendo os vinhedos,
conversando com os técnicos e estudando com eles o assunto. A vinícola que
herdei não era o meu negócio mais lucrativo, então sentia que aquele tempo
eu poderia ter empregado em algo mais produtivo, e isso me deixava ainda
mais irritado e frustrado.
Mas diferentemente do meu irmão, não deixaria que o legado do meu
avô e o prestígio dos vinhos dos Della Torre ruísse por causa de uma praga.
Stronzo!

Dei mais uma volta na piscina, com a raiva ainda fluindo em minhas
veias, pois o exercício em nada estava me ajudando, e ao aproximar-me da
borda, com um impulso dos braços, saí da água, balançando meus cabelos
molhados.

Cazzo!

Minha exasperação se tornava ainda maior por causa de uma certa


mulher que invadia meus pensamentos com uma recorrência enervante,
fazendo-me perder minha concentração. Invadia meu sono apenas para me
fazer acordar com uma ereção dolorosa que somente arrefecia quando eu
levava a mão ao meu pênis e começava a me acariciar, aumentando o ritmo
que me tocava à medida que deixava-me levar pela imagem criada pela
minha mente de Adelle nua e completamente saciada em meus lençóis, como
se eu fosse um adolescente na puberdade. Ninguém foi capaz de causar
tamanho descontrole no meu corpo, obrigando-me a saciar-me eu mesmo,
fazendo-me gozar em meus dedos.

E ouvir a voz rouca e sonolenta dela uma hora atrás foi o meu
estopim.

Mandaria ao inferno minha determinação de não a ter antes que eu


executasse a minha vingança, pois podia ver com clareza que se eu não
extravasasse minha energia, matando de vez o meu desejo por ela, minha
frustração iria me sufocar. Poderia muito bem mantê-la como minha amante e
continuar focado nos meus objetivos. Eu podia ver nos seus gestos, mesmo
que ela tentasse esconder sob a sua fachada profissional, o quanto ela se
sentia atraída por mim. Várias vezes, quando estávamos juntos, a pegava me
observando com seus olhos verdes brilhando de desejo, dando-me a certeza
que nossa atração sexual era recíproca. Adelle também me queria…

E tinha o bônus de que, por ser extremamente profissional, mais do


que ninguém Adelle não iria me impor caprichos tolos, como a noiva do meu
irmão fazia com ele. Embora minha assistente fosse uma romântica, com
certeza ela não seria ingênua em acreditar que teríamos algo a mais além de
sexo, quando e onde nós queríamos. Eu nunca tive e nem teria um
relacionamento sério com ninguém e tampouco tinha algo para dar além de
dinheiro e presentes caros.

Nós dois saberíamos muito bem os limites da nossa relação, e eu


definiria quando terminaria e as regras, deixando-as bastante claras. Me
conhecia bem e sabia que uma única vez não seria suficiente. A insatisfação
que eu sentia por não ter Adelle era a prova viva disso, pois nunca tive isso
antes, e somente a minha secretária conseguiu se infiltrar dessa maneira em
mim, tomando meus pensamentos e minha hora de sono.

Nus, seríamos muito bons juntos, com certeza. A vez que a amparei
em meus braços era a prova viva disso. Não deveria ter guardado o incidente
corriqueiro na minha mente, mas vez ou outra a lembrança do fato de que o
seu corpo era perfeito contra o meu me invadia, atormentando-me e
enchendo-me de lascívia e luxúria.

Soltei um suspiro irritado e cerrei os dentes ao sentir uma ereção se


formar contra o tecido da minha sunga só com a lembrança, tamanho o meu
descontrole.

Sono un perfetto imbecille[17].

Como tinha dispensado quase todos os funcionários alocados na vila,


que ficava próxima ao vinhedo da família, restando apenas os homens
responsáveis pela segurança do local, ajeitei o meu pau enquanto caminhava
até o banheiro externo, que ficava próximo da área da piscina e que
funcionava também como uma espécie de spa.

Retirando minha sunga e jogando-a em um canto qualquer, adentrei


em uma espécie de chuveiro com sauna e, fechando o box de vidro, liguei o
sistema de sauna a vapor. Como Adelle demoraria para organizar minha volta
com o piloto, infelizmente não era só estalar os dedos para eu estar de volta a
Nova York, aproveitaria alguns minutos para relaxar. Embora uma pilha de
trabalho me esperasse para ser feito, vários relatórios no meu e-mail e na
nuvem a serem lidos, e meu plano a ser executado, o qual já iniciei
dispensando todos os funcionários de alto e médio escalão, como minha
secretária tinha sugerido, duvidava seriamente que eu conseguisse manter o
meu foco estando excitado dessa maneira. Atravessando a névoa de vapor
que já começava a se formar no ambiente fechado, sentei no banco de
madeira e joguei a cabeça para trás, apoiando-a contra a parede. Fechei os
olhos, tentando ignorar a minha ereção, concentrando-me em outros assuntos
de negócios.

Mas a minha mente tinha outros planos para mim e, mesmo eu não
querendo, meus pensamentos se voltavam para ela, como um maldito
obcecado que eu estava. Trinquei os dentes com força quando uma das
fotografias dela de biquíni verde, completamente comportado e malditamente
sexy, que ela postou nas redes sociais veio à minha mente, fazendo com que
meu pau ficasse ainda mais duro de desejo. Maldito foi o dia em que abri
meu perfil, em uma crise anormal de “curiosidade”, e resolvi acessar o dela
para ver se ela tinha fotos com algum namorado e deparei-me com a selfie
inocente que se tornou o combustível das minhas mais variadas fantasias. Por
mais imperfeita que ela se achasse, de fato seu corpo apresentava pequenas
celulites e estrias, na minha visão não diminuíam em nada sua beleza aos
meus olhos, pelo contrário, me sentia ainda mais atraído por ela. Suas curvas,
suas coxas grossas e sua pele morena exposta pelo traje de banho mexiam
completamente com a minha libido. Mas eram seus cabelos longos e
castanhos soltos sobre os ombros, os olhos verdes brilhantes e o sorriso suave
em seus lábios de aparência apetitosa e convidativa eram que roubavam
completamente a minha capacidade de raciocínio.

Maledizione[18]! Soltei um gemido involuntário e, sem que me desse


conta, ainda de olhos fechados, levei minha mão ao pênis em um gesto que se
tornava cada vez mais recorrente, e o apertei, sentindo uma gota de pré-gozo
sair pela ponta. Era impensável até mesmo para mim, que o grande magnata
Andrea Della Torre, que tinha o mundo aos seus pés, se dava prazer com as
próprias mãos pensando em uma funcionária.

Deixando de lado o grande absurdo da situação, deslizei lentamente


meus dedos por toda a extensão do meu pau e pus-me a imaginar que
estávamos no meu escritório em Nova York, em mais um dia normal de
trabalho, quando a mulher que dominava todas as minhas fantasias, enquanto
caminhava até a minha mesa, começou a desabotoar sua blusa social,
revelando-me o topo dos seus seios emoldurados pelo sutiã meia taça rendado
verde que contrastava com a cor dos seus olhos. Um leve sorriso pairava em
seus lábios pintados de um vermelho vivo, que prometiam vários prazeres, e
seus olhos verdes tinham um brilho travesso, arrancando outro gemido rouco
da minha garganta, tamanho desejo que sentia só de pensar na sua expressão
que era uma mistura de inocência e malícia.

Aproximando-se de mim, ela encostou sua boca em minha orelha


apenas para mordiscar o lóbulo enquanto suas mãos deslizavam pelos meus
ombros, peitoral, barriga até chegar ao cós da minha calça, abrindo o botão e
o zíper. Adentrando a mão em minha cueca boxer, deslizou os dedos por
minha carne, do mesmo modo que agora eu me acariciava, apalpando meu
volume suavemente, deixando-me ainda mais rígido ao toque. Em uma
carícia lenta e deliberada, que nada fazia para aplacar meu desejo, pelo
contrário, apenas alimentava minha ânsia e expectativa. Torturava-me, como
eu fazia comigo mesmo, não dando o alívio que o meu pau exigia. Eu era um
masoquista por querer prolongar o ato, mas gostava de imaginar Adelle
despertando todas essas sensações em mim que mexiam com o meu
autocontrole.

Ganhando mais coragem, na minha mente, ela afastou a mão do meu


pênis, e pediu que eu me afastasse e, sem questioná-la, eu empurrei a cadeira
para trás, deixando um espaço entre mim e a mesa. Para minha surpresa,
sorrindo para mim, seus olhos fixos nos meus, jogou os seus cabelos para trás
e se ajoelhou na minha frente. Fez um gesto para que eu me erguesse para ela
poder abaixar um pouco minha cueca e deixar minha ereção à mostra,
tomando-me entre seus dedos finos pintados com um esmalte escuro. Grunhi
algo indecifrável, rodeei meu pau com a mão, apertando-o com mais pressão
quando a vi se curvando na direção do meu membro, levando-o aos seus
lábios apenas para brincar com a minha glande com a ponta da sua língua,
enquanto seus dedos subiam e desciam pela minha extensão, masturbando-
me do mesmo modo que eu fazia, mas imaginar que era Adelle que me
tocava, intensificava ainda mais as sensações de prazer que percorriam o meu
corpo.

Enquanto nos movimentávamos, em um deslizar lento e torturante


com seus dentes raspando suavemente pela extensão da minha glande e
prepúcio, minha respiração ficava cada vez mais pesada pelas ondas de
vapores quentes produzidos pela sauna e pela excitação que crescia em meu
interior, levando-me cada vez mais longe na busca desenfreada pelo orgasmo.

Reclamei quando a vi tirar-me da sua boca e afastar seus dedos,


porém logo o rosnado foi substituído por um gemido de prazer quando, me
encarando com os olhos brilhando, parecendo gostar de me ver cada vez mais
rendido ao seu toque, ela percorreu com a língua todo o comprimento,
preguiçosamente, em uma nova forma de tortura bastante prazerosa, apenas
para fazer o caminho inverso, deixando um rastro úmido por onde tocava. A
imagem era forte e deliciosa o suficiente para fazer com que o meu corpo se
retorcesse contra a madeira do banco, meus pelos se arrepiando com o prazer
proporcionado. Dio, uma simples imagem criada pela minha mente era capaz
de arrebatar-me, fazendo-me reagir como nunca o tinha feito antes.

Mantendo meus olhos fechados com força, apliquei ainda mais


pressão e aumentei ainda mais a cadência dos meus movimentos quando sua
boca voltou a tomar meu membro, a umidade quente me envolvendo cada vez
mais fundo enquanto ela me provava sem ressalvas, sugando, lambendo,
fazendo com que eu chegasse cada vez mais próximo ao orgasmo. Gemidos e
ruídos incessantes escapavam da minha garganta e eu não conseguia mais
contê-los, e nem mais tentava, imerso cada vez mais no prazer que ela me
proporcionava. Na minha fantasia, imaginei que eu levava uma das minhas
mãos aos seus cabelos sedosos e, enrolando-os entre os meus dedos, passei a
ditar os movimentos que ela fazia, impondo cada vez mais velocidade e indo
cada vez mais fundo, mandando ao inferno o meu desejo de prolongar a
sensação.

Arfando e completamente à mercê do desejo e da minha imaginação


lasciva, continuei a percorrer minha extensão com os dedos, com cada vez
mais cadência, em um vai e vem frenético, até que um gemido gutural brotou
na minha garganta, revelando-me que eu tinha chegado lá. Mordi os meus
lábios com força para não gritar perante a sensação poderosa que me invadiu
e eu esvaí-me entre os meus dedos, sentindo meu corpo tremer com a onda
avassaladora do êxtase.
[19]
— Madre di Dio — blasfemei com a voz entrecortada, sem me
importar com o fato.

Nunca poderia imaginar que ao evocar tal imagem erótica da minha


secretária me tomando em sua boca dessa forma poderia me proporcionar
tamanha entrega e enlevo. Mal podia esperar pela realidade, pois meus
instintos e cada poro do meu corpo me diziam que seria ainda mais
arrebatador, proporcionando-me o alívio e o relaxamento perante toda
frustração e estresse que eu, inevitavelmente, sentia por gerir um grande
império e várias empresas conglomeradas por todo o mundo, além de outros
investimentos financeiros.

Sim, tornar Adelle minha amante seria a melhor escolha para acabar
de vez com a frustração sexual que sentia por não a ter. Não me deixei levar
novamente pelas minhas fantasias, pois como um insano, senti meu pau
começar a crescer novamente. Cielo[20].

Sentindo a determinação me invadir e os efeitos do êxtase diminuírem


pouco a pouco, levantei e com um gesto acionei o chuveiro e lavei as minhas
mãos sujas com o meu sêmen para depois desativar o sistema de sauna do
box, deixando que o vapor pouco a pouco fosse drenado do ambiente.

Tudo o que eu poderia fazer era tomar um banho, lavando os


resquícios dos meus momentos de luxúria. E depois, esperar uma ligação de
Adelle com o horário do meu voo, com os relatórios e documentos na nuvem,
momentaneamente, esquecidos.
Capítulo Quatorze

— Muito obrigada por cuidar dele, Ashley — a agradeci novamente


antes de pegar a minha bolsa que tinha deixado no aparador da casa dela.

— Não precisa agradecer, minha filha.

— Tem certeza que cuidar dele, nessas circunstâncias, não será um


problema para você? — Minha voz saiu um pouco hesitante. — Ainda mais
porque ficarei fora até tarde.

Mesmo que William aparentasse estar um pouco melhor, acredito que


pelos antibióticos, embora ainda sentisse um pouco de dor, não sei se estava
confiante no tratamento da médica, embora, aparentemente, eles estivessem
fazendo efeito. Confesso que não queria deixá-lo sabendo que ele não estava
totalmente recuperado, deixando a responsabilidade para outra pessoa para
cuidar dele. Como uma mãe desesperada, queria ter Will sempre na minha
vista, tendo sempre a garantia de que ele estava bem e de que nada
aconteceria quando ele não estivesse sob meu escrutínio.

— Ficaremos bem, não é mesmo, Will? — Ela deu um beijinho no


topo da cabeça do meu menininho e meu irmão assentiu. — Será ótimo
contar com um miniajudante para embalar as encomendas. — Sorriu para
mim, passando confiança.

— Eeeee — meu irmão soltou um gritinho como há alguns dias não


fazia. Ele amava mexer nas embalagens e nos produtos que Ashley vendia,
cheirando todos, mesmo que eu o repreendesse várias vezes por isso por ser
falta de educação.

— Ele não irá te atrapalhar? — Insisti.

— Claro que não — balançou a cabeça —, agora pare de enrolar e


inventar desculpas, ou você vai acabar se atrasando — repreendeu-me
suavemente em uma voz terna.

— Tá. — Fiz uma careta que a fez soltar uma gargalhada alta. —
Qualquer coisa me liga, ok?

— Não tenha dúvidas — se aproximou de mim e deu-me um beijo no


rosto —, te mandarei notícias e fotos.

— Obrigada! — Sorri para ela, que retribuiu. — Obedeça a Ashley,


viu?

— Tá, Del.

— E coma todos os vegetais e legumes que ela colocar no prato.

— Ah não, Del — resmungou e torceu as mãos na frente do corpinho


—, eu odeio legumes!

Arqueei a sobrancelha para ele que apenas assentiu, amuado, soltando


uma pequena reclamação infantil de que detestava brócolis.

— Vou garantir que ele coma tudo antes de ganhar um dos meus
famosos cookies — Ash comentou e meu irmãozinho pareceu mais favorável
a ideia de comer as tão odiadas leguminosas.

— Eu amooo cookies — Will comentou arrancando de nós uma


gargalhada.

— Tenho certeza que sim, meu Come-Come. Mas não abuse, só um.
— Fiz cócegas nele que se encolheu, rindo. Era assim que eu gostava de vê-
lo, sorrindo e brincalhão. — Agora tchau, antes que eu realmente me atrase
para bater o ponto.

Dei um beijo e um abraço apertado em William que durou vários


minutos, até que ele se desvencilhasse do meu toque e corresse para dentro
do apartamento de Ashley, em direção ao espaço que ela usava para trabalhar
e guardar seus produtos. Balançando a cabeça em negativa, dei um último
sorriso para a mulher mais velha que assim que dei alguns passos, fechou a
porta atrás de si. Soltei um suspiro e, ajeitando a minha postura, tentei manter
a fachada profissional que sempre tinha, aquela que nunca levava problemas
pessoais para o trabalho. Escondendo o medo, frustração, tristeza e
principalmente, o desespero que sentia por ainda não ter o dinheiro da
cirurgia de Will, caso ele precisasse, em mãos…

***

Era quase horário de almoço quando resolvi abrir meu e-mail pessoal
no celular, mesmo temendo fazê-lo, pois tinha medo de ver que a minha
solicitação tinha sido rejeitada por outro banco. E dito e feito, mais uma
financeira me enviava a resposta padrão de que infelizmente não tinham o
crédito disponível para empréstimo para mim, e quem sabe em um futuro o
teria. Sorte, se é que eu poderia chamar assim, era que estava sentada na
cadeira da copa, pois não sabia se minhas pernas me segurariam em pé
perante o tremor que percorreu o meu corpo. Meus olhos lacrimejaram,
porém, como tinha prometido a mim mesma que não choraria e que seria
forte, não deixei que caíssem. Eu tinha um plano B, e por mais perigoso que
fosse, eu o levaria a cabo sem pestanejar. Imersa em meus pensamentos,
tentando dizer a mim mesma que eu iria conseguir, que no fim, tudo daria
certo e que meu irmãozinho ficaria bem, ouvi passos se aproximando da
copa.

Olhei no meu relógio de pulso constatando que o voo de Andrea


deveria ter aterrissado e que ele veio direto do Aeroporto JFK para cá, talvez
passando em sua cobertura apenas para trocar a roupa amassada. Confesso
que estava completamente perdida com o fuso horário, então não sabia se
houve algum atraso ou não e, pela primeira vez, não tinha atentado para a
diferença existente, mas não me culparia por isso.
Suspirando fundo, dei leves batidas no meu rosto, fazendo com que
minhas bochechas ganhassem um pouco mais de cor e aprumei o meu corpo
na cadeira, tentando aparentar mais recomposta, ao mesmo tempo que
adotava um ar mais casual. Embora fosse egocêntrico e insensível ao
sentimento alheio, meu chefe, estranhamente e da maneira dele, preocupava-
se com meu bem-estar, então não queria que ele desconfiasse de algo. Por
quê? Não tinha ideia.

— Adelle? — Chamou-me com a voz rouca, que estranhamente fez


os pelos da minha nuca se arrepiarem. Céus, ultimamente andava mais
sensível do que imaginava para ficar reagindo dessa maneira ao tom que ele
usava. — Está aí?

— Na copa — forcei-me a dizer em voz neutra, ignorando todas as


sensações que estava sentindo.

Segundos depois, ele adentrou no recinto impecavelmente vestido,


com um terno escuro feito sob medida, a abotoadura de ouro se destacando
perante a cor sóbria. Sua barba estava um pouco mais comprida do que de
costume, e a pele bronzeada pelo sol da Itália deixava-o ainda mais bonito do
que já era. Porém era o brilho em seus olhos azuis que novamente fez com
que um calafrio me varresse. Era fome que via em seu olhar?

O pensamento de que aquele homem pudesse nutrir desejo por mim


fez com que uma pulsação surgisse no meio das minhas pernas, algo que não
me era recorrente. Embora eu fosse virgem, sentia desejo como qualquer
outra mulher, principalmente quando estava lendo meus livros eróticos a
noite no Kindle. Porém reagir dessa maneira a Andrea era completamente
absurdo, pois agora, mais do que nunca, precisava me manter no emprego. Eu
poderia me sentir atraída por qualquer um, menos pelo homem que eu era
diretamente subordinada. E por mais que pudesse ser mútuo, nada de bom
viria disso. Por mais que o magnata não fosse mulherengo, nesse tempo que
trabalhava para ele nunca tinha ouvido falar que Andrea tinha saído com
alguma mulher. Diferentemente dos outros diretores e executivos que
trabalhavam na corporação, ele nunca tinha delegado a secretária o papel de
comprar presentes para uma amante relegada de coração partido. Fora que,
quando meu chefe aparecia na mídia, era apenas na sessão de negócios,
nunca na parte de fofocas e escândalos. De toda forma, não era da minha
conta.

— Adelle? — disse meu nome preguiçosamente com seu sotaque


italiano, e saí do transe que eu estava. Mal tinha percebido que ele já estava
bem próximo a mim. — Algum problema quando estive fora, mammina? Está
dispersa hoje.

— Apenas não tomei a dose necessária de café que meu corpo exige
para funcionar direito — menti e ele arqueou uma sobrancelha, porém não
disse nada, apesar de que o relâmpago que cruzou seu olhar me indicava que
ele sabia muito bem a sensação que despertava em mim. Merda! Talvez eu
fosse mais legível do que gostaria. — E não aconteceu nada além daquilo que
te informei por telefone. Como foi o voo? — perguntei por educação.

— Tranquilo, apenas com algumas turbulências. — Fez uma pausa e


deu de ombros. — Deu para dormir bastante, confesso que mais do que eu
esperava conseguir.
— Isso é bom — sorri genuinamente para ele, pois até mesmo Andrea
precisava descansar por algumas horas. Pensei que ele iria ficar ocupado com
os relatórios boa parte do tempo, como comumente fazia.

— Se você diz…

Abriu um sorriso lentamente que teria deixado qualquer um de pernas


bambas, ainda bem que estava sentada. Ele deveria ser proibido de sorrir e
olhar para mim daquela maneira, como se fosse um predador perante a sua
presa, que no caso era eu. Não, meus pensamentos estavam indo longe
demais, criando-me peças. Fragilizada, talvez estivesse enxergando coisas
que não havia, buscando atenção, carinho e consolo, mesmo que físico, em
qualquer um. Em um homem frio e emocionalmente distante de todos,
inclusive de quem amava. Focado somente nos seus objetivos de alcançar
ainda mais poder e dinheiro.

— Já almoçou? — perguntou depois de um tempo em que ficamos em


silêncio, retirando o celular do bolso. — Estou pensando em pedir uma
comida no Asiate. Quer alguma coisa? Sei que você adora comida asiática e
chinesa.

Foi a minha vez de arquear a sobrancelha, para depois fazer uma


careta.

— Está muito além do que posso pagar — contive um suspiro que


brotou nos meus lábios ao lembrar da minha atual situação financeira.

— Não estou pedindo para você pagar a conta — soou arrogante e


grosseiro, em um tom que me dizia claramente que não aceitaria ser
contestado. Mandão, como sempre.
— Trouxe minha…

— Adelle — repreendeu-me suavemente.

— Um hamachi crudo está bom para mim. Obrigada.

Sorri e coloquei uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, gesto que
não passou despercebido por Andrea. Não podia negar que ter alguém atento
ao que eu gostava era bom, mesmo que não tivesse nenhum significado, pois,
afinal, meu chefe estava sendo apenas cordial, embora não tivesse nenhuma
obrigação de sê-lo.

— Vou pedir para entregarem aqui.

— Claro.

Mexeu no celular por alguns minutos e colocou-o no bolso da calça


social.

— Daqui duas horas você tem a reunião com o senhor Bernard.


Encaminhei ontem a pauta para ele, com os pontos que achei pertinentes
sobre a companhia de transporte. Quer que eu encaminhe para o seu e-mail
para você o ler antes de encontrá-lo?

— Não será necessário, tesoro — sussurrou com a voz arrastada e


rouca, o sotaque italiano parecendo mais sexy do que o de costume,
parecendo mais íntimo do que antes, como se contivesse as mais diversas
promessas, o que era completamente absurdo. Mas mesmo assim, tive que me
conter para não reagir a tal disparate. Estranhamente, a aura de camaradagem
que sempre nos envolvia, mesmo que sejamos patrão e empregada, parecia
ter se dissolvido completamente, dando lugar a uma tensão palpável, uma
energia que nos atraía mutuamente, impelindo-nos a algo que,
definitivamente, eu me arrependeria depois.

Sem dizer mais nada, sem deixar de me fitar com um brilho predador,
sentou-se à minha frente e me fitou por um bom tempo, como se conseguisse
invadir cada um dos meus pensamentos. Como eu não era uma pessoa que
fugia, elevei o meu queixo e não desviei meu olhar, porém fracassei no meu
intento segundos depois, pois o medo de expor-me era maior.

Meu celular vibrou em cima da mesa e eu o peguei com meus dedos


trêmulos, com medo de ser alguma notícia ruim, porém era apenas Ashley me
enviando uma foto do meu irmãozinho comendo um de seus famosos cookies
de gotas de chocolate, falando que ele tinha comido tudo aquilo que ela havia
preparado e que tudo estava bem com ele. A médica não tinha passado
nenhuma restrição alimentar, então acho que um biscoito não faria mal. Foi
impossível conter a onda de alívio momentâneo que eu senti, mesmo sabendo
que ele não estava completamente recuperado. Sem demora, pus-me a
responder a mulher, agradecendo-a.

Troquei mais algumas mensagens com Ashley e desliguei meu


aparelho, decidindo tomar as rédeas de pelo menos uma coisa da minha vida
e fazer o meu trabalho. Ainda demoraria um pouco mais de quarenta minutos
para a comida do restaurante badalado chegar, então poderia adiantar alguma
coisa que Andrea precisaria para mais tarde. De súbito, levantei-me, fazendo-
o sair do transe com que me fitava.

— Vamos trabalhar? — Peguei meu aparelho em cima da mesa. —


Podemos começar a discutir o que você está pensando para a empresa de
transportes marítimos. Se você quiser mesmo os contratos para o transporte
de milho para a China, é melhor iniciarmos logo.

— Okay, você está certa. — Assumiu a sua postura normalmente rude


e fria que tinha ao falar de negócios, porém, dessa vez, aparentava uma
postura ainda mais severa, como se punisse a si mesmo por algo que me fugia
à compreensão.

— Agendei algumas reuniões com os seus contatos do ramo para os


próximos dias, antes que você me pedisse.

Quando estava passando por ele, Andrea se levantou de súbito,


fazendo com que eu perdesse o equilíbrio nos meus saltos, mas antes que eu
me apoiasse em algo, meu chefe enlaçou minha cintura com força, me
puxando contra o seu corpo rígido e musculoso, que ficou tenso junto ao
meu. Sua respiração pareceu ficar cada vez mais pesada e entrecortada, seu
peitoral subindo e descendo chocava-se contra os meus seios, fazendo com
que um calor se formasse no meu ventre. O cheiro amadeirado do seu
perfume me inebriava.

Levantei meu rosto e fitei seus olhos azuis intensos, e sem saber como
reagir, mordi levemente meus lábios, acabando chamando a atenção dele, que
me olhava com uma intensidade de tirar o fôlego. Levei as mãos ao seu peito,
sentindo seu coração bater cada vez mais acelerado, e mesmo que eu quisesse
e muito ser beijada por ele, presa na teia sensual que nos unia, eu o empurrei
de leve, fazendo com que ele me soltasse e desse um passo para trás. Meu
corpo sentiu falta instantaneamente do seu, da sua mão que segurava com
força minha cintura, mas eu não podia ceder a aquele homem. Eu precisava
daquele emprego mais do que nunca, e se realmente minha única alternativa
fosse pegar dinheiro emprestado com agiotas, o necessitava ainda mais.

Sem dizer nenhuma palavra sobre o momento, Andrea apenas virou-


se para sair da copa, restando a mim apenas segui-lo, fingindo que nada tinha
acontecido e que o homem que ia na minha frente não me despertava
tamanho ardor e desejo.
Capítulo Quinze

Algo estava completamente errado com Adelle, apenas não sabia o


que era. Ela estava mais pálida. Mesmo usando maquiagem, podia perceber
olheiras se assomando sob seus olhos. E, Dio, a mulher ainda parecia bela aos
meus olhos, mesmo com a aparência cansada. Só o simples fato de poder a
olhar me deixava completamente aceso, fazendo-me devorá-la inteira com a
minha visão, observando cada detalhe do seu corpo E quando seu olhar me
percorreu, mesmo que por pouco tempo, apreciando-me, tive que conter um
gemido que quis brotar na minha garganta, a excitação correndo nas minhas
veias como lava quente. E precisei fazer um esforço sobre-humano para
conter a ereção que queria se formar nas minhas pernas. A corrente elétrica
que existia entre nós dois tinha sido palpável em todo o ambiente, deixando-
nos ainda mais conscientes um do outro.

Não mais resistindo, acabei a assustando deliberadamente, tomando-a


em meus braços da maneira que eu estava há tempos desejando, aplicando
força o suficiente para que seu corpo ficasse bem colado ao meu, fundindo-
nos. Seus olhos verdes brilhavam com desejo, provavelmente rivalizando
com os meus, o cheiro de chocolate da sua pele brincava com os meus
sentidos, deixando-me cada vez mais certo de que sermos amantes por um
tempo seria bastante benéfico para nós dois. Porém, quando ia beijá-la, algo
em sua expressão mudou completamente, o desejo se dissolvendo
completamente em uma expressão apática, não me restando outra alternativa
que não fosse soltá-la. Acabou revelando-me que algo estava acontecendo,
mas o que seria me escapava. Frustrado e sem saber como reagir com a súbita
rejeição, virei as costas como um menino mimado, ao invés do homem
controlado que eu era; por sorte, eu consegui me aprumar e agir com a frieza
costumeira.

Mas eu não desistiria de ter Adelle…

Porém o que me dava a certeza de que algo estava fora do lugar era o
fato da minha secretária não ter comido toda a comida que eu tinha comprado
para ela, comportamento pouco habitual e, principalmente, por ter se
recusado a experimentar algumas peças que pedi com salmão, polvo e
tamboril à moda asiática que tinha certeza de que ela apreciaria tanto quanto
eu. Mesmo que eu insistisse para que provasse um pouco, como ela sempre
acabava fazendo mesmo depois de relutar, por considerar isso inapropriado
para uma funcionária, dessa vez de nada adiantou.

Não deveria estar me sentindo incomodado com isso nem dado tanta
importância ao fato dela não o querer, mas me sentia. Compartilhar minha
comida com Adelle, ver o prazer cintilando em seus olhos ao conhecer novos
sabores, e ouvir o gemido de deleite escapar pelos seus lábios aumentava
ainda mais o ardor que eu sentia por ser eu a proporcionar essas experiências.
Dividir essa intimidade com ela era algo que não sabia que precisava até
agora. Mas não buscaria explicações para a ânsia que sentia, pelo contrário,
eu a massacrei como se não existisse. E a reunião com Bernard me ajudou a
afastar, momentaneamente, Adelle e o nosso quase beijo da minha mente.

***

Já era pouco mais de sete horas da noite e estávamos trabalhando há


algum tempo e, eu me pegava observando-a. Por mais que ela parecesse
focada na nossa pequena reunião, podia perceber que, em alguns momentos,
ela se dispersava, parecendo distante e tensa. Definitivamente, hoje não tinha
a mulher cem por cento centrada à minha frente, por mais que Adelle se
esforçasse para mostrar que sim. Algo estava acontecendo e eu descobriria
agora.

— Vamos fazer uma pequena pausa — ordenei com a voz rouca, e


levantei-me, encarando-a.

Adelle apenas assentiu e fez o mesmo, espreguiçando o seu corpo que


provavelmente estava dolorido por ficar debruçada sobre a mesa.

— Você se importa se eu tirar os sapatos? Eles estão me matando —


perguntou em um sussurro.

— Claro que não, faça o que deixar você mais confortável.

Para dar a ela mais segurança, levei a mão as abotoaduras do meu


terno, removendo-as e as colocando em cima da mesa, fazendo o mesmo com
o blazer a gravata que me sufocava, enquanto observava-a remover os
sapatos de bico fino e salto alto que a deixava completamente sexy. Não
costumava reparar nos sapatos que as mulheres normalmente usavam; para
mim, eram todos iguais, mas no que tangia a Adelle, eu reparava em cada
milímetro dela, nenhum detalhe me escapava. Minha mente parecia querer
guardar cada nuance da minha secretária. Sentindo um calor estranho no
peito, enrolei as mangas da minha camisa social nos antebraços e abri alguns
botões, e caminhei até um móvel de canto para me servir uma dose de
whisky, a fim de aliviar a tensão.

— Quer um pouco? — perguntei, enchendo o copo com uma dose da


bebida envelhecida e tomei-a de um gole, sentindo o ardor proporcionado
pelo álcool mais bem-vindo do que o calor que sentia no lado esquerdo do
tórax.

— Não, você sabe que odeio o sabor do líquido — comentou


suavemente. — Estou bem assim.

— Hmmm… — Dei de ombros.

Servi-me de mais uma dose e virei-me em sua direção, apenas para


encontrá-la próxima a enorme janela de vidro, com sua mão apoiada na
superfície, encarando a vista iluminada lá fora. Parecia distante, solitária, ao
mesmo tempo etérea.
Sem me aguentar mais, tomei toda a dose da bebida, pousando o copo
na mesinha, e caminhei até ela, tocando seus ombros com gentileza,
massageando o local. Ela não se virou, apenas ficou ali, observando. Curvei-
me em direção a sua nuca, sentindo o cheiro da sua pele ao inalar
profundamente, fazendo com que os pelinhos dela se arrepiassem. Dio, ela
era maravilhosa, deliciosa, minha perdição… O desejo que sentia por ela me
fazia perder completamente a sanidade e a capacidade de raciocinar. Eu era
um animal faminto louco para prová-la.

Ainda a tocando, aproximei minha boca do seu ouvido e sussurrei:

— O que foi, tesoro? — sussurrei com a voz rouca, e sem resistir,


mordisquei sua orelha, fazendo com que ela tremesse com o meu contato,
amaciando meu ego masculino, já que fui rejeitado mais cedo. — Pode me
falar o que está te incomodando…

Afaguei seus ombros e a virei para mim, encontrando seus olhos que
pareciam, pela primeira vez, uma incógnita para mim.

— Está tudo bem, mio cioccolato[21]? — pressionei-a. — Não tenha


medo de dizer…

Ela suspirou fundo e ergueu um pouco o queixo, parecendo criar


coragem, me indicando algo que provavelmente não gostaria de ouvir.

— Diga… — ordenei com a voz um pouco mais rude do que gostaria,


mas estava ficando impaciente.

— Preciso de dinheiro — soltou em um tom que nunca a ouvi usar


antes e, sem que me desse conta, dei um passo para trás e afastei minhas
mãos, recuando, porém minha palma ainda parecia queimar. — Eu… — não
conseguiu concluir sua frase.

Antes que pudesse analisar sua expressão, se virou novamente para a


janela, e passou os braços em torno do seu corpo, como se se abraçasse,
envergonhada.

Senti uma fúria lenta consumir-me aos poucos quando o real


significado das suas palavras se infiltraram em minha mente, não querendo
acreditar completamente naquilo que ouvi. Eu sabia que as pessoas se
aproximavam de mim sempre buscando algo em troca, seja um acordo de
negócio, promoção ou a minha influência e apoio. E eu sempre usava isso ao
meu favor. Porém não esperava que a mulher à minha frente, uma das poucas
pessoas que realmente eu via como uma igual, também queria obter algo.
Mas eu também poderia jogar o seu jogo e impor as minhas próprias regras.
Ela teria o que queria e eu também.

— Quanto? — perguntei com a voz cortante.

— Cinquenta mil… — sussurrou com a voz fraca, provavelmente em


uma tentativa dissimulada de me enganar com o seu ar frágil.

— Certo.

— O quê? — Virou-se para mim e fingiu incredulidade, o que me


deixou ainda mais irritado e com raiva.

— Esse dinheiro é uma esmola para mim — comentei rudemente,


com um quê de maldade, demarcando a nossa diferença social. — Eu te dou
esse dinheiro com uma condição… — Minha voz saiu áspera e ela pareceu
encolher-se em si mesma.

Tola! Mais do que ninguém ela deveria saber que aqueles que
tentavam obter algo de Andrea Della Torre sempre sofreriam as
consequências.

— Qual? — questionou em um fio de voz.

— Você será a minha amante pelo tempo que eu quiser…


Capítulo Dezesseis

Apertei o meu braço com mais força em torno do meu corpo, sentindo
a frieza da sua voz e seu olhar gelado me cortar como mil navalhas,
dilacerando-me. Nunca imaginei que um dia eu seria alvo de tamanho
desdém por parte dele e aquilo me machucou mais do que deveria. Levada
pelo carinho e ternura presente na voz de Andrea e também em seu toque,
sentindo uma espécie de conforto, revelei aquilo que me incomodava sem
pensar nas consequências e em como aquilo poderia ser interpretado pelo
meu chefe. Mas a necessidade de ter o dinheiro em mãos, mesmo que não
fosse gastá-lo, era maior. E isso foi o meu maior erro. Todo o respeito
profissional que eu cultivei ao longo do tempo que eu trabalhava para ele foi
massacrado pelas minhas próprias palavras, me deixando completamente sem
reação. Uma raiva surda emanava dele e, pela primeira vez, eu senti meu
corpo tremer.

Porém nada poderia ter me preparado para a condição imposta por ele
para me dar o dinheiro. Eu não deveria ter ouvido direito no meu nervosismo
e por saber que minha carreira estava por um fio.

— Não entendi — sussurrei, abaixando a minha cabeça, dando um


passo para trás, meu corpo se colando com força na grande janela de vidro.

Eu precisava da distância, porém Andrea parecia não concordar, pois


ouvi ele dando alguns passos e apenas pela proximidade podia sentir toda a
tensão do corpo másculo que exalava poder. A confirmação veio quando a
mão masculina roçou a minha bochecha em uma carícia suave, apenas para
segundos depois, segurar o meu queixo com pressão, erguendo-o, sem me
machucar, mas fazendo com que eu olhasse diretamente seus olhos azuis
frios e cortantes. Minha boca ficou seca e um calafrio me varreu, meu corpo
traidor e vulnerável reagindo à sua proximidade e ao seu toque, desejo que
busquei suprimir não querendo que ele percebesse, porém o brilho que
cintilou em seus olhos me indicava que ele tinha consciência daquilo que me
fazia sentir. E o apreciava.

— É muito simples, mia cara — passou o polegar sobre meus lábios,


massageando-os, observando minha reação.

— Hm… — gemi involuntariamente.

— Você deseja o dinheiro, e eu quero o seu corpo… — Afastou a


mão, me soltando, e deu um passo para trás, fazendo com que eu sentisse a
perda do contato e do calor que ele emanava. — Uma troca bastante justa
para mim.

— Isso é uma loucura — obriguei-me a dizer em um fio de voz, a


ideia não tinha sido totalmente assimilada pela minha mente.

— Você não pode negar para mim o quanto você também me deseja,
tesoro — sua voz saiu rouca e perigosamente aveludada, causando em mim o
efeito que ele queria. — Seu corpo e seu olhar te traem…

Como que para provar a sua teoria, com um olhar que exalava pura
luxúria e arrogância masculina, embora um respingo de raiva ainda ardesse
em sua expressão, aproximou-se de mim novamente, segurando as minhas
duas mãos com as suas e as ergueu acima da minha cabeça, deixando-me
indefesa e a sua mercê. Com o seu peitoral musculoso e pernas fortes,
prensou-me contra a janela, fazendo com que ficássemos tão próximos um do
outro que podia sentir sua respiração quente tocando o meu pescoço,
arrepiando-me. O volume se formando no meio das suas pernas enviava uma
onda de calor líquido para o centro da minha feminilidade, e precisei de todo
meu autocontrole para não mover meu quadril em direção ao seu, em uma
resposta instintiva a um mero contato.

Deus, isso era completamente errado. Render-me a ele só complicaria


ainda mais a situação frágil que eu havia me colocado.

Porém, antes que eu dissesse qualquer coisa, senti sua barba por fazer
roçando a pele sensível da região da minha clavícula e ele inspirou fundo,
soltando um gemido rouco que me fez ficar mole de excitação. Nunca
nenhum homem se aproximou de mim dessa forma, querendo sentir o cheiro
que emanava de mim, como se precisasse disso para continuar vivendo.

— Deliciosa… — sussurrou com uma voz sexy, ao mesmo tempo


controlada.

Repetiu o mesmo processo e, para minha total surpresa, ele pousou


seus lábios de encontro a minha garganta e sua língua começou a traçar
círculos lentos pela minha pele, como se me degustasse. O contato vagaroso
da sua boca e os sons roucos que emitia enquanto sua língua percorria toda a
extensão do meu pescoço, até o maxilar, despertava em mim uma sensação
completamente desconhecida, roubando pouco a pouco minha capacidade de
raciocínio, mitigando uma a uma as razões pelas quais eu achava que me
tornar sua amante era um absurdo.

Era assim que as mocinhas dos livros que eu amava ler se sentiam?
Como se toda a determinação que tínhamos em não nos deixarmos levar por
um mero momento de prazer sucumbisse ao mero toque? Fazendo-nos querer
mais? Eu não sabia ao certo, a única certeza que tinha era que, diferentemente
de mim, elas acabariam tendo o seu final feliz.

Brincando com o meu corpo, Andrea refez o caminho com a língua,


sugando o ponto em que ele podia sentir meu coração bater descompassado.
O rastro molhado deixado por ele em contato com o ar-condicionado e sua
respiração quente arrepiava-me, e contra a minha força de vontade, arqueei
minha pelve em direção ao seu membro excitado em um gesto instintivo,
fazendo-o levantar a cabeça para olhar para mim quando um gemido escapou
pelos meus lábios. Não existia mais traço de raiva em sua expressão, apenas
uma leve contrariedade e um desejo cru e avassalador que nenhum outro
homem sentiu por mim.

Sua respiração estava cada vez mais acelerada e, soltando um


grunhido, ainda segurando as minhas mãos acima da cabeça, apertou-me
ainda mais contra o seu corpo e sua boca aproximou-se da minha, roçando-a
suavemente, como uma carícia feita por uma pena. Nunca pensei que o
homem poderoso à minha frente me provaria com tanta doçura, que embora
eu o tivesse irritado, ele fosse tão calmo em seus movimentos.

Tinha sido beijada na adolescência por alguns meninos ousados e


afoitos, e também por um colega da universidade que roubou um quando
estávamos fazendo um trabalho acadêmico, então, nesse quesito, eu era quase
inexperiente, porém nenhum deles tinha sido tão carinhoso quanto Andrea.
Pensei que, como os outros, ele queria apenas me dominar, mostrar o seu
poder sobre mim, porém Andrea me saboreava, construindo pouco a pouco
minha redenção. A barba por fazer arranhava de leve a minha pele, e nunca
pensei que tal coisa poderia me proporcionar ainda mais prazer.

Parei de pensar quando seus lábios começaram a se mover lentamente


sobre os meus, e eu tentei imitá-lo, desajeitadamente provando-o, apreciando
o contato, com gemidos escapando da minha garganta. Soltando meus
punhos, sem interromper o encontro das nossas bocas, com uma mão segurou
a minha cintura e a outra, levou aos meus cabelos, desfazendo o coque que os
prendia, massageando os fios e puxando suavemente minha cabeça em
direção a sua, controlando nosso beijo.

Vagarosamente intensificou o contato, exigindo com a ponta da


língua que eu me abrisse para ele, demandando uma resposta que não hesitei
em concedê-lo. Fundindo-nos em um só, e querendo guardar o beijo na
minha mente, fechei os meus olhos, aumentando ainda mais as sensações que
os lábios de Andrea me proporcionavam. Nunca apreciei tanto o gosto de
whisky envelhecido como agora o fazia. Ele provava calmamente cada canto
da minha boca enquanto nossos corpos se moviam um contra o outro em uma
dança silenciosa e prazerosa, deixando nossa respiração cada vez mais
acelerada.

Quando ele demandou mais e mais de mim, levei minhas mãos aos
seus ombros, sentindo a sua força e autocontrole. Obriguei-me a corresponder
seus movimentos cada vez mais vorazes, revelando minha inexperiência e ele
toda a fome que sentia, todo o desejo insatisfeito, arrancando gemidos de nós
dois cada vez mais altos. Ele me devorou com a boca até que ficássemos sem
ar e me soltou, a perda me assolando instantaneamente. Precisei me apoiar no
vidro para não cair, minhas pernas completamente bambas.

Colocou as mãos nos bolsos da calça social e, dando alguns passos,


virou-se de costas. Pelos seus ombros, que subiam e desciam aceleradamente,
podia ver que ele estava tão descontrolado quanto eu. Porém sua fala saiu
completamente fria, muito diferente do homem doce e terno que me beijou.

— Não tem por que você negar que somos bons juntos — fez uma
pausa —, você consegue o que quer, e eu também.

Sua última frase soou como um balde de água fria em mim, matando
as sensações deliciosas provocadas pelo beijo, e fez com que minha
racionalidade voltasse completamente.
— Você não me quer, Andrea, não uma…

— Uma o quê? — Virou-se para mim e seu olhar me percorreu de


cima a baixo, friamente. — Ainda dúvida, Adelle?

— Eu… — Estava sem jeito de dizer por que ele não iria me querer.
— Você deve ter notado que eu…

— Diga logo o que te impede — ordenou rispidamente. — Ou não


passou pela sua cabeça que eu iria querer algo em troca do dinheiro? Você
sabe que nunca saio perdendo nas minhas negociações, mia cara.

Engoli em seco, assentindo. De fato, Andrea sempre ganhava muito


mais em uma transação do que qualquer outra pessoa e isso era algo
reconhecido por todos, e mais do que ninguém, trabalhando como sua
secretária eu o sabia.

— Estou esperando, Adelle… — pressionou-me e eu soltei um


suspiro.

Não tinha por que esconder a minha inexperiência dele. Ele era um
homem muito mais vivido do que eu e deve ter percebido isso.

— Eu sou virgem! — Disse, ao erguer o meu queixo e fitá-lo.

Um brilho de excitação cruzou os seus olhos azuis e um sorriso lento


se formou em seu rosto enquanto me percorria de cima a baixo, parando em
meus lábios. Tensa, mordi meus lábios, fazendo com que sua expressão se
tornasse ainda mais lasciva. Sem tirar os olhos de mim, se aproximou
novamente e segurou o meu rosto em concha, seu toque queimando a minha
pele.
— Eu pago o dobro. Ou melhor, o triplo, mais as dívidas que você
tiver.

— Pagar? — Engoli em seco.

— Estou comprando seu corpo e seu desejo, tesoro — falou


lentamente, o sotaque italiano arrepiando-me como a boba que era. — Você
será minha pelo tempo que eu quiser e eu a terei da forma que desejar… —
Acariciou a minha bochecha com o polegar e por um momento eu fechei os
olhos, me entregando a carícia.

Eu estava disposta a negociar minha virgindade e meu corpo só para


ter o dinheiro da cirurgia do meu irmão caso ele precisasse fazê-la?, uma
parte de mim dizia que era uma insanidade, que era algo que eu me
arrependeria depois, porém a parte mais racional e desesperada por uma
solução para o meu problema me dizia que era insanidade não aceitar o
dinheiro que me daria a garantia de que Will pudesse realizar o tratamento,
sem precisar que eu procurasse um agiota.

— Será bom para nós dois, mio ciocolato. — Passou um dedo pelos
meus lábios, e estremeci em resposta. — Seu corpo anseia por isso tanto
quanto o meu. — Deu-me um leve selinho que reacendeu o fogo que me
consumiu durante o beijo, porém o controlei.

Fiquei em silêncio por alguns momentos, pesando os prós e contras


enquanto Andrea fazia de mim sua boneca viva.

Eu disse a mim mesma que estava disposta a tudo para cuidar de Will,
não disse? Até mesmo fazer um pacto com o diabo, não é mesmo? Então o
que eu tinha a perder em aceitar a proposta do meu chefe? Perderia o
emprego que eu gostava, minha dignidade, mas a vida do meu irmão não era
mais importante do que isso? O preço poderia ser alto, mas o dinheiro que eu
receberia bancando a amante inexperiente dele me era ainda mais precioso no
momento, mesmo que para ele fosse apenas uma esmola. A quantia
significava além do bem-estar do pequeno, a nossa segurança, pois não
precisaria negociar com pessoas barra pesada.

Sim. Eu venderia meu corpo ao magnata apenas para ter a certeza que
eu poderia custear o tratamento cirúrgico do meu irmão se ele precisasse.

— Eu aceito — sussurrei a resposta. — Mas com duas condições.

Andrea arqueou a sobrancelha, me dizendo claramente que eu não


tinha poder nenhum para barganhar, porém acabou assentindo.

— Diga, tesoro — respondeu lentamente.

— William sempre será a minha prioridade. — Fiz um gesto com a


mão.

— Não esperava menos de você — respondeu com a voz firme e deu


de ombros —, e a outra?

— Não me machuque, dizem que dói…

— Nunca o faria — pousou seus lábios na minha testa —, eu


prometo, tesoro.

— Obrigada.

