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Paulo R.

Margotto
4ª EDIÇÃO - 2021

ASSISTÊNCIA AO
RECÉM-NASCIDO
DE RISCO

UNIDADE DE NEONATOLOGIA
DO HOSPITAL MATERNO
INFANTIL DE BRASÍLIA
Hospital de Ensino/SES/DF
SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE
DO DISTRITO FEDERAL
Paulo Roberto Margotto

Médico, Doutor em Perinatologia pelo CLAP


(Centro Latinoamericano de Perinatología
y Desarrollo Humano) / OPS (Organização
Panamericana de Saúde) /OMS (Organização
Mundial de Saúde), Montevideo, Uruguai.
Professor do Curso de Medicina da Escola
Superior de Ciências da Saúde (ESCS)/
Secretaria de Estado de Saúde do Distrito
Federal, Coordenador do Internato-6ª Série
(Eixo Saúde da Criança|) de 2001-2013.
Professor de Neonatologia da Faculdade de
Medicina da Universidade Católica de Brasília
(2014-2018). Especialista em Neonatologia
(TEM) pela Sociedade Brasileira de Pediatria.
Estágio de Aperfeiçoamento em ecografia
cerebral e Doppler na Unité de Soins
Intensifs de Port-Royal (Centre Hospitalier
Universitaire Cochin St Vincent de Paul,
Université René Descartes, Paris, France e
na Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Coordenador do Programa
de Residência Médica em Neonatologia
do Hospital Regional da Asa Sul/HRAS/
SES/DF (1990-2000). Chefe da Unidade
Neonatologia da Secretaria de Estado de
Saúde do Distrito Federal (1987-1996;1999-
2002). Coordenador da Neonatologia da
Secretaria de Estado de Saúde do Distrito
Federal (1999-2002). Diretor de Ensino
Médico Continuado da Associação Médica
de Brasília (1999-2001). Neonatologista
do Hospital das Forças Armadas / EMFA
(1981-2011).Ultrassonografista cerebral do
Hospital Maternidade Brasília, UTI Neonatal
do Hospital Santa Lúcia e Unidade de
Neonatologia do HMIB/SES/DF (visitante).
Paulo R. Margotto
4ª EDIÇÃO - 2021

ASSISTÊNCIA AO
RECÉM-NASCIDO
DE RISCO

UNIDADE DE NEONATOLOGIA
DO HOSPITAL MATERNO
INFANTIL DE BRASÍLIA
Hospital de Ensino/SES/DF
SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE
DO DISTRITO FEDERAL
UNIDADE DE NEONATOLOGIA DO HOSPITAL MATERNO INFANTIL DE BRASÍLIA
Hospital de Ensino/SES/DF
SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL

© 2021. Todos os direitos reservados. Paulo Roberto Margotto.


É proibida a reprodução, total ou parcial, por qualquer meio ou processo. Vedado o
armazenamento total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em
qualquer sistema de processamento de dados. Aviolação de direitos autorais é crime.

Como citar:
Margotto PR. Assistência ao Recém-Nascido de Risco, HMIB/SES/DF, Brasília, 4ª Ed., 2021

Projeto Gráfico e Editoração


Qualidade Gráfica e Editora | Wagner Castro

Revisão de Texto
Qualidade Gráfica e Editora | Amanda Vasconcelos

Impressão
Qualidade Gráfica e Editora

Foto Capa
Paula Cristina Margotto aos 6 meses

FICHA CATALOGRÁFICA
___________________________________________________________________________

Margotto, Paulo Roberto.


Assistência ao recém nascido de risco/
Paulo Margotto, - Brasília, 2021.

1. Recém-nascido - normas de assistência


2. Recém-nascido de risco - assistência I. Título

ISBN: 85.8799-117-5
CDU
___________________________________________________________________________

Essa e outras edições deste livro você


encontra em: www.paulomargotto.com.br
AGRADECIMENTOS

À Carmen, esposa, amiga, conselheira, além de grande


companheira em todos os momentos; sem seu apoio,
sobretudo tolerância, compreensão e amor, a 4ª Edição dessa
obra com certeza não seria hoje uma realidade.
À minha filha Paula Cristina (na capa aos 6 meses), a
nossa Flor do Cerrado que nos enche de orgulho e felicidade
diuturnamente.
Aos meus pais, Aurélio Margotto e Maria Guerra
Margotto, de onde estiverem, a distância jamais será maior
que a saudade de quem dedicou a vida na formação dos seus
filhos médicos, José Antônio Margotto, Paulo R. Margotto,
Luis Pedro Margotto (in memoriam) e Lucas Margotto.
Aos colegas da Unidade de Neonatologia do Hospital
Regional da Asa Sul/ Hospital Infantil de Brasília e aos
Residentes da Neonatologia que ao longo de 40 e 30 anos,
respectivamente, me tornaram esse neonatologista que
sempre buscou incessantemente a divulgar o conhecimento
e que constituem os pilares dessa 4ª Edição.
– PREFÁCIO –

PREFÁCIO
Procuramos “descobrir os erros e não a verdade” (Karl Popper), pois essa é mutável.

Tão logo foi publicada a 3ª Edição do livro Assistência ao Ensino do HMIB), Marta Vieira (SubSecretária de Saúde do DF),
Recém-Nascido de Risco, em outubro de 2012, começamos a Virgínia Lira e Fabiana Márcia Alcântara de Moraes (Coordena-
construir a 4ª Edição ao longo de seis anos (são 111 capítulos ção da Neonatologia do DF) e Nelma Regia da Cunha Louzeiro
com 4096 referências!). (Acessora de Relações Institucionais/IGES) pelo intenso apoio e
O combustível que nos impulsionou veio das nossas Dis- envolvimento, sempre acreditando na importância desse traba-
cussões Clínicas diárias na Unidade, Apresentações de artigos lho para uma melhor Medicina Neonatal no DF.
científicos pelos Residentes e Internos da Faculdade de Medicina Ao longo desses 40 anos sempre acreditamos que as Uni-
da Universidade Católica de Brasília, Conferências de Congressos dades devem ter suas Normas implantadas após discussão com
e Simpósios, Casos Clínicos e Casos Anátomo-Clínicos e Sessões a Equipe, sobretudo em ambiente onde há Programa de Resi-
de Anatomia Clínica. dência Médica para evitar um brain storm de condutas, no qual
Essa nova Edição registra os Avanços da Neonatologia in- o grande prejudicado será inevitavelmente o paciente associado
corporados nos 111 capítulos, como a Hipotermia Terapêutica, à impossibilidade da avaliação do que fazemos (é como singrás-
o único neuroprotetor aprovado pela Academia Americana de semos em mar aberto sem rumo!). Todos devem participar na
Pediatria, Uso do bilirrubinômetro tanto no recém-nascido a elaboração das Normas, discutindo em conjunto (ninguém é
termo como pré-termo, Ventilação de alta frequência e Venti- melhor sozinho), buscando a melhor evidência, revisando os
lação dirigida a volume, Uso do surfactante de forma menos resultados e propondo novos caminhos com base na evidência e
invasiva, conhecida entre nós como Mini Insure, o melhor enten- agora com a experiência (os resultados). Isso nos torna verdadei-
dimento da microbiota intestinal na prevenção da enterocolite ros artesões na Medicina Neonatal!
necrosante, a sensibilização na necessidade de melhor controle Com esse livro na nossa Unidade, procuramos “descobrir
na administração de oxigênio com alvos definidos (Projeto os erros e não a verdade” (Karl Popper), pois essa é mutável e à
COALA-Controlando Ativamente Alvos de Oxigênio), idealizado luz das evidências, corrigí-los diuturnamente para uma melhor
pelo Dr. Guilherme Sant´Anna, Canadá), A definição do Limite de assistência a esses indefesos que desabrocham para a vida pelas
Periviabilidade na Unidade Neonatal do HMIB, a Priorização do nossas mãos.
uso de CPAP precoce, uma das tecnologias que mais influenciou Nesses 40 anos, com certeza foram várias as razões que nos
nos índices de morbimortalidade nos pré-termo, Insuficiência impulsionaram cada vez mais para gente na conquista do ideal
Intestinal e Refluxo Gastroesofágico. de ser sempre útil, uma doação constante, na esperança de uma
Novos capítulos fazem parte dessa Edição, como Um olhar vida sadia que começa através de nós Momento mágico que não
para o Recém-Nascido, sua Família e a Equipe de Saúde, a Relação pode admitir erros, pelo risco de uma cicatriz perene!
entre Pais e Bebês Críticos na UTI Neonatal, Uso de Diuréticos na Encerro o que diz o Professor e Escritor Daniel Pennac
UTI Neonatal, Ecocardiografia Funcional, Hipertensão Arterial, (França): existem três tipos de pessoas a) os guardiões do
Medicações Endovenosas em Uso na Neonatologia, Síndrome templo que veem o saber como propriedade privada e tentam
de Abstinência, Cuidado Paliativo: um desafio na abordagem do monopolizá-la, porque outros não são dignos deles b) os que
paciente neonatal, Colostroterapia, Imunodeficiência Primária no não ligam para nada, ou seja, preferem se manter alienados
Neonato e entre os capítulos de Urgências Cirúrgicas, Extrofia e indiferentes e agora, c) os passeurs, pessoas que levam em
Vesical, Epispádia e Extrofia de Cloaca, Atresia das Vias Biliares, consideração a sua cultura, sabendo que ela não lhe pertence
Dilatação das Vias Biliares e Priapismo Neonatal. e pode fazer a felicidade dos outros. Ser passeurs é isso: tudo
Agradecemos a todos os colegas participantes que suporta- que vocês sabem não pertence a vocês, não é sua propriedade.
ram os inúmeros e-mails e de forma especial às Dra. Sandra Lins, O conhecimento não faz mais do que passar através de você.
Marta David Rocha de Moura (Chefes da Unidade Neonatal do É certamente emocionante fazer parte desta peça há tanto anos!
HMIB) e Edelaide Rachel Pilau Frazão (Presidente do Hospital de

Paulo R. Margotto,
22 de agosto de 2020
– PREFÁCIO –

É com grande satisfação que apresento aos colegas a quarta tribuídos com a finalidade de facilitar a busca por tópicos. Na
edição do livro Assistência ao Recém-nascido de Risco, um proje- sobrecarga dos plantões, para uma consulta atenta e comple-
to coordenado pelo eminente colega Prof Dr Paulo Margotto em mentar é de importância essa praticidade, sem perda na quali-
conjunto com seu grupo da UNIDADE DE NEONATOLOGIA DO dade de informação. É exatamente o que vocês, caros colegas
HOSPITAL MATERNO INFANTIL DE BRASÍLIA. A sobrevida de nos- terão nesse livro. Espero que seja muito útil, também aos novos
sos neonatos de alto risco, tem crescido ano a ano, resultado da colegas neonatologistas e futuros colegas em formação.
melhora da qualidade assistencial nas UTIs Neonatais do mundo Muito obrigada, Professor Paulo Margotto e equipe de
todo, incluindo o nosso país. colaboradores por nos oferecer mais essa contribuição para a
Esse livro, traz atualizações que contribuirão sobremaneira Academia Brasileira, ampliando oportunidades de informações
na qualificação profissional de quem atende o neonato, a leitura relevantes, atuais e de elevada qualidade científica.
é agradável, com fluidez e os capítulos estão didaticamente dis-

Professora Dra Rita de Cassia Silveira,


Medica Pediatra e Neonatologista; Professora Associada IV Depto de Pediatria Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS);
Orietadora Mestrado e Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente UFRGS; Chefe da UTI
Neonatal e da área Neonatal no Centro Obstétrico do Hospital de Clinicas de Porto Alegre (HCPA), Coordenadora do Ambulatorio
de Seguimento da Neonatologia HCPA; Pesquisadora PQ/CnPQ

Só é útil o conhecimento que nos torna melhores.


Sócrates.

É com muita honra e alegria que fui presenteada com o privi- o sonho desse livro durante as visitas, discussões à beira leito e
légio de apresentar aos leitores a 4ª edição do Livro Assistência ao as apresentações dos residentes que são seu motor de desafios.
Recém – Nascido de Risco que tem o Dr Paulo Roberto Margotto Durante a leitura, vamos mergulhando nos vários “arquivos”
como autor principal. dos capítulos do livro. Aprendendo e identificando no conjunto
Dr Paulo é um ser humano como poucos, neonatologista de da obra as mudanças dos paradigmas assistenciais aos recém
primeira linha, que tem como meta de vida divulgar o conheci- nascidos criticamente enfermos. É um livro para principiantes e
mento baseado nas melhores evidências. Tenho a honra de ter leitores já acostumados com o tema e que buscam se aperfeiçoar.
sido sua residente, sua colega de plantão e chamá-lo de meu Querido, Dr Paulo o seu entusiasmo pela causa neonatal é
amigo e mestre. contagiante, e sua autoridade para defendê-la, inquestionável.
O livro Assistência ao recém-nascido de risco é uma constru- Pois é um exemplo vivo daquilo que prega, cuidar do recém-
ção coletiva de vários profissionais que foram orquestrados pelo -nascido e de sua família para garantir um futuro melhor para
Dr Paulo, e é um passeio pelos mais variados temas neonatais, todos nós.
com uma linguagem fácil. Cada capítulo tem sua vinculação a Acredito que durante a leitura vocês serão surpreendidos e
alguma prática acadêmica e aos protocolos assistências da UTI serão felizes confirmando os seus conhecimentos, reforçando e
Neonatal do Hospital Materno Infantil de Brasília onde começou aprendendo outros. Divirtam-se!

Marta David Rocha de Moura,


Pediatra Neonatologista do Hospital Materno Infantil de Brasília, Mestre em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia pela Univer-
sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Botucatu. Doutoranda da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade
de Brasília. Professora e atual Diretora da Escola Superior de Ciências da Saúde e Diretora técnica do Instituto de Pesquisa em
Neonatologia Paulo Roberto Margotto.
– PREFÁCIO –

Receber o convite para fazer o prefácio da 4ª Edição do Livro foram partilhados pelo Brasil, pelos vários serviços neonatais e
Assistência ao Recém-Nascido de Risco além de um privilégio é se tornaram companheiros de plantões de muitos. E ele segue
uma honra e uma felicidade muito grande. Dr. Paulo é inspirador. partilhando conhecimento, partilhando amor e construindo um
Ele lança as sementes do amor ao recém-nascido e rega todos belo jardim. Um jardim de muitos outros que amam a Neonato-
os dias com o saber que busca incessantemente e compartilha logia e que aprendem com ele todos os dias, seja folheando seus
com todos que estão a sua volta e que amam a Neonatologia. livros, seja assistindo suas aulas. O tempo passou e já estamos
Foi assim que me apaixonei ainda no Internato e segui o cami- na 4ª edição e o entusiasmo e o amor que Dr. Paulo tem pela
nho da Pediatria e da Neonatologia. Tive o privilégio de conhe- Neonatologia só aumentam e a gente fica aqui, recebendo amor
cê-lo e depois de ser sua Residente no Hospital Materno Infantil em forma de livro. Cada vez que folhearmos esses livros nos de-
de Brasilia - HMIB e hoje sigo nesse mesmo serviço onde tudo pararemos com o amor que ele tem pelo recém-nascido, pela
começou. E, ao longo de todos esses anos, vi essas sementes vida e por cada um de nós.
germinando. Mais Neonatologistas sendo formados e os livros Obrigada Mestre!!
sendo escritos por ele e pela equipe que tanto ama. Estes livros

Sandra Lúcia Andrade de Caldas Lins,


Médica Pediatra e Neonatologista; Pós Graduação em Saúde, Educação e Desenvolvimento do Bebê UNB; Pós Graduação em
Nutrição Pediátrica Boston University Scholl of Medicine; Médica Assistente da Unidade de Neonatologia do Hospital Materno
Infantil de Brasília - HMIB; Coordenadora Médica da Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília - HMIB;
Coordenadora Médica da Unidade de Neonatalogia do Hospital Santa Lúcia; Presidente do IPN - Instituto de Pesquisas em Neona-
tologia Paulo Roberto Margotto.
– PREFÁCIO –

AUTORES

1. Adriana Kawaguchi Fernandes Araújo 12. Carlos Moreno Zaconeta


Medica Assistente UTI neonatal HMIB; Médica Preceptora Titulo de Especialista em Pediatria e Neonatologia; Preceptor
da Residência de Neonatologia HMIB; Médica Assistente UTI da Residência Médica em Neonatologia do HMIB; Mestre em
Neonatal Hospital Santa Lúcia. Medicina pela UnB; Instrutor de Reanimação Neonatal pela
Sociedade Brasileira de Pediatria.
2. Amanda Torrezan Galigali Pereira da Luz
Fisioterapeuta especialista em Fisioterapia Pneumofuncional 13. Cláudia Janaína Silva Cruz
– UnB; Curso RTA Fisioterapeuta da UTIN-HMIB-SES-DF. Graduada em Medicina pela Escola Superior de Ciências da
Saúde em 2007; Cursou Residência Médica em Pediatria no
3. Alexandre Peixoto Serafim Hospital Regional da Asa Sul, Brasília, DF, no período de 2008
a 2009; Cursou Residência Médica em Nefrologia Pediátrica
Especialista em Terapia Intensiva Pediátrica da UTI Pediátrica
no Hospital de Base do Distrito Federal no período de 2009
do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB) e Supervisor
a 2010; Treinamento em Serviço em Nefrologia Pediátrica no
do Programa de Residência Médica em Terapia Intensiva
Hospital de Base do Distrito Federal no período de 2011 a
Pediátrica.
201; Nefropediatra do Hospital da Criança de Brasília desde
abril de 2012; Nefropediatra do Instituto de Nefrologia de
4. Aline de Aquino Barbosa
Brasília desde janeiro de 2017; Pediatra Geral e Nefropediatra
Nutricionista formada pela Universidade de Brasília, UNB; da RF Pediatria desde setembro de 2017.
Especialista em Saúde Coletiva/Vigilância Sanitária na área
de Alimentos, pela Universidade de Brasília, UNB; Consultora 14. Cristina Targa Ferreira
em Boas Práticas e Análise de Perigos e Pontos Críticos de
Doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal do
Controle (APPCC), pelo Programa Alimentos Seguros (PAS).
Rio Grande do Sul (UFRGS); Especialista em Gastroenterolo-
Nutricionista do Banco de Leite do Hospital Materno Infantil
gia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e
de Brasília (HMIB).
Associação Médica Brasileira (AMB); Especialista em Endosco-
pia Pediátrica pela AMB e Sociedade Brasileira de Endoscopia
5. Ana Carolina Kozak
Digestiva (SOBED); Especialista em Hepatologia pela AMB e
Cardiologista e Intensivista da UTI Cardíaca Pediátrica do Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH); Chefe do Serviço
Instituto de Cardiologia do Distrito Federal. de Gastroenterologia Pediátrica do Hospital da Criança Santo
Antônio – Complexo Hospitalar Santa Casa; Prof. Adjunta de
6. Ana Carolina Pereira de Oliveira Ziller Gastroenterologia Pediátrica da UFCSPA.
Fisioterapeuta especialista em Fisioterapia Neurofuncional
– UnB; Curso no Conceito Neuroevolutivo; Curso RTA; Fisio- 15. Diogo Pedroso
terapeuta da UTIN- HMIB-SES-DF. Pediatra com área de atuação em Infectologia Pediátrica e
Terapia Intensiva Pediátrica; Preceptor do Programa de Re-
7. Ana Célia Dos Santos Brito sidência Médica em Neonatologia e Médico Assistente da
Nutricionista. Especialista em Nutrição Clínica Funcional pela Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de
VP Consultoria Nutricional/ Divisão Ensino e Pesquisa; Consul- Brasília (HMIB); MBA Executivo em Administração: Gestão
tora Internacional em Amamentação pela International Board em Saúde pela Fundação Getúlio Vargas (FGV); Coordenador
of Lactation Consultant Examiners (IBLCE); Chefe do Banco de Médico da UTI Pediátrica do Hospital Santa Luzia - Rede D´or
Leite do Hospital Regional de Sobradinho; Membro da Acade- São Luiz.
mia Brasileira de Nutrição Funcional. Coach Nutricional.
16. Elisa de Carvalho
8. Ana Lúcia Moreira do Nascimento Doutora e Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade de
Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria; Brasília, com área de concentração em Pediatria. Especialista
Médica Assistente na Unidade de Neonatologia do Hospital em Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade
Materno Infantil de Brasília. Brasileira de Pediatria (SBP) e Associação Médica Brasileira
(AMB); Diretora clínica do HCB. Supervisora da Residência
9. Ana Paula Amaral Médica em Gastroenterologia Pediátrica do HBDF/HCB.
Professora do Curso de Medicina do Centro Universitário
Cirurgiã Pediatra do Hospital Materno Infantil de Brasília; de Brasília;  Membro da Academia de Medicina de Brasília;
Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica; Coor- Membro do Departamento de Hepatologia da Sociedade
denadora do Ambulatório de Manejo Colorretal do Hospital Brasileira de Pediatria; Autora de 04 livros de Gastroentero-
Materno Infantil de Brasília. logia e Hepatologia em Pediatria, lançados em 2003, 2011 e
2018 (editora Manole); Autora de vários capítulos de livros
10. Ana Paula Moreira referências para estudos de Pediatria e Gastroenterologia Pe-
Cirurgiã Pediátrica do Hospital Materno Infantil de Brasília/ diátrica; Publicações em revistas internacionais de Pediatria e
SES/DF. Gastroenterologia Pediátrica; Revisora do Jornal de Pediatria;
Presidente do Departamento de Gastroenterologia Pediátri-
11. Carla Pacheco Brito ca da Sociedade de Pediatria do DF.
Especialista em Pediatria e Neonatologia pela Sociedade
Brasileira de Pediatria; Médica Assistente da Unidade de
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília.
– AUTORES –

17. Emmanuelle S. Coutinho 28. Flávia Alice Timburibá de Medeiros Guimarães


Especialista em Audiologia Clínica. Fonoaudióloga da Unida- Especialista em Pediatria e Área de Atuação em Alergia e
de de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília. Imunologia do Programa de Residência Médica de Alergia e
Imunologia Pediátrica do HMIB/SES/DF.
18. Erika Ibiapina
Médica Assistente da Unidade de Neonatologia do Hospital 29. Geórgia Quintiliano Carvalho da Silva
Materno Infantil de Brasília/SES/DF. Especialista em Pediatria e Neonatologia pela Sociedade
Brasileira de Pediatria; Médica Assistente da Unidade de Neo-
19. Elysio Moraes Garcia natologia do Hospital Regional da Asa Sul Materno Infantil
de Brasília.
Docente do curso de medicina da ESCS; Especialista em car-
diologia com habilitação em Ecocardiografia pela Sociedade
Brasileira de Cardiologia; Médico Cardiologista da Unidade 30. Giane M. César
de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília; Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pe-
Docente do Centro Universitário de Brasília (Uniceub); diatria; Médica Assistente da Unidade de Neonatologia do
Hospital Materno Infantil de Brasília.
20. Evely Mirela Santos França
Graduada em Medicina pela UFBA em 1994; Residência Mé- 31. Gilda Porta
dica de Pediatria SES/DF Em 1995/1996; Residência Médica Prof. Livre-Docente do Departamento de Pediatria da FMUS-
de Neonatologia SES/DF Em 1997; Título De Especialista em P;Médica do Grupo de Hepatologia e Transplante Hepático
Pediatra pela SBP em 1999; Médica Assistente na Unidade do Hospital Menino Jesus, H. Sírio-Libanês e A C Camargo
de Neonatologia do HMIB/SES/DF desde 2000; Título de Câncer Center- São Paulo.
Especialista em Neonatologia pela SBP em 2002; Preceptora
do Programa de Residência Médica (PRM) de Neonatologia 32. Hélida Adelina Maia
HMIB/SES/DF desde 2004; Supervisora do PRM DE e Neona- Fonoaudióloga Clínica da UTI Neonatal do HMIB; Especialista
tologia do HMIB/SES/DF desde e 2009. em Linguagem; Tutora do Método Canguru.

21. Fabiana M. Pontes 33. Isadora de Carvalho


Especialista em Pediatria e Neonatologia pela Sociedade de Especialista em Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela
Pediatria. Médica; Médica Assistente da Unidade de Neona- SBP e AMB; -Curso de Aperfeiçoamento em Transplante de
tologia do Hospital Regional da Asa Sul/Hospital Materno Fígado Pediátrico (Hospital Sírio-Libanês e Ministério da Saú-
Infantil de Brasília. de); Preceptora do Programa de Residência Médica de Pedia-
tria no Hospital Materno Infantil de Brasília/SES/DF; Pediatra
22. Fabiana Márcia de Alcântara Morais e Gastroenterologista Pediátrica no Hospital Materno Infantil
de Brasília e no Hospital da Criança de Brasília.
23. Fabiano Cunha Gonçalves
Título de Especialista em Neonatologia (TEN); Médico Assis- 34. Jaisa Ma M. Moura (in memorian, 2012)
tente da Unidade de Neonatologia Hospital Materno Infantil Mestre em Ciências Médica pela Universidade de Brasília
de Brasília (HMIB) e da Unidade de Neonatologia Hospital (UnB); Especialista em Cirurgia Geral pela Sociedade Brasi-
Santa Marta/ DF. leira de Cirurgia; Especialista em Cirurgia Pediátrica pela So-
ciedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica; Cirurgiã Pediátrica
24. Fábio Augusto Albanez Souza do Hospital Regional da Asa SUL/Hospital Materno Infantil
Cirurgião Pediátrico do Hospital Materno Infantil de Brasília/ de Brasília.
SES/DF.
35. Jane Júnia S Ramos Albernaz
25. Fabíola Scancetti Tavares Fisioterapeuta especialista em Traumato-Ortopédica e Des-
Pediatra, Alergista e Imunologista; Mestre em Ciências Apli- portiva, PUC; Curso em Reedecation Posturale Globale ( RPG
cadas à Pediatria pela UNIFESP/EPM; Responsável pela Área PH Souchard); Fisioterapeuta da UTIN- HMIB- SES- DF.
de Imunologia Infantil do Hospital da Criança de Brasília;
Responsável pelo Ambulatório de Infecções de Repetição do 36. Jefferson Guimarães de Resende
Hospital Universitário de Brasília. Especialista em Pediatria pela UFRJ; Doutor em Ciências Mé-
dicas pela UnB, Intensivista Neonatal do Hospital Regional da
26. Fávia de Azevedo Belêsa Asa Sul/Hospital Materno Infantil de Brasília, de 1986 a 2009.
Formada pela Universidade de Brasília - UnB na Turma;
Residência Médica de Cirurgia Geral na Universidade 37. João Francisco Volpe Junior
Federal do Triângulo Mineiro; Residência Médica de Cirurgia Médico pela Universidade de Brasília (UnB); Anestesista pelo
Pediátrica na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; Hospital de Base do Distrito Federal.
Pós-Graduação de Videocirurgia pelo IPEMEC - UNICETREX;
Cirurgiã Pediátrica no HMIB.
38. Jorge Yussef Afiune

27. Felipe Teixeira de Mello Freitas Diretor da Divisão de Cardiologia Pediátrica do Instituto de
Cardiologia do Distrito Federal; Doutor em Medicina pela Uni-
Médico infectologista do Núcleo de Controle de Infecção versidade de São Paulo – Área de Concentração em Pediatria.
Hospitalar do Hospital Materno Infantil de Brasília. Doutora-
do em Medicina Tropical com ênfase em Epidemiologia das
Doenças Infecto Parasitárias pela Universidade de Brasília;
Docente da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS).
– AUTORES –

39. Joseleide de Castro 47. Marcia Cristina Mondaini Salazar


Residência Médica em Pediatria e Terapia Intensiva Pediátri- Especialista em Alergia e Imunologia pela Associação Brasi-
ca; Especialista em Pediatria e Neonatologia pela Sociedade leira de Alergia-Imunopatologia - ASBAI; Especialista em Pe-
Brasileira de Pediatria; Médica Assistente da Unidade de diatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria - SBP; Ex-coor-
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília; Médi- denadora do Programa de Asma do Distrito Federal - SES-DF;
ca Assistente do Hospital Santa Lucia (Unidade de Terapia Ambulatório de Alergia e Imunologia Pediátrica do Hospital
Neonatal); Preceptora do Programa de Residência Médica de Regional da Asa Sul/ Hospital Materno Infantil de Brasília.
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília.
48. Marcos Ortega Judice
40. Kátia Rodrigues Menezes
Cirurgião Pediatra na Hospital Materno Infantil de Brasília
Enfermeira na Secretaria de Estado de Saúde do DF; Docente (HMIB); Cirurgião Pediatra do Hospital da Criança de Brasília
do Curso de Graduação em Enfermagem da Escola Superior (HCB); Preceptor de Residência Médica em Cirurgia Pediátri-
de Ciências da Saúde; Especialista em Educação e Promoção ca do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB); Cirurgião
da Saúde; Especialista em Saúde da Família; Especialista Pediatra na Área de Urologia Pediátrica no Hospital Materno
em Formação Pedagógica na Área de Saúde: Enfermagem; Infantil de Brasília (HMIB).
Especialista em Gestão do Trabalho e Educação na Saúde;
Mestranda em Ciências da Saúde pela Escola Superior de 49. Maria Eduarda Canellas de Castro
Ciências da Saúde.
Médica Pediatra pela Universidade de Brasília e especialista em
Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria. Residente de
41. Laurista Corrêa Filho
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília.
Assistente Estrangeiro dos Hospitais de Paris.
50. Maria Grasiela de Paula
42. Letícia Martins Narciso
Enfermeira, Técnica de enfermagem da UTIN do HMIB há 10 anos.
Fisioterapeuta especialista em Fisioterapia Neurofuncional –
UNB; Especialista em gestão em saúde – FioCruz; Curso no 51. Maria Luíza Almada
Conceito Neuroevolutivo; Certificada em Avaliação de Gene-
ral Movements; Chefe do Núcleo de Saúde Funcional HMIB. Residência em Pediatria, Especialização em Saúde Pública e
Medicina Tropical. Médica Assistente (Alojamento Conjunto)
da Unidade de Neonatologia do HMIB/SES/DF e da UTI Neo-
43. Lisliê Capoulade
natal (Alojamento Conjunto) do Hospital Santa Lúcia.
Doutor em Ciências Médicas pela Universidade de Brasília;
Professora do Curso de Medicina da Escola Superior de 52. Maria Teresinha de Oliveira Cardoso
Ciências da Saúde (ESCS); Preceptora da Pediatra  do Hospital
Regional da Asa Sul/ Hospital Materno Infantil de Brasília. Medica Geneticista, Responsável Técnica pelo Laboratório de
Triagem Neonatal Ampliada da SES, Coordenadora de Gené-
tica e Doenças Raras da SES. Professora adjunta do Curso de
44. Liu Campelo Porto
Medicina Universidade Católica de Brasilia.
Mestre em Ciências da Saúde (área de concentração em
epidemiologia) pelo Programa de Pós-graduação em 53. Maria Rita Carvalho Garbi Novaes
Ciências da Saúde da Universidade de Brasília; Docente da
Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS); Neonatologista Farmacêutica-Bioquímica graduada pela Universidade
e Infectologista Pediátrica do Hospital Regional da Asa Sul/ Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS); Mestrado em Quí-
Hospital Materno Infantil de Brasília. mica Farmacológica pela Universidade de Brasília (UNB);
Mestrado em Metodologias Ativas pela Universidade de
Maastrich, Holanda; Doutora em Farmacologia Clínica pela
45. Lucila Nagata
UNB; Pós-Doutora em Ética em Ensaios Clínicos pela Univer-
Médica formada pela Faculdade de Medicina na Univer- sidade do Chile; Titular da Academia Brasileira de Ciências
sidade de Brasília (UnB) em 1988; Residência médica em Farmacêuticas; Farmacêutica hospitalar da SES/DF desde
Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Regional da Asa Norte 1988; Professora do Curso de Medicina e dos Mestrados e
(HRAN) em 1989/1990; Título de Especialista em ginecologia Doutorados dos Programas de Pós graduações em Ciências
e obstetrícia pela FEBRASGO desde 1991; Médica do Serviço da Saúde da ESCS e da UNB desde 2000; Membro do Comi-
de Gestação de Alto Risco do Hospital Materno Infantil de tê de Ética em Pesquisa (CEP/FEPECS) e da Comissão Nacio-
Brasília desde 1994 até a presente data; Chefe do Serviço de nal de Ética em Pesquisa (CONEP/MS); -Possui mais de 150
Ginecologia e Obstetrícia no período de junho de 2012  a artigos publicados em Revistas Nacionais e Internacionais.
31/12 de 2018; Membro do Comitê de Mortalidade Mater-
na da FEBRASGO desde 2015 até a presente data; Membro 54. Marcela Soares Silva Ferreira
da Diretoria da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia de
Brasília (SGOB). Fisioterapeuta Especialista em Fisiologia - Gama Filho – RJ;
Coordenadora da Equipe de Fisioterapia da UTIN- HMIB.
46. Ludmylla de Oliveira Beleza
55. Márcia Pimentel de Castro
Graduação em Enfermagem e Obstetrícia pela Universidade
de Brasília (2002); Pós-Graduação em Terapia Intensiva pela Médica Pediatra/Neonatologia, Pós Graduada em Bioética
Universidade Católica de Goiás e em Educação Profissional pela Universidade de Brasília; Mestrado em Ginecologia/
pela FIOCRUZ; Mestre pelo Programa de Pós-Graduação de Obstetrícia com Área de Atuação em Perinatalogia pela
Enfermagem da Universidade de Brasília; Supervisora do Universidade Estadual de São Paulo/UNESP; Atuou como
Programa de Residência de Enfermagem em Neonatologia Médica Intensivista Neonatal -SES DF até junho 2015; Médica
do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB) de 2009 a Rotineira da Unidade Neonatal/HUB (Universidade de Brasí-
2014; Enfermeira assistencial da Unidade de Terapia Intensiva lia) desde julho 2015. Docente do Curso de Medicina da ESCS
Neonatal do HMIB. (Escola Superior de Ciências da Saúde) de 2009 a 2015.
– AUTORES –

56. Mariana Gadelha Coordenadora da Nefrologia Pediátrica do Instituto de Nefro-


Médica formada pela UFPB - Universidade Federal da Paraíba logia de Brasília desde 2016.
em 2001; Residência Médica em Pediatria no HMIB- SES - DF
em 2002-2003; Residência Médica em Medicina do Adoles- 63. Milena Conde Nogueira Pires
cente - HBDF - SES DF em 2004; Especialização em Endocri- Graduada em Medicina pela Universidade Regional de
nologia Pediátrica na UFPR - Universidade Federal do Paraná Gurupi-TO (UNIRG), Pediatra pelo Hospital Materno Infantil
/ 2005-2006; Título de especialista em Pediatria em 2004 e de Brasília (HMIB), Pós-Graduada em Saúde da Família pela
em Pediatria com Área de Atuação em Endocrinologia Pediá- Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), atual-
trica em 2007; Médica Pediatra / Endocrinopediatra do HMIB mente é Médica Residente em Neonatologia no HMIB e atua
desde 2006; Médica Endocrinopediatra do HFA (Hospital das como Médica em Neonatologia na Secretaria de Saúde do
Forças Armadas) desde 2008 e Médica Endocrinopediatra do Distrito Federal.
HCB (Hospital da Criança de Brasília) desde 2011. Atualmente
Preceptora do internato da ESCS e Preceptora da Residência 64. Miriam Martins Leal
Médica em Pediatria do HMIB.
Medica pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS);
Pediatra pelo Hospital Materno-Infantil de Brasília (HMIB);
57. Marina Betiol Nogueira Medica Concursada da Unidade de Neonatologia do HMIB;
Médica Pediatra pelo Hospital Materno Infantil de Brasília Docente do Centro Universitário de Brasília (Uniceub); Mes-
(HMIB); Médica Gastroenterologista Pediátrica pelo Hospital tranda pela Escola Superior de Ciências da Saúde.
de Base de Brasília (HBDF); Médica Pediatra da Área de Gas-
troenterologis Pedátrica do Hospital da Criança de Brasília 65. Miza M B A Vidigal
(HCB).
Medica formada pela Universidade de Brasília;
58. Maristela Estevão Barbosa Residência em Pediatria e Neonatologia na SES/DF e Titulo
de Especialista em Pediatria e Neonatologia pela SBP; Medica
Formado em Medicina pela Universidade Federal do Triângu- da SES Na Unidade de Neonatologia do HMIB.
lo Mineiro, Uberaba (1993); Educação Formal:1995 – 1998: Es-
pecialização em Endocrinologia Pediátrica pela Universidade
66. M. Monset Couchard
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, São Paulo;
1997 – 1998: Especialização - Residência Médica pela Uni- Chargée de Recherche INSERM e Pediatre Attaché, Unidade
versidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, de Cuidados Intensivos de Port-Royal, Centro Hospitalar
São Paulo, (Título: Pediatria 3 Endocrinologia; 1995 – 1997: Universitário de Cochin Port- Royal, Universidade René Des-
Especialização - Residência Médica. Universidade Estadual cartes, Paris, França.
Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, São Paulo, Título: Pe-
diatria Conselheiro. Médica Pediatra da Secretaria de Saúde 67. Mônica de Lima Lemos
do Distrito Federal (SESDF). Especialista em Terapêutica Ocupacional com área de atua-
ção em recém-nascidos e lactentes no Hospital Regional da
59. Marta David Rocha de Moura Asa Sul/Hospital Materno Infantil de Brasília.
Pediatra Neonatologista do Hospital Materno Infantil de
Brasília, Mestre em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia pela 68. Nathalie de Abreu Cardoso Zambrano
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Bo- Especialista em Pediatria pela Sociedade de Pediatria;
tucatu. Doutoranda da Faculdade de Ciências da Saúde da Pós-graduação em Endocrinologia Pediátrica pela Univer-
Universidade de Brasília. Professora e atual Diretora da Escola sidade de Brasília; Membro do Departamento Científico de
Superior de Ciências da Saúde e Diretora técnica do Instituto Aleitamento Materno da Sociedade de Pediatria do Distrito
de Pesquisa em Neonatologia Paulo Roberto Margotto. Federal (SPDF); Médica Responsável pelas Atividades Médi-
cos Assistências do Posto de Coleta de Leite Humano de São
60. Martha Vieira Sebastião-DF.
Coordenada da Neonatologia da Secretaria de Estado de
Saúde do Distrito Federal; Médica Assistente da Unidade de 69. Nara Vanessa Costa
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília. Fisioterapeuta especialista em Reabilitação do Portador de
Deficiências Físicas Incapacitantes pelo HCFM-USP; Tutora
61. Mauro P. Felipe Baças em atenção humanizada ao recém nascido (Método Can-
Especialista em Pediatria e Neonatologia pela Sociedade guru); Fisioterapeuta da UTI Neonatal do HMIB; Certificação
Brasileira de Pediatria; Médico. Assistente da Unidade de pelo método Reequilíbrio Tóracoabdominal (RTA).
Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília.
70. Neulânio Francisco de Oliveira
62. Maya Caetano Paes de Almeida Médico Pediatra, Neonatologista e Paliativista; Mestre em
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina da Uni- Saúde Pública; Membro do Departamento de Dor e Medici-
versidade Federal de Minas Gerais em 2004; Cursou Residên- na Paliativa da Sociedade Brasileira de Pediatria; Membro do
cia Médica em Pediatria no Hospital Universitário de Brasília Comitê de Perinatologia da Academia Nacional de Cuidados
no período de 2005 a 2006; Cursou Residência Médica em Paliativos.
Nefrologia Pediátrica no Hospital de Base do Distrito Federal
no período de 2007 a 2008; Cursou o Aprimoramento em 71. Patrícia Leão Bered
Transplante Renal Pediátrico no Hospital Samaritano de São Médica formada pela Pontifícia Universidade Católica do RS;
Paulo no Período de 2016 a 2017; Título de Especialista em Residência em Pediatria – Hospital São Lucas da PUCRS; Resi-
Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria; Atuou como dência em Neonatologia – Hospital São Lucas da PUCRS; Titulo
Preceptora da Residência Médica em Nefrologia Pediátrica de Especialista em Pediatria pela SBP; Titulo de Especialista em
no Hospital de Base do Distrito Federal no período de 2017;
– AUTORES –

Neonatologia pela SBP; Psicoterapeuta Pais-Bebê  -  Formada 79. Samiro Assreuy


pelo Instituto de Psicanálise da Universidade de Columbia Médico Assistente da Unidade de Neonatologia do Hospital
– Nova York; Atualmente atua na interface Neonatologia / l Materno Infantil de Brasília.
Psicoterapia Pais-Bebês  na UTI Neonatal do Hospital Materno
Infantil de Brasília (HMIB); Médica Integrante da Equipe de 80. Sandra Lins
Cuidados Paliativos  Perinatal no HMIB.
Médica Pediatra e Neonatologista; Pós Graduação em Saúde,
Educação e Desenvolvimento do Bebê UNB; Pós Graduação
72. Paulo Lassance
em Nutrição Pediátrica Boston University Scholl of Medicine;
Professor de Cirurgia Pediátrica da Universidade Católica de Médica Assistente da Unidade de Neonatologia do Hospital
Brasília; Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediá- Materno Infantil de Brasília - HMIB; Coordenadora Médica da
trica; Cirurgião Pediátrico do Hospital Materno Infantil de Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de
Brasília/SES/DF. Brasília - HMIB; Coordenadora Médica da Unidade de Neona-
talogia do Hospital Santa Lúcia; Presidente do IPN - Instituto
73. Raquel Prata Da Fonseca de Pesquisas em Neonatologia Paulo Roberto Margotto.
Nutricionista formada pela Universidade de Brasília, UNB.
Especialista em saúde pública pela University of British Co- 81. Sérgio Henrique Veiga
lumbia, UBC/CA. Nutricionista do Banco de Leite do Hospital Médico Pediatra, área de atuação em Neurologia Pediátrica,
Materno Infantil de Brasília. trabalhando nas clínicas Pediátrica e Neonatal do Hospital
Regional da Asa Sul/Hospital Materno Infantil de Brasília; Do-
74. Raulê de Almeida cente e Coordenador de Módulo do 4° ano do Curso de Me-
Médico, Pediatra, Neonatologista, Especialista em Perinato- dicina da Escola Superior de Ciências da Saúde l (ESCS-DF).
logia e Desenvolvimento da Criança – UnB; Especialista em
Desenvolvimento na Infância – Centro de Estudos, Pesquisa 82. Sylvia Freire
e Atendimento Global na Infância e Adolescência – BSB/DF Pediatra do HMIB. Preceptora do PRM de Infectologia Pe-
E CENTRO LYDIA CORIAT – Porto Alegre / RS. Mestrando em diátrica do HMIB. Infectologista Pediátrica do Hospital da
Psicologia Clínica E Cultura – UnB; Tutor para Formação em Criança de Brasília.
Atenção Humanizada - Método Gang uru – MS; Instrutor Do
Programa de Reanimação Neonatal – SBP; Assistente em Pe- 83. Tatiana Santos Freire Ribeiro Netto
diatria e Terapia Intensiva Neonatal – HFA e Mil /DF; Preceptor
da Residência Médica em Pediatria e Neonatologia – HFA e Graduação em Enfermagem e Obstetrícia pela Universidade
HMIB/DF; Coordenador de Especialidade Neonatal dos Hos- de Brasília (2005); Residência de Enfermagem Materno In-
pitais da SES/DF; Assistente Em Puericultura – PueriClínica. fantil, com aprofundamento em Neonatologia pela FEPECS
(2006); MBA em Gestão em Saúde e Controle de Infecção
pela INESP (2018); Tem experiência na Área de Supervisão
75. Renilde Barros Tavares
e Assistência de Enfermagem, com ênfase em Enfermagem
Enfermeira Especialista em Administração Hospitalar pela em Neonatologia; Preceptora da Residência em Enfermagem
Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP; Especialista em em Neonatologia (2015 - 2017); Atua como Enfermeira na UTI
Enfermagem em Neonatologia pela Associação Brasileira Neonatal no HMIB desde 2006.
de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras – ABENFO; Tutora da
Metodologia Canguru- Ministério da Saúde; Enfermeira As-
84. Tayana T. de Almeida
sistencial da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do HMIB;
19 anos de atuação na Área de Neonatologia. Especialista em Audiologia Clínica; Fonoaudióloga da Unida-
de de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília.
76. Rodolfo Alves Paulo de Souza
85. Vanessa Gonzaga Tavares Guimarães
Mestrado em Oftalmologia pela Universidade de Brasília
(UnB) – Retinopatia da Prematuridade; Residência em Of- Especialista em Pediatria pela SBP e Alergia e Imunolopa-
talmologia–Hospital das Forças Armadas Brasília/DF; Título tologia pela ASBAI; Preceptora do Programa de Residência
de Especialista em Oftalmologia pela Comissão Nacional Médica de Alergia e Imunologia Pediátrica do HMIB; RTD
de Residência Médica do Ministério da Educação e Cultura colaboradora da Pneumologia - SES/DF.
e pela Associação Médica Brasileira; Médico concursado do
Hospital Materno Infantil de Brasília, responsável pelo setor 86. Vanessa Macedo Silveira Fuck
de Retinopatia da Prematuridade. Graduada em medicina pela Universidade Federal de Brasília
- UnB. Especialização em Pediatria (Residência Médica) no
77. Rosângela C. Marinho Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB); Especialização
Especialista em Terapia Intensiva Pediátrica; Médica Assisten- em Gastroenterologia Pediátrica (Residência Médica) no Hos-
te da Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil pital de Base do DF (HBDF); Tílulo de especialista em Pediatria
de Brasília. pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP); Título de especia-
lista em Gastroenterologia Pediátrica; Médica Pediátrica no
Banco de Leite Humano – HMIB; Preceptora de Residência
78. Rozilene Bastos Cabral Muniz
Médica de Pediatria – HMIB; Presidente do Departamento
Especialista em Pediatria (Residência pela Fundação Hospi- Científico de Aleitamento Materno da Sociedade de Pediatria
talar do Distrito Federal); Especialista em Alergia e Imuno- do Distrito Federal (SPDF).
logia pela Associação Brasileira de Alergia-Imunopatologia
- ASBAI; Ambulatório de Alergia e Imunologia do Hospital de
Base de Brasília.
– AUTORES –

87. Vanessa Siano da Silva 90. Yanna Aires Gadelha de Mattos


Pediatra Infectologista na Região Sul de Mato Grosso; Plan- Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pe-
tonista na UTI Neonatal da Santa Casa de Rondonópolis, diatria; Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela
MT; Médica Responsável pelo Home Care Pediátrico em Associação Médica Brasileira, Sociedade Brasileira de Pediatria
Rondonópolis; Formada pela UFMT; Residência em Pediatria e Federação Brasileira de Gastroenterologia; Pós-graduação
e Infectologia no Hospital Regional da Asa Sul/ Hospital Ma- em Nutrição Pediátrica pela Boston University School of Me-
terno Infantil de Brasília. dicine, Mestranda em Ciências da Saúde pela Universidade de
Brasília (UnB); Médica Preceptora da Residência de Pediatria
88. Viviana I Intriago Sampietro Serafim do Hospital Materno Infantil de Brasília e do Hospital da Crian-
Médico pela   Universidad Central del Ecuador Facultad de ça de Brasília e Professora do Curso de Medicina do Uniceub.
Ciências Médicas Escuela de Medicina, Título revalidado na
UNB; Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de 91. Wandréa Marcinoni
Pediatria; Residência Médica na UNB; Especialista em Terapia Formada em Medicina pela Universidade Federal do Ma-
Intensiva Neonatal; Residência Médica na UTI Neonatal do ranhão, 1998; Residência Médica em Pediatria no Hospital
HMIB; Especialista em Terapia Intensiva Pediátrica pela AMIB Regional de Taguatinga, DF (HRT) 1998 a 2000, Residência
e SBP; Residência Médica no HMIB; Médica Coordenadora Médica em Neonatologia no HRT 2000 a 2001; Residência
Médica da UTI Infantil do Hospital Anchieta; Médica diarista Médica em Terapia Intensiva Pediátrica 2001 a 2002; Médica
da UTI Pediátrica do Hospital Brasília; Médica Plantonista da da SES em Terapia Intensiva Neonatal desde 2002 no HMIB;
UTI Neonatal do Hospital Regional de Sobradinho SES. TEP 2001 e TEN 2004.

89. Virginia Lira da Conceição


Medica Pediatra Neonatologista HMIB; Instrutora do Pro-
grama de Reanimação Neonatal e Vice Coordenadora do
Programa de Reanimação Neonatal DF; Responsável Técnico
Distrital de Neonatologia SES-DF.
PREFÁCIO DA 3ª EDIÇÃO
O homem faz a sua obra. A obra, faz o homem.

Prefiro assim iniciar, com estas palavras, o prefácio solicitado rotineiros e elementares, passando pelos grandes tópicos ligados
para a 3ª. Edição do livro “Assistência ao Recém-Nascido de Risco”, ao recém-nascido e à sua família, até as discussões bioéticas en-
de autoria do Dr. Paulo R. Margotto. volvendo a mortalidade neonatal.
Conheço o Dr. Paulo R. Margotto, há, acredito três décadas. E as sessões clínico-patológicas realizadas com seus compa-
Margotto além de estar sempre atuando na Unidade de Neo- nheiros da Unidade Neonatal e, quase sempre, enriquecida pela
natologia do Hospital Regional da Asa Sul/Hospital Materno participação de seus jovens alunos médicos residentes. Sessões
Infantil de Brasília, sempre via-o, frequentando, os Congressos extremamente importantes ao aprendizado de todos, em espe-
de Pediatria e de Perinatologia. E sempre lá estava participando cial aos jovens alunos e médicos residentes, que usufruíam do
como ouvinte dos convidados nacionais e internacionais e apre- conhecimento, dedicação de Margotto e de sua disponibilidade
sentando trabalhos realizados com seus alunos-residentes. Mar- em distribuir o conhecimento.
gotto sempre estava publicando normas atualizadas, discutindo A obra aumenta: agora nos chega a 3ª. Edição, com 86 capí-
artigos internacionais e... enviando a seus amigos. E aí, a obra tulos, e mais de 600 páginas e uma grande relação de convidados
armazenada, torna-se um livro, “Assistência ao Recém-Nascido de especiais participando como colaboradores.
Risco” em sua primeira edição.
No entanto, o trabalho do homem Margotto vai muito
O trabalho na Unidade hospitalar, crescia, fervilhava de alu- além de suas publicações. A preocupação que ele tem com
nos, companheiros e colaboradores e tudo isso, mais os resumos quem o cerca no dia a dia do trabalho, com quem trabalha com
comentados dos Congressos, chegavam a todos nós, membros recém-nascidos, continua, célere e incansável. A sua capacidade
de uma lista, trazendo as informações colhidas (escritas, gravadas, de trabalho só é suplantada pela sua capacidade de distribuir
filmadas) didaticamente discutidas e comentadas. conhecimentos, adquiridos aqui e ali e, sempre, compartilhados.
E veio a 2ª. Edição do livro “Assistência ao Recém-Nascido Margotto lança mais uma edição de seu livro “Assistência
RN de Risco” sempre com a preocupação de discutir todos os ao Recém-Nascido de Risco”. Sua obra cresce para fazer jus ao
aspectos ligados a essa assistência, desde seus aspectos mais grande homem que ele é.

José Dias Rego,


Membro da Academia Brasileira de Pediatria

A teoria sem a prática é nula


A prática sem a teoria é cega

Este livro é um exemplo de produção de conhecimentos de saúde no contexto de uma rede de serviços. Eles são muito
científicos e tecnológicos a partir de uma rede pública de servi- cientes de que uma rede de serviços para se desenvolver, neces-
ços de saúde: a rede da SES-DF. Exemplo também do que o Mi- sita ter uma escola em sua estrutura de funcionamento: rede e
nistério da Educação e o Ministério da Saúde preconizam: através escola, com objetivos comuns, alcançando benefícios mútuos,
do trabalho do dia a dia na rede assistencial do SUS, é possível através da integração Ensino-Serviços.
produzir conhecimentos voltados para a melhoria permanente O Professor Paulo Roberto Margotto vem realizando seus
dessa mesma rede assistencial. trabalhos para o desenvolvimento de habilidades profissionais
O Professor Doutor Paulo Roberto Margotto pertence ao cor- que garantam as competências necessárias a uma boa prática
po docente de um novo curso de medicina que o GDF implantou e ao bom desempenho clínico, dirigidos para uma melhoria
em 2001, com a criação da Escola Superior de Ciências da Saúde contínua da qualidade da atenção e da assistência à saúde de
(ESCS). Mantém ao mesmo tempo, assim como os demais docen- recém-nascidos de risco.
tes dessa Escola, grande parte de sua carga horária de trabalho No desempenho dessa função assistencial–educadora, o pro-
em serviços do SUS-DF. Esse grupo de docentes do qual ele faz fessor Paulo R. Margotto, sempre procurou garantir o domínio da
parte, guiados pelo Projeto Político Pedagógico da ESCS, procu- fisiopatologia e da consistência dos dados e análises epidemioló-
ram desenvolver novas abordagens de educação de profissionais gicas – bases da produção de seus conhecimentos. Direciona-os
– PREFÁCIO –

ao mesmo tempo para os serviços que os originaram para as ativi- clínica ampliada, uma vez que procura abordar os aspectos que
dades educacionais correlatas. Nesse sentido, o livro é também o envolvem o contexto de vida do recém-nascido grave como
auge de uma fértil e longa trajetória de divulgação de publicações resultados que são, muitas vezes, das condições sociais, econô-
contendo artigos relevantes e relatórios estatísticos, além de micas e culturais tanto dos pacientes como dos próprios serviços
sugestões de condutas próprias para a Assistência ao Recém-nas- de saúde – tal como ocorre na maioria dos serviços brasileiros de
cido de Risco. São produtos dos bons resultados da Unidade de neonatologia.
Neonatologia do Hospital Regional da Asa Sul/Hospital Materno É pro isso que o livro expressa o essencial das Diretrizes Cur-
Infantil de Brasília, fruto dos esforços do conjunto dos profissionais riculares Nacionais/MEC que determinam que além de um sólido
ali lotados. Úteis no cotidiano por dirigirem-se a profissionais que conhecimento profissional específico, o profissional formado
trabalham “na ponta”, aquelas publicações, aprimoradas e no seu deve adquirir também em sua formação outros domínios e com-
tempo natural, resultaram no livro ASSISTÊNCIA AO RECEM NAS- petências gerais tais como atenção à saúde, tomada de decisão,
CIDO DE RISCO, que agora ganha nova edição. comunicação, liderança, administração e gerenciamento de serviços
Fiel à Aprendizagem Baseada em Problemas – método de e educação permanente. O livro expressa a própria evolução da
ensino adotado na ESCS, o arranjo didático-expositivo do livro especialidade e certamente sua leitura por estudantes, residen-
problematiza toda a amplitude da temática desses conheci- tes, estagiários e profissionais dessa área da saúde fortalece o
mentos e das práticas sugeridas. Enquadra-se na denominada domínio do novo paradigma da clínica atual.

Mourad Ibrahim Belaciano,


Diretor Geral da ESCS 2001-2012
Professor do DSC-FS/UnB
– PREFÁCIO –

PREFÁCIO DA 2ª EDIÇÃO

Há médicos que aprendem a ciência e a arte da medicina e quase que inevitavelmente, num livro de Neonatologia, agora
as usam em benefício de seus pacientes. Há outros, entretanto, oferecido à comunidade pediátrica pelo Dr. Margotto e seus
que possuem o dom da inquietude sadia que, além disto, os leva colaboradores.
a dividir o seu aprendizado e suas reflexões com seus pares e Trata-se de um livro prático, para consulta rápida, editado
seus alunos, divulgando dados e informações, descrevendo suas em português por quem conhece a Neonatologia, mas conhe-
experiências, multiplicando o conhecimento que se irá traduzir ce também as peculiaridades da Neonatologia no Brasil. Estas
em benefícios a um número maior de pacientes. publicações são muito úteis ao médico na linha de frente e ao
Nesta categoria de inquietos situa-se o Dr. Paulo R. estudante e complementam os amplos e detalhados tratados,
Margotto. De uma forma continuada, através dos anos, o Dr. tão bem desenvolvidos nos Estados Unidos e na Europa.
Margotto tem divulgado para todo o Brasil dados estatísticos O livro aqui apresentado é bastante abrangente e, além dos
da Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de clássicos temas de tratamento intensivo neonatal, contempla
Brasília, reproduções e resumos de artigos neonatais relevan- ainda aspectos importantes da pediatria preventiva neonatal.
tes e experiências pessoais e de seu grupo. Poder-se-ia prever
Está, pois, plantada a árvore. Que ela dê muitos frutos.
que este acervo coletado por longo período desembocaria,

Renato M. Fiori,
Professor de Neonatologia
PUCRS, Porto Alegre

PREFÁCIO DA 1ª EDIÇÃO
"É inútil procurar encurtar o caminho (...)
Pois existe a trajetória e a trajetória não é apenas um modo de ir.
A trajetória somos nós mesmos."

Certa vez Wiston Churchill disse que um autor passa por Nos últimos anos ele já vinha sendo tão abrangente e
diversas fases ao escrever um livro. Nas fases iniciais tudo é completo que sua compilação em livro tornava-se mandatória
novidade, uma. Entretanto, lá pelo final passa a ser uma tirania e inevitável.
que governa sua vida. É, exatamente no momento em que você É com enorme prazer que vejo minha expectativa se concretizar!
começa a se acostumar com a sua servidão, você mata o monstro
Com este trabalho sobre "Assistência ao Recém-Nascido de
e o atira para o público.
Risco", Paulo Margotto nos brinda com uma obra extremamente
Há muitos anos venho acompanhando o trabalho do Dr. prática e objetiva sobre as principais patologias encontradas no
Paulo R. Margotto à frente da Unidade de Neonatologia do dia-a-dia por profissionais de saúde que prestam assistência a
Hospital Materno Infantil de Brasília e durante este período tenho recém-nascidos de risco.
sido presenteado com boletins informativos anuais emitidos por
Tenho plena convicção de que a realização de um trabalho
sue serviço.
desta magnitude é sempre o produto da contribuição de diversas
Estes Boletins Informativos, inicialmente apenas relatos pessoas, a despeito da solidão aparente de quem o subscreve.
estatísticos da Unidade de Neonatologia do HMIB, foram gradati-
A Neonatologia Brasileira se engrandece com esta obra de
vamente incorporando artigos relevantes e sugerindo condutas
Paulo Roberto Margotto e sua Equipe.
práticas na assistência ao recém-nascido.

Prof. Dr. Manoel de Carvalho,


Prof. de Neonatologia da Universidade Federal Fluminense
– AUTORES –

SUMÁRIO

17
SUMÁRIO

CAP. 1 | Assistência perinatal CAP. 6 | Nutrição do recém-nascido


1.1 Como exercer a Medicina/ 6.1 Nutrição enteral do prematuro.............................170
Neonatologia com base em evidências..........22 6.2 Nutrição parenteral no recém-nascido............183
1.2 Uso do corticosteroide pré-natal: 6.3 Leite humano exclusivo para o
visão do neonatologista............................................25 recém-nascido pré-termo: evidências
1.3 A relação entre pais e bebês críticos para o seu enriquecimento.....................................191
na UTI Neonatal..............................................................31 6.4 Crescimento pós-natal do prematuro:
1.4 Assistência ao nascimento em um olhar uso de curvas...................................................................196
para o sujeito emergente ........................................34
1.5 Limite de viabilidade...................................................36 CAP. 7 | Distúrbios metabólicos
1.6 Gemelaridade: uma abordagem para o 7.1 Distúrbios metabólicos no recém-nascido...... 202
neonatologista................................................................40 7.2 Doença metabólica óssea da
1.7 Estatística neonatal .....................................................45 prematuridade................................................................208
7.3 Hidratação venosa........................................................210
CAP. 2 | Unidade de Terapia Intensiva: 7.4 Erros Inatos do Metabolismo: manifestações
um olhar para o recém-nascido, clínicas no recém-nascido.......................................214
sua família e a equipe de saúde
2.1 Unidade de Terapia Intensiva: um olhar CAP. 8 | Distúrbios respiratórios
para o recém-nascido, sua família e a 8.1 Causas dos distúrbios respiratórios ...................226
equipe de saúde............................................................50 8.2 CPAP nasal..........................................................................237
CAP. 3 | Assistência ao recém-nascido 8.3 Ventilação Não Invasiva Neonatal.......................239
3.1 Assistência ao recém-nascido na sala 8.4 Assistência respiratória ao recém-nascido....... 241
de parto...............................................................................58 8.5. Surfactante pulmonar exógeno............................. 251
3.2 Exame físico neonatal.................................................68 8.6. Hipertensão pulmonar persistente...................... 256
3.3 Avaliação neurológica do recém-nascido......72 8.7. Hemorragia pulmonar.................................................. 265
3.4 Avaliação da idade gestacional............................78 8.8. Displasia broncopulmonar......................................... 267
3.5 Alojamento conjunto para bebês 8.9. Apneia neonatal................................................................ 277
saudáveis e de cuidados especiais/ 8.10. Hérnia diafragmática congênita.......................... 281
Unidade Canguru..........................................................94
8.11. Traqueostomia em neonatos................................ 288
3.6 Aleitamento Materno e Banco de Leite...........104
3.7 Abordagem do recém-nascido febril................118 CAP. 9 | Distúrbios cardiológicos
9.1 Arritmias cardíacas/insuficiência cardíaca
CAP. 4 | Cuidados ao recém-nascido congestiva/ cardiopatias congênitas................294
criticamente doente
9.2 Persistência do canal arterial..................................307
4.1 Recém-nascido prematuro extremo.................122
9.3 Cuidados no pós-operatório de cirurgia
4.2 Manuseio mínimo: um caminho para o cardíaca neonatal..........................................................311
neurodesenvolvimento adequado....................126
4.3 Transporte do recém-nascido................................130 CAP. 10 | Distúrbios hematológicos
4.4 Dor neonatal ...................................................................133 10.1 Anemia neonatal.........................................................320
4.5 Analgesia e sedação no recém-nascido 10.2 Policitemia.......................................................................324
em ventilação mecânica/sequência 10.3 Disturbios hemorrágicos........................................326
rápida de intubação.....................................................145 10.4 Trombocitopenia/trombocitose........................331
4.6 A Fisioterapia na UTI Neonatal..............................153 10.5 Hemoderivados e suas complicações...........335
CAP. 5 | Monitorização do paciente 10.6 Trombose neonatal....................................................339
criticamente doente
CAP. 11 | Distúrbios Neurológicos
5.1 Oximetria de pulso/capnografia..........................160
11.1 Crises Convulsivas no Período Neonatal......346
5.2 Avaliação da severidade clínica nos
recém-nascidos sob assistência respiratória/ 11.2 Hemorragia Intraventricular no
escore preditivo de morbimortalidade............165 Recém-Nascido a Termo.........................................353
11.3 Lesão neurológica isquêmica e
hemorrágica do prematuro: patogenia,
fatores de risco, diagnóstico e tratamento.......362
11.4 Macrocrania....................................................................375 18.3 Atresia de Esôfago......................................................588
11.5 Hemorragia Peri/Intraventricular no 18.4 Megacólon Congênito
Recém-Nascido Pré-termo....................................377 (Doença de Hirschsprung)....................................591
11.6. Significado Perinatal das Dilatações 18.5 Extrofia Vesical, Epispádia e Exrofia
Ventriculares Cerebrais.......................................................384 de Cloaca.........................................................................593
11.7 Aspectos Ultrassonográficos das 18.6 Obstruções Intestinais.............................................597
Malformações Cerebrais.........................................397 18.7 Atresia de Vias Biliares..............................................601
11.8 Defeitos de Fechamento do Tubo Neural..... 402 18.9 Priapismo Neonatal...................................................605
11.9 Asfixia Perinatal............................................................404 18.10 Acesso Vascular no Recém-Nascido.............607
11.10 Ultrassonografia Doppler Cerebral 18.11 Drenagem Torácica.................................................625
no Recém-Nascido..................................................416
11.11 Retinopatia da Prematuridade.........................425 CAP. 19 | Distúrbios endocrinológicos
11.12 O Cérebro do Recém-Nascido com 19.1 Distúrbios Do Desenvolvimento Sexual
Cardiopatia Congênita..........................................433 (DDS) e Hiperplasia Congênita de
Suprarrenal (HCSR).....................................................628
CAP. 12 | Infecções adquiridas 19.2 Hipotireoidismo Congênito ...............................634
12.1 Infecções fúngicas......................................................442
CAP. 20 | Imunologia do Recém-Nascido
12.2 Infecções bacterianas...............................................448
20.1 Imunodeficiência Primária no Neonato.......640
CAP. 13 | Infecções Perinatais Crônicas 20.2 Colostroterapia.............................................................650
13.1 Sífilis Congênita...........................................................462
CAP. 21 | Uso Do Curare Na UTI Neonatal
13.2 Toxoplasmose congênita.......................................466
21.1 Uso do Curare na Uti Neonatal...........................654
13.3 Síndrome da imunodeficiência adquirida
perinatal............................................................................474 CAP. 22 | Uso de Diuréticos na UTI Neonatal
13.4 Rubéola Congênita....................................................478 22.1 Diuréticos no recém-nascido: mais
13.5 Doença de Chagas.....................................................480 controvérsias do que indicações......................666
13.6 Herpes Simples............................................................483
CAP. 23 | Administração de Medicamentos
13.7 Varicela Congênita.....................................................485 no Recém-Nascido
13.8 Tuberculose Congênita e Perinatal..................487 23.1 Administração de Medicamentos
13.9 Tétano................................................................................489 no Recém-Nascido...............................................................672
13.10 Hepatite B.....................................................................491
CAP. 24 | Síndrome de Abstinência Neonatal
13.11 Citomegalovirose Congênita Perinatal.......494
24.1 Síndrome de Abstinência Neonatal................698
13.12 Infecção Perinatal Pelo novo
Coronavírus 2019.....................................................500 CAP. 25 | Problemas Hemodinâmicos
CAP. 14 | Distúrbio do Trato Gastrintestinal 25.1 Problemas Hemodinâmico...................................702
14.1 Refluxo gastroesofágico.........................................506 CAP. 26 | Ecocardiografia Funcional
14.2 Enterocolite Necrosante.........................................511 26.1 Ecocardiografia funcional......................................708
14.3 Insuficiência intestinal.............................................516
CAP. 27 | Cuidado Paliativo: Um Desafio na
CAP. 15 | Síndromes ictéricas Abordagem do Paciente Neonatal
15.1 Hiperbilirrubinemia Neonatal.............................524 27.1 Cuidado Paliativo: Um Desafio na
15.2 Colestase Neonatal....................................................539 Abordagem do Paciente Neonatal..................712

CAP. 16 | Distúrbios do Trato Genitourinário CAP. 28 | Hipertensão arterial


16.1 Injúria Renal Aguda ..................................................552 28.1 Hipertensão Arterial no Recém-Nascido.....716
16.2 Hidronefrose Pré-Natal...........................................562 CAP. 29 | Distúrbios Do Equilíbrio Ácido-Básico
16.3 Ascite Neonatal............................................................594 29.1 Distúrbios Do Equilíbrio Ácido-Básico...........722
CAP. 17 | Hidropsia Fetal CAP. 30 | Seguimento Ambulatorial do
17.1 Hidropsia Fetal..............................................................574 Recém-Nascido Egresso da UTI
Garantindo a Continuidade do Cuidado
CAP. 18 | Urgências Cirúrgicas 30.1 Seguimento Ambulatorial do Recém-
18.1 Defeitos no fechamento da parede Nascido Egresso da UTI Garantindo a
abdominal Onfalocele/gastrosquise..............578 Continuidade do Cuidado....................................730
18.2 Anomalias Anorretais...............................................585
Referências..............................................................................737
ASSISTÊNCIA CAP. 1
PERINATAL
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

1.1 COMO EXERCER A MEDICINA/


NEONATOLOGIA COM BASE EM EVIDÊNCIAS
Paulo R. Margotto

O novo paradigma para a prática clínica, ou seja, base para tomar ocupados e precisamos encontrar uma evidência válida (artigos de alta
decisões, tem que incluir a evidência da pesquisa clínica. Os tratamentos qualidade).
que usamos para os bebês devem ter sempre mais benefícios do que Nos últimos três anos, foi possível, para qualquer parte do mundo,
prejuízos. Assim, devemos adquirir informação por meio da procura por ter acesso à internet gratuitamente, procurando o Medline por meio
evidências, e que isto seja verdadeiro na literatura. Este é o novo para- deste endereço: www.pubmed.com.1
digma da Medicina: um esforço para tentar melhorar a situação do pa-
No exercício da Medicina Neonatal com base em evidências,
ciente com base em evidência nas pesquisas clínicas. Medicina baseada
citamos um endereço da internet (www.cochrane.org) que nos possi-
em evidência é o uso consciencioso da melhor evidência disponível
bilita acessar meta-análises de diversas situações colocadas em ordem
na tomada de decisões no cuidado ao paciente. A prática da Medicina
alfabética, como: cafeína versus teofilina no tratamento da apneia no
baseada em evidência significa integrar experiência clínica individual
recém-nascido (RN) pré-termo; CPAP versus teofilina para a apneia do
à melhor evidência clínica disponível em pesquisas sistemáticas. Sem
pré-termo; uso profilático de CPAP nasal em RNs muito prematuros;
a experiência clínica, as práticas correm o risco de ser tiranizadas pela
uso profilático de anticonvulsivante na asfixia perinatal do RN a termo;
evidência, podendo esta evidência ser inapropriadamente aplicada ou
e muitos outros temas polêmicos na prática clínica diária. O endereço
mesmo não aplicada ao paciente. Sem a evidência, as práticas logo se
específico neonatal é: http://www.nichd.nih.gov/cochrane.
tornarão obsoletas e podem ser detrimentais ao paciente.
O nome Cochrane é uma homenagem ao Dr. Archibald Lemon
Já chegando ao novo milênio, a estratégia mais poderosa é a
Colchrane (1909-1988), pesquisador médico britânico que muito
procura eletrônica pela informação. Devemos ter um modo sistemá-
contribuiu para o desenvolvimento da Epidemiologia como ciência.
tico de estudar a literatura médica de uma maneira eficaz. A evidência
A biblioteca Cochrane é um compêndio de revisões sistemáticas de
válida é apenas uma pequena parte da literatura que está disponível.
estudos randomizados de todos os campos da Medicina.
Temos que ter uma forma eficiente de busca. Somos médicos muito

Utilizando o site www.paulomargotto.com.br, vamos ter a oportunidade de consultar casos clínicos selecionados, resumos de artigos
neonatais, reprodução das mais importantes conferências/congressos/simpósios de Perinatologia, além de acesso a importantes
sites de busca, como: Medline: www.pubmed.com; MD Consult: www.mdconsult.com; Journal of Perinatology: www.nature.com/jp;
New England Journal of Medicine: http://content.nejm.org; Cochrane Neonatal: www.nichd.nih.gov/cochrane; Bireme: www.bireme.
br; Pediatrics: http://pediatrics.aappublications.org; Neonatology on the Web: www.neonatology.org; Jornal de Pediatria: www.jped.
com.br; Journal of Pediatrics: www.jpeds.com. Os artigos também podem ser solicitados diretamente ao autor por e-mail, quando
22 disponível nos abstracts.

Estrutura de um estudo da avaliação de um tratamento in Premature: Bell; Acarregui, 1999) –, pode-se calcular um intervalo de
confiança para esta estimativa. Para um dado nível de significância (P
Conhecimento da estrutura de um estudo da avaliação de um
≤ 0,05), o intervalo de confiança representa o intervalo em que deve
tratamento:
estar o parâmetro, ou seja, o RR verdadeiro. Se o valor 1, que se refere
EXPOSIÇÃO à nulidade da associação, não estiver contido no intervalo, temos uma
confiança de que, na população de onde nossa amostra foi extraída, o
Resultados Total RR é diferente de 1, sendo, portanto, significativo o achado da amostra.
Evento Não evento Para a realização dos cálculos do RR e o intervalo de 95% de confiança,
Sim (tratado) a b n1 assim como o seu significado, consulte Paulo Margotto (www.paulo-
margotto.com.br), em Entendendo Bioestatística e Exercício da Medicina
Não (controle) c d n2 Baseado em Evidências.
Medidas do efeito de tratamento: Uma vez calculado o intervalo de 95% de confiança para o nosso
Risco relativo (RR): é a medida da força da associação entre a exemplo, temos:
exposição e o evento (resultado) RR = 0,40 (95% IC: 0,26 – 0,63): a interpretação deste resultado é
RR: a/n1 a de que o RR é significativo na redução do ductus arteriosus patente
c/n2 no grupo exposto ao regime de menos líquido. O intervalo de confian-
Redução do risco relativo (RRR): 1 – RR ça não contém o valor 1, que indica nulidade de associação, ou seja,
a amostra estudada reflete um efeito real da menor oferta hídrica na
Diferença de risco (DR): a/n1 – c/n2 redução do ductus arteriosus patente.
Número necessário para tratamento (NNT): Redução do Risco Relativo (RRR): determina, em termos percen-
1 tuais, que a redução do tratamento provoca a ocorrência da doença no
DR grupo tratado quando comparado com o grupo controle.
Quando RR = 1, significa que não há efeito com o tratamento, RRR: 1 – RR
ou seja, o efeito do tratamento é o mesmo nos dois grupos. Se RR <
1, significa que o risco do evento é menor no grupo tratado do que No exemplo anterior, ductus arteriosus patente: regime de menor
no controle. A variabilidade amostral do estudo pode ser avaliada por x regime de maior oferta hídrica.
meio de testes de significância ou via intervalo de confiança. Aqui, da- RR: 0,40
remos preferência à segunda abordagem. Assim, desejando-se saber RRR: 1 – 0,40 = 0,60 x 100 = 60% (há uma redução de 60% do
se um RR = 0,40 – para a redução de ductus arteriosus patente, foi signi- ductus arteriosus patente no grupo de menor oferta hídrica).
ficativo no grupo de RN exposto a um menor regime de oferta hídrica
versus maior regime de oferta hídrica (Restricted vs Liberal Water Intake

1 Só é permitido acesso ao resumo do artigo (abstract), tal como fora publicado, o que permite ao médico fazer uma primeira seleção de artigos de maior relevância para questão
clínica que motivou a pesquisa.
– CAPÍTULO 1 | 1.1. COMO EXERCER A MEDICINA/NEONATOLOGIA COM BASE EM EVIDÊNCIAS –

Diferença de Risco (DR): a/n1 – c/n2. No exemplo anterior do x 100 = 127: aumento de 27%: 100 + 27); porém, não foi
ductus arteriosus patente com oferta hídrica menor ou maior, a DR foi significativo (veja que o intervalo de confiança contém a
de 0,190. unidade: 0,99....1....1,63).
Número necessário para tratamento (NNT): • Hipertensão arterial: RR = 5,30. IC 95%: 1,59 - 21,29: há um
1 aumento significativo (o intervalo de confiança não contém
DR a unidade) de 5,3 vezes mais.
A importância de se conhecer a DR é que possibilita calcular o • Hipertrofia do miocárdio: RR = 9. IC: 95%: 1,2 - 67,69: há um
NNT, que nos informa quantos indivíduos devem ser tratados para que aumento significativo (o intervalo de confiança não contém
se possa evitar a ocorrência de um evento (quanto melhor o trata- a unidade: 1....1,2....67,69) de nove vezes mais.
mento, menor o NNT). No caso do ductus arteriosus patente frente a Vejam como fica a apresentação dos resultados:
dois regimes, de oferta hídrica (maior x menor), o NNT é:
Esteroide com 7-14 dias nos RNs ventilados x controle
NNT = 1
Hiperglicemia
DR
Hipertensão arterial
DR= - 0,190; NNT = 1 = 5,26 = 5,3
-0,190 Hipertrofia do miocárdio
Ou seja, o número necessário de indivíduos a serem tratados com
restrição hídrica para evitar um caso de ductus arteriosus patente é 5,3.
Mais dois exemplos:
1. Hemorragia intraventricular (todos os grupos): grupo com
menor x maior oferta hídrica.
RR = 0,94 (95% IC: 0,52 – 1,72)
RRR = 1 – 0,94 = 0,06 x 100= 6%
DR = - 0,011
NNT = 1 = 90,9
-0,011
Interpretação: o risco de hemorragia intraventricular (todos os Odds ratio ou razão das chances
graus) não foi significativamente afetado pela oferta hídrica (veja, o Os estudos de casos-controles comparam a frequência de
intervalo de confiança do RR contém a unidade). A redução da hemor- expostos a um determinado fator entre um grupo de indivíduos que
ragia intraventricular, que é o RR, é de 6%, ou seja, há uma diminuição apresenta a doença – casos – e outro que não a tem – controle. Nestes
de 6% na incidência desta patologia no grupo com restrição hídrica, estudos se ingressa pelo dano, isto é, um grupo de indivíduos doentes
mas esta redução não foi significativa. O NNT de 90,9 significa que é em que se estuda a exposição ao(s) fator(es) é comparado a um grupo
necessário restringir líquido em 90,9 RNs para evitar a ocorrência de de indivíduos sem esta patologia, exposto ao(s) mesmo(s) fator(es).
um caso de hemorragia. Lembramos que, quanto melhor o tratamento, Aqui estamos lidando com grupos: um portador da condição (doença)
menor o NNT. e outro não portador da condição (controle). Estes estudos também 23
Morte neonatal: ingesta hídrica restrita x ingesta liberal. são chamados de estudos retrospectivos, pois, a partir da doença-dano,
busca-se para trás fator(es) de exposição. Veja o esquema:
RR = 0,52 (95% IC: 0,28 – 0,96)
RRR = 1 – 0,52 = 0,48 x 100 = 48% Fator Dano
DR = - 0,063
Sim Não
NNT = 1 = 15,87 = 15,9
-0,063
Sim a b
Vejam que há uma redução significativa de 48% de morte neona-
tal no grupo submetido à restrição hídrica, e o número necessário para Não c d
o tratamento com restrição hídrica para evitar uma morte neonatal é a+b b+d n (a + b + c + d)
de 15,9.
Assim, a soma horizontal não tem sentido (pode-se conhecer
Confiram a apresentação dos resultados: Forest Plot mostra todos os enfermos e só um número muito pequeno dos não doentes).
visualmente os resultados de uma meta-análise, além de fazer uma Desta forma, torna-se impossível calcular o RR como aprendemos ante-
estimativa visual da quantidade de variação entre os resultados. riormente, e, então, usamos um estimador indireto do RR, que é a razão
RR (95% IC) dos produtos cruzados ou de chance (odds ratio: OR):
Oferta hídrica restrita x ingesta liberal
Ductus arteriosus patente Este é um bom estimador do RR sempre
OR = a x d
Hemorragia peri/intraventricular que a prevalência do dano nos não
Morte neonatal bxc
expostos for igual ou menor que 5%.

A expressão “odds” não possui equivalente em português; alguns


epidemiologistas referem-se à odds ratio como "razão de chances ",
“razão de produtos cruzados”, ou, ainda, “razão de odds”. Usaremos o
termo original.
A razão das chances (OR) é definida como a probabilidade de que
um evento ocorra dividida pela probabilidade de que ele não ocorra.
Quando a linha horizontal estiver à esquerda (RR < 1), significa Quando o (a) é pequeno em relação ao (b) e o (c) é pequeno em relação
redução do evento; quando à direita, aumento do evento; e, toda vez ao (d), os resultados entre RR e OR são muitos semelhantes.
que a linha horizontal tocar a linha vertical, significa que o RR não é
significativo. Como calcular a odds ratio:
Veja, agora, um exemplo do RR localizado à direita: meta-análise EXPOSIÇÃO
revista por Halliday e Ehrenkranz (1999) para determinar se o uso de
Resultado
esteroide entre 7 e 14 dias de vida versus controle é benéfico na preven-
ção e/ou no tratamento da doença pulmonar crônica no prematuro. Evento Não evento
Foram observados como efeitos colaterais: Sim a b
• Hiperglicemia: RR = 1,27. IC = 0,99-1,63. Como interpretar: Não c d
há um aumento da glicemia em 27% destes bebês (1,27
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

OR = a x d Em resumo, a regressão logística é uma regressão múltipla, mas


bxc com uma variável de saída categórica dicotômica e variáveis previsoras
contínuas ou categóricas.
Utilizando o mesmo grupo de dados, o valor obtido para a me-
dida de associação pela fórmula da OR é, geralmente, maior do que se Veja outro exemplo da aplicação da regressão logística: o
obtém por meio da fórmula tradicional do RR. estudo de Whelan et al. (2009) avaliou o sódio sérico como um fator
de risco para a mortalidade intra-hospitalar em pacientes graves à
Do mesmo modo, o RR avalia se a variabilidade amostral da OR,
admissão. A odds ratio para a morte dentro de 30 dias da admissão
por meio do cálculo do intervalo de confiança, e a interpretação são as
foi de 4,07 (IC a 95% de 2,95-5,63) quando o paciente apresentava
mesmas do RR, ou seja, se o intervalo de confiança da OR contiver a uni-
hipernatremia, e 3,36 (IC a 95% de 2,59-4,36) quando apresentava
dade, significa ausência de associação. Para os cálculos, consulte Paulo
hiponatremia. A regressão logística foi usada para calcular a odds ratio
Margotto (www.paulomargotto.com.br), em Entendendo Bioestatística.
ajustada: fatores incluídos neste ajuste foram o escore de severidade da
doença, a permanência na UTI, o efeito da idade, o sexo, a transfusão de
Entendendo as regressões múltipla e logística sangue e a sepse. Após o ajuste, para hipernatremia, a odds ratio (ajus-
Havendo vários previsores, estaremos realizando uma regressão tada) para a morte passou para 1,41 (IC de 0,97-2,07: não alcançou a
múltipla (esta é uma extensão lógica dos princípios da regressão li- significância, pois o intervalo de confiança contém a unidade; e a odds
near simples quando há vários previsores). Os princípios básicos são os ratio (ajustada) para hiponatremia passou para 2,00 (IC a 95% de 1,44-
mesmos da regressão simples, isto é, procura-se encontrar uma combi- 2,77, ou seja, foi menor, porém continuou significativa, pois o intervalo
nação linear de previsores que se correlacionam de forma máxima com de confiança não contém a unidade).
a variável de saída. Para mais informações, sugiro consultar Field (2009), Assim, o sódio sérico é um poderoso marcador inicial para a
Descobrindo a Estatística usando o SPSS. mortalidade, mas a mortalidade no grupo hipernatrêmico é primaria-
Já a regressão logística, que veremos a seguir, é uma regressão mente um fator de severidade da doença. Já para a hiponatremia, o
múltipla, mas com uma variável de saída categórica dicotômica aumento da mortalidade é independente de outras variáveis. Portanto,
(dependente) e variáveis previsoras (explicativas ou independentes) os dados deste estudo nos informam que o sódio sérico na admissão é
contínuas ou categóricas. Assim, podemos prever a qual das duas um importante determinante da mortalidade intra-hospitalar em todos
categorias é provável que esta pertença, dadas certas informações. os pacientes. O sódio na admissão pode ser usado para estratificar
Quando a variável de saída é dicotômica (como sim/não), não pode- os pacientes que vão necessitar de uma terapia mais agressiva e de
mos usar a regressão linear, a despeito da semelhança entre a regressão maior monitorização, em particular a hiponatremia, que precisa de
linear e a logística. Para uma regressão linear ser válida, os dados ob- tratamento cuidadoso para evitar um excesso de mortalidade que é in-
servados devem ter um relacionamento linear. Quando a variável de dependentemente associada com anormalidade deste distúrbio. Con-
saída é dicotômica, esta hipótese é normalmente violada. Por meio de sulte, em SPSS - O Essencial, de Paulo Margotto (www.paulomargotto.
uma transformação logarítmica, você pode contornar este problema, com.br), como realizar uma regressão logística e também como avaliar
mantendo a forma do relacionamento linear, enquanto o próprio rela- a colinearidade (a multicolinearidade existe quando observamos uma
cionamento em si não é linear. forte correlação entre dois ou mais previsores – variáveis explicativas)
A regressão logística vem sendo utilizada em diversas áreas. Este em um modelo de regressão. Este fato dificulta a avaliação da impor-
método, tal como as regressões linear e múltipla, estuda a relação en- tância individual de um previsor (se ambos previsores são altamente
tre uma variável resposta e uma ou mais variáveis independentes. A correlacionados e cada um é responsável por uma variância similar dos
24 resultados, como vamos poder dizer qual, entre as duas variáveis, é a
diferença entre estas técnicas de regressão deve-se ao fato de que, na
regressão logística, as variáveis dependentes estão dispostas em mais importante? Na verdade, não podemos dizer, pois o modelo pode
categorias (sim/não/alto/baixo/bom/ruim), enquanto na regressão incluir qualquer uma delas de forma intercambiável). Na regressão múl-
linear estas variáveis são contínuas. A resposta na regressão logística é tipla, o SPSS produz vários diagnósticos de colinearidade, entre eles o
expressa por meio de uma probabilidade de ocorrência, enquanto na VIF (fator de inflação da variância).
regressão simples obtém-se um valor numérico. Portanto, a regressão
logística apresenta-se como um método na determinação da probabi- Antigo paradigma da
lidade de ocorrência dos valores preditos de uma variável dicotômica. prática clínica
Na regressão logística, as variáveis independentes podem ser tanto Tomada de decisões baseava-se em:
fatores quanto covariantes (dados contínuos), e as variáveis dependen-
tes poderão estar dispostas em duas ou mais categorias. Assim, temos • Boa experiência clínica.
a regressão logística binária (duas categorias), ordinária e nominal. A • Bastante conhecimento em Fisiopatologia.
escolha de qual método utilizar depende do número de categorias e • Informação com base em bons livros.
das características da variável resposta. Veja a tabela 1, a seguir:
• Opinião de especialistas (professores).
Tabela 1 – Tipos de variável resposta
Novo paradigma da
prática clínica
Tomada de decisões baseia-se em:
• Evidências das pesquisas clínicas, com embasamento na
experiência clínica.
A Medicina baseada em evidência é o uso consciencioso da melhor
evidência na tomada de decisões, integrado com experiência. Sem a expe-
Fonte: Penha (2002). riência, as práticas correm o risco de serem tiranizadas pelas evidências.
Uma variável binária é aquela que aceita apenas dois níveis
de resposta, como sim ou não. Já uma variável ordinária segue uma
ordenação natural das coisas, como pequeno, médio e grande, ou clas-
sificação, como ruim, bom ou excelente. A variável nominal tem mais
de três níveis sem nenhuma ordenação (objeto azul, preto, amarelo e
vermelho, ou na previsão do tempo, ensolarado, nublado, chuvoso).
– CAPÍTULO 1 | 1.2 USO DO CORTICOSTEROIDE PRÉ-NATAL: VISÃO DO NEONATOLOGISTA –

1.2 USO DO CORTICOSTEROIDE PRÉ-NATAL:


VISÃO DO NEONATOLOGISTA
Paulo R. Margotto, Marta David Rocha de Moura

Tratamento e procedimentos instituídos sem avaliação de controle Displasia broncopulmonar


de resultados podem revelar efeitos inesperados. A história da Medicina
é repleta de adoção de intervenções antes de uma avaliação completa. A displasia broncopulmonar (DBP) é um grande problema na Neo-
A única forma que temos para prevenir usos de condutas seguidas por natologia; à medida que estes RNs sobrevivem, maior é a evidência de
falta de efetividade, ou mesmo com resultados funestos, para depois problemas pulmonares crônicos. Com o não uso do esteroide, segundo
abandonar, é esperar resultados de ensaios clínicos apropriadamente estudo de Van Marter et al. (1990), o risco de ter a DBP no RN < 1750 g foi
randomizados. A falta destas medidas de controle tem sido uma verdade três vezes maior (OR: 3,0 – IC 95% : 0,4 – 4,3); um curso, mesmo incomple-
na Neonatologia. O clássico exemplo é o uso de O2 em altas concentra- to, não aumentou o risco (OR: 1,3 – IC 95% : 0,4 – 4,3%). Onze anos depois,
ções nos recém-nascidos (RNs) prematuros, resultando na retinopatia da Van Marter et al. (2001), em um estudo envolvendo 1.454 RNs de muito
prematuridade. Muitas terapias podem resultar em desastres. Apesar disto, baixo peso, evidenciaram que a taxa de DBP (necessidade de O2 com 36
vários profissionais ainda utilizam destas terapias sem o devido cuidado. semanas de idade pós-concepcional) não variou com o uso do esteroide
Devemos nos manter atentos para a segurança de tratamentos que ainda pré-natal. Embora os autores não saibam o número de cursos usados, a
usamos, mas que não foram suficientemente testados. supressão adrenal por múltiplos cursos pode ter contribuído, uma vez
que há evidências, a partir dos estudos de Watterberg e Scott (2000), de
Dos grandes acertos na Perinatologia, vamos comentar sobre o que menor nível sérico de cortisol nos primeiros dias de vida associa-se a
corticosteroide pré-natal. maior risco de DBP. Esta é a razão pela qual Banks et al. (2002) relataram
Provavelmente, não há uma prova definitiva de que uma inter- maior risco de DBP no RN pré-termo cujas mães receberam mais de três
venção seja efetiva e segura, mas deve haver um momento que diz que cursos (veja Cursos Múltiplos). No RN abaixo de 1000 g, o efeito protetor do
mais ensaios clínicos tornam-se antiéticos, ou, melhor ainda, uma perda esteroide pré-natal é questionado. Estudo de 1999, realizado por Wells et
de recursos. Nos últimos 30 anos, 18 ensaios clínicos têm evidenciado al., envolvendo 670 RNs < 1500 g, houve aumento da frequência de RNs
consistentemente que um simples curso de esteroide pré-natal dado à sobreviventes sem DBP.
mulher que irá dar à luz a um RN pré-termo reduz a morbimortalidade
neonatal. Muitos perinatologistas têm sido relutantes em abraçar esta Canal arterial pérvio
simples intervenção.
O canal arterial pérvio atrasa a saída do RN do respirador e, uma vez
O uso do esteroide pré-natal é um dos tratamentos mais bem do- prolongando a assistência ventilatória, o risco de DBP torna-se maior. Os
cumentados quanto à sua efetividade em salvar vidas e à sua redução de RNs cujas mães receberam esteroide pré-natal têm menor probabilidade
custos na Medicina Perinatal. de ter canal arterial pérvio, pois o esteroide pré-natal diminui a sensibili-
Na corticoterapia pré-natal, existe uma data muito importante, dade corticosteroide-induzida a prostaglandina que mantém a patência
que vai do dia 28 de fevereiro ao dia 2 de março de 1994, quando houve ductular. É bastante significativa a menor incidência do canal arterial no
a Conferência de Consenso do Instituto Nacional de Saúde. O objetivo grupo de RNs cujas mães utilizaram esteroide versus os RNs cujas mães
desta Conferência foi aumentar, entre os obstetras, o uso dos esteroides não utilizaram esteroide.
pré-natal (no primeiro objetivo, em até 60%, e, no segundo, em até 90%-
100%). Antes da Conferência, o uso do esteroide era de apenas 12%-18% Enterocolite necrosante 25
(peso ao nascer entre 500 g e 1500 g). Hoje, estudo recente evidenciou
que 98% dos obstetras no Reino Unido usam esteroide pré-natal em Quanto à enterocolite necrosante (ECN), Hallac et al. (1990) relata-
doses múltiplas, e 75% destes concordam que deva haver mais estudos ram incidência de 14,45% no grupo sem betametasona versus 3,4% no
controlados. Assim, não devemos passar da realidade benéfica ao exage- grupo com betametasona que nasceu acima de 24 horas, e 6,9% nos
ro prejudicial. bebês que nasceram antes de 24 horas do uso. Meta-análise de Crowley,
Chalmers e Keirse (1990) evidenciou redução significativa da ECN (68%:
Nesta visão do neonatologista, vamos apresentar os efeitos pul- OR: 0,32 – IC 95% de 0,16-0,64). A incidência de ECN no grupo tratado foi
monares (doença da membrana hialina, hérnia diafragmática, doença de 1,6% versus 51%.
pulmonar crônica), os efeitos não pulmonares (canal arterial, hemorragia
peri/intraventricular, leucomalácia periventricular, balanço hidroeletrolítico, Recentemente, Guthrie et al. (2003) identificaram os fatores de
enterocolite necrosante), o uso do esteroide na pré-eclâmpsia, na rotura riscos para a ECN em 98 Unidades de Cuidados Intensivos Neonatais
prematura de membranas, a tocólise, o tempo de hospitalização, os múlti- nos Estados Unidos. O estudo compreendeu 15.072 RNs, dos quais 390
plos cursos e o follow-up. Sempre que usar o esteroide pré-natal, considerar apresentaram ECN (2,6%). Entre os fatores de risco, em uma análise mul-
o pulmão, o cérebro, o coração e o intestino. tivariada, o corticosteroide pré-natal esteve associado à ECN (1,6 mais;
95% IC de 1,3-2,0). Os autores relatam que 59% das pacientes receberam
Ao optar pelo esteroide, é importante que se saiba que a inserção corticosteroide pré-natal e algumas podem ter recebido cursos múltiplos.
de um flúor na posição 9 aumenta a potência e prolonga a vida média O uso de cursos múltiplos de corticosteroide pré-natal pode ter diferentes
do esteroide, tornando a betametasona (9-alfa-flúor 16 beta-metilpredni- efeitos morfológicos no desenvolvimento gastrintestinal em comparação
solona) 33 vezes tão potente quanto a hidrocortisona e a dexametasona com curso simples. Infelizmente, os dados dos autores não permitiram a
(9-alfa-flúor 16-alfa metilprednisolona), e 25 vezes tão potente quanto a avaliação desta hipótese.
hidrocortisona. A prednisona e a prednisolona são bastante inativadas na
placenta, devido à 11-beta-hidroxiesteroide desidrogenase. O cortisol e a
prednisolona têm 67,4% e 51,4%, respectivamente, de inativação versus a
Hemorragia intraventricular e leucomalácia
betametasona e a dexametasona, que apresentam uma porcentagem de periventricular
1,8% e 7,1% de inativação pela placenta, respectivamente. A betametaso- Quanto à hemorragia intraventricular (HIV) e à leucomalácia peri-
na atinge a circulação fetal 1 hora após o tratamento materno (vida média ventricular (LPV): a HIV e a LPV constituem um grande problema nestes
de 5 a 6 horas; a vida média do cortisol é de 2 horas). Assim, causa-nos RNs prematuros extremos sobreviventes. Interessante que o uso do
estranheza saber que há obstetras que optam pela hidrocortisona (para surfactante pulmonar não diminui a incidência de HIV e de LPV; combi-
obter efeitos com a hidrocortisona na diminuição da incidência da doença nando o uso do surfactante pulmonar com o esteroide pré-natal, há uma
da membrana hialina, você deveria usar uma dose equivalente a 13 vezes diminuição significativa da HIV e da LPV. Os mecanismos citados incluem:
mais à dose da betametasona/dexametasona). estabilização da pressão arterial (primeiros três dias), fechamento espon-
Os esteroides promovem uma indução de mudanças no tecido co- tâneo do canal arterial, aceleração da diferenciação neuronal, aumento da
nectivo do pulmão, indução de receptores beta-adrenérgicos no pulmão, maturação dos vasos da matriz germinativa. Interessante lembrar que, nos
efeito direto no gen da proteína do surfactante (SPA), aumento do de- RNs com idade gestacional menor que 32 semanas, existe uma proemi-
senvolvimento antioxidante do pulmão, reduzindo o risco de doença da nência de sangue à matriz germinativa.
membrana hialina (DMH), tal como o surfactante administrado na sala de Estudo de Cooke (1999) envolvendo 1.722 RNs com peso de nas-
parto. Meta-análise de 3.000 mulheres de alto risco para prematuridade re- cimento inferior a 1500 g evidenciou que, no grupo esteroide, a sobre-
velou: no grupo esteroide em que os RNs nasceram entre 24 horas até sete vivência foi três vezes maior (OR: 3,34 – IC 95%: 2,31-4,79), a incidência
dias após o uso de esteroide, a diminuição da DMH foi de 69% (OR: 0,31 de hemorragia cerebral parenquimatosa diminuiu 56% (OR: 0,44 – IC 95%
- IC 95%: 0,23 - 0,42), havendo menor necessidade do uso de surfactante 0,28-0,71), o risco de paralisia cerebral diminuiu 53% (OR: 0,47 – IC 95%
(22% x 53% - p < 0,01) e diminuição significativa da mortalidade neonatal 0,27-0,81). Demarini et al. (1999) relatou que, no grupo esteroide, os RNs
(41%: OR: 0,59 - IC 95% de 0,47-0,75). Bunt et al. (2000) evidenciaram que o apresentavam pressões arteriais médias mais estáveis, com 3, 6, 12, 18 e 24
corticosteroide pré-natal aumenta a síntese do surfactante pulmonar em horas, menor necessidade de expansores de volume e menor necessidade
1,3 mg/kg/dia por cada dose de esteroide.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

do uso de vasopressores de suporte. Estes achados conferem proteção vezes mais chance de apresentar HIV de graus 2 a 4 do que aqueles em
contra a HIV. que as mães receberam esteroide pré-natal.
Achamos muito importante enfatizar estes aspectos do ponto de Estudos recentes assinalam diferenças quanto ao efeito neuropro-
vista cerebral, pois, quando o obstetra usa esteroide, ele o faz no sentido tetor da betametasona em relação à dexametasona (vide adiante).
de evitar a doença da membrana hialina. Ao usar esteroide pré-natal, ra-
ciocinar em termos de pulmão, intestino, coração e cérebro. Balanço hidroeletrolítico
O estudo de Leviton et al. (1999), envolvendo 1.604 RNs com peso ao Quanto ao balanço hidroeletrolítico no RN abaixo de 1000 g:
nascer menor que 1500 g, evidenciou que, nos RNs cujas mães utilizaram es- estudos realizados em 1999 e em setembro de 2000 por Omar et al. evi-
teroide, houve diminuição da ecoluscência periventricular; esta ecoluscên- denciaram que os RNs cujas mães usaram esteroide apresentaram menor
cia pode significar isquemia, congestão venosa, e está muito relacionada, perda insensível de água (devido ao aumento da maturação das células
mais atualmente, à infecção fetoplacentária, principalmente na presença de epiteliais da pele), menor hipernatremia, maiores diurese e natriurese,
vasculite fetal, nos casos com HIV e nos casos com hipotiroxinemia. Mais maior reabsorção do líquido pulmonar fetal devido ao crescimento da ati-
adiante, vamos ver que as pacientes com bolsa rota prolongada e que têm vidade da Na-K-ATPase, levando ao aumento da expansão do extracelular,
vasculite fetal apresentam um aumento excessivo no risco de lesão cerebral ajudando a prevenir a hipernatremia e a hipercalemia não oligúrica pela
no seu RN prematuro. Interessante que o esteroide pré-natal protege esta estabilização da membrana celular, que resulta em diminuição da saída de
lesão cerebral nestes RNs. Os RNs com hipotiroxinemia têm o risco duas K+ do intracelular para o extracelular. A hipercalemia pode levar a arritmias
vezes maior de ter lesões cerebrais, e o esteroide pré-natal protege estes be- cardíacas e a lesões cerebrais.
bês destas lesões (um curso completo e parcial diminui em 50% o risco de
HIV: OR: 0,5 IC 95% de 0,2-0,98). Outro fato muito importante é a ventriculo- Jain et al. (2000), estudando o efeito do sexo e da exposição antenatal
megalia; sabemos que 30% dos bebês com HIV vão ter dilatação ventricular, ao esteroide, não evidenciaram efeito do esteroide pré-natal na barreira epi-
e, destes, 50% vão ter uma dilatação ventricular transitória (ou a dilatação dérmica do recém-nascido pré-termo (foram estudadas 137 crianças nascidas
desaparece ou os ventrículos permanecem aumentados, mas sempre do antes de 34 semanas de idade gestacional, sendo que 87 foram expostas ao
mesmo tamanho) e 50% evoluem para uma dilatação ventricular progressi- esteroide pré-natal e 50 não receberam esteroide no pré-natal).
va, que é o hidrocéfalo pós-hemorrágico. O esteroide pré-natal diminui sig-
nificativamente a ventriculomegalia em 70% com o curso completo (OR: 0,3 Rotura prematura de membranas
IC a 95% de 0,3-0,96). No RN cuja mãe fez uso de esteroide, se ocorrer a HIV, A rotura prematura de membranas (RPM) ocorre em 30% dos nasci-
a ventriculomegalia ocorrerá numa frequência significativamente menor. mentos pré-termos. Vermillion et al. (1999), estudando 374 RNs entre 24-
Kari et al. (1994), com o uso da dexametasona (157 gestantes 34 semanas de gestação, divididos em três grupos (curso simples [99 RNs],
com idade gestacional menor que 32 semanas), mostraram diminuição curso múltiplo [3 a 6: 72 RNs] e controle [203 RNs]), observaram que, no
significativa da HIV/LPV (13% x 33%). Maher et al. (1994), envolvendo 432 grupo de curso múltiplo, houve aumento significativo da sepses neonatal
gestantes entre 26 e 31 semanas utilizando betametasona, evidenciaram precoce (p<0,0002) e corioamnionite e endometrite (p<0,004). Quando
diminuição da HIV em 74% (OR: 0,26 – IC 95% de 0,08-0,90). Spinillo et al. foi comparado o curso múltiplo ao curso simples, não houve diferenças
(1995), com 302 gestantes entre 24 e 33 semanas utilizando dexametaso- significativas em doença da membrana hialina, HIV e ECN (provavelmente,
na, evidenciaram diminuição da HIV em 76% (OR: 0,24 - IC 95% de 0,09- a corioamnionite teve influência negativa no efeito protetor, via citocinas).
0,61). Shanrakan et al. (1995), envolvendo 4.665 RNs com peso ao nascer Meta-análise realizada por Alfirevic (2002) incluindo 13 ensaios
inferior a 1500 g, evidenciaram significativa diminuição da HIV graus III e clínicos evidenciou que o esteroide pré-natal na rotura prematura de
IV tanto com o curso completo quanto com o curso parcial de betameta- membranas melhorou o prognóstico do bebê (diminui o risco de doença
sona. Canterino et al. (2001), estudando 1.161 RNs com idade gestacional da membrana hialina em 40%), sem aumento do risco de infecção tanto
entre 24 e 34 semanas e peso ao nascer de 500-1750 g, evidenciaram o para o RN quanto para a mãe.
26 efeito protetor do esteroide pré-natal para a leucomalácia periventricular
Na RPM, um grande problema é a lesão cerebral. Em 1999, Leviton
HIV, LPV com HIV. O grupo com esteroide pré-natal apresentou significa-
et al., como já citamos anteriormente, relataram um risco de 6,9 de eco-
tivamente menos LPV (23% x 31% - p < 0,005), LPV com HIV (5% x 11%
luscência periventricular na infecção materna e 10,8 vezes na vasculite
- p < 0,009). Após análise logística controlando variáveis de confusão, o
fetal, sendo estes dois fatores fortes preditivos de ecoluscência periven-
esteroide pré-natal esteve associado a 56% e 28% de menor probabilidade
tricular, sobretudo a tardia no RN pré-termo.
de o RN apresentar LPV com HIV (OR = 0,44 – 95% IC = 0,25 – 0,77) e LPV
isolada (OR = 0,42 – 95% IC = 0,20 – 0,88), respectivamente. Assim, o maior Spinillo et al. (1995) relataram que os RNs pré-termos que nascem
uso do esteroide pré-natal (reduziu em mais de 50% a LPV) pode melhorar após rotura prolongada das membranas (maior que 12 horas) são de
o prognóstico neurológico do RN pré-termo. alto risco para deficiência severa no desenvolvimento neurocomporta-
mental (OR: 5,75; 95% IC de 1,22-22,18).
Verma et al. (1997), estudando os antecedentes obstétricos para
HIV em 745 RNs de peso ao nascer entre 500-1750 g, evidenciaram sig- Em 1999, Burguet et al. relataram uma incidência 4,3 vezes maior de
nificante aumento da HIV e da LPV na presença de rotura prematura de paralisia cerebral quando estava presente a rotura prematura de membra-
membranas. A corioamnionite clínica aumentou a incidência e a severi- nas (risco relativo: 4,3; IC 95%: 1,6-11,8).
dade destas lesões. No estudo de Chen et al. (1997) em 75 RNs de mães com RPM e
Na determinação da influência das causas do nascimento do re- idade gestacional entre 24-28 semanas, foi observada diminuição signifi-
cém-nascido muito prematuro sobre o prognóstico neonatal, Baud et al. cativa da HIV (graus III e IV) no grupo com esteroide antenatal.
(1999) relataram, após regressão logística múltipla, que a administração Elimian et al. (2000), estudando 1.148 RNs de mães com RPM (peso
do esteroide no pré-natal foi associado a uma diminuição significativa de ao nascer < 1750 g), relataram diminuição significativa da HIV severa e da
LPV (OR de 0,36; 95% IC de 0,16-0,79). LPV com o uso do esteroide pré-natal. Em 2000, estes autores evidencia-
Agarwal et al. (2002) relataram que um curso completo de esteroide ram, nos RNs cujas placentas apresentavam corioamnionite histológica,
pré-natal foi associado a efeito protetor contra lesões na substância bran- redução significativa da doença da membrana hialina, da HIV e da LPV,
ca cerebral nos RNs < 1500 g ao nascer (p < 0.03). outras lesões cerebrais maiores, além de menor mortalidade neonatal
quando expostos ao corticosteroide pré-natal em relação aos RNs com
As infecções perinatais e as condições inflamatórias têm sido recente-
corioamnionite histológica não expostos ao corticosteroide pré-natal.
mente implicadas na patogênese da LPV, haja visto o aumento de citocinas
pró-inflamatórias (TNF-alfa, interleucina-1b e interleucina-6) na corrente Assim, além do risco da infecção neonatal na RPM, deve-se pensar
sanguínea, no líquido amniótico do RNs com LPV. Mais recentemente, têm também no alto risco da lesão cerebral. O esteroide pré-natal protege
sido descritos receptores da interleucina-2 nas lesões cerebrais, levando-se esses RNs da lesão cerebral, minimizando as graves consequências no
a crer que esta interleucina possa induzir a produção das citocinas pró- amanhã destes bebês.
-inflamatórias TNF-a (fator mielotóxico) e da interleucina-1b, que, por sua
vez, induzem a degeneração da mielina e iniciam a apoptose (morte) dos Pré-eclâmpsia severa
oligodendrócitos. Estudos epidemiológicos evidenciam que as infecções Estudo brasileiro publicado em 1999, com 218 gestantes entre 26-
perinatais, a corioamnionite e as sepses precoces são associadas a um 34 semanas com pré-eclâmpsia, evidenciou diminuição significativa da
aumento de risco de LPV. A administração de corticosteroide pré-natal, doença da membrana hialina HIV, do canal arterial, da infecção perinatal, da
um potente inibidor da síntese de citocinas pró-inflamatórias, associa-se à mortalidade neonatal, havendo aumento do risco de diabetes gestacional.
diminuição do risco de LPV. Assim, o corticosteroide pré-natal é o fator mais Não houve diferenças entre natimorto e pressão arterial média.
significativo na prevenção da HIV.
Em outro estudo de 1999 com 31 gestantes (28-33 semanas), foi ob-
Analisando fatores de risco para HIV nos RNs prematuros de muito servada relação L/E ³ 2 em 81% das mães que usaram esteroide. A doença
baixo peso, Linder et al. (2003) relataram menor risco de HIV grave para da membrana hialina ocorreu em 47% do grupo de esteroide pré-natal x
cada dose de esteroide pré-natal (OR de 0,52; 95% IC: 0,30-0,90). 100% do grupo controle. Assim, dizer que a pré-eclâmpsia amadurece o
Tavares (2003), estudando os fatores perinatais associados à HIV, pulmão e o RN não tem doença da membrana hialina não é totalmente
relatou que os RNs cujas mães não usaram esteroide pré-natal tiveram 15 verdadeiro. O esteroide pré-natal tem importância na prevenção da DMH
em RNs de mães com pré-eclâmpsia.
– CAPÍTULO 1 | 1.2 USO DO CORTICOSTEROIDE PRÉ-NATAL: VISÃO DO NEONATOLOGISTA –

Tocólise x hemorragia intraventricular Em 1999, French et al., estudando 652 RNs com idade gestacional
entre 20-32 semanas, relataram redução do peso ao nascer (9%) e da
Quando você faz a tocólise isolada, há o risco de aumentar a HIV em
cabeça (4% - esta equivale a uma redução de 11% do volume craniano),
duas vezes mais. Pranikoff et al. (1991) relataram um aumento três vezes
além de maior tendência à doença pulmonar crônica.
maior da HIV com a tocólise isolada. Atkinson et al. (1995) também relata-
ram aumento duas vezes maior da HIV graus III e IV quando a tocólise sem Abbasi et al., no ano de 2000, com 713 RNs cujas mães receberam
esteroide foi realizada. Os tocolíticos afetam o padrão de fluxo sanguíneo de um a 12 cursos, relataram diminuição significativa da incidência da
cardíaco fetal, cerebral e renal materno ou fetal, e o esteroide pré-natal doença da membrana hialina (45% x 35% a favor dos cursos múltiplos),
alivia o impacto negativo dos tocolíticos pelo efeito no fluxo sanguíneo canal arterial (20% x 13% a favor dos cursos múltiplos) e redução significa-
cerebrovascular ou na integridade cerebrovascular. tiva do perímetro cefálico nos múltiplos cursos. Para os RNs de gestação
múltipla com idade gestacional maior ou igual a 35 semanas, e que
Follow-up nasceram sete dias após a última dose, não foram observadas diferenças
no prognóstico neonatal independentemente do número de cursos. Os
Estudo de Salokorp et al. (1997) avaliando o crescimento e o desen- autores relataram aumento significativo de endometrite pós-parto (p <
volvimento, aos 2 anos de vida, evidencia menor incidência de paralisia 0,013) para múltiplos cursos. Meta-análise de oito estudos observacionais
cerebral no grupo com esteroide pré-natal (10% x 22%). É importante que realizada por Aghajafari et al., em 2001, relatou que múltiplos cursos de
os colegas que aplicam follow-up saibam se as mães fizeram ou não uso esteroide pré-natal estiveram associados ao aumento significativo do risco
de esteroide, sendo necessário anotar o número de cursos utilizados (veja de endometrite (OR = 3,42, IC = 95%, 1,92-6,11) (variáveis interferentes es-
a seguir). tavam presentes em todos os estudos). Ambos os autores concluem que
Estudo recente realizado por Arad et al. (2002) evidenciou que os o benefício de cursos múltiplos deve ser estabelecido por meio de um
RNs que apresentaram maiores benefícios cognitivos na idade de 6-8 anos estudo prospectivo randomizado e controlado.
com o uso do esteroide pré-natal (um curso com betametasona) foram Estudo experimental recente conduzido por Smith et al. (2003) evi-
aqueles com ventriculomegalia no ultrassom (vantagem de 23 pontos no denciou que a resposta renal corticosteroide induzida foi comparável nos
QI), evidenciando, assim, o efeito neuroprotetor do esteroide pré-natal. animais pré-termos submetidos à exposição simples versus à exposição
Nos RNs com ultrassom normal, o esteroide pré-natal foi associado a um múltipla a esteroide pré-natal. Assim, a exposição múltipla ao esteroide
aumento de 14,1 pontos no QI na idade 6-8 anos. pré-natal não melhora a função cardiovascular e renal (ovelha recém-nas-
Um follow-up de 20 anos: nos bebês pré-termos, cujas mães fizeram cida prematura).
uso de um curso de esteroide, não foram observados efeitos adversos na McEvoy et al. (2002) não evidenciaram que cursos repetidos sema-
vida adulta quanto à orientação sexual, à capacidade intelectual, ao cres- nalmente de betametasona aumentam a capacidade residual funcional
cimento e ao desenvolvimento. No grupo esteroide, foi observado menor ou a complacência respiratória nos RNs pré-termos quando comparados
pressão arterial média. a RNs pré-termos com curso simples dado numa idade gestacional média
Lee et al. (2008) compararam o desenvolvimento de prognósticos de 29 semanas.
adversos na idade corrigida de 18-22 meses para RNs de extremo baixo Guinn et al. (2001) concluíram que cursos semanais de esteroide
peso (< 1000 g) expostos, no pré-natal, à dexametasona, à betametasona pré-natal não diminuíam a mortalidade neonatal em relação ao curso
ou ao não esteroide. A exposição pré-natal à betametasona foi associada simples, e esta prática deveria ser abandonada.
ao melhor neurodesenvolvimento e reduziu significativamente o risco de
deficiência auditiva, em relação à dexametasona ou ao não uso de esteroide Em questionário realizado por Broklehurst et al., em 1999, consta-
pré-natal. Embora os resultados do neurodesenvolvimento não tenham al- tou-se que 98% dos obstetras no Reino Unido usam múltiplos cursos e,
cançado diferença estatística significante, houve uma tendência consistente entre as indicações principais, estão RPM (84,2%) e suspeita de trabalho
de melhor prognóstico motor associado ao uso da betametasona pré-natal. de parto prematuro (81,8%). Interessante que 75% concordam que deve
haver mais estudos.
27
Múltiplos cursos Em 1994, o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos passou
a recomendar o uso de esteroide em gestantes com risco de parto prema-
A efetividade comprovada do esteroide pré-natal na promoção da turo e deixa incerteza quanto à segurança e à eficácia de doses repetidas.
maturação pulmonar e, também, na proteção cerebral pode resultar em
perda de células cerebrais, com aumento de problemas neurocompor- Quanto à gestação gemelar: como não é possível, na maioria das
tamentais se usado de forma abusiva. Muito mais pode não ser melhor vezes, predizer com eficácia que gêmeos vão nascer prematuros, cursos
quando se lida com corticosteroides, devido aos seus potentes efeitos repetidos de corticosteroide têm sido feitos nas gestações gemelares.
biológicos. Recentemente, Murphy et al. (2002) compararam duas intervenções no
tratamento do nascimento prematuro em gemelares; em 902 gestações
Estudo experimental controlado em ovelhas, de Ikegami et al. gemelares, o esteroide foi usado como terapia de resgate (duas doses
(1997), evidenciou redução do peso ao nascer de 27% com três a quatro de 12 mg de dexametasona com 24 horas de intervalo quando havia o
doses. Stewart et al. (1998), também em estudo experimental controla- risco tanto de trabalho de parto quanto de nascimento eletivo); e, em
do, relataram aceleração da maturação pulmonar com diminuição do 136 gestantes, o esteroide foi realizado a cada duas semanas, da 24ª a
peso do pulmão, que persistiu na idade adulta no regime de múltiplos 32ª semana de gestação ou até o nascimento (esteroide profilático). Os
cursos. Em 1998, Jobes et al., em outro estudo experimental controlado autores relatam que o esteroide profilático não foi associado à redução
em ovelhas, mostrou que o peso fetal era inversamente proporcional na incidência de doença da membrana hialina (OR = 0, 7-IC = 95%: 0,2-
ao número de cursos e que a supressão do cortisol materno ocorreu 2,0), havendo redução significativa de 129 g no peso médio dos bebês
após cada curso, e a supressão do cortisol fetal ocorreu após três cursos. a termo (p=0,008). Os bebês que receberam cinco cursos de esteroides
Em 1999, Banks et al., envolvendo 710 RNs entre 25-32 semanas de tiveram redução estatisticamente significativa no peso ao nascer. Os auto-
idade gestacional com 1, 2 e ³ 3 cursos, relataram não haver diferenças res atribuem a não resposta da gestação gemelar ao esteroide à redução
na incidência de DMH, doença pulmonar crônica (DPC) e hemorragia da biodisponibilidade do esteroide na gestante gemelar (aumento da
intraventricular (nascimentos 1-6 e 7-13 dias após o uso do esteroide); ³ 2 massa fetal ou do volume de distribuição), havendo necessidade de mais
cursos houve diminuição do peso ao nascer; e com ³ 3 cursos aumentou estudos para confirmar esta hipótese. Com estes resultados, os autores
o risco de morte (OR: 2,8; IC 95%: 1,3-5,9), além de diminuição do nível concluem que, até que sejam demonstradas a eficácia e a segurança de
de cortisol com 2 horas. Em 2002, Banks et al. relataram maior risco de múltiplas doses, é mais prudente utilizar a terapia de resgate e reservar
doença pulmonar crônica severa e precoce (OR = 3,3 – p < 0,001) nos os cursos múltiplos para casos selecionados de alto risco. Para Alan Jobe
RNs cujas mães receberam mais do que três cursos de esteroide pré-natal, (2003), esta explicação é insustentável, uma vez que a massa fetal no início
além de maior risco de morte (OR = 3,2 – p < 0,003). Bradley et al., em da gestação é pequena em relação à massa materna, além de a dose de
1994, relataram Cushing Neonatal, com supressão do eixo hipotálamo- dexametasona que foi usada ser o dobro da preconizada. Jobe acredita
-hipófise-adrenal com sete cursos de betametasona. É o único estudo da que a não resposta consistente dos gêmeos ao esteroide seja devido ao
literatura que relata essa potencial complicação. Ng et al. (1999), apesar de trabalho de parto dos gêmeos ser diferente das causas do trabalho de
não terem observado severa supressão pituitária-adrenal com o uso de parto nas gestações únicas. Talvez as causas (materna, uterina e fetal) do
múltiplos cursos de dexametasona pré-natal (média de 11,6 cursos), um trabalho de parto prematuro nestas gestantes não “estressam” suficiente-
leve grau de supressão adrenal pode ocorrer em uma pequena proporção mente o feto para responder aos esteroides (estudos experimentais evi-
destes RNs tratados. Um curso padrão não tem nenhum efeito supressor denciaram que o estresse fetal aumenta a resposta aos corticosteroides).
no eixo hipófise-adrenal. Nos RNs de múltiplos cursos, é necessário que Apesar das incertezas quanto à segurança e à eficácia dos múl-
sejam monitorizados (pressão arterial, eletrólitos e sinais de supressão tiplos cursos, há autores que defendem. Terrone et al., em 1999, com
adrenal), pois estes RNs podem ter reserva adrenal diminuída. apenas quatro gestantes e nove RNs, relataram não haver supressão
Mckenna et al. (2000) relataram que repetidas doses de esteroide adrenal com cursos semanais de betametasona (³ 3 cursos). Elimian et
pré-natal produziram insuficiência adrenal em todas as mulheres. Esta su- al., em 2000, estudando 93 RNs (³ 2 cursos) x 261 RNs (1 curso) relataram
pressão adrenal materna pode ter sérias consequências, particularmente não haver diferenças no prognóstico perinatal, além de sinalizarem
durante o trabalho de parto e o nascimento. diminuição da incidência da doença da membrana hialina e da necessi-
dade do uso de surfactante nos múltiplos cursos.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Matthews, em 2000, em um estudo de revisão sobre o desenvol- tasona tendeu a requerer mais surfactante para o tratamento da doença
vimento cerebral, alerta para o uso de múltiplos cursos de esteroide da membrana hialina do que o grupo placebo (o grupo que não recebeu
pré-natal. O sistema límbico, constituído primariamente pelo hipocam- esta dose após sete dias do curso simples). Este achado é consistente
po, é sensível ao corticosteroide endógeno e exógeno durante o seu com a falta de eficácia da repetição semanal da dose de betametasona,
desenvolvimento. O hipocampo tem funções complexas no cérebro, contradizendo estudos anteriores.
incluindo: cognição, comportamento, memória, coordenação de ativida- O cortisol sérico fetal começa a diminuir 6 horas, e encontra-se no
de autônoma e regulação de inúmeros sistemas endócrinos. Assim, pela menor nível 10 a 15 horas após uma dose de 12 mg de betametasona. Os
complexidade das funções desenvolvidas pelo hipocampo, a programa- níveis começam a se recuperar 24 horas após o tratamento, e a supressão
ção das funções do sistema límbico durante o desenvolvimento será de desaparece sete dias após o tratamento pré-natal com a betametasona.
grande importância na vida pós-natal e adulta. A exposição crônica do Uma hora após a administração de betametasona na mãe, a droga foi
corticosteroide pode levar a uma redução do volume do hipocampo em detectada no sangue do cordão. Alcança um pico com 6 horas, e os níveis
aproximadamente 30% (os neurônios do hipocampo contêm alta densi- diminuem, tornando-se indetectáveis 20 horas após a administração de
dade de receptores de corticosteroides, podendo, assim, serem particular- betametasona na mãe. Os recém-nascidos prematuros são capazes de
mente afetados por doses farmacológicas de esteroide, diferente). Há uma responder ao estresse (asfixia, doença da membrana hialina), e o cortisol
considerável degeneração neuronal no hipocampo dose-dependente, sérico aumenta após o nascimento. No entanto, a administração de cor-
com efeitos no comportamento e na função neuroendócrina. Múltiplas ticosteroide logo antes do nascimento pode suprimir transitoriamente o
pequenas doses causam mais severa lesão hipocampal do que uma dose eixo hipotálamo-hipófise-adrenal durante a adaptação precoce do recém-
maior única (estudos experimentais em macacos). Portanto, muita cautela -nascido. Portanto, o estresse fetal atribuído a doses repetidas de corticos-
ao usar múltiplos cursos. teroides administradas na mãe pode ter consequências adversas no longo
Wapner et al. (2007) avaliaram as crianças na idade corrigida de 2 e 3 prazo, em termos de programação do crescimento ou no aumento do risco
anos cujas mães haviam recebido múltiplos cursos de esteroide pré-natal de síndromes metabólicas e risco de anormalidades neurológicas.
ou simples curso. Houve aumento de paralisia cerebral nas crianças de No entanto, o estudo recente de Crowther et al. (2006) evidenciou
múltiplos cursos (2,9%) em relação às crianças com curso simples (0,5%), diminuição da incidência da doença da membrana hialina no grupo
embora não significativo (RR: 5,7 - IC a 95%: 0,7- 46,7 – p = 0,12). exposto à dose semanal de betametasona (33% versus 41% no grupo
Crowther et al. (2006) relataram igual frequência de desabilidades placebo), além de diminuição do requerimento de surfactante exógeno.
maiores entre o grupo de crianças na idade de 2 anos corrigida que As causas dos diferentes resultados neste estudo e no de Peltoniemi et al.
recebeu múltiplos cursos versus curso único de esteroide pré-natal (RR: (2007) permanecem especulativas: no estudo de Crowther et al. (2006),
1.04 - IC: 0.98-1,10). No entanto, o único dado que demonstrou diferença a duração da exposição fetal após a última dose foi consideravelmente
significativa foi problema de atenção, no qual havia mais crianças com maior; a idade gestacional ao nascer foi > = 34 semanas em 36% em todos
essa alteração no grupo que recebeu dose repetida de corticosteroide do os casos (isto é, naqueles casos, a exposição fetal em relação à última in-
que no grupo com curso simples (6,0% versus 3,2%, risco relativo ajustado, tervenção excedeu duas semanas); um total de 18% dos recém-nascidos
1,87; IC 95%, 1,03 a 3,42; p = 0,04). nasceram a termo, enquanto, no estudo de Peltoniemi et al. (2007), ne-
Kumar e Seshadri (2005) relataram uma percentagem significativa- nhum recém-nascido nasceu a termo e somente 23% dos recém-nascidos
mente alta dos neonatos nascidos após múltiplos cursos de esteroides foram expostos à intervenção > = 24 horas. Provavelmente, no estudo
pré-natal com perímetro cefálico inferior ao percentil 10 à alta (23 versus de Crowther et al. (2006), o nascimento pré-termo não era eminente
9%, OR ajustado, 3,25 (95% IC, 1,4, 7,3); p = 0,.015). Os autores concluem quando a dose de betametasona foi repetida. Isto pode ter contribuído
que múltiplos cursos de esteroides pré-natal (mais de dois cursos) podem para o sucesso na prevenção da doença da membrana hialina utilizando
predispor os neonatos de muito baixo peso a prejuízo no crescimento so- a estratégia de repetidas doses semanais de betametasona no estudo de
mático pós-natal sem promover qualquer benefício adicional ao resultado Crowther et al. (2006).
28 neonatal imediato. Segundo Stiles (2007), devemos informar aos pais os dados limita-
Por que dose semanal? Roger Lenke, em 2000, fez uma análise críti- dos do seguimento em longo prazo quanto ao uso repetitivo de esteroide
ca do estudo original de Liggins e Howie, ocorrido há 28 anos. No grupo pré-natal, e os sobreviventes devem ser seguidos, do ponto de vista neu-
tratado que nasceu antes de 24 horas x controle, a incidência da DMH rocomportamental, por um longo tempo.
foi de 24,1% e 31,8%, respectivamente; nos RNs que nasceram dentro de Os obstetras americanos esperaram mais de 20 anos após o pri-
dois a sete dias após o uso do esteroide pré-natal x controle, a incidência meiro estudo com uma dose e avaliaram 15 estudos randomizados. Hoje,
da doença da membrana hialina foi 3,6% x 33,3%, respectivamente; já sem grandes estudos randomizados mostrando segurança ou benefício,
para os RNs que nasceram após sete dias do uso do esteroide pré-natal x rapidamente se passou de um curso para múltiplos cursos. É tempo de
controle, a incidência da doença da membrana hialina foi de 2,2% e 9,4%, retornar para o curso simples e aguardar resultados de mais estudos
respectivamente (observem que a redução da incidência da doença da randomizados. Ao usar cursos múltiplos, informar à gestante que não há
membrana hialina foi menor em relação à < 24 horas e 2-7 dias, mas a evidências seguras de eficácia.
incidência de doença da membrana hialina no grupo controle ³ 7 dias foi
baixa - 9,4%). McNamara e Bottoms (1998) evidenciaram que a incidência Betametasona ou dexametasona?
da doença da membrana hialina não aumenta quando o nascimento
pré-termo ocorre depois de sete dias após a administração do esteroide. Estes dois agentes, usados no pré-natal para gestantes em risco de
Estes autores acreditam que o processo de maturação pulmonar induzido parto prematuro, diferem de outras formas de esteroides por serem os
pela administração do esteroide é permanente, mais do que transitório. mais estudados, apresentam atividade biológica idêntica e cruzam rapi-
Então, por que propor um tratamento potencialmente perigoso se não há damente a placenta. Não apresentam atividade mineralocorticoide, têm
evidência de eficácia? Por que a nossa abordagem médica tem, atualmen- fraca ação imunossupressora e apresentam longa duração de ação em
te, deteriorado tanto? comparação ao cortisol e à metilpredinisolona.
Caughey e Parer, em 2002, reviram as evidências dos cursos A escolha entre betametasona e dexametasona é baseada na faci-
múltiplos versus cursos simples de esteroide pré-natal para responder à lidade de administração, nos custos, na disponibilidade e nos resultados
questão, analisando dois resultados neonatais que foram a doença da conflitantes de estudos observacionais. Na literatura, não há um consenso
membrana hialina e a morte neonatal: que regime de tratamento resulta- a respeito do tipo de corticosteroide que deve ser usado no pré-natal.
ria em melhores resultados neonatais, ou seja, que esquema de esteroide Em estudo retrospectivo realizado em três centros perinatais de
pré-natal resultaria em menos doença da membrana hialina sem aumen- Paris, envolvendo 883 RNs com idade gestacional entre 24 e 31 semanas,
tar o número de mortes neonatais? Após análise dos dados (da literatura e Baud et al (2000). analisaram a incidência de LPV entre três grupos de RNs:
do National Center for Health Statistics), os autores recomendam: um grupo cujas mães usaram betametasona (duas doses de 12 mg IM
1. Todos os fetos entre 24 e 31 semanas de gestação, com 24 horas antes do parto; n = 361); outro grupo cujas mães usaram dexa-
risco de nascimento pré-termo, deveriam receber o 1º metasona (quatro doses de 6 mg IM 12/12 horas; n = 185); e um grupo
curso (betametasona – duas doses de 12 mg com inter- cujas mães não usaram corticosteroides (n = 357). A análise foi bivariada
valo de 24 horas). e multivariada, após o ajuste dos fatores de confusão. A taxa de LPV foi
2. Havendo o risco de nascimento prematuro subsequente, de 4,4% entre os RNs cujas mães receberam betametasona, e 11% nos
o próximo curso deveria ser feito duas semanas após. RNs cujas mães usaram dexametasona. Entre os RNs de mães que não
3. Não mais do que dois cursos deveriam ser feitos. fizeram o uso de esteroide pré-natal, a incidência de LPV foi de 8,4%. Após
Peltoniemi et al. (2007) investigaram se uma simples dose adicional ajuste para a idade gestacional, tipo de parto, presença ou ausência de
de betametasona, administrada no nascimento pré-termo iminente an- corioamnionite, presença de rotura prematura de membranas mais de 24
tes de 34 semanas, > = 7 dias após o curso completo de betametasona, horas, fatores estes que aumentam o risco de LPV, a exposição à betame-
melhoraria a proporção de recém-nascidos sobreviventes sem doença da tasona foi associada ao menor risco de leucomalácia multicística (OR de
membrana hialina ou severa hemorragia intraventricular. O que se obser- 0,5; IC de 0,2-0,9), enquanto a dexametasona foi associada ao maior risco
vou é que esta dose não aumentou a taxa de sobrevivência intacta, isto de leucomalácia multicística periventricular, embora não significativo (OR
é, sobrevivência sem doença da membrana hialina ou severa hemorragia de 1,5; IC a 95%: 0,8-2,9). Assim, a exposição pré-natal à betametasona,
intraventricular. No entanto, o grupo que recebeu esta dose de betame- mas não à dexametasona, esteve associada à diminuição significativa da
– CAPÍTULO 1 | 1.2 USO DO CORTICOSTEROIDE PRÉ-NATAL: VISÃO DO NEONATOLOGISTA –

leucomalácia periventricular multicística nos RNs prematuros extremos. Estudo conduzido por nós no período de agosto/2007 a julho/2007,
Apesar da sutil diferença entre estes dois corticosteroides, já assinalada com 187 mães que conceberam 219 RNs com idade gestacional entre 26
anteriormente (configuração do grupo metil na posição 16), o efeito neu- e 34 semanas, mostrou:
roprotetor da betametasona não está totalmente esclarecido. • Os RNs cujas mães receberam corticosteroides tiveram me-
O estudo de Baud et al (2000) não realizou ajuste para o Centro na lhores condições de nascimento aos 5 minutos de vida. No
análise de leucomalácia periventricular; o Centro com a menor incidência entanto, não houve diferença entre os dois grupos quanto
de leucomalácia foi aquele com a taxa de maior uso de betametasona. à necessidade de intervenção na sala de parto; porém, ob-
Estudo experimental conduzido por Rayburn et al. (1997) evidenciou servou-se menor tendência ao uso de drogas no grupo que
melhor desempenho neurocomportamental no grupo da betametasona recebeu corticosteroide pré-natal.
em relação ao grupo da dexametasona compararam betametasona com • Diferenças significativas na incidência de doença da mem-
dexametasona em termos de efetividade na redução da morbimortalidade brana hialina (RR: 0,75; IC a 95%: 0.62-0,92; NNT: 5) e todos os
neonatal entre os recém-nascidos pré-termos, envolvendo 299 mulheres. graus de hemorragia intraventricular (RR: 0,49; IC a 95%: 0,26-
A taxa de doença da membrana hialina, a necessidade de vasopressores, 0,95; NNT: 9), ocorrendo com menor frequência no grupo do
a enterocolite necrosante, a retinopatia da prematuridade, o canal arterial corticosteroide pré-natal.
patente, a sepse neonatal e a mortalidade neonatal não foram diferen- • Houve forte tendência a menor incidência de sepse precoce
tes. No entanto, as taxas de hemorragia intraventricular (5,7%-6 de 105, no grupo do corticosteroide pré-natal (RR: 0,71; IC a 95%: 0,56-
comparada com 17%-17 de 100: risco relativo de 2,97 com IC a 95% de 0,91; NNT: 5).
1,22-7,24 - p = 0,02) e lesão cerebral (6,7%-7 de 105, comparada com 18%- Para verificar possível influência no tipo de corticosteroide usado
18 de 100: risco relativo de 2,7 com IC a 95% de 1,18-6,19 – p = 0,02) foram nos resultados neonatais, foram analisados os dois tipos de corticosteroide
significativamente menores nos neonatos expostos à dexametasona do usados no pré-natal, a betametasona e a dexametasona:
que nos neonatos expostos à betametasona. A redução do risco absoluto • A betametasona reduziu significativamente a incidência de
na taxa de hemorragia intraventricular foi de 11,3%, e o número necessário doença da membrana hialina (RR: 0,49; IC a 95%: 0,36-0,68 -
para tratar foi de nove a favor da dexametasona. NNT: 2).
Quanto à leucomalácia periventricular, o presente estudo não en- • Tendência à menor hemorragia intraventricular, menor de-
controu qualquer diferença na taxa de leucomalácia periventricular entre pendência ao oxigênio na idade gestacional pós-concepção
os grupos. Na verdade, a incidência de leucomalácia periventricular nos de 36 semanas, menor necessidade de ventilação mecânica,
neonatos expostos à dexametasona foi menor em relação aos recém-nas- menor incidência de pneumotórax, menor necessidade do
cidos expostos à betametasona, embora o presente estudo não tivesse uso de surfactante pulmonar, porém sem alcançar significação
suficiente poder para detectar diferenças nas taxas de leucomalácia peri- estatística. Na sepse precoce e tardia e na enterocolite necro-
ventricular entre os dois grupos. sante, a betametasona mostrou tendência a pior resultado
Portanto, o esteroide pré-natal é uma estratégia barata e eficaz na
Segundo Murphy (2007), considerando os achados deste estudo redução da morte neonatal (a doença da membrana hialina é uma das
conflitantes com os da literatura, são necessários ensaios adicionais. principais causas de morte neonatal no Brasil), na redução da necessidade
Feldman et al. (2007) avaliaram as taxas de morbidade e mortalida- de mais doses de surfactante, na diminuição da hemorragia intraventricu-
de nos recém-nascidos de muito baixo peso (334 RNs) nascidos durante lar, da leucomalácia periventricular, da ventriculomegalia, da enterocolite
um período de seis anos, incluindo o período em que se usou somente necrosante, de canal arterial pérvio, distúrbios hidroeletrolíticos em RNs
a dexametasona, e compararam os resultados neonatais entre os RNs prematuros extremos, e, possivelmente, da displasia broncopulmonar, mas
expostos à betametasona versus os RNs expostos à dexametasona. Os não devemos passar da realidade benéfica ao exagero prejudicial.
autores relataram significativamente menores taxas de doença da mem-
brana hialina e displasia broncopulmonar no grupo que fez uso da beta- Uso de corticosteroide nos prematuros tardios (34-36
metasona em relação ao grupo que fez uso da dexametasona. O número
29
médio de dias em ventilação mecânica foi semelhante, assim como as semanas e seis dias)
taxas de hemorragia intraventricular e o grau, embora tenha sido obser- O estudo de Serrano et al. (2014), englobando dois grupos de
vada uma tendência à maior severidade da hemorragia intraventricular 247 prematuros tardios que receberam corticosteroide pré-natal (73) e
no grupo da betametasona. As taxas de mortalidade neonatal e a média que não receberam (175), evidenciou que os RNs que não receberam o
de permanência na UTI Neonatal foram semelhantes. esteroide pré-natal apresentaram significantemente maior incidência de
Lee et al (2006) usaram os registros do National Institute of Child taquipneia transitória do recém-nascido (TTRN) (28% versus 2,7% - p <
Health Development (Neonatal Research Network), com o objetivo 0,0001) em relação aos que não receberam o esteroide pré-natal. Estas
primário de determinar se há diferença de risco para o desenvolvimento diferenças podem ser explicadas pelo fato de que somente os glicocor-
de leucomalácia periventricular entre os RNs expostos à dexametasona ticoides parecem estimular a síntese e a atividade dos canais de sódio
versus os RNs expostos à betametasona. O segundo objetivo foi comparar envolvidos na patogênese da TTRN. No parto vaginal espontâneo a termo,
a incidência de hemorragia intraventricular, retinopatia da prematuridade ocorre aumento de esteroides endógenos e catecolaminas.
e morte neonatal entre os RNs que foram expostos à dexametasona versus Outras complicações estão associadas à patologia respiratória
os RNs expostos à betametasona. como causa de internação em Unidades Neonatais como os distúrbios de
Um total de 3.600 RNs com peso entre 401-1500 g foram envol- digestibilidade, a necessidade de suporte respiratório, hidratação venosa
vidos no estudo. Os autores não evidenciaram diferença de risco de e nutrição parenteral. Dessa forma, a extensão da administração de corti-
ocorrência de leucomalácia periventricular com o uso da dexametasona coides antenatais resultaria em redução das hospitalizações e consumo
e da betametasona. A dexametasona reduziu o risco de hemorragia de recursos.
intraventricular, assim como a sua severidade em comparação aos re- Quanto aos efeitos adversos da administração de corticoide antena-
cém-nascidos não expostos à corticoterapia. A betametasona reduziu tal no longo prazo, os mais descritos são as alterações de crescimento e
o risco para hemorragia intraventricular, assim como a sua severidade neurodesenvolvimento. A idade gestacional entre 34 a 36 semanas e 6 dias
e a morte neonatal em comparação ao grupo não exposto à corticote- um período crítico para o desenvolvimento do cérebro. Com 34 semanas,
rapia. Comparando com a betametasona, a dexametasona apresentou o peso cerebral é de apenas 65% de um RN a termo, os giros e sulcos cere-
significativamente maior risco de morte neonatal. Houve uma tendência brais ainda estão incompletos. Entre 34 e 40 semanas de gestação, o volu-
a maior risco associado à dexametasona em comparação com a betame- me cortical aumenta entre 25% e 50%. Há, nessa fase, o desenvolvimento
tasona, para hemorragia intraventricular e severa retinopatia da prema- do cerebelo. Em modelos animais, os corticoides induziram a apoptose e
turidade. Quanto à retinopatia da prematuridade, houve uma tendência a morte celular no cérebro de animais expostos. Nos humanos, o processo
não significativa de aumento de 50% do risco para severa retinopatia de divisão neuronal já está completo na 24ª semana de gestação; porém,
da prematuridade associada ao uso da dexametasona em comparação os oligodendrócitos (síntese de mielina) têm seu crescimento mais rápido
com a betametasona. As causas para este efeito retinotóxico potencial entre as 34-36semanas; portanto, mais suscetíveis aos efeitos neurológicos
entre dexametasona e betametasona permanecem não esclarecidas e adversos dos corticoides. Um dos efeitos mais temidos em curto prazo é a
necessitam de estudos adicionais. Estudos em animais não evidenciaram possibilidade de aumento do risco de infecção perinatal, devido à imatu-
alterações no desenvolvimento da retinopatia da prematuridade associa- ridade do sistema imune. No estudo, não foi observada diferença entre os
da à dexametasona. grupos; portanto, não houve aumento da incidência de sepse nos PTs cujas
Apesar de resultados controversos na literatura sobre qual deve mães receberam corticoide antenatal.
ser o melhor esteroide pré-natal, pode ser mais interessante para os Estudo nacional de Porto et al. (2011) englobando 247 prematuros
recém-nascidos que suas mães em risco de parto prematuro recebam tardios, dos quais 143 receberam esteroide pré-natal e 130 placebo,
betametasona mais do que dexametasona, quando houver condições de demonstrou que o tratamento com corticosteroides no pré-natal em
optar por uma ou outra. Em muitos países, a dexametasona antenatal é o mulheres entre 34-36 semanas de gestação com risco iminente de parto
único corticosteroide disponível. São os países economicamente menos prematuro é ineficaz na redução da ocorrência dos distúrbios respiratórios
desenvolvidos, com limitados recursos financeiros e neonatais que mais nos recém-nascidos e não exerce qualquer efeito sobre a incidência de vá-
se beneficiam da corticoterapia pré-natal. rias outras complicações na prematuridade tardia, com exceção da icterícia
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

neonatal com necessidade de fototerapia (possivelmente, a corticoterapia mortalidade (OR: 0,65; IC 95%, 0,5-0,86) em comparação com crianças não
promove uma aceleração da maturação hepática). Assim, os autores não expostas nas gestações. O mais importante achado deste estudo foi a melho-
recomendam em gestações de prematuros tardios. ra da sobrevida dos RNs pré-termos extremos. A regressão de Cox mostrou
Em duas meta-análises publicadas, subgrupos de idade gestacional significante melhora na sobrevivência entre 22-23 semanas (OR: 0,72; IC
mostraram evidência insuficiente para recomendar ou não o uso de corti- 95%, 0,53-0,97), assim como entre 24-25 semanas e 26-27 semanas. Mesmo
costeroide após 34 semanas de gestação. Embora alguns estudos tenham usando o corticosteroide pré-natal entre 22-23 semanas e se conseguir adiar
sugerido uma redução no risco de doenças respiratórias, tanto o número o nascimento, os efeitos do esteroide permanecem por uma a duas semanas.
de crianças desta idade gestacional quanto o número de eventos respira- Assim, o tratamento com corticosteroide pré-natal deve ser considerado na
tórios foram baixos. Em contraste, uma outra meta-análise publicada em ameaça de parto prematuro entre 22-23 semanas de gestação.
1995 mostrou que seria necessário tratar 94 grávidas para prevenir um Riskin-Mashiah S et al., em Israel e Tyson et al., também evidencia-
caso de síndrome do desconforto respiratório. O estudo Astecs avaliou ram, nos Estados Unidos, diminuição da mortalidade com a exposição ao
a eficácia da corticoterapia no pré-natal em 998 pacientes de termo, que esteroide entre 23-25 semanas de idade gestacional.
foram candidatas à cesárea eletiva, relatando uma redução significativa Na tomada de decisão para os recém-nascidos entre 24 semanas
de cerca de 54% nas internações em UTI por problemas respiratórios. No e 24 semanas e seis dias que se encontram na zona cinzenta, a partir
entanto, esse estudo tinha várias limitações metodológicas: não era cego de dados internacionais, não somente a idade gestacional, como tam-
e não houve um grupo placebo. Na coorte desse estudo, possível de ser bém outros fatores clínicos, exercem importância: peso ao nascer, sexo,
acompanhada aos 8-15 anos, observou-se que, embora não existissem nascimento único e intervenções obstétricas, como uso de terapia para
diferenças de comportamento e na saúde para crianças de 8 a 15 anos de tocólise, corticosteroide pré-natal e cesariana, influenciam a decisão do
idade, foi notada uma maior incidência de mau desempenho escolar no neonatologista. Nesta faixa de idade gestacional, as intervenções obsté-
grupo que usou betametasona (17,7% versus 8,5%; p < 0,03). tricas terão profundas influências nos neonatologistas, principalmente
É necessário o tratamento de 100 para prevenir um caso de síndro- o uso de esteroide pré-natal. O uso de esteroide antenatal, tanto curso
me do desconforto respiratório (SDR), um número muito alto, diferente- parcial quanto completo, associou-se a três vezes o aumento de terapia
mente para os RNs abaixo de 31 semanas (tratar cinco para evitar um intensiva ativa. Estudo de Carlo et al. (2011) mostrou diminuição da
caso de SDR. mortalidade ou deficiente neurodesenvolvimento na idade de 18 a 22
Talvez seja interessante considerar o uso de betametasona nos RNs meses, nos RNs entre 23-25 semanas expostos ao esteroide pré-natal. No
> 34 semanas em situações de cesariana eletiva que não podem aguar- Serviço Neonatal do Hospital Materno Infantil de Brasília/Secretaria de
dar chegar nas 39 semanas. Quando usar, fazê-lo com moderação. Não Saúde do Distrito Federal (HMIB/SES/DF), a nossa zona cinzenta (limite
utilizar ciclos múltiplos em hipótese alguma. entre a autonomia do paciente ou de seus familiares e a futilidade do
tratamento) é de 24 semanas-24 semanas e seis dias, com base em dados
do próprio Serviço.
Uso de corticosteroide nos prematuros na zona
cinzenta
Mori R et al. avaliaram a eficácia do uso de corticoide pré-natal em
melhorar os resultados de bebês prematuros por idade gestacional, principal-
mente nas < 24 semanas de gestação. Os bebês expostos ao corticosteroide
antes do nascimento em 24-25 semanas de gestação tinham síndrome do
desconforto respiratório menos frequentes (OR: 0,77; IC 95%, 0,60-0,98), me-
nos hemorragia intraventricular grave (OR: 0,49; IC 95%, 0,36-0,67) e menor

30
– CAPÍTULO 1 | 1.3 A RELAÇÃO ENTRE PAIS E BEBÊS CRÍTICOS NA UTI NEONATAL –

1.3 A RELAÇÃO ENTRE PAIS E BEBÊS


CRÍTICOS NA UTI NEONATAL

Patrícia Leão Bered

Agora preciso de tua mão,


não para que eu não tenha medo,
mas para que tu não tenhas medo.
Sei que acreditar em tudo isso será,
no começo, a tua grande solidão.
Mas chegará o instante em que me darás a mão,
não mais por solidão, mas como eu agora:
por amor.

Clarice Lispector

gênero e como gostariam que o bebê fosse do ponto de vista físico. As


A gestação origens dos desejos e das expectativas atribuídas ao bebê imaginado são,
A gestação é um período repleto de angústias na vida da mulher. em sua grande maioria, inconscientes. Nas palavras de Leff (1993), o útero
Algumas mulheres sonham em ser mãe desde meninas; outras, incertas se torna um receptor de esperanças, desejos e ansiedades, uma vez que
de sua capacidade de procriar e de maternar, ou ameaçadas pela perda de o bebê é investido com propriedades do mundo interno de seus pais. O
sua liberdade, carregam a dúvida sobre querer ou não ser mãe por longos bebê imaginário pode representar, então, aspectos da realidade interna de
anos. Independentemente das incertezas ou dos planos bem delineados, um de seus pais ou de ambos, pode também ser portador de caracterís-
quando ocorre, a gestação traz inúmeras mudanças corporais e psíquicas. ticas da personalidade de seus pais que eles temem ou admiram ou até
Estas mudanças são concomitantes e sentidas de forma mais ou menos mesmo características de uma pessoa importante para os pais.
intensa pela mulher e seu companheiro desde o momento da concepção. Identificações da gestante com um de seus genitores, ou antigos
Do ponto de vista psíquico, a mãe não nasce no momento em que ela dá conflitos com figuras parentais, podem reagudizar, pois a gravidez é um
à luz a seu bebê. Mudanças psíquicas ocorrem desde o início da gravidez, período de transição de ser a criança de sua mãe para ser a mãe da criança
preparando-a para essa nova identidade: ser mãe. Segundo Stern e Stern que está em seu útero.
(1998), a identidade de filha se torna passado e a de mãe carrega inúme- Algumas pesquisas sugerem que quase metade dos pais apresenta- 31
ras possibilidades para o futuro. A mulher passa a ver seu companheiro rão sintomas físicos durante a gravidez de sua companheira, inconsciente-
de forma diferente. Passa a valorizar as habilidades de seu companheiro mente, colocando o foco de atenção em seu próprio corpo. A experiência
enquanto pai e cuidador. de esperar o primeiro bebê desloca o homem para a posição de pai e
Esses mesmos autores escrevem sobre o processo de se tornar mãe o coloca na posição de reavaliar seu passado enquanto bebê e criança
dividindo-o em três partes: perante seus pais.
• Preparação para ser mãe: começa com os nove meses de ges- Mas e o feto, o que se conhece sobre a vida fetal intraútero em
tação. É neste período que ocorrerá a maior parte do “trabalho termos psíquicos?
mental”, que permitirá à mulher ingressar na maternidade. O A neurobiologia autoriza-nos a pensar que a vida psíquica fetal e
parto e o nascimento físico do bebê levarão ao nascimento do recém-nascido tem características próprias que permitem a ele se
psíquico da mãe. Após o nascimento do bebê, a mãe terá que relacionar com o meio mesmo sem ter capacidade de simbolizar, pois esta
lidar com suas fantasias a respeito de seu bebê e com o bebê capacidade só existirá quando entrarem em funcionamento as estruturas
real. do córtex cerebral, especialmente do córtex pré-frontal, proporcionando
• Os meses que se seguem ao nascimento do bebê são exte- a consciência que conhecemos enquanto adultos. Esta outra forma de
nuantes para a mãe, que descobre que dela depende a sobre- se relacionar, a fetal, permanecerá presente, mas de modo inconsciente.
vivência de seu filho. É neste período que ela vai realmente No feto, existem processos neuronais dinâmicos que vão entrando em
assumir o papel de mãe. O binômio mãe-bebê começará a funcionamento no decorrer de seu processo de maturação. Szejer (1999),
se conhecer intimamente e incertezas sobre a capacidade psicanalista francesa que trabalha dentro de uma Unidade de Terapia In-
da mãe de identificar os sinais de seu bebê e atender às suas tensiva Neonatal (UTI Neonatal), mostra, em muitos de seus trabalhos com
demandas surgirão. Nesta fase, a maneira de se relacionar in- bebês, que muito antes da capacidade de simbolização, os bebês estão à
timamente com seu parceiro e seus familiares se repetirá aqui espera de palavras de que necessitam para intermediar sua inserção no
com seu bebê. mundo dos humanos.
• Nesta etapa da maternidade, a nova mãe busca ser reconhe-
cida como boa mãe por outras mães, e isto a faz reavaliar a O bebê, biologicamente, é um ser distinto do adulto. Ele traz estru-
relação com sua própria mãe e repetir ou rejeitar o modelo turas cerebrais funcionantes, mas ainda imaturas, que necessitam ser es-
adotado consigo. A partir destas etapas e como a mulher se timuladas para que se atinja seu potencial na fase adulta. É interessante a
relaciona com cada uma delas fará nascer sua própria identi- ideia de que “existem informações no feto e no bebê que o transformarão
dade como mãe. em um ser falante” (Szejer, 1999). Se pensarmos em termos de linguagem,
Na primeira fase da gestação, a mulher presta muita atenção nos ouvir palavras às quais ainda não se possa entender o sentido estimula
sintomas físicos, nas alterações de humor e nas sensações corporais. Na conexões cerebrais e respostas a nível orgânico e psíquico. Bion (2004),
segunda fase da gravidez, a ênfase recai sobre os movimentos fetais e so- psicanalista da escola inglesa, sempre prestou atenção em seus pacientes
bre a ideia de um ser desconhecido crescendo em seu interior. A terceira adultos e, em seus escritos, fez referência ao afeto contido na fala de seus
fase ou fase final inicia-se quando a mulher começa a considerar seu bebê pacientes e em suas respostas corporais, na grande maioria das vezes,
viável e acredita que se ele nascesse mesmo que prematuramente teria inconscientes. É muito interessante prestar atenção na resposta corporal
chances de sobreviver. Então, nos três trimestres o foco muda da gravidez do bebê ao afeto contido na fala dos pais e/ou cuidadores quando se
para o feto e, finalmente, para o bebê. dirigem a ele.
Existem dois grandes registros de comunicação: a analógica e a digi-
tal. A comunicação analógica caracteriza-se pela transmissão não verbal de
O bebê esperado mensagens emocionais e afetivas, por meio de comportamentos não linguís-
ticos (mímicas, olhares, gestos), enquanto a comunicação digital refere-se,
Bebê real x bebê imaginado principalmente, à transmissão verbal de mensagens de tipo conceitual e
O casal que espera um bebê, muitas vezes, fala de forma racional utiliza-se de palavras, frases, locuções etc. Segundo Golse e Desjardins (2004),
de suas expectativas em relação ao bebê, da preferência por um ou outro seria, no entanto, redutor fazer da comunicação analógica um equivalente
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

da comunicação pré-verbal e da comunicação digital um sinônimo de suas tarefas buscando a perfeição. A perfeição, todavia, afasta-nos daquilo
comunicação verbal; as coisas parecem ser mais intrincadas. Esses mesmos que é humano.
autores escrevem: “Existe uma parte não verbal do próprio verbal, que é a No relato de pais que observam esta dinâmica entre os profissionais
música da linguagem”. Essa noção é importante para que se compreenda a e seu filho, muitas vezes aparece a ambivalência em relação à equipe:
entrada do bebê na ordem da linguagem. O bebê entra na linguagem por ao mesmo tempo em que percebem a competência dos profissionais
sua parte afetiva e analógica, e não pela parte simbólica e digital. Segundo e são gratos por isto, sentem raiva pelo sentimento de impotência, por
Golse e Desjardins (2004), “Para entrar na ordem da linguagem e do simbólico não serem capazes de, neste primeiro momento, cuidarem de seu bebê,
verbal, o bebê precisa não saber, mas experimentar e sentir profundamente de dependerem de um outro e de aparelhos que tomam seus lugares
que a linguagem do outro e, singularmente, a da sua mãe, o toca e o afeta, e enquanto pais.
que esta é afetada e tocada, por sua vez, pelas primeiras emissões vocais dele”.
A UTI Neonatal interpõe-se entre o bebê e seus pais de forma
abrupta, e o fará por longos períodos, especialmente nos casos de bebês
O nascimento prematuro prematuros extremos. Há, então, uma impossibilidade de simbiose entre
a mãe e seu bebê, o que garantiria a continuidade do contato entre a
E o que acontece com a relação dos pais com o bebê quando mãe e seu filho, vivido tão intensamente durante os meses de gestação.
este nasce antes do tempo previsto? A mãe será confrontada com a ideia de que a incubadora fará as vezes
O nascimento, prematuro ou não, constitui-se em uma separação. de seu útero, aquele que não foi capaz de segurar o bebê, motivo pelo
Precisa ser visto como uma etapa da vida humana que pode ser traumá- qual, muitas vezes, ela se envergonha e se sente inferiorizada em relação
tica ou não, a depender das condições em que se dê este nascimento. a outras mulheres e também frente ao seu companheiro. A culpa pelo
Colocar o bebê em cima da mãe, pele a pele, logo após sua saída do nascimento prematuro ronda essas mães de forma intensa. Em sua fala a
ventre, permite-lhe continuar em contato com seus referenciais pré-natais respeito da gestação, costumam questionar atitudes como se buscassem
e permite ao bebê continuar a ser. uma justificativa para este nascimento inesperado. Às vezes, parece que
encontrar um culpado ou um motivo concreto que justifique a prema-
Quando ocorre o nascimento prematuro ou, por algum outro moti- turidade dá aos pais uma falsa sensação de controle sobre a situação,
vo diferente da prematuridade, o bebê necessite ser levado para longe de ainda que não alivie seu sofrimento. Catherine Druon , em Wanderley DB,
sua mãe, acontece uma ruptura no modo relacional que vinha ocorrendo, psicanalista francesa que trabalha dentro de uma UTI Neonatal, escreveu:
até então, por meio do corpo da mãe, e isto acarreta uma desorganização
psíquica ao bebê e aos pais. O bebê perde abruptamente todos os seus Em certos casos, o serviço é vivido como uma mãe toda po-
referenciais, tudo o que conhecia até então: a voz de seus pais, o cheiro, os derosa, que arranca o bebê desta mãe indigna que não pode
batimentos cardíacos de sua mãe etc. Vai ser colocado, então, em um local terminar a sua obra.
desconhecido, e ser tocado e manipulado por estranhos, muitas vezes sem É vivido como o juiz dessa incapacidade e, ao mesmo tempo,
que nenhuma palavra seja enunciada a ele. A fragilidade vista no corpo de como o único recurso para a sobrevivência desse bebê.
um bebê, especialmente de um prematuro, é também uma fragilidade Filho é sentido como parte de seus pais; em uma linguagem
psíquica de quem, sozinho, tem de lidar com o desconhecido. Os pais, por psicanalítica, dizemos que filho é objeto narcísico. Portanto, tudo que é
sua vez, sente-se frustrados, incompetentes, culpados e angustiados por feito ao bebê é, em última instância, sentido pelos pais destes infantes.
tudo ter acontecido de forma diferente do esperado. O nascimento perde, É extremamente doloroso para uma mãe ser substituída por máquinas e
então, a conotação de um acontecimento social e feliz, de celebração da por profissionais da área de saúde, por mais que ela seja grata a estes pela
vida, e a possibilidade de morte e a ideia de perda tomam conta dos pais sua expertise e eficiência e saiba que seu filho está vivo pelo cuidado que
e da família do bebê. está recebendo.
Reconhecendo-se o potencial traumático dessa separação, é im- Para amenizar a dor sentida pelos pais, é preciso que a equipe
portante que não se poupem esforços para que os pais e os familiares
32 tenham acesso ao bebê e sejam estimulados a permanecer perto dele
enfatize com eles e, dentro do possível, vá devolvendo a eles seu lugar
prioritário de cuidadores, conforme a recuperação do bebê permita. Co-
o maior tempo viável. Uma intervenção possível visando aos pais e ao locá-los nos cuidados é permitir que se instale no bebê um sentimento
bebê é que a primeira conversa com os pais se faça ao lado da incubadora de continuidade, continuidade de existir. A mãe, já nos últimos meses
do bebê, para que palavras sejam colocadas na experiência vivenciada da gestação, é tomada por um estado psíquico descrito por Winnicott
por eles juntamente ao bebê, evitando-se lacunas na história e buracos (1983) como “loucura materna primária”, em que é capaz de se identificar
simbólicos nos quais eles e, em especial, o bebê, correm o risco de cair tão profundamente com o bebê que está em seu ventre, funcionando
a qualquer momento de suas vidas. Narrar a experiência vivida ajuda os como se fossem um só. Este estado de “loucura” se prolongará até o final
pais a processarem o acontecido, pois, ao contarem e recontarem suas do primeiro mês de vida do bebê e qualificará a mãe como a pessoa com
experiências, eles a revivem e podem, com a ajuda daquele que os escuta, maior aptidão para responder às necessidades de seu filho. Futuramente,
encontrar um sentido para a experiência vivida, independentemente do ela não lembrará deste “estado de loucura”.
desfecho desta, diminuindo, então, seu potencial traumático. A separação
pode ser vivida respeitando-se a subjetividade de cada um, suas angústias
e dificuldades, e, desta forma, tornar-se uma experiência estruturante, e
não devastadora.
A função do profissional de saúde mental
Szejer (1999) enfatiza que: “Toda separação, seja provisória ou Ao profissional da área de saúde mental cabe, muitas vezes, ajudar
definitiva, deve ser enunciada para o recém-nascido”. Ela adverte aos os pais a se aproximarem deste bebê criticamente doente, pois o medo
profissionais que: de perdê-lo os afasta por longos períodos, deixando o bebê sozinho. Em
algumas situações, observamos mães e pais virem diariamente à UTI,
Não é porque uma criança não é capaz de falar que obterem informações sobre o estado de saúde de seu filho, mas não tole-
devemos deixar de nos dirigir a ela. Sabe-se que as crianças rarem olhar o bebê ou permanecer ao lado do seu leito.
compreendem muito antes de poder falar, e ninguém sabe
em que momento estão em condições de pensar, processo Uma forma de intervenção gentil, que tem se mostrado eficaz nas
que se dá entre a maturação neurológica e a experiência situações em que os pais não conseguem olhar seu bebê, é que o profis-
psicológica. Para pensar, é preciso dispor dos instrumentos sional de saúde mental se coloque próximo à incubadora ou ao berço do
necessários, a saber, as palavras (Szejer, 1999). bebê e o observe atentamente. Após alguns minutos, como que tomados
pela curiosidade sobre o que o profissional está vendo, e na presença dele,
Assim como o filho precisa do cuidado e da confiança dos pais para os pais se encorajam a olhar para seu filho. Iniciou-se, assim, um trabalho
crescer e se desenvolver, os pais, especialmente aqueles de bebês doentes cujo objetivo final é o encontro dos pais e do bebê, no tempo em que se
internados, necessitam da confiança dos profissionais que o assistem para sentirem prontos do ponto de vista emocional. Este encontro dar-se-á por
seu próprio amadurecimento e fortalecimento. Dar autonomia ao pai e à meio do olhar. É pelo olhar do seu bebê que a mãe é reconhecida na sua
mãe, respeitando-se as possibilidades de interação, a depender do estado função. A partir do olhar inicial dos pais ao bebê, o profissional passa a
clínico do bebê, é respeitar seu tempo de construção da maternidade e olhar o binômio mãe-bebê, pai-bebê, ou a tríade mãe-pai-bebê, e, a partir
da paternidade. desta observação, precisa iniciar um diálogo buscando descobrir o que os
Ao bebê criticamente doente, que entra na UTI, é oferecido um pais enxergam quando olham seu filho e o que sentem.
cuidado altamente especializado, com profissionais tecnicamente muito Ao profissional de saúde mental cabe, também, ajudar na comuni-
bem treinados em procedimentos. A grande maioria dos profissionais mé- cação entre a equipe médica e os pais e intermediar a aproximação entre
dicos e de enfermagem tende a fazer procedimentos sem dirigir qualquer os pais e o bebê, se este mostra que está reagindo ao tratamento, ou aju-
palavra ao bebê, o que é um movimento contrário àquele dos pais que dá-los a iniciar um processo de luto, se o bebê dá sinais de que irá morrer.
tomarão conta de seu bebê, passado o período crítico de internação. Não
acredito que isto seja por não se importarem com o bebê, mas, pelo que Até o momento, comentei sobre situações potencialmente traumá-
observo, é muito mais uma defesa, para tentarem esquecer que ali está ticas do ponto de vista psíquico para a tríade mãe-pai-bebê. Poder-se-ia,
um bebê, e, então, fazerem o procedimento de forma segura e eficiente. então, supor que o bebê já nasce pronto para lidar com as emoções e
Há, desta forma, uma separação nítida entre os sentimentos e o fazer; dito as situações que vivencia. Todavia, qualquer pessoa que tenha prestado
de outra forma, uma clivagem interna, que permite ao profissional realizar minimamente atenção às diferentes fases de um bebê percebe que, no
– CAPÍTULO 1 | 1.3 A RELAÇÃO ENTRE PAIS E BEBÊS CRÍTICOS NA UTI NEONATAL –

início da vida, após o nascimento, o recém-nascido dorme a maior parte O entendimento desta dependência absoluta do bebê de um outro
do tempo, de forma que, muitas vezes, no colo de sua mãe, nem o con- coloca a questão da importância da constância do cuidador, no caso, a
seguimos diferenciá-lo de maneira clara do corpo da mãe, como se deste mãe. Mas, se pensarmos no bebê que necessita de internação em UTI
fizesse parte. Há, neste período inicial, uma simbiose. Embora o nasci- Neonatal, teremos que enfrentar a problemática de que ocorre troca
mento biológico seja um desligamento do corpo materno, o nascimento constante de pessoal de enfermagem e médicos e, habitualmente, não
psíquico não coincide com este, e é um processo lento e contínuo, que há um cuidador de referência para o bebê. Coloca-se, então, mais um risco
necessita de determinadas condições para que ocorra. para este bebê: além da fragilidade do corpo, a fragilidade psíquica logo
Podemos nos referir ao nascimento psicológico do indivíduo como em sua constituição.
um processo de separação – individuação. Isto implica a aquisição, pelo Para que o bebê sobreviva, é preciso que a mãe se conecte com o
bebê, de um funcionamento autônomo gradual, na presença da mãe desejo de viver de seu filho. Permitir a permanência da mãe, estimular o
emocionalmente disponível. As principais aquisições psicológicas deste contato dela com o bebê e colocá-la nos cuidados assim que possível, são
processo vão ocorrer entre 4 e 36 meses de vida do bebê. É importante atitudes que, além de estimularem o vínculo mãe-bebê, devolvem a ela
ressaltar que este, como qualquer outro processo intrapsíquico, nunca seu lugar de mãe retirado pela UTI e sua equipe, e devolvem ao bebê a
termina, permanece sempre ativo. possibilidade de um vir a ser. A equipe e a UTI precisam funcionar como
objeto de suporte para a mãe que, então, proverá o suporte para seu bebê.

O que é aparato psíquico?


É interessante nos perguntarmos o que é o psíquico, pois a ele
Conclusão
estamos nos referindo desde o início deste texto. Sabemos que ele não Espero, por meio desta breve exposição, ter tornado mais clara a
é um órgão como o cérebro, por exemplo. O conceito de psíquico, para importância do cuidado especializado a ser oferecido ao bebê e do su-
Freud, engloba instâncias que vão do inconsciente ao consciente e do id porte emocional aos pais no contexto do nascimento. Esta experiência
ao ego. Celes , em Aragão RO, explica: tem potencial de se tornar traumática se nós, profissionais da área de
O sentido de nascimento psíquico seria o nascimento saúde, não nos atentarmos aos sinais de sofrimento de nossos pacientes
humano por excelência, não sendo o psíquico um ente, mas e suas famílias. Receber a notícia de que o filho necessitará de UTI coloca
as condições, o fundamento e o processo que constituem o a família em estado de desespero e desamparo. Em lugar de celebrar
humanamente entendido como tal. Costuma-se dizer que a vida, inicia-se um diálogo em que a possibilidade de morte é trazida
originariamente um bebê é humano quando alguém o re- para o agora. Reconhecer o sofrimento do outro e cuidá-lo deve ser, em
conhece como tal. Talvez se possa entender assim o mínimo última instância, o objetivo de cada profissional da área de saúde que se
psíquico, a condição decisiva para que se estabeleça o nasci- propõe a trabalhar com seres humanos em qualquer fase de suas vidas.
mento psíquico. A troca de experiências, ideias e saberes entre profissionais de diferentes
áreas, contemplando o que se chama, hoje, de interdisciplinaridade, é o
Freud postulou que o ego é, antes de tudo, um ego corporal, e, por que pode propiciar um cuidado mais amplo e eficaz. Discussões clínicas
isso, predominantemente sensorial. O bebê nasce com uma consciência com abordagem de diferentes perspectivas instrumentalizam cada um
rudimentar. É exposto a uma infinidade de estímulos percebidos pelos ór- dos profissionais a lidar de forma mais segura com seu paciente, e a
gãos dos sentidos, os quais percebe, mas não compreende. Para que com- colaboração entre os colegas diminui o grau de estresse e angústia dos
preenda, ele precisa da mãe. A mãe terá a função de conter e transformar próprios profissionais. Quanto mais curiosidade tivermos pelo bebê e
estes estímulos percebidos pelo recém-nascido. Essa transformação se dá seus familiares, mais humano será nosso olhar.
no inconsciente da mãe, que contém as angústias de seu bebê e o cuida
com amor. A mãe, então, exerce uma atividade psíquica organizadora
das diferentes percepções do bebê, e as traduz na forma de experiências,
função chamada de capacidade de rêverie (Bion, 2004). A capacidade de
33
rêverie da mãe vai levar aos primórdios do pensamento no bebê. Pode-
mos entender, então, que corpo e psique são indissociáveis no bebê.
O desenvolvimento emocional do bebê vai se dar, então, em uni-
dade com a mãe.
Um recém-nascido dorme cerca de 20 horas por dia. Em suas pou-
cas horas de vigília, empenha-se em atingir a homeostase, livrando-se de
sensações que causam tensão: fome, sede, vontade de urinar e defecar,
tossir , espirrar, vomitar etc. Para se livrar dessas e outras tensões, o recém-
-nascido depende de um outro, habitualmente, a mãe. Podemos supor,
então, que o nascimento físico deixa o bebê na condição de dependência
absoluta do outro. O acúmulo de excitações corporais das quais o bebê
não consegue se livrar constituem-se, para Freud, em angústia, e denun-
ciam a insuficiência do psíquico no bebê.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

1.4 ASSISTÊNCIA AO NASCIMENTO EM UM


OLHAR PARA O SUJEITO EMERGENTE

Raulê de Almeida

Cada nascimento é único, não se repete jamais, traz um novo sujeito a ser escrita ou uma tábula rasa sobre a qual se colocava o que quisesse.
com outro histórico sociocultural, um pai e uma mãe, uma concepção Enfim, um ser passivo a receber os estímulos do ambiente.
psíquica seguida da concepção biológica, uma embriogênese seguida Vygotsky (1999), já nessa época, disse que “Um dia o cuidador pode-
da fetogênese, um nascimento biológico seguido da possibilidade rá fazer a diferença na vida de uma criança, desde que tenha estabelecido
do nascimento psíquico e, enfim, outra vida que segue. O cuidador do com ela uma interação facilitadora de sua estruturação psíquica, a partir
nascimento, estimulando e favorecendo a interação mãe-bebê, facilita a da qual ela poderá fazer escolhas e tomar atitudes definidas e confiantes”,
formação e/ou a fortificação do apego e do vínculo afetivo entre estes, ou seja, saber quem é e o que quer.
o que contribui para a construção da arquitetura neuronal cerebral e a
estruturação psíquica do sujeito emergente conhecedor de si e integrado Freud, nos meados do século XX, citado por Honigsztejn H, disse que
na sociedade. “Há muito mais continuidade entre a vida intrauterina e a primeira infância
do que a impressionante cesura do ato do nascimento nos permite saber”.
Considerando as notificações estatísticas da Organização Mundial Isto nos remete a valorizar a história do bebê, de sua mãe e de sua família
da Saúde (OMS), em nosso planeta nascem cerca de 350 mil bebês por e não nos determos aos seus potenciais genéticos e às suas competências
dia. Destes, 12 mil morrem no período neonatal, concorrendo os países inatas. A história do bebê começa antes de sua concepção e pode influen-
em desenvolvimento, como o Brasil, com 98% destes óbitos. Destes óbitos ciar sua estruturação psíquica.
neonatais, aproximadamente dois terços ocorrem na primeira semana de
vida, e dentre os óbitos da primeira semana de vida, aproximadamente Hené Spitz, após a Segunda Guerra Mundial, observou e escreveu
dois terços ocorrem nas primeiras 24 horas. Portanto, o risco de um bebê que bebês separados de seus pais e deixados em abrigos onde recebiam
morrer no período neonatal é 15 vezes maior do que em qualquer outro cuidados físicos, porém pouco afeto e atenção descontinuada, perdiam o
momento do primeiro ano de vida. De forma semelhante, um estudo interesse pelo meio, tornavam-se apáticos, hipotônicos, anoréxicos, per-
sobre a mortalidade dos neonatos residentes no Distrito Federal, em 2003, diam o desejo de viver e até morriam se não fossem investidos de amor e
segundo dados do Núcleo de Neonatologia, Sistema de Informações de atenção a tempo.
Nascidos Vivos e Sistema de Informação sobre Mortalidade da Secretaria John Bowlby, na década de 1950, observando os efeitos da privação
de Saúde do Distrito Federal (SES-DF), mostrou que a regra dos dois ter- da figura materna no desenvolvimento das crianças, concluiu e postulou a
ços, referente à mortalidade infantil no primeiro ano de vida, aconteceu Teoria do Apego, segundo a qual um vínculo inicial seguro entre a mãe e
também nesta Unidade Federativa. Muito podemos fazer para diminuir o seu bebê proporciona a este um sentimento positivo de segurança em
esta mortalidade e melhorar a qualidade de vida dos sobreviventes, pro- relação ao mundo.
porcionando-lhes chances de realização plena enquanto seres humanos. O conhecimento dos efeitos danosos sobre o desenvolvimento e
Em conferência proferida para a SES-DF, em 2003, o Dr. Kaare E. sobre a estruturação psíquica na infância, devido à ausência dos pais, le-
Lundstrøm, chefe do Departamento de Neonatologia do Hospital-Escola vou os estudiosos e cuidadores da criança a repensarem, a partir de então,
da Universidade de Copenhagen, informou que grandes investimentos o bebê com psiquismo em desenvolvimento e suscetível a influências do
34 em tecnologia de ponta só resultaram em queda da morbimortalidade, meio ambiente.
naquela comunidade, quando foram associados a esta tecnologia, assis- Winnicott descreveu que uma mãe suficientemente boa, atenta
tência baseada em programas de cuidados humanizados e individualiza- e pronta para atender às necessidades do seu bebê, mas não a todas as
dos para os bebês, a partir do nascimento, sobretudo para os prematuros. necessidades, é importante para o desenvolvimento de um sentimento de
Segundo o Anuário Estatístico do Ministério da Saúde do Brasil, a queda segurança e bem-estar psíquico dele. Esta condição de mãe suficientemen-
da fecundidade e da mortalidade infantil na população brasileira resultou te boa deve desempenhar três funções fundamentais:
em maior sobrevida e aumento de idosos. Isto nos conduz, portanto, a
cuidar hoje do bebê, vislumbrando o ancião saudável do amanhã, com • O holding, montagem do colo ou aconchego, que, dando a
sua estrutura biológica e seu sujeito psicocognitivo preservados e inte- sustentação física e psíquica ao bebê, denota a identificação
grados no mundo. materna com ele.
• O handlin, que é a forma como o bebê é cuidado e tocado,
No Brasil, existem normas para a assistência perinatal. Uma delas é dando-lhe a noção da existência, dimensão e limite do seu
o protocolo da Sociedade Brasileira de Pediatria para reanimação do bebê próprio corpo.
na sala de parto, que é também instituída pela American Academy of • A apresentação ao bebê dos elementos substitutivos ao corpo de
Pediatrics e pela American Heart Association. Esta norma orienta que, ao sua mãe, auxiliando-o a perceber o mundo além de si e dela.
nascimento de cada bebê, o assistente deve indagar se este é de termo, Werner (2001), psiquiatra infantil, a partir da observação de crianças
se respirou ao nascer, se chorou, se o seu tono muscular é bom e se o assistidas na enfermaria de pediatria do Hospital-Escola da Faculdade de
líquido amniótico tem mecônio. Se a resposta for favorável para todas as Medicina da Universidade Federal Fluminense, concluiu e escreveu que,
indagações, o bebê deverá ser mantido junto de sua genitora até ir para o mesmo que se ofereçam nutrientes e medicamentos à criança, porém
alojamento conjunto e ali permanecer até o momento da alta hospitalar, sem afeto, vínculo e cumplicidade, ela perde a vontade de viver, deixa
facilitando, assim, a amamentação, a formação e/ou a fortificação do ape- de produzir hormônio de crescimento e imunoglobulinas, definha-se e
go e do vínculo afetivo, que é a base para a arquitetura neuronal e para a pode até morrer. A isto, ele denominou “Síndrome da Carência Afetiva”,
estrutura psíquica do sujeito emergente. De forma semelhante, a portaria que pode ser evitada pela manifestação de cumplicidade por parte do
do Ministério da Saúde que trata do aleitamento materno estabelece cuidador para com a criança, que percebe o valor que lhe é dado e reage
que, nos casos favoráveis, toda equipe perinatal deve facilitar, estimular rumo à vida.
e auxiliar para que o bebê sugue o seio materno durante os primeiros 30
minutos de vida e permaneça junto de sua mãe, com contato pele a pele, Brazelton (1995) descreveu que o histórico familiar e sociocultural,
até ir para o alojamento conjunto e dali para o seu domicilio, favorecendo, os potenciais genéticos, as experiências da vida intrauterina e perinatal
desta forma, o olho a olho mãe-bebê. Se for imperativa a prescrição de se- e as competências inatas, somados à integridade neurológica do bebê
dativos, analgésicos e anestésicos para as parturientes, esta conduta deve e a uma adequada interação deste com os cuidadores, formam as bases
ser discutida em equipe, a respeito dos seus riscos, custos e benefícios para o desenvolvimento normal da criança. Enfim, o cuidador, seja ele
para a mãe e para o bebê. Exceto em condição de necessidade estudada primordial ou não, parental ou não, eleito ou instituído, desde que exerça
e predefinida, pode-se separar a mãe do seu filho neste momento. Logo a função primordial com cumplicidade, pode, além de influenciar a cons-
após o nascimento, com o bebê junto de sua mãe e com a ajuda desta, trução do instrumento corpo, influenciar também a estruturação psíquica
este deve ser enxugado com um tecido seco preaquecido e de textura do bebê. Na relação estabelecida com cumplicidade, o cuidador e o bebê
macia. influenciam-se mutuamente, o bebê percebe-se e também ao mundo;
então, acontece a socialização.
Indaga-se, com frequência, se o bebê, já ao nascimento, possui
psiquismo desenvolvido. A neurociência já demonstrou que a arquitetura Thomas R. Verny (2008), na década passada, escreveu que a ansieda-
neuronal cerebral, que é um dos pilares para a construção do psiquismo, de e a depressão sofridas pela mãe no período de gestação ou perinatal,
tem início antes do nascimento, passa por este e segue ao longo do de- bem como o estresse em neonatos, constituem fatores de risco para
senvolvimento infantil. Para melhor compreender esta afirmativa, vejamos danos cerebrais em desenvolvimento e instalação de doenças, dependên-
como fluíram no tempo os conceitos a respeito do bebê. cias e transtornos de personalidade. Daí que nós, os cuidadores, devemos
estar sempre atentos a estas condições maternas e neonatais para instituir
Nos meados do século XX, definia-se o bebê como um ser passivo, medidas preventivas precoces.
um tubo digestivo, uma massa plástica a ser moldada, uma lousa branca
– CAPÍTULO 1 | 1.4 ASSISTÊNCIA AO NASCIMENTO EM UM OLHAR PARA O SUJEITO EMERGENTE –

Nos primórdios da vida, as percepções sensoriais do bebê são dis- segundo as emoções, verbalizadas ou não, sofridas por suas mães. Isto evi-
persas e desintegradas, mas, a partir dos cuidados maternos diários, do dencia que o bebê percebe alterações emocionais maternas e, por meio
apego e do vínculo afetivo com o sujeito da função primordial materna, de competências sensoriais, pode apresentar alterações neurofisiológicas
o bebê vai adquirindo e reforçando a percepção de si e a segurança na frequência e no ritmo cardíacos. Esta percepção por parte do bebê
na relação com o cuidador e o meio, até se ver como pessoa inteira e também pode interferir em sua estruturação psíquica emergente.
integrada com o outro e com o mundo. Por isto devemos monitorar Golse (1998) descreve a linguagem do bebê como sendo analógica,
possíveis dificuldades na formação do vínculo mãe-bebê, já perceptíveis por meio de expressão corporal, posturas, movimentos, gritos e interações
antes do nascimento e que poderão resultar em transtornos somáticos visuais, sinais estes emitidos pelo bebê ao cuidador, que os recebe, com-
e/ou psíquicos futuros. A função do cuidador primordial é a base para a preende e responde. Em contrapartida, o bebê percebe e responde aos
estruturação psíquica da criança, seguindo a importância da função dos estímulos partidos do cuidador, toma iniciativa e controla a interação. Para
outros cuidadores. isto, chora, sorri, mira firme ou desvia o olhar, deixa de responder a um ou
O bebê é um sujeito em constituição e já possui singularidade, a outro estímulo e é capaz de conduzir a interação. O bebê é social, recebe
vivências e história, cujos primórdios encontram-se nas fantasias de sua e promove influências interpessoais, isto possibilita sua sobrevivência, seu
mãe a respeito do bebê imaginado e nas primeiras relações desta com o crescimento e sua estruturação psíquica. Esta competência de comunica-
bebê real, além de suas próprias experiências, dentro do útero materno e ção possibilita ao bebê interagir com sua mãe logo após o nascimento,
ao nascimento, pelo reconhecimento visual de sua genitora. Reconheci- facilitando a formação ou o reforço do vínculo com ela para, em seguida,
mento este descrito por Busnel (2002) como sendo “o momento mágico”. interagir com outros cuidadores.
Enquanto cuidadores perinatais, podemos influenciar este e outros mo- Dunker (2008) descreve a estruturação do sujeito por meio da
mentos mágicos subsequentes e importantes na estruturação psíquica do relação entre a criança e seus cuidadores, na qual o cuidador, a partir do
bebê. A nossa atitude pode ser favorecedora do encontro mãe-bebê e da nascimento, pode facilitar este processo conversando com a criança/bebê
formação do apego e do vínculo afetivo, alicerce para a estruturação do e dando sentido à sua linguagem, cuidando e interagindo com ela, incluin-
psiquismo do sujeito emergente. A estruturação psíquica do bebê tem do-se aí as trocas corporais investidas de carinho e satisfação, numa atitude
início nos primórdios da vida de sua mãe, começa antes da concepção semelhante à imagem vista no espelho, repetindo o seu gesto, pedindo
psíquica dele, quando da imaginação da menina futura genitora, que, e oferecendo palavras e coisas, permitindo ou impedindo experiências
embalando seu boneco de pano, fazia de conta que o amamentava e o pelas quais o mundo lhe é apresentado e, daí, possibilitando a identifica-
cuidava, seguindo, depois, a intenção de concepção, a concepção bio- ção formadora do eu, a filiação e a busca da solução para a sexuação e a
lógica, a gestação embrionária e fetal, o preparo do enxoval, o período complementação do ciclo da vida.
perinatal, com seus estímulos físicos e sociais, a estruturação do sujeito
emergente e a sua inclusão no mundo. Segundo Souza (Brasil) e Klaus (Estados Unidos) (2002), na obra de
Busnel (2002), mães que tiveram contato precoce e mantido com seus
Segundo Busnel (2002), existe, ao nascimento, um momento espe- bebês, desde o nascimento, estenderam a amamentação por mais tempo
tacular, extraordinário, extremamente rápido e sensível de aprendizagem quando comparadas às mães que não tiveram contato precoce e mantido
e reconhecimento, em que o recém-nascido vê, reconhece e guarda a com seus bebês após o nascimento.
imagem de sua mãe como lhe sendo própria. Ele tem todos os sentidos,
utiliza-os e lembra-se de tê-los utilizado enquanto feto. É um ser sensorial, Shore (2000) descreve que o desenvolvimento do bebê não é linear
sente gosto e cheiro, escuta, memoriza, habitua, desabitua, prefere voz, e progressivo em direção à vida adulta; não depende apenas dos genes
prefere voz da mãe, o gosto e o cheiro do leite dela, prefere cheiro de com os quais se nasce, mas também das experiências deles e de suas inte-
sua mãe e responde às emoções maternas. A permanência do bebê junto rações com o cuidador. As experiências dos primórdios da vida ajudam a
de sua mãe lhe proporciona reconhecer o que lhe era familiar dentro do formar a arquitetura cerebral, a natureza e a extensão das capacidades no
útero, e isto é um determinante de que, exceto nos casos imperativos, adulto. Existem períodos preciosos para se adquirir diferentes tipos de co-
admite-se a separação mãe-filho ao nascimento. Nos dois dias que se- nhecimentos e habilidades, um deles é o nascimento. Mas a estruturação
guem ao nascimento, o bebê se consola com a contenção nos braços do sujeito vai além deste tempo, é contínua. 35
de sua mãe, com a voz e o cheiro dela, diferentemente daqueles que Ao conceber, gestar e dar à luz, a mulher acrescenta à sua condição
permaneceram separados de suas mães. Ao nascimento, o bebê procura de filha a condição de mãe, traz consigo necessidades íntimas, mais bem
marcos de referência a que estava habituado na vida intrauterina, e, não resolvidas no ninho familiar, como acontecia primordialmente, quando
raro, é deixado sem contenção, num lugar frio e sem vida: o berço. Quanto o parto ocorria no domicílio, com os cuidados mãe-bebê como encar-
maior o tempo de separação do bebê de sua mãe, maior o seu estresse e, gos dos parentes e das pessoas íntimas eleitas. Hoje, habitualmente, o
proporcionalmente, maior o nível de cortisona endógena neonatal e suas nascimento do bebê ocorre na maternidade, equipada com os recursos
consequências. técnicos necessários, e, ali, estamos como cuidadores. É este o momento
Leboyer (1992) também demonstrou que existe, após o nascimento em que, ao cuidar de cada rebento, devemos ter um olhar para além do
do bebê, um período muito sensível de reconhecimento e aprendizado, seu instrumento corpo, mas também voltado para a estrutura psíquica do
propício para dar-lhe todo conforto e prazer imediatos, pelo que não é sujeito ali emergente, junto de sua mãe e com toda a sua história, uma vez
nosso direito roubar-lhe este momento, separando-o de sua mãe. que o bebê não existe sozinho.
Busnel (2002) demonstrou, em outros estudos, que a frequência e o
ritmo cardíacos de fetos e recém-nascidos pré-termo ou a termo alteram
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

1.5 LIMITE DE VIABILIDADE

Paulo R. Margotto, Sandra Lins, Marta David Rocha de Moura, Márcia Pimentel,
Patrícia Leão Bered, Martha G. Vieira, Zilma Eliane Ferreira Alves, Lucila Nagata

A sobrevivência de recém-nascidos (RNs) prematuros melhorou ao


longo das últimas cinco décadas. A idade gestacional em que pelo menos
metade das crianças sobrevive diminuiu de 30 a 31 semanas, nos anos
1960, para 23 a 24 semanas, durante esta década. O aumento da sobrevida
destes RN cada vez menores e vulneráveis representa uma enorme me-
lhoria ocorrida no pré-natal e no período perinatal. A estreita colaboração
entre a Perinatologia e a Neonatologia e os avanços na compreensão da
fisiopatologia fetal e neonatal com ênfase no período transicional tiveram
importante papel.
Um dos desafios fundamentais na Medicina Perinatal, a partir de sua
criação, é definir o nível de maturidade, abaixo do qual a sobrevivência
e/ou o aceitável neurodesenvolvimento são extremamente improváveis.
Do ponto de vista ético, cada serviço deve ter o seu limite de via-
bilidade (cada serviço tem que conhecer a sua capacidade de manter
um RN naquelas condições com qualidade de vida). Eticamente, é muito
mais importante dar uma vida digna do que simplesmente salvar a vida.
Portanto, é importante que se estabeleça limite para cada serviço. A Rede Vermont disponibiliza uma calculadora de sobrevida con-
siderando os dados da unidade filiada. Basta colocar idade gestacional,
O estudo realizado na Unidade de Neonatologia do Hospital Regio- peso, sexo, parto único e uso de corticosteroide pré-natal: https://
nal da Asa Sul/Hospital Materno Infantil de Brasília/Secretaria de Saúde nightingale.vtoxford.org/calculator.
do Distrito Federal (HRAS/HMIB/SES-DF) por Castro et al. (2012), ao avaliar
a proporção de sobrevivência por cada semana de idade gestacional, Segundo a Vermont, as informações contidas neste site não preten-
observou que o limite de viabilidade foi de 26 semanas; no entanto, quase dem ser a única base para a tomada de decisões de cuidados para um
metade (45,4%) dos RNs com 25 semanas sobreviveram até 28 dias, au- bebê em particular, nem um meio definitivo de prever os resultados do
mentando para 91% nos RNs de 31 semanas (gráfico 1). bebê. Os usuários devem ter em mente que toda criança é um indivíduo
e que fatores além dos descritos neste site influenciam a sobrevivência e o
Gráfico 1 - Taxas de sobrevivência nos recém-nascidos entre 25 semanas e 31 desenvolvimento da criança.
semanas e 6 dias
Veja esse exemplo usando dados da Unidade de Neonatologia do
HMIB/SES-DF: RN com 25 semanas, 650 g, feminino, nascimento único e
uso de esteroide.

36

Fonte: Castro et al. (2012). Resultado:


Segundo Marba et al. (2014), a Rede Brasileira de Pesquisas Neona-
tais, entre 2008 e 2012, envolvendo 6.628 crianças e 16 unidades universi-
tárias brasileiras de nível terciário, mostrou que a sobrevivência nos RNs
com idade gestacional <24 semanas foi, em média, de 5,9%.
Limites de viabilidade na Unidade de Neonatologia do HRAS/
HMIB/SES-DF:

Interessante notar que, se esse bebê não recebesse o esteroide


pré-natal, as taxas de sobrevivência com tratamento ativo e para todas as
crianças, incluindo as que não receberam tratamento ativo, cairiam para
62% (29%-87%) e 56% (24%-84%), respectivamente.
– CAPÍTULO 1 | 1.5 LIMITE DE VIABILIDADE –

Idade gestacional e peso ao nascer No entanto, para evitar erros de interpretação na prática diária, con-
tinuamos usando a idade gestacional nestes casos.
Há uma falsa sensação de certeza na estimativa da idade gestacio-
nal e do peso fetal (erro de quatro a sete dias na estimativa da idade ges- Uma vez que a idade gestacional foi estabelecida, esta não deve
tacional faz uma grande diferença nos desfechos; o peso fetal é altamente ser modificada ao longo da gestação. As medidas fetais realizadas em
variável, dependendo de quando a estimativa foi feita). ultrassonografias subsequentes são parâmetros essenciais para avaliação
de crescimento fetal, e não mais para datar a gestação.
Entretanto, considerar exclusivamente a idade gestacional pode
não ser a melhor escolha. As evidências são limitadas, e a determinação A idade menstrual tem pouca acuracidade devido a muitas variáveis,
da duração da gestação pode variar de acordo com os métodos diag- as principais são: a maioria das mulheres não anota o primeiro dia da mens-
nósticos utilizados – se a idade gestacional for determinada pelo exame truação regularmente; muitas mulheres têm ciclos irregulares; e a primeira
físico neonatal: no estudo de Hack e Fanaroff (1999), a distribuição da fase do ciclo ovulatório pode variar de dez dias (ovulação precoce) a 21 dias
idade gestacional pelo exame físico, pelos critérios físicos de Ballard et (ovulação tardia). Matsumoto et al. mostraram que as ovulações precoce e
al., desviou-se para a direita (uma semana a mais). Este fato pode levar a tardia ocorrem, aproximadamente, em 20% da população.
diferentes decisões quanto ao tratamento a ser oferecido. O emprego da ultrassonografia proporcionou um importante avanço
Também não devemos considerar exclusivamente o peso ao nascer, na clínica obstétrica. Para se ter uma boa avaliação do crescimento fetal, é im-
pois um RN de 750 g, adequado para a idade gestacional, tem um período portante o conhecimento da idade gestacional, o que pode ser determinado
de gestação entre 22 e 26 semanas, mas a sobrevida é completamente por vários parâmetros:
diferente. • No primeiro trimestre (até 13 semanas e 6 dias), pelo compri-
mento cabeça-nádega, que é o padrão-ouro de estimativa de
Avaliação da idade gestacional com maior precisão no idade gestacional intraútero.
pré-natal: • No segundo trimestre (14 semanas a 27 semanas e 6 dias),
pela medida da circunferência cefálica, do diâmetro biparietal
Zilma Eliane Ferreira Alves, Denilson de Medeiros Bem, Cibele e do comprimento do fêmur.
Setor de Gestação de Alto Risco do HMIB/SES-DF • No terceiro trimestre (> 28 semanas), por meio do diâmetro
A idade gestacional é padronizada, na prática obstétrica, como a biparietal, da circunferência cefálica, da circunferência abdo-
idade menstrual, ou seja, o tempo contado a partir do primeiro dia do minal e do comprimento do fêmur. A utilização desses múlti-
ciclo menstrual (DUM), sendo o ciclo padrão de 28 dias. plos parâmetros é fundamental por oferecer menor margem
de erro.
A idade conceptual deve ser reservada apenas para aqueles casos Nos casos de DUM desconhecida, é recomendado o uso da idade
de fertilização in vitro. Nesta situação, devemos saber a idade do embrião gestacional ecográfica.
que será implantado. Então, idade gestacional = idade do embrião + 14
dias.
Tabela 1 – Diretrizes para redatação da gestação, com base em ecografia

37

Fonte: The American College of Obstetricians and Gynecologists, American Institute of Ultrasound in Medicine e Society for Maternal-Fetal Medicine.

De acordo com a literatura internacional, a idade gestacional e o nas e < 500g, respectivamente (praticamente nenhuma chance para a
peso de nascimento, abaixo dos quais os bebês são muito imaturos e a sobrevivência intacta; sem alterações nos últimos 10-15 anos).
oferta de tratamento intensivo não são razoáveis, parecem ser < 23 sema-
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Os RNs ≥ 25 semanas ou com peso ≥ 600 g apresentam matu- Na verdade, a maioria das crianças imaturas na zona cinzenta
ridade suficiente para sobreviver e, em 50% dos casos, sem sequelas apresenta fatores pré e perinatais que afetam sua condição clínica no
graves no longo prazo. momento do nascimento.
No entanto, para RNs com idade gestacional entre 23 e 24 sema- Para os pacientes que estão na zona cinzenta, é recomendada uma
nas e 6 dias e peso ao nascer entre 500 g e 599 g, tanto a sobrevida análise cuidadosa de certos fatores adicionais e constante reavaliação do
quanto o prognóstico são altamente incertos. Neste grupo da cha- efeito do tratamento na sala de parto e, depois, na UTI Neonatal. A atuação
mada “zona cinzenta”, o limite entre a autonomia do paciente ou de da Obstetrícia desempenha importante papel na decisão do neonatologista.
seus familiares e a futilidade do tratamento é muito estreito, e as decisões
quanto à conduta a ser adotada são mais complexas.
Significativas consultas ao obstetra e à família
A zona cinzenta, para os dados perinatais da Unidade de Neonatolo-
gia do HRAS/HMIB/SES-DF, está entre 24 semanas e 24 semanas e 6 dias. • Avaliação correta da idade gestacional da paciente antes.
Nesta faixa de idade gestacional, as intervenções obstétricas terão • Avaliação da condição do paciente no momento do nasci-
profundas influências nos neonatologistas. mento (reanimação bem sucedida): tem significativo impacto
na sobrevivência e na morbidade.
• Considerar fatores de proteção:
Zona cinzenta • - Restrição do crescimento intrauterino.
• - Cesariana: sofrimento fetal, consentimento dos pais.
A aplicação do conceito da “zona cinzenta” é mais adequada para
• - Peso ao nascer.
definir os limites de viabilidade para os RNs muito imaturos para sobrevi-
• - Sexo feminino: menor mortalidade (três a quatro dias mais
ver (24 semanas a 24 semanas e 6 dias).
maduras em relação ao sexo masculino).
Nesta faixa, a sobrevivência e os resultados no longo prazo são, • - Uso de esteroide pré-natal: melhora a mortalidade e as lesões
em geral, muito pobres para o grupo, mas muito difíceis de prever e, cerebrais.
possivelmente, aceitáveis para um paciente individual. A sobrevivência e Assim, estas informações conferem ao neonatologista segurança na
a evolução, mesmo nesta relativamente estreita faixa, podem variar con- melhor tomada de decisão para os recém-nascidos na zona cinzenta, em
sideravelmente em função dos pacientes, do nível de maturidade e em que a incerteza do resultado é a regra, e não a exceção.
certas outras condições.
Após contempladas todas as opções com a família e os profissio-
Abaixo do limite inferior da zona cinzenta (< 24 semanas), o bebê nais que estão em situação de extrema dificuldade no nascimento dos
é muito imaturo para ter qualquer razoável chance de sobrevivência sem bebês na zona cinzenta, com base em Seri e Evans (2008), elaboramos o
deficit graves. Para essas crianças, a prestação de outros cuidados que não seguinte algoritmo, tendo por referência a análise dos dados da literatu-
sejam os cuidados de conforto não é racional. ra e a experiência no Serviço Neonatal do HRAS/HMIB/SES-DF.
Figura 1 – Algoritmo de tomada de decisão para os RNs no limite de viabilidade

38

Fonte: Adaptado de Seri e Evans (2008).

Ao nascimento: • Avaliação contínua.


Frequência cardíaca (FC) • Envolvimento dos pais.
• Estado clínico ruim: descontinuar a intervenção/conforto.
• Ausente ou ≤ 40 bpm: Portanto, nestes recém-nascidos na zona cinzenta:
• Não reanimar/iniciar medidas de conforto.
• > 40-50 bpm: • CPAP nasal/ Nutrição Parenteral/ Antibióticos (se indicado)
• Ventilação com máscara/intubação. • No entanto, após discussão com a Equipe e considerando:
• FC < 100: resposta ruim: descontinue intervenções; conforto. » Restrição do crescimento intrauterino.
• Boa resposta: surfactante/gases/hidratação venosa e UTI » Sexo ao nascer (feminino).
Neonatal. » Nascimento único.
• Resposta ruim: descontinue reanimação/conforto. » Peso ao nascer.
Na UTI Neonatal: » Condições ao nascer.
– CAPÍTULO 1 | 1.5 LIMITE DE VIABILIDADE –

» Uso de esteroide pré-natal. Além disto, é necessário refletir sobre o direito destes
» Cesariana. pacientes de terem uma vida digna, mesmo curta, e, poste-
» Desejo dos pais. riormente, uma morte também digna. A impossibilidade de
» Fertilização in vitro. quantificar o sofrimento do prematuro inviável, bem como a
dificuldade em tratá-lo, não faz com que ele deixe de existir. Neste contex-
to, a percepção dos pais sobre quais cuidados reduziriam o sofrimento do
Ventilação mecânica, principalmente naquele próximos à viabi- seu bebê deve ser sempre levada em consideração.
lidade. Para o Serviço de Saúde em questão, esta pesquisa trouxe como
resultado a necessidade de maior divulgação dos protocolos utilizados na
Desejo dos pais Unidade, preenchimento detalhado do prontuário dos prematuros inviá-
Devido à incerteza do resultado, considerar o desejo dos pais se veis, padronização e oferta regular de apoio psicológico e espiritual para
estes de fato representam os interesses do bebê. os pais, estímulo à participação familiar na curta vida e posterior morte do
prematuro, bem como educação continuada e apoio psicológico para os
Oferecer apoio, suporte (estamos aqui para cuidar e fazer o melhor profissionais que lidam com estes pacientes.
para o seu bebê). Os pais precisam de conselhos e, em 79% dos casos,
estarão de acordo com o que o médico aconselhar. Se os pais pedirem Percebe-se, assim, o quanto é importante se discutir o viver, princi-
para não reanimar, os médicos deveriam atender. palmente quando o fim da vida é sabidamente próximo e todo o processo
ascimento-vida-morte é concluído em poucas horas. Nesse contexto, o
atendimento às necessidades de cada etapa do processo vida-morte em
Incerteza na idade gestacional/conflito com os pais um período de tempo tão curto é desafiador, as discussões são escassas
Havendo incerteza sobre a idade gestacional do recém-nascido e/ e os protocolos assistenciais são vagos, o que leva à necessidade de mais
ou um conflito não resolvido entre os médicos e os pais, a provisão de estudos neste campo que possam fomentar a qualidade do atendimento
cuidados clínicos deve continuar. A condição da criança será reavaliada e o respeito pela integridade e pela dignidade, tanto do prematuro quan-
durante as etapas subsequentes do manuseio. to de sua família.

Interrupção dos cuidados Malformações


A interrupção dos cuidados é uma condição prevista (pode ser sus- Precisamos reconhecer a certeza e as incertezas do nosso diagnós-
penso se o tratamento for considerado inefetivo ou fútil), sendo tão ético tico. Se tivermos um diagnóstico genético-molecular preciso, podemos
não os iniciar quanto descontinuar em algum momento. Deve-se evitar o agir com base nesta informação, podendo até recomendar a interrupção
reinício dos cuidados, uma vez interrompidos. da gravidez no início do 2º trimestre com estes dados.
Medidas de conforto Não devem ser reanimados os RNs com malformações facilmente
No lugar de paciente terminal, doente sem possibilidade de cura, reconhecíveis, com desfecho letal ou estado vegetativo em 100% dos
mas nunca sem possibilidade de cuidados. casos, e deve-se ter uma confirmação laboratorial.
• Alimentação. Defeitos estruturais incompatíveis com a vida, segundo Golds-
• Calor. mith et al. (1996), em Marba et al. (2014):
• Medicamentos para a dor. • Hidranencefalia.
Oliveira (2020), em seu estudo sobre “Cuidados paliativos para • Anencefalia-holoprosencefalia.
prematuros extremos com idade gestacional menor que o limite de • Trissomia do cromossomo 18.
viabilidade: reflexão bioética sobre a prática em uma Unidade de • Trissomia do cromossomo 13.
Terapia Intensiva Neonatal”, expõe as questões seguintes. • Triploidia. 39
Os desafios quanto a oferecer conforto, reduzir a dor, promover uma • Agenesia renal bilateral.
morte digna, sem uso de terapias fúteis, e ainda proteger a vulnerabilidade • Sirenomelia.
dos pais, por meio do respeito à sua autonomia, com adequado suporte • Síndromes de nanismo – membros curtos:
psicológico e espiritual, são grandes. » Acondrogênese tipos 1A e 1B.
» Acondrogênese-hipocondrogênese tipo II.
Os cuidados paliativos propõem ótimas discussões sobre o fim da
» Fibrocondrogênese.
vida, mas poucas sobre o início da vida de prematuros inviáveis, e, por
» Atelosteogênese.
isto, os conceitos trazidos pela Bioética de Intervenção, de Proteção e pela
» Síndrome de polidactilia com costela curta, tipo Saldino-
Declaração Universal sobre Bioética de Direitos Humanos, que tem como
-Noonan.
objetivo garantir a dignidade do ser humano, contribuem para a proteção
» Displasia tanatofórica.
desta população mais vulnerável, almejando sempre a justiça social e o
» Osteogêmese imperfeita tipo II.
exercício da autonomia.
• Síndrome complexas:
Questões como a realização adequada de pré-natal, o reco- » Síndrome do pterígio múltiplo letal.
nhecimento da vulnerabilidade acrescida desses pacientes, a neces- » Síndrome de Neu-Laxova.
sidade de alívio da dor total do prematuro e de sua família, a efetiva » Síndrome de Meckel-Gruber.
capacitação da equipe de saúde em cuidados paliativos primários
e o respeito à dignidade do próprio prematuro extremo, têm que
ser amplamente discutidas visando à sua implementação.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

1.6 GEMELARIDADE: UMA ABORDAGEM PARA O NEONATOLOGISTA

Paulo R. Margotto, Márcia Pimentel de Castro

Francis Galton (1822-1911), que lançou as bases da Biometria cerca tuplos. Da mesma forma que ocorre com os pares de gêmeos, sabe-se que
de 25 anos antes da redescoberta dos trabalhos do pai da Genética (Gre- a origem dos trigêmeos, tetragêmeos e quíntuplos pode ser monozigótica
gor Johann Mendel, 1822-1884), já participara da Anthropological Society ou resultar de mais de uma célula-ovo. Assim, por exemplo, no caso de
of London em que os gêmeos podem ser estudados com a finalidade trigêmeos, eles podem ser trizigóticos, dizigóticos ou monozigóticos se
de avaliar a contribuição do que ele chamou de natura e nurtura na oriundos, respectivamente, de três zigotos, dois zigotos ou um único zigoto.
determinação dos caracteres quantitativos (Galton, 1876 ). Esse binômio
passou, mais tarde, a ser designado por genótipo e ambiente, mas o
princípio lógico estabelecido por Galton para o estudo de gêmeos com a Embriologia, zigosidade e placentação
finalidade de investigar a participação do genótipo na variação fenotípica
permaneceu basicamente o mesmo. Os fatores do ambiente que afetam A gestação dizigótica é causada pela fertilização de dois óvulos. Os
as diferenças intrapar dos gêmeos monozigóticos (oriundos de um único blastocistos resultantes geram âmnios separados, córions e placenta. Se a
zigoto) seriam comparáveis aos fatores ambientais que afetam as diferen- implantação delas no útero é próxima, as placentas podem se fundir; no
ças intrapar dos gêmeos dizigóticos, os quais, do mesmo modo que os entanto, a comunicação vascular entre as duas circulações não ocorre e a
pares de irmãos nascidos de gestações sucessivas, são oriundos de dois placenta pertencente a cada feto é, em geral, facilmente identificada pela
zigotos. simples inspeção.
Atualmente, sabe-se que a gemelaridade ocorre em 1,6% das A gestação monozigótica é causada pela divisão de um único óvulo
gestações e é um campo importante do conhecimento da reprodução fertilizado em algum momento durante as duas primeiras semanas após
humana. A maior incidência de problemas neonatais em gêmeos compa- a concepção. A divisão precoce resulta em gêmeos dicoriônicos. A divisão
rados a recém-nascidos de gestações únicas dá suporte à noção de que um pouco mais tardia dá origem à placentação monocoriônica, porém
a gestação múltipla é um desvio do padrão humano normal. Restrição diamniótica, que é o tipo mais comumente visto de gêmeos monozigó-
do crescimento intrauterino, prematuridade, malformações congênitas e ticos. Outra situação possível é a divisão um pouco mais tardia do que
mortalidade perinatal aumentada são mais comuns em gêmeos do que a anterior, que dá origem a gêmeos monocoriônicos e monoamnióticos.
em fetos únicos. O conhecimento sobre a embriologia da gemelaridade Uma divisão ainda mais tardia do que as anteriores resulta em gêmeos
auxilia a compreender a ocorrência de algumas destas complicações. unidos por alguma parte do corpo, conforme veremos mais adiante.
Gêmeos dicoriônicos monozigóticos têm diferentes placentas, que
podem estar separadas ou fundidas. Assim como no caso de placentas
A formação de gêmeos fundidas dos gêmeos dizigóticos, a anastomose vascular não ocorre e a
identificação de cada placenta pode ser grosseiramente feita. Gêmeos
Se, no momento da ovulação, forem expelidos dois ovócitos ao monocoriônicos têm uma placenta comum e, invariavelmente, existe
invés de um, e se ambos forem fecundados, os zigotos resultantes darão comunicação vascular entre as duas circulações.
origem a gêmeos dizigóticos (DZ). Esses gêmeos, em média, não apresen-
tam maior similaridade genética entre si do que pares de irmãos gerados Assim, fica evidente que gêmeos monocoriônicos devem ser sem-
sucessivamente, porque tanto os pares DZ quanto os pares de irmãos pre monozigóticos; são, invariavelmente, do mesmo sexo; e têm o mesmo
40 sucessivos são oriundos de pares de zigotos distintos. Os pares DZ são, grupo sanguíneo. Nos Estados Unidos, um terço dos pares de gêmeos são
por isso, considerados como irmãos da mesma idade e, em consequência, monozigóticos, e destes, 60%-70% são monocoriônicos, enquanto os dois
também denominados gêmeos fraternos (do latim, frater = irmão). Por terços restantes são dizigóticos.
terem origem biovular, os pares DZ podem ter o mesmo sexo, ambos
masculino (MM) ou feminino (FF), ou, ainda, discordante quanto ao sexo
(MF). Nem sempre, porém, os pares DZ apresentam duas placentas dis- Mortalidade perinatal
tintas, pois, em decorrência de uma eventual proximidade excessiva dos A mortalidade perinatal em gêmeos é quatro vezes maior do que
locais de implantação dos blastocistos que dão origem aos gêmeos DZ, as em produtos de gestação única. A mortalidade perinatal em gêmeos
placentas podem, aparentemente, fundir-se em uma única. Quando isso monocoriônicos é, aproximadamente, duas a três vezes maior do que
acontece, somente o exame microscópico na região de união das placen- em dicoriônicos. Dados sugerem fortemente os efeitos da placentação,
tas mostrará a presença da chamada zona T, composta de quatro lâminas muito mais do que o da zigosidade, sobre a mortalidade perinatal em
(um âmnio de cada lado e dois córions no meio). Entre os dois córions gêmeos. Embora correspondam a apenas 1,5% de todos os gêmeos, os
será possível observar a presença do trofoblasto e vilosidades coriônicas monozigóticos e os monocoriônicos têm uma mortalidade perinatal de,
atrofiadas. aproximadamente, 30%-50%. Este risco pode ser explicado por problemas
Outro tipo de gêmeos, os pares monozigóticos (MZ), são formados envolvendo o cordão, incluindo: estrangulamento, nó de cordão e entre-
no período entre um e 14 dias depois da fertilização, quando um único laçamento ao redor do outro gêmeo.
zigoto sofre desenvolvimento irregular, dando origem a dois indivíduos
que são considerados idênticos do ponto de vista genético, pois possuem
o mesmo patrimônio genético, visto que são oriundos de uma única cé- Prematuridade, baixo peso e
lula-ovo ou zigoto. Os gêmeos MZ são do mesmo sexo, isto é, MZMM ou
MZFF, e, frequentemente, são denominados gêmeos idênticos, apesar desenvolvimento intrauterino
de essa denominação não ser muito apropriada, visto que a identidade, Revisando a mortalidade perinatal em gêmeos, Chaurasia et al.
aqui, refere-se ao genótipo, e não ao fenótipo, havendo casos em que os notaram que 80% dos óbitos ocorriam em menores de 37 semanas, e
pares MZ apresentam grandes diferenças fenotípicas. Segundo Benirschke 90% estavam associados ao baixo peso ao nascer (< 2500 g). Restrição de
(1994), cerca de 30% dos pares MZ originam-se da separação dos blastô- crescimento intrauterino (RCIU) também contribuiu para peso baixo ao
meros num período muito precoce, isto é, até o terceiro dia após a fecun- nascer, e não apenas a prematuridade.
dação, quando o zigoto segmentado ainda está no estado de mórula. Em
consequência disso, formam-se dois blastocistos e os gêmeos resultantes Aproximadamente 40%-50% dos partos gemelares ocorrem antes
mostrarão, ao nascer, dois córions, dois âmnios (diamnióticos dicoriônicos) de 37 semanas. A alta incidência de prematuridade é largamente respon-
e, dependendo da proximidade dos locais em que estavam implantados sável pelo grande número de morte entre gêmeos.
no útero, duas placentas bem separadas ou unidas. Os outros 70% de A incidência de baixo peso entre gêmeos é da ordem de 50%-60%,
pares MZ são o resultado de alterações que ocorrem entre o quarto até o cinco a sete vezes maior que a incidência de baixo peso em gestações
14o dia após a fecundação do ovócito. Essas alterações podem provocar a únicas. Gêmeos apresentam curvas de crescimento normal para estatura e
divisão da massa celular interna, o que propicia o nascimento de gêmeos perímetro cefálico, sempre oscilando entre o percentil mais baixo normal
com dois âmnios e um córion (diamnióticos monocoriônicos) e uma para fetos de gestação única. No entanto, o peso começa a se desviar da
placenta. No caso de essas alterações serem mais tardias, elas provocam a curva normal para fetos únicos a partir do 3º trimestre. O peso dos mo-
divisão do disco embrionário, disso resultando o nascimento de gêmeos nocoriônicos é consideravelmente menor que o peso dos dicoriônicos.
com um único âmnio e um único córion (monoamnióticos monocoriôni- Corney et al. descreveram que a média de peso ao nascer para gêmeos
cos) e placenta única. Essas alterações tardias também podem provocar monozigóticos sobreviventes, mono ou dicoriônicos, era similar, porém
uma repartição desigual do material embrionário e, por conseguinte, a marcadamente menor em ambos os casos, quando comparada com
produção de mais diferenças entre os pares MZ. a média de pesos de gêmeos dizigóticos. Estes dados sugerem o efeito
Dentre os partos múltiplos, os de trigêmeos são menos frequentes da zigosidade, mais do que a placentação, sobre o peso ao nascer entre
que os de gêmeos, sendo mais raros ainda os de quadrigêmeos e de quín- gêmeos. Grandes variações de peso ao nascimento foram demonstradas
– CAPÍTULO 1 | 1.6 GEMELARIDADE: UMA ABORDAGEM PARA O NEONATOLOGISTA –

entre pares de gêmeos monocoriônicos, mais do que entre os dicoriôni- para o gêmeo do lado venoso (“receptor”). Os efeitos da transfusão feto-
cos. Erkkola et al. relataram que a mortalidade perinatal é 2,5 vezes maior -fetal em cada gêmeo dependem, muito provavelmente, do período em
em gêmeos cuja diferença de peso ao nascer é maior que 25%, do maior que a transfusão ocorreu.
para o menor. Na população estudada por Manlan et al., a incidência de Clinicamente, a síndrome da transfusão feto-fetal é diagnosticada
RCIU – definida como peso ao nascer maior que 2 desvios padrão abaixo quando existe uma diferença de hemoglobina > 5 g/100 ml entre os
da média para o feto único de mesma idade gestacional – foi dez vezes gêmeos. Pode ser suspeitada quando um dos gêmeos parece pletórico
maior em gêmeos do que em fetos únicos. RCIU ocorre mais frequente- e o outro pálido ao nascimento. Em alguns casos, pode existir também
mente entre gêmeos monocoriônicos do que dicoriônicos. discordância entre os PNs, sendo o gêmeo receptor bem maior, o que
Corroborando a noção de que gestação múltipla é um desvio da indica transfusão intrauterina crônica, resultando em significativa restrição
normalidade humana, a maioria dos pesquisadores usa a curva padrão do crescimento intrauterino no gêmeo doador. Quando a diferença de PN
para fetos únicos, mais do que curvas para gêmeos, para avaliar cresci- é pequena (<= 300 g), tanto o doador quanto o receptor podem ser gran-
mento intrauterino em gestações gemelares. Marivat et Norman definem des, o que significa que a transferência de sangue ocorreu agudamente,
RCIU quando o peso de nascimento (PN) é < P10 para aquela idade gesta- talvez durante o clampeamento precoce e tardio do cordão do doador e
cional, numa curva para fetos únicos, ou quando o PN é menor que 85% do receptor, respectivamente.
do peso do outro gêmeo, mesmo que esteja acima do P10. Mais recentemente, devido a ter sido demonstrado que tanto o
Anomalias congênitas são muito mais frequentemente reportadas peso quanto a discordância de hemoglobina são achados relativamente
em gêmeos do que em fetos únicos, com alta incidência em gêmeos mo- comuns entre gêmeos monocoriônicos, associado aos avanços da ultras-
nozigóticos. A taxa de anomalias congênitas, como foi demonstrada por sonografia obstétrica, o achado principal para diagnóstico de STFF é uma
Hendricks, é maior em gêmeos com PN menor 1 desvio padrão da média discrepância significativa nos volumes de líquido amniótico.
normal para idade gestacional (IG), independentemente se pré-termo ou A STFF é, geralmente, a primeira suspeita devido a achados carac-
a termo. terísticos ao exame de ultrassonografia. A gestante normalmente é assin-
Considerando-se alta taxa de mortalidade e anomalias congênitas tomática; no entanto, sintomas relacionados à distensão uterina excessiva
entre gêmeos, esforços têm sido feitos para detectar discrepância de podem ocorrer. O diagnóstico é, então, definido por critérios ecográficos:
tamanho entre pares de gêmeos e RCIU diagnosticados por exame de ul- sequência de oligo-polidrâmnios (por exemplo, medição da bolsa maior
trassonografia antenatal. Estimativas podem ser feitas, como a medida dos do líquido amniótico no saco do doador ≤ 2 cm, e > 8 cm no saco do re-
diâmetros biparietal e abdominal, com apenas 62% de chance de firmar ceptor). Após a 20a semana, a medição da bolsa maior para o polidrâmnio
o diagnóstico. Outra possibilidade seria a medida da velocidade do fluxo deve ser superior a 10 cm. Em casos extremos, o oligodrâmnio pode cursar
sanguíneo na artéria umbilical com Doppler contínuo. como stuck twin, situação em que o gêmeo doador é comprimido contra
a parede uterina dada a quase ausência de líquido amniótico no seu saco.
Outros transtornos que devem ser considerados quando há discor-
Síndrome de Transfusão Feto-Fetal (STFF) dância na quantidade do líquido amniótico: insuficiência útero-placentá-
A estimativa da incidência da STFF é de 1:40 a 1:60 nas gestações ria, anomalias congênitas (por exemplo, agenesia renal), anormalidades
gemelares, 9% a 15% nas gestações monocoriônicas diamnióticas, e 6% do cordão umbilical e infecção intrauterina.
nas gestações monocoriônicas-monoamnióticas. TAPS (Twin Anemia-Polycythemia Sequence) – Sequência Anemia-Po-
As maiores diferenças entre alterações incidentes em um par MZ licitemia Gemelar é uma forma crônica atípica da STFF que se apresenta
ocorrem naqueles que são monocoriônicos, porque neles é mais provável a como uma grande diferença entre a hemoglobina dos gêmeos, sem a
manifestação da síndrome da transfusão entre gêmeos idênticos, em conse- sequência oligodrâmino-polidrâmnio. A incidência relatada após terapia
quência de anastomoses placentárias arteriovenosas, que podem permitir o com laser é de 2% a 13%. A maioria dos casos é diagnosticada tardiamente,
no segundo ou no terceiro trimestre.
estabelecimento de um fluxo sanguíneo preferencial de um gêmeo para 41
outro. As anastomoses vasculares placentárias entre os gêmeos desempe- O diagnóstico de TAPS pós-natal é feito pela presença de uma
nham um papel fundamental na fisiopatologia da STFF; nos gêmeos dico- diferença de hemoglobina ≥ 8,0 g/dL entre os gêmeos em conjunto
riônicos, faltam conexões vasculares entre as placentas – mesmo quando com uma proporção de reticulócitos > 1,7 (contagem de reticulócitos
fundidas, eles não desenvolvem STFF. Embora as anastomoses vasculares do gêmeo doador dividida pela contagem de reticulócitos do gêmeo
sejam encontradas em praticamente todos os gêmeos monocoriônicos, receptor) e um exame de injeção de contraste via placentária mostrando
apenas 9% a 15% destas gestações gemelares acabará por desenvolver STFF. pequenas anastomoses AV superficiais. O resultado inclui o nascimento de
No caso de STFF, o feto receptor passa a ser hipervolêmico (com dois recém-nascidos saudáveis, a necessidade de transfusão de sangue ou
hipertrofia e aumento de câmaras ventriculares) e a produzir um excesso transfusão parcial, a morte de um ou de ambos os gêmeos.
de fluido amniótico, enquanto o doador, ao contrário, torna-se hipovolê- Não está estabelecido qual o intervalo ideal na monitorização
mico (há uma resposta exagerada do sistema renina-angiotensina-aldos- ecográfica da STFF. Alguns obstetras defendem que se realize uma obser-
terona que induz oligúria), com pouca quantidade de fluido amniótico. vação ecográfica a cada duas semanas, com início a partir da 16ª semana
Se a síndrome da transfusão entre os gêmeos MZ iniciar-se antes de 26 até o parto. A ecografia das 16 semanas deverá avaliar o volume de líquido
semanas de gestação, haverá alto risco de mortalidade fetal. Atualmente, amniótico e concluir se as bexigas de ambos os fetos são detectáveis. A
o melhor recurso para enfrentar essa situação é a interrupção da comuni- presença do sinal lambda, também conhecido como “sinal de pico duplo”
cação circulatória placentária, com a utilização de laser durante fetosco- (refere-se à projeção triangular do córion entre as camadas de membranas
pia. A fetoscopia com coagulação a laser é o melhor tratamento, por ser intergêmeas, que se assemelha ao alfabeto grego “lambda”), é altamente
um causal e com intenção curativa para ambos os fetos. Primeiramente sugestiva de gravidez gêmea diamniótica dicoriônica, mas sua ausência
introduzido por De Lia, em 1990, ganhou ampla aceitação como trata- não o exclui, ou seja, nas gestações gemelares monocoriônicas, esse sinal
mento definitivo para STFFs graves entre 16 e 26 semanas de gestação. pode estar presente em 5% (sensibilidade e especificidade do sinal lamb-
Em comparação com o grupo da amnioredução, o grupo do laser tinha da para a previsão de gravidezes dicoriônicas são 99% e 95%).
uma probabilidade significativamente mais alta de sobrevivência aos 28 Com 18 semanas, procede-se a uma avaliação anatômica e rea-
dias de vida (76% contra 56%), e, aos 6 meses de idade, uma incidência valiam-se os mesmos parâmetros anteriores. Nas observações seguintes,
significativamente menor de leucomalácia periventricular (6% versus alterna-se entre uma observação simplificada do líquido amniótico e uma
14%). Além disso, os sobreviventes foram significativamente mais pro- observação detalhada dos demais parâmetros, incluindo os marcadores
pensos a estar livres de complicações neurológicas aos 6 meses de idade de crescimento fetal (a cada quatro semanas).
(52% contra 31%).
A STFF é letal em 80%-100% dos casos não tratados, apresentando
A anastomose vascular encontrada exclusivamente – e, provavel- um risco de 15%-50% de incapacidade nos sobreviventes.
mente – em todas as placentas monocoriônicas é responsável pelas altas
taxas de morbidade e mortalidade associadas a gêmeos monocoriônicos. Em casos de transfusão feto-fetal crônica, polidrâmnio associado
O tipo de anastomose mais comum ocorre entre as artérias das duas ao feto receptor pode ser tão importante que é capaz de desencadear
circulações. Quando um cotilédoco é suprido pela artéria de um gêmeo o trabalho de parto prematuro. Os óbitos entre gêmeos com síndrome
e drena para a veia de outro, existe o risco potencial de transferência de de transfusão feto-fetal são, usualmente, secundários à prematuridade e à
quantidades significativas de sangue do gêmeo do lado arterial (“doador”) doença da membrana hialina.
Citamos, agora, alguns achados de necropsia de pares de gêmeos com transfusão feto-fetal:

Achado Doador Receptor


Peso do coração ↓ (hipovolemia) ↑ (hipervolemia)
Camada muscular média das arteríolas
↓ ↑ (HPP antenatal)
pulmonares
Alargamento glomerular e aumento do número de
Rins ↓
glomérulos maduros.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

A combinação de hipervolemia, hipertensão arterial e o conse-


quente aumento do débito urinário podem explicar o achado de poli-
Malformações congênitas
dramnia no saco amniótico do feto receptor. Ao contrário, o oligoâmnio Muitos estudos têm demonstrado uma maior prevalência de
encontrado no feto doador pode ser explicado pela hipovolemia, pela anormalidades no nascimento em gêmeos do que em fetos únicos. Estas
hipotensão e pela oligúria. Coração, fígado, rins, pâncreas e córtex adrenal são mais frequentes entre pares de gêmeos monozigóticos. Gêmeos dizi-
são significantemente menores no feto doador, de maneira semelhante à góticos apresentam taxas similares de malformações congênitas àquelas
encontrada em fetos com RCIU. Isso sugere que o feto doador é submeti- descritas para gestação única. As malformações mais frequentes são: ano-
do a uma má nutrição intrauterina, provavelmente secundária ao desvio malias do SNC, sistema cardiovascular e defeitos do trato gastrintestinal.
de nutrientes para o receptor. Melnick e Myrianthopoulos demonstraram que a incidência de anomalias
Alguns problemas encontrados nos RNs com restrição do cresci- congênitas entre gêmeos monozigóticos com placenta dicoriônica é
mento intrauterino devido à insuficiência placentária, especialmente a similar à ocorrência em gêmeos monozigóticos com placentas mono-
hipoglicemia, podem ser vistos no gêmeo doador, secundária a transfusão coriônicas. Então, as ocorrências de malformações congênitas têm uma
feto-fetal crônica . Hidropsia fetal pode complicar o quadro de transfu- significativa associação com zigosidade, mas não com placentação.
são feto-fetal; é usualmente vista no doador, mas também já foi descrita Os defeitos estruturais foram divididos em três subgrupos:
isoladamente no receptor e nos gêmeos. Outro problema que pode ser a. Defeitos impostos tardiamente em decorrência do limitado es-
encontrado em gêmeos monocoriônicos com anastomoses vasculares paço intraútero. Exemplos: assimetria facial, torcicolo congênito,
é a passagem de substâncias tromboplásticas para o feto sobrevivente, pé torto congênito. Independentemente da zigosidade, após
em seguida à morte intrauterina do outro gêmeo. Esta transferência pode a 34ª semana os gêmeos “disputam” o espaço intrauterino. A
iniciar um quadro de CIVD, com consequente trombose, infarto e necrose incidência é similar tanto para gêmeos monozigóticos quanto
de órgãos do receptor. Esta sequência de eventos pode resultar em morte para dizigóticos.
intrauterina, anemia severa, necrose cortical renal, encefalomalácia e b. Disrupção do fluxo sanguíneo normal devido a anastomoses
defeitos estruturais disruptivos. O efeito mais devastador das anastomo- vasculares na placenta. Algumas consequências desse tipo
ses vasculares em placentas monocoriônicas é a formação de um feto de anormalidade no fluxo sanguíneo placentário já foram
acardíaco ou amorfo. Isto geralmente ocorre em associação a grandes descritas anteriormente, quando tratamos da síndrome da
anastomoses artério-arterial ou veno-venosa entre o feto anômalo e seu transfusão feto-fetal. Anormalidades do tipo feto acardíaco
gêmeo usualmente normal. O feto inicialmente doador deve perfundir são secundárias ao fluxo reverso por meio das anastomoses
ambas as circulações fetais e, depois, pode desenvolver hipertrofia e falên- placentárias desenvolvidas precocemente. A transferência de
cia cardíaca (ICC), bem como hidropsia fetal. A baixa pressão de perfusão, substâncias tromboplásticas do feto macerado via conexões
dessaturação e circulação reversa no receptor levam a múltiplos defeitos vasculares pode causar CIVD ao nascimento no feto monoco-
estruturais, produzindo um feto acardíaco ou amorfo. riônico sobrevivente.
A disponibilidade do diagnóstico ultrassonográfico possibilita o c. Defeitos precocemente adquiridos na morfogênese, que se-
diagnóstico antenatal de transfusão feto-fetal crônica. Algumas evidências rão discutidos mais adiante.
ecográficas incluem: Em gestação múltipla com morte fetal precoce, o resultado final
• Gestação gemelar com placenta única e fetos de mesmo sexo. da trombose ou embolização de material necrótico pode ser visto tardia-
• Medidas biométricas indicando diferença significativa entre o mente, como, por exemplo, na oclusão de carótida ou de artéria cerebral
tamanho dos fetos. média com consequente hidrocefalia ou porencefalia, provavelmente
• Volume de líquido amniótico discrepante entre os pares de secundárias à reabsorção de tecido cerebral necrosado. O envolvimento
gêmeos e atividade fetal. difuso de arteríolas cerebrais pode ocasionar encefalomalácia multicística.
• Presença de edema, efusões serosas, aumento de área cardíaca As crianças afetadas podem apresentar convulsões logo após o nasci-
42 e hepatomegalia, sugerindo insuficiência cardíaca congestiva mento, microcefalia com consequente retardo mental e paralisia cerebral.
e feto hidrópico. Pode ocorrer atresia ileal, supostamente secundária à obstrução precoce
O manejo de gêmeos com síndrome de transfusão feto-fetal vai da artéria mesentérica, com infarto, reabsorção e atresia do segmento in-
depender da apresentação clínica ao nascimento. Em casos de transfusão testinal suprido por aquela artéria. Outros defeitos estruturais que podem
aguda, o receptor e o doador podem mostrar sinais de sobrecarga de vo- ser encontrados em gêmeos monocoriônicos com morte intrauterina de
lume e choque, respectivamente. Exsanguineotransfusão parcial usando um dos fetos são: espinha bífida; rim em ferradura; microssomia hemifa-
solução cristaloide é o tratamento de escolha para o receptor (consulte o cial; e defeitos das extremidades. Uma vez que anastomoses vasculares
capítulo de Policitemia). O tratamento apropriado para o doador inclui a são vistas exclusivamente em placentas monocoriônicas, uma maior
expansão volumétrica rápida com solução cristaloide ou coloide, seguida incidência desses eventos deve ser esperada em gêmeos monozigóticos
por transfusão com concentrado de hemácias. Em casos de transfusão e monocoriônicos do que em monozigóticos e dicoriônicos.
crônica, restrição do crescimento intrauterino severo pode ser vista no A terceira categoria de malformações estruturais engloba os de-
doador, e pode cursar com hipoglicemia. Se o bebê estiver estável e vigo- feitos precoces da morfogênese. A sua etiologia é atribuída ao próprio
roso, esta complicação pode ser evitada pela alimentação enteral mínima processo de gemelaridade monozigótica. O exemplo mais conhecido é o
com controles seriados de glicemia capilar. Quando o feto doador porta- de gêmeos siameses, uma anormalidade provavelmente secundária à di-
dor de severo crescimento intrauterino restrito estiver instável ou houver visão incompleta dos blastocistos. O fato de gêmeos fundidos terem uma
relato de hipoxia perinatal e/ou hipotensão, a alimentação enteral deverá elevada incidência de anomalias estruturais dá suporte à teoria que asso-
ser adiada e prescrita solução com dextrose EV. cia a gemelaridade a esse tipo de defeito estrutural. Uma vez que a cisão
Em ambos os casos de transfusão feto-fetal (aguda ou crônica), o dos blastocistos não é considerada um evento normal, a gemelaridade
feto receptor poderá apresentar icterícia secundária ao aumento da pro- monozigótica em si deve ser considerada uma malformação congênita.
dução de bilirrubina, consequente a um aumento na quantidade de célu- Outra explicação seria o fato de que a gestação gemelar monozigótica in-
las vermelhas. O controle seriado de bilirrubina sérica e o uso apropriado e terrompe a sequência normal de eventos do desenvolvimento, deixando
precoce de fototerapia podem evitar exsanguineotransfusão. esses fetos mais sensíveis a fatores ambientais cujo potencial teratogênico
é extremamente baixo para embriões únicos. Exemplos de malformações
Raramente, um ou dois gêmeos envolvidos em transfusão feto-fetal incluídas nesse grupo: defeitos do tubo neural; holoprosencefalia; associa-
podem desenvolver hidropsia. Bebês hidrópicos são de difícil manuseio, e ção de VACTERL (anomalia vertebral, imperfuração anal, fístula traqueoe-
a mortalidade é alta. Geralmente, nascem deprimidos, requerem mano- sofágica, anomalia retal e de rádio), cardiopatias congênitas, extrofