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O homem evoluiu ou involuiu (como ser humano) ?

Antes de começar a análise, é necessário conceituar alguns pontos. Como o


ser humano faz parte da classe ontológica mais complexa e, como define Hayek, é
um ser complexo, com múltiplas facetas, desejos e diferenças, é difícil traçar
exatamente o que seria uma evolução ou não, considerando o quão pessoal é o
objetivo e os desejos de cada um. O que é possível fazer, portanto, são
generalizações com base em estímulos e distorções que ocorreram atualmente, e a
partir destes apontar onde o ser humano pós-moderno erra como indivíduo em
comparação aos seus antepassados ou a aquilo que ele deveria ser. Vale ressaltar
também que esta análise não inclui o Oriente, tendo em vista que seus problemas
sociais e suas formas de pensar e encarar a realidade são diferentes. Além disso, a
análise pode estar totalmente passível de erros, já que sou apenas um iniciante no
estudo da filosofia.

O problema do método
Nos dias de hoje, pela vitória da ciência sobre as outras do conhecimento, é
comum que a visão que estudiosos tenham sobre o humano enquanto ser seja
reducionista no sentido de que o homem é analisado como animal, no ponto de vista
puramente biológico. O problema deste tipo de análise já foi descrito por
Kierkegaard ao analisar o problema do pecado hereditário: antes de iniciar um
estudo, é importante conseguir compreender a qual área do conhecimento este
objeto pertence (isto é, se ele pertencer a alguma). Qualquer outra forma de análise
irá ser falha em compreender o objeto de estudo como um todo, o que a tornará
superficial e por vezes falha. A tentativa de compreender o ser humano não só falha
em explicar o comportamento da linguagem, das ideias e da cultura, como é
superficial e derivada de outras correntes filosóficas, como o conceito de meme
deriva da ideologia de Marx, inconsciente de Freud e o discurso de Foucault.​1

O que o ser humano é


O ser humano pode portanto ser compreendido filosoficamente como um ser
complexo, movido pelo seu desejo de abandonar um estado menos satisfatório para
um mais satisfatório, que possui capacidade própria de julgar situações, valores e
outros indivíduos, além de interagir com semelhantes e odiar, governar, etc.​2 Para o
segundo tópico do texto, partirei do pressuposto de que o ser humano possui um
ordenamento comum que o orienta a ter a vida mais satisfatória possível, a ordem
natural. Tal ordenamento colabora com uma baixa preferência temporal e uma
harmonia com valores tradicionais, no sentido que Evola dá ao termo.

Para facilitar a análise, irei separar o ser humano em alguns grupos que
sozinhos não o definem em sua totalidade mas a de concordar que caracterizam o

1
On human nature, Roger Scruton, SCIENCE AND SUBVERSION.
2
queria escrever mais só que fiquei sem tempo :|
homem: “o ser social”, “sua relação consigo mesmo” e “o estado contra a
responsabilidade, maturidade e família”.

1. O ser social
Tendo em vista que quase todos os problemas que a filosofia se dispõe a
analisar, assim como a ciência, as poesias ocidentais e a política, por exemplo,
envolvem a relação de um ser com os demais em seu convívio (ou além disso), não
tenho motivos para discordar que o ser humano é um ser social e totalmente
relacionado com o meio em que se encontra, já que mesmo o egoísmo randiano
trata-se sobre satisfazer os próximos para satisfazer-se a si mesmo. Também não
há dúvidas que, visto a necessidade de se relacionar, ter boas relações colabora
para a saúde mental de um indivíduo e, na maioria dos casos, a sua própria
felicidade. A capacidade de amar ou odiar um semelhante, as diferentes formas de
relacionamento, que vão de colegas de trabalho a esposa e filhos, evidenciam
também que existe a possibilidade de ter relações melhores ou piores.
Por algum motivo de desconhecimento do autor, o ser humano
contemporâneo é radicalmente político, no sentido de que ele está disposto a alterar
seus princípios em virtude de uma causa que ele considera nobre (ou não).
Protestos em nome do movimento Black Lives Matter, empresas de tecnologia
aconselhando e interferindo na política americana​3 e o ativismo de empresas de
todos os setores em prol de causas sociais​4 apenas evidenciam o quanto a vida
atual está relacionada com a política. Isso significa que a política assume um papel
de alta relevância na vida de boa parte das pessoas hoje, podendo assumir o papel
de deus do pós modernismo (no sentido que Nietzsche dá para deus ao criar o
super-homem). A relação desta introdução com o tópico 1 está no fato de que,
tendo esta relevância, é comum atualmente que uma pessoa encerre suas relações
com outra por determinada posição política contrária. Que fascistas ou nacional
socialistas devem ser boicotados, presos ou até mortos já caiu no senso comum e a
lei brasileira até reforça este tipo de comportamento​5​, porém é notável que, nas
últimas eleições americanas, o radicalismo político atingiu até mesmo as relações
pai e filho, com diversos artigos sendo produzidos defendendo este tipo de

3
Este trecho referência os aviso que o Twitter coloca nos tweets do atual presidente americano
Donald Trump. O valor verdade por trás daquilo que o presidente fala não é de interesse do artigo.
4
Apesar de muitos considerarem estas causas corretas, não deixa de ser verdade que elas foram
criadas por uma determinada corrente filosófica. Para o exemplo de ativismo corporativo abaixo,
cabe a relação da teoria de gênero com a Escola de Frankfurt e o Marxismo.
Kelleher, Patrick, et al. “Oreo Launches Rainbow-Coloured Biscuits to Celebrate LGBT Families – but
Not Everyone Is Impressed.” ​PinkNews​, 13 Oct. 2020,
www.pinknews.co.uk/2020/10/12/oreo-rainbow-biscuits-parents-lgbt-kids-allyship-pride-lesbian-flag-gi
veaway-twitter/.
5

TARDELLI, R. ​A legislação brasileira criminaliza a incitação ao nazismo​. Disponível em:


<https://www.cartacapital.com.br/opiniao/a-legislacao-brasileira-criminaliza-a-incitacao-ao-nazismo/>
comportamento em prol “do futuro da nação”​6​. Este pesadelo hegeliano e a
glorificação da política não só ameaça qualquer corrente filosófica contrária a aquela
presente no imaginário popular como deteriora ou impede que novas relações
sociais sejam feitas. A tolerância, tão propagada com as ideias de democracia e
liberdade, foi uma das primeiras vítimas em nome de um mundo mais livre, e com
ela, milhões de potenciais relações sociais e possibilidades de ser mais feliz.

2. Sua relação consigo mesmo


Como referido anteriormente, irei considerar aqui que o conceito de ordem
natural. Não posso afirmá-lo como absoluto para todos os indivíduos, por falta de
estudo, porém não posso negá-lo como um meio válido para se encontrar a
felicidade, tendo em vista a antiga ascensão do fascismo (embora seja fruto de
Hegel e do modernismo, possui alguns valores tradicionais), a escola tradicionalista,
a quarta posição e o conservadorismo como correntes de pensamento que utilizam
de ao menos alguns dos elementos tradicionalistas em suas teorias.
O realidade do século XX é marcada por um distanciamento dos indivíduos
dos valores tradicionais vigentes até a primeira guerra mundial. Monarquias são
raras e quando existem são liberais e democráticas, rituais de passagem não
existem mais, os princípios da revolução francesa venceram a hierarquia, as ordens
de cavalaria deram espaço aos exércitos populares que lutam pela defesa (ou não)
do seu país. No século pós grandes guerras, é extremamente incomum qualquer
defesa do celibato, honra, desigualdade, espiritualidade e masculinidade.
Concordando com estas mudanças ou não, há de se concordar que para as
gerações que nasceram com estes valores já formados, ou para as que viveram
estas transformações, o comportamento destas seja diferente com relação aos seus
antepassados. A respeito disso, o Doutor Robert A. Glover escreve: “Para
compreender verdadeiramente os fenômenos atuais da Síndrome do Cara
Bonzinho, temos que levar em conta uma série de mudanças sociais
significativas, que começaram por volta da virada do século e aceleraram após a
Segunda Guerra Mundial. Estas dinâmicas sociais incluíram:
● O transição de uma economia agrária para uma economia industrial.
● O movimento de famílias das áreas rurais para áreas urbanas.
● O ausência do pai em casa.
● O aumento do divórcio, lares monoparentais, e casas chefiadas por
mulheres.
6
Para este trecho cabe dois exemplos:
Dear Dad, Please Don't Vote For Donald Trump This Time​. Disponível em:
<​https://ryanholiday.net/letter/​>

VESPA, M. ​What a Liberal Voter Reportedly Did to Her Conservative Dad Is Just Deplorable​.
Disponível em:
<https://townhall.com/tipsheet/mattvespa/2020/10/26/is-this-the-worst-video-for-the-2020-election-cycl
e-n2578813>
● Um sistema educacional dominado por mulheres.
● Libertação da mulher e feminismo.
● A Guerra do Vietnã.
● A revolução sexual.

Estes eventos combinados tiveram um grande impacto sobre os rapazes que


cresceram nessa época. Estas mudanças sociais tão profundas criaram três
dinâmicas que contribuíram para o fenômeno generalizado da Síndrome de Cara
Bonzinho na geração baby boom.”
Embora possa não ter tido efeito na maioria, alguns homens começaram a
manifestar uma série de problemas psicológicos, físicos ou sociais devido à
ausência da masculinidade no sentido tradicional. Os diferentes indivíduos que
manifestam problemas parecidos são chamados por Glover de “Caras Bonzinhos”.
A relação desta observação com o nome do tópico ocorre devido ao fato de que,
como a corrente filosófica atual é tida como correta e oposições não são
mencionadas ou, se são, levam o título de fascismo e por consequência são
condenadas, muitos indivíduos são criados de uma maneira que é danosa para eles
e sequer sabem que existem outros jeitos de abordar questões como sexualidade,
masculinidade e espiritualidade. Tendo em vista a imensa influência budista nas
teorias de Nietzsche e Evola, todos os valores antes debatidos como universais e
necessários para o funcionamento da sociedade agora são relevantes para o
homem enquanto indivíduo: se ele realmente acredita que um valor X é relevante
para ele, cabe a ele colocar em prática e pela Virtude influenciar outras pessoas a
fazer o mesmo. A aplicação do Super-Homem em um cidadão em Curitiba
certamente não irá derrubar a democracia na França, portanto não vejo como
criticar este estilo de vida senão por divergências filosóficas.
Concluindo, ficou claro pelos textos acima que, embora seja possível
perseguir uma filosofia de vida que possa vir a agradar alguém, a corrente filosófica
vigente por vezes suprime as outras e até mesmo ameaça via monopólio da força
(estado) os praticantes destas, e acredito que não há retrocesso humano maior do
que a supressão do conhecimento, em nome do que quer que seja.

3. O estado contra a responsabilidade, maturidade e família


O estado democrático, fundado no princípio de igualitarismo e de
cuidar de todos, expande suas tarefas e responsabilidades de forma
exponencial e começa a atuar em áreas que há 4 séculos atrás seria
inimaginável. Isso inclui, dentre várias opções, a questão social. Ao criar um
sistema de previdência, o estado democrático remove a responsabilidade que
as gerações mais novas possuem com as mais velhas e desincentiva que as
famílias desenvolvam relações mais profundas. O mesmo serve para países
em que a educação é majoritariamente ditada pelo estado e/ou sem
homeschooling.
Além do âmbito familiar, o governo democrático interfere nas
liberdades e responsabilidades individuais direta ou indiretamente por leis e
atitudes econômicas. O estado pós-moderno possui a liberdade de ditar
como indivíduos podem casar, ir e vir, abrir seus próprios negócios e
comercializar com outras pessoas. Estas intervenções diretas retira do
homem a responsabilidade sobre uma grande quantidade de escolhas e o
acostuma a deixar com que o estado os resolva para si. O resultado não
poderia ser mais óbvio: o governo expande de maneira impagável e cria
dívidas enormes para sustentar a quantidade absurda de direitos enquanto
paralelamente penaliza aqueles que são capazes de tomar escolhas, como
empreendedores. Indiretamente, a imprevisibilidade do futuro devido às
trocas constantes de poder (4 em 4 anos), a expansão das taxas e a inflação
aumentam a preferência temporal da sociedade e incentivam o pensamento a
curto prazo, sendo que uma das condições de formação de uma sociedade é
a baixa preferência temporal daqueles que a compõe.​7​ O estado, e o homem
atual, são marcados, portanto, pelo processo de Descivilização, na qual a
sociedade fica cada vez mais pobre materialmente, moralmente e
eticamente, tendo em vista a prioridade que o presente possui sobre o futuro.
O homem moderno tem mais incentivos para ser infantil, pobre, dependente
do estado e degenerado em comparação com seus antepassados, cabe ao
leitor escolher qual representa um retrocesso ou não.

Conclusão
Apesar dos avanços civilizacionais no geral (ciência, por exemplo),
que é o ponto que provavelmente a maioria das pessoas analisam ao pensar
sobre o tema, o homem nascido no século XX/XXI é carregado de problemas
políticos, econômicos, sociais e psicológicos provindos seja devido ao
excesso de política em sua vida, seja da ausência de ideias a se seguir ou
seja da interferência excessiva do estado democrático, o que caracteriza um
retrocesso, em algum nível, nas áreas do conhecimento citadas acima.

7
Em Democracia: O Deus que Falhou, do Hans-Hermann Hoppe, o autor conceitua preferência
temporal como: “Ao agir, o agente humano (o homem) sempre visa a substituir um estado de coisas
menos satisfatório por um estado de coisas mais satisfatório; ele, portanto, demonstra uma
preferência por mais bens – e não por menos bens. Além disso, ele sempre considera o momento
futuro em que os seus objetivos serão alcançados (i.e., o tempo necessário para realizá-los), bem
como a capacidade de duração de um bem. Ele, assim, também demonstra uma preferência
universal por bens presentes em vez de por bens futuros e por bens mais duráveis em vez de por
bens menos duráveis. Este é o fenômeno da preferência temporal.” Ao ser limitado pelo tempo, o
agente humano só trocaria bens presentes por futuros se ele pudesse esperar um aumento dos bens
futuros em relação aos atuais. A instabilidade democrática impossibilita este aumento.

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