— Quero algo em troca…

— O quê? — Fitei seus olhos azuis indecifráveis.


— Seremos exclusivos um do outro e você nunca irá suprimir o
desejo que sente por mim.

Sem esperar resposta, segurou a minha nuca e puxou-me para um


beijo lento, intoxicante, que mexia com todas as minhas terminações
nervosas. Seus lábios macios sobre os meus me provavam com calma, como
se Andrea quisesse gravá-los em sua mente e eu aproveitei do seu sabor,
desfrutando da carícia terna e ao mesmo tempo excitante. Perdida na
irracionalidade do ato, tentei aprofundar o beijo, porém meu chefe não me
deixou, obrigando-me a me contentar com a lentidão dos seus movimentos.
Quando aproximei mais meu corpo de encontro ao seu, ele me deu um último
selinho e se afastou, depois de ter pegado minha mão e pousado um beijo
nela.

— Vá para casa, já está tarde — sua voz soou mais suave do que eu
poderia imaginar.

— Andrea…

— Apenas vá, Adelle. — Ordenou.

— Tá.

Cambaleante pelas sensações que ele me provocava, caminhei


tropegamente até onde estavam os meus sapatos e os calcei com certa
dificuldade sob o olhar atento de Andrea. Respirando fundo, procurei me
acalmar e peguei a minha bolsa. Como não sabia muito bem como uma
amante deveria se comportar, antes de sair do escritório, caminhei até o meu
chefe e dei um leve beijo em seus lábios como despedida.
— Boa noite, Andrea. — Sussurrei.

— Até amanhã, tesoro.

Assentindo, dei meia volta e deixei o escritório, não tendo certeza de


que tinha feito a escolha certa para mim e para o meu coração…
Capítulo Dezessete

Embora prestasse atenção no leve trânsito da noite, nunca me


colocaria em risco a toa, pouco a pouco a realidade do que eu acabava de
aceitar era assimilada pela minha mente. Nunca pensei que seria capaz de
fazer tal coisa, de me vender como se fosse uma mercadoria, mas eu era. E o
temor inicial que sentia foi substituído pela determinação em ter o dinheiro
caso o meu irmão precisasse da cirurgia, embora não soubesse
completamente o que o magnata poderia fazer com o meu corpo. Tinha
ouvido falar que alguns homens tinham gostos peculiares que envolviam dor
e submissão, porém confiava em Andrea que ele nunca faria nada para me
machucar. Eu poderia ser virgem e inexperiente em relação aos homens, mas
aprenderia rápido meu papel em dar a ele prazer da forma que queria.

E se eu fosse sincera comigo mesma, Andrea não seria o único a obter


satisfação nessa negociação.

Ainda sentia meus lábios formigando pelo beijo suave que foi ficando
cada vez mais intenso que ele me deu, fazendo-me ansiar por mais, por sentir
o gosto da sua boca e a pressão dos seus lábios nos meus. O calor que o seu
corpo, bem maior do que o meu, me proporcionava, mexeu com todas as
minhas terminações nervosas.

Desejava conforto e segurança que seu toque me fazia sentir mesmo


que o homem estivesse ardendo de irritação; ansiava pelo carinho que fazia
muito tempo que outra pessoa adulta não dispensava a mim, embora tivesse
quase certeza de que Andrea não tenha intenção de oferecer algo emocional,
mas inevitavelmente, eu sentia-me dessa maneira, como se, através do seu
contato, ele pudesse me dar algo que ia além do desejo carnal. O que era uma
grande tolice da minha parte.

Eu não poderia desejar nada além do prazer que ele me proporcionaria


e o dinheiro que era muito mais do que eu teria a minha vida toda, que além
de me dar a certeza que eu poderia pagar o tratamento, me permitiria quitar
todos os meus empréstimos e viver por uns seis meses depois que eu fosse
demitida quando ele se cansasse de mim. Sabia que seria logo e que nossa
relação de patrão e empregada ficaria completamente abalada, a cumplicidade
existente entre a gente completamente arruinada. A confiança que ele tinha
em mim, pude perceber pelo seu olhar frio, tinha se estilhaçado em mil
pedaços.

A vida tinha me ensinado que não podíamos ter tudo, então ter a
segurança financeira que precisava me bastava.

Perdida em pensamentos, nem tinha visto que estava próxima ao meu


bairro e com cautela fiz a curva que levava à rua em que ficava meu prédio e
adentrei a garagem subterrânea, estacionando na minha vaga. Suspirando,
sentindo-me mais um pouco recomposta, peguei minha bolsa e caminhei até
o elevador, que poucos segundos depois, parou no andar onde ficava a
residência de Ash. Não demorou muito para que ela atendesse e por um
momento ela me olhou de cima a baixo.

— Está tudo bem, querida? — Franziu o cenho.

— Sim, por que não estaria?

— Nunca te vi com o cabelo desarrumado e tem algo de diferente na


sua expressão. Você está mais corada.

— Ah — não sabia o que dizer e falei a primeira mentira que passou


pela minha cabeça. — Em meio ao trabalho, devo os ter soltado e nem ter
percebido e o vento fez o resto do trabalho.

Não podia falar para a mulher na minha frente que tinha acabado de
me vender ao meu chefe em troca de muito dinheiro. Não suportaria que
Ashley me julgasse pelo que eu tinha feito no meu desespero, e nem que ela
tentasse me demover da minha decisão, me convencendo que poderia existir
outra solução e que ainda a cirurgia estava apenas no papel, nem sabendo se
iria ocorrer. Que poderia estar agindo com certa precipitação. Preferia ter um
pássaro na mão do que dois voando.

— Sei… — Fez uma pausa. — Eu só me preocupo com você.

— Obrigada.

Um pouco envergonhada por omitir algo dela, abracei-a, sentindo-me


agradecida pela sua preocupação.

— Como está Will? — perguntei, com um tom de preocupação,


quando ela se desvencilhou de mim e fez um gesto para que eu entrasse.

— Bem, Del, apenas sentiu um leve incômodo, mas depois que dei o
antibiótico do horário, ele pareceu bem. Está um pouco cansado de tanto
brincar e mexer nas minhas coisas. — Riu baixinho.

Senti meu coração se apertar um pouco, mas a médica disse que era
natural que ele sofresse algum desconforto durante os dez dias de tratamento.

— Desculpe por isso, Ash… Eu falo para ele não ficar mexendo, que
é feio...

— Bobagem, querida — fez um gesto com a mão —, eu permiti que


ele o fizesse. Nos divertimos tanto quando o desconforto passou, que, depois
de tomar banho e jantar, ele acabou dormindo no sofá vendo um canal
infantil e eu o carreguei até o quarto de hóspedes.

— Obrigada, não saberia o que fazer sem você.

— Eu gosto, me faz lembrar de quando o meu filho era pequeno —


soltou um suspiro de saudades. — Por que eles têm que crescer, né? Agora
que foi para a faculdade, nem lembra que tem mãe. — Deu uma pausa. —
Você quer que eu esquente um pouco da sobra do jantar? Deve estar com
fome.

— Não precisa, comi alguma coisa no trabalho e farei um sanduíche


mais tarde…

— Certo.

— Agora deixe eu pegar meu menininho, pois você precisa descansar.

— Me siga.

Assenti e assim que me aproximei do meu pequeno, toquei seu


rostinho em meio ao sono, tirando um dos fios que tinha grudado em sua
bochecha. Contendo a emoção que queria transbordar de mim ao pensar que
ele ficaria bem logo, peguei-o suavemente no colo enquanto equilibrava a
bolsa no ombro e, para minha sorte, ele não acordou, apenas soltou um
suspiro. Ashley abriu a porta do apartamento para mim e trancando-o
rapidamente, me acompanhou até o meu, me ajudando a entrar. Soltei um
obrigada e um boa noite sem som para ela que me retribuiu com um de nada
e até amanhã da mesma forma.

Tentando fazer o menor barulho possível, cruzei todo o local onde eu


morava até chegar no quarto do meu pequeno. Liguei o abajur, o deitei
suavemente na cama, no cômodo que ficava anexo ao meu, e o cobri com a
sua manta. Quando estava prestes a sair, virei-me e fiquei escorada no batente
da porta, observando-o dormir na semiescuridão, sentindo um alívio percorrer
todo o meu corpo. Uma lágrima sorrateira escapou dos meus olhos, seguida
de outras, enquanto observava meu menininho dormindo como um anjo, seus
lábios fazendo um beicinho em meio ao sonho. Olhando-o, eu tive a certeza
de que vender-me para Andrea, e com isso a minha dignidade e carreira, não
era nada, pois eu daria a minha vida para ver Will bem e em segurança.

E saber que se ele precisava fazer a cirurgia e que o dinheiro não seria
um empecilho para tal, fizeram com que a emoção me tomasse forte e as
lágrimas rolassem ainda mais. Sem que me desse conta, soltei uma prece de
agradecimento e depois de alguns minutos, maneei a cabeça e encostei a
porta, caminhando em direção ao banheiro.

Tomaria um banho, comeria algo e depois de ler algo, tentaria dormir,


apesar de que duvidava muito que eu conseguisse depois de todos os
acontecimentos do dia, principalmente com a lembrança do beijo
completamente impregnada na minha mente.
Capítulo Dezoito

Adentrei o escritório sentindo um frio na barriga, e a ansiedade que


corroía o meu estômago me impediu até mesmo de apreciar um bom café.
Diferentemente do que eu pensava, eu tinha conseguido dormir rápido e por
várias horas seguidas. Fazia dias que eu não conseguia pregar os olhos,
porém agora acordada sentia a pontada de receio do que poderia acontecer.
Não podia negar que tinha medo de que Andrea pudesse ter pensado melhor e
voltado atrás, afinal não o via pagando por sexo. Mais do que nunca, não
queria que a dádiva que tinha conseguido, bem como o alívio que sentia, me
fosse retirada horas depois. Mas o que realmente me deixava insegura era o
modo como deveria me comportar, apenas me restando deixá-lo conduzir
toda a situação. Suspirando fundo, aproximei-me da minha mesa e coloquei
minha bolsa no encosto da cadeira, percebendo a presença de um envelope
branco com o meu nome escrito com a caligrafia de Andrea no tampo.
Temendo mais do que tudo o seu conteúdo, abri o invólucro, deparando-me
com duas vias de um mesmo documento.

Sentando na minha cadeira, liguei o computador e, enquanto esperava


ele iniciar, comecei a ler os papéis que segurava entre meus dedos trêmulos,
cláusula por cláusula, constatando que as folhas nada mais eram do que um
contrato formal, que me fazia a amante de Andrea por tempo indeterminado.
Me tornando a sua propriedade.

Suspirei fundo, sentindo-me um pouco trêmula de alívio. Pelo menos


ele não tinha desistido, pensei comigo mesma, tentando não me importar
completamente por ele ter formalizado sua aquisição em um documento.

Além da quantia estipulada, que era bem mais do que eu podia sonhar
em ter um dia, três itens me chamaram a atenção: uma que dizia respeito ao
emocional, estabelecendo que o relacionamento se restringiria apenas aos
aspectos físicos, o que não me era uma surpresa vindo de Andrea. Mas não
dei tanta importância a isso, pois era algo que eu não pretendia fazer mesmo,
pois sentia que se eu me deixasse levar pelos sentimentos, embora não
pudesse controlá-los, além de terminar desempregada, eu acabaria de coração
partido. Mas o que me fez realmente hesitar em assinar foi a cláusula que eu
aceitaria sem pestanejar todas as suas ordens e desejos. Eu não era uma
especialista em direito, mas podia ver que o item claramente era bastante
amplo e ambíguo, me fazendo duvidar se dizia somente respeito ao sexo.

Mas o que me fez assinar e rubricar as duas vias foi a disposição de


que, embora eu fosse a amante dele, eu ainda teria o meu tempo de lazer com
Will e ele não interromperia esses momentos, o que me tocou
completamente, pois não esperava tamanha generosidade dele. Andrea sabia
o quanto brincar e ficar com o meu irmão significava para mim e ele não me
privaria disso. Fiquei emocionada por saber que realmente seus desejos não
estavam acima da minha relação com o meu irmão.

Respirando fundo, procurei me acalmar enquanto checava os e-mails


da caixa de entrada e encaminhava os mais importantes para o meu chefe.
Depois de fazê-lo, abri a agenda dele no meu tablet e peguei uma cópia do
documento, a fim de enfrentar o inevitável, por mais que eu temesse o
momento.

Caminhando sobre meus saltos, sentindo minhas mãos suarem frio e


minha barriga revirar, bati de leve na porta e esperei que ele me desse
autorização para entrar.

— Andrea?

— Entre e tranque a porta, tesoro. — Sua voz saiu rouca e embora


tivesse estranhado seu último pedido, não contive o arrepio que percorreu a
minha pele, a lembrança do seu beijo e calor fazendo com que uma pontada
de desejo surgisse em meu íntimo.

Tentando me controlar, criando coragem para encará-lo, fiz o que ele


pediu e assim que rodei a chave na fechadura, senti seus braços firmes
envolverem a minha cintura por trás, prensando-me contra a parede rígida
que eram seus ombros e peitoral. Quando sua respiração quente tocou a
minha pele, tive que me conter para não jogar o tablet e os papéis no chão,
exigindo ainda mais autocontrole quando seus lábios mornos pousaram na
minha nuca, com suas mãos grandes, fortes e possessivas subindo até
pousarem na curva dos meus seios arrancando dos meus lábios uma série de
gemidos.

— Andrea — sussurrei com uma voz irreconhecível quando me


trouxe ainda mais contra seu corpo, sua boca e língua traçando círculos lentos
pela minha extensão, saboreando-me, provocando-me. Sua barba me
arranhando e os sons de prazer que emitia contra a minha pele fizeram que eu
me colasse ainda mais a ele, e eu remexi minha bunda contra a sua pélvis
instintivamente, sem me importar se eu parecesse uma devassa diante seus
olhos. Desfrutei do calor que ele me proporcionava com suas carícias e do
pequeno poder que tinha de deixá-lo completamente rígido de desejo.

— Eu amo o cheiro e o gosto da sua pele, tesoro — sussurrou com a


voz entrecortada e eu apenas respondi com um gemido baixo quando sua
língua percorreu meu pescoço de cima a baixo, fazendo-me estremecer.

— Hmm...

Unidos, com a sua boca sem deixar de me tocar, beijando-me,


sugando a minha pele, ele deu alguns passos até uma mesinha de canto e eu
pousei o tablet e o documento em cima dela. De mãos livres, joguei meus
braços para trás, e embrenhei meus dedos em seus cabelos, sentindo a maciez
dos fios negros e espessos enquanto suas mãos brincavam levemente com a
parte inferior do meu peito, excitando meus mamilos com o leve roçar. Com
as pernas cada vez mais bambas, puxei seus cabelos com mais força tentando
me equilibrar nos meus saltos, fazendo com que ele soltasse um som rouco
que me fez estremecer.

Soltei um grunhido quando seus lábios se afastaram e gentilmente


afrouxei o aperto das minhas mãos em seus cabelos, deixando que meus
braços pendessem ao lado do corpo. Com a respiração acelerada, girei-me em
meus saltos para encarar seus olhos azuis brilhando selvagemente,
provavelmente refletindo minha luxúria. Seus cabelos estavam desordenados
pelos meus dedos, seu peito subia e descia com a força que puxava o ar para
os seus pulmões, mas o que me fazia ficar sem fôlego era o sorriso lento de
predador que tomava o seu rosto. Sem esperar minha reação, trouxe-me
novamente de encontro ao seu corpo e tomou meus lábios com os seus, os
movimentos lentos, tornando-se cada vez mais exigente, querendo mais e
mais a minha entrega. Fechei os meus olhos, querendo amplificar as
sensações do beijo, quando sua mão espalmou as minhas costas acima da
minha bunda, trazendo-me mais de encontro a sua ereção, e enlacei o seu
pescoço, buscando me equilibrar nele.

Ousada, mordisquei os seus lábios e, entendendo o gesto como um


convite, Andrea passou a língua pelos meus forçando-me a entreabri-los para
ele, provando cada recanto da minha boca. Envolvida pela pressão e a força
transmitida pelo contato, deixei-me levar pelas sensações que ele me
despertava, suas mãos alisando as minhas costas de cima a baixo,
estimulando todas as minhas terminações nervosas, fazendo-me arquear meus
quadris de encontro ao seu sexo rígido. Eu poderia me viciar no carinho e
ternura presente na forma que me tomava. Nunca imaginei que o magnata
fosse um amante tão gentil.

Definitivamente, eu estava perdida. Seria impossível não ser cativada


pelas emoções que ele me suscitava. Toda minha determinação anterior de
me manter imune a ele, evaporando. Juntaria os cacos do meu coração
depois, como o fiz com as mágoas deixadas pela minha mãe e pelo meu pai, e
seguiria em frente. Guardaria os meus sentimentos apenas para mim, me
escondendo atrás da máscara de amante.

Quando ele interrompeu o beijo, soltei um gemido de protesto,


abafado pelo seu polegar brincando com meus lábios. Pelo menos uma de
suas mãos grandes e quentes ainda me segurava contra si, abraçando-me.
Seus olhos brilhavam ainda mais, provavelmente desfrutando do fato de que
eu queria muito mais. Seu ego com certeza estava se regozijando, podia vê-lo
em sua expressão arrogante. Mas quem era eu para repreendê-lo? Eu era a sua
posse, sua amante, paga para lhe dar prazer.

— Bom dia, tesoro — substituiu seu dedo pelos lábios, me dando um


selinho, e acariciou o meu rosto. — Dormiu bem?

— Bem, e você? — Toquei os pelos da sua barba, que pinicavam o


meu dedo, percebendo um pingo de cansaço por detrás do desejo.

— Tanto quanto minha ereção permitiu, mio cioccolato… — Abaixou


a cabeça e beijou o meu pescoço.

— Andrea — arfei quando o significado das suas palavras foi


assimilado pela minha mente.
— Você causa isso em mim, tesoro — pegou a minha mão e a levou
de encontro ao volume na sua calça, fazendo com que eu o apalpasse com os
meus dedos trêmulos, sentindo o seu pênis pulsar mesmo por cima do tecido.

Fascinada pelo poder que eu exercia no homem poderoso e sempre


controlado, e por ser a primeira vez que eu tocava alguém tão intimamente,
explorei-o lentamente, ouvindo sua respiração ficar ainda mais acelerada, até
que ele afastou a minha mão.

— Chega! — Deu um passo para trás, como se precisasse se


distanciar de mim para obter alguma espécie de controle sobre si mesmo.

— Certo. — Assenti, passando os dedos pelos meus cabelos ajustando


alguns fios que tinha soltado do meu coque.

— Deixe-os soltos — ordenou com a voz rouca.

Sem responder e consciente que não poderia mais negar nada que ele
solicitasse, mesmo achando pouco profissional, tirei a presilha que prendia os
meus cabelos no lugar, deixando que as mechas caíssem pelas minhas costas.
Um sorriso lento de aprovação se formou em seus lábios.

— Melhor assim…Enquanto você for minha amante, mantenha-os


sempre soltos.

— Sim, Andrea. — Fiz um gesto de concordância e abri um sorriso


enquanto ajeitava os fios minimamente.

Tentando manter um pouco de formalidade, suspirando fundo e me


sentindo mais recomposta, peguei o tablet a fim de repassar a agenda dele,
porém, para minha surpresa, Andrea fez um gesto negativo com a cabeça.
— Já tomou seu café, Adelle? — acentuou o seu sotaque ao
pronunciar meu nome.

— Ainda não, não consegui por conta do nervosismo — confessei em


voz baixa, e ele arqueou a sobrancelha.

— Nunca me tema, tesoro…Nada mudou. — Eu não sei se


concordava completamente com ele, pois, para mim, tudo mudou e nada seria
a mesma coisa entre nós dois, porém não disse nada. — Venha, vamos até a
copa.

Pegando minha mão, deu um leve aperto nela e me puxou em direção


a cozinha privativa. A mesa estava impecavelmente posta, com uma
variedade de pratos que iam desde pães frescos, brioches e croissants, à
geleias e pratos mais elaborados. Porém, o que mais me despertou interesse
foi o cheiro pungente de café que exalava por todo o ambiente, enchendo
minha boca d’água. Era completamente divino.

— Sente-se — tocou as minhas costas fazendo-me andar até a mesa, e


puxou a cadeira para mim de modo cortês.

— Obrigada. — Sorri para ele e fiz o que pediu.

Antes que se sentasse, ele foi até o pequeno cooktop da cozinha e


segurou um utensílio que parecia uma espécie de bule em formato de
ampulheta e o pousou sobre um suporte na mesa.

— O que é isso? — perguntei, curiosa, enquanto ele se ajeitava à


minha frente e eu pegava um croissant, que parecia ter acabado de sair do
forno, partindo-o ao meio, sentindo o estalar crocante do folheado. Sem
resistir, levei um pedacinho à boca, soltando um gemido quando senti o sabor
da massa, passando a língua para remover umas migalhas no canto da minha
boca. Sem dúvidas, era o melhor que já tinha provado.

— Deliciosa — murmurou para si mesmo, e senti seu olhar me


devorar enquanto ele derramava o líquido de aparência encorpada nas duas
xícaras. — Isso é uma cafeteira moka. Foi inventada na Itália e é muito
popular por lá. Funciona como uma espécie de pressão. Minha mãe diz que
não há modo melhor de se preparar um café.

— Hm…Vamos ver.

Colocando algumas colheres de açúcar, Andrea fez um gesto para que


eu provasse a bebida. Sem perder tempo, levei o recipiente aos lábios
provando o líquido, sentindo a textura mais espessa e encorpada do que o
expresso comum. O gosto muito mais rico do que daqueles que já tinha
experimentado, o grão utilizado devendo ser um dos melhores do mundo.

— Maravilhoso. — Beberiquei um pouco mais da bebida, apreciando


o calor proporcionado pelo café fumegante. — Sua mãe é uma mulher sábia.

— Sabia que você iria gostar — comentou satisfeito e tomou um gole


da sua xícara. — Te apresentarei aos melhores pratos e tudo o que houver de
melhor. — Fez uma pausa. — Até o final do dia o dinheiro vai cair na sua
conta… — mudou bruscamente de assunto, trazendo à tona a natureza da
nossa relação no tom frio de quem negociava, o amante terno e carinhoso se
dissolvendo em meio a fachada de CEO implacável que costumava usar
sempre que se via em uma mesa de reunião.

Engoli em seco e assenti com a cabeça.


— Obrigada — forcei-me a dizer. Poderia aproveitar o momento para
me explicar, tentando apagar a imagem de interesseira que ele provavelmente
estava fazendo de mim, porém hesitei. Afinal, o motivo realmente poderia
importar para ele? Eu ainda estava me vendendo a ele e recebendo muito
mais dinheiro do que necessitava, o suficiente para pagar todas as minhas
dívidas também. Eu não precisava e nem queria mais, mas acho que nada do
que falasse passaria como verdade para ele, então resolvi me manter calada.

— Só estou cumprindo o contrato — sua voz soou fria e ele deu de


ombros, pegando uma faca para cortar uma espécie de bolo. — Pedi também
um cartão, que deve chegar nos próximos dias.

— Cartão? — Arregalei os olhos, incrédula. — Eu… Não é…

— Para comprar roupas, sapatos e os demais cuidados que vocês


mulheres se importam tanto enquanto você for minha amante —
interrompeu-me com um gesto e se serviu de um pedaço. — Não finja que
você não quer isso, não é necessário.

— Okay — fingi que me interessava por esse tipo de coisa, tentando


suprimir a minha perplexidade. Se ele achava que eu iria usar esse cartão com
essas coisas fúteis, Andrea estaria completamente enganado. Os gastos com a
minha aparência seriam só meus, o luxo das roupas de grife e tratamento
estéticos caros não me interessavam, por mais que ele achasse que sim.

— Só não compre perfumes — ordenou.

— Por que não? — Arqueei a sobrancelha e o provoquei. — Um


Chanel não combina comigo? Ou não posso ter um feito exclusivamente para
mim? — Passei a unha sobre a borda da xícara, chamando a atenção dele para
lá. Seu cenho franzido mostrava sua irritação com o pensamento.

— Você não ousaria substituir o que você já usa — cerrou os dentes e


deu uma garfada no seu prato.

— O quê? — Dei uma gargalhada sonora que ecoou por todo o


ambiente. — Meu hidratante de vinte dólares? — Sorri para ele que assentiu,
um brilho cruzando seus olhos azuis. — Não se preocupe, Andrea —
instintivamente, pousei minha mão sobre a dele, o calor do seu tato fazendo
com que eu estremecesse, o feitiço virando contra o feiticeiro. — Você é
quem dita as regras.
[22]
— Sì, mio cioccolato . Fico feliz que isso esteja bem claro para
você — murmurou com a voz rouca e, com a mão livre, levou o talher aos
meus lábios. — Agora prove um pouco dessa la ciambella que pedi que
fizessem exclusivamente para você.

Surpresa com a intimidade e a ousadia do gesto, abri minha boca sob


o escrutínio intenso dos olhos azuis e provei a massa de textura esponjosa e
fofa, sentindo o gosto leve de limão, enquanto assistia Andrea levar
novamente o garfo ao prato e pegar um pouco para si, para depois me servir
de um pouco mais. Não podia negar que estava mais presa ao fato dele levar
a comida aos meus lábios, do que no sabor do bolo. Já tinha visto em muitos
filmes o casal de mocinhos fazendo a mesma coisa, e achava o gesto
terrivelmente romântico e carinhoso, mas nunca pensei que o homem
poderoso a minha frente o faria. E para o meu total espanto, seus olhos e o
sorriso em seu rosto me indicavam que Andrea estava apreciando fazê-lo
tanto quanto eu estava em recebê-lo. Era algo completamente surreal pensar
que eu estava vivenciando tal coisa, que o meu chefe me dispensaria tanto
cuidado, tal atenção.

— Hmm… — gemi quando ele levou mais um pedaço aos meus


lábios.

— Ótimo, não é mesmo? — perguntou em tom de apreciação.

— Incrível — respondi dubiamente, sem me importar que ele


compreendesse o sentido.

— Experimente com o café. — Cortou uma fatia de bolo e pousou no


meu pires, estendendo-me o garfo. — Minha avó costumava prepará-lo
sempre que íamos passar o fim de semana com ela, tem gosto da minha
infância.

Sorri para ele e desfrutei do restante do café da manhã, enquanto


conversávamos sobre coisas de quando éramos pequenos, relembrando os
nossos pratos favoritos. Como ele tinha se mudado para Nova York há apenas
alguns anos, nossa criação foi completamente distinta, embora
compartilhássemos alguns valores morais. Contra toda a minha razão e bom
senso, peguei-me imaginando como seria fazer parte de uma família italiana
bastante unida e animada. Embora eu tivesse tido meus momentos felizes
quando pequena, nada se comparava àqueles narrados por Andrea. Queria ter
dado uma infância assim a Will, porém senti que também pequei nesse
aspecto.

— Adelle, tesoro? — pousou a sua mão grande e quente sobre a


minha. — Tudo bem?
— Está sim, Andrea — forcei um sorriso e ele arqueou uma
sobrancelha, porém não disse nada. Não iria incomodá-lo com assuntos que
não seriam do seu interesse, principalmente a respeito das minhas
inseguranças como responsável por uma criança. Andrea, definitivamente,
não me entenderia já que o magnata não pretendia ter filhos, embora tivesse o
dom natural de encantar as crianças. O modo com que ele dava atenção a
Will era a prova viva disso.

— Quero te levar para jantar fora sábado e depois vamos para um


hotel, algum problema para você? — questionou-me com a voz rouca, e o
real significado do que iria acontecer foi absorvido pela minha mente. —
Provavelmente pernoitaremos lá.

Andrea estava marcando a data em que tiraria minha virgindade e me


tornaria de fato a sua amante, fazendo com que eu iniciasse a minha parte do
contrato, que não tinha prazo para finalizar. Foi impossível não sentir um
arrepio de antecipação me varrer, reação que foi observada por ele, que me
encarava fixamente. Não sei se estava totalmente preparada, porém o modo
que eu reagi ao seu beijo, a proximidade do seu corpo ao meu e ao toque
dele, perdendo a capacidade de raciocinar, me dizia que eu me entregaria sem
ressalva e pudores ao momento, presa no turbilhão de emoções que o mero
contato me fazia sentir. E algo dentro de mim ansiava pelo conforto e ternura
que ele me dispensaria, mesmo que em meio ao sexo. Eu precisava disso,
com uma força que nem sabia que existia. Por muito tempo, deixaria de lado
o peso das preocupações que carregava sobre os meus ombros, e me
permitiria ser envolvida por Andrea, tentando resguardar o meu emocional e
coração.

— Vou só olhar com a Ashley se ela pode ficar com Will —


sussurrei.

— Certo.

Enquanto tomava mais uma dose de café e levava mais um pedaço de


bolo a boca, peguei o celular do meu bolso do meu blazer e mandei uma
mensagem para ela:

Adelle

Oi, Ash, você pode ficar com Will sábado o dia todo, e um pedaço do
domingo também?

Para a minha surpresa, alguns minutos depois ela me respondeu:

Ashley

Claro, hora extra novamente? Você também precisa descansar,


menina.

Adelle

Dessa vez não.

Obrigada por isso, Ash… <3

Não sei o que faria sem você :*


Ashley

Nada :)

Um encontro? Dormir fora?

Fiquei curiosa rs

Adelle

É…

Preciso ir agora, obrigada.

Ashley

Tá, mas quero saber de tudo quando você chegar.

Não vai me esconder nada.

Desliguei o aparelho sentindo o meu rosto ficar rubro com a


vergonha. Tinha certeza que a mulher mais velha me encheria de perguntas e
só ficaria satisfeita quando eu respondesse a todas. Ela era minha vizinha há
mais de três anos e nunca me ouviu mencionar nenhum namorado ou homem,
e ela sempre me incentivou a ir a bares e boates para tentar conhecer gente
nova, sem muito sucesso. Esse estilo de vida, definitivamente, não era para
mim. E agora, magicamente, eu iria sair com alguém, e que essa pessoa era o
meu chefe, um bilionário que tinha o mundo inteiro aos seus pés. Deus, sorte
que eu tinha um expediente inteiro antes de encará-la e contar uma meia-
verdade.
— Ela concordou? — Tirou-me do transe momentâneo, parecendo
ansioso por uma resposta.

— Sim.

— Ótimo! — Fez uma pausa. — Já terminou de comer?

— Terminei, obrigada pelo café da manhã à moda italiana. — Sorri.

— Foi um prazer, tesoro.

Levantou-se de súbito, ajeitando o terno, e se aproximou de mim.


Curvando-se em direção ao meu rosto, tocou os lábios nos meus gentilmente,
dando-me um selinho. Querendo um pouco mais, segurei nos seus fios e
tentei desajeitadamente aprofundar o beijo, querendo sentir o calor e o
conforto da sua boca. Compreendendo o que eu queria, Andrea gemeu contra
mim e tomou o controle para si, envolvendo-me com a sua língua,
embriagando os meus sentidos, o gosto de café intensificando e tornando o
beijo ainda mais gostoso. Quando o puxei ainda mais em minha direção, ele o
findou, dando-me um beijo rápido na testa.

— Precisamos trabalhar, tesoro, por mais que a minha vontade seja te


levar a um hotel mais próximo e saciar minha vontade. Já esperei mais de um
ano, posso aguardar mais dois dias — sussurrou contra a minha orelha.

Estremeci quando ele mordeu meu lóbulo e o puxou de leve, seu


hálito na minha nuca mexendo com todas as minhas terminações nervosas, as
pernas ficando bambas. Presa ao desejo, o vi se afastar com as mãos no bolso
e respirei fundo, e olhei no relógio, constatando que em quinze minutos
Andrea tinha uma reunião. Só agora percebi que tinha esquecido de repassar
a agenda diária de Andrea…
Capítulo Dezenove

Era final de expediente de sexta e tudo estava silencioso pelo


escritório, o telefone não tocava há um pouco mais de uma hora, até mesmo o
fluxo de e-mails que costumávamos receber tinha diminuído. Como Andrea
estava tendo uma série de reuniões com representantes de outros locais que
duraria para além do horário de trabalho, não precisei atender o ramal que
tocava várias vezes quando ele estava ali, seja para pedir um relatório, para
que eu buscasse algum documento ou para roubar um beijo, algo que tinha se
tornado cada vez mais recorrente, para a minha completa surpresa e deleite.
Nem em meus sonhos poderia imaginar que Andrea me desejava nessa
proporção, tomando a minha boca em meio a reuniões com fome e ternura. E
eu estava apreciando esse meu pequeno poder em fazê-lo perder o controle,
mesmo que isso pudesse ser o meu maior erro, pois acreditava que isso era
somente uma ilusão que logo se estilhaçaria quando ele se cansasse de mim e
o desemprego viesse.

Suspirando melancólica, chequei se tinha enviado todos os


documentos que Andrea tinha me pedido mais cedo, e constatando que estava
tudo certo, desliguei o computador. Quando estava prestes a pegar a minha
bolsa e ir embora, o telefone soou e eu franzi o cenho. Sempre tinha alguém
que ligava e queria algo de última hora. Como era o meu trabalho, atendi:

— Boa tarde. Senhorita Beckett, em nome da Della Torre Company,


como posso ajudar?

— Ah, Adelle, aqui é o Jonas.

— Oi, Jonas, como vai? — Ele era um dos funcionários mais velhos
da companhia e uma das pessoas mais gentis e carismáticas que conheci.
Embora o edifício contasse com uma recepção moderna, com vários
funcionários, aquele senhor era responsável exclusivamente por receber as
cartas de Andrea e por avisar se algum visitante viria para aquele andar, o que
incluía seguranças e entregadores.

— Estou bem, obrigada. Chegou uma encomenda para você. Posso


mandar subir, senhorita?

— Para mim? Eu não pedi nada…

— Mas o moço diz que é para você!


Dei um suspiro, consternada, estranhando o fato, porém acabei
concordando.

— Pode subir, obrigada.

— Certo, moça. Boa tarde.

— Até logo, Jon.

Pousei o telefone no gancho e soltei um suspiro enquanto tentava me


recordar de alguma compra que eu possa ter feito e caiu completamente no
esquecimento em meio ao turbilhão de coisas que vinha acontecendo. Porém
nada vinha à minha mente. Minutos depois, um rapaz que parecia na casa dos
vinte, com o rosto cheio de espinha, adentrou no recinto, carregando várias
sacolas que pareciam provir de uma boutique de luxo. Arqueei a sobrancelha,
definitivamente não tinha sido eu que comprei aquilo.

— Senhora Beckett? — disse ao se aproximar de mim, hesitante,


provavelmente achando estranha a minha expressão.

— Boa tarde, eu mesma — fui cortês.

— Você pode assinar o recebimento, por favor? — Estendeu-me uma


prancheta enquanto, com a outra mão, ele segurava todas as sacolas.

— Claro. Você sabe quem enviou essas compras? — Peguei o objeto


das mãos trêmulas do rapaz e a caneta que estava amarrada, assinando o meu
nome no lugar que tinha um x, nem prestando atenção no documento.

— Andrea Della Torre.

— Entendo — entreguei a prancheta para ele —, só isso?


— Sim. Posso deixar as sacolas em cima da mesa, senhora?

— Oh, desculpe, nem me ative ao seu desconforto de segurá-las.

— Tudo bem. — Deixou-os próximo ao meu computador. — Tenha


uma boa tarde, senhora.

— Obrigada — sorri para ele que ficou vermelho.

O moço me olhou de cima a baixo antes de gaguejar algo e


relutantemente sair do ambiente, me deixando sozinha ali, com o coração
descompassado, assimilando o fato de que Andrea tinha comprado algumas
coisas para mim, e o número de pacotes indicavam que seriam muitas,
tentando imaginar quando ele conseguiu fazê-lo entre as atribulações, não
tinha ideia. Mas o fato dele ter tirado um momento do dia para me presentear
com o que quer que fosse, significou mais do que deveria. Fazia muito tempo
que ninguém se preocupava comigo dessa forma, me mimando. Curiosa,
aproximei-me da minha mesa e cuidadosamente abri a primeira sacola de
papel. Acima da seda que embrulhava algo, tinha um pequeno envelope
branco que, pela ausência de logo, indicava que era do meu chefe.
Calmamente, peguei e o abri, revelando o cartão pardo com uma mensagem
curta, assinada com a sua rubrica, porém que me fez tremer quando a li:

Me surpreenda, tesoro.

Se não gostar, compre outras.

Tire a manhã de folga para se preparar. Te buscarei em casa.

ADT
Surpreendê-lo? Ignorando as outras palavras e deixando-me levar pela
ânsia de saber logo o que tinha ali, removi o embrulho da primeira sacola,
sentindo-me incrédula ao olhar para o conjunto de uma espécie de top bordô
rendado com manguinhas, que não cobriria absolutamente nada dos meus
seios, e uma calcinha tão pequena com amarração lateral que me fez
questionar se de fato serviria. Deixando-as de lado, peguei outro embrulho e
franzi o cenho quando vi outro conjunto tão pequeno e sensual, só que de um
modelo completamente diferente. Fiz o mesmo com todos os conteúdos da
sacola, arregalando os olhos à medida que os olhava um por um.

Ele queria mesmo que eu usasse aquelas peças?

Não podia negar que achava cada uma mais bonita do que a outra e
que, embora os tecidos e rendas fossem de excelente qualidade, me indicando
que deveriam terem sido extremamente caras e de bom gosto, confesso que
só de olhá-las me fez hesitar. Nunca tinha usado algo tão provocante quanto
essas lingeries, estava acostumada a usar apenas aquelas feitas para o dia a
dia, então foi inevitável não me sentir insegura. Mas não era eu que ditava as
regras do contrato, então atenderia ao desejo de Andrea de ver-me amanhã
vestindo algo mais sexy e sofisticado. Só não sabia qual delas escolheria.

Um lampejo de lembrança cruzou a minha mente e me fez sorrir.


Tinha adquirido algo que pensei em usar há alguns meses, mas que tive
vergonha de fazê-lo. Eu teria coragem agora? Me parecia a melhor opção e
combinaria em muito com um vestido que eu tinha.

É, Andrea nunca esperaria por isso…


Capítulo Vinte

— Você está linda, Adelle — Ashley comentou enquanto eu entrava


no seu campo de visão. Tinha dito uma meia verdade a ela sobre o meu
encontro, que não era bem um, como Ash acreditava que era. Ela tenha ficado
receosa quando disse que seria com o meu chefe, pois tinha aquela visão de
que os homens ricos convidavam suas funcionárias apenas para brincar com
elas, o que não deixava de ser uma verdade. Apenas tinha omitido o fato de
que eu tinha recebido uma bela soma em dinheiro, apenas para deixar-me ser
usada por Andrea da forma que bem entendesse.
— Obrigada — sorri para a mulher.

— Tá tão bonita igual uma princesa — meu irmão bateu palminhas,


animado, porém, ele fez uma pausa, parecendo pensativo —, que nem a
Fiona, Del.

— Fiona, querido? — Agachei-me sobre meus saltos, ficando na sua


altura, e removi uma mecha de cabelo que caía sobre seus olhos. Fitá-lo me
dava ainda mais certeza de que estava fazendo a coisa certa.

— Eu amo tanto ela — fez uma pausa, mexendo uma perninha —


Mas amo mais você, Del.

— Oh, meu anjo. — Sussurrei, emocionada.

Com os sentimentos em polvorosa e nervosa pelo que estava preste a


fazer, abracei-o carinhosamente, precisando sentir o calor do corpinho dele
trajando um pijama contra o meu. Tive que me controlar para não deixar que
as lágrimas que se assomavam em meus olhos escorressem e acabassem por
borrar o rosto com meu rímel e delineador.

— Eu te amo tanto que você nem pode imaginar, Will — sussurrei


para ele, dando um beijo em sua bochecha, por sorte meu batom era daqueles
que não saiam, e ergui-me nos meus saltos, ajeitando a fenda do meu vestido
que tinha embolado nas minhas pernas.

Olhei-me no pequeno espelho que ficava na sala e de repente me senti


insegura. Apesar de eu achar que o traje valorizava minhas curvas e deixava
minhas pernas mais longas, tinha ciência de que não chegava aos pés
daqueles vestidos de grife que as mulheres, sejam esposas, namoradas ou
amantes dos executivos costumavam usar. E o pequeno ponto dourado que
adornava o vale dos meus seios, chamando atenção para o meu busto, estava
longe de ter vários quilates. Eu me recusava a gastar algo no cartão
corporativo que tinha chegado hoje pela manhã, mas, ao mesmo tempo, tinha
medo de não ter o obedecido e da sua reação.

— Ele sentirá vergonha de mim? — perguntei a mim mesma, e odiei-


me por ter falado isso em voz alta.

— Não mesmo, querida — Ashley pousou suas mãos nos meus


ombros, encorajando-me. — Ele seria um grande tolo se ficasse. Você ficaria
linda até mesmo usando trapos, Adelle — fez uma pausa e pude ver seu
sorriso refletido no espelho —, te garanto que chamará atenção de todos os
homens do restaurante e do lugar onde for.

— Obrigada — tentei parecer mais confiante.

— Se na minha época de jovem eu fosse tão bonita quanto você, eu


não teria tido apenas dois divórcios, mas uma penca deles. — Gargalhou, me
fazendo rir também.

— Você pode se casar outra vez, ainda é jovem.

— Estou trabalhando nisso, mas os homens não querem nada com a


dureza… — Deu de ombros.

— Bem que você poderia dar uma oportunidade para o Scott, do


andar de baixo.

— Veremos — fez-se de desentendida. — Não está na hora de você


descer?
— Sim. — Olhei as horas no relógio do celular e soltei um suspiro. —
Tem certeza que não será um problema você dormir aqui, Ash?

Senti meu coração se apertar um pouco por saber que eu passaria a


noite fora, como sempre ocorria quando eu precisava fazê-lo. Eu estava sendo
uma tola, sabia, mas era inevitável não me sentir assim todas as vezes.

— Claro que não. Apenas se divirta e não pense em mais nada. Você,
mais do que ninguém, Del, merece um tempinho só para si, ainda mais com
um homem bonito como aquele. — Riu, me dando uma piscadela. —
Qualquer coisa, te ligo. Agora vá, antes que se atrase.

— Obrigada.

Despedi-me dos dois, dando um abraço mais apertado em Will, e


peguei minha bolsa de mão, sentindo os meus dedos suados de ansiedade.

Entrando no elevador, tentei me controlar, respirando fundo várias


vezes até que me senti mais calma. Definitivamente, não tinha sido paga para
agir como uma adolescente insegura a caminho do seu primeiro encontro.
Nem havia motivo pela qual temer tudo que iria acontecer essa noite, pois
ambos queríamos e era inegável o prazer que sentíamos juntos. Soltando um
suspiro profundo, deixei a caixa de metal e caminhei lentamente pelo hall
antigo do prédio até a rua, sentindo uma brisa fresca tocar a minha pele nua,
arrepiando-me. Mas o que me deixou com a boca seca foi o homem
encostado na lataria do esportivo tão imponente quanto ele, iluminado pela
luz do poste. Diferentemente das outras vezes que o vi na empresa e o
acompanhei a alguns eventos e jantares, seus cabelos estavam penteados para
trás e usava um terno azul marinho, uma camisa social azul clara, que estava
com alguns botões abertos e não levava a costumeira gravata, o que o deixava
com uma aparência sofisticada mas, ao mesmo tempo, casual. Incrivelmente
másculo e sexy.

Andrea seria apenas meu naquela noite, como eu também me


entregaria a ele. A perspectiva, somada ao sorriso lento que se formava em
seu rosto, e o brilho em seus olhos azuis enquanto o magnata se aprumava e
caminhava em minha direção, fazia com que qualquer ressalva e insegurança
que eu tivesse evaporasse em meio ao desejo que correu por todo o meu ser.

Quando se aproximou o suficiente, envolveu minha cintura com o


braço firme e colou nossos corpos. O modo como me fitava, sua respiração
começando a ficar descompassada, despertava uma chama que somente ele
poderia aplacar.

— Você está maravilhosa, tesoro — murmurou contra o meu pescoço


com voz rouca, sua barba roçando a minha pele sensível, arrepiando-me,
enquanto sua mão deslizava pelas minhas costas em uma carícia sútil,
aquecendo-me. — Perfetta per me, mio cioccolato. È mia[23].

Não entendia completamente o significado das suas palavras


sussurradas em italiano, porém a sonoridade fazia meus pelos se arrepiarem.
E quando seus lábios pousaram na minha pele percorrendo toda a extensão da
minha garganta lentamente, joguei a minha cabeça para trás, dando a ele mais
acesso, e segurei os seus ombros, cravando minhas unhas no seu blazer,
deixando minha bolsa cair. Estávamos no meio da calçada onde alguém
poderia nos ver, porém nada além das sensações que me invadiam e do toque
dele me importavam. Gemidos e sons roucos saíam dos nossos lábios, me
indicando que ambos nos encontrávamos presos na espiral que nos consumia.
Mordiscando meu queixo e meu maxilar, subiu com uma das mãos, correndo
por toda a extensão das minhas costas, até segurar a minha nuca com força,
trazendo meus lábios de encontro ao seu, enquanto a direita deslizava pela
minha espinha até pousar sobre a minha bunda.

Diferentemente dos beijos que trocamos desde que assinei o contrato,


esse não começou lento, mas sim com fome, exigindo a minha entrega com
sua boca enquanto me fitava com seus olhos ardentes que com toda certeza
refletia o que havia nos meus. A pressão da sua língua e lábios, seus
movimentos famintos que me devoravam, a qual tentava responder na mesma
medida, me deixava cada vez mais perdida e desesperada pelo desconhecido.
Arfei quando apertou minha nádega com mais força, fazendo com que eu
sentisse ainda mais a rigidez dele contra minha feminilidade, que pulsou
quando ele se esfregou em mim, em um espasmo involuntário. Seu olhar
preso ao meu enquanto me provava agia como um afrodisíaco em minhas
veias, deixando-me cada vez mais ansiosa por algo que não sabia.

Quando arqueei meu corpo ainda mais em direção ao dele, ele


interrompeu o beijo, a perda do contato me assolando de uma forma que não
deveria sentir.

— Andrea — dei um selinho em seus lábios, sem soltá-lo, não o


queria. Meu peito subia e descia com a respiração acelerada.

— Tesoro.

Massageou o meu couro cabeludo e com a outra mão, adentrou pela


fenda do meu vestido até encontrar a minha calcinha, tocando a renda lateral
em uma carícia lenta. A palma quente em contato com a minha pele
arrepiava-me, ao mesmo tempo que me inflamava e me deixava bamba.
Quando seus dedos tocaram o meu monte coberto pelo tecido, precisei me
apoiar ainda mais sobre seus ombros e mordi os lábios para não deixar que
um gemido alto escapasse pelos meus lábios.
[24]
— Schianto … — Brincou comigo mais um pouco e afastou a
mão, um sorriso depravado tomando todo o seu rosto e olhar. Com um
movimento súbito, afastou-se de mim, e curvando-se pegou a bolsa,
completamente esquecida, Dando-me a mão e entregando-me a bolsinha, me
puxou para próximo do carro, destravando o alarme enquanto caminhávamos.
— Vamos, mio cioccolato? Você irá gostar do jardim do restaurante do Four
Seasons.

— Andrea? — Me desvencilhando dos seus dedos, quando chegamos


perto do veículo, o segurei-o pela lapela do seu blazer, fazendo-o olhar para
mim.

— Sì?

— Me leva para sua cama. Me faça sua. — sussurrei contra os seus


lábios. Mandando às favas todo o meu bom senso, segurei seu queixo com a
barba aparada e o beijei desajeitadamente, precisando sentir seu gosto
novamente.
Capítulo Vinte e um

Soltando um grunhido rouco de excitação ao ouvir a voz dela trêmula


de desejo me pedindo para fazê-la minha, girei nossos corpos com uma mão,
envolvido pelo seu beijo, e a prensei contra a lataria do meu carro sem me
importar com o impacto ao veículo e nem com a bolsa entre nós. O toque
inocente dela em meus lábios e os movimentos lentos da sua língua faziam
com que todo o meu autocontrole e determinação em ser o amante frio ruísse,
por mais que eu lutasse contra isso. Mesmo que ela quisesse apenas dinheiro,
sua resposta a mim era real, e isso bastava para que eu me entregasse ao
desejo irracional que sentia por ela, sem pensar muito no que isso significava
e no porquê ela me despertava assim. Agindo como um adolescente afoito, a
esmagava-a com meu corpo e boca, esquecendo-me completamente de que
estávamos em um lugar público. Eu precisava senti-la como nunca,
necessitava do seu desejo e das suas reações, como um homem faminto por
uma refeição substanciosa. Quanto mais a beijava, sentia seu gosto e o calor
do seu corpo através do meu toque, ouvia seus gemidos e sons, mais minha
ânsia por ela crescia ao ponto de sentir dor não somente física, mas de algo
que matei dentro de mim.

Preso a sensação poderosa que me tomava, me sentia cada vez mais


irracional, ao ponto de querer tomá-la ali mesmo, até que um relâmpago de
sanidade cruzou a minha mente. Embora ela fosse responsiva, ela era virgem
e inexperiente, e merecia mais do que isso, embora eu a tivesse comprado por
uma soma vultuosa. Com esse pensamento em mente, apartei o beijo com um
selinho e tomei seu rosto entre os dedos, fazendo seus olhos verdes me
fitarem.

— É sua primeira vez, você merece algo especial, affetto.

— Não preciso que você me dê uma noite romântica, Andrea, o que


seria uma ilusão tola que não precisamos. — Sua voz saiu decidida, como se
estivesse falando de negócios, embora os seus olhos me passassem uma
mensagem completamente diferente que poderia ser fruto apenas da minha
imaginação.

Pela primeira vez na vida, engoli em seco. Ouvir minhas palavras


redigidas no contrato ditas por ela fez com que algo desconhecido se
revirasse dentro de mim, mas tratei de ignorar.
— Apenas necessito do desejo e das sensações que você me
proporciona — completou. — Sem cobranças, sem sentimentos…Apenas
sexo e prazer… — sussurrou em um fio de voz.

Assenti, sem saber o que responder. Era aquilo que eu queria, não é
mesmo? Saciar minha fome por ela até que eu estivesse completamente
satisfeito e seguir minha vida, sem precisar dar nada em troca além do
dinheiro e presentes caros. Era o que nós desejávamos, certo?

— Certo, tesoro. — Fiz um carinho no seu rosto e ela fechou os


olhos, gesto que me massacrou por dentro. — Serei cuidadoso e poderemos
pedir algo depois.

Ela não respondeu, apenas maneou a cabeça concordando, e eu abri a


porta do carro para que ela entrasse. Quando ela estava acomodada no
assento, colocando o cinto, bati a porta e fiz o mesmo antes de ligar a chave
na ignição, acender os faróis e dar a partida. Enquanto dirigia para sair da
região em que Adelle morava, vez ou outra virava para ela ou a olhava pelo
retrovisor, contemplando o brilho nos seus olhos e o leve sorriso sensual que
pairava em seus lábios, boca que queria novamente sob a minha. Sem resisti,
infiltrei minha mão pela fenda do seu vestido, que estava um pouco mais
levantada, e a pousei sobre a sua coxa, sentindo a pele quente e sedosa sob o
meu toque, arrancando um gemido leve dela, bem como um remexer no
assento que senti diretamente no meu pênis, excitado pelos beijos trocados e
pela expectativa do que iria acontecer.

***

— É de tirar o fôlego — Adelle arfou enquanto caminhava lentamente


até a janela panorâmica, pousando suas mãos no vidro olhando para as luzes
da cidade.

Aproveitando sua distração momentânea, deixei que meu olhar


percorresse o seu corpo de cima a abaixo, gravando em minha memória todos
os traços das suas curvas reveladas pelo vestido justo preto. Ela era mais
gostosa do que ela poderia imaginar e só de olhá-la me deixava aceso, tudo
em mim era consciente dela. Nunca ninguém foi capaz de destruir todo o meu
autocontrole como a mulher à minha frente, por mais que eu fizesse de tudo
para manter-me distante. Adelle poderia só querer o meu dinheiro, algo que
de certa maneira quebrou parte da confiança que depositava nela, porém ela
era a única que conseguia fazer-me perder o fio de racionalidade. Como
agora eu o fazia…

— Realmente rouba todo o meu ar, tesoro. — Respondi após alguns


minutos, depois de ter devorado com o olhar a bunda perfeitamente redonda e
empinada, de tamanho avantajado, sem me importar com o duplo sentido.
Nádegas que tinha apertado com meus dedos e estava louco para senti-lo nu
enquanto rebolava no meu pau, posição que ficaria para outro dia.

— Pena que está escuro para ver o Central Park. — Pareceu absorta, o
significado dúbio da minha frase passando despercebido.

Removendo o blazer do meu terno, caminhei lentamente até onde ela


estava, sentindo o desejo insano de tê-la rendida em meus braços, dessa vez
nua, pulsar dentro de mim.

— Podemos apreciá-lo quando amanhecer, tesoro — sussurrei em sua


orelha, enquanto com o meu corpo a prensava contra o vidro, fazendo-a
arfar.

— Hm… — gemeu ainda mais quando eu enrolei os seus cabelos,


jogando-os para a lateral e mordisquei seu pescoço, o cheiro de chocolate que
emanava da sua pele me fazia o seu refém.

Enquanto trilhava um caminho de beijos, mordidas e lambidas, passei


a explorá-la com as mãos, percorrendo cada pedacinho coberto pelo tecido
preto, fazendo com que ela jogasse a cabeça para trás, apoiando-o em meus
ombros, e arqueasse seu corpo de encontro ao meu. O roçar inocente do seu
traseiro contra a minha pelve fazia com que eu emitisse sons roucos,
murmurando palavras inteligíveis até para mim mesmo. Querendo sentir seu
gosto novamente, segurando sua cintura com força, girei-a para mim e tomei
os seus lábios entreabertos com os meus, infiltrando a minha língua na sua
cavidade quente e úmida, provando cada canto da sua boca lentamente,
deliciando-me com o seu gosto que me deixava viciado e sedento. Seus olhos
verdes brilhavam com uma intensidade que nunca tinha visto antes, e por um
momento eu senti que estava perdido, porém, mais tarde, teria tempo para
matar todas essas coisas criadas pela minha mente escrava do impulso. Por
agora, me bastava saciar minha fome pela Adelle.

Soltando um pequeno protesto pela minha lentidão, Adelle levou as


mãos aos meus cabelos e os puxou, implorando com gestos que eu
aumentasse o ritmo e a pressão que meus lábios exerciam sobre os seus.
Porém a inocência dos seus movimentos era uma constante lembrança de que
eu não deveria impor toda a minha fome e voracidade para cima ela. E eu
tinha o restante da noite para fazê-la minha…
Ainda segurando-a de encontro ao meu corpo e preso às sensações
despertadas pelo seu beijo, dei alguns passos para trás, fazendo-a se agarrar
ainda mais a mim pela falta de equilíbrio, até ficarmos sob a luz do lustre.
Quando fosse despi-la, queria poder ver e admirar cada pedaço dela. Não
podia negar que estava louco para vê-la trajando uma das lingeries que
escolhi e comprei para ela, peças que passaram a fazer parte das minhas
fantasias. Com ela usando cada uma delas. Motivado pelas imagens eróticas
criadas por mim mesmo, sem deixar de fitá-la, enquanto exigia a redenção
dela com a minha boca que passou a devorá-la, segurei um pedaço do tecido
que a cobria e comecei a subi-lo pelo seu corpo, deslizando-a para cima,
aproveitando para roçar de leve o dorso dos meus dedos em sua pele em uma
carícia sensível, sentindo-a estremecer de encontro ao meu corpo.

— Andrea — gemeu meu nome contra a minha boca e para minha


surpresa, enquanto eu ainda a tocava, ela prendeu meus lábios com os dentes
e os puxou de leve, provocando um leve estalo que reverberou por todo o
meu corpo.

— Tesoro.... — Soltando o tecido do seu vestido, levei minhas mãos


ao seu rosto e, segurando-a entre meus dedos, fitei-a por alguns momentos,
apenas para beijá-la novamente, completamente embriagado por ela, agindo
como um tolo sedento. Mas quanto mais eu a tomava com meus lábios e
língua, mais eu a queria. Ela agia como um afrodisíaco pelo meu corpo, que
não se importava nem um pouco com sua ambição.

— Dispa-se para mim, mio cioccolato. — Decidi, ofegante, enquanto


beijava sua mandíbula e seu queixo, trazendo ar para meus pulmões. —
Quero que seja você a fazê-lo, que você se sinta preparada e autoconfiante
para mostrar-se para mim.

— Então ajude-me a fazê-lo, Andrea. — Com a voz rouca, pousou


suas mãos na minha e deixei que ela conduzisse meus membros pelo seu
corpo com movimentos lentos, parecendo apreciar cada um deles, e sons
baixos escapavam da sua garganta. Rocei suavemente nos seus seios, na
cintura, até alcançar a coxa exposta pela fenda lateral do vestido, fazendo-nos
estremecer.

Nunca um gesto me pareceu tão erótico na minha vida e, soltando um


grunhido alto, precisei de todo o meu autocontrole para não dar vazão a
minha ânsia de deitá-la no tapete e fazer sexo com ela ali mesmo.
Movimentando meus dedos com gentileza, ela fez com que eu segurasse o
tecido, começando a subi-lo lentamente, estremecendo e arqueando seu
corpo, enquanto mantinha meus olhos presos aos seus, até remover o vestido
pelos braços, jogando-o para o lado. Quando o fez, afastou-se de mim e do
meu toque, e eu quase rugi em protesto, porém ele morreu em meus lábios
quando a percorri de cima abaixo, analisando-a das pontas dos pés calçados
no salto alto, passando por suas panturrilhas firmes, suas coxas mais roliças,
que tinham as tão faladas imperfeições, e por sua barriga não tão lisa.

Mas o que me fez ficar desconcertado foi olhar o seu sexo coberto por
uma calcinha verde-escura de renda floral com um pequeno lacinho a
enfeitando, maior do que as que eu havia comprado, mas ainda mais sensual
do que aquelas, combinando com um sutiã meia-taça sem bojo da mesma cor,
que ressaltava seus seios perfeitos e arfantes com a respiração acelerada.
Adelle era uma verdadeira deusa, ainda mais bella, seminua com os cabelos
soltos, e um meio sorriso pairando em seus lábios pintados de vermelho.
Quase não percebi a pequena correntinha de ouro que destacava ainda mais o
seu busto.

Sentindo a boca cada vez mais seca, meu coração acelerado e meu
pênis rígido contra o tecido da minha cueca e calça, aproximei-me novamente
dela e a abracei, tocando a pele nua das suas costas, acariciando-a, apreciando
o calor e a suavidade de Adelle. Com uma ternura que não sabia existir em
mim, dei um beijo em sua testa quando ela se encolheu contra o meu corpo,
como se fosse uma gatinha.

— Gostou, Andrea? — perguntou com suavidade. — Não é tão linda


quanto as que você comprou, mas…

— Se eu gostei, tesoro? — Percorri à sua espinha até alcançar as


nádegas firmes e macias, massageando o local, sentindo a renda sob o meu
toque, arrancando gemidos dela. — Dio, está perfetta. Mais schianto do que
imagina…

Com um som rouco, brinquei com o tecido e a popa da sua bunda


exposta pela calcinha enquanto tomava-a em um beijo faminto, sentindo-a
cada vez mais mole contra mim, suas unhas fincando em meus ombros
buscando o apoio para se manter de pé. Seu corpo me indicava que ela já
estava completamente à minha mercê para o que eu quisesse fazer com ela.
Adelle era minha.

— Enlace suas pernas na minha cintura, Adelle. — Interrompi o beijo


com um selinho.
— Eu…

— Não te deixarei cair, nunca.

Mesmo receosa, ela deu um impulso e, com a minha ajuda, enlaçou-


me com os braços e pernas, me apertando com uma força que me deixou
surpreso e ao mesmo tempo, teso. Foi inevitável não desejar senti-la me
envolvendo daquela forma enquanto eu entrava e saía de dentro do seu canal
também apertado. A perspectiva de tê-la tão aferrada a mim me deixava duro,
porém ter sua feminilidade protegida pelo tecido frágil da calcinha roçando
de encontro ao meu pênis, enquanto caminhava pela suíte presidencial até
levá-la para cama, era ainda mais doloroso. Principalmente quando ela me
beijava, gemia e se esfregava contra mim involuntariamente. Precisei de toda
a força que tinha nas pernas e meu autodomínio para não vacilar, sucumbindo
ao desejo como um jovem inexperiente afoito.

Controlando-me, aproximei-me da king size e a pousei suavemente na


beirada do colchão, tocando os seus lábios vermelhos e inchados pelos meus
beijos com as pontas dos dedos, até que, me surpreendendo, os tomou em sua
boca, lambendo e sugando como se fosse meu pênis, e meu fluxo sanguíneo
se acumulou no meu pau. Dio, era demais até mesmo para mim. Removi
meus dedos e ela soltou um suspiro, seu olhar antes brilhando de satisfação
pareceu arrefecer. Toquei seu rosto gentilmente e ergui seu queixo para mim.

— Eu... — Pareceu insegura e odiei vê-la assim.

— Você não me decepciona em nada Adelle…

— Entendo…
Para acabar de vez com a hesitação que via na minha amante, peguei a
sua mão e aproximei-a da minha carne rígida.

— Está sentindo, tesoro? — Apertei-lhe os dedos contra o meu pau e


guiei Adelle para que ela me massageasse por cima da calça, fazendo-me
gemer. — Eu te desejo muito, schianto, e agora vou provar isso com minhas
mãos e boca.

Ouvindo-a arfar, tirei o sapato e as meias desajeitadamente enquanto


ela me observava, impaciente, e removi os botões das casas da minha camisa
social e a tirei, deixando meu tórax a mostra, querendo sentir um pouco da
pele dela em contato com a minha. Subindo na cama, soltando um gemido,
trouxe uma Adelle admirada, para o centro da king e a prensei com meu
corpo contra o colchão macio, colando-nos, nossas pernas entrelaçadas. Sua
palma quente espalmada contra o meu peitoral e seu olhar, que era uma
mistura de luxúria e inocência, não desviava do meu, seus cabelos espalhados
pelo travesseiro e seus lábios entreabertos fizeram com que um calafrio me
varresse, que um fogo me incendiasse como nunca tinha sentido antes.

Com uma paciência e ternura que não sabia que existia dentro de
mim, capturei sua boca novamente com lentidão, desfrutando das sensações
que sua língua enroscada na minha me proporcionava. Estava cada vez mais
inebriado por aquela mulher que, mesmo sendo virgem e comprada, se
entregava a mim com intensidade, o arquear da sua pélvis contra a minha, o
modo como seus lábios se moviam contra os meus, cada vez mais confiantes,
e os gemidos que emitia me indicavam o quanto Adelle estava totalmente
rendida ao prazer que eu proporcionava. E, embora eu tentasse negar para
mim mesmo, minha secretária exigia de mim o mesmo, o que eu concedia
sem pensar que eu deveria me manter distante emocionalmente. Ela
arrancava de mim, apenas com o seu beijo e calor, tudo que eu não estava
disposto a dar a ninguém. Cazzo, eu estava fodido, mas só o agora me
importava, só o meu desejo por aquela mulher.

Me acomodando melhor sobre ela, sustentando meu peso sob um


cotovelo, passei um braço pelas suas costas, acariciando a base da sua coluna
enquanto minha língua brincava com a sua. Seus dedos faziam movimentos
circulares pelo meu peito, suas unhas arranhando minha pele de leve.
Querendo mais dela, sentir o sabor da sua pele, escorreguei minha boca pela
linha do seu maxilar, deixando uma leve mordida em seu queixo
determinado, trilhando um caminho de beijos pela sua garganta, fazendo-a se
contorcer embaixo de mim, sua feminilidade coberta pela renda roçando
contra o volume por debaixo da calça social. Como um jovem afoito, senti
quando uma gota do meu pré-gozo escorregou pela minha extensão, tamanho
o descontrole do meu corpo em tê-la. Mas com Adelle eu tomaria todo o meu
tempo, queria tudo que ela poderia me oferecer.

Expondo sua garganta ainda mais para mim, mordisquei a pele


sensível dela fazendo arquear-se ainda mais contra mim. Suas unhas
cravando com força era um pouco doloroso, porém meu ego apreciava e
muito sua reação selvagem.

— Gosta, tesoro? — perguntei com a voz rouca, depois que eu desci


mais com a minha boca e corpo, lambendo o vale dos seios expostos pelo
decote do sutiã extremamente sexy. Definitivamente, verde era uma cor que
combinava com o tom moreno da sua pele e seus olhos, levando-me à
loucura. Se contorcendo, conseguiu desvencilhar suas mãos do meu peito,
para pousar uma nas minhas costas, fazendo com que meus músculos
ficassem ainda mais rígidos sob o seu toque, e outra levou aos meus cabelos,
segurando os fios com força, prensando minha cabeça contra os seus seios
que subiam e desciam pela respiração acelerada.

— Por favor, Andrea — a voz rouca implorava e, grunhindo, beijei o


seu colo enquanto minha mão trabalhava no fecho do sutiã. Quando soltei o
gancho, ergui-a um pouco do colchão e ao compreender minha intenção,
ajudou-me a retirar a peça, estremecendo enquanto meus dedos roçavam em
sua pele, principalmente na lateral dos mamilos, os pelinhos finos se
arrepiando com o meu toque. Dio, como aquela mulher era responsiva a
menor carícia que eu fazia.

Com delicadeza, terminei de removê-la, colocando-a em cima do


móvel de cabeceira, e deitei de novo Adelle, observando seus seios, que eram
de tamanho médio e firmes, os bicos marrons rijos somente pelo meu afago.
Sentindo-me subitamente emocionado, levei meus dedos trêmulos a carne
macia, apertando-os gentilmente, meus polegares brincando com as pontas
excitadas, enquanto observava uma miríade de coisas refletirem nos olhos
verdes, seus lábios entreabertos e inchados, clamando pelos meus beijos.
Dando atenção a lateral dos seus seios, a qual descobri que era uma das suas
zonas erógenas, abaixei-me contra ela e tomei um mamilo na minha boca,
puxando-o suavemente, arrancando um gemido alto da sua garganta que
reverberou diretamente no meu pau.
Lentamente eu a provava enquanto continuava a tocá-la com as mãos,
traçando com a língua círculos ao redor da aréola, apenas para sugá-lo
devagar, aumentando o ritmo e diminuindo novamente, deixando um rastro
molhado pela sua pele quando eu me direcionava para o outro, tomando-o
entre os meus dentes. Nossos gemidos ecoavam por todo o quarto, e Adelle
se movia em busca do próprio prazer embaixo de mim, esfregando nossos
sexos um no outro instintivamente, conduzindo-nos em uma dança só nossa,
ao mesmo tempo que suas mãos nas minhas costas me puxavam ainda mais
contra ela, arranhando-me. Era uma carícia selvagem, desesperada, porém, ao
invés de eu sentir dor, só consegui mergulhar ainda mais no júbilo de tê-la
entregue em meus braços.

Sentindo a fome e a ânsia crescendo dentro de mim, soltei o mamilo e


lambi o vale dos seus seios adornado apenas pela semijoia, e desci ainda mais
com a língua, beijando a barriga com aquelas imperfeições que a faziam mais
mulher e humana aos meus olhos, muito mais gostosa, conferindo atenção a
uma pintinha próxima ao umbigo que me fascinou.

— Andrea — sussurrou meu nome, arqueando a pelve quando


aproximei minha boca do seu sexo apenas para subir novamente, lambendo
sua pele em direção aos seus seios, e levar uma mão em direção a sua
calcinha, brincando com ela.

— Sì, tesoro[25]? — Friccionei meu dedo no tecido fino que cobria sua
entrada, percebendo o quanto ela já estava excitada, quase pronta para mim.

— Eu… — Pareceu perder o ar quando tomei seu mamilo novamente


entre meus dentes.
Compreendendo o que ela queria, levei a minha mão a sua,
segurando-a firmemente e a guiei até a sua calcinha, ajudando-a lentamente
com a outra mão a baixá-la até a suas coxas. Soltando-a brevemente e
erguendo um pouco o meu corpo, terminei de removê-la, deixando-a
completamente nua e exposta para mim. Uma visão deliciosa, a realidade
superando toda a minha imaginação febril.

Segurando novamente sua mão, fiz ela roçar os próprios dedos contra
a sua feminilidade e abrir seus grandes lábios, apenas para conduzir
lentamente seu indicador pelo seu canal, arrancando dela um arfar. Guiando-a
até o seu centro, fiz ela se masturbar para mim através dos círculos lentos que
eu a conduzia sobre seu clítoris.

— Já tinha se tocado assim antes, tesoro? — disse enquanto levava


meus lábios ao seu outro seio, aumentando a fricção com que ela se
massageava. Seus olhos estavam fechados e ela se arqueava com cada vez
mais cadência contra as nossas mãos, sons escapando pelos seus lábios. Tal
momento iria assombrar por muito tempo minhas fantasias e sonhos.

— Não… Andrea — sussurrou, cravando suas unhas com ainda mais


força em minhas costas, quando não me aguentei mais e, removendo sua
mão, inseri meu dedo em seu canal apertado, sentindo-a completamente
molhada, movimentando-me da maneira que eu queria fazer com o meu pau,
explorando todas as texturas do seu sexo.

Sem deixar de tocá-la devagar, esfregando suavemente seu clitóris,


ergui-me um pouco mais e a beijei com toda a fome que sentia, capturando os
seus gemidos apenas para mim. Quando ela se arqueou ainda mais, inseri
outro dedo e intensifiquei a velocidade dos meus movimentos, tomando
cuidado para não a machucar, conduzindo-a mais longe, a respiração
acelerada e a forma que seus músculos internos comprimiam meus dedos que
entravam e saiam do seu canal me indicavam isso.

— Por favor — gemeu contra os meus lábios pedindo por algo que
nem mesmo sabia o que era, mas eu podia ver pela sua expressão que estava
perdida de desejo.

Apreciando a entrega, removi um dedo e com o outro comecei a


friccionar sua carne inchada, fazendo-a se contorcer ainda mais debaixo de
mim até que, abraçando-me com força enquanto eu ainda a beijava, ela se
deixou levar pelas sensações proporcionadas pelo orgasmo. A imagem dela
de olhos fechados, sua pele brilhando de suor, os cabelos molhados e a
respiração acelerada fizeram com que mais líquido escorresse pela minha
glande, provavelmente não duraria mais tempo. Aproveitando o seu estado de
relaxamento, desvencilhei-me dela que me fitou. Fiquei de pé, removi o cinto
e abri a braguilha da calça, tirando-a, juntamente com a cueca boxer.
Massageando o meu pênis suavemente, soltando um gemido doloroso, me
abaixei, procurando no bolso da calça um pacote de camisinha. Rasgando o
invólucro, coloquei-a em meu pau que pulsava, descartando a embalagem em
algum lugar.

Protegido, ajeitei-me sobre Adelle. Com os cotovelos apoiados no


colchão para não a esmagar, roubei mais um beijo e a olhei. Um momento de
consciência me atravessou.

— Você quer mesmo isso, Adelle? Eu posso esperar você estar


pronta. — Minha voz soou rouca e eu toquei o seu rosto gentilmente.

— Faça-me sua, Andrea. — Sussurrou ao segurar meu queixo e dar-


me um beijo cálido, o roçar da sua pélvis na minha ereção me dando o seu
consentimento.

— Entrelace seus dedos na minha mão — pedi, e ela ergueu seus


dedos trêmulos e suados, segurando uma das minhas mãos, e praticamente
perdi um dos apoios ao pedir para fazer isso. — Serei o mais gentil que
puder.

Assentiu.

— Eu confio em você…

Querendo acreditar nas suas palavras, abri um pouco as suas pernas,


acomodando-me em sua entrada, e a beijei novamente enquanto, pouco a
pouco, lentamente, a penetrava, vendo a dor tomar a sua expressão antes
inebriada, seus músculos me apertando com a invasão. Sem parar de tentar
distrai-la com meus lábios, saí lentamente de dentro dela, e impulsionei meus
quadris, adentrando-a novamente com calma, rompendo a barreira da sua
virgindade. Odiei-me ao senti-la ficar tensa com a dor, as lágrimas se
assomando em seus olhos fechados. Tinha tentado prepará-la da melhor
maneira possível para a invasão, porém me perguntei o que poderia ter feito
de diferente para mitigar seu sofrimento. Sentindo meu peito apertar, beijei
sua testa e suas pálpebras, e comecei a sussurrar palavras carinhosas em
italiano enquanto, usando todo o meu autocontrole, forcei-me a me manter
parado, esperando que ela se acostumasse com a minha presença, embora
minha vontade fosse me movimentar no seu canal quente.
Fitou-me com os olhos nublados e, apertando meus dedos com mais
força, remexeu um pouco os quadris. Deixei que ela tomasse o seu tempo e
controlasse quando nos moveríamos. Ainda dentro dela, trilhei um caminho
de beijos novamente pela sua garganta e ela arqueou-se contra mim algumas
vezes, pedindo silenciosamente com seu corpo, e eu iniciei os movimentos
quando a senti menos tensa diante das carícias da minha boca, entrando e
saindo do seu canal, friccionando suas paredes internas com meu pênis
protegido pela camisinha.

— Deliziosa — murmurei ao arremeter novamente para dentro dela,


indo cada vez mais fundo, já estava perto do ápice.

— É desconfortável e um pouco doloroso, mas bom... — Sussurrou a


elevar os quadris, aprendendo os movimentos da dança mais antiga do
mundo. — Beije-me, Andrea. Toque-me.

Sem dizer nada, desvencilhei nossos dedos, e levei a minha mão ao


seu seio para massageá-lo enquanto a degustava e a penetrava, sentindo-a me
apertar ainda mais. Soltando um grunhido, deixei-me levar pelo prazer que a
duras penas tinha controlado até ali, e movimentei-me freneticamente em
busca do êxtase. Quando estava chegando quase lá, o líquido do meu pré-
gozo sujando a camisinha, levei meu dedo a sua vagina e, abrindo os grandes
lábios sem deixar de penetrá-la, friccionei seu ponto de prazer com a mesma
intensidade que eu a estocava, sem me preocupar em ser delicado, querendo
que ela gozasse junto comigo. Sentindo-me cada vez mais embriagado e sem
controle do meu próprio corpo, belisquei o seu clitóris de leve, fazendo-a
tremer, e continuei arremetendo, sentindo o seu canal me apertando, até que
seus dentes se cravaram em meu ombro e a pressão exercida pelo seus
músculos que me prendiam fez com que eu me juntasse a ela ao orgasmo,
esvaindo-me na camisinha, um urro de satisfação masculina escapando pela
minha garganta.

Reunindo minhas forças, sem sair de dentro dela, e sentindo meu


corpo tremer pelo poder do êxtase, girei nossos corpos no colchão e a abracei,
mantendo seu corpo mole rente ao meu, acariciando seus cabelos molhados
de suor.

Dio, eu estava perdido.


Capítulo Vinte e dois

Deitada em cima dele, percebia seu coração bater ritmado contra o


meu, enquanto Andrea acariciava meus cabelos com ternura. Ainda sentia um
pouco de dor nas minhas pernas onde ele estava encaixado, porém a sensação
de ficar assim com ele era muito boa, melhor do que eu poderia imaginar. E
eu poderia facilmente confundir a gentileza dele, o carinho, com algo que não
existia.

Não esperava que meu chefe fosse um amante tão atencioso, delicado
e paciente, principalmente por ter me comprado e ter se sentido
decepcionado. Mas ele o tinha sido, e mesmo assim continuava a me tocar
com carinho, fazendo-me desmoronar ainda mais. Provavelmente não tinha
entregado apenas a minha virgindade a ele, mas também minhas emoções, o
que ele não desejava. Eu não sobreviveria com o coração intacto como eu
queria, pois algo dentro de mim me dizia que eu já havia dado um pedacinho
a ele em meio ao sexo. Mas deixaria para juntar meus cacos depois,
aproveitaria para desfrutar dele enquanto ele me quisesse.

— Tesoro? — Segurou o meu rosto gentilmente, fazendo-me fitar


seus olhos azuis brilhantes e tão claros pelo relaxamento que foi impossível
não mergulhar neles. Céus, Andrea ficava tão lindo sem a preocupação
estampada no rosto!

— Hmm… — Pousei um dedo em seus lábios e brinquei com o


sorriso que lentamente se formava em sua expressão. Um sorriso lascivo
combinado, com sua ereção que parecia criar vida dentro de mim, fez com
que minha respiração ficasse mais acelerada, meus seios friccionando em seu
peitoral.

— Obrigada, mio cioccolato. — Deu-me um beijo na testa e outro na


bochecha. — Mas agora preciso deixá-la.

Rolando-nos suavemente sobre a cama, ficando novamente em cima


de mim, retirou-se da minha entrada, levantando-se. De pé, olhei para o seu
pênis semiereto envelopado, sujo com meu sangue. Arfei quando meus olhos
pousaram na cama e vi a mancha, prova de que eu tinha me entregado pela
primeira vez, na colcha que deveria custar uma grande soma de dinheiro e
fitei Andrea. Tinha me esquecido completamente desse aspecto.
— Não se preocupe com isso, affetto[26] — removeu a camisinha e
deu um nó na ponta —, posso pagar por milhares delas. Pedirei para que
deem destino nela depois.

Curvou-se para me dar um selinho, apenas para depois dar as costas


para mim, deixando-me ver suas costas largas e os vergões que tinha feito e
nem tinha percebido, bem como a bunda masculina achatada enquanto
caminhava até o banheiro. Ouvi o barulho dele mexendo na torneira e
minutos depois retornou, segurando uma espécie de toalha, aproximando
novamente da cama.

— Abra as pernas, tesoro — ordenou com voz suave e o fiz.

Debruçando-se sobre o colchão, passou gentilmente o tecido úmido


em minhas coxas, limpando-me com carinho.

— Não precisa fazer isso, Andrea — falei, sem jeito, tocando sua mão
para que ele parasse. — Eu mesma faço.

— Deixe-me Adelle… — Seu tom autoritário fez com que eu não o


questionasse mais.

Quando se deu por satisfeito, abriu um sorriso gentil e deu-me mais


um beijo. Andrea não parecia cansar de tocar os seus lábios nos meus;
afastou-se apenas para jogar a toalha no lixo.

Sem que eu esperasse, caminhou novamente até mim e pegou-me no


colo, fazendo com que eu soltasse um gritinho e enlaçasse seu pescoço com
medo de cair, embora ele me segurasse com força, como se não fosse nenhum
esforço carregar-me.
— Não sabia que você era tão forte, Andrea. — Ousada, mordisquei a
base da sua garganta como ele tinha feito comigo, para depois lamber a
região, sentindo o gosto do sal do suor que cobria sua pele. O grunhido
emitido por ele encheu-me de satisfação feminina e continuei a provocá-lo
com a minha boca, até ele me pousar no chão aquecido, próximo a banheira.
Nossos corpos roçando um no outro arrancavam gemidos de nós dois.

— Tenho minhas limitações — me encarou enquanto alisava as


minhas costas, parando em minhas nádegas, apertando-as — e meus pontos
fracos também. — Deu de ombros e eu estremeci. Ele me considerava uma
fraqueza sua? E em qual sentido? O simples pensamento de que ele se
arrependia do que tinhámos feito e considerasse o fato de fazer sexo comigo
um erro, fez com que uma pontada de dor me invadisse, principalmente
depois de entregar-me a ele. Porém tratei de ignorá-la. — A banheira já está
cheia, tesoro. A água quente ajudará a aliviar um pouco a dor que você sente
internamente e te relaxará.

— Como você sabe disso? — perguntei, mesmo não querendo saber


das outras mulheres que passaram pela sua vida.

— Digamos que quando meu irmão arrumou uma namoradinha,


minha mãe e meu pai deram-nos uma aula bem elucidativa. Você pode
imaginar o desastre — fez uma careta e deu uma risada rouca, fazendo-me
sorrir para ele. Deu uma pausa. — E não, tesoro, o que fizemos no passado
não importa, não para mim. Enquanto nosso caso durar, não existe nada além
de nós dois.

Para provar o que dizia, abaixou a cabeça e capturou a minha boca em


um beijo exigente, apertando-me de encontro ao seu corpo rijo e poderoso,
seus lábios e língua exigindo de mim que eu me entregasse novamente, do
mesmo modo que ele parecia fazer.

Uma grande tola, já que ele tinha deixado bem claro no contrato que
não haveria nada além de sexo e prazer. Mas, como uma maldita idiota, dizia
para mim mesma que um homem que só queria me usar como a prostituta
que me tornei ao me vender, não me beijaria, não me tocaria daquela forma.
Parecendo preocupado com o meu bem-estar, como nenhum outro homem se
preocupou antes. Mergulhando no sabor da sua boca, deixei-me levar pelo
seu gosto enquanto ele me alisava, deixando um rastro de fogo por onde sua
palma percorria. Interrompendo o beijo apenas para me dar a mão, entrei na
banheira junto com ele, que se acomodou e me fez sentar entre suas pernas,
colando minhas costas no seu peitoral. A água quente, de fato, relaxou os
meus músculos, deixando-me cada vez mais em um estado de torpor.
Pegando o sabonete líquido do suporte, despejou um pouco na banheira e em
suas mãos, e começou a me ensaboar.

Soltando um suspiro, fechei meus olhos, aproveitando seu toque


gentil, que parecia percorrer cada pedacinho do meu corpo, dando atenção
aos meus seios, minhas coxas e meu monte, fazendo com que eu ficasse
excitada, uma vontade imensa em tocá-lo me tomando.

Movimentando-me em seu colo, fiquei de frente para ele e, sem pedir


seu consentimento, peguei um pouco de espuma e passei pelos seus ombros
rígidos, começando a minha exploração, tocando cada recanto da sua pele.
Colocando os braços na cabeça, se apoiou na borda da banheira e fechou os
olhos, gemendo baixinho, enquanto minhas mãos curiosas, cheias de sabão, o
acariciavam. Sentindo-o cada vez mais ereto e desperto debaixo de mim, fui
descendo minha mão pelo seu abdômen trincado, sentindo os gominhos se
retesarem sob o meu tato. Era impossível não me sentir poderosa ao vê-lo
reagir dessa forma, mesmo eu sendo inexperiente. Instigada, comecei a subir
com as unhas pela sua barriga em direção ao peitoral, arrancando um som
rouco da sua garganta. Quando ia fazer o caminho inverso, Andrea segurou a
minha mão e abriu seus olhos mais escuros pelo desejo, com uma fome que
fazia com que eu me arrepiasse. Para minha surpresa, pegou a minha mão e a
levou em direção ao seu pênis.

— Toque-me, Adelle — pediu com a voz rouca enquanto me


encarava.

— Me ensina. — Mordi os lábios e ele gemeu. Tinha visto que


algumas mocinhas dos livros que eu lia fizeram o mesmo, mas a teoria era
muito diferente da prática, e eu não queria decepcioná-lo. Pelo contrário,
queria me sentir ainda mais poderosa ao assistir o prazer dele.

— Com prazer, tesoro. Relaxe os dedos e deixe eu te mostrar.

Fazendo o que ele pediu, deixei que ele segurasse a minha mão e a
deslizasse por toda sua extensão em um primeiro reconhecimento, sentindo
lentamente as texturas do seu pênis que parecia pulsar ao meu toque. Quando
minha mão chegou na sua extremidade, fez com que eu tocasse com a ponta
do dedo a sua glande, friccionando suavemente a sua fenda, arrancando um
espasmo involuntário do seu corpo, a água morna que nos envolvia
oferecendo pouca resistência ao meu toque.
— Cazzo! — Arfou, jogando uma mecha dos seus cabelos escuros
para trás, e conduzindo nossas mãos, deslizou-as até a sua base, e ajustando
meus dedos, fez com que eu o rodeasse. Curiosa, apertei-o com certa pressão
e vi um relâmpago cruzar o seu olhar, um gemido escapando pelos seus
lábios. — Isso, tesoro, agora comece a movimentar de cima a baixo.

Guiou-me lentamente por todo o seu comprimento, e pouco a pouco


seus dedos foram afrouxando o seu aperto, dando-me liberdade para
experimentar a cadência e o ritmo dos movimentos que eu fazia, concedendo-
me o controle sobre o seu corpo. Curiosa, afundei meu braço na água e levei
minha mão aos seus testículos, massageando-os e brincando com os meus
dedos, enquanto continuava a deslizar minha outra mão pelo seu pênis ainda
mais rígido. Mas o que me deixava mais excitada, não era simplesmente o ato
de tocá-lo, mas sua expressão de enlevo, seu peito subindo e descendo com a
respiração entrecortada, enquanto eu o masturbava.

Parecendo cansado de assistir, levou uma mão a minha vagina e,


abrindo os meus grandes lábios, penetrou com um dedo o meu sexo relaxado
pela água, fazendo com que meus músculos contraíssem contra a invasão
deliciosa. Tombando contra o seu colo, colei nossas bocas e o beijei, pedindo
passagem com a minha língua, vibrando quando ele me tomou com fome.

Quando aumentei a intensidade dos meus movimentos no seu pênis


teso, Andrea inseriu mais um dedo no meu canal e eu senti um pouco de dor,
que logo foi diminuindo quando as sensações que ele me provocava
sobrepujaram sua existência.

Arqueei contra a sua mão, movimentando-me, sentindo a onda do


orgasmo sendo construída pouco a pouco dentro de mim, roubando minha
capacidade de raciocinar em meio ao toque e ao beijo. Ficamos nos
acariciando desajeitadamente enquanto estávamos reféns do próprio desejo, a
água espirrando por todo o banheiro enquanto nos movimentávamos, até que
esfregou meu clítoris com mais intensidade. Deixei-me levar pela onda do
orgasmo e, me apegando ao último fio de racionalidade, intensifiquei os
movimentos, até que senti seu corpo ficar rígido pelo êxtase, seu fluído
misturando-se a água, não dando tempo dele esvai-se em outro lugar.

Permanecemos assim por vários minutos, até que recuperássemos o


fôlego.

— Vamos tomar banho de verdade dessa vez? — perguntei,


timidamente, ainda em seu colo.

— Tentaremos, tesoro. — Gargalhou, seu rosto tomado de uma


expressão feliz que nunca vi antes e me beijou enquanto pegava o shampoo
no suporte próximo a banheira.

Como um casal de apaixonados, lavamos os cabelos um do outro e


iniciamos a sessão de ensaboar, enquanto ríamos e conversávamos,
completamente satisfeitos. E, é claro, repleto de beijos.

— Está com fome? — Me perguntou ao abraçar-me por trás,


enquanto eu olhava para a escuridão lá fora, vestida com um roupão de seda
fornecido pelo hotel.

— Sim, para ser sincera, estou faminta. — Ele riu, me dando um


beijinho na nuca, sua barba contra minha pele me arrepiando.
— Hm…

— Andrea…

— Que tal algo italiano e um bom vinho? — perguntou com a voz


rouca.

— Parece ótimo para mim. — Virei-me nos seus braços e deixei que
ele me beijasse novamente. — Agora é melhor pedir logo, antes que fique
muito tarde e o restaurante do hotel feche.

— Isso não é problema. — Alisou minhas costas, pousando sua mão


na minha bunda, trazendo-me junto a si. — O serviço é vinte e quatro horas.

— Andrea…

— Tá — resmungou e, a contragosto, me soltou, caminhando até o


ramal que conectava a todos os setores do hotel.

Deixou-me ali, com a certeza de que tudo que era bom não durava
muito…
Capítulo Vinte e três

Era a primeira vez que eu dormia com alguém, e diferentemente do


que achava que seria, acordar com o ressonar baixinho de uma Adelle nua
trazia uma espécie de conforto que há muito tempo não sentia. O calor do seu
corpo, seus cabelos emaranhados de encontro a minha pele, e o seu cheiro
misturado com o suor, após tê-la tomado novamente de madrugada, deixava-
me completamente inebriado, uma ânsia sufocante por mais tomando o meu
peito. Com esse pensamento inadmissível para mim, trincando os dentes,
movi-me na cama suavemente para não a acordar, e deixei a king. Pegando
uma toalha que ela tinha jogado para fora da cama, envolvi minha cintura e
caminhei até a sacada da suíte. Fiquei olhando para o Central Park sem
realmente vê-lo, preso nos meus pensamentos.

Eu estava agindo que nem um tolo em deixar-me levar por Adelle. Ela
sempre tinha sido uma combinação perigosa para mim: linda, determinada,
focada no trabalho e uma inteligência e sagacidade que rivalizava com a
minha. Eram poucas as pessoas que eu respeitava, e ela, mesmo querendo o
que eu poderia oferecer, ainda a tinha. E eu era mais idiota ainda por
considerá-la em pé de igualdade comigo, admirando-a, embora não pudesse
mais confiar plenamente nela. Tinha aplacado momentaneamente minha
fome descomunal por Adelle, mas depois de nos tocarmos no banho e de
compartilhar com ela um jantar à luz do luar nessa mesma sacada, sabia que
se eu não tomasse cuidado, poderia cair na minha própria armadilha. O que
era inadmissível!

Era apenas sexo, stronzo[27]! Nada mais. Ignorando as sensações


despertadas por ela que poderiam me dizer o contrário, tentei colocar a
cabeça no lugar. Tinha muito trabalho para fazer. Iria transar com ela outra
vez e a deixaria em casa, para que ela passasse o dia com o irmão. A uma
hora dessas, Bernard já tinha começado a colocar a remodelação da empresa
marítima e terminado a seleção de novos candidatos aos postos do setor
administrativo e financeiro. Movido pela mesma ambição que a minha,
remanejamos sem pensar muito alguns dos nossos funcionários para lá,
inclusive Washington e Mindy da contabilidade. Tinha dado a eles duas
opções: ir ou rua, e optaram pela primeira. E era no meu plano que iria focar.
Com a empresa funcionando, eu teria pouco mais de um mês para atravessar
meu adversário, o fazendo perder milhões, muito mais do que eu havia
perdido. Me certificaria disso.

Imerso na lista de coisas que teria que fazer enquanto observava a


vista, não escutei os passos de Adelle que vinha até mim, apenas senti o calor
das suas palmas quentes de encontro ao meu peitoral e barriga, bem como
seus seios esmagados contra as minhas costas. Gemi, apreciando o contato
mais do que devia, principalmente quando a mulher escorregou as unhas
compridas pelo meu abdômen, mordiscando a minha pele. Mesmo que eu não
quisesse, ela derrubava a frieza que eu queria preservar.

Quando minha secretária adentrou com a mão por baixo da toalha que
me cobria e envolveu o meu pênis em seus dedos finos, começando a
massagear-me, despertou o meu lado predador, a minha fome, o meu desejo,
que não se importavam com nada além da satisfação.

Virando-me de súbito e, como estava ficando cada vez mais


recorrente, peguei-a no colo e a levei para cama, soltando-a não com tanta
gentileza como das últimas vezes, mas sem machucá-la. O sorriso provocante
em seus lábios inchados e o brilho nos olhos verdes provavam que ela não se
importava com a minha intensidade. Os bicos dos seus seios, já rígidos de
excitação, clamavam pela minha boca e por sentir minhas mãos apalpando-a.

Safada, me pegando completamente de surpresa pela devassidão que


via nela, ficou de joelhos na cama, removendo a toalha da minha cintura,
deixando-me nu, e puxou-me de encontro ao seu corpo, tomando minha boca
em um beijo sedento. Dio, aquela mulher era puro fogo, mesmo que o modo
em que correspondia me revelasse sua inexperiência. Lamentava e muito não
ter provado daquela chama antes. Teria me poupado do descontrole por ela
que eu havia experimentado, principalmente ao masturbar-me pensando nela.

Sua língua macia explorava cada canto da minha boca enquanto com
minhas mãos eu fazia o mesmo com o seu corpo, gravando com o meu tato
cada pedaço dela, suas imperfeições, suas curvas e pontos erógenos. Quão
patético estava sendo, pois nosso caso tinha prazo de validade e eu que
estipularia nosso término. Irritado comigo mesmo por estar me deixando
levar por sentimentalismos baratos, aprofundei ainda mais o beijo, tomando o
controle para mim, aumentando e diminuindo a velocidade que nos
movíamos fazendo ela choramingar e arquear sua pelve contra o meu pau.

Quando eu estava escorregando minha mão pela sua barriga,


chegando próximo ao seu monte, um som estridente veio do móvel de
cabeceira, porém o ignorei, continuando o meu caminho enquanto ela gemia
contra a minha boca. Porém o toque insistiu mais uma vez e a amante
fervorosa que eu tinha debaixo de mim interrompeu o beijo e ficou rígida.

— Ashley… — Ao ouvir sua voz temerosa, saí de cima dela e rolei


para o lado, tateando o móvel em busca do aparelho dela enquanto encarava
seu rosto ficando cada vez mais pálido. Merda!

— Atenda — falei com voz suave ao estender o celular para ela que
pegou com os dedos trêmulos. Definitivamente, algo estava muito errado. A
sensação que tive quando a vi depois de retornar da Itália voltou com
intensidade. E depois dessa reação, eu teria a minha resposta. Ninguém ficava
pálido e rígido apenas com uma ligação, ainda mais sem saber o que era.

Levantando, com um pressentimento de que não gostaria nem um


pouco do que ela me falaria, enrolei-me na toalha e caminhei até a janela,
escutando Adelle perguntar com a voz fraca se estava tudo bem, soltando em
seguida um choramingo que me incomodou e me fez estacar. Virando para
ela, vi seu semblante ficar mais branco do que uma folha de papel.

— Irei o mais rápido que puder. — Sua voz saiu chorosa e a vi


desligar a chamada, se erguer rapidamente, completamente bamba, parecendo
confusa e perdida.

De cenho franzido, dei passos largos em sua direção e a segurei pelo


cotovelo, obrigando-a me encarar. Odiava ficar no escuro e Adelle mais do
que ninguém sabia disso, estava ficando cada vez mais difícil não demonstrar
minha irritação.

— O que está acontecendo, Adelle? — Observei uma lágrima escorrer


dos seus olhos verdes e a ira que sentia foi sobrepujada por uma pontada de
dor, que dessa vez não consegui ignorar.

Dio, algo dentro de mim odiava ver essa mulher sofrer, mesmo
sabendo que isso era extremamente ridículo. Soltei-a apenas para puxá-la
para os meus braços logo em seguida, envolvendo-a, tentando oferecer algum
conforto enquanto ela molhava o meu peito com suas lágrimas. Plantei um
beijo suave em seus cabelos.

— Eu preciso ir — disse em um fio de voz, tentando se soltar do meu


aperto.

— Adelle…

— Meu irmão… — disse baixinho. — O tratamento não está


funcionando. Vai ter que ser operado.

— Opera.. — Parei de falar na metade do caminho e a soltei, dando


um passo para trás, quando uma ideia percorreu a minha mente como um
relâmpago. Tocá-la perante essa possibilidade era como se eu colocasse
minhas mãos em brasas.

Como eu pude ser tão tolo? Como estive tão cego pelo desejo ao
ponto de não perguntar o motivo?

— Era para isso, não é? — rosnei, passando as mãos pelos meus


cabelos, sentindo a fúria contra mim mesmo me consumir. — O dinheiro…

Ela assentiu e abraçou-se a si mesma, provavelmente temendo o meu


tom. E eu me odiei ainda mais. Que espécie de monstro eu era? Comprar uma
virgem que só queria pagar o tratamento do irmão?

— Madre di Dio, Adelle. — Passei a mão pelos meus cabelos e sem


perder tempo vendo-a ficar mais desesperada disse: — Essa conversa não
terminou. Vista-se.

Ela não disse nada, apenas procurou o seu vestido, que estava jogado
no chão.

Enquanto colocava minha roupa, eu pensava na conclusão a que tinha


chegado, e todo rancor que eu tinha, por ter achado que ela era mais uma
interesseira, se dissolveu em admiração. Um sentimento ainda mais poderoso
de respeito por ela assomou meu peito. Adelle tinha se vendido para mim
apenas para proteger o seu irmãozinho, e ao fitá-la se vestindo com rapidez,
eu tive a completa certeza de que, se fosse preciso, ela iria descer ainda mais
baixo para cuidar dos seus. Foi inevitável não estremecer diante da
constatação quando fechei o cós da minha calça.

— Você está pronta? — Peguei a chave do carro minutos depois,


colocando a carteira no bolso.

— Posso pegar um táxi, Andrea — sussurrou, pegando sua bolsa, sem


se importar com seus cabelos embolados. Seu rosto era pura aflição.

— Eu te levo — fiz um gesto com a mão para ela —, não discuta,


Adelle.

Ela apenas assentiu e, controlando tudo o que eu sentia, pousei a


minha mão em suas costas, guiando Adelle para fora do quarto em direção ao
elevador. Quando me acalmasse completamente, lidaria com aquilo de uma
vez. Ela me devia muitas explicações.
Capítulo Vinte e quatro

Eu podia sentir a raiva que emanava de Andrea em cada gesto, no seu


toque e na expressão fria e controlada, ainda mais que não tivemos tempo de
conversar. Nunca me arrependeria de algo que me fez sentir preciosa, quista e
cuidada. E não queria a culpa que ele sentia por ter me tornado sua amante
pensando que eu era interesseira, algo que podia ver em seu olhar, maculasse
a noite que tivemos juntos.

As coisas poderiam se complicar mais ainda, mas tudo o que


realmente queria agora era que o trânsito caótico de Nova York, mesmo em
um domingo de manhã, evaporasse da minha frente e eu visse meu
irmãozinho logo, por mais que Andrea dirigisse como um louco, cortando os
outros veículos.

Ashley tinha me falado que ele tinha ido dormir logo depois que saí
do apartamento e não viu nada de anormal nele. Porém, ao acordar, ele sentiu
uma dor próxima ao umbigo, reclamando que estava doendo demais, aos
prantos, e ela constatou que ele tinha um pouco de febre. E assim tive a
certeza que o tratamento com antibióticos receitados pela médica não
funcionou, e o aperto no peito que senti quando Ash me contou me
confirmava isso. E eu sentia-me completamente quebrada. Eu não estava com
ele quando precisava e o sentimento de impotência me tomou. Sentia que de
algum modo eu tinha falhado, embora tivesse feito o meu melhor, mas não
sabia onde tinha errado. Soltei um suspiro profundo e senti a mão quente e
grande de Andrea, que tinha percorrido todo o meu corpo com ternura há
poucas horas, apertar a minha, seu polegar acariciando meu dorso com
delicadeza. Mas não me deixaria levar pela ilusão de conforto que ele parecia
me proporcionar, mas também não o afastaria. Tinha certeza de que quando
sua fúria e raiva passasse, Andrea colocaria fim no nosso relacionamento, se
podíamos chamar o que tínhamos assim. O que definitivamente não queria. E
com isso, o meu emprego deve ter ido pro espaço.

— Vai ficar tudo bem, Adelle. — Apertou minha mão com mais força
enquanto dirigia com a outra. Assenti, não dizendo nada, embora ele não
pudesse ver, concentrado no trânsito.

Eu queria realmente acreditar nas suas palavras, porém o aperto no


meu peito e o sentimento de falha não me deixava completamente.

Ficamos em silêncio por alguns minutos até que sua voz soou ríspida,
mas não direcionada a mim, mas como se fosse a ele mesmo.

— Por quê, Adelle? Por que me escondeu isso? — perguntou


suavemente e soube que não poderia mais fugir daquele assunto. Meu chefe
não era conhecido pela sua paciência e eu sabia que devia uma explicação a
ele. Era justo.

— Realmente fazia diferença, Andrea? Nós dois sabemos que você já


estava determinado a pensar o pior de mim e eu deixei que acreditasse no
queria. E de qualquer forma, não posso negar que senti alívio quando a soma
volumosa caiu na minha conta. Posso não ter agido deliberadamente, mas eu
precisava e sim muito do seu dinheiro — confessei.

— Teria feito… Eu me sinto um maldito cretino por ter feito o que


fiz, e da forma que fiz.

— Não, Andrea — balancei a cabeça em negativa, e olhei para o


trânsito lá fora —, eu assinei aquele contrato sabendo de todas as
consequências. E a verdade era que eu também queria tudo o que aconteceu,
apenas não sabia ou não queria admitir. Não houve mentiras na minha
entrega, e não me arrependerei nunca de você ter sido o meu primeiro, pelo
contrário, por mais que não queira sentimentalismos, guardarei para sempre o
carinho e a paciência que teve comigo. E principalmente o fato de você estar
aqui, me apoiando, quando não é a sua obrigação.

— Adelle... — sussurrou com a voz embargada.


— Se você quiser cancelar o acordo por eu ter quebrado uma das
principais cláusulas várias vezes em pouco tempo, não tenha pena de mim. E
nem se sinta culpado para me demitir se você quiser. — Mesmo que minha
mente estivesse em William, tentei ser prática quanto a esse assunto, tirar o
band-aid de uma vez doeria menos. — Eu sabia que esse era o nosso fim.

— O quê? — seu tom pareceu um pouco mais acima do normal, mas


ele continuava atento ao trânsito que nos cercava.

— Posso pedir transferência para outra empresa conglomerada. Ou


aceitar a proposta de Edward se você nunca mais quiser me ver…

— Então ele quer roubar a minha funcionária? — Sua voz soou fria.
— Nada mudou entre nós, tesoro. Você é uma boa funcionária, meu braço
direito e uma peça fundamental na companhia, não só por organizar a minha
vida, mas pelos seus conselhos financeiros e ideias. Definitivamente, não a
deixaria escapar. E ainda será a minha amante pelo tempo que eu quiser.

Engoli em seco sem saber o que dizer, meus sentimentos estavam


completamente confusos e tinha medo de que ele, depois de ponderar melhor,
mudasse de opinião. Mas meu coração quebrado não deveria ser minha
prioridade no momento.

— Sobre o seguro saúde oferecido pela companhia… — mudou de


assunto quando paramos em um sinal e eu o fitei.

— Não cobre despesas cirúrgicas, apenas consultas e alguns exames,


nada muito abrangente. — Tentei não soar como se estivesse fazendo uma
reclamação, mas senti a tensão de Andrea ficar ainda maior, fazendo-me
olhar para o seu perfil teso, seus dentes trincados.
— Merda — praguejou baixinho. — Que merda de chefe eu sou…
Dio, eu deveria saber disso.

— Andrea… — Não sabia ao certo o que dizer.

— Agora terei que virar babá do RH — rilhou os dentes com mais


força —, mas isso vai mudar, muita coisa irá, mesmo que eu tenha que fazer
cabeças rolarem.

— Entendo. — Pousei minha outra mão na dele. — Será muito bom


para todos ter essa segurança. Mesmo que acarrete mais custos para a
companhia, acredito que se não descontarem na folha de pagamento, pode ser
que motive ainda mais nossos colaboradores.

— Estudarei a melhor alternativa e a implantarei o mais rápido


possível. — Soltou a minha mão e passou pelos seus cabelos bagunçados,
jogando uma mecha para trás e acelerou o carro quando o sinal abriu. — Não
consigo acreditar que a fiz minha sob essas circunstâncias…

Encolhendo-me contra o banco do carro, não disse mais nada e voltei


a fitar a janela. Por mais que ele se culpasse pelo fato, a escolha tinha sido
completamente minha. Eu era a dona do meu próprio corpo e fazia com ele o
que eu quisesse. E não me arrependia em nada em ter me entregado ao
homem que estava ao meu lado. Andrea tinha me mostrado não apenas o que
era ser cuidada e acariciada, mas aquilo que eu merecia: ternura, gentileza e,
principalmente, devoção. E depois da minha primeira experiência com um
homem que fazia questão de deixar claro que era apenas sexo, embora tenha
sido bastante carinhoso, eu não aceitaria menos que isso.

Mergulhada em pensamentos conflitantes, presa ao medo de perder


meu irmão e a sensação de que tinha de algum modo falhado, com o pânico
me corroendo por dentro, deixei-me levar pelo turbilhão que sentia até que o
carro parando em frente ao meu prédio tirou-me do torpor.

— Obrigada, Andrea.

Sem perder tempo e esperar a resposta dele, abri a maçaneta do carro


e saí, correndo desajeitadamente em meus saltos enquanto procurava minhas
chaves dentro da bolsa, não me importando com os meus vizinhos que
observavam a cena, nem com as crianças brincando no passeio próximo a
entrada do prédio. Não me preocupei com nada e nem com o fato de deixar a
portaria aberta. Quando me aproximei do elevador e já ia chamar a caixa de
metal, uma mão agarrou o meu braço, e eu dei um saltinho para trás,
esbarrando no corpo rígido que o meu conhecia tão bem, e que
provavelmente não esqueceria tão cedo.

— Pensou que eu apenas te deixaria e iria embora, tesoro? —


sussurrou no meu ouvido com a voz séria e algo mais que não estava com
condições de definir, porém que me fez estremecer, meus pelos se arrepiando.
— Posso ser muitas coisas, Adelle, mas não cretino ao ponto de te deixar
sozinha quando visivelmente está em pânico e com medo de perder seu
irmão.

— Não sou sua obrigação, Andrea… — murmurei, tentando ficar o


mais firme possível.

— Mas é a minha amante e eu estou no comando, não é


mesmo?

Quando ia dizer algo, uma voz masculina nos interpelou, fazendo-nos


virar para ele.

— Tudo bem, Adelle? — Scott estava de cenho franzido, em uma


posição protetora. — Vi esse homem correndo atrás de você. Se ele estiver te
incomodando…

Senti Andrea ficar tenso ao meu lado, porém, ao contrário do que


esperava, ele disse em uma voz calma, usando todo o seu autocontrole e
domínio que eu conhecia bem. Puxando-me de encontro a ele, agarrou a
minha cintura com posse, falando:

— Por que não me apresenta a ele, tesoro? — Alisou meus braços


enquanto falava. — Melhor, prazer, sou Andrea Della Torre… — Sua voz era
cortês, porém eu sabia que era seu jeito sutil de intimidá-lo.

— O ma…. magnata? — Arregalou os olhos, surpreso.

— Sim, e estamos em uma emergência…Com licença, senhor. —


Pressionou o botão que chamava o elevador novamente, não demorando mais
que vinte segundos para que ele chegasse ao térreo e uma pessoa saísse de
dentro dele, também incrédula. — Vamos, querida.

Com uma mão na minha cintura, guiou-me para dentro da caixa de


metal, deixando o homem e a outra pessoa parada e embasbacada, sem
reação. Quando as portas se fecharam, apertei o botão do meu andar e virei
para Andrea, mesmo que eu me sentisse mole, com o pânico e a confusão me
dominando.

— Eu posso... posso resolver isso sozinha. — Minha voz saiu mais


fraca e trêmula do que gostaria. — Vou pedir um táxi, sei que você tem
coisas mais importantes para fazer.

— Sem discussão, tesoro. — Tocou o meu rosto, fazendo-me encarar


seus olhos azuis frios de raiva, mas, ao mesmo tempo, preocupado, o que
achava desconcertante. — Lidaremos com isso, juntos.

Deu um beijo na minha testa e, contra todo o meu bom senso, ao


ouvir suas palavras, depois de muito tempo, senti que não carregava todo o
peso nas minhas costas sozinha, que tinha alguém com quem dividi-lo. Mas
era uma mera ilusão criada pelo meu medo e pela sua fala doce, que
provavelmente era dita pela culpa que sentia. Mas por um momento quis-me
entregar a essa mentira. Por sorte o elevador parou, abrindo no meu andar,
obrigando-me a reagir com ele a tira colo. Suspirando fundo, aproximei-me
do meu apartamento, já que tinha deixado a chave com Ash, e toquei a
campainha. Não demorou muito e minha vizinha com uma expressão
preocupada abriu a porta para mim, fazendo com que meu coração se
afundasse ainda mais no peito. Lançando um olhar para ela, me deu
passagem para entrar, mas não antes de arregalar os olhos ao fitar o homem
que me acompanhava. Mas eu não me importei com isso. Como uma
desesperada, cruzei o pequeno apartamento até onde Will estava, seu choro
alto quebrando-me em pedaços.

— Oh, meu amor, estou aqui — passei meu dorso pelo seu rosto
molhado e dei um beijo nele —, desculpe a demora.

— Tá doendo muito, Del. — Envolveu meus braços em seu pescoço e


tive cuidado ao abraçá-lo.

— Xiu, já estamos indo ao médico.


Beijei-o novamente, sentindo-me completamente dilacerada.

— Vai ficar tudo bem, querido. — Continuei assim, afagando-o, até


que a mão pesada de Andrea pousou sob um dos meus ombros.

— Troque de roupa, tesouro, enquanto faço uma ligação. — Sua voz


era suave e terna, e com o canto do olho pude ver ele pegar o aparelho do
bolso. Queria protestar, porém acabei assentindo.

Se ele quisesse bancar o chofer, não poderia impedi-lo. Afinal, ele


estava certo, eu tinha assinado um contrato em que eu seguiria suas ordens,
embora não esperasse que ele iria interferir na minha vida pessoal dessa
forma. Particularmente, achava que seria mais sexual, de controlar e dominar
o outro. Mas o que está feito, está feito, pelo menos dinheiro não seria um
acréscimo a minha preocupação. Sem perder mais tempo, dando outro beijo
em um Will choroso que não queria me largar, passei-o para a Ashley que o
segurou com carinho.

Meu coração apertado dizia que eu não tinha mais nenhum minuto a
perder.
Capítulo Vinte e cinco

Desliguei a ligação sob o olhar atento da mulher mais velha que tinha
um ar surpreso em meio a preocupação. Colocando o aparelho no bolso,
caminhei novamente para perto da criança que chorava forte, depois que a tal
de Ashley o pousou no sofá, sentindo um certo incômodo me dominando. Eu
não queria me importar com ele, mas só de olhá-lo algo se retorcia dentro de
mim. O que só poderia ser culpa. Isso.

Sem querer pensar nas razões das atitudes que estava tomando, parei
perto dele e ele me olhou com seus olhos verdes tão parecidos com o da sua
irmã, brilhantes pelas lágrimas derramadas.

— Andrea… — Choramingou.

— Oi, garotão...

Antes que eu pudesse dizer alguma coisa, ele estendeu-me seus


bracinhos finos, pedindo por um abraço, fazendo-me engolir em seco. Nunca
tinha pegado no colo uma criança antes, o que me fez hesitar. Porém, movido
pelo incômodo que sentia, curvei-me e com uma delicadeza que não sabia
que existia dentro de mim, deixei que ele envolvesse meu pescoço e o segurei
desajeitadamente, sentindo o calor do seu corpinho de encontro ao meu, suas
lágrimas molhando minha camisa social. Ele não era tão pesado para mim,
mas, pela primeira vez na vida, estava inseguro, meus braços parecendo que a
qualquer momento iriam falhar. Eu não era um homem terno e carinhoso, e o
ato de tê-lo abraçado pareceu exigir isso de mim de uma forma que não
estava preparado para dar. Mesmo assim, me vi tocando seus cabelos com a
mão livre, tentando manter a outra firme, querendo consolar o pequeno que
apertou ainda mais o meu pescoço.

— Tá doendo, Andrea — choramingou e meu peito se afundou no


peito, mesmo que eu não quisesse senti-lo.

— Eu sei, piccolo. Ficará tudo bem, eu farei de tudo o que estiver ao


meu alcance. — Eu não deveria estar prometendo algo assim, mas movido
pela irracionalidade eu o fiz.

Dio, que caralho estava acontecendo comigo? Estava sentindo tanta


culpa ao ponto de enredar-me em um problema que não era meu? Algo que
não queria analisar dizia-me que ia muito além disso, pois não queria ver
Adelle, a mulher que jurei que era apenas uma interesseira e que achava que
havia me traído, sofrer. Porque me incomodava tanto o fato de vê-la perdida,
solitária? Desamparada? Como se precisasse carregar todo o peso do mundo
sobre as costas, sozinha?

Ela era apenas a minha melhor funcionária e queria vê-la bem, disse
para mim mesmo. Porém outra parte de mim bombardeava que Adelle ainda
era a mulher que eu desejava, que eu respeitava, e que hoje passei a admirar
ainda mais. O meu braço direito, a minha igual. A única, além da minha mãe,
que conseguia arrancar algo de mim que não estava disposto a dar. A mulher
perfeita para mim, lembrei-me da fala tola da minha mãe, porém ignorei-a
nesse momento. Éramos apenas amantes, não um casal, e ficaríamos assim.

Os sons de passos e um arfar surpreso fizeram com que eu saísse dos


meus pensamentos.

— Está pronta, Adelle?

Percorri-a com o olhar enquanto ajeitava William que soluçava


baixinho contra o meu peitoral. De jeans e camiseta, ela não tinha nada da
imagem perfeita, imaculada e profissional que usava no escritório. Mas,
mesmo assim, estava incrivelmente linda e sexy, e meu coração se acelerou.
Lembrei que um contrato fazia dela minha.

— Estou.

— Pegou os documentos dele? — a mulher mais velha interveio, se


aproximando de Adelle, e só naquele momento me recordei que ela estava ali.

— Peguei.
— Você quer que eu vá com você, querida? — Ashley perguntou,
solicita.

— Sei que o seu filho virá…

— Eu a acompanharei — minha voz soou mais grossa e fria do que


gostaria, e as duas deram um saltinho. Porém a tal mulher me encarou com
um brilho no olhar, analisando-me, até que assentiu.

— Vá que eu tranco tudo, querida. — Deu um beijo em Adelle. —


Qualquer coisa, me liga que irei correndo. Vá me dando notícias.

— Obrigada por tudo, querida. — Retribuiu o carinho e caminhou em


minha direção. — Pode me dar ele, Andrea.

— Não, Del — Will choramingou baixinho, se remexendo no meu


colo. — Qué o Andrea…

— Meu amor… — Pude ver a tensão e a tristeza que ela carregava,


aumentando ainda mais o desconforto e incômodo que sentia.

— Pode deixar que eu o carrego até o carro. — Ofereci, mesmo


sabendo que não deveria.

Não queria criar laços, não queria que ela acreditasse que eu seria o
homem atencioso que ofereceria a ela mais do que sexo e luxo. Mas algo
dentro de mim me passava a sensação de que eu deveria auxiliá-la,
provavelmente era apenas um lapso da educação dada pelos meus pais que
me impelia a fazê-lo.

Nada mudará entre nós dois, repeti várias vezes enquanto a via
hesitar, buscando convencer a mim mesmo disso.
— Obrigada.

— Então vamos.

Sentindo meu braço incomodar um pouco, passei por uma Adelle um


pouco atônita e, sem me preocupar em me despedir da outra mulher, deixei o
pequeno apartamento em que minha secretária vivia, sabendo que ela me
seguiria. Durante o breve percurso do elevador até o meu carro, não dissemos
nada um para o outro. Quando me aproximei do meu esportivo, segurei-o
com mais força e, com a mão livre, tateei o bolso da calça encontrando a
chave e destravando o alarme do veículo. Abrindo a porta, com uma
delicadeza que não sabia que existia dentro de mim, lentamente removi seus
dedinhos que seguravam meu pescoço e o pousei no assento.

— Não, Andrea. — Lágrimas escaparam dos seus olhos verdes e ele


tentou me segurar, o que de alguma forma aumentou a angústia que sentia.
Eu era um homem frio e ganancioso, não aquele que oferecia consolo a
ninguém, muito menos a uma criança pequena.

— Preciso dirigir, piccolo — disse com uma voz suave —, se você


fosse mais crescidinho, com certeza eu não iria precisar fazê-lo.

— Você vai dexá eu dirigi? — Sua fala saiu um pouco embolada,


porém a carinha pareceu mais animada.

Fiz que sim, mesmo sabendo que era uma mentira.

— Agora vamos, não queremos deixar sua irmã mais preocupada, não
é mesmo?

— Tá.
Fechei a porta e olhei por alguns segundos Adelle, que observava o
nosso pequeno diálogo com uma expressão abatida, embora pudesse ver uma
chama arder em seus olhos verdes, que me indicava que eu deveria ter mais
cuidado, não queria que ela se enganasse. Tomando o controle da situação,
pousei as mãos nas suas costas, e fiz com que ela caminhasse até o outro lado
do veículo, abrindo a porta para ela. Esperei que se acomodasse próximo à
criança, que chorava baixinho, deitando a cabeça dele sobre seu colo, e fui
assumir a direção, colocando o cinto, programando a rota. Dei partida no
motor, sem perder mais tempo.

— O local onde a médica pediu que eu fosse em caso de emergência


não fica muito longe daqui — Adelle falou com uma voz mais fraca minutos
depois, quando eu percorria as ruas, guiado pelo GPS acoplado ao veículo.

— Não iremos para lá. — Dei a seta.

— O quê? — deu um grito, porém não me importei.

— Estamos indo para o hospital onde sou atendido. Já liguei para meu
médico pedindo a ele para me encontrar no Mount Sinai. Quero que William
seja avaliado por ele e a equipe de lá.

De fato, desejava ouvir a opinião do meu médico, pois em minha


mente soou um alerta quando Adelle falou que a criança estava sendo tratada
com antibióticos. Eu não era médico, mas pelo que eu sabia só cirurgia era
uma opção. Cada pedaço meu me dizia que era para oferecer ao irmão da
minha secretária uma alternativa. E minha intuição nunca falhava, exceto
quando julguei aquela mulher mal, algo que provavelmente não conseguiria
me perdoar tão cedo.
— Não é necessário, a médica…

— Vamos garantir que ele tenha o melhor tratamento, Adelle. E eu


posso pagar por isso… — falei com voz suave.

— Andrea…

— Deixe-me oferecer isso a ele, tesoro. Deixe que eu me redima com


você. Permita que alguém lhe estenda a mão e divida um pouco o peso da
responsabilidade que carrega em seus ombros... Da mesma forma que você
faz comigo… — Engoli em seco diante da minha própria fala, a realidade me
atingindo em cheio.

Mesmo que eu estivesse agindo pela emoção, e não com a razão fria
que sempre tinha, minha última frase não era uma mentira. Nesse mais de um
ano que ela trabalhava para mim, sempre peguei-me dividindo os meus
problemas de natureza mais financeira, meus investimentos e meus projetos
com ela, como nunca fiz com nenhum outro funcionário e, às vezes, nem
mesmo com os meus pais. Sem medo dela me enganar, dela vender meus
segredos e informações para os meus concorrentes, compartilhando
estratégias e dados confidenciais que eram restritos a função de secretária.
Sem saber, eu compartilhava um pouco do peso que sentia por gerir um
grande império, como o meu, com ela. Apenas ela. Ela conhecia como
ninguém cada ponto fraco meu, cada frustração, quase todas as ânsias, e
nunca pediu nada em troca. E constatar aquilo naquele momento foi como
levar uma série de socos no estômago.

Mas eu estava disposto a realmente tomar as responsabilidades dela


para com William para mim? E o que isso de fato significaria? Eu não sabia,
apenas tinha a sensação de que era ali que eu deveria estar, ao lado dela. Mas
isso, guardaria apenas para mim.

— É pesado, mais do que você pode imaginar. — Parando no sinal,


olhei para ela pelo retrovisor, vendo uma lágrima rolar pelo seu rosto, e eu
pude sentir a sua dor e sua força. Dio, aquela mulher era completamente
incrível e teve que aprender sozinha a assumir o controle e as rédeas da
própria vida. E eu me senti ainda mais idiota por ter duvidado dela.

— Eu sei… — forcei-me a dizer. — Mas deixe-me ajudar nisso.


Posso pagar os melhores médicos para cuidar dele.

— Tudo bem, Andrea. — Sua voz tinha um tom que nunca ouvi
antes, porém que foi quebrada pela sua voz sussurrada para si mesma: — Só
dessa vez.

Deveria me sentir aliviado e satisfeito com o seu comentário, mas


tudo o que consegui sentir foi um vazio que não queria e nem precisava…
Capítulo Vinte e seis

Eu deveria estar me sentindo nas nuvens por Andrea se oferecer para


pagar o tratamento do meu irmão em um dos hospitais mais caros de Nova
York, colocando à disposição dele os melhores médicos. E ainda mais com o
fato de ele querer dividir comigo, momentaneamente, o peso e a
responsabilidade sobre a vida de uma criança. Vê-lo segurando Will no colo,
tentando passar algum conforto ao meu irmão doentinho, tinha feito meu
coração bombardear no peito como um louco e algo, que antes eu fazia de
tudo para suprimir, voltou com força: eu queria e muito uma família como as
que via nos filmes. Mas logo tratei de enterrar aquele desejo, o sufocando
perante a urgência do momento. Porém ouvir Andrea oferecendo-me apoio
me quebrou, pois representava tudo que sempre sonhei e que seria retirado
logo depois.

Eu sentia dor e impotência por tudo o que estava acontecendo, minha


mente cada vez mais em turbilhão.

Se fosse sincera comigo mesma, queria viver essa fantasia


momentânea, independente do resultado, apenas para tentar mitigar um pouco
da confusão e medo que sentia. Mas eu tomaria cuidado, pois não queria que
Will se apegasse a um homem que sairia da sua vida tempos depois.
Permitiria só agora, uma única vez. Eu poderia lidar com meus sentimentos
depois, mas não com os do meu irmãozinho, que pareceu encontrar certo
conforto nos braços do magnata.

Depois de estacionar o carro em um local subterrâneo, como um


cavalheiro, ele abriu a porta para mim, ajudando-me a sair, o contato da sua
mão na minha oferecendo o conforto que ele sabia que eu precisava. Porém,
antes que eu me adiantasse para pegar Will que tinha cochilado depois de
tanto chorar, Andrea gentilmente o pegou no colo, como se fosse um pai
protetor e amoroso. Isso seria a minha ruína.

Sem trocarmos uma palavra, caminhamos até a rampa de acesso


interno para a recepção sofisticada. Algumas pessoas arregalavam os olhos
enquanto passávamos, provavelmente o reconhecendo e estranhando o fato
dele carregar uma criança em seus braços, mas ele parecia não se importar,
seus passos largos e apressados percorreram a extensão do chão branco até
parar próximo ao balcão.
— Bom dia, senhor. Em que posso ajudá-lo? — Ignorou-me por
completo, sorrindo abobada. — Consulta ou emergência?

— Ambas. Pedi que Albert Schneider me encontrasse aqui — disse


em uma voz ríspida e fria que apagou qualquer traço de sorriso no rosto da
mulher.

— Documentos do paciente, por favor, e do responsável.

Abri minha bolsa e, grudando-me no balcão, entreguei os documentos


à recepcionista que pareceu surpresa quando Andrea, segurando Will
firmemente em seus braços, deu um beijo na minha bochecha em uma
demonstração de afeto público. Sua mão grande envolveu a minha cintura,
me puxando para si, seu calor me abraçando e confortando.

— Qual o seu parentesco com o paciente, senhora?

— Irmã.

— Você tem algum seguro de saúde conveniado? — perguntou com a


sobrancelha arqueada em desdém, ao olhar meu jeans e camiseta sem ser de
marca.

— Não.

— Imaginei que não — sussurrou para si mesma e eu franzi o cenho.


— Como deve saber, senhora, abriremos uma ficha com as despesas médicas
a serem pagas, inclusive a consulta de última hora com o doutor Albert. Pelo
protocolo, somos obrigados a registrá-la no nosso sistema.

— Isso não é nenhum problema para mim — disse com uma


segurança que não sentia completamente, embora tivesse o dinheiro do
contrato que tinha assinado com o Andrea.
[28]
— De fato não o é, mio amore — Andrea interveio com voz
arrogante. — Estamos com certa urgência. Mais alguma coisa?

A mulher engoliu em seco e digitou algo freneticamente no


computador.

— Os acompanhará na consulta, senhor? Se sim, qual o parentesco


com o paciente? É procedimento não deixar entrar sem essas informações.

Sem dar uma resposta, Andrea pegou a carteira e jogou a habilitação


no balcão.

— Não sabia que isso era necessário, digo, o parentesco — soou


friamente —, mas, tudo bem, só quero apoiar a minha futura esposa. —
Apertou-me ainda mais junto a si. — Como não existe um documento que
ateste nosso noivado, vamos logo.

Tive que conter o impulso de arregalar os olhos com a sua frase,


desmentindo-o na frente da mulher arrogante. Mas a mentira era chocante até
mesmo para mim, nunca pensei que o meu chefe seria capaz de dizer
tamanho absurdo. Mas se fosse para facilitar nossa entrada, que seja. Estava
ficando cada vez mais impaciente, ainda mais ao ouvir o choro baixinho de
Will.

Com uma careta, a mulher terminou de fazer a ficha e devolveu os


nossos documentos.

— Só vou confirmar com o doutor Schneider onde ele se encontra.

— Quando eu liguei para ele, me falou que estaria na ala oeste,


terceiro andar, no seu consultório.

— Certo, tenha um bom dia.

Sem dizer nada, Andrea me arrastou enquanto eu colocava os


documentos na bolsa para entrar no elevador, sem saber que, em menos de
duas horas, o sofrimento e impotência que sentia ao ver meu irmão sentindo
tamanha dor iria aumentar exponencialmente, acrescida com a culpa e o
sentimento de fracasso.
Capítulo Vinte e sete

Como eu esperava, o médico mostrou-se bastante reticente ao ouvir


Adelle explicar a situação, porém não comentou nada até fazer novos
exames, pois inflamação no apêndice era uma doença de desenvolvimento
rápido e ele só poderia dizer alguma coisa com uma tomografia em mãos.
Mas pude ver que, enquanto o médico dizia isso, Adelle empalideceu ainda
mais, sua expressão revelando todo o seu sofrimento, dor e angústia.
Principalmente quando o doutor Schneider, junto com outro médico, pediu
que minha secretária assinasse o termo de internação de William e um outro
documento, sobre dar a eles a autorização para a realização de qualquer
procedimento de emergência sem precisar comunicá-la e que ela concordava
em arcar com todos os custos eventuais. Ela hesitou um pouco, pensando se o
dinheiro que tinha lhe dado seria suficiente para pagar a conta de um hospital
como aquele, mas apenas comuniquei a ela para não se preocupar com isso,
que eu acertaria tudo depois, que o bem-estar do seu irmão era a única coisa
que deveríamos nos preocupar no momento.

A mulher forte e determinada, que normalmente eu via, se dissolveu


em um poço de angústia e medo uma hora depois, quando o médico entrou no
quarto em que estávamos acompanhado de um cirurgião e uma enfermeira,
que carregava um carrinho com medicamentos.

Foi instintivo para mim tocar seus ombros quando a senti estremecer
ao fitar o homem mais velho, que tinha uma expressão extremamente grave
no rosto. A dor dela me incomodava, sufocava de uma forma que nunca
imaginei ser possível. Apenas sabia que queria tomá-la toda para mim, pois
não suportava vê-la dessa maneira. Quebrada, desamparada, como se ela
assistisse o seu mundo desabar todo de uma vez sem poder fazer nada.

— E então, doutor? — ela forçou-se a dizer, sua voz trêmula ecoando


por todo o cômodo.

— Temo que tenho más notícias. — Senti Adelle ficar um pouco


bamba e com uma mão enlacei a sua cintura, querendo transmitir a ela
segurança e conforto. Sabia que não gostaria de ouvir as palavras do médico.

— Diga — ordenei.

— Precisamos submetê-lo a uma apendicectomia convencional, já que


detectamos através dos exames que o apêndice sofreu uma ruptura e tem
pequenos abcessos. A laparoscopia, um procedimento que seria menos
invasivo, só poderia ser realizada se o caso não fosse tão complicado. A
apendicite deve ser sempre tratada com urgência para evitar maiores
problemas.

— Mas a doutora Shutz disse que, como estava em estágio inicial, os


antibióticos fariam o efeito desejado… Que talvez nem seria necessária a
realização do procedimento cirúrgico.

— Bom, senhora Beckett, vários são os estudos que vem pesquisando


sobre o tratamento antibioticoterápico para apendicite, porém são
experimentos randômicos e bastante incipientes. Os resultados têm se
mostrado satisfatórios por retardar um pouco a necessidade de procedimentos
invasivos, porém, por enquanto, o único tratamento completamente aceito é o
cirúrgico. Mas eu ainda acredito na ciência e que um dia chegaremos a esse
ponto.

— Essa mulher deveria ter a licença médica dela caçada, isso sim —
o cirurgião comentou baixinho, para si mesmo, mas soou audível mesmo
assim. — A irresponsabilidade dela poderia ser fatal. Além de colocar a
credibilidade de uma pesquisa séria a perder.

Adelle soltou a mão do irmãozinho, desvencilhando de mim também,


e se abraçou, seus ombros subindo e descendo me indicavam que ela estava
prestes a desabar de vez.

— Quer dizer que os antibióticos que ela passou… — Sussurrou.

— Infelizmente ainda é um tratamento experimental sem


comprovação científica.
— Por que ela faria algo assim? — Levou a mão a boca. — O que ela
ganharia com algo assim?

— Prestígio, dados, vai saber o que se passa na cabeça dela… — Fez


uma pausa. — Mas agora precisamos agir, a sala está sendo preparada.

Como se estivesse em um transe de dor, Adelle se aproximou


novamente da criança, com o rosto molhado pelas lágrimas que rolavam, e
beijou a bochecha do irmão, que tinha sido sedado para sentir menos dor;
induzido ao sono, o que me obrigou a assentir para o doutor em seu lugar.

— Desculpe, meu amor, desculpe por ter colocado você em risco sem
saber. — Deu outro beijo nele. — Espero que um dia você possa me perdoar,
pois eu não irei. Eu te amo tanto, Will… Meu Deus, o que foi que eu fiz?

Enterrou a mão no rosto e seu choro ficou mais forte, convulsivo, que
me atingiu diretamente, fazendo meu coração se apertar como nunca. Apenas
desejei poder tomar toda a sua dor para mim.

— Com licença, senhora — a enfermeira pediu, tocando a mão da


minha secretária, porém Adelle parecia alheia a tudo, afundada em culpa.

— Não se preocupe, moça, ele está em boas mãos e, apesar de tudo,


ele não corre risco de morte. — O cirurgião falou e fez um sinal para que eu
ajudasse.

Sentindo-me abalado pelo desespero da minha secretária, aproximei-


me de Adelle, que parecia uma boneca sem reação, e, com gentileza, puxei-a
contra o meu corpo, abraçando-a e fui afastando-a da cama com passos
lentos, dando espaço para a equipe trabalhar.
— Ficará tudo bem, tesoro — apertei-a com mais força contra mim,
sem me preocupar com nada, enquanto acariciava seus cabelos —, não ouviu
o médico? Ele vai ficar bem, embora o caso seja delicado. Não é uma cirurgia
de alto risco.

Não sei quanto tempo continuei a repetir isso no ouvido dela até que
ela pareceu se acalmar um pouco, erguendo o queixo para me fitar. Toquei o
seu rosto, limpando o rastro de lágrimas que umedecia sua pele.

— Você me promete, Andrea?

— Sim, mio amore. — Dei um beijo na sua testa. — Eu prometo.

Abracei-a com força tentando transmitir minha certeza, e a senti


relaxar um pouco, embora lágrimas ainda escorressem pelo seu rosto.
Confiava nas palavras do médico e do cirurgião, que eram dois dos melhores
de Nova York.

— Estamos prontos. Se tudo ocorrer bem, a cirurgia demorará de


trinta a noventa minutos. — O cirurgião começou a explicar como seria o
procedimento, e nós assentimos. — Se quiser dar um até logo, senhora, fará
bem para vocês dois. — Fez uma pausa. — Tenho certeza que o
procedimento será um sucesso, já fizemos muitas outras antes.

— Obrigada.

Desvencilhando do meu abraço, Adelle aproximou-se novamente da


maca e pegou a mãozinha do irmão, beijando-a.

— Me perdoe, querido…

Soltou a mão dele e deixou que a equipe o transportasse para fora do


quarto.
Capítulo Vinte e Oito

Eu não conseguia parar de chorar, a culpa me corroendo por dentro


como se fosse ácido. Saber que eu tinha prolongado a dor do meu irmão ao
seguir o tratamento doía e muito dentro de mim, me fazendo entristecer ainda
mais só de pensar que eu poderia ter colocado sua vida em risco. Por ter
acreditado em uma profissional formada, licenciada. O que ela ganharia
brincando com a vida das pessoas assim? Como pode ser tão cruel? Existiam
outros pacientes vítimas do seu tratamento? Como uma pessoa dessas ainda
tinha licença para atuar em uma clínica médica? Eram tantos por quês e ses
que doía, incomodava…
— Meu Deus — sussurrei, voltando a me abraçar, sentindo as
lágrimas descerem pelo meu rosto. — Como eu pude ser tão tola? Eu falhei
tanto com ele.

— Xiu — a voz suave dele soou no meu ouvido, e senti ele me


envolvendo no seu abraço, girando-me contra o seu peitoral. O calor do seu
corpo me dava um pouco de conforto, seu toque nos meus cabelos era como
um bálsamo, me dizendo que não estava sozinha, porém não conseguia
amenizar tudo o que sentia. — Você não falhou, tesoro. Tenho certeza que
seguiu o tratamento à risca…

— Dando um remédio que não tinha eficácia comprovada para o


tratamento. — Ri amargamente, sentindo mais lágrimas quentes rolarem
pelas minhas bochechas. Senti o seu corpo ficar tenso e ele apertou minha
cintura com mais força. — Um que quase colocou a vida do meu irmão em
risco.

— Não foi culpa sua, Adelle — senti a fúria emanar dele.

— Mas e se… — Engoli em seco só de pensar no que poderia ter


acontecido. — Deus, me sinto tão tola, Andrea. Por quê?

— Olhe para mim, amore[29]. — Ergueu o meu queixo e me fez fitar


seus olhos azuis preocupados. — Prometo que usarei todos os recursos que
estiverem ao meu dispor para que essa mulher nunca mais pise em um
consultório. Só descansarei quando a vir pagar por tudo o que ela fez com seu
irmão e vou mandar investigar se ela enganou outras pessoas. Acabarei com a
carreira dela e de todos que estiverem envolvidos nisso.
— Obrigada… — Funguei. Eu não era uma pessoa vingativa, porém
não se tratava de um erro médico, mas talvez algo mais deliberado. E ela não
poderia ficar impune, livre para passar um tratamento experimental sem
explicá-lo corretamente aos pais, arriscando vidas. Nem sempre eu
concordava com as coisas que Andrea fazia para benefício próprio, mas
sentia que ali não seria cometida nenhuma injustiça.

— Não se preocupe com nada, tesoro. — Deu um beijo na minha


testa, sua mão fazendo movimentos circulares nos meus cabelos. — Eu
cuidarei da parte suja por você. Tenho poder e dinheiro para sair impune se
precisar jogar baixo... Para te proteger, cuidar — sussurrou as últimas
palavras para si mesmo tão baixo, que provavelmente não desejava que eu
ouvisse. Lágrimas se assomavam nos meus olhos por outra razão diferente da
dor. Eu facilmente poderia me deixar enredar pelas suas palavras que
ofereciam calor, conforto, proteção… se eu fosse sincera, eu já estava
completamente entregue a ele, aceitando qualquer fragmento de apoio
emocional que ele me oferecia mesmo sem saber. Por mais que na maioria
das vezes Andrea Della Torre fosse um homem frio, insensível e ambicioso,
ele estava me mostrando um lado carinhoso e protetor que trancava a sete
chaves dentro de si. E eu gostava mais e mais de vislumbrar esse lado,
mesmo que eu fosse sair ainda mais machucada depois.

— Sei que sim. — Beijei o seu rosto com a barba por fazer. —
Obrigada por isso, Andrea. — Aninhei-me de encontro o seu peito, pouco a
pouco as lágrimas secando nos meus olhos. — Por estar aqui, me apoiando e
dando consolo. Não sei o que estaria sendo de mim agora… — Estava sendo
sentimental, novamente quebrando a cláusula do nosso acordo, porém eu
precisava dizer isso a ele, mesmo correndo o risco de irritá-lo.

O senti engolindo em seco e soltando um suspiro profundo, porém


não disse nada, apenas me segurou com mais força, seu corpo me dando a
resposta que ele não queria me dar verbalmente. E que era tudo o que eu
precisava.

Ficamos assim por vários minutos, seu calor e toque nos meus cabelos
me acalentando, seus lábios quentes e macios pousando na pele do meu rosto
em carícias suaves. Deus, como era bom ficar assim… Sem que eu pudesse
conter, uma lágrima teimosa escapou dos meus olhos chorosos e senti seu
polegar limpando-a.

— Ficará tudo bem, tesoro. — Deu-me um selinho terno e


gentilmente se afastou, mas não sem antes afagar meus ombros. — Agora
sente-se na poltrona um pouco, dolcezza[30], enquanto eu providencio algo
para comermos.

— Estou sem fome. — Sentei-me no assento, e como uma tola, senti


falta do contato dele.

— Mas irá se alimentar mesmo assim, tesoro. — Fez uma careta. —


Espero que tenha um café decente por aqui. Não demorarei, mas qualquer
coisa me ligue. — Curvou-se sobre mim, dando um beijo suave em meus
lábios em despedida, como um homem apaixonado fazia, o que era um
pensamento irracional da minha parte. Mesmo assim, saboreei o breve toque.
— Até daqui a pouco…
Assenti e o vi deixar o quarto lentamente, como se relutasse em fazê-
lo, lançando-me um último olhar por sobre os ombros.

A solidão me envolveu novamente.

***

Sob o olhar de Andrea, como se eu fosse uma criança pequena,


obriguei-me a dar mais uma colherada na salada de frutas tropicais, que
embora tivesse cores vibrantes, não tinha gosto de nada em minha boca. A
comida estava deixando meu estômago cada vez mais embrulhado.

Fazia pouco mais de quarenta minutos que Will tinha sido levado para
a sala de cirurgia e tudo se revirava dentro de mim com a expectativa. Será
que estava correndo tudo bem? Ou teria tido alguma complicação? Eu dizia
para mim mesma confiar nos médicos que falaram que, apesar da urgência,
era uma cirurgia com baixo risco e que daria tudo certo, porém precisava ver
com meus próprios olhos.

Dei mais algumas colheradas e tampei a vasilha, não aguentando mais


forçar-me a comer, fazendo ele arquear a sobrancelha.

— Está tão ruim assim? Pensei gostaria, já que adora experimentar


novas coisas.

— Obrigada por pensar em mim. — Não sabia o que poderia dizer, de


fato era muito atencioso da parte dele pensar em algo assim só para tentar me
animar um pouco, mesmo que soubesse que não o conseguiria de fato.

Ele deu de ombros.

— Não me custa nada. — Um brilho estranho cruzou seus olhos


azuis, que provavelmente carregava significados ocultos que não consegui
decifrar. — Agora coma esses biscoitos e tome o café, antes que esfrie. Você
não comeu nada ainda. — Ordenou em tom firme.

— Okay. — Poderia protestar, porém obriguei-me a ingerir mais um


pouco de alimento. Precisava manter as minhas forças. Não poderia fracassar
ainda mais com o meu irmão ao ficar mole por não me alimentar. Tinha
falhado uma vez com ele, não queria uma segunda. Embora eu tivesse o
apoio momentâneo de Andrea, o que me deixava completamente agradecida,
sabia que ele não estava à minha disposição, ele tinha coisas mais
importantes para fazer do que cuidar de uma criança que precisa de atenção
no pós-operatório.

Também não sabia quantos dias ou semanas Will precisaria para ficar
completamente curado, mas me dedicaria a ele até que estivesse bem o
suficiente. Só que não sabia se as leis trabalhistas existentes me permitiriam
algumas semanas, embora soubesse que tinha direito de alguns dias de folga
não remuneradas. Se não fosse esse o caso, teria que deixar o meu emprego
que tanto gostava. Mesmo pagando a conta do hospital caríssimo, acreditava
que sobraria algum dinheiro para cuidar do meu irmão.

— O que foi, tesoro? — Me fitando com atenção, o homem levou seu


dedo aos meus lábios, limpando uma migalha que ficou de um dos biscoitos.
O homem à minha frente parecia estar sempre consciente de tudo o que fazia
e ter essa atenção era incrivelmente boa. — Está de cenho levemente
franzido. O que te preocupa?

— Tenho que avisar o RH que não poderei ir trabalhar e…


— Não se preocupe, mio amore. Eu farei isso… — Tocou minha
bochecha e eu apreciei o contato quente e terno. — Ficará fora o tempo que
precisar, sem perder sua remuneração.

— E se eles…

— Não irá acontecer nada com o seu emprego, Adelle. Sou o dono de
tudo aquilo ali e você me é indispensável. — Fez uma pequena pausa. —
Muito mais do que você imagina... — Sua voz saiu rouca, aveludada, e eu
não contive o arrepio que me varreu ao assimilar o duplo sentido das suas
palavras. Andrea me envolvia cada vez mais com suas palavras doces e,
completamente vulnerável, me deixava levar cada vez mais por elas, me
fazendo acreditar que era valiosa como mulher. Única. Embora isso fosse um
grande erro, pois não era nada disso. Eu era apenas uma funcionária, mas
agora também a sua amante. A mulher que ele desejava…

— Eu…

— Fique tranquila, tesoro. Pedirei que alguém te substitua


temporariamente para anotar os recados e organizar minimamente os
documentos, mas ninguém fará tão bem como você. — Segurando o meu
queixo, curvou-se sobre a mesa e deu-me um selinho, apenas para se sentar
de novo na sua cadeira. — Você é a melhor, mio cioccolato. Seus conselhos e
opiniões, inestimáveis. Bom que Edward não sabe disso… — Fez uma
careta.

— Ele não foi o único. — Disse por dizer.

— Então quer dizer que tenho mais concorrentes? — Um brilho


cruzou o olhar dele, uma mistura de raiva e diversão.
— Bem…

— Tenho que pensar em outras estratégias para manter a minha


melhor funcionária. — Deu de ombros, dando um sorriso que em outro
momento teria me feito derreter.

Não disse nada, apenas forcei-me a comer mais alguns biscoitos e


engolir o café que estava quase frio enquanto Andrea me observava em
silêncio. Embora pudesse ser constrangedor com outra pessoa, o silêncio que
pairava entre nós era confortável. Assim que terminei, o homem à minha
frente pegou as embalagens descartáveis, jogando-as fora.

— Você se importa que eu responda alguns e-mails?

— Claro que não, Andrea. Fique à vontade. Preciso mandar notícias


para a Ash também. — Fiz uma pausa. — Você nem precisava perguntar
isso, perante tudo o que está fazendo por nós.

— Não é nada, tesoro. — Deu-me mais um beijo de leve, acariciando


meu rosto, e foi pegar seu computador que sempre levava no carro, deixando-
me a sós no quarto momentaneamente. Assim que voltou, pegou a minha
bolsa, me entregando a seguir, e se sentou na mesa.

Enquanto trocava algumas mensagens com Ashley, era inevitável não


pensar no quando Andrea estava sendo atencioso e prestativo. Ao assinar o
contrato de amante, não podia imaginar que descobriria várias facetas dele
que se escondiam sob a fachada fria, severa e arrogante que ele apresentava a
todos, e que provavelmente poucos conheciam. E esse lado dele era
completamente fascinante, e era muito fácil se iludir e apaixonar por ele.
Soltei o celular depois que Ash escreveu que qualquer coisa era só avisar, e
mergulhei nos meus próprios pensamentos, perdendo a noção de tempo, até
que uma batida na porta e o cirurgião entrando, seguido da maca com o meu
irmão, me fizeram voltara a realidade. Instantaneamente, eu saltei da cadeira
e me aproximei do meu menininho, que foi transferido para a cama hospitalar
e notei que estava com soro na veia. Ele parecia um pouco agitado e o
nervosismo se assomou dentro de mim, tanto que só percebi a aproximação
de Andrea quando ele pousou sua mão sobre os meus ombros.

— Está tudo bem, doutor? — Forcei-me a perguntar.

— Embora tenhamos precisado administrar alguns remédios e lavar a


parede abdominal a fim de evitar infecção, já que ele tinha um abcesso, a
cirurgia foi bem-sucedida e não teve maiores problemas.

Deu um sorriso e eu senti que fiquei mole pelo alívio, tanto que senti
Andrea envolver minha cintura, me dando suporte.

— Fico feliz em saber.

Um pouco mais controlada, dei alguns passos e aproximei-me da


cama, e tirei uma mecha que estava grudada em sua fronte.

— Aos poucos o efeito da anestesia irá passar, e é natural a


inquietação e ele perder a noção do que está acontecendo ao seu redor.

— Certo, doutor.

— Del? — Meu irmão tentou se levantar, mas suavemente o deitei,


atenta a mãozinha conectada por agulha ao soro.

— Tudo bem, querido. Fique quietinho, deitado. — Curvei-me, dando


um beijinho na sua fronte.
— Hm… — Fechou os olhinhos.

— É procedimento comum nesse tipo de cirurgia que o paciente fique


internado por vinte e quatro horas para ser observado antes de ter alta, mas
como o caso dele era um pouco mais grave e ele é uma criança, manteremos
ele um pouco mais. Queremos garantir que nenhuma inflamação nas paredes
ocorra.

— Okay.

— Então é isso, mais tarde passarei para ver como ele está se
recuperando.

— Obrigada, doutor. — Eu e Andrea falamos ao mesmo tempo.

— Nada. Qualquer coisa, é só apertar o botão ao lado da maca que


uma enfermeira virá.

Assenti e, sem tirar os olhos de Will, ouvi o médico e o restante da


equipe deixarem o apartamento. Sem que eu conseguisse conter, uma lágrima
de alívio escorreu pelo meu rosto enquanto eu tocava meu irmãozinho.

— Graças a Deus… — Sussurrei para mim mesma, enquanto


acariciava os cabelos do meu pequeno que se remexia levemente.

Fiquei ali por um bom tempo, até que uma mão gentil apertou os
meus ombros, fazendo com que um calor bom se espalhasse pelo meu corpo.

— Adelle? — Sua voz rouca era o suficiente para fazer os meus pelos
se arrepiarem como uma tola. Era surreal a forma como reagia a sua voz, ao
seu cheiro, a sua presença.

— Sim? — Virei-me para ele, fitando seus olhos azuis.


— Alguma preferência de roupa e marca de objetos pessoais? Ligarei
para alguém providenciar tudo o que você precisa para ficar com o seu
irmãozinho e para ele também.

— Ah… — Franzi o cenho.

— Tenho certeza de que você não irá querer deixar seu irmão
enquanto ele estiver em observação. — Colocou uma mecha atrás da minha
orelha. — Então você e ele precisarão de algumas coisas.

— Tinha me esquecido completamente disso… Qualquer coisa está


bom. — De fato, naquelas circunstâncias nada me importava além o meu
irmãozinho.

— Tudo bem, tesoro. Darei um telefonema solicitando tudo que você


possa precisar.

— Obrigada.

Dei um sorriso quando o vi caminhar até uma pequena varanda do


quarto. Perante aquele homem eu perdia completamente minha capacidade de
agir com bom senso. Deveria recusar sua ajuda, argumentando que eu poderia
me virar, porém algo dentro de mim queria prolongar ao máximo a sensação
de que eu tinha alguém mais forte em que poderia me apoiar. Sabia que nos
próximos dias seria eu apenas, então queria desfrutar enquanto podia.
Capítulo Vinte e nove

Já passava um pouco das oito da noite quando adentrei a minha


cobertura que ficava a poucos quilômetros do hospital onde William estava
internado. Eu poderia estar me sentindo aliviado por ter tudo dado certo,
principalmente depois da culpa avassaladora que senti pôr a ter comprado
perante a situação em que ela se encontrava, preferindo acreditar que ela não
passava de uma interesseira, porém esse alívio não veio. Pelo contrário, um
desconforto me invadiu quando uma das enfermeiras avisou que o horário de
visita tinha encerrado e que apenas um acompanhante poderia ficar no local.
Eu sabia que era uma regra de todos os hospitais, uma pela qual nem mesmo
todo o meu dinheiro poderia burlar, mas, mesmo assim, foi com certa
relutância que deixei uma Adelle atenta a um menininho desperto. Contra
todo o meu bom senso, eu queria ter ficado ao seu lado. O motivo? Eu não
tinha certeza e não queria pensar muito mais a respeito, embora ele me
consumisse e me deixasse irritado.

Passando a mão pelos cabelos, jogando os fios para trás, coloquei a


chave do meu veículo no móvel de entrada e caminhei a passos lentos até
onde ficava o bar, a fim de servir-me de uma dose dupla do whisky mais forte
que tinha guardado. O líquido com certeza diminuiria a sensação de
desconforto absurdo que sentia. Eu fiz tudo o que poderia ter feito para ajudá-
la, porém uma parte de mim me dizia o contrário.

Tolo.

Bebi todo o conteúdo do copo em um gole só, sentindo a minha


garganta arder e meus olhos lacrimejarem, porém não foi suficiente para
afastar o incômodo que parecia impregnado em mim. Cada pedaço meu
implorava para que eu estivesse ao lado dela, mesmo que o pior já tivesse
passado. Queria amparar aquela mulher, auxiliando-a no que fosse possível,
independente das milhares de coisas que tinha que fazer. Queria ser o seu
apoio, o seu pilar, como ela o era de alguma maneira para mim. Sei que era
uma completa idiotice da minha parte. Eu era um homem frio, ambicioso,
capaz de destruir tudo aquilo que estivesse no meu caminho, não aquele que
era capaz de se doar a alguém ou a algo. Mesmo assim, estava impelido em
ser o seu companheiro no sentido literal da palavra, pelo menos enquanto o
irmão não estivesse completamente recuperado. Me incomodava saber que
ela carregava nas costas uma grande responsabilidade em cuidar de uma
criança, gerir uma carreira e sustento, pagar dívidas, contando apenas com
uma vizinha para ajudá-la que também tinha seus próprios problemas. Ver a
única mulher que realmente desejava e admirava vulnerável tinha me tirado
completamente do eixo e sem reação, a pessoa centrada e racional se
dissolvendo em meio ao caos. Confuso, de uma única coisa eu tinha certeza
era que nunca mais queria ver Adelle assim. E no que dependesse de mim
isso não mais aconteceria, aproveitaria minha posição como amante para
garantir isso.

Pegando mais uma dose da bebida, levei aos lábios o líquido e


caminhei até a janela panorâmica sem de fato ver o Central Park. Quando ia
dar mais um gole no whisky, meu telefone apitou várias vezes, indicando que
tinha recebido várias mensagens.

Imaginando que poderia ser alguma de Adelle, senti um calafrio


percorrer o meu corpo ao pensar que algo poderia ter acontecido no curto
espaço de tempo que a deixei só, então peguei o aparelho do bolso da calça e
destravei, apenas para constatar que era a minha mãe enviando uma série de
fotografias que ela e meu pai tiraram do passeio feito no dia de hoje. O lugar
era realmente bonito, mas as que estranhamente me despertaram a atenção
foram as dos dois juntos, ora se abraçando, se beijando ou encarando um ao
outro como se não existisse nada além daquilo que eles compartilhavam. Não
havia nada demais nelas, a troca de afeto em público deles era uma coisa
bastante comum, e algo que todos nós estávamos acostumados, mas preso ao
turbilhão de coisas que sentia, contemplei-as por outro ângulo, que
diferenciava e muito da visão de filho. Era evidente só de fitá-los o desejo e a
paixão que ardia entre os dois. Algo intenso, que faria com que qualquer
pessoa romântica suspirasse.

E, por um momento, me questionei se alguém seria capaz de fazer


com que eu a olhasse dessa maneira, me fazendo retribuir, sobrepujando
meus objetivos e o meu trabalho. Assim que pensei nisso, um par de olhos
verdes surgiu em minha mente e eu cerrei os dentes, guardando o celular no
bolso embora a imagem não me deixasse. Parecia que o meu cérebro tinha
guardado cada nuance e expressão deles, a intensidade. Mas o que me fez
estremecer, que me fez deixar o copo cair dos meus dedos, era a lembrança
dela me olhando com desejo enquanto a fazia minha com minhas mãos e
lábios.

— Cazzo. — Soltei um suspiro profundo. Meus pensamentos estavam


indo longe demais. O whisky estava embolando ainda mais minha capacidade
de raciocínio, mas não o suficiente quando um assunto urgente que deixei de
lado durante o dia assomou os meus pensamentos.

Sem me importar com as horas, disquei o número do responsável pela


equipe de investigação que eu sempre contratava. Juntaria todas as provas
possíveis e massacraria aquela médica que colocou a vida do irmão da Adelle
em risco.
Capítulo Trinta

Não contive a surpresa quando, com sua arrogância masculina natural,


trajando um terno escuro impecável, Andrea adentrou o apartamento
hospitalar segurando sua pasta e um embrulho, fazendo Will soltar um
gritinho fraco.

— Andrea.

— Vejo que se sente um pouco melhor, piccolo. — Sorriu para ele. —


Como você está?

Aproximou-se de uma mesa de canto, deixando as coisas em cima


dela, caminhando até onde estávamos, já que eu não conseguia afastar-me de
Will.

— Quero ir pra minha casa— disse com a voz mais fraquinha.

— Imagino. — Próximo a cama, tocou os cabelos dele com


suavidade. — Mas será por pouco tempo, bambino, prometo.

Para minha surpresa, Andrea se curvou e deu um beijo suave na testa


dele, como se fosse um pai confortando um filho, e aquele gesto fez com que
meu coração desse um salto no peito. Era impossível não se encantar e se
apaixonar pela cena, principalmente quando Will envolveu seu pescoço com
seus bracinhos em um abraço e Andrea deixou-se abraçar. Como uma tola,
senti meus olhos lacrimejarem, porém não chorei. Deveria colocar algum
limite, pois quando meu chefe se cansasse de mim, tudo iria acabar, porém,
contemplando os dois, foi impossível não me deixar levar por ela, por mais
que fosse uma ilusão. Ali eu soube que era impossível não me apaixonar por
aquele homem que mantinha um controle rígido sobre tudo, principalmente
sobre as suas emoções, ainda mais se ele continuasse a agir com tamanho
carinho. E aqui estava, quebrando a principal regra do contrato novamente.
Deveria me considerar uma pessoa de sorte por não haver alguma espécie de
multa nas cláusulas por ele estabelecida, pois já era tarde demais para mim.

Enquanto os observava, soltei um suspiro apaixonado, que fez com


que Andrea gentilmente se afastasse de William e virasse para mim, seu
corpo ficando tão próximo ao meu, que pude sentir o calor que emanava dele.
Seus olhos azuis brilhavam com intensidade enquanto me fitava, porém pude
perceber o cansaço presente em suas feições, o que me deixou levemente
preocupada.

— Andrea. — Levei as mãos ao seu queixo, sentindo os pelos da sua


barba pinicando sob o meu toque, e acariciei seu rosto bem-feito.

Sem dizer nada, abaixou sua cabeça e aproximou seus lábios dos
meus, beijando-me suavemente, explorando-me ternamente, apenas com um
toque gentil. Sua boca cálida e morna brincava com a minha sem de fato
provar-me.

— Eca — o comentário inocente de Will fez com que eu desse um


passo para trás e Andrea interrompesse o beijo. Para o meu desespero, um
sorriso lento e extremamente sensual se formou nos lábios de Andrea,
contendo várias promessas, seus olhos fumegando diversão.

Aprumando meu corpo, tentei manter uma postura mais séria, porém
sob o olhar de Andrea e pelos efeitos do beijo, provavelmente falharia
miseravelmente.

— Bom dia, Andrea. — Coloquei uma mecha do meu cabelo para


trás. — Não sabia que viria hoje.

— Oi, tesoro.

Sem responder a minha pergunta, envolveu a minha cintura com força


e beijou-me novamente com ainda mais intensidade, mesmo sob as
reclamações infantis de William. Tentei me segurar para não rir enquanto a
boca de Andrea se movia contra a minha, porém as lamúrias e sons do
pequeno eram tão engraçados que apartamos o contato e caímos na risada,
que ecoou por todo o quarto.
— Não entendi — meu irmãozinho resmungou, mas logo começou a
gargalhar se juntando a nós, mesmo sem compreender o motivo.

— Estava te provocando, piccolo. — Andrea se virou para ele,


parecendo mais no controle de si. — Quando você estiver mais crescidinho,
você verá que não é tão ruim e nojento assim… — bagunçou o cabelo dele.

— Não vou, não. — Balançou a cabeça em negativa.

— Um príncipe ou um cavalheiro nunca resiste e acaba beijando a


princesa — viu a careta do meu irmão para ele. — Até mesmo o ogro.

William riu uma gargalhada gostosa, e agora eu que tinha ficado sem
entender ao que os dois se referiam. Dei de ombros, e sorri enquanto via eles
interagirem. Porém não demorou muito e ele se virou para mim, tocando o
meu rosto.

— Como foi a noite? Conseguiu descansar um pouco?

— Ele foi despertando aos poucos e conseguiu comer toda a sopa que
o hospital enviou. Pensei que iria ser muito mais difícil pelos efeitos da
anestesia geral, mas Will passou quase o tempo todo dormindo. Acho que o
mais difícil será mantê-lo quieto estando acordado.

— Entendo, tesoro. — Não disse mais nada e apenas continuou a


fazer carinho em mim.

— E você? Parece cansado. Não conseguiu dormir bem?

— Não. — Sua voz saiu rouca, porém não explicou o motivo.

— Te conhecendo como eu conheço, ficou a madrugada inteira em


cima de relatórios e planilhas — dei um suspiro —, você deveria tentar
dormir mais cedo. Te fará bem.

— Isso é uma ordem da minha amante, mammina?

— Se for necessário, sim.

— Hm… — Um brilho cruzou seus olhos. — Bom saber como


funcionará a nossa relação.

Dei de ombros, sem saber o que responder, e ele sorriu, antes de se


virar para William novamente.

— Trouxe um presente para você, piccolo.

— Eeee. — Deu um gritinho e animado, tentou se levantar da cama,


porém Andrea o conteve com a mão.

— Só irá recebê-lo se ficar bem quieto e comportado. — Piscou para


ele e meu irmãozinho obedeceu, o medo de perder o seu presente muito
maior que a sua empolgação.

Enquanto meu chefe andava para buscar o embrulho, acionei os


botões para deixar a maca confortável para o meu irmão, sentando-o,
enquanto ele aguardava ansiosamente. Quando se aproximou novamente,
entregou o pacote para Will, que o abriu sem a menor cerimônia, rasgando o
papel brilhante até revelar um aparelho eletrônico que deveria ter custado
alguns milhares de dólares.

— O que é?

— Um videogame.

— Uau! — A empolgação sumindo em meio a uma careta. — Mas


como joga?

— Deixa que eu te mostro, piccolo.

Completamente grata por Andrea ter comprado um presente que iria


distrair e muito William, embora eu tivesse que controlar o tempo que ele
utilizaria o portátil, afastei-me deles e sentei na mesa de canto, observando-os
interagir, embevecida, assistindo eles rirem um para o outro, brincando e
conversando. A paciência do meu chefe com a criança me deixava
completamente surpresa, pois, com os seus funcionários, ele demonstrava ter
pavio curto, não tolerando nenhum erro, dúvida ou incompetência.

Quando pareceu que Will conseguia usar sozinho o aparelho, meu


chefe deixou-o e se aproximou de onde eu estava, sentando à minha frente,
mas antes removeu o terno, colocando-o na cadeira, e abrindo alguns botões
da sua blusa social, parecendo à vontade, mesmo estando em um hospital.
Olhei para ele e me passou pela cabeça que tinha quase certeza que, na
semana passada, tinha agendado uma reunião na parte da manhã dele com o
senhor Tahiro.

— Andrea?

— Sim, dolcezza?

— Você não tinha uma reunião daqui — olhei para o relógio fixado
na parede e involuntariamente franzi o cenho —, dez minutos?

Ele batucou os dedos na mesa e deu de ombros.

— Tenho.

— Então?
— Ele pode tentar marcar outra na semana que vem.

— Andrea — ralhei. — Não é assim.

— Que foi, mammina? Ouvi-lo tem se tornado cada vez mais um


aborrecimento.

— Então por que ainda compra as ideias dele?

— Você sabe por quê. No fim, são bastante lucrativas.

— Por isso mesmo você deveria tomar parte dela.

— É mesmo? — Curvou-se na minha direção roubando um selinho.


— Mas não estou interessado em ouvi-lo, não hoje.

Soltei um suspiro, dando-me por vencida.

— Tudo bem, você melhor do que ninguém sabe o que te convém.

— De fato, tesoro.

Ignorei o sentido duplo das suas palavras e observei ele se sentar


novamente na cadeira, seu olhar me avaliando por alguns minutos até que o
som de William me tirou do transe proporcionado pelo olhar dele.

— Ganhei!

— É mesmo, querido? — Levantei-me de súbito e, a passos largos,


me aproximei dele, tocando os fios dos seus cabelos que tinha caído sobre os
olhos.

— Olha, Del. — Apontou para o aparelho e eu olhei ele controlando


um bichinho.

— Você é muito bom — dei um beijo estalado na sua bochecha e ele


se regozijou —, agora deixa eu ver meu menininho em ação.

Enquanto observava William desajeitadamente brincando no


aparelho, com o canto do olho observei Andrea retirar o computador da pasta
e se colocar a trabalhar no seu notebook. E, estranhamente, meu coração deu
um salto no peito ao saber que ele iria ficar ali um pouco mais.
Capítulo Trinta e um

Dois dias no hospital tinham se passado mais rápido do que eu


poderia imaginar. Ashley veio visitar Will, trazendo um boneco, já que flores
seria estranho para uma criança receber. E, diferentemente do que eu achava,
Andrea passou quase todo o tempo do horário de visita com a gente, ora
trabalhando, ora conversando e brincando conosco. Ele ficou apenas algumas
horas distante quando precisou ir em algumas reuniões importantes. Fora
isso, Andrea permaneceu durante todo o tempo de visita daqueles dois dias
ali, trazendo sempre um pequeno presente para o convalescente, como ditava
a tradição.
Eu sabia que deveria ter argumentado que não precisava ter ficado ali
e nem encher meu irmão de presentes, que ele poderia seguir com a rotina
dele, porém eu fui fraca, não consegui nem mesmo sugerir tal coisa. Tinha
tentado com relação a reunião com o senhor Tahiro, mas depois que vi que
ele ignorou a sugestão, apenas decidi aproveitar enquanto podia a presença
dele, que me trazia conforto, e os pequenos agrados que pareciam fazer Will
sorrir ainda mais.

Mas, agora, felizmente, pois não conseguia lamentá-lo, meu irmão


teria alta, o que era o mais importante para mim. Depois de mais uma bateria
de exames, lá pelas nove da noite o médico disse que Will seria liberado, me
passando uma série de recomendações com o cuidado do pós-operatório, com
as medicações que tinha que tomar em casa, e precauções que iam desde a
alimentação até não fazer grandes esforços físicos. Muito mais aliviada pelo
pior ter passado, avisei a Ashley e Andrea por mensagem que pela manhã
deixaríamos o hospital, compartilhando com eles minha alegria, agradecendo
pela preocupação e o apoio.

Estava aguardando a enfermeira passar com o termo de alta do meu


irmãozinho, quando meu chefe adentrou o quarto de hospital, me
surpreendendo. Não esperava que ele viesse no dia em que deixaríamos o
hospital.

— Oi, Andrea — Will saudou-o assim que meu chefe se aproximou


da maca.

— Olá, piccolo.

Virou-se para mim e, como estava virando um costume, me


cumprimentou com um beijo suave, um mero roçar de lábios, como se
precisasse do simples contato todos os dias. Sei que não era intencional dele,
mas o mero toque das nossas bocas deixava-me formigando, ansiando por
mais. Nunca imaginei que eu ficaria tão sedenta pela sua carícia, que eu
precisasse dela como necessito de ar.

— Bom dia, dolcezza.

— Oi. Não estava esperando que você viesse hoje. — Externei a


minha surpresa sem me preocupar em como Andrea poderia interpretar minha
fala.

— Não poderia perder esse dia. — Deu-me mais um selinho e eu sorri


para ele, agradecida.

Virando-se para Will, entabulou uma conversa amena e poucos


minutos depois a enfermeira entrou no quarto.

— Bom dia, senhores — deu um sorriso —, trouxe o documento de


alta desse rapazinho. — Apontou para a prancheta e a caneta. — Ele está
mais do que bem para ficar em casa. Antes de irem embora, peço que o
responsável assine o termo e que também acerte a conta na recepção do
hospital.

— Certo, enquanto ela assina a documentação irei lá embaixo


providenciar o pagamento. — Meu chefe disse com a voz suave e a mulher
assentiu.

— Andrea, você não precisa... — tentei protestar, mas o mesmo


morreu quando ele fez um gesto para mim.
— É um prazer para mim, tesoro.

Sem me deixar dizer mais nada na frente da enfermeira, roubou mais


um beijo meu e saiu do aposento, com as mãos dentro dos bolsos da calça, o
que arrancou da mulher um suspiro apaixonado, como se não houvesse gesto
mais romântico para ela. Eu apenas balancei a cabeça em negativa e peguei a
prancheta da sua mão, lendo os itens da documentação. Não, dessa vez eu iria
bater o pé, não deixaria que Andrea arcasse com a despesa hospitalar. Era um
completo absurdo ele achar que iria deixar por isso mesmo sendo que eu
tinha o dinheiro. Porém toda a minha determinação em confrontá-lo quando
ele voltasse ao quarto sumiu enquanto eu arrumava as coisas de William, que
estavam em um canto do quarto nas sacolas e ele chegou me abraçando por
trás, o calor do corpo dele se espalhando pelo meu.

— Andrea?

— Já está pronta, tesoro? — Sussurrou contra o meu ouvido, fazendo-


me estremecer.

— Estou terminando, agora só falta guardar os presentes e estou


pronta para voltar para casa. Mas antes eu quero…

— Vocês não voltarão para casa — interrompeu-me com a voz


aveludada, e demorou alguns segundos para que minha mente absorvesse
suas palavras, fazendo-me virar em seus braços com o cenho franzido. Não
me importei em analisar a expressão que tinha em seu rosto, estava incrédula
demais para isso.

— O quê? — Tentei me controlar para não gritar de exasperação, não


estava em um ambiente propício e nem queria que Will se alarmasse.
Andrea arqueou uma sobrancelha e depois de um tempo deu de
ombros, sorrindo.

— Posso levar você até o seu apartamento se você quiser buscar


algumas coisas suas e do William, porém não dormirão ali. — Fez uma
pausa. — Pensando bem, nós precisamos do seu hidratante.

— Não estou entendendo…

— É simples, tesoro — segurou o meu queixo, fazendo-me fitar seus


olhos azuis brilhantes —, vocês vão, a partir de hoje, ficar comigo na minha
cobertura.

— Andrea, isso é loucura… — Recuei um passo para trás, afastando-


me, batendo com a bunda na mesa, completamente atordoada.

Eu não conseguia acreditar naquilo que tinha ouvido dele, era surreal
demais para acreditar.

— Não vejo nenhum problema nisso, dolcezza. — Deu um passo na


minha direção, não querendo distância entre nós. — Pelo contrário…

— É a sua casa, vamos invadir o seu espaço. — Maneei a cabeça. —


Não, não, iremos.

Curvou-se em minha direção e disse baixinho em meu ouvido, para


que somente eu escutasse: — Você não tem escolha, se lembra?

Engoli em seco ao lembrar da cláusula do contrato que tinha assinado,


que dizia que eu faria tudo que Andrea quisesse. Não, eu não poderia
esquecê-la. Tinha estranhado aquela exigência, porém não esperava que meu
chefe iria usá-la contra mim daquela maneira. Poderia não parecer uma
grande coisa, algo que não era tão difícil assim de cumprir, porém as
consequências de morar com Andrea, compartilhar sua casa, ainda mais com
uma criança em processo de recuperação, poderiam ser completamente
desastrosas, principalmente quando acabasse.

E o pior, eu não conseguia entender a razão para ele querer tal coisa.
Andrea sempre foi um homem que prezou a solidão, detestando interações de
cunho pessoal. Então por que ele desejava, da noite para o dia, que alguém
invadisse seu espaço? Que tirasse a sua liberdade? Éramos amantes por
contrato, não um casal de apaixonados vivendo uma vida a dois, por isso eu
previa dor para mim. Fiquei observando seus olhos, tentando compreender o
motivo, porém não o conseguia.

— Por que isso, Andrea? — Tive que perguntar, algo dentro de mim
queria saber a razão, por mais que, no fim, eu não gostasse do motivo.

Antes de responder, Andrea segurou novamente o meu rosto e se


curvou em minha direção, sua face estava tão próxima à minha que podia
sentir sua respiração contra a minha pele.

— Quer saber mesmo a verdade, Adelle?

Assenti.

— Porque eu não suporto a ideia de ver você cuidando de tudo


sozinha, tesoro — sussurrou as palavras em um tom que nunca ouvi antes e
eu estremeci.

Não tive tempo de responder, pois antes que pudesse pronunciar


qualquer coisa, Andrea diminuiu a distância que havia entre nós dois e,
envolvendo minha cintura com pressão, tomou meus lábios em um beijo
faminto, sem se importar com o fato de estarmos em um quarto de hospital.
Ele me devorava, persuadia, sua língua provava cada canto da minha boca
exigindo minha entrega. Eu poderia me perder mais e mais nos movimentos
que fazia e no seu sabor viciante, no seu corpo rígido, poderoso e controlado
contra o meu, porém, antes que perdêssemos o juízo, ele interrompeu o beijo,
encostando a testa na minha.

— Porque eu preciso, porque eu desejo, contra todo o meu bom senso.


E estou pouco me importando com as consequências…

— Andrea…

— Posso ajudá-la no que for preciso, tesoro. Você mesmo disse que
vigiá-lo e mantê-lo quieto será a parte mais difícil do tratamento.

— Ashley poderá…

— Deixe que eu o faça, Adelle.

— Eu…

— Não te darei escolha, tesoro… — Disse com uma voz tão suave
que tive que conter o sorriso bobo.

— Tudo bem — concordei, mesmo sabendo que deveria resistir mais.

Ele poderia não estar pensando muito nas consequências de eu e


William irmos morar com ele, mas eu estava. No entanto, deixei-me envolver
pelas suas palavras suaves que ofereciam apoio e companheirismo. A única
coisa que eu teria que ter em mente era que esse desejo dele, que tinha um
quê de altruísmo, tinha prazo de validade.
Eu também pude ver a determinação de Andrea em seu olhar que me
dizia que realmente não tinha escolha. Nesse tempo que trabalhava para ele,
eu sabia que ele era capaz de tudo para obter o que deseja e, se precisasse, ele
não iria se fazer de rogado em usar todas as armas e subterfúgios para obter o
que queria. E ele tinha o contrato ao seu favor, e não hesitaria em usá-lo
contra mim.

— Não irá se arrepender, docezza. — Deu-me um beijinho.

Não tinha tanta certeza disso, mas optei por não expor o meu receio e
com isso todos os motivos pela qual aquilo não acabaria bem.

— Você é muito controlador, sabia? — brinquei.

Ele arqueou a sobrancelha.

— Pensei que tivesse acostumada com isso, tesoro. — Fez uma


pausa. — Mas ao contrário do que você pensa, cada vez mais tenho sido
escravo dos meus próprios desejos. Uma certa mulher tem predominado meus
pensamentos, me tornando seu cativo.

— Eu… — Minha boca ficou seca perante suas últimas palavras, que
atingiram diretamente o meu peito, meu ego feminino se derretendo por ser
essa mulher.

— Agora vamos, tesoro, William está ficando impaciente… — Ele


fez que iria se virar, mas o fato dele falar o nome do meu irmão fez com que
algo soasse dentro de mim, e eu o segurei pelo braço, chamando sua atenção.
— Sim?

— Como vou explicar o fato de morarmos com você para Will?


— É simples, tesoro, falaremos a ele que estamos juntos, que somos
um casal. Ele já nos viu nos beijando aqui, então não deve ser difícil para ele
entender isso… Se precisar, nós dois conversamos com ele, juntos, sobre o
assunto.

— Mas é uma mentira — sussurrei, incrédula.

— Não para mim — disse tão baixinho que quase não ouvi.

Sem falar mais nada, afastou-se bruscamente de mim, caminhando até


onde William estava gritando com o videogame, e tive que segurar na borda
da mesa para não cair. Mesmo que eu lutasse contra, com suas palavras,
Andrea derrubava todas as camadas de determinação que eu construíra para
me proteger dele…
Capítulo Trinta e dois

Ainda estava trêmula quando deixei Ashley embasbacada quando


peguei as chaves do meu apartamento com ela e disse que iria morar com
Andrea temporariamente. Diferentemente de William, que pareceu contente e
animado com a perspectiva de morar em uma cobertura, embora eu não
soubesse ao certo qual a graça ele via no fato. Minha vizinha ficou
ressabiada, ainda mais com a desculpa fraca que eu tinha dado de que ficava
mais próximo ao hospital caso alguma coisa acontecesse. Embora não fosse
bem uma mentira, pude perceber quando ela me analisou de cima a baixo e
me fitou, como se buscasse a verdade, que eu não poderia dar à mulher. Não
me envergonhava de ter ido para cama com Andrea por dinheiro, embora
meu corpo o desejasse, mas não queria ser julgada, taxada.

Coloquei a chave na fechadura e abri a porta, deixando Andrea, que


estava carregando gentilmente William no colo, entrar na frente e os segui.

— Pode deitá-lo no sofá mesmo, Andrea — disse enquanto pousava


minha bolsa em cima da mesa, constatando que, nesses dias que fiquei fora,
ela estava tomada pelo pó. — Desculpe pela bagunça.

— Não tem problema, tesoro. — Deu passos largos pelo meu


pequeno apartamento e aproximou-se do sofá, cuidadosamente deitando meu
irmão no assento desbotado. Não se dando por satisfeito, ajeitou uma
almofada na cabeça de Will e sorriu para ele. — Assim está melhor, não é,
piccolo?

Ele apenas balançou a cabeça em afirmativo.

— Quero vê desenho. — Apontou para a televisão.

— Certo.

Enquanto observava a pequena interação entre os dois, não pude


deixar de me divertir com o homem que, pegando os controles, ligou os
aparelhos, e tentou desesperadamente encontrar um canal infantil. Era uma
coisa muito simples, porém, como ele provavelmente não perdia tempo com
esse tipo de entretenimento, a tarefa acabou se tornando frustrante para ele.

— Tente o 426 — disse suavemente.

— Obrigado.

— Quer alguma coisa para beber enquanto espera?


— Não é necessário. — Sentou-se em uma poltrona de canto e me
observou. — Você precisa de ajuda, tesoro?

— Acho que não. Mas se precisar, eu grito. Fique à vontade enquanto


espera. Tentarei ser o mais rápida possível para não desperdiçar o seu tempo.

Andrea franziu o cenho para mim, sua expressão revelando-me sua


contrariedade e eu me senti uma menininha sendo repreendida pelo pai.

— Estou por conta de você hoje, Adelle. — Ergueu a mão e fez um


gesto para mim. — Não, mammina, me preocuparei com os relatórios mais
tarde. Afinal, um homem como eu pode tirar um tempo para fazer o que bem
lhe aprouver.

Como se para provar isso, descaradamente, seu olhar percorreu todo o


meu corpo lentamente, como se não houvesse nada melhor para fazer.
Sentindo a vergonha me tomar pela intensidade com que me fitava, assenti e,
sem dizer nada, andei até o quarto do meu irmão, não sem antes buscar uma
mala no meu. Enquanto pegava algumas cuecas na gaveta, me questionei
quantas mudas de roupas eu deveria levar. Não sabia ao certo quanto tempo
ficaria no apartamento de Andrea, poderia ser apenas poucos dias ou
semanas, isso dependeria de quanto tempo Andrea queria brincar de sermos
um casal, o que para mim não demoraria muito. Com certeza ele se sentiria
incomodado quando duas pessoas invadissem seu espaço, e a curiosidade
infantil de William por tudo se tornasse um grande aborrecimento. E isso
seria o que mais doeria em mim, pois claramente meu irmãozinho adorava
questioná-lo. Estava se acostumando com sua atenção e os mimos que o
homem lhe dava. Eu poderia estar pronta para a rejeição de Andrea a mim,
mas não ao meu irmão.

Decidi pegar apenas alguns conjuntos de shorts e blusas e moletons, o


que acreditei ser o suficiente para uns dez dias. Em todo caso, se eu estivesse
errada, poderia lavá-las lá mesmo ou buscar mais. Por alguma razão não
queria levar peças demais, levando-o a crer que eu estava extrapolando a
nossa relação, que eu queria algo que ele não poderia me dar, como um
compromisso sério. Poderia estar cada mais envolvida pelo magnata, mas não
me iludiria pensando que ele queria algo além de sexo e prazer.

Soltando um suspiro[AR1], fechei a bagagem do meu irmão e fui até


o meu quarto pegar minhas coisas, guardando meus produtos de higiene
pessoal em uma frasqueira, não esquecendo de colocar o bendito hidratante
de vinte dólares que Andrea parecia tanto gostar. Um calafrio me varreu
quando a lembrança do meu chefe cheirando a minha pele e beijando o meu
pescoço, como um homem embriagado e faminto pelo meu aroma, tomou a
minha mente. Instantaneamente fiquei mole ao pensar que ele poderia repetir
a dose, degustando, lambendo e mordiscando-me, me devorando com a boca.
Porque sim, sabia que ele me tomaria novamente, e algo dentro de mim
formigava pela antecipação, por sentir-me uma mulher sexy, quente e
desejada em seus braços. Com esse pensamento em mente, fui até a cômoda
onde tinha guardado as peças íntimas que Andrea tinha comprado para mim e
escolhi algumas que poderiam agradá-lo, por mais que eu não tivesse certeza
de que teria coragem de usá-las. Mas caso ele exigisse, eu as teria comigo.
Depois de guardar alguns vestidos, shorts, blusas e outras roupas mais
formais caso precisasse, parei de frente para a mala pensando se tinha
esquecido de alguma coisa.

De repente, meus olhos se voltaram para o envelope em cima da


cabeceira da minha cama, que guardava o contrato que tinha assinado com
Andrea, que ao mesmo tempo que me sentenciava, era o meu vínculo com
ele, que me fazia dele. Como se eu não tivesse vida própria, aproximei-me do
pacote e o segurei entre os meus dedos, sentindo uma sensação estranha ao
tocá-lo. Sem saber o porquê e o que poderia significar, guardei-o na mala
junto com minhas roupas e fechei o zíper.

Instantes depois, empurrando a bagagem com a frasqueira em cima,


adentrei na minha sala de estar e estaquei ao ouvir uma explosão de risos
infantis junto com a do homem, enquanto ambos assistiam algo na televisão.
Fiquei observando os dois, até que Andrea percebeu minha presença na
entrada da sala.

— Pegou tudo que precisava, Adelle? — Pareceu se controlar e


franziu o cenho ao reparar nas malas.

— Acredito que sim. Só falta uma sacola com os brinquedos do Will


que ainda estão no quarto.

— Pensei que eram bem mais coisas. — Era inegável que ele estava
contrariado pela quantidade de malas. — Esperava umas cinco ou seis
bagagens…

— Essas já são suficientes. — Fiz uma pausa. — Você queria que eu


levasse o guarda-roupa inteiro? — brinquei, tentando quebrar um pouco a
expressão rabugenta que ele fazia.
— Hm…Até que não é má ideia. Posso providenciar isso.

— Andrea! — gritei, incrédula, quando o tom que ele falou aquilo me


disse que não era uma brincadeira.

— Foi você quem sugeriu, tesoro.

Pude perceber que ele estava realmente disposto a isso, e eu não


soube o que dizer e o que fazer. Para minha sorte, meu irmão interveio,
mudando completamente de assunto.

— Tô com fome, Del — resmungou, tentando se levantar, porém


Andrea o conteve apenas para ajudá-lo.

Olhei para o relógio, constatando que era quase meio-dia e que estava
próximo do horário em que Will costumava almoçar, e eu tinha me esquecido
completamente disso. E novamente senti a culpa pesando em meus ombros,
mesmo que por uma coisa à toa. Embora meu irmão não mais corresse risco
de vida, eu não tinha conseguido me perdoar completamente pelo fato de que,
por eu não ter ido buscar uma segunda opinião com outro profissional,
mesmo tendo estranhado a recomendação da médica, eu fiz meu irmãozinho
sofrer ainda mais. O sentimento deve ter transparecido em meu rosto, pois
Andrea se levantou e com passos largos se aproximou de mim, suas mãos
grandes tocando meus ombros em um gesto gentil.

— Posso sair para comprar alguma coisa para ele comer — ofereceu
gentilmente e eu apenas neguei com a cabeça.

— O médico disse que eu deveria tomar bastante cuidado com a


alimentação dele enquanto estiver se recuperando — sussurrei. — Não
gostaria de dar nada a ele que não sei o que leva.

— Certo. — Assentiu. — Mas tenho certeza que você tem alguns


ingredientes aqui para preparar um almoço.

— Tenho, sim.

— Então sem culpa, tesoro. — Deu um beijo nos meus lábios e me


virou, dando um tapa de leve na minha bunda e me guiando até a cozinha.

— Obrigada pela paciência. — Aproximei-me da geladeira, pegando


alguns legumes que tinha congelado no freezer e um pacote de carne. Faria
um purê e um filé de frango grelhado, que seria de mais fácil absorção, como
o médico sugeriu.

— Você precisará fazer uma lista com os itens que você deseja para a
alimentação do Will, que vou mandar providenciar. Ainda hoje, contratarei
uma cozinheira, já que sempre faço minhas refeições fora, e não tenho uma
trabalhando para mim.

— Okay, mas não é necessário contratar alguém só por nossa causa.

— Adelle… — Seu tom era de repreensão.

— Particularmente, quando tenho tempo, gosto de me aventurar um


pouco na cozinha. — Peguei uma panela, coloquei água e acrescentei os
legumes que já deixava descascado e picado. — Mas nem tudo fica bom.
Will, às vezes, sofre.

— Hm...

— Mas você pode pedir suas comidas, ir a restaurantes, continuar


com sua rotina.
— Tenho certeza de que vou adorar tudo que você fará — disse com
uma voz carregada de várias intenções.

Antes que eu respondesse, afastou-se de mim, seus passos me


indicando que ele caminhava para fora da cozinha pequena, me deixando ali,
trêmula com o súbito desejo que me tomou.
Capítulo Trinta e três

— Pegue a chave no meu bolso, Adelle — pedi enquanto carregava


William no colo.

O gesto tem se tornado cada vez mais recorrente e natural. O


desconforto que senti quando fiz isso pela primeira vez não mais existia, pelo
contrário, estranhamente me pegava apreciando o breve contato do corpinho
pequeno contra o meu, ativando um instinto que nem sabia que tinha, uma
necessidade de protegê-lo. Sentimento reforçado ainda mais pelo fato do
pequeno parecer gostar de mim, confiar. Eu deveria me manter indiferente a
ele, mas me pegava me importando com a criança. Tanto ele quanto Adelle se
infiltravam mais e mais dentro de mim, quebrando toda a minha
determinação de não dar nada de mim a ninguém sem levar alguma
vantagem.

E aqui estava eu, em um momento de insanidade, levando os dois


para morar comigo, porque algo dentro de mim revirava só de pensar em
Adelle precisando de ajuda para cuidar dele, mesmo que eu soubesse que esse
tempo todo ela tinha dado conta de fazê-lo sozinha, apenas com a ajuda da
vizinha. Sempre que o horário de visita terminava, eu relutava e muito em
deixá-la, e eu dizia para mim mesmo que era pela vulnerabilidade que tinha
visto nela, o que era uma completa mentira. Mas a verdade também não me
interessava.

Senti a mão de Adelle tatear o meu bolso da calça social e, mesmo


que o gesto fosse inocente, senti um calor se espalhar pelo meu corpo, e tive
que me controlar. Toda vez que ela me tocava eu me sentia aceso, alerta, cada
pedacinho de mim ficava consciente dela. Eu não era um homem que
apreciava tanto que me tocassem, mas me pegava ansiando por cada contato
com aquela mulher, como um rapaz sedento por sentir sua primeira
namorada. O que eu não sabia de fato, já que nunca tive uma, nem mesmo
quando adolescente, pois nunca tive interesse em me relacionar com
nenhuma mulher. Até agora.

Tolo, disse para mim mesmo em pensamentos, enquanto com a chave


em mãos, ela abria a porta do meu apartamento, deixando que eu entrasse
primeiro,
— Uau! — William se agitou em meu colo querendo descer, porém
segurei-o mais firme. Tinha certeza de que se eu deixasse, ele iria correr pelo
hall de entrada que levava à sala ampla que raramente usava.

— Que bom que gostou, piccolo. — Enquanto caminhava até o sofá


que nunca prestei tanta atenção, uma insegurança que jamais tinha sentido
antes me varreu e, sem que me desse conta, externei-a em voz alta: — O que
achou, tesoro?

Ela ficou alguns segundos em silêncio, provavelmente observando


tudo ao seu redor, me deixando ansioso. Como uma criança pequena que
precisava de aprovação, queria e muito que ela gostasse, que o achasse
confortável, não opressor. Queria que ela se sentisse bem dentro do meu
apartamento, que seria seu lar pelo tempo que eu quisesse… Ao me dar conta
do rumo dos meus pensamentos fiz uma careta. Eu estava indo longe demais.

— É muito bonito, mas a decoração é muito diferente do que


imaginava que você teria — sua voz revelava-me admiração.

— E como você acharia que seria? — Sentei o pequeno no sofá e falei


com ele: — Fique quietinho, você não pode fazer estripulias ainda.

— Ah, não, Andrea. Aqui é altão! Queria vê lá na janela. — Fez


beicinho.

— Você terá tempo de correr muito quando estiver melhor, piccolo.


— Fiz uma pausa. — Depois te contarei um segredo que você vai amar.

— Ah… — Cruzou os bracinhos.

— E então, Adelle? — Retomei a conversa, sua opinião tendo mais


relevância para mim do que gostaria. Com o canto do olho, percebi que
minha secretária tinha se aproximado de uma estante, que era de madeira
maciça, e contemplava as fotografias que estavam nos porta-retratos.

— Não posso negar que imaginava que seria moderna, com cores
mais clean e sem vida, como aquelas que as revistas de design de interiores
dizem que os homens ricos e solteiros apreciam. Então me surpreende que
você seja um apreciador do clássico e que o lugar seja bastante acolhedor. —
Fez uma pausa e virou-se para mim. — E nem imaginava que teria tantas
fotos de família, algumas até mesmo bastante íntimas.

— Hmph…

Não podia negar que me incomodou o fato de ela achar que minha
casa seria fria e genérica, mas parte disso eu sabia que era culpa minha.
Todos me conheciam como um homem desprovido de emoção, exigente, frio
e arrogante, e de fato, eu não me preocupava em mudar essa imagem, pelo
contrário, eu alimentava ainda mais essa percepção dos outros por isso ser
favorável aos meus objetivos. Mas, estranhamente, senti um aperto no peito
ao pensar que ela poderia pensar o mesmo.

— É lindo, e tenho que confessar que invejo você, sempre quis ter
algumas peças assim — deu de ombros —, são seus pais? — Pegou o porta-
retrato com a foto dos meus pais se beijando em um dos aniversários de
casamento deles, e contemplou o retrato com curiosidade. — Desculpe, estou
agindo como uma menina bisbilhoteira, mexendo nas suas coisas.

O irmão dela deu uma risadinha, achando graça da fala dela.

— Sim, essa foto foi tirada quando eles completaram trinta anos
juntos. Tem um tempinho já.

Adelle soltou um suspiro profundo, como se estivesse encantada com


o que via.

— A senhora Della Torre tinha me contado que eles eram muitos


apaixonados um pelo outro — sua voz saiu baixinha e trêmula. — Mas não
podia imaginar que tal amor era tão forte ao ponto de que uma mera
fotografia fosse capaz de revelá-lo com tanta intensidade.

— Realmente — respondi, mesmo que ela não tivesse feito uma


pergunta. Fiquei desconfortável, pois tive esse mesmo pensamento ao olhar
para outra foto deles dias atrás.

— O brilho dos olhos, o sorriso — pousou o objeto na estante —, fico


imaginando como é amar e ser amada dessa mesma maneira… — Sua voz
soou melancólica e eu engoli em seco, não estava esperando pelo rumo que
tudo estava tomando.

—Te amo um tantão assim, Del — William deu um gritinho inocente,


abrindo os braços, claramente pequeno demais para compreender o sentido
que a irmã falava, e uma Adelle sorridente se virou e caminhou até ele, seus
sapatos fazendo barulho no piso de madeira.

— E eu o amo ainda mais, meu amor. — Sentando-se ao lado dele, o


abraçou, dando uma série de beijinhos no seu rosto inocente.

— Vou buscar as coisas no carro. — Abri alguns botões da minha


camisa, me sentindo tenso de repente. — Depois apresento o restante do
apartamento para vocês, principalmente o quarto desse meninão.
— Obrigada, Andrea…

Já estava quase saindo do ambiente, quando uma exclamação de


Adelle me fez parar e virar para ela.

— Oh!

— Que foi, tesoro? — Com passos largos, me aproximei dela que


olhava para o lado de fora, sentindo uma urgência descabida.

— Sua sacada tem rede de proteção! Que alívio. Nem tinha me


atentado ao fato de que era necessário. — Riu.

— Mandei instalar ontem na varanda e em todas as janelas, dolcezza.

— Agradeço por pensar nisso, tudo está acontecendo tão rápido que
eu…

— Não se preocupe com isso, eu que convidei, então deveria pensar


nesses detalhes para a segurança dele.

— Não sei como retribuir.

Não respondi, apenas me aproximei, toquei de leve sua boca com a


minha e a beijei, sedento de sentir novamente seus lábios macios e
convidativos, que sempre me respondiam com intensidade, me afastando logo
depois, antes que eu perdesse de vez todo o controle que tinha sobre mim
mesmo.
Capítulo Trinta e quatro

Enquanto me apresentava todos os cômodos do apartamento, que era


quase cinco vezes maior do que o meu, era impossível não se encantar por
cada detalhe da decoração do apartamento luxuoso. Era como se eu estivesse
em um sonho, mal podia acreditar que eu moraria ali por tempo indefinido.
Facilmente alguém poderia se acostumar à tamanho conforto dos ambientes
convidativos.

— Quer ver onde você vai dormir, piccolo? — Parou no corredor e


olhou para o pequeno que novamente estava em seu colo.
Claramente meu irmãozinho estava ficando mal-acostumado e teria
que comentar a respeito com Andrea, que parecia alheio a isso, sobre não
ficar mimando-o assim, pois ele acabaria ficando insuportável. Ainda mais
quando meu chefe deixasse nossas vidas.

— Eeeee. — Bateu palminha, empolgado.

— Então vamos.

Dando alguns passos, aproximou-se de uma porta no fim do corredor


e a abriu. Assim que os dois entraram, um gritinho ecoou por todo o corredor
e eu me aproximei, também entrando no aposento, ficando completamente
chocada com o que via. Imaginava que seria um quarto de hóspedes decorado
conforme o resto da casa, mas diferentemente do que pensei, o quarto tinha
claramente sido redecorado para agradar o gosto infantil, com trave de
segurança lateral na cama, que estava enfeitada com uma colcha do Shrek.
Havia alguns bonecos do filme guardados em prateleiras e, em um canto,
pude perceber vários brinquedos dispostos em uma caixa colocada no chão,
além de uma pequena barraca.

— Andrea — sussurrei, emocionada, me aproximando dos dois que


estavam próximos aos carrinhos e pelúcias.

— Posso brincar?

— Claro, é tudo para você, piccolo.

— Eba! — Ele exalava alegria.

Gentilmente o pousou no chão e o ajudou a se sentar, e eu por alguns


momentos observei a felicidade estampada no rostinho que eu mais amava no
mundo. Meu coração se encheu de amor e carinho pelo homem que tinha
proporcionado isso a Will. Estava imensamente grata por ele ter pensado na
proteção do meu irmãozinho ao mandar instalar as telas de proteção, mas
aquela surpresa para William depois que o pequeno sentiu tanta dor era muito
especial para mim. Mais do que o magnata poderia pensar…

Como ele poderia esconder tão bem esse lado generoso dele? Algo
que eu achava completamente apaixonante? Ou ele estava querendo apenas
me agradar por eu ser sua amante? Duvidava muito que fosse a última, pois
não via aquele homem bajulando ninguém. Ele não precisava fazê-lo, já que
tinha o mundo inteiro aos seus pés, inclusive eu, que era dele por contrato.
Mas não importavam as razões, apenas que ele o tinha feito.

Comovida e sem pensar muito, aproximei-me dele e o abracei com


força, sentindo seus braços se fecharem em torno do meu corpo, envolvendo-
me. Me aninhei ainda mais contra o seu calor, quando gentilmente ele tocou
meus cabelos e plantou beijos no topo da minha cabeça. Não sei quantos
minutos fiquei ali, mas ele se afastou.

— Quero que conheça o nosso quarto, tesoro — sua voz saiu rouca e
eu estremeci.

— Claro. — Eu não era ingênua ao ponto de acreditar que ele não me


queria em sua cama todas as noites. Andrea não escondia seu desejo por mim
e estranharia o fato dele me colocar em outro lugar.

Dando-me a mão e depois de olhar para William, se certificando de


que ele ficaria bem por alguns minutos, me puxou para fora do quarto.
Passamos por duas portas e chegamos em uma no fim do corredor.
— O que eram aqueles cômodos?

— Um banheiro e um armário.

— Certo. — Assenti.

— Abra. — Pareceu ansioso pela minha opinião e eu sorri, girando a


maçaneta para revelar a suíte mais linda que já tinha visto na vida.

Dei alguns passos para dentro dela, contemplando cada detalhe em


dourado, vermelho e marrom, meu olhar varrendo as poltronas estofadas com
pés arredondados, o papel de parede geométrico que contrastava com o piso
liso, os dois enormes lustres de cristal em cada canto do quarto e a cama
imponente.

— Meu Deus — sussurrei ao sentir seus braços me envolvendo por


trás, sua respiração quente arrepiando os pelos do meu pescoço.

— Se você não gostou, podemos fazer algumas mudanças.

— Não, é linda, não mudaria em nada. Por que eu faria tal coisa? —
antes que ele respondesse minha pergunta, comecei a fazer outra por impulso,
mas logo me arrependi: — Você já…

Não, não queria saber do passado dele e muito menos que alguém já
esteve ali. Realmente o que ele fez tempos atrás não me importava e nem era
da minha conta.

— Não, tesoro — deduziu o que perguntaria. Mordiscou o lóbulo da


minha orelha e eu colei meu corpo ao dele —, você é a única mulher que já
entrou neste quarto e que irá dormir na minha cama.

— Hm… — soltei um gemido quando ele alisou os meus braços. —


Fico feliz por isso.

— É mesmo, schianto?

Balancei a cabeça, concordando. Não podia negar o prazer que senti


ao saber que eu era a única, a primeira.

— Então não tem razão para eu mudar nada… Na verdade, acho um


sonho.

— Só quero que você fique confortável aqui, Adelle. Então se você


não gostar de algo, será um prazer atendê-la.

— Obrigada, é muito gentil… — um som escapou pelos meus lábios


quando ele, afastando meus cabelos para o lado, mergulhou o rosto no meu
pescoço e me beijou ali, deixando um rastro úmido pela minha pele. Joguei
meu braço para trás e puxei seus cabelos negros, apreciando o momento.

— Sabe de uma coisa, tesoro? — Me virou em seus braços e me


fitou.

— Sim?

— Desde que pisou no meu escritório, você é a única que quero.

Exigiu uma resposta com a boca em um beijo sôfrego e nada delicado,


pelo contrário, cheio de fome e urgência, e eu me deixei levar pelas sensações
provocadas pelo contato da sua língua e pelos seus movimentos sem me
importar nem um pouco com o pudor. Saber que aquele homem não teve
mais interesse em ninguém depois que me conheceu intensificava ainda mais
o meu desejo por ele, me fazendo sentir especial. Agarrei-me a ele com ainda
mais intensidade enquanto ele me provocava com a sua boca, o beijo se
aprofundando, com uma emoção que nunca pude imaginar que existiria.
Éramos entrega, éramos puro fogo. Porém, quando ia começar a remover a
sua camisa, ele parou, afastando-se de mim, com o peito subindo e descendo
com a respiração acelerada.

— Infelizmente tenho uma reunião daqui alguns minutos, e Will não


pode ficar sozinho por muito tempo — falou com a voz entrecortada,
enquanto gentilmente acariciava meu rosto.

— Você tem razão. — Senti-me ficar vermelha de vergonha, eu não


era uma mulher tão irracional.

— Você quer que eu chame alguém para te ajudar a guardar tudo?

— Não será necessário, posso fazê-lo, não são tantas assim.


Começarei com as coisas do Will.

— Fique à vontade para mexer em tudo, explorar os cômodos e


acomodar suas roupas e objetos pessoais aqui. Tem uma parte vazia no closet
e espaço nos armários do banheiro da suíte.

— Obrigada.

— Qualquer coisa, me chame no escritório.

Deu-me um selinho e tentou se ajeitar minimamente, já que em meio


ao beijo eu tinha amarrotado sua blusa social e bagunçado seus cabelos.
Suspirei profundamente enquanto observava ele sair, seguindo-o logo depois.
Afinal, tinha algumas coisas para fazer e um pequeno empolgado com seu
novo quarto para cuidar.
Capítulo Trinta e cinco

Três dias se passaram e, diferentemente do que eu pensava, Andrea


tinha sido um homem atencioso para comigo e meu irmão, preocupado com o
nosso bem-estar. E mesmo em meio ao trabalho, ele tirava vários momentos
para ficar comigo e meu pequeno, até compartilhando as refeições que eu
preparava. Era engraçado pensar que o magnata que apreciava comidas caras
e sofisticadas trocou isso por comidas simples e sem nada demais, já que não
podia usar condimentos por conta da recuperação de Will.

Mas as ocasiões que eu mais apreciava eram quando podia observar


aquele homem, poderoso e cheio de coisas para fazer, sentado no quarto de
William, brincando de boneco, carrinho ou de qualquer outra coisa que a
criança quisesse. Paciente, ele respondia todas as perguntas do meu
irmãozinho, conversava e inventava histórias, fazendo o pequeno rir. E com
isso, Andrea me conquistava cada vez mais. Acho que nunca mais
conseguiria vê-lo da mesma maneira, pois estava me apaixonando pelo
homem gentil, terno e carinhoso que se escondia por detrás da fachada
arrogante e fria de magnata. Ele poderia negar o quanto quisesse, mas meu
chefe era bom em lidar com crianças, e tinha certeza que ele seria um ótimo
pai.

Feliz seria a mulher que conseguisse adentrar no seu coração. Depois


de ouvir que há muito tempo ele não saía com ninguém, que depois de me
conhecer não teve interesse, pegava-me fantasiando em ser tal pessoa, mas
minutos depois tentava afastar esse pensamento, pois alimentar tal esperança
só aumentaria meu sofrimento. Mas se tornava cada vez mais difícil quando,
nos finais da noite, ele me beijava até roubar todo o meu ar e eu dormia em
seus braços ouvindo seu coração bater ritmado, e com o calor proporcionado
pelo seu tórax nu, eu não demorava a dormir, sucumbindo ao cansaço do dia.
Não podia negar que estava apreciando e muito essa nossa rotina.

Contudo, diferentemente do que eu achava, Andrea não me tomou


novamente, sempre parando quando nossas carícias ficavam mais intensas,
deixando-me sedenta por senti-lo dentro de mim outra vez, seu corpo
musculoso e forte me prensando contra o colchão enquanto entrava e saia do
meu canal. Eu sabia que meu chefe ainda me desejava, a fome com que me
beijava e a ereção que se formava entre suas pernas enquanto me tocava e
acordava pela manhã eram provas disso. Mas ele nunca ia além. Sem saber o
que fazer nessa situação, apenas me deixava abraçar ou levantava junto com
ele para preparar um café.

Suspirei fundo, encolhendo-me na cama enquanto passava a página


do e-book que estava lendo. Era um romance bem erótico, e toda vez que o
personagem principal tocava a mocinha, eu sentia um calor me invadir, como
um bom livro do gênero deveria fazer sentir. Vez ou outra, parava a leitura e
começava a fantasiar acordada que era eu e Andrea. Tinha tantas coisas no
sexo que eu ainda desconhecia, tantas posições que me sentia tentada a fazer,
que eu me pegava imaginando como seria com Andrea, o que
inevitavelmente me deixava ardendo, latejando, ansiando por aquilo que eu
sabia que ele poderia me dar.

Movida por essas imagens mentais e pelo fato de saber que ele estava
em um cômodo próximo, completamente nu, pois tomava banho, soltei o
leitor digital no móvel de cabeceira, ergui-me, tranquei a porta do quarto para
que Will não entrasse de surpresa e caminhei até o banheiro da suíte, que
mais parecia um spa. Eu precisava saber a razão de ele não me tocar e não
fazer-me sua outra vez, ainda mais que sabia que Andrea me queria também.

Assim que abri a porta, Andrea se virou para mim e eu percorri todo o
seu corpo nu com o olhar, da mesma maneira que ele fazia comigo. Fui dos
seus ombros largos ao peitoral definido, admirando cada gominho do seu
abdômen trincado. Porém foi a mão grande que rodeava o pênis ereto e se
acariciava lentamente que me deixou com a boca seca, o desejo que senti por
ler cenas picantes e pela minha imaginação intensificou-se ainda mais no
meio das minhas pernas, um fogo de antecipação correndo por todo o meu
corpo. Eu sabia que tinham homens que se masturbavam, principalmente
vendo pornografia ou pensando nisso, mas não pensei que Andrea fizesse
parte desse rol. Soltei um som de surpresa que não passou despercebido para
ele, que arqueou a sobrancelha, afastando a mão da sua ereção.

— Não perco tempo assistindo pornografia. Não me atrai em nada


essa porcaria. Mas isso não me impede de fantasiar com a mulher que agora
está na minha frente.

— Andrea… — Arquejei, surpresa.

— Meu desejo por você não conhece limites, Adelle.

Não disse nada, apenas absorvi suas palavras, que me faziam


estremecer e me encorajaram ainda mais em ter o que eu queria. Sentindo-me
ousada e sabendo que ele me observava, abaixei lentamente a minha calcinha
e a joguei para o lado e removi a camisola, dando a ela o mesmo destino da
outra peça.

Vendo ele engolir em seco, senti meu coração bater freneticamente


dentro do peito, mas não me conteria. Consciente do meu poder, algo que
nunca imaginei ter sobre ninguém, caminhei até o box sob o seu escrutínio e
me juntei a ele no chuveiro. Pousei uma mão no seu peito, sentindo o
ribombar frenético contra a minha palma, e com a outra segurei o seu queixo
com a barba rente, fazendo-o ele se inclinar para mim e olhar diretamente em
meus olhos.

— Então por quê?


— O que, tesoro?

— Porque não fez mais… — quase falei amor, mas me contive a


tempo —, sexo comigo, já que sou a sua amante e você me quer tanto? —
Tentei soar prática, escondendo minhas emoções. O fato era que estava cada
vez mais me apaixonando por ele, mas minha fala pareceu de alguma forma
incomodá-lo.

Ficou em silêncio por alguns segundos enquanto acariciava o meu


rosto, e antes de me responder tocou a minha fronte com os lábios.

— Não queria te pressionar, dolcezza. Você parecia cansada e tinha


muita coisa para processar. — Removeu uma mecha do meu cabelo que já
estava molhado e a colocou atrás da minha orelha. — Nunca poderia me
impor a você por mais que o meu desejo chegasse a doer. Eu a respeito e a
quero demais, por isso quis te dar esse tempo … — Fez uma pausa. — Nada
mais me importa do que o seu bem-estar. Nem mesmo meu desejo pode
sobrepor o seu equilíbrio emocional.

Senti uma emoção me dominar ao saber que ele tinha tal deferência
por mim, a umidade se formando em meus olhos, e não me importando com a
lágrima de felicidade que escorreu pelos meus olhos nem com a água do
chuveiro, o abracei, sentindo seus braços fortes me envolvendo. Não sei
quanto tempo permaneci assim, com a sua pele colada à minha, mas o que
começou inocente se tornou necessidade quando, por instinto, eu me
esfreguei na sua ereção, que estava mais do que pronta e que eu ansiava por
sentir dentro de mim. Porém, antes que eu fizesse qualquer coisa, Andrea deu
um passo para trás, grudando suas costas na parede, e pude vê-lo lutando pelo
controle de si mesmo.

— Andrea… — Aproximei-me de novo dele e espalmei minhas duas


mãos no seu peitoral, erguendo meu queixo para fitar melhor os seus olhos
azuis que me revelavam um desejo cru por mim.

— Tesoro… — sua voz saiu entrecortada.

— Me faça sua mulher novamente, por favor — pedi ao ficar na ponta


dos pés. — Preciso senti-lo. Apague esse fogo que me deixa em chamas. Me
ame…

Sem esperar uma resposta dele, puxei o seu rosto de encontro ao meu
e o beijei, sentindo a suavidade dos seus lábios deliciosos contra os meus.
Andrea não era o único que apreciava o encontro das nossas bocas. Foi
instintivo para ele envolver minha cintura com um braço trazendo o meu
corpo mais para si. Estávamos tão próximos um do outro que faltava apenas
ele encaixar-se em mim para virarmos um só.

Hesitante, enquanto sua mão percorria a minha coluna, movimentei-


me contra os seus lábios, pedindo passagem com a ponta da minha língua do
mesmo modo que ele fazia quando me beijava. Precisava e muito sentir o seu
gosto. Tão ansioso quanto eu, com sua mão livre embrenhou seus dedos nos
meus cabelos molhados pela água que escorria pelo chuveiro, e tomou o
controle do beijo para si, movendo-se com fúria, como se o contato suave não
fosse capaz de satisfazer a sua fome. E se eu fosse sincera comigo mesma,
adorava a intensidade com que ele se impunha, exigindo nossa redenção.
Soltei um gemido contra os seus lábios quando a mão dele roçou na lateral do
meu seio, sabendo que era meu ponto erógeno. Andrea começou a brincar
com o meu mamilo enquanto sua boca dominava a minha, arrancando mais
sons de mim.

Envolvida por ele e me sentindo cada vez mais mole, finquei minhas
unhas nos seus ombros tentando manter a duras penas meu equilíbrio, e
arqueei minha pelve contra seu membro rígido, cada vez mais ansiosa por ser
penetrada. Parecia que apenas a proximidade do seu corpo, o contato da sua
boca, e a carícia suave era tudo o que eu precisava para ficar pronta para ele.
Porém Andrea parecia não concordar comigo, pois ele não me preencheu
como eu gostaria. Pelo contrário, ele não parecia ter pressa nenhuma, seu
autocontrole era admirável.

Sem deixar a minha boca, soltou meus cabelos e, segurando meus


quadris com as duas mãos, girou-nos e caminhou comigo até que minhas
costas encontrassem a superfície azulejada. O calor da sua pele e o frio do
azulejo provocavam em mim pequenos calafrios que atingiam diretamente o
meu sexo necessitado. Um espasmo de prazer fez com que eu rebolasse de
encontro à parede.

— Andrea — gemi contra seus lábios quando suas mãos subiram,


percorrendo a lateral da minha cintura até encontrar os meus mamilos;
parecia que meus seios estavam mais pesados quando ele os segurou, seus
polegares brincando com os bicos.

— Sì, tesoro? — disse com a voz entrecortada e escorregou sua boca


pela minha bochecha, queixo até alcançar o pescoço, os pelos da sua barba
arranhando a minha pele, me fazendo estremecer.

— Por favor — minha voz saiu quase inaudível, pois enquanto falava,
meu chefe lambia a extensão do meu pescoço, mordiscando e chupando o
ponto onde podia sentir minha pulsação acelerada.

— Hm… Você é deliciosa…Saborosa, schianto — me ignorou por


completo e eu choraminguei, arqueando-me contra ele, usando o meu corpo
para persuadi-lo, sem sucesso, pois ele continuou com o seu trabalho lento
enquanto me fitava com seus olhos azuis.

Quando sua língua escorregou do meu externo ao meu seio, tomando


um bico entre seus dentes, senti que iria desfalecer contra ele, precisando me
apoiar em seus ombros para não cair. Atormentando o outro mamilo com os
dedos, beliscando-o suavemente, passou a sugar o outro, ora com pressão, ora
tão lentamente, que eu rocei minhas coxas uma na outra buscando o alívio
que ele não queria me dar. O brilho maroto que ardia em suas pupilas que não
deixavam meu rosto me dizia que ele estava apreciando e muito me
atormentar daquela forma, se deleitando com o meu desespero.

— Homem malvado — sussurrei e ele sorriu lascivamente para mim.

Como poderia um homem me deixar tão sedenta por ele?

— Ainda não viu nada, tesoro.

Não consegui dizer uma palavra, apenas emiti um som rouco quando
sua boca tomou o outro mamilo, sua língua quente e sedosa traçando
pequenos círculos no bico do meu seio. Era tão bom, que eu segurei seus
cabelos com força e o obriguei a continuar com seus movimentos deliciosos.
Porém, para a minha surpresa, Andrea soltou meu mamilo e se ajoelhou na
minha frente, levando suas mãos aos meus quadris, segurando-o. Um brilho
de prazer cruzou seu olhar e, soltando um gemido, aproximou sua boca
novamente da minha pele, traçando um caminho de beijos pela minha barriga
que não era tão lisa quanto gostaria, beijando a pintinha que eu tinha próxima
ao umbigo. Sua língua adentrou a pequena cavidade, imitando o movimento
que eu tanto queria que seu pênis fizesse em mim, até que, dando-se por
satisfeito, aproximou a sua boca do meu monte e eu arfei.

— Andrea… Você…

Um sorriso lento foi a sua resposta e eu me senti envergonhada ao


lembrar que não estava depilada, tinha aparado desajeitadamente meus pelos
em meio ao banho, mas nunca ficava certinho como as profissionais faziam.

— Estou louco para te provar, tesoro. Quero saber se seu sabor é tão
gostoso quanto me parece… — A voz rouca denunciava todo o seu desejo,
mas mesmo assim, me senti sem jeito, por mais que eu quisesse saber como
era receber um oral.

— Não estou… — Apontei para o meu sexo, mortificada.

— Somente um tolo se preocupa com isso perante a mulher que


deseja. E eu, schianto, não sou nenhum tolo.

Sem esperar que eu dissesse algo, levou uma mão a minha vagina e,
com delicadeza, abriu meus grandes lábios com os dedos. Senti sua língua
invadindo pouco a pouco o meu canal, que contraiu instintivamente perante a
doce penetração. Sua barba roçando na pele sensível da minha coxa arrancava
de mim estremecimentos involuntários.

Sem pudores, enquanto me observava com os olhos nublados de


desejo, Andrea entrava e saia com a língua. Saboreava todas as texturas do
meu sexo, soltando gemidos de prazer que se somavam aos meus, me
indicando que estava gostando de saborear-me tanto quanto eu estava em
recebê-lo. Quando aumentou o ritmo, apoiei uma mão em seu ombro firme e
segurei novamente os fios negros nos meus dedos trêmulos e o puxei de
encontro a minha vagina, querendo que ele me penetrasse ainda mais fundo.
Me arqueei contra ele, mesmo que suas mãos, que seguravam com força
meus quadris, podassem meus movimentos, torturando-me. Gostando do
controle que tinha sobre mim, ele adotou um ritmo lento fazendo-me
choramingar. Tive que conter o grito quando ele encontrou o meu clítoris e
começou a traçar círculos vagarosos sobre ele, deixando meus músculos cada
vez mais tensos, minhas pernas cada vez mais bambas.

Me sentindo à beira do precipício, fechei os olhos e desfrutei da


sensação quando ele tomou meu ponto sensível entre os lábios e começou a
sorver e a sugar, arrancando de mim mais um gritinho, enquanto me
espichava contra a parede de azulejo, rebolando contra a superfície, perdida
na espiral que ele me proporcionava. Alternando sucções e movimentos
circulares sob a carne sensível, para o meu delírio, Andrea escorregou uma
mão em direção ao meu sexo e me penetrou com dois dedos, entrando e
saindo do meu canal, que o apertava, com cada vez mais força.

Ainda segurando seus cabelos, sem me aguentar mais, me vendo livre,


comecei a arquear minha pelve em direção a sua boca. Agarrando minha
bunda, Andrea ajudava que me movimentasse de encontro a sua língua e
dedos. E eu rebolava nele sem nenhum pudor na busca pelo ápice, sem me
importar com nada além de mim mesma.
A pressão que seus lábios exerciam, a cadência cada vez mais rápida
com que me penetrava com os dedos, foi maior do que eu podia aguentar. E
quando Andrea prendeu meu ponto inchado entre os dentes e o sugou com
mais força, abri os olhos, fitando suas duas safiras azuis que brilhavam
intensamente e deixei-me levar pelo orgasmo. Com sua ajuda, continuei a me
mover de encontro a sua boca, que sorvia todo o líquido da minha excitação
como se fosse uma iguaria. Trêmula, ouvi o som gutural escapar pela
garganta do meu amante e ele se afastou, passando a língua pelos seus lábios.
Tal gesto fez com que uma comichão surgisse no meu ponto de prazer,
mesmo que eu ainda estivesse me recuperando do êxtase.

— Deliciosa — deu um último beijo no meu monte e se levantou


enquanto eu o observava languidamente —, só você para me fazer ficar de
joelhos e querer me ajoelhar mais vezes.

Aproximou-se de mim, colando seu corpo viril ao meu, prensando-me


contra a parede do box. Mesmo que minha capacidade de raciocinar estivesse
embotada pelo prazer, trouxe seus lábios para o meu e o beijei, sentindo o
meu gosto pungente em sua língua enquanto minha mão envolvia seu pênis e
o encaixava na minha entrada. Ele não me penetrou como ansiava,
provavelmente esperando pela minha permissão.

— Faça-me sua como eu te fiz meu — sussurrei contra ele, e


deslizando minha boca, beijei o seu pescoço, incentivando-o.

Com um grunhido, Andrea arrematou para dentro de mim e eu mordi


seu ombro, cravando minha unha nas suas costas ao sentir seu membro me
preenchendo por completo. A dor e o incômodo da primeira vez, agora, era
praticamente inexistente, tanto pela minha lubrificação como por saber que
ele iria apenas me dar prazer.

— Tesoro... — Ficou parado e eu me emocionei por novamente ele se


preocupar comigo, com o meu bem-estar. Eu não poderia querer um amante
mais terno e carinhoso do que aquele.

Não disse nada, apenas comecei a me movimentar, embora com


restrição devido ao meu corpo estar sendo prensado pelo dele. Andrea me
acompanhou, deslizando suavemente, para depois entrar com lentidão
enquanto beijava-me com a mesma vagarosidade. Porém, quanto mais ele me
penetrava, mais eu sentia-o perdendo o controle, mesmo que quisesse
prolongar o ato. Meus músculos internos o prendiam dentro de mim,
exercendo uma pressão sobre o seu membro que arrancava gemidos altos dos
seus lábios. Escorregando minhas mãos pelas suas contas, apertei-o mais
contra mim, incentivando-o.

— Perca o controle, Andrea… — sussurrei e um raio cruzou seus


olhos. — Do mesmo modo que estou perdendo o meu.

— Adelle…

Sem dizer mais nada, removeu os meus braços das suas costas e
ergueu-os contra a parede, colocando-os acima da minha cabeça. Me
penetrou com mais vitalidade e, graças a força com que ele me pressionava
contra o box, eu não caí, pois minhas pernas não me davam mais sustentação.
Eu era sua cativa, e não mentia ao dizer que a racionalidade tinha me
abandonado por completo.

Senti ele me estocar mais fundo e mais rápido e o acompanhei da


maneira como podia, sentindo que eu não era a única perdida pelo nosso ato
que se tornava cada vez mais intenso, cada vez mais desesperado. O chocar
das minhas costas contra a parede ecoava por todo o banheiro, somando-se
aos nossos sons.

— Me beije, querido — ordenei enquanto puxava ar para os meus


pulmões.

Tomando minha boca com fúria e fome, como se fosse um homem


faminto, marcando-me por completo, entrou e saiu de dentro de mim até que
senti meus músculos apertarem o seu membro com tanta intensidade, que
fechei os olhos e concentrei-me nas sensações do seu pau deslizando pelo
meu canal, proporcionando uma nova onda de orgasmo que pareceu me
engolfar. Após arremeter mais algumas vezes, senti seu corpo tremer de
encontro ao meu, o que me fez abrir os olhos. Soltando um rugido, Andrea
saiu de mim depressa, se esvaindo no chão. Sua respiração era ruidosa e, por
um momento, ele parecia alheio a tudo. Um sorriso se formou em meus
lábios enquanto observava seu estado; o prazer de vê-lo completamente
descontrolado por minha causa varria todo o meu corpo.

— Banho? — sussurrei contra a sua orelha.

Ele balançou a cabeça concordando e respirou fundo, dando-me a


mão e levando-nos em direção ao chuveiro aberto, completamente esquecido
por ambos.
Capítulo Trinta e seis

Ajeitei-me na cabeceira da cama enquanto observava Adelle, trajando


um roupão felpudo e uma toalha na cabeça, deixando o quarto para ver como
o irmão estava. A visão das suas pernas grossas e longas me eram um deleite
a parte. Eu não cansava de devorar aquela mulher com o olhar e não
conseguia manter minha boca longe dela. Custou todo o meu autocontrole
interromper os beijos cada vez mais intensos que tínhamos trocado nos
últimos dias. Não menti para ela quando disse que a queria bem, que não iria
me impor a ela, nem usar truques de sedução sujos, por mais que todas as
noites quando a tive em meus braços meu corpo implorasse por isso. Por
mais que ela tivesse sido responsiva na nossa primeira vez juntos, ainda não
podia me perdoar completamente, mesmo que eu não soubesse, por ter tirado
a virgindade dela enquanto ela sofria pelo irmão. E por isso, decidi que iria
respeitar o tempo dela.

Mas me pareceu um sonho etéreo quando ela invadiu o banheiro e me


pegou em meio um arroubo de desejo, em que me acariciava pensando nela.
Mas quando ela se despiu lentamente na minha frente, de uma maneira
extremamente sensual, que com certeza Adelle nem sabia que o fazia, e se
juntou a mim no chuveiro, me confrontando, embora o uso da palavra amante
tenha me incomodado, eu soube que eu não poderia mais me controlar. Ainda
mais com aquelas duas esmeraldas cintilantes me fitando com um desejo
avassalador, uma fome que faria qualquer homem são se entregar sem pensar
duas vezes.

E quando ela me pediu que fizesse amor com ela, eu me entreguei


sem pensar nos significados ocultos disso, não me importando em amá-la, em
mostrar minha devoção com boca e mãos. Mas o que não poderia imaginar
era que, ao fazê-lo, eu também colheria os benefícios, pois tudo pareceu
ainda mais intenso para mim. Envolvido pelas sensações inebriantes, eu me
entreguei.

Eu era de Adelle, do mesmo modo como ela era minha, tanto que,
sem pensar direito, quase me esvaí dentro dela. Tive um relâmpago de juízo
quando estava prestes a gozar, embora soubesse que o método não era
completamente eficaz. Tinha me esquecido completamente de usar camisinha
durante o ato, e isso poderia trazer consequências que não previmos. Mas não
podia negar que sentir seus músculos internos me apertando enquanto eu
deslizava dentro dela sem nenhuma barreira era completamente delicioso.
Nunca tinha sentido tal sensação de carne contra carne, pois jamais me
permiti isso. Pude ter sido o primeiro dela, mas ela era a primeira em várias
coisas na minha vida.

Adelle foi a única que pouco a pouco conseguiu se infiltrar e se


enraizar dentro de mim, me fazendo querer ficar próximo, que mexia com
meu brio, roubava minha racionalidade. Que derrubava uma a uma as
barreiras que nem sabia que tinha colocado na minha vida.

Eu me sentia um homem diferente ao lado dela, e a prova viva disso


era o fato de eu despender o meu tempo brincando com seu irmão, o que me
era, de certa forma, estranhamente prazeroso. Apenas não sabia ao certo o
que eu faria com esse homem que estava descobrindo. Sinto que de alguma
maneira ele tem tirado o meu foco nas questões que realmente me eram
importantes até pouco tempo, como os negócios e minha sede por poder. Mas
me sentia ganhando muito mais me permitindo essa mudança, essa entrega.

Soltando um suspiro longo, joguei os meus cabelos para trás e abri um


sorriso quando ouvi passos pelo corredor. Pouco depois, uma Adelle serena
entrava, trancando a porta atrás de si.

— Tudo bem com ele?

— Sim, dorme tranquilamente — caminhou até o banheiro e removeu


a toalha enrolada em sua cabeça. Ficou no recinto alguns instantes, voltando
logo depois para o quarto —, confesso que não resisti e fiquei observando-o
por alguns minutos. Ele parece um pequeno anjo, tão inocente em seu sono!
Me passa uma tranquilidade…Posso parecer tola, mas...

— É natural sentir-se protetora, tesoro. Ele é como se fosse um filho


para você e o ama mais que tudo. E depois do que você passou e de ver a dor
dele, me parece ainda mais normal que você queira vigiá-lo o tempo todo.

— Hm…

Removeu o roupão, ficando nua, e quando se aproximou da cama, a


luz batendo nos pequenos cristais do lustre fizeram um jogo de sombras em
sua pele. Subindo em cima do colchão, engatinhou até onde eu estava e,
como se fosse a coisa mais natural, sentou-se no meu colo, seu sexo contra o
meu, e abraçou o meu pescoço. Envolvi sua cintura com o braço e a
acomodei melhor enquanto ela deslizava um dedo pelo meu rosto.
Estranhamente me sentia satisfeito apenas de ficar assim com ela, em um
meio abraço, tão próximos um do outro que, com um movimento, eu poderia
penetrá-la. Sentir sua pele contra a minha, seu toque suave em minha face, e
o cheiro do hidratante de chocolate que invadia minhas narinas era muito
bom. Com ela, descobri que não precisava estar enterrado em seu canal para
me dar prazer. Sua companhia, seu olhar e seu contato já eram suficientes.

— Fico feliz que pense assim, Andrea — deslizou a ponta do dedo


pelos meus lábios enquanto me fitava com um brilho intenso —, poucos
homens entenderiam dessa forma. Poucos se dignam a entender uma mulher
solteira que tem a responsabilidade de cuidar de uma criança sozinha. Somos
julgadas por todas as decisões que tomamos.

— Imagino o quanto deve ser difícil, dolcezza… — coloquei uma


mecha úmida do seu cabelo atrás da sua orelha —, confesso que só depois
que de fato vi o seu sofrimento, é que realmente compreendi o quanto não é
fácil essa rotina.

— Entendo, Andrea…

Passou a unha pelo meu peitoral, arranhando-me suavemente e eu


estremeci, com um calor percorrendo todo o meu corpo, fazendo meu pênis
se avolumar ainda mais debaixo dela. Mas eu me controlaria.

— Mas pelo menos o faz, agora — continuou.

Para a minha surpresa, curvou-se contra mim, seus seios macios do


tamanho perfeito para as minhas mãos prensando-se contra o meu peitoral, e
beijou-me delicadamente, sua língua se movendo com tanta lentidão contra a
minha, que apenas saboreei o contato, gravando com a minha boca o
contorno dos seus lábios cheios e deliciosos. Ela era minha perdição.
Segurando em meus ombros, moveu-se contra minha pelve, arrancando de
mim um gemido, e aprofundou o beijo. Nossas cabeças se inclinavam
buscando o melhor encaixe das nossas bocas até que nos afastamos por falta
de fôlego.

— Eu tenho sorte — comentou com a voz falha —, por ganhar o


suficiente para mantê-lo em uma boa escola e por ter o seu apoio agora. Nem
todas podem contar com isso.

Sua expressão ficou séria de repente. Seu comentário me fez


questionar algo que eu sabia que teria minha parcela de culpa por não ter me
atentado a esse ponto antes.

— Nossa matriz e conglomeradas oferecem algum tipo de apoio às


nossas colaboradoras e colaboradores que tenham responsabilidade de cuidar
de crianças?

— Infelizmente não há nenhuma política nesse sentido. — Seu


semblante entristeceu e ela virou a cara, provavelmente querendo esconder
seus sentimentos sobre o assunto, e eu senti meu peito se apertar. — Seria
muito útil aos pais e responsáveis ter algo nesse sentido.

Segurei o seu rosto e a fiz me encarar, não encontrando repreensão em


seus olhos, apenas compaixão por aqueles que, como ela, não tiveram a
mesma sorte. Algo que nunca senti por ninguém, pois era egoísta demais para
me preocupar com algo que não fosse os meus objetivos. E encarando aquela
mulher forte, que tomou desde tão nova tanta responsabilidade para si, soube
que como dono de todo aquele império eu poderia fazer muito mais do que
fazia. Definitivamente, eu era um merda de chefe até então. E o que faria não
era bem caridade, porque me beneficiaria também, já que no fim, os
funcionários se sentiriam mais motivados.

— Podemos mudar isso. — Ela arregalou os olhos, parecendo


incrédula.

— Podemos? Nós?

— Sim, tesoro. Nós. — Acariciei seu rosto delicado. — Montaremos


uma comissão junto ao RH e alguns membros do departamento de
contabilidade e avaliaremos tudo que poderemos fazer para auxiliar esses
colaboradores com filhos, ou melhor, estendendo-o para quem precisar de
ajuda com algum familiar, como é o seu caso.

Sua boca formou um O de surpresa e eu a achei completamente


adorável, tanto que não resisti em beijar o canto dos seus lábios.

— Começaremos implantando-a na nossa matriz, mas faremos disso


uma política a ser adotada em qualquer das nossas conglomeradas e filiais. —
Fiz uma pausa. — Teremos que olhar a legislação de outros países, mas não
vejo isso como um problema.

— Andrea…

— E eu quero que você presida o comitê assim que voltar a trabalhar,


e que dê a palavra final em tudo.

— Eu não sei o que dizer…

— Apenas diga que sim, tesoro. Você melhor do que ninguém sabe
qual a necessidade dessas pessoas. — Deslizei minha mão da sua bochecha
até o seu pescoço, tocando a curva suave e delicada. Eu amava sentir sua pele
contra o meu tato. Como resposta, ela se acomodou melhor sobre mim e
minha ereção roçou em sua barriga; não contive o gemido. Não queria que
aquele momento fosse interrompido pelo sexo, embora tendo ela tão próxima,
duvidasse que não acabaríamos nos amando novamente. Todo o meu corpo
estava consciente dela e eu estava faminto.

— Eu acho que precisamos incluir no processo realmente quem


vivencia o problema cotidianamente. — Disse um pouco mais animada
depois de pensar por longos minutos, o entusiasmo refletindo em seus olhos.
Ela ficava muito mais linda assim. — São vivências e necessidades distintas,
então acho importante ouvi-las. Acredito que as políticas para auxiliar essas
pessoas só poderão ter efeito se realmente elas tiverem voz.
— Hm…

— Não acho que deva ser unilateral. — Franziu o cenho de leve. —


Sem avaliarmos, com certeza os departamentos farão o mínimo apenas para
evitar custos.

— Será como você deseja, tesoro. Não vamos economizar e,


pensando melhor, você poderá escolher quais pessoas você quer que integrem
o comitê.

— É muita responsabilidade para mim... — Pareceu insegura e seus


dedos.

Novamente puxei seu queixo para mim e, erguendo um pouco meu


tronco, beijei seus lábios suaves, sem a intenção de aprofundá-lo.

— Tenho certeza que dará conta de tudo. Não conheço pessoa mais
capaz do que você Adelle, nem mesmo eu. Não há nada que você não consiga
fazer. Você é eficiente, inteligente, determinada, não se rende perante as
dificuldades. E muito menos deixa de correr atrás daquilo que você precisa. É
uma mulher admirável, mio amore.

— Andrea — sussurrou meu nome tão baixinho que quase não ouvi.

— Aquela que respeito mais do que tudo…

Uma lágrima escorreu pelo seu rosto e eu limpei com o polegar a


trilha deixada por ela.

— Não chore, Adelle, por favor.

— Nunca ninguém me viu dessa maneira…


— E eu a vejo muito mais além, e não hesitarei em te mostrar isso
todos os dias que estivermos juntos.

Fitando-a profundamente, busquei sua mão e a entrelacei na minha,


em um gesto carinhoso, querendo transmitir pelo contato aquilo que sentia.

Para minha surpresa, soltando sua mão da minha, se apoiou contra o


meu peito, e esticando o braço, pegou uma camisinha que eu tinha deixado
sobre o móvel de cabeceira. Rasgou o invólucro, o descartando em qualquer
lugar. Pareceu hesitar, então ajudei-a a deslizar o látex pelo meu membro, e
nossos dedos roçando na minha carne fez com que eu sentisse um espasmo de
prazer. Mas eu iria esperar o que ela queria fazer. Deixando-a no controle,
apenas segurei novamente os seus dedos entre os meus.

Sem deixar de me olhar, jogou seus cabelos para trás, que caíram
como uma cascata pelas suas costas, e tombou contra o meu corpo. A
sensação de ter os seus seios macios esmagados contra o meu peitoral era
completamente delicioso.

— Então me ame outra vez — sussurrou contra os meus lábios e me


beijou com tamanha ferocidade e paixão que não tive escolha a não ser
responder com a mesma intensidade, enroscando minha língua na sua.

A senti cravando a unha no meu peito quando, com a mão livre,


segurei sua nuca e controlei o ardor com que nos devorávamos, como se não
conseguíssemos ter o suficiente do sabor um do outro. Poderia passar horas
apenas degustando sua cavidade quente e úmida, que era bastante
convidativa. Nunca fui um homem sedento por beijos, porém o gosto doce de
Adelle era inebriante.
Soltando um gemido, a mulher deslizou sua unha pelo meu peito e
abdômen, e mesmo com os movimentos restritos pelo peso do seu próprio
corpo, encontrou minha ereção, tomando-a entre seus dedos finos, me
desarmando, e eu grunhi com a carícia enquanto ela aproveitava meu
desconcerto e tomava o controle novamente das nossas bocas. Eu poderia ter
sido o primeiro dela e não termos tido tantos interlúdios ainda, mas Adelle
aprendia rápido e não tinha medo nenhum de mostrar aquilo que queria, nem
colocava barreiras no seu próprio desejo. Uma corrente de antecipação
roubou o resto de racionalidade que eu tinha ao pensar no deleite que eu teria
quando aquela mulher aprendesse comigo tudo que poderia fazer para nos dar
prazer. Até podia imaginar que chegaria ao ponto em que teríamos que
praticar outras coisas juntos.

Deixando-me levar pelo fascínio que ela exercia sobre mim, desci
minha mão da sua nuca e percorri toda a linha da sua coluna até encontrar a
fenda entre as nádegas perfeitas, o que fez com que a mulher inclinasse um
pouco o corpo para trás, sua boca afastando da minha, quando gentilmente
brinquei com seu buraco enrugado apenas para provocá-la. Como dois
podiam jogar esse jogo, sem dizer nada, ela se ajeitou sobre meu pau e,
apoiando as duas mãos no meu peito, mordeu os lábios e cravou-me dentro
de si. Um som alto escapou da minha garganta enquanto observava seus
olhos brilhantes, em uma mistura de desejo e travessura.

— Cazzo, Adelle. — Gemi, segurando suas nádegas com as duas


mãos quando ela se ergueu e deslizou novamente pela minha extensão, seus
músculos se contraindo enquanto me tomava até a base. — Tão deliciosa…
— Hm… — Se atreveu a se mover um pouco mais e deixei que ela
explorasse a posição da forma que queria, apreciando sentir sua bunda contra
as minhas palmas e ver os seus seios nus pendulando enquanto ela mexia
contra mim.

— Bom, tesoro?

Ela soltou um gemido e assentiu enquanto repetia seus movimentos


com tanta lentidão que tive que usar todo o meu autocontrole para não a girar
na cama, deixando-a embaixo de mim e tomá-la, impondo o meu ritmo. Mas
eu seria um amante paciente e me permitiria desfrutar a doce tortura que ela
me impunha.

— Beije-me, amore mio[31] — pedi com a voz rouca de desejo, nos


ajustando na cama de modo que ela tivesse controle sobre mim, ao mesmo
tempo que me tomava com a sua boca. Queria sentir aquela mulher por
inteiro, fundindo-me a ela. Tinha certeza que ao fazê-lo, tudo se tornaria
ainda mais intenso e mais gostoso.

Não precisei dizer mais nada, pois me acomodando melhor dentro de


si, ela novamente se inclinou e eu aproximei meu rosto do seu, acabando
completamente com a distância entre nós. Enquanto rebolava suavemente
contra a minha pelve, subi uma das mãos até a base da sua coluna e
mordisquei seus lábios pedindo passagem para a minha língua, estava sedento
por ela. Envolvido pela calidez de Adelle, eu perdia a noção de tudo, menos
do seu sabor e da pressão que seu sexo exercia sobre o meu. Seus seios
macios friccionando contra o meu peito enquanto quicava em seu próprio
ritmo, potencializava ainda mais as sensações que fazer amor com ela me
proporcionava. Era muito bom tê-la completamente grudada a mim, e olhar
sua expressão cada vez mais nublada pelo prazer que eu proporcionava
alimentava o meu ego, que já era tido como gigante.

Aquela mulher era minha, apenas minha. E no que dependesse de


mim, nenhum outro teria aquele prazer.

Apertei sua nádega com mais força quando os movimentos hesitantes


começaram a ficar ainda mais intensos, os estalos provocados pelo subir e
descer de Adelle se unindo aos sons que escapavam em meio ao beijo,
denunciando que pouco a pouco íamos sendo engolfados pela onda de
excitação.

— Ajude-me, querido — ela disse completamente sem fôlego, e seu


pedido sussurrado contra a minha orelha fez com que meu autocontrole se
despedaçasse por completo.

— Con molto piacere, tesoro[32].

Beijando-a com fúria, enroscando minha língua na sua, segurei os


seus quadris e afundei meus dedos na sua carne, ajudando-a a deslizar pelo
meu pênis, erguendo-a para descê-la novamente, fazendo com que ela
soltasse um gritinho. Quanto mais eu a ajudava a se movimentar, cavalgando
sobre mim, mais eu sentia sua carne me apertar, indicando que ela estava
perdida em sua própria busca pelo prazer. Buscando por ar, deixei sua boca e
comecei a deslizar minha língua pela sua bochecha, maxilar e queixo até
encontrar o seu pescoço, sentindo o sal que impregnava sua pele devido ao
suor misturado ao seu hidratante. Deixando-o mais exposto para mim,
mordisquei sua pele e suguei, fazendo com que ela emitisse sons agudos,
barulho que terminou de roubar toda a minha sanidade. Usando toda a força
do meu corpo, girei nossos corpos, deixando-a debaixo de mim, e tirando
meu pênis de dentro dela completamente, a penetrei com ímpeto, sentindo
seu corpo tremular e ela arfar.

Deliciado pela sua reação, beijei-a novamente, aumentando a


velocidade com a qual eu arremetia para dentro dela, sentindo-a trêmula, sua
vagina contraída perante a minha invasão. Quando ela apertou meu braço
com certa força e seus olhos pareceram ficar opacos, vi que Adelle estava
quase lá só com a penetração, então eu intensifiquei os movimentos, me
controlando até que senti os músculos dela me prenderem, e tomei o seu
murmúrio de assombro com a minha boca. Estando à beira do colapso,
principalmente com ela exercendo pressão contra o meu pênis, com mais
algumas estocadas deixei-me levar pelo orgasmo, soltando um grunhido
baixo, que ela absorveu.

Sentindo-me fraco pelas ondas de êxtase que ainda me percorriam,


fiquei em cima dela por um tempo, esmagando-a contra o colchão com meu
peso, até que vendo que eu poderia machucá-la, saí de dentro dela e rolei na
king, removendo a camisinha do meu pau quase flácido. Dando um nó,
peguei um lenço de papel no móvel de cabeceira e o envolvi, o jogaria no
lixo mais tarde. Queria aproveitar cada momento de languidez tendo ela junto
a mim.

Sem dizer nada, puxei uma Adelle mole para os meus braços e a
envolvi, não resistindo a beijar seus lábios vermelhos pela intensidade com
que a devorei.
— Spettacolare, dolcezza[33]. — Beijei sua testa suada.

— Hm… — Tinha fechado os olhos, mas os abriu novamente.

— Bellissima[34] — sussurrei minutos depois, enquanto olhava para o


lustre, sentindo nossos corações baterem já compassados.

Não obtive nenhuma resposta e, suspirando, contemplei a mulher com


semblante sereno completamente adormecida em meus braços.
Capítulo Trinta e sete

— Em duas semanas, a DT Maritime estará transportando o milho


para a China — Bernard Jackson soou confiante e eu apreciei o fato —, só
estamos esperando toda a carga chegar por terra aos portos gêmeos de
Wisconsin para carregar os containers.

— Excelente. É o porto mais próximo?

— Sim, boa parte da produção do Cinturão dos Grãos é escoada por


ali. Em breve iniciaremos também o da soja.

— Ótimo — passei a mão na barba incipiente do meu queixo —,


sobre a remodelação da nossa frota?

— Já estamos fazendo orçamentos com várias construtoras, senhor


Della Torre. Mais tarde enviarei todos os relatórios para que possa
acompanhar. Mais alguma coisa, senhor?

— Não, mantenha-me informado de tudo.

— Certamente, boa noite.

— Boa noite — respondi educadamente e desliguei a videochamada.

Eu não poderia estar mais satisfeito com todo o andamento da minha


vingança. Embora a empresa ainda tivesse seus problemas, não era nada que
ao longo dos meses seguintes não conseguiríamos ajustar. Tinha sido bem
difícil a negociação com os produtores, mas, no fim, por um preço bem
menor, mesmo que comprometesse um pouco o lucro, iríamos atrair um
número considerável deles para a minha empresa. Saboreava e muito o fato
de ter gerado um prejuízo de milhares de dólares a empresa que tinha me
lesionado pela demora na entrega da minha carga. Não era lá a total
destruição deles, pois provavelmente eles contornariam a situação no futuro,
mas, mesmo assim, me deixava exultante.

Eu sempre vencia e tinha o que queria no final.

Mas não podia negar que em partes o mérito era de Adelle. Além dos
conselhos valiosos, também tinha sido ela quem deu a ideia de atravessar
essas negociações do transporte de milho, agendando as reuniões com os
meus contatos sem demora. Sua eficiência e inteligência agindo ao meu
favor. Poderia parecer pouco para muitos, porém saber que ela tinha sido
minha companheira nisso, deixava minha vitória ainda mais saborosa.

Não era apenas o seu corpo, sorriso e olhar que me deixavam


completamente aceso, mas a sua inteligência me fazia arder. Todas as noites,
quando a tinha em meus braços, mesmo estando afastada temporariamente
das funções na empresa, ela me perguntava sobre o trabalho e meus negócios,
e eu me pegava contando tudo a ela e pedindo sua opinião sobre
determinadas coisas, e ela não hesitava em dar, algo que eu achava
completamente excitante e despertava o meu desejo a tal ponto, que não me
restava alternativa a não ser amá-la com o meu corpo até ficarmos
completamente saciados.

Estava completamente envolvido pela rotina doméstica que sem


querer havíamos criado, e que diferentemente do que eu poderia imaginar, eu
apreciava e muito.

Nunca pensei que eu poderia ser esse tipo de homem, daqueles que
diminuía sua carga de trabalho para ficar na companhia da mulher que
gostava, que interagia com uma criança pequena, brincando, vendo filmes,
até mesmo ajudando-o nos deveres da escola. Um homem presente, mais
caloroso, menos egoísta. Embora ainda continuasse o mesmo arrogante,
exigente e frio com os outros, pois, na minha posição, eu precisava dessas
qualidades para continuar prosperando, em casa era outro homem.

Assim que terminei de redigir um e-mail para Fernando Matiazzi,


solicitando uma reunião, olhei as horas no relógio do computador,
constatando que passava um pouco das seis horas da tarde de um sábado e
que me encontrava há várias horas trabalhando, mesmo no fim de semana.
Questionando o que Adelle e Will poderiam estar fazendo, levantei-
me da minha cadeira presidencial e, abrindo os botões da minha camisa
social, deixei o escritório, encaminhando-me para o quarto dele pensando que
eles poderiam estar lá, mas não tive sucesso.

— Não, Del, a peça não é aí — ouvi a voz infantil animada quando


alcancei a sala de estar conjugada com a cozinha —, é aqui, ó. — Deu uma
gargalhada gostosa ao apontar para algo na mesa de centro, provavelmente o
quebra-cabeças do Shrek que tinha comprado online e tinha chegado ontem.

— Sou péssima montando essas coisas. — Vi minha mulher franzir o


cenho de leve quando me aproximei deles. — Se fosse jogo da memória, não
teria para ninguém.

— Ah, Del, é que dexo você ganhá.

William fez um biquinho infantil e eu e Adelle não resistimos, caindo


na risada, fazendo o menininho soltar um resmungo apenas para gargalhar
também. Não podia negar que meu apartamento se tornou um lugar muito
mais alegre com eles.

— Você não pode ser tão ruim com quebra-cabeças, tesoro — falei,
curvando-me em direção a ela, dando um beijo suave em seus lábios.

— Sempre confundo onde vão as peças, ainda mais desses menores.


— Deu de ombros, abrindo um sorriso logo depois.

— Hm… — Peguei o controle e liguei em um canal de notícias, mas


diminuindo o volume. — Então deixa eu ajudar vocês. Quando criança, eu
montava os meus em um estalar de dedos.
Arregaçando as mangas da minha camisa, sentei no meio deles e
peguei uma pecinha verde que parecia uma orelha, encaixando-a na parte que
Adelle estava montando.

— Convencido — disse em tom brincalhão enquanto tentava colocar


uma peça que claramente era de outro lugar, percebendo isso segundos
depois.

— Faz parte do meu charme — soltei, fazendo nós três rir.

Imersos na brincadeira, a qual minha brilhante secretária provou-se


bastante ruim, montando muito pouco. Mal vimos o tempo passar rindo,
conversando com William e gracejando um dos outros, apreciando cada
minuto que passávamos juntos como se fôssemos uma família.

— Deus. — Adelle arfou e eu olhei para ela, sem compreender. Ela


parecia fitar fixamente a televisão e, franzindo o cenho, voltei meu escrutínio
para o aparelho.

Reagindo, a mulher pegou o controle aumentando o volume e eu


prestei atenção naquilo que a repórter falava e, pela segunda vez no dia, eu
ficava feliz por saber que tudo estava ocorrendo da maneira que eu queria,
mesmo que eu não tivesse total controle sobre os fatos.

"Em operação da polícia de Nova York, Melanie Shutz, médica de


uma famosa clínica popular de Staten Island, foi presa, junto com outras
quatro pessoas, acusadas de receitar tratamentos duvidosos aos pacientes.
Embora a investigação esteja em andamento e os responsáveis acreditem que
o número de vítimas poderia ser bem maior, eles afirmaram que existem
provas suficientes para condená-la [...]”
— Que bom que essa mulher tão cedo irá prejudicar alguém
novamente — Adelle falou com a voz tão baixa e embargada, que eu fitei seu
rosto, e vi que estava tomado pelas lágrimas.

Protetor, trouxe-a para os meus braços e beijei o topo da sua cabeça.

— No que se depender de mim, tesoro, ela nunca mais o fará.

— Será que precisarei depor? — perguntou, preocupada.

— Provavelmente, já que registramos queixa, mas será bom que você


dê seu depoimento para a polícia. Eles devem te procurar a qualquer
momento, mas você não precisará fazê-lo sozinha.

— Certo. — Fez uma pausa. — Agradeço, Andrea, pois tenho certeza


que ela só foi pega porque você mexeu seus pauzinhos.

— Fiz muito pouco, Adelle. — Apertei-a ainda mais em meus


braços.

— Del, tá tudo bem? — William se levantou de onde estava e tocou


o rosto da irmã, suas feições infantis, antes alegre enquanto montava o
quebra-cabeças, repleta de medo e angústia.

— Está sim, querido. Na verdade, não poderia estar mais feliz.

— Então poquê tá chorando, Del? — Ainda parecia desconfiado.

Afastando-se do meu abraço, Adelle suavemente envolveu William


nos seus, como uma forma de confortá-lo.

— Sabe, meu amor? — Deu um beijo na bochecha dele. — Nem


sempre choramos de tristeza, mas sim pode ser por outro motivo.
— É, Del?

— Sim. Você se lembra quando eu chorei quando você me deu um


desenho que tinha eu e um coração?

Ele fez que não com a cabeça, seus cachinhos movendo-se no


processo.

— Mas eu caí aos prantos de emoção, por saber que você me ama.

Pareceu pensar um pouco e assentiu.

— Tá.

— E para comemorar, que tal eu preparar o meu famoso purê de


batatas e frango enquanto vocês terminam esse quebra-cabeças?

— Eeeee — soltou um gritinho e eu não contive o sorriso quando ele


fez uma careta segundos depois. — Mas sem aquele troço ruim, né?

— Nada disso, você precisa das vitaminas do aspargo. — Balançou a


cabeça em negativa.

— Ah, não, Del. Andrea… — Voltou-se para mim, como se pedindo


ajuda.

— Você ouviu sua irmã, piccolo. — Fiz uma pausa. — Se você


quiser ser forte como eu e os super-heróis, tem que se alimentar bem.

— Tá bom. — Pareceu aceitar um pouco o meu argumento.

— Então deixa eu ir preparar a comida antes que fique muito tarde


para jantar. — Adelle se desvencilhou do irmão e ele se sentou novamente no
seu lugar.
Will pegou uma pecinha e montou parte do vestido da Princesa Fiona,
que, para minha surpresa quando vi o filme pela primeira vez, era a
companheira do Shrek. Parecia que até mesmo os ogros tinham direito ao seu
final feliz. E era por esse motivo que ele tinha rido de mim no dia do
casamento do meu sócio. Não podia negar que, mais e mais, eu, um egoísta e
frio, estava encontrando a felicidade nos braços deliciosos daquela mulher.

Adelle se levantou de súbito e caminhou até a cozinha em conceito


aberto, parando quando alcançou o balcão, se virando para nós.

— Comportem-se, estou de olho em vocês.

Para dar ênfase no que dizia, fez um gesto com os dedos, indicando
que estava nos vigiando, fazendo-nos rir enquanto pegávamos mais uma peça
e a encaixava naquelas já montadas.
Capítulo Trinta e oito

Analisei criticamente o balancete mensal feito por uma das filiais do


império Della Torre e fiz uma careta, abrindo a do mês passado para
comparar. Tinha sofrido uma grande queda nos números de vendas, algo que
simplesmente não poderia ignorar, pois não houve nenhuma flutuação do
mercado de bens e serviços que justificasse isso. Teria que marcar uma
reunião com urgência com os responsáveis para saber o que estava
acontecendo. Levei minha mão à cabeça, sentindo as têmporas pulsarem com
a dor iminente e suspirei. Teria que tomar um analgésico para tentar
sobreviver a metade do dia de trabalho que ainda restava, para finalmente ter
a doce mulher embaixo ou em cima de mim a noite. Diferentemente do que
eu achava quando a fiz minha amante, a cada dia que eu a tinha nos meus
braços, mais eu a queria. Eu, um homem que tinha controle sobre tudo, não o
tinha mais perante Adelle. E se fosse sincero comigo mesmo, nem me
importava em não o mais ter, independente do que isso significasse.

Afastando essa torrente de pensamentos, tentei me concentrar nos


números à minha frente, quando, para piorar a minha dor de cabeça, meu
telefone pessoal começou a tocar. Pegando o aparelho, olhei rapidamente o
visor apenas para constatar que era a minha mãe. Fazia algum tempo que a
mamma não me ligava, já que o meu pai decidiu estender a viagem para mais
de um mês, percorrendo várias praias das Maldivas. Eles eram aposentados,
tinham dinheiro, então poderiam fazer o que bem lhe aprouvesse. Com toda a
certeza, os dois deveriam estar bem felizes curtindo um ao outro.

Pensei se deveria ou não atender sua ligação, mas, inevitavelmente,


me lembrei de Adelle ralhando comigo algumas vezes, dizendo que eu tinha
sorte de ter uma família amorosa que se preocupava comigo, e isso fez com
que eu não deixasse cair na caixa postal, por mais que algo dentro de mim
soubesse que minha dor de cabeça aumentaria exponencialmente.

— Olá, mammina — disse com a voz suave. — Como está a viagem?

— Bambino, que saudades de você, mio figlio.

— Também, mamma.

— Chegamos a nossa vila ontem de viagem, e confesso que por mim


não voltaria. Tudo era tão lindo, as areias brancas, as águas cristalinas. —
Soltou um longo suspiro, provavelmente imergindo nas suas próprias
lembranças. — Tão romântico! Um verdadeiro paraíso.

— Se você o diz. — Dei de ombros mesmo que ela não pudesse ver.
Não era um homem romântico e tal coisa não me interessava em absoluto.

— Falei para o seu irmão estender a lua de mel e levar Justine até lá.
Existem muitas praias desertas ótimas para fazer amor. Descobrimos algumas
enquanto...

— Madre… — cortei-a secamente enquanto fazia uma careta.

Eu sabia que meus pais tinham uma vida amorosa muito ativa, porém
não me interessava nem um pouco discutir as proezas sexuais dos dois. Sexo,
definitivamente, era um assunto que eu não falava com ninguém, e não o
começaria a fazer com a minha mãe. Nesse aspecto, eu era um homem muito
conservador. A única pessoa com quem estava realmente disposto a
conversar sobre isso era com Adelle, pois a mulher era capaz de realizar todas
as fantasias que tinha com ela.

— Não tem necessidade de ser tão puritano, Andrea. — Fez uma


pausa. — Não disse nada demais e todo mundo faz sexo — completou,
maliciosa. — Você que trabalha demais.

— Tenho certeza que não me ligou apenas para discutir minha vida
sexual, madre… — falei com a voz aveludada, escondendo minha
impaciência. Mas ela me conhecia bem o suficiente, afinal, ela era minha
mãe.

— Ragazzino viziato[35]. — Soltou um suspiro que fingia irritação. —


Onde eu falhei com a sua educação?
Começou a fazer o seu drama e eu revirei os olhos. Minha madre,
definitivamente, deveria ter sido atriz. Ela tinha muito talento para atuar.

— Nove meses na barriga para tratar a mamma desse jeito —


continuou. — Mas quem perde é você.

— Tenho certeza que sim, madre. — Coloquei fim a essa conversa


com suavidade, sentindo minha cabeça pulsar perante a falação da minha
mãe. — Quem sabe um dia, não é mesmo, eu tome jeito?

— Quando conhecer a mulher perfeita, bambino, verá que é capaz de


fazer qualquer coisa. Espero que não demore a encontrá-la, querido. Você é
um homem solitário…

Eu já a encontrei, meu corpo estremeceu com esse simples


pensamento, roubando o ar dos meus pulmões, e você mesmo me apontou tal
mulher, mamma. Mas como era idiota, preferi ignorar o que ditava o meu
coração e não dei importância a essa ideia.

— Liguei para contar que seu irmão e a noiva decidiram adiantar o


casamento e ele ocorrerá daqui a dois meses. — Pareceu animada em dizê-lo.
— Ele te contou? Ele será pai. Estou eufórica com a ideia de ser avó.

— Tenho certeza que sim, mammina. — Eu costumava ser indiferente


a esses assuntos, mas me peguei mais contente do que poderia imaginar pelo
meu irmão, por mais que ainda estivesse irritado com ele pela viagem
desnecessária que me fez ir até os vinhedos. — Ligarei para ele mais tarde
para felicitá-lo.

— Não vejo a hora de pegar meu neto no colo — falou radiante.


— Te conhecendo como a conheço, capaz de sufocar a criança com
tanto amor. — Soltei uma risada fazendo a minha mãe gargalhar também.

— Que comentário maldoso, mio bambino. Só não brigarei ainda


mais com você porque estou feliz demais com a novidade. — Riu de si
mesma e pude imaginar a mulher baixinha de cabelo curto negro
completamente empolgada.

— A verdade é que você não tem como negar isso, mamma. — Sorri
para o telefone.

— Tá, não vou negar… Você virá para as bodas, não é?

— Claro, tesorino[36]. Por mais que odeie essas festas, é o meu irmão.

— Deve ser porque você foge do seu… — comentou


displicentemente e senti minha cabeça pulsar ainda mais, ao que parece, era
um grande avesso ao tema.

— Madre… — Levei a mão a têmpora, massageando-a suavemente.

— Não julgue uma mãe que só quer a felicidade do filho, Andrea. Sei
que você é adulto, mas sempre me preocuparei com você, como se fosse o
menino pequeno que buscava consolo em meus braços depois de se
machucar. Porque eu te amo e sinto que você se preocupa demais com coisas
que não têm tanta importância e esquece de que a vida passa rápido demais.
Não quero que você se arrependa de não ter vivido quando ficar mais velho.

Engoli em seco, suas palavras atingindo-me em cheio. O homem de


outrora talvez não teria se importado tanto com isso, porém envolver-me com
Adelle e com o pequeno William tem me dado uma outra perspectiva sobre
tudo. Não podia negar que me pegava apreciando cada momento que
passávamos juntos, e que antes essas coisas me pareceriam completamente
banais.

— Desculpe, madre. Eu também te amo e te quero bem.

— Sei disso, bambino. — Deu um suspiro melancólico que me deixou


incomodado. Como todo filho que ama a mãe, não gostava de saber que eu
poderia ter causado alguma dor nela, nem mesmo ter estragado
momentaneamente sua felicidade. — Mas mudando de assunto, liguei mais
cedo para o seu escritório, mas foi outra mulher que atendeu a ligação.

— Ah...

— Se você fez algo com aquela menina... — ameaçou.

— Claro que não, ela está de licença. O irmão dela teve apendicite e
precisou fazer uma cirurgia de urgência — comecei a contar, mas minha mãe
me interrompeu com o seu falatório.

— Tadinha daquela menina e do seu pequeno! — Soltou um suspiro.


— Eles só têm um ao outro. Nem consigo imaginar como deve estar sendo
difícil para ela cuidar de tudo sozinha…

— Madre…

— Uma mulher tão doce e batalhadora. Queria que ela tivesse alguém
para ajudá-la… Se eu não estivesse tão longe, eu mesma iria.

— Eu…

— Ela deveria sair mais, encontrar uma pessoa para ajudar a cuidar do
pequeno. Deve existir um homem nesse mundo que aceite a responsabilidade
para si, que queira oferecer auxílio para educar uma criança.

Não sei por que, mas uma raiva surda me invadiu. O ciúme, em
pensar na minha mulher com outro homem que não fosse eu, me corroeu por
dentro, e antes que eu pudesse pensar racionalmente, falei de súbito:

— Eu sou esse homem, madre! Eu a comprei. Tenho um contrato


provando isso.

— Você o quê, Andrea? — Seu tom ficou alterado como nunca tinha
visto, beirando a histeria.

— Ela agora é minha amante.

— Dio, Andrea, o que você fez?

— Ela precisava de dinheiro, e eu tinha para dar. Fizemos um trato.


— Fiz uma pausa e tentei justificar: — Pensei que era para comprar coisas
fúteis.

— Eu não posso acreditar que você fez algo do tipo, bambino. — Sua
voz foi diminuindo alguns tons, a raiva sendo substituída pela decepção,
fazendo-me sentir um gosto amargo na boca, só então me dando conta de
que, na minha irritação, tinha falado mais do que era prudente. — Me diz que
é mentira, Andrea.

Fiquei em silêncio sem saber o que dizer, já que tinha feito merda.
Porém o arfar alto que minha mãe soltou me indicava que ela tinha
compreendido e muito bem que eu não estava mentindo sobre o assunto.

— Meu filho — soltou um suspiro longo —, por mais que você tenha
poder e dinheiro, e não nego que isso atrai pessoas ruins, não pode julgar
todas elas da mesma maneira. — Fez uma pausa. — E sua secretária é um ser
humano, Andrea, não um objeto que você usa e joga fora. Que você pode
comprar. Ela é uma mulher, e tem sentimentos como qualquer outra, não uma
máquina de eficiência que você queria que fosse.

A frase da minha mãe doeu em mim como se eu tivesse sido


apunhalado no peito, uma dor que nunca tinha sentido antes assolando o meu
peito. Minha dor de cabeça não era nada perante aquele sentimento.

Eu fiquei calado, minha mãe tinha razão. Quando realmente a tomei


como amante, sabia que ela tinha aspirações românticas, mas preferi dizer a
mim mesmo que poderíamos lidar com isso e sair ilesos, menosprezando seus
sentimentos. Só agora conseguia pensar racionalmente nas consequências das
minhas ações.

— E um contrato? Onde você estava com a cabeça, filho? Nem quero


imaginar o teor das cláusulas! — Era inegável o desapontamento em sua
voz. — Nunca pensei que você poderia desrespeitar tanto uma mulher dessa
forma, ainda mais uma funcionária. É um insulto! Ela é uma mulher decente
e sozinha.

— Madre, eu…

— Não, meu filho, eu estou muito decepcionada e não quero saber de


mais nada. — Pareceu pensar por uns momentos. — Mas antes que eu
desligue, deixe-me te dizer uma última coisa. Você pode ter o corpo dela no
momento, ela pode até ter se entregado a você de bom grado, mas esse
maldito contrato que você redigiu nunca permitirá que ela seja sua por
inteiro. Ela sempre te dará a metade, não a mulher por completo.
E não disse mais nada, desligando a ligação na minha cara. E perante
a verdade das suas palavras só restou-me tragar em seco. As palavras da
minha mãe, sobre Adelle não se doar por inteiro, ressoavam e intensificavam
ainda mais minha dor de cabeça. Meu ego sofrendo um grande baque. Eu
sabia que Adelle me desejava, que ela me queria tanto quanto eu a queria,
porém isso não mais me bastava. Quando foi que o homem dentro de mim
passou a desejar a mulher por inteiro? Que ela gostasse de mim? Que me
amasse? Eu não sabia, e o turbilhão de coisas que passaram pela minha
mente, principalmente a culpa que sentia por a ter comprado, por ter escrito o
maldito contrato em um momento de raiva e decepção, não me deixavam
pensar com coerência.

Sem saber ao certo o que estava fazendo, peguei a cópia do


documento, que tinha guardado na minha gaveta no escritório que mantinha
em casa, e o li várias vezes, sem acreditar que eu tinha sido capaz de redigir
tal coisa, percebendo a crueldade de cada palavra escrita. Sentindo-me ainda
pior por saber que ela estava vulnerável e não tinha outra opção.

Sim, aquelas cláusulas tinham sido a minha maior felicidade, mas


provaram que poderiam se tornar um verdadeiro inferno. A minha ruína.
Capítulo Trinta e nove

Na noite passada, eu pude ver nos olhos azuis de Andrea que algo
estava errado, mesmo que ele tenha me dito que não havia acontecido nada,
que estava apenas com um pouco dor de cabeça e que logo passaria. Mas
senti através do seu beijo, na forma como ele me tocava e no modo como ele
fez amor comigo, demandando minha resposta como se precisasse dela mais
do que qualquer outra coisa, que algo o incomodava. Teve algo de
animalesco, uma raiva contida de si mesmo.

Enquanto caminhava pelo Central Park de mãos dadas com meu


irmãozinho, já que o médico na semana passada tinha dito que pequenas
caminhadas fariam bem para ele, foi inevitável não refletir sobre os
significados dessa fúria e muito menos conter o tremor que percorreu o meu
corpo, mesmo que essa sensação não pudesse ser justificada. Nada conseguiu
abrandar o medo que crescia dentro de mim em perder tudo aquilo que estava
vivendo ao lado de Andrea. Mesmo que aos poucos tinha voltado ao trabalho
em home office, nós dois praticamente tínhamos formado uma rotina, que
incluía fazer todas as refeições juntas, ajudar William com os exercícios que
buscávamos na escola, para que ele não ficasse tão prejudicado, ver filmes ou
brincar, e o melhor de tudo para mim, depois de fazermos amor, dormir em
seus braços, induzida pelo bater ritmado do seu coração.

Sei que ele não tinha me prometido sentimentos, o contrato deixava


isso bastante explícito, mas Andrea me fazia sentir amada, adorada,
protegida. E eu aprendi a amá-lo pouco a pouco, mesmo que tivesse tentado
de tudo para não o fazer. Mas tudo naquele homem, seus gestos e sua
atenção, me induzia a apaixonar-me. Era platônico e eu sofria por isso, mas,
ao mesmo tempo, me contentava em ter sua gentileza, carinho, e em ter o
amante dedicado em me satisfazer, pois era bem mais do que poderia esperar.
Patético da minha parte, mas me era inevitável. Não, não queria perder isso.
Suspirei fundo, observando os turistas parando para tirarem fotos de
diferentes pontos do parque, enquanto tomava a alameda que levava à entrada
próxima ao apartamento de Andrea, constatando que William já tinha se
exercitado bastante por hoje.

— Olha, Del. — Apontou para uns carrinhos de lanche.


— Hm?

— Cachorro-quente. Vamu comê um, Del?

Começou a me puxar em direção a um dos vendedores e eu o deixei


ir. Desde a operação, eu estava tomando um cuidado excessivo com a
alimentação de William, pois o médico disse que era de suma importância
para sua recuperação. Eu sabia que não deveria ceder, mas como estava
praticamente curado, não vi nenhum mal em dividir um com ele, desde que
não tivesse os tradicionais condimentos, afinal, ele era uma criança como
qualquer outra. Depois de pagar pela comida, sentamos em um banco verde
próximo da carrocinha e dividimos o lanche, comigo tentando puxar assunto
com a criança que parecia se lambuzar ao comer a salsicha aferventada, o
prazer brilhando em seus olhinhos verdes.

— Gostoso, meu amor? — Tirei um cacho do cabelo dele que caía


sobre os olhos e ele me fitou, enquanto eu dava uma mordida no meu pedaço.

— Ahãm. — Balançou a cabeça, contente. — Queria comê um tantão


deles.

Deu uma risada gostosa, me fazendo sorrir. Era muito bom saber que
a gente poderia proporcionar tal felicidade a uma criança com uma coisa tão
banal.

— Adoro cachorro-quente.

— Sei que sim, pequeno. — Soltei um suspiro ao dar outra


abocanhada. — Realmente está muito gostoso. — Menti, pois a cada mordida
que dava, mais meu estômago parecia embrulhar, a sensação ruim não me
deixava.

— Quero mais um — Will pareceu animado ao dizer.

— Não — comentei suavemente e fiz ele fazer um biquinho,


emburrado.

— Ah, Del.

— Não podemos abusar, querido. Mas te prometo que qualquer dia


desses vou comprar para você todos os cachorros-quentes do mundo.

— Eeeee. — Soltou um gritinho e se concentrou em comer o resto do


seu lanche, obrigando-me a fazer o mesmo.

***

Era um pouco mais de quatro da tarde quando enfiei a chave que


Andrea tinha me dado na porta, e adentrei o hall imenso com um William
mais calmo em meu colo. O apartamento estava silencioso e o meu amado
não veio me receber, já que estaria em uma reunião importante com os
acionistas da empresa matriz, e não poderia perdê-la porque discutiriam
alguns investimentos a serem feitos. Mas, diferentemente das outras vezes, a
quietude da casa pareceu oprimir meu peito, o sentimento de angústia quando
estava caminhando no parque se intensificando ainda mais.

Deixando o menino no chão e minha bolsa em cima do aparador, vi


Will caminhar pelo corredor em direção ao seu quarto, provavelmente para
brincar com a pilha de brinquedos que parecia aumentar exponencialmente a
cada dia que passava. Tinha conversado seriamente com Andrea sobre ficar
mimando Will dessa forma, que a criança não precisava de tantas coisas, mas
o homem parecia não me escutar, sempre comprando um carrinho, um
boneco ou outros brinquedos mirabolantes que deveriam custar os olhos da
cara. Tentando ignorar a inquietação que me tomava, suspirei fundo e
caminhei até a suíte que compartilhava com Andrea, que parecia ter sido
tirada dos meus sonhos, louca para remover o tênis que machucava o meu
calcanhar.

Porém, assim que transpus o cômodo, eu paralisei e um frio me


penetrou, indo dos pés à cabeça. Havia uns papéis rasgados e me abaixei para
ver o que era. Congelei quando confirmei o que instintivamente já sabia do
que se travava. Rasgado em pedaços e embolado, jogado aos pés da cama,
estava o nosso contrato. Me abracei, contemplando a cena. Não sei por
quanto tempo fiquei ali paralisada, só sei que meu rosto estava
completamente molhado pelas lágrimas e meu coração batia tão apertado, que
demorei a compreender o real significado daqueles pedaços de papéis.

Era o fim!

Andrea estava terminando o nosso acordo, e com isso todo o sonho


que estava vivendo ao seu lado. Pensei que estaria preparada para esse
momento, mas não estava. Sabia que um dia ele colocaria um ponto final em
tudo, mas não esperava que pudesse ser tão cedo e que fosse dessa maneira,
sem conversa, sem nada, apenas frieza, o que me doeu ainda mais, me
fazendo questionar que, durante esse tempo todo em que ele foi gentil e
amoroso, era apenas uma mentira.

Tinha sido tola em acreditar que eu era única e especial para ele, e
ainda mais idiota por amar o homem que tinha me comprado e que tinha
deixado claro que queria apenas o meu corpo. Nada mais.

Quanto mais os segurava os papéis picados que significavam o fim,


mais eu sentia o desespero tomar conta de mim, e antes de me dar conta do
que estava fazendo, peguei minha mala e comecei a colocar algumas peças de
roupa dentro dela, sem me importar como. Ele não me queria mais em sua
vida, então eu faria o favor de deixar a sua casa sem implorar, apenas deixaria
uma nota pedindo minha demissão. Não suportaria trabalhar e estar tão perto
do homem que eu aprendi a amar com todo o meu ser depois disso, pois não
conseguiria me manter imune a ele. E hoje, eu precisava desesperadamente
ficar longe dele para juntar novamente os cacos do meu coração partido, além
de consolar uma criança que claramente tinha se apegado a ele.

Pensar no carinho que meu irmão nutriu por ele e o sofrimento que
iria passar por não ter mais o homem amoroso que agia como um irmão mais
velho, amigo e às vezes fazia o papel de pai, fez com que mais lágrimas
deslizassem pela minha face e me sentisse ainda pior. Deveria o ter evitado,
mas nada fiz, apenas me deixei levar pelas minhas ilusões tolas. Caminhei até
o banheiro colocando alguns objetos pessoais em uma frasqueira, deixando o
maldito hidratante que eu acreditava nunca mais conseguir usar, e arrastei
minhas coisas até o corredor, deixando-a no meio do caminho enquanto
entrava no quarto de William.

— Del? — O menininho levantou a cabeça e olhou na minha direção,


seu rostinho antes sereno se transformando em angústia, e me odiei ainda
mais por isso. — Por que tá chorando, Del?

— Oh, meu amor — coloquei-me sob os calcanhares e Will, que


começou a chorar alto, com medo, veio me abraçar —, desculpe-me por fazer
isso com você.

— O que foi? Tô com medo.

— Precisamos ir embora, querido. Eu e Andrea não estamos mais


juntos.

— Mas por quê? — Seu choro ficou mais convulsivo. — Ele não
gosta mais de mim? É por isso?

— Não, meu amor, não tem nada a ver com você. Só não damos mais
certo — tentei soar firme e não deixar transparecer o quanto doía em mim
nosso relacionamento ter acabado. Mas teria que lidar com a minha dor de
outra forma, já tinha desesperado o pequeno demais. — E isso não significa
que ele não goste de você.

— Hm… — Continuou chorando e eu tentei falar palavras de


conforto até que ele pareceu mais calmo, embora uma certa tensão ainda
tomasse seu rostinho.

— Vamos arrumar suas coisas? — tentei soar positiva enquanto me


erguia e me aproximava da mochila dele, colocando algumas peças de roupa,
embora me sentisse dilacerada por dentro.

— Quero levar meus brinquedos, Del.

— Hm.. Não vejo por que não, já que ele te deu. Escolha os que mais
gostar, querido. — Não seria hipócrita em negar tal coisa ao pequeno, acharia
muita infantilidade da minha parte não o deixar levar seus presentes só
porque meu caso com Andrea tinha terminado. Não ganharia nada com
aquilo.

— O videogame também?

— Sim, meu amor.

— Oba. — Sua voz não era um poço de animação, mas com o tempo,
eu torcia para que nós dois conseguíssemos superar a ausência de Andrea nas
nossas vidas. Talvez para o pequeno seja mais fácil, mas para mim, eu tinha
certeza que duraria muitos dias e noites, de pura solidão. Eu estava
completamente perdida.

— Pronto? — perguntei minutos depois, minha voz completamente


embargada. Consciente de que daqui a poucos minutos eu deixaria de vez
aquela casa, a vida de Andrea.

O menininho apenas assentiu e eu soltei um suspiro conformado.

— Nós vamos para casa, Del?

Parei para pensar por alguns minutos. Não havia um motivo grande
para não voltar para o meu apartamento, sabia que Andrea não me procuraria,
mas, no fundo, no fundo, não estava preparada para ouvir um eu te disse da
Ashley. Neste momento, não precisava de ninguém me dizendo o quanto eu
tinha sido tola e que homens ricos só usavam mulheres como eu. Estava
ferida demais, e eu já me culpava o suficiente. Por mais boa vontade que Ash
tivesse, não queria julgamentos e nem nada do tipo.

— Que tal passarmos uns dias em Gloversville, a cidade onde a vovó


nasceu? — sugeri.

O menininho deu um sorriso contente, provavelmente esperando que


eu o levasse ao Adirondack Animal Land, para ver as girafas, lemonis e
alpacas, como prometi algumas vezes. De fato, seria um bom passeio a se
fazer, mas passaria em outro médico para que desse o aval, já que teríamos
que caminhar bastante pelo local.

— Veremos — respondi, antecipando sua pergunta, e ele assentiu em


concordância, enquanto deixávamos o apartamento de Andrea, a angústia
tomando-me por completo.

Mas quando deixei a chave com o porteiro, tive que me conter ainda
mais para não desmoronar e cair em lágrimas. Tinha que ser forte, por Will e
por mim mesma.
Capítulo Quarenta

Cada minuto na reunião tinha sido um completo martírio e embora eu


tentasse prestar atenção nas pautas, eu só conseguia pensar no passo que eu
daria a seguir. Depois de muito pensar, as palavras da minha mãe sobre o
quanto eu agi mal com a mulher que eu mais respeitava e admirava,
comprando-a e estabelecendo minha posse por meio de um contrato, decidi
que só tinha uma coisa a ser feita: acabar de vez com o nosso acordo e pedi-la
em namoro, torcendo para que ela me aceitasse. Mas ao mesmo tempo que eu
me sentia eufórico como nunca, um medo descomunal de ser tarde demais
oprimia meu coração. O fato de não ter certeza de que ela queria ser minha
sem nenhuma barreira e imposição, por não saber se ela poderia nutrir amor
por mim da mesma maneira que eu a amava, me deixou suando de
nervosismo, como se fosse um adolescente, afinal era a primeira vez que eu
teria um relacionamento sério e me declararia.

Sim, eu amava aquela mulher e tinha sido um completo tolo por não
ter enxergado isso antes, precisando da minha mãe jogar a verdade na minha
cara para que eu percebesse que há muito tempo estava apaixonado pela
inteligência, pelo sorriso, pela mulher que Adelle era. Eu não a tinha ajudado
por ter sentido culpa pelo meu ato, mas simplesmente por amá-la tanto que
não queria vê-la sofrendo, compartilhando com ela o peso que carregava em
seus ombros. Queria ser o seu homem não só como amante, mas como seu
companheiro, seu protetor, seu confidente. Que fôssemos um casal de
verdade, compartilhando todos os aspectos da vida, bons e ruins, como os
meus pais.

Furioso comigo mesmo por ter demorado a perceber isso, e com medo
da rejeição, embora uma parte de mim alimentasse a esperança de que
ficaríamos bem, pois a entrega dela a mim tinha sido de corpo e alma, peguei
o contrato que eu tinha visto que estava na mala dela e, junto com a minha
cópia, os rasguei, sentindo um alívio me tomar por saber que isso não estaria
mais entre a gente. Pena que eu tinha essa maldita reunião torturante, que
tinha se prolongado por mais tempo do que eu poderia imaginar. Eu queria
ter ficado no meu apartamento esperando por ela, e assim que chegasse do
passeio no parque, tomá-la em meus braços e dizer de uma vez como eu me
sentia, me declarar, dizendo que a amava e que, se ela me aceitasse e me
correspondesse, que eu queria passar por cada passo com ela.

Pelo menos a ida ao meu compromisso de negócios tinha resultado


em algo útil e acabei passando em uma joalheria ao me recordar do anel que
meu pai deu a minha mãe quando a pediu para renovar os votos. Embora
Adelle fosse uma mulher simples, assim que meus olhos pousaram no aro
com uma esmeralda de tamanho discreto, em um tom mais claro das que
eram populares, os olhos verdes intensos dela vieram à minha mente e eu
soube que não existia peça mais perfeita para ocasião, pois como a mulher, a
pedra era única.

Sentindo meu coração ribombar no peito, minhas mãos suando frio e


o peso da caixinha com o anel no bolso da minha calça, inseri a chave na
porta do meu apartamento e adentrei na minha casa, sendo recepcionado por
um estranho silêncio que me deixou momentaneamente em alerta, fazendo
com que um calafrio percorresse a minha espinha. Naquela hora da tarde,
Adelle e Will sempre costumavam estar na sala, vendo filmes, brincando ou
fazendo as tarefas escolares e não os ver ali era estranho. Mas procurei me
acalmar, talvez eles estivessem no quarto do pequeno.

— Tesoro? — gritei por ela, fechando a porta atrás de mim e comecei


a caminhar com passos rápidos pelo hall e corredores sentindo que, a cada
segundo sem a resposta dela, uma angústia desconhecida crescia dentro de
mim. — Amore[37]?

Coloquei a cabeça na soleira, mas encontrei o cômodo vazio,


aumentando ainda mais minha aflição. Será que eles ainda estavam
caminhando no Central Park? Era uma possibilidade, embora algo dentro do
meu peito me dizia que não era o caso, ainda mais ao ver que parecia ter
muito menos brinquedos no cantinho que tinha construído para William.

Sentindo uma dor desconhecida e um pressentimento ruim, me


direcionei até a suíte que dividia com a Adelle, não encontrando-a ali, e meu
coração deu um baque quando constatei a ausência da mala que ficava em um
canto, a realidade do que poderia ter acontecido agindo como se fosse ferro
em brasa sobre o mim, uma dor no meu coração me dilacerando. O ar faltava
em meus pulmões, e ali eu soube o que era a agonia da solidão, pois eu estava
vazio, desprovido de tudo. Adentrei o banheiro somente para constatar que
boa parte dos itens pessoais de Adelle não estavam mais lá, restando apenas o
frasco do hidratante de chocolate que ela usava. Percebi que uma lágrima
silenciosa caía pelo meu rosto, seguida de várias outras que não tive forças
para contê-las, muito menos me importei se molhassem a minha roupa.

O que eu tinha feito, mio Dio? Ela tinha ido embora sem ao menos dar
uma chance para que eu fizesse a coisa certa, para dizer a intensidade do
amor que sentia por ela, que queria ela para sempre em minha vida. Era tarde
demais para nós? Foi o que pareceu, e uma dor ainda maior se apossou de
mim, cortando-me por dentro.

Diziam que o amor doía, mas nunca poderia imaginar que seria dessa
maneira. Senti um amargor na boca, e me odiei ainda mais por não ter ficado,
por ter rasgado o maldito contrato antes de conversar com Adelle. Ela poderia
não ter aceitado o meu pedido, mas pelo menos eu teria tido a chance de
tentar argumentar.

Trêmulo, peguei meu celular que tinha guardado no mesmo bolso da


calça que o anel, e destravando-o, disquei o número dela várias vezes, mas
todas ou caíam na caixa postal ou ela desligava, aumentando ainda mais o
meu desespero. Completamente perdido e cego por claramente ser rejeitado,
voltei para o quarto, sentando na cama em que várias vezes fizemos amor,
onde nos entregamos um ao outro, e levei minha mão ao rosto, sentindo meus
dedos úmidos pelas minhas lágrimas, deixando-me levar pela sensação de
impotência e dor, que eram avassaladores. Não sei quanto tempo fiquei
sofrendo, alheio a tudo, até que contemplei uma folha dobrada em cima de
uma cômoda e erguendo-me, peguei o papel. Quando o abri, reconheci a
caligrafia redonda e feminina da mulher que amo.

Meu querido,

Por mais que me doa, escrevo essa carta com o meu pedido de
demissão. Depois encaminharei meus documentos ao departamento de
recursos humanos.

Quando eu assinei aquele contrato, eu sabia que nossa relação tinha


um prazo de validade, mas o que não esperava era que eu fosse quebrar a
principal cláusula por você estipulada: eu me apaixonei, mesmo lutando
contra esse sentimento. Eu não o culpo por colocar um fim em tudo, se
alguém tem culpa, essa sou eu, por nutrir sentimentos por você.

Tentei de todas as formas ficar imune, não me deixar envolver, mas


foi impossível não amar o homem gentil, apaixonado, carinhoso que você se
mostrou para mim durante o tempo que estivemos juntos. Não sabia que você
poderia ser um homem tão doce.

Nos seus braços, mesmo sabendo que não era sua intenção, eu me
senti amada, quista, única. Senti que você foi o meu companheiro, meu
amigo, meu amante. Nunca foi apenas sexo para mim, era mais do que você
poderia imaginar, e todas as vezes eu me entreguei de corpo e alma para
você porque eu te amo.

E é com lágrimas nos olhos que digo que não posso mais trabalhar
para você, pois não aguentaria a dor de saber que nunca mais me sentirei a
mulher amada que você me fazia sentir.

Eu te amo, Andrea Della Torre.

Ps: Obrigada por me fazer sentir que era a mulher mais especial do
mundo, mesmo que inconscientemente.

Molhei o papel ao ler e reler a carta diversas vezes, sentindo-me


completamente quebrado quando suas palavras se infiltravam mais e mais
dentro do meu peito. Ela me amava e tinha ido embora ao pensar que eu não
poderia retribuir os seus sentimentos, não podendo conviver com a dor de
saber que era platônico. Isso me entristecia ainda mais. Só agora vi os papeis
amassados perto da cama. A culpa por rasgar o contrato sem dar a ela alguma
explicação me tomava. Deveria ter conversado com ela primeiro, não agir
como um estúpido deixando os contratos rasgados espalhados pelo chão.
Claro que ela poderia pensar que eu estava colocando um fim em tudo, ainda
mais que não tinha prometido nada além de sexo. A cláusula que eu mesmo
redigi deixava isso bastante claro: nada de sentimentos. Tinha agido como
um grande tolo e a fúria de mim mesmo me dominou.

Coglione di merda[38].

Limpando as lágrimas, obriguei-me a reagir. Com largos passos, fui


em direção a porta que levava a saída do meu apartamento. Eu amava aquela
mulher com todo o meu ser e ela me correspondia. E se precisasse, eu iria
rastejar aos seus pés para provar isso a ela. Um mal-entendido não iria nos
separar.
Capítulo Quarenta e um

Dois dias se passaram desde que tinha tomado a decisão de ir embora


e fugir para uma cidadezinha a vinte cinco milhas de Nova York. Duas noites
completamente insones, em que as lágrimas tinham sido minhas
companheiras. A dor da desilusão, temperada com um sentimento que não
sabia definir, mas que era causada pela ausência de Andrea. Vi o registro de
algumas ligações dele e de Ashley, que não retornei. Não poderia imaginar
que o homem que amava fosse tão cruel ao ponto de me ligar depois da forma
com que ele terminou o nosso relacionamento, e a cada ligação tive que
reunir uma coragem descomunal para não atender, não cedendo aos apelos do
meu coração, que queria ouvir novamente a sua voz, seu sotaque italiano.
Tinha certeza que se eu o fizesse, sofreria ainda mais; deveria tentar cortar o
mal pela raiz, embora Andrea parecesse enraizado dentro do meu peito.

Suspirei fundo enquanto tomava um gole de café na cozinha pequena


da casa que eu havia alugado por quinze dias, olhando a paisagem cinzenta.
O sol ainda não tinha nascido por completo e várias nuvens prometiam um
clima nublado, melancólico, tempo que combinava bem com meu estado de
ânimo, embora eu tentasse esconder minha tristeza dos olhos atentos de
William. Sem muito sucesso.

Bebendo um gole da bebida que apreciava, mas que me parecia


completamente sem sabor, tive a impressão de que alguém tinha batido na
porta. Ignorei, pensando que poderia ser impressão, mas quando ouvi
novamente o barulho, levantei-me com o cenho franzido, me perguntando
quem poderia ser aquele horário. Hesitante, pousei a caneca sobre a mesa e
caminhei lentamente até a porta, pensando se deveria abrir ou não. Mas
quando a pessoa voltou a bater, girei a chave na fechadura e a abri
parcialmente, ficando em choque ao ver o homem alto, de cabelos negros
revoltos, sua barba por fazer e seus olhos azuis, antes tão brilhantes, opacos,
vermelhos, com grandes olheiras sob suas pálpebras.

— Andrea. — Dei um passo para trás e uma pontada de dor surgiu no


meu peito. Não esperava vê-lo ali, e muito menos parecendo tão devastado.

— Tesoro — sussurrou com a voz tão baixa e rouca, que quase não o
ouvi.

— O que você está fazendo aqui? — Forcei-me a perguntar e tive que


conter a lágrima que queria escapar dos meus olhos.

— Eu precisava te ver… — Passou as mãos pelos cabelos, parecendo


nervoso, e deu um passo para frente. — Você não sabe o que senti quando
você me deixou, mio amore. A dor que senti…

Engoli em seco, suas palavras me soando como se fosse fruto da


minha imaginação. Deveria ser a minha mente pregando peças.

— Andrea, eu…

— Pensei que você tinha voltado para casa e quando não te encontrei,
eu pensei que ficaria ainda mais despedaçado. — Fez uma pausa e continuou:
— Dio, Adelle, esperei você por horas na frente da sua porta, fui até a Ashley
e não a encontrei lá, eu endoideci. E a cada minuto que passava sem que os
detetives particulares que contratei tivessem notícias suas, parecia um
verdadeiro inferno.

Deu um passo para frente e seus braços me envolveram com força.


Deixei-me abraçar, sentindo-me em um sonho etéreo.

— Nunca mais me deixe, tesoro, por favor. — Segurou o meu rosto e


se inclinou em minha direção, seus lábios quase tocando aos meus. Pude ver
quando uma lágrima escorreu pelo seu olho, demonstrando a sinceridade com
a qual ele falava: — Me ame como eu te amo, mia vita[39].

Sem esperar resposta, diminuiu o espaço que existia entre a gente e


me beijou com tanto carinho que eu retribuí. Diferente de todos os outros que
tínhamos trocado, esse era repleto de sentimento, amor. Podia sentir isso no
modo como seus lábios deslizavam suavemente pelos meus, sua língua
envolvendo a minha em uma dança lenta e deliciosa. Enredando meus dedos
em seu cabelo, aprofundei o contato e aumentei o ritmo em que nos
movimentávamos, nos fazendo gemer, a saudade que eu sentia do seu gosto
fazendo-me querer muito mais.

— Eu te amo, Adelle — repetiu quando nos afastamos um do outro,


embora nossas testas ainda estivessem apoiadas uma na outra. Sua mão
quente acariciava meu rosto, fazendo-me estremecer.

— Quando vi os contratos rasgados, pensei que você não me queria


mais — confessei e vi um brilho de dor cruzar suas feições. — Que era o
fim…

— Foi um mal-entendido, apenas. Eu queria fazer a coisa certa,


Adelle. Desejava que você fosse minha porque me amava, não por
obrigação...

— Hum…

— Não queria que o contrato fosse uma sombra constante em nossa


relação. Eu preciso de você por inteiro, tesoro. De corpo e alma, da mesma
maneira que eu me darei a você. Te entrego aqui e agora o meu coração, todo
o meu amor.

— Andrea — arfei, uma lágrima escorrendo pelo meu rosto. Nunca


pensei que aquele homem poderia me amar daquela forma, tudo nele me
indicando que não eram palavras vazias. Sem saber, ele me fazia a mulher
mais feliz do mundo.

— Seja minha, tesoro — pediu com a voz rouca, um medo bobo se


fazendo evidente.

— Eu sempre fui sua, Andrea, pois eu amo você.

Colei minha boca novamente na sua e selei nossos sentimentos com


um beijo urgente, fazendo com que ele segurasse minha nuca e controlasse os
nossos movimentos, sem deixar de me devorar, exigindo minha entrega. E eu
a dei, sem ressalvas, sentindo-me completamente nas nuvens nos braços do
homem que me amava.

— Comprei algo para você. — Levou a mão ao bolso da calça,


pegando uma caixinha de veludo preto e a abriu, revelando um anel delicado
de ouro branco com uma pedra verde no centro e diamantes nas laterais. —
Quer namorar comigo? Quero todas as etapas com você.

— Não há nada no mundo que eu queira mais…

Sorrindo um para o outro, Andrea deu um selinho em meus lábios e,


tomando minha mão, colocou o anel no meu dedo anelar direito e beijou a
pedra.

— É lindo…

— Me lembra a cor dos seus olhos, tesoro. Mas você é muito mais
bella.

— Obrigada…

— E não vejo a hora de poder te ter de novo.

— Não precisamos esperar, sabia — sussurrei na sua orelha, e


mordisquei o lóbulo, fazendo-o tremer. — A casa tem dois quartos e a
acústica é boa.
— Já disse que te amo? — perguntou, brincalhão.

— Prove. — Provoquei-o e Andrea me pegou no colo de súbito, e tive


que conter o gritinho enquanto eu sentia seus braços fortes me segurando. O
guiei até o quarto que ficava distante do que Will se encontrava e nos
amamos, sem reservas.
Capítulo Quarenta e dois

— Confesso que me soa tentador iniciarmos já a construção de casas


populares por toda a Europa — Fernando Matiazzi ponderou.

Ainda me era surpreendente ver que o homem que nunca aparecia nas
reuniões, agora mostrava o seu rosto coberto por ferimentos nas conferências.
Diferente do que muitos poderiam pensar, ele não tinha uma expressão
severa, mas estranhamente feliz consigo mesmo. Provavelmente se devia ao
casamento e ao nascimento do filho. Acho que, meses atrás, eu pensaria que
ele era um tolo, mas depois que descobri os prazeres de amar e dividir uma
vida com alguém, não conseguia mais julgá-lo. Adelle tinha mudado não
apenas minha rotina, onde diminuí significativamente minha carga de
trabalho, mas minha percepção sobre várias coisas. E depois de ficar quase
dois dias sem notícias dela e de sentir na pele a dor da distância por conta de
um mal-entendido há duas semanas, percebi que não havia nada mais
importante do que ela.

Podia entender muito melhor como ele se sentia agora, afinal, eu, a
mulher que amo e o seu irmãozinho formávamos uma família. E, hoje, não
podia imaginar minha vida sem os pequenos momentos cotidianos com os
dois. Como um menino ansioso, mal podia esperar para levá-los mês que vem
para Itália para que os dois pudessem conhecer os meus pais. Minha mãe
pareceu me perdoar pela merda que eu tinha feito quando disse a ela que pedi
Adelle em namoro e que, futuramente, a tornaria minha esposa. Embora eu
tenha que admitir que ainda estava um pouco temeroso em reencontrá-la, por
mais que minha mãe parecesse exultante com a notícia. Dona Ana disse que
não poderia estar mais feliz em ouvir a mim confessando meus sentimentos
por uma mulher tão doce, inteligente e bem-humorada quanto sua nova nora.
Como mammina já tinha dito uma vez, Adelle era perfeita para mim.

Sorri como um bobo em meio a reunião ao pensar nas duas juntas,


confabulando e fofocando sobre tudo.

— Mas necessito de mais tempo para ler todos os relatórios que você
enviou, Pedro — continuou e obriguei-me a voltar minha atenção para a
reunião.

— Certo — o homem que eu não gostava pareceu irritado —, mas


tenho certeza que no final você chegará a conclusão de que só trará lucros,
nada mais. Com isso, só iremos atrasar mais o começo das obras que já estão
no gatilho para serem iniciadas.

Quando Fernando Matiazzi me chamou para participar desse


empreendimento formado por três pessoas que prometia grandes lucros,
confesso que me chamou bastante atenção pela rentabilidade. Porém hesitei
quando soube quem seria o terceiro homem. Sei que em partes isso se devia
por não ter gostado em nada de ter aquele idiota olhando para Adelle de
forma lasciva. Poderia soar como um babaca machista, mas ainda me
enervava pensar que o homem tocou Adelle e convidou-a para dançar com
segundas intenções. Nunca poderia imaginar que me tornaria um homem
possessivo e ciumento, mas eu me sentia assim em relação a Adelle. Mas
sabendo que ela não gostaria de saber que eu usaria isso como justificativa
para não ampliar meus rendimentos, decidi passar por cima do meu ego
masculino e concordei em entrar na parceria, mesmo que me desagradasse
olhar para ele.

— Pode até ser, mas é uma soma considerável para investir sem estar
cem por cento certo. Não me agrada perder dinheiro.

— Estou de acordo — intervi. — Ainda tenho algumas ressalvas. Te


encaminharei por e-mail o pedido de outros documentos e informações que
preciso antes de assinar o cheque.

— Certo. Assim que chegar de Pequim, envio tudo que precisar. —


Pareceu não gostar muito da ideia, mas deu um sorriso mesmo não estando
tão contente assim.
— Envie uma cópia para mim também — Fernando pediu e o tal de
Pedro Montenegro assentiu. Vi meu sócio levantar o pulso, olhando as horas
no relógio. — Já passa das nove e meia da noite aqui no Brasil e Miranda
deve estar me esperando para o jantar. Podemos encerrar a reunião?

— Claro — respondi —, acho que já dissemos tudo o que


precisávamos por enquanto.

— Jantar, até parece... — o tal de Pedro comentou com um sorriso


lascivo. — Com uma mulher como a sua, a última coisa que pensaria era em
comida. Mas pensando bem, ela é uma excelente sobremesa, principalmente
com aquela boca…

Arqueei a sobrancelha perante a audácia do homem e vi um brilho


perigoso cintilar nos olhos de Fernando. Era evidente que seu controle ficou
por um fio.

— É da minha mulher que você está falando. — Sua voz era fria,
cortante, mas o tolo pareceu ignorar e continuou a dizer um monte de merda:

— Estamos entre homens — deu de ombros —, não precisa negar que


está doido para se enterrar nela. Se fosse minha, eu não sairia de dentro dela
para nada.

— Filho da puta, desgraçado — bateu os punhos na mesa, porém o


idiota pareceu ignorar.

— Falando nisso, bem que você poderia me passar o telefone da sua


secretária gostosa, Andrea. Estarei em Nova York no final do mês e vai ser
ótimo trepar com ela.
Senti a fúria queimar em meu sangue quando ele mencionou Adelle,
reforçando suas intenções para com ela, e eu fiquei à beira de perder o
controle. Não toleraria aquilo.

— Tenho certeza que não irá querer nada com um idiota com você, é
inteligente demais para isso. Fora que ela já é comprometida… E…

— Coitado do corno — cortou-me, debochado, sua risada


aumentando ainda mais a minha raiva.

— Chega dessa merda — Fernando disse. — Amanhã marcarei uma


reunião com meus outros associados e pedirei seu afastamento, Pedro. Não
aceito que você fale da minha mulher dessa forma, e, na verdade, nem preciso
de você. Se livre dele, Andrea, não quero ter nada mais a ver com esse
homem. Não investirei em nada que esse bosta planeje, por mais lucrativo
que seja.

— Com o maior prazer… — Fernando Matiazzi assentiu e saiu da


reunião, provavelmente tão furioso quanto eu estava.

— Eu estava só brincando. — Vi o Montenegro engolir em seco.

Dei um sorriso diabólico e frio que deixou o homem ainda mais


apavorado.

— Nunca brinque com a mulher dos outros — falei com uma voz
baixa e aveludada. — Nenhum de nós viu graça nenhuma na sua
brincadeirinha. — Fiz uma pausa. — E eu não vou ser complacente com
você, pelo contrário, irá me pagar por isso. Quando se referiu a Adelle,
mexeu com a pessoa errada.
— Eu, eu… Ela é apenas sua secretária.

— Mesmo que fosse, não toleraria que você falasse assim de uma
funcionária minha. — Arreganhei meus dentes, deixando meu sorriso ainda
mais frio. — Mas você estava dizendo coisas infames sobre a futura senhora
Della Torre. E isso, mio caro, não deixarei barato. Vou querer sua cabeça em
uma bandeja.

— Me desculpe, não sabia.

— Eu não sou tão bonzinho assim, então se prepare, Montenegro.

Antes que ele pudesse dizer qualquer outra merda, fechei o aplicativo
por onde fazíamos as reuniões e, diferentemente do que eu achava, a fúria
cega que senti quando ele faltou com respeito com Adelle foi se
transformando em satisfação ao perceber que eu agora teria uma boa
justificativa para derrubar aquele porco. Não que de qualquer forma minha
amada ficasse sabendo de algo, claro. Mas nunca me pareceu tão satisfatório
a perspectiva de perder milhões só para foder com aquele cara.

Levantando-me, removi o paletó e a gravata que usava, abrindo


alguns botões da minha camisa social e caminhei pelo meu escritório até um
aparador, me servindo uma dose de whisky. Bebi tudo em um gole só,
sentindo a bebida descer queimando pela minha garganta. Fiquei olhando o
fundo do copo vazio por alguns minutos, pousando-o logo a seguir, voltando
para a minha mesa. Tinha alguns relatórios para ler ainda hoje, além de
outros trabalhos para fazer, e isso incluía começar a mexer os meus
pauzinhos contra o Montenegro.
Capítulo Quarenta e três

Estava com meus olhos fixos na tela do computador, terminando de


encaminhar um e-mail para uma das minhas filiais, pedindo um relatório mais
completo da campanha de marketing de um dos nossos clientes, quando ouvi
um leve bater na porta.

— Entre — disse suavemente ao constatar que já passava das dez e,


envolvido com os relatórios, nem tinha me atentado nas horas.

Ouvi o barulho da porta sendo aberta e, pouco depois, o clique suave


da chave girando na fechadura, o que fez com que eu desviasse os olhos do
notebook e fitasse a mulher que usava um robe de seda verde curto, que me
deixava ver suas pernas deliciosas.

— Precisa de algo, tesoro? — Meu olhar percorreu-a de cima a baixo,


do sapato de bico fino vermelho até os seus cabelos soltos, fazendo minha
boca ficar seca. Foi impossível não conter a onda de excitação que me tomou
só de vê-la. Adelle despertava um fogo em mim apenas por existir, tornando-
me cada vez mais o seu cativo. — William já foi dormir?

— Sim — disse com uma voz suave, ao dar alguns passos até parar
sob a luz de um lustre —, está tarde e você já trabalhou demais.

Antes que eu dissesse qualquer coisa, Adelle levou a mão ao laço que
prendia o robe e o abriu, deixando à mostra a camisola preta transparente e
diáfana, que não deixava nada para imaginação, com uma calcinha tão
pequena do mesmo tecido, que, sob a luz da luminária, deixava ver os pelos
do seu sexo. Enquanto observava-a novamente de cima a baixo, mexendo-me
desconfortável na cadeira ao sentir uma ereção se formando no meio das
minhas pernas, ela caminhou com um sorriso provocante até a minha mesa,
contornou-a, e girou minha cadeira na sua direção.

— Gosta do que vê, senhor Della Torre? — sussurrou na minha


orelha, ao se inclinar. Sua respiração quente arrepiando os pelos da minha
nuca. Tomou o lóbulo entre os seus dentes, puxando-o suavemente, fazendo
um gemido rouco escapar pelos meus lábios.

— Deliciosa, senhorita Beckett. — Estendi minhas mãos e


gentilmente removi o robe, desfrutando da sensação de deslizar lentamente a
peça pelos seus ombros, sentindo pele contra a pele. — Incrível,
surpreendente, maravilhosa…

— Hm…

Seus lábios deslizaram da minha orelha para a minha bochecha,


continuando o seu caminho até encontrar a minha boca, beijando a minha
comissura em um gesto provocante e sensual enquanto uma mão encontrava a
braguilha da minha calça estufada, brincando com meu volume, abrindo o
botão da calça e deslizando o zíper.

— Tesoro…

Segurando seu rosto, aproveitei a proximidade das nossas bocas e a


beijei, movendo meus lábios sobre os seus, pedindo passagem com a língua
quando ela emitiu um suspiro de satisfação. Aumentava ainda mais o meu
prazer saber que era eu que proporcionava tal júbilo. Embriagado pelo sabor
e suavidade de Adelle, abaixei minhas mãos até sua bunda redonda, sentindo-
a nua sob meu tato, e trouxe-a para o meu colo, encaixando nossas pélvis. A
movimentei suavemente, fazendo com que seu sexo protegido apenas pelo
fino tecido roçasse na ereção dentro da cueca.

— Andrea. — Gemeu meu nome contra os meus lábios e esfregou-se


contra mim, provavelmente apreciando o estímulo que, mesmo vestidos,
provocávamos um no outro.

Soltei um grunhido quando, ainda agarrando-a, a fiz se movimentar


novamente, torturando nós dois.

— Não foi assim que planejei a noite — continuou com a voz rouca e
agarrou meus ombros.
— Hum… E o que você queria fazer, tesoro? — obriguei-me a
perguntar, mesmo que o fio de racionalidade que mantinha estava quase
desfeito em meio ao nosso contato.

— Te dar prazer no seu escritório, realizando minha fantasia —


sussurrou a última frase tão baixinho, parecendo envergonhada em admitir.

— Será um deleite para mim satisfazê-la, tesoro — dei um beijo


suave em seus lábios —, já que também faz parte da minha. Não é com vista
de Wall Street, mas aqui me parece suficiente.

— Não sabia que você também fantasiava com isso. — Abriu os


botões da minha camisa enquanto tentava se manter quieta no meu colo.

— Era impossível não imaginar deixá-la completamente nua e de


tomá-la em cima da minha mesa… — Minha voz era rouca de desejo.

— Pena que iremos deixá-la para depois… — comentou, travessa. —


Mas teremos tempo para realizar nossa fantasia.

— De fato, tesoro.

Não falei mais nada, apenas desfrutei da sensação que sua boca
quente e úmida provocava em minha pele. Foi deslizando lentamente pelo
meu queixo, pela lateral da minha garganta, mordiscando o local onde podia
sentir minha pulsação. Se curvou para passar a língua pelo meu tórax
enquanto suas unhas percorriam meu abdômen nu, subindo e descendo,
deixando-me cada vez mais tenso, mas sem me tocar onde eu desejava.
Quando me arqueei involuntariamente contra ela, Adelle se levantou,
arrancando de mim um gemido de protesto que morreu quando a olhei, vendo
os bicos rígidos dos seus seios, bem como a umidade que se formou na sua
calcinha, revelando-me o estado da sua excitação. Aquela mulher seria minha
completa perdição.

Jogando os cabelos para trás, deu um sorriso satisfeito, sabendo o que


causava em mim, e aproximou-se novamente. Com seus olhos brilhando de
desejo, passou uma perna entre as minhas e instintivamente as abri, apenas
para assistir a mulher provocante ficar de joelhos no meio delas. Observar os
seios arfantes sob o tecido transparente preto era mais delicioso do que
poderia imaginar.

Erguendo-me um pouco da cadeira, a ajudei a abaixar minha calça e


cueca, e esperei ansiosamente por aquilo que ela iria fazer. Ela estava muito
mais experiente. Prendendo-me com seus olhos, que brilhavam e eram mais
lindos do que a esmeralda no seu dedo, rodeou-me com uma mão e começou
a deslizar seus dedos por toda extensão do meu pênis, com tanta suavidade,
que eu chiei com a carícia que nada me aliviava, pelo contrário, apenas me
deixava mais rígido.

Com uma ousadia que não imaginava ser possível, levou a ponta do
indicador até a minha glande e a pressionou, traçando círculos lentos, até que
um líquido saísse pela fenda, apenas para levar seu dedo à boca, provando-
me, enquanto com a outra mão continuava a me masturbar, aumentando e
diminuindo o ritmo e a pressão que exercia na minha carne.

— Gostoso — comentou com um tom que achei tão sexy, que foi
inevitável não gemer.

— Adelle... — soltei seu nome, jogando minha cabeça para trás


quando sua boca quente envolveu a ponta do meu pênis e ela começou a
sugar suavemente, aumentando de intensidade quando meus gemidos ficaram
mais intensos à medida que ela construía meu orgasmo.

Gostando das sensações que provocava em mim, tomou-me mais


fundo, deslizando-me pelo seu interior, chupando, sugando, ora com
intensidade, ora com um ritmo lento que me obrigava a mover minha pélvis
contra a sua boca, implorando por mais, porém, para meu desespero, ela
voltava a lamber e sugar a minha extremidade, provando o líquido que saia
do meu pré-gozo. Sentir sua língua, seus dentes raspando pela minha
extensão e sua boca envolvendo-me, era como estar no paraíso, e quando ela
começou a diminuir o ritmo novamente, segurei seus cabelos e a ajudei a se
movimentar, ditando a cadência que eu queria que ela aplicasse, estando bem
perto do orgasmo.

Como boa aprendiz, ela entendeu meu pedido e deslizou-me mais


fundo, seu ritmo ficando mais acelerado. Seus olhos, nublados por uma
paixão desenfreada, e a camisola transparente, que me deixava ver todo o seu
corpo que reagia ao me dar prazer, me levavam muito mais além do que eu
poderia imaginar.

— Schianto… — grunhi, preso na espiral de desejo por ela


proporcionada.

Acariciando seus cabelos, deixei que ela comandasse os movimentos,


até que, sem mais nenhum controle sobre o meu próprio corpo, arquei-me
contra ela algumas vezes, e sentindo meu corpo completamente trêmulo, me
esvaí dentro da sua boca, algo que não tinha planejado. Adelle engoliu todo o
meu líquido e, quando se deu por satisfeita, ergueu-se nos seus saltos,
lambendo seus lábios como se tivesse provado uma iguaria.

Sabendo que tinha toda a minha atenção para si, removeu a pequena
calcinha lentamente, jogando-a depois em minha direção. Mesmo trêmulo e
sob os efeitos que ela tinha me proporcionado, peguei a peça e a levei ao meu
nariz, aspirando o cheiro almiscarado da excitação da minha mulher. Senti-lo,
fez com que meu pênis começasse a voltar a vida. Aquela mulher me deixava
completamente insano.

— Acho que podemos tentar a mesa, a ideia me soou completamente


tentadora — disse, me dando um beijo longo e profundo, fazendo-me sentir o
meu próprio gosto em sua língua.

— Seu desejo é uma ordem, mio amore.

Enquanto puxava ela para o meu colo e me embriagava da sua boca


outra vez, eu soube que eu faria tudo o que ela desejasse, e estaria no paraíso
ao fazê-lo.
Capítulo Quarenta e quatro

Suspirei contra a boca dele enquanto ele me conduzia em um beijo


suave e morno. Suas mãos adentravam a camisola e acariciavam a lateral do
meu corpo, sua palma contra a minha pele me arrepiando. Aproveitando
meus lábios entreabertos, Andrea entrelaçou sua língua na minha e eu me
deixei envolver pelo seu sabor, gemendo quando ele aumentou ainda mais o
ritmo com que me provava. Seus olhos azuis me prendiam, o beijo daquele
homem era viciante, seu toque me deixava queimando, mas saber que ele me
amava e que tinha me entregado o seu coração intensificava ainda mais as
sensações despertadas. Era muito gostoso saber que não só para mim, mas
também para Andrea, cada encontro dos nossos corpos tinha um significado
especial. Nunca havia sido apenas sexo para mim e agora tinha certeza que
também não mais o era para ele.

Apoiei-me em seus ombros, tentando-me acomodar melhor em seu


colo, de modo que eu pudesse friccionar minha entrada na sua ereção, que
começava a despontar novamente debaixo de mim. Movimentei-me
suavemente sobre ele, apreciando a corrente elétrica que percorria meu corpo
com o atrito, deixando-me cada vez mais excitada, enquanto sua boca
deslizava da minha até o meu pescoço, lentamente, fazendo com que um
arrepio me varresse.

— Hm… — gemi quando o homem percorreu com a língua a


extensão da minha garganta.

Brincou com a região apenas para retomar o caminho inverso, me


fazendo encolher com o prazer, os pelinhos da sua barba arrepiando-me.
Nunca pensei que o arranhar suave poderia proporcionar um grande prazer.

Instintivamente, sentei com mais força em cima dele, querendo que


ele me penetrasse; o pulsar na minha feminilidade era incessante.
Movimentei-me com mais intensidade, deixando-o duro. Meu ego se
regozijava por saber que eu era capaz de incendiá-lo da mesma forma que ele
fazia comigo.

— Deliziosa, tesoro... — Deu um beijo na base da minha garganta e


eu me espichei no seu colo, ainda mais quando ele soprou o local úmido.

Não respondi, apenas finquei minhas unhas na sua camisa com o


delírio. Para minha surpresa, segurou firmemente minha cintura e, depois de
girar a cadeira em direção a mesa, empurrando-a um pouco para trás, se
levantou comigo, como se não fosse esforço nenhum para ele o movimento.
Tomando meus lábios novamente em um beijo exigente, me sentou em cima
da superfície, sem se importar com os papéis que ali estavam. Confesso que
nem liguei para eles, presa no calor da boca do meu homem. Enquanto me
devorava, provando todas as reentrâncias da minha boca, passei minhas
pernas em torno da sua cintura, trazendo-o mais de encontro a mim. Como
resposta, ele levou as mãos fortes e quentes as minhas nádegas e me puxou
ainda mais contra si, arrancando de mim um grunhido quando senti seu pênis
ereto a centímetros de me penetrar.

Precisava, com um desespero crescente, senti-lo me preenchendo,


dando-me o alívio que meu corpo pedia. Não podia negar que achava
delicioso quando ele me amava lentamente, provando cada pedaço do meu
corpo, me fazendo tremer a cada toque das suas mãos e lábios, porém, agora,
não queria o amante terno, mas sim aquele que perdia o controle de si.

— Estou por um fio, mio amore — sussurrou.

— Então o perca. — Fitando seus olhos azuis intensos, movimentei


minhas mãos pelos seus ombros e, erguendo-me um pouco da mesa, deslizei
sua camisa e ele me ajudou a removê-la por completo. Nu, deslizei minhas
unhas pelos seus braços, sentindo os músculos firmes sobre o meu tato e ele
estremecer.

— Não era assim que eu estava pensando… — Plantou um beijo


gentil na minha testa. — Queria te dar prazer também.

— Faça-o me penetrando. — Segurei o seu rosto entre meus dedos e o


fiz me encarar, dando-lhe a certeza do que eu queria. — Eu preciso senti-lo.

— Adelle…

Sem deixar que ele falasse mais nada, trouxe sua boca até a minha e
me fundi a ele, mordiscando os seus lábios para que minha língua bailasse
com a sua. E não precisou de mais nenhum incentivo para que ele se
encaixasse em mim e me penetrasse, meus músculos internos comprimindo-o
com a invasão. Um gemido rouco escapou das nossas gargantas ao sentir
novamente carne contra carne, sem nenhuma barreira entre nós. A
necessidade de usar camisinha nublado pelo desejo de senti-lo.

Seus movimentos começaram lentos, um deslizar agonizante, e


desejando que ele aumentasse a intensidade com que me preenchia, deslizei
minhas mãos pelas suas costas até alcançar a região da sua cintura, o
segurando, e comecei a me movimentar em cima da mesa, trazendo seu corpo
para o meu com mais ardor. Nossas pélvis se chocando uma contra outra,
com o ritmo cada vez mais acelerado, provocavam estalos altos, que se
juntavam aos nossos gemidos e ao barulho que minha bunda fazia ao chocar
contra a superfície da mesa, em um som só nosso. A música do nosso amor e
do nosso prazer.

Fechei os olhos quando ele se cravou mais fundo em mim e, perdida


nas ondas cada vez maiores do êxtase, apertei-o com força, descendo minha
boca em direção ao seu ombro. Mordi o local quando suas mãos fortes
espremeram a minha bunda ao arremeter para dentro de mim com mais força,
a parte interna da minha vagina não oferecendo resistência à sua entrada
enquanto me afogava em Andrea. Nos amávamos de forma feroz e selvagem,
perdendo o controle juntos, mas não havia dor, apenas uma busca
desenfreada por chegarmos lá.

Com a respiração cada vez mais acelerada, sentia que algo estava
estilhaçando dentro de mim, intensificado quando senti Andrea tenso sob
meu tato. A sensação aumentou exponencialmente quando sua mão deixou a
minha bunda e trilhou o caminho até o meu sexo, seu dedo encontrando o
meu clitóris enquanto me penetrava, estimulando-me, ora com pressão, ora
tão lentamente que me fazia gemer e emitir resmungos de protesto contra a
sua boca. Senti-me cada vez mais lânguida até que, ao deixar de me estocar,
mas massageando meu ponto de prazer com movimentos circulares, fui
arrebatada pelo clímax avassalador. Meus olhos pareciam sem foco enquanto,
com um controle admirável, ele continuava a me acariciar, prolongando meu
orgasmo.

Quando viu que os efeitos estavam passando, ele substituiu


novamente seu dedo pelo seu pênis, e mesmo mole, meu corpo reagiu ao
dele, recebendo suas investidas, até que, com um gemido rouco, Andrea se
deixou levar, esvaindo-se dentro de mim enquanto me abraçava, sua testa
colada a minha.

Ficamos em silêncio por vários minutos, recuperando o fôlego, em


um momento cúmplice, até que, sorrindo e ainda encaixado dentro de mim,
Andrea me segurou com força, e sentou em sua cadeira. Acomodei-me
melhor em seu colo e envolvi o seu pescoço com meus braços, apreciando o
calor que me envolvia de ficar abraçada a ele tão intimamente.

— Eu te amo, Adelle. — Me fitando, tirou uma mecha do meu cabelo


e a colocou atrás da minha orelha. — Mais do que você pode imaginar.

— Eu também te amo. — Plantei um beijo suave na sua mandíbula.


— Tanto que eu perco o controle sempre que estou com você.

— Hmm... Sobre isso…

— Nos descuidamos e não uso anticoncepcional. Eu…

Ele franziu o cenho com a minha fala e por um momento senti meu
coração apertar no peito, o que deve ter transparecido no meu semblante.

— A ideia de ser a mãe dos meus filhos te parece tão ruim assim,
tesoro? — sussurrou com a voz arrastada.

— Sempre quis ser mãe, mas…

— Eu não menti quando disse que queria tudo com você, Adelle. —
Tocou o meu rosto com suavidade. — E se nosso filho nascer antes do
planejado, eu serei o homem mais feliz do mundo da mesma maneira. Você
me fez ansiar por ter a minha própria família. Melhor, você e Will já me
deram uma e adoraria ter mais integrantes nela.

— Andrea — falei o nome dele, emocionada. Era difícil não me


apaixonar ainda mais por aquele homem quando ele falava nesses termos,
principalmente por incluir meu irmãozinho nisso tudo.

— Você me daria a honra, tesoro?

— Eu não poderia ficar mais feliz caso acontecesse…

Sorri para ele e o beijei, selando ainda mais o nosso amor e também o
nosso futuro, juntos.
Capítulo Quarenta e cinco

Um mês depois

Andrea colocou a mão na minha coxa enquanto dirigia pela estrada


montanhosa que levava a Costa Amalfitana, e eu apreciei o contato gentil
enquanto olhava para pequenos relances do mar verde azulado que compunha
a vista, mal vendo a hora de poder contemplar a imagem paradisíaca por
completo que prometia ser espetacular, embora um certo nervosismo me
percorresse por saber que em pouco tempo eu conheceria meus sogros.
Faz quatro dias que tínhamos chegado à capital da região da
Campânia e decidimos conhecer alguns lugares de Nápoles, já que era a
primeira vez que eu e meu irmãozinho, que estava cem por cento recuperado,
pisávamos no país, e queríamos aproveitar tudo que a cidade poderia
oferecer, desde as atrações turísticas até as belas massas e sobremesas
napolitanas. Quando Andrea tinha mencionado o monte Vesúvio ao William,
contando a história de como, no ano 79 antes de Cristo, as cinzas do vulcão
acabaram soterrando a cidade de Pompéia, não restou outra escolha que não
fosse visitar o local. Não chegamos a subir o monte por ser uma caminhada
cansativa, mas não podia negar que visitar o parque arqueológico tinha me
tirado o fôlego, principalmente a arquitetura com grandes colunas e frontões,
além do Grande Teatro, uma estrutura típica dos teatros romanos.

Foi delicioso passar esses momentos em família com os dois, pena


que não poderíamos prolongar tanto o nosso tour. Andrea tinha diminuído e
muito sua carga de trabalho frenética, e inclusive a minha, pois ele contratou
uma assistente para mim, e ficava muito mais tempo conosco, mas
infelizmente não poderíamos ficar mais de dez dias fora, já que teríamos que
voltar ao trabalho e eu não queria que William se prejudicasse ainda mais nos
estudos, embora o menininho tenha se saído bem em todas as atividades.

Eu não poderia estar mais feliz com tudo que estava vivendo.

— Não precisa ficar nervosa, tesoro. Minha mãe a adora antes mesmo
de te ver — disse em um tom suave, tentando me tranquilizar, me tirando dos
devaneios. Aquele homem me conhecia bem, mesmo sem olhar para mim. —
Vocês já conversaram muitas vezes por telefone.
— Mas é diferente, Andrea. — Coloquei uma mecha de cabelo que
voava pelo vento atrás da orelha e pousei minha mão sobre a sua. — Antes
eu era apenas sua secretária, que informava sobre como andava o filho à uma
mãe desesperada por notícias dele. — Provoquei-o e ele e William deram
uma risada. — Agora sou sua namorada, e isso muda muita coisa. Fora que
não sei muito como me comportar nessa situação.

— Seja você mesma, tesoro. Não tem nada com que se preocupar,
dona Ana é uma mulher simples e afetuosa. — Fez uma pausa. — Sabe? Ela
sempre achou que você era perfeita para mim.

— Verdade? — perguntei, surpresa.

— Sì. E tenho que concordar que ela estava mais que certa. Só deveria
ter escutado ela antes e ter tentado te conquistar há muito mais tempo.

Foi impossível não sorrir diante dessa declaração. Estava tão


apaixonada, que agia como uma boba quando estava perto dele. Mas eu não
importava, pois a felicidade que estava vivendo era indescritível.

— Hm…Então tenho que agradecê-la por isso. Mas acho que se fosse
em circunstâncias normais, eu não teria coragem de envolver-me com o meu
chefe.

— Provavelmente não. — Fez uma careta enquanto fazia uma curva


mais sinuosa e eu ri.

— Já tá chegando, Del? — meu irmãozinho, que estava brincando no


videogame, me interpelou. — Cansei de jogar esse jogo.

— Ainda faltam trinta quilômetros, piccolo — disse com a voz suave.


— Que tal ouvirmos uma música?

— Eu quero Lottie Dottie Chicken — meu irmão disse com a voz


animada e eu olhei para Andrea, que deu um sorriso.

— Claro, por que não? Coloque para a gente, Adelle.

Conectando o celular ao sistema de som do carro alugado, a música


infantil de um desenho que William assistia na plataforma de streaming soou,
e o pequeno começou a cantarolar com a voz estridente, empolgado. Muitos
homens se irritariam com tal coisa, mas o magnata continuou sorrindo,
parecendo completamente relaxado, e eu o achei ainda mais belo, como se
isso fosse possível. E quando ele começou a tentar cantarolar a música, eu
não consegui conter a risada que brotou na minha garganta.

Foi nesse clima descontraído que, quase meia hora depois, paramos
próximo a uma enorme casa no estilo da região, coberta por trepadeiras que
pareciam se integrar perfeitamente ao jardim de arbustos altos repletos de
flores roxas. O mar azul ao fundo coroava ainda mais a beleza do local.

— É lindo! — exclamei.

— Minha madre se apaixonou pela casa assim que a viu — Andrea


comentou enquanto removia o cinto de segurança e abria a porta.

— Consigo imaginar o motivo — comentei, enquanto fazia o mesmo.

Mais rápido do que eu, deu a volta no veículo esportivo e abrindo a


maçaneta do carona, pôs-se a tirar William do assento infantil. Saindo do
veículo, eu senti minhas pernas um pouco trêmulas e um suor frio cobriu
minhas mãos, o que era um completo absurdo.
— Relaxe, tesoro. — Segurando William com um braço só, pousou
uma mão nas minhas costas me incentivando a caminhar pelo pequeno
jardim.

Porém, para minha completa surpresa, antes mesmo que chegássemos


à porta, uma mulher pequena, de cabelos pretos e curtos, correu até mim e me
abraçou calorosamente. Todo o receio e medo que sentia anteriormente foi
dissolvido pela recepção efusiva da minha sogra. Segundos depois, um
homem parecido com Andrea, só que um pouco mais alto e com cabelos
prateados, aproximou-se da esposa com um sorriso de contentamento no
rosto.

— Bambina mia[40], você não sabe a felicidade que estou sentindo por
finalmente conhecê-la pessoalmente — seu inglês tinha um grande sotaque
—, me abrace direito pois estava doida para conhecer a mulher que mudou
toda a vida di mi figlio. Já a considero como uma figlia mia[41].

— Obrigada — sussurrei, emocionada, e uma lágrima escorreu pelos


meus olhos. Aquela mulher pela qual conversava apenas pelo telefone
professava um carinho por mim que fez meu coração transbordar ainda mais
de felicidade.

— Você vai sufocá-la dessa maneira, madre — Andrea comentou.

— Ragazzo maleducato.[42] Carreguei nove meses na barriga para vir


falar assim com sua madre. — Fingiu-se ofendida, porém, pela sua
expressão, pude perceber que era apenas charme dela. — Oh, e quem é esse
belíssimo bambino? Ah, é o pequeno Will, certo?
Desvencilhando de mim, Ana aproximou-se de Andrea e estendeu os
braços para meu irmãozinho, que surpreendentemente, foi para o colo da
mulher e deu um beijo em seu rosto, para o regozijo dela.

— Estou tão feliz que teremos mais uma criança nessa família —
comentou e eu não tive palavras para expressar o quanto aquilo me
enterneceu e deixou-me feliz. Nunca poderia imaginar que ela aceitaria meu
irmão tão bem em sua família. — Eu adoro ter a casa cheia, pena que os
filhos crescem rápido demais, não é, Loreto?

— Sì, querida. — O homem mais velho se aproximou de mim e pegou


a minha mão, dando um beijo no dorso. — Prazer em conhecê-la, Adelle.

— Obrigada, senhor…

— Loreto, por favor.

— Claro.

— Ela é uma bela mulher, mio figlio. Nós dois somos homens de sorte
por elas terem escolhido nos amar.

— De fato, papà. — Como se para provar sua teoria, aproximou-se de


mim e envolveu a minha cintura, dando-me um beijo no rosto. — E hoje eu
não poderia ser um homem mais feliz, por mim essa felicidade irá durar
eternamente.

— Que romântico, mio figlio. Mas vamos entrar, vocês devem estar
com fome e cansados da viagem — Ana disse, solícita. — Ou preferem tomar
um banho e descansarem primeiro?

— Tô morrendo de fome, Del. — No colo da mulher, Will apontou


para a barriguinha, fazendo com que as nossas risadas se mesclassem.

— Não posso deixar o piccolo com fome. Tenho uma bela foccacia
recheada esperando por vocês.

— Qui é focátcha? — Meu irmãozinho se agitou querendo descer e


Ana o colocou no chão, dando a mão para ele.

— Vem comigo até a cozinha que vou te mostrar — respondeu com


carinho.

— Eu e meu pai vamos pegar as nossas coisas, daqui a pouco te


encontro lá dentro. — Deu-me um selinho breve, uma demonstração de afeto
na frente dos pais que eu não esperava, pois imaginava que ele seria daquele
homem mais discreto.

— Certo — respondi, e vi os dois homens caminharem em direção ao


veículo.

Ana me observou curiosa e virou-se segundos depois, caminhando em


direção a casa com Will, obrigando-me a segui-los.

— Realmente, perfetta — a mulher sussurrou para si mesma


parecendo contente.
Capítulo Quarenta e seis

Abri um sorriso enorme ao ver Loreto tomando a mão da esposa,


levando-a para o meio da pista de dança, juntando-se a alguns casais que
ainda não tinham ido para os seus quartos. Os noivos já tinham ido embora há
uma hora com destino a lua de mel, em uma villa reservada somente para
eles, e como William parecia se divertir brincando com outras crianças que
falavam nossa língua, deixei que ele aproveitasse mais a noite, embora já
estivesse tarde. Como Andrea conversava com um homem que tinha o
abordado para falar de negócios, enquanto observava os meus sogros, meus
pensamentos repassaram os acontecimentos dos últimos dias.
Sabia por telefone que Ana era uma pessoa agradável e maravilhosa,
mas nunca poderia imaginar que a mulher pudesse ser tão calorosa e tratar
William e eu como se fôssemos da família dela. Ela e Loreto mimavam o
menininho, enchendo-o de presentes, brincando com ele como se fosse um
neto, e fazendo todas as vontades dele, mandando a cozinheira preparar todas
as guloseimas que o pequeno queria comer, mesmo eu dizendo que não era
necessário. Até mesmo entraram na piscina de borda infinita para nadar com
ele, segurando-o sempre, zelando pela sua proteção. Não podia negar que me
enchia de felicidade ver que os pais de Andrea dispensavam tanta atenção ao
meu irmãozinho, que parecia retribuir, abraçando-os, dando beijos e carinho.
Will sempre foi uma criança afetuosa e me alegrava ver que os meus sogros
não eram pessoas frias com ele.

Mas o que mais me surpreendeu foi quando, em uma tarde fresca,


Ana me convidou para tomarmos um refresco na varanda do quarto dela para
que tivéssemos uma conversa a sós, de mulher para mulher. Explicou que
tinha ciência do modo que o filho dela tinha me tratado e o quanto a magoou
saber que Andrea tinha me comprado como amante por meio de um contrato,
que ela considerou um absurdo.

Perante sua confissão, não pude fazer nada além de ser sincera com
Ana, contando toda história do início, revelando o meu desespero a cada vez
que me era negado o crédito e do alívio que senti ao saber que aquele acordo
me daria dinheiro o suficiente para pagar todas as despesas médicas, algo que
não se mostrou necessário, já que Andrea cuidou de tudo. E, com nós duas
aos prantos e de mãos dadas, eu disse que nunca poderia me arrepender de o
ter feito e que o faria mil vezes se fosse preciso.

Diferentemente do que muitos poderiam pensar, eu não me senti suja


ao me vender, apenas não queria que me julgassem. Ver que minha sogra não
me condenava, apenas me olhava com a compaixão de uma mãe para uma
quase outra, e dizendo que se tivesse precisado, teria feito a mesma coisa,
isso fez com que o vínculo de amizade que eu sentia com ela se tornasse
ainda maior.

Saindo dos meus pensamentos observei que duas músicas tinham


tocado e meus sogros continuavam se beijando em meio a pista de dança,
sem se importar com nada além de ser eles mesmos.

— Tesoro? — A voz suave de Andrea fez com que eu desviasse o


olhar do casal que, depois de interromperem o contato, deu as mãos e
caminhou em direção a nossa mesa assim que a música terminou.

— Sim?

— Quer dar uma volta pelo terraço do infinito?

— Hm…Deve ser ainda mais lindo iluminado pelas tochas. — Olhei


calorosamente para Andrea. — Mas tenho que ficar de olho em William. —
disse quando os pais dele se aproximaram da mesa e apontei para o menino,
que ainda corria com duas outras crianças na pista de dança. — Já está
ficando tarde também.

— Preciso dizer algo a você, mio amore. — Andrea tentou me


convencer e eu me senti tentada, pois também tinha um segredo para contar
para ele. Uma coisa que descobri antes mesmo de viajarmos e que estava
esperando um momento especial para contar, e ali parecia perfeito para fazê-
lo.

— Por que não vai, querida? — Ana perguntou solicita. — Vamos


olhá-lo para você. Eu e Loreto fomos lá mais cedo e está muito romântico. —
Suspirou, apaixonada, e eu sorri ainda mais.

— Vamos, Adelle?

O homem que eu amava estendeu a mão para mim e eu não consegui


resistir aos seus olhos azuis suplicantes, assentindo. Pousando minha palma
sobre a sua, ergui-me nos meus saltos.

— Já disse que você está linda essa noite, tesoro? — parou para
sussurrar em meu ouvido quando estávamos longe dos convidados. Com seus
olhos percorrendo todo o meu corpo, pude sentir minha pele arder com o
mero escrutínio, parecendo totalmente consciente daquele homem, e eu me
derretia todas as vezes que ele parecia me despir com o olhar.

— Várias vezes, senhor Della Torre — forcei-me a dizer e obriguei-o


a caminhar em direção ao Terraço, que tinha uma vista linda para o Mar
Mediterrâneo pelo que pude ver mais cedo. Mal podia esperar para que
amanhecesse novamente e que eu pudesse ver essa vista da cama.

Enquanto caminhávamos em silêncio, com o som suave da música


tocada na festa, que podia ser ouvida até ali, não contive um suspiro que
brotou da minha garganta. De fato, minha sogra estava certa, tudo era
bastante romântico e eu me deixei envolver pelo clima propício. Percorremos
uma boa extensão até que chegamos a uma espécie de gazebo de pedra
medieval, já que a Villa Cimbrone, atualmente um hotel de luxo, tinha sido
construída no século XI.

Quando paramos no centro da construção, Andrea me girou para ele e


a música From this Moment On, da Shania Twain, começou a tocar bem
longe e eu sorri.

— Amo essa música — sussurrei, pousando minhas mãos nos ombros


largos dele, sentindo seu calor mesmo que ele trajasse um terno grosso.

— Então dance-a comigo, tesoro. — Um brilho cruzou os seus olhos


e sorri ainda mais.

Plantou um beijo suave em meus lábios apenas para enlaçar minha


cintura com seus braços fortes, fazendo-nos mover ao ritmo da música lenta,
nossos olhares se fitando com intensidade. Para minha surpresa, Andrea se
inclinou para mim, cantarolando, e o sotaque italiano e sua voz carregada de
emoção fizeram o meu coração bater mais forte e uma lágrima de felicidade
escorreu do meu rosto: — Bem ao seu lado é onde eu pertenço…

— Andrea…

— A partir desse momento, eu tenho sido abençoado. Eu só vivo para


sua felicidade…

Antes que eu dissesse qualquer coisa, Andrea se afastou de mim um


pouco e, puxando algo dentro do bolso, se ajoelhou a minha frente, me
deixando trêmula com a emoção que me percorreu. Mais lágrimas se
assomaram aos meus olhos quando ele abriu a caixinha, revelando uma
aliança dourada.

— Você é a razão pela qual eu acredito em amor e, enquanto eu viver,


eu vou te amar, eu prometo isto — adiantou o refrão da música e pediu: —
Casa comigo, Adelle?

— Eu não poderia me sentir mais feliz em aceitar — sussurrei.

Uma risada brotou dentro de mim quando vi Andrea pegar minha


mão.

— Se eu pudesse, me casaria com você amanhã mesmo — completei.


— Não preciso de festa, luxo, nem nada, apenas quero ser a sua mulher.

— Para mim, já somos marido e mulher, Adelle. Você é a minha


companheira, minha namorada, minha amante, minha esposa. Meu céu, meu
sonho e a minha metade. Aquela com quem quero passar o resto da minha
vida — Fez uma pausa e se levantou, me abraçando. — A mulher perfeita
para mim.

— Eu te amo, Andrea — minha voz saiu completamente fraca, mas


era impossível conter o embargo que sentia.

Não disse mais nada, apenas provou-me a força do seu amor com seus
lábios, sua boca se movendo sobre a minha com tanta calma, tanta ternura,
que eu fechei os olhos, entregue as sensações que ele me proporciona. Abri a
boca para emitir outro suspiro e Andrea aproveitou a abertura para envolver a
minha língua com a sua em uma dança lenta e embriagante. Levei meus
dedos aos seus cabelos e puxei os fios macios, sua boca era completamente
viciante.

— Que tal casarmos depois de amanhã, tesoro? — disse contra os


meus lábios ao interromper o beijo.
— Mas como? — Fiquei surpresa.

— Já tenho tudo acertado em um cartório de Nápoles. Entrei em


contato com eles antes de chegarmos à Itália e enviei toda a documentação
necessária para que pudéssemos nos casar aqui. Depois, nos casamos em
outro cartório nos Estados Unidos. Pedirei dupla cidadania para vocês dois.

— Hm...É tão autoconfiante ao ponto de organizar tudo sem saber se


eu aceitaria? — brinquei, traçando seu rosto com as pontas dos dedos.

— Você sabe que sim. — Deu de ombros e eu gargalhei. — Mas se


você quiser na igreja…

— Não, para mim só no cartório está perfeito, Andrea.

— Me fez o homem mais feliz do mundo, tesoro. — Voltou a me


beijar com fome me demonstrando o quanto ele estava contente, e eu retribui
na mesma altura, aprofundando o nosso contato e mostrando a ele também o
quanto eu era uma mulher feliz.

— Você não é o único a guardar segredos — murmurei quando


nossas bocas se afastaram, e ele traçou um caminho de beijos pelo meu
pescoço nu.

— Verdade? — Mordeu a base da minha garganta e eu joguei a minha


cabeça para trás, um calor gostoso se formando no meu centro.

— Sim.

— E então? — perguntou quando não respondi de imediato, erguendo


a cabeça para me fitar.

Não falei nada, apenas peguei as suas mãos e as levei até a minha
barriga, que ainda não tinha nenhum sinal da gravidez. Seus olhos brilharam
de emoção e vi uma lágrima escorrer pelo seu rosto.

— Vou ser pai? — Moveu a mão pelo meu abdômen.

— Sim, Andrea. — Pousei minha palma sobre o seu dorso, tocando-o.

— Quando soube, tesoro? — sussurrou.

— Antes de viajarmos, só estava esperando o melhor momento para


contar. — Fiz uma pausa quando ele não disse mais nada, parecendo em
transe. — Temos uma consulta marcada para assim que chegarmos a Nova
York.

— Hum… — Alisou ainda mais a minha barriga. — Como já posso


amar tanto o nosso filho? Estar tão apaixonado pela ideia de ser pai?

A risada dele de felicidade ecoou por todo o ambiente aberto e, me


dando um beijo, segurou minha mão na sua. Como se fosse uma criança
animada perante sua nova descoberta, me puxou correndo de volta para a
festa e tudo que pude fazer foi rir, contagiada por ele.

— Ela aceitou? — Ana perguntou quando chegamos na mesa.


William estava lá também, comendo um salgadinho.

— O quê? — O menininho questionou, curioso.

— O pedido de casamento — foi Loreto quem disse.

— Sim — Andrea respondeu com um tom mais do que exultante. —


Mas o melhor de tudo é que eu vou ser pai!

— Parabéns, queridos — Ana deu um gritinho, chamando a atenção


dos poucos convidados ainda presentes. Se levantou da cadeira, seguida de
Loreto, e nos abraçou, molhando-nos com as suas lágrimas. — Vou ter mais
netinhos!! E você, Will, vai ser titio!! — disse para o meu irmãozinho.

— Eu vou ser titio? — Will perguntou inocentemente e todos nós


olhamos para ele, embriagados de felicidade. — Que legal! —, completou,
enfiando um salgadinho na boca e todos nós rimos do seu comentário.

Aquele dia e a fala inocente do meu irmãozinho teriam para sempre


um lugar especial no meu coração.
Epílogo

Nove meses depois

Tinha acabado de deitar ao lado de uma Adelle profundamente


vencida pelo cansaço, quando o chorinho da pequena Melody soou na babá
eletrônica. Ainda estávamos nos adaptando a vida com uma recém-nascida e
minha mulher mais ainda, já que a neném mamava várias vezes ao dia em
pequenas quantidades.

Como se eu tivesse uma mola em meu corpo, ergui-me do colchão e


caminhei a passos lentos para fora da suíte em direção ao quarto da bebê.
Nunca pensei que ao me tornar pai, eu pudesse me sentir tão completo. A
primeira vez que peguei a recém-nascida, tão pequenininha, em meus braços,
tocando seus dedinhos enrugados, e beijei sua cabecinha coberta por fios
finos, ficaria guardada para sempre na minha memória. E se já estava
completamente apaixonado por ela antes mesmo de nascer, esse momento
intensificou ainda mais o amor que eu sentia pela pequena.

Melody tinha mudado muita coisa dentro de mim, e hoje conseguia


entender todo o cuidado que minha mãe e meu pai tiveram comigo e com o
meu irmão. Na verdade, se eu fosse sincero comigo mesmo, eu era ainda
mais grudento com a minha pequena. O trabalho não tinha mais tanta
importância como antes, pois minha prioridade era a minha família.

Abrindo com suavidade a porta, adentrei o pequeno quarto, mobiliado


com o tema princesa, e caminhei até o berço, vendo a menina mexer seus
bracinhos, seu pulmão a pleno vapor.
[43]
— O que foi, tesoro di papà ? — sussurrei com a voz calma e
toquei seus dedinhos com os meus.

Seu choro ficou mais intenso e eu removi a manta que a cobria,


verificando que a fralda estava molhada.

— Já descobrimos a causa, não é mesmo? — Conversava com ela


ainda que soubesse que não podia me entender.

Carreguei-a até o trocador e abri a parte de baixo do seu


macacãozinho, removendo a fralda suja e enrolando-a. Ao fazer isso, o choro
foi cessando pouco a pouco. Com um lencinho umedecido, limpei suas
dobrinhas, vendo-a mexer os bracinhos e perninhas. Estava apaixonado pela
sua boquinha perfeita e seus olhinhos cinzentos que tinham se aberto, que,
segundo a pediatra, era algo normal. Quando passei a pomada contra as
assaduras e coloquei uma fralda limpa, ela pareceu relaxar e, jogando a outra
no lixo, limpei minhas mãos e a peguei no colo, o calor do meu peito nu
parecendo confortá-la.

— Eu amo você, mio amore — sussurrei.

Ao virar-me com Melody no braço, vi uma Adelle sonolenta na


soleira da porta.

— Tudo bem, Andrea? — perguntou com a voz baixinha.

Assenti.

— Era apenas xixi.

— Certo.

Se aproximou de onde eu estava e tocou os cabelinhos da neném em


meu colo, que parecia cada vez mais sonolenta em meus braços, fazendo
barulhinhos.

— Eu amo ver vocês dois juntos. — Pegou a neném no colo e


colocou-a de volta no berço, observando-a enquanto dormia.

Caminhei até onde ela estava e a abracei por trás, envolvendo sua
cintura mais arredondada por estar se recuperando da gravidez. Mas, mesmo
assim, seu corpo ainda me era completamente atraente. Adorava as novas
formas que ela tinha adquirido durante a gestação e cada nova marca, mesmo
que Adelle não concordasse comigo.

— E eu amo você por ter me dado uma família e por me amar, tesoro.

Ficamos minutos em silêncio, apenas observando o fruto do nosso


amor dormir. Quando deixamos o quarto dela e entramos no nosso, a abracei
e sussurrei:

— Você, Adelle, é o meu felizes para sempre.

Agradecimentos

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer aquelas que me aturam


diariamente, minha irmã e minha mãe, dando-me conselhos, puxando minha
orelha e me trazendo de volta para o chão. Sem vocês duas, minha vida seria
um imenso vazio. Cada palavra redigida é graças ao apoio e amor
incondicional de vocês.

Agradeço a toda equipe do Grupo Editorial Portal por todo o apoio


para a publicação primorosa da minha obra.

Um beijo especial para as minhas preparadoras de texto, leitoras e


amigas Ana Roen, Rosimeire Gouveia e Adriana Leite. Obrigada por todo o
apoio, pelo carinho, pelo tempo. Sem vocês, esse livro não seria a mesma
coisa. Ana, fadinha, sua revisão é primorosa, muito obrigada por dedicar o
seu tempo sem obter nada em troca além da minha gratidão. Rosi, agradeço
sua conversa e paciência frente aos meus desabafos. Isso é muito importante
para mim.

Jéssica Macedo, Lizzie e Mari Sales gratidão por todo apoio de vocês,
pelos palpites e torcida.

E a você meu leitor, obrigada por chegar até aqui. Sem vocês, não
teria sentido escrever!
Sobre a autora:

Mineira, se apaixonou por romances há alguns anos, quando comprou


e devorou um romance de banca que adquiriu em um supermercado. Após
aquela leitura, não parou mais de comprar livros e ler . Encontrou no mundo
da literatura um lugar de prazer e refúgio. E agora se aventura em escrever
suas próprias histórias.
Conheça outros livros da autora:

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Sinopse:

Sua secretária não resistiria a ele...

Depois de muito lutar contra o desejo que sentia, o CEO da Jhonson's


and Phillips's, uma grande multinacional do ramo imobiliário, estava
determinado a conquistar sua secretária supereficiente e torná-la sua amante,
sem se importar com as consequências, e por tempo indeterminado. Porém os
planos do empresário vão por água abaixo quando um obstáculo se interpõe
no seu caminho.

Machucada e ferida por um relacionamento fracassado, Madeline


Jameson, secretária do CEO da J&P, não queria se envolver tão cedo com
outro homem. Mas o seu chefe, e amigo, estava determinado a arrastá-la à
uma ilha australiana a fim de avaliar o estado físico do local e,
principalmente, para seduzi-la.

Poderá a convivência entre os dois forjar algo além da atração e do


desejo?
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inocente-do-ceo/

Sinopse:

Ele não confiaria em mais ninguém...

CEO multimilionário da Matiazzi Corporation, uma empresa


reconhecida mundialmente no ramo da construção, Fernando Matiazzi era um
homem amargurado, frio e cético, que controla tudo e a todos ao seu redor.
Não há nada, nem ninguém, que o dinheiro não possa comprar.

Cínico e arrogante, cuidava da empresa e da sua vida com mão de


ferro, afastando todos que ousavam se aproximar. Ele nunca se deixaria
enganar, não mais...

Porém suas barreiras de gelo e de cinismo poderão começar a ruir


quando uma jovem, meiga, inocente e persistente, entra na sua vida e começa
a colocar em xeque tudo o que ele acreditava que era e se tornou.

Será que a doçura dela conseguirá quebrar o coração de gelo desse


CEO calculista?

[1]
Mamãe.
[2]
Meu caro.
[3]
Pequeno.
[4]
Deus.
[5]
Minha cara.
[6]
Caralho.
[7]
Mamãe ou mãezinha.
[8]
Minha mãe.
[9]
Pai.
[10]
Meu filho.
[11]
De sua mãe.
[12]
Meu menino.

[13]
Deus, mãe.
[14]
Mãe, eu te amo muito.
[15]
Tesouro.
[16]
Mãe.
[17]
Sou um completo idiota.
[18]
Maldição.
[19]
Mãe de Deus.
[20]
Céus.
[21]
Meu chocolate.
[22]
Sim, meu chocolate.
[23]
Perfeita para mim, meu chocolate. E minha.
[24]
Gostosa...
[25]
Sim, tesouro?
[26]
Amor.
[27]
Imbecil
[28]
Meu amor.
[29]
Amor.
[30]
Doçura.
[31]
Amor meu.
[32]
Com muito prazer, tesouro.
[33]
Espetacular, doçura.
[34]
Linda.
[35]
Rapazinho mal-criado.
[36]
Querida.
[37]
Amor.
[38]
Estúpido de merda.
[39]
Minha vida.
[40]
Minha menina.
[41]
Filha minha.
[42]
Rapaz mal-educado.
[43]
Tesouro do papai.

[AR1]Como iria ser repetida nesse parágrafo, retirei-a do parágrafo anterior.

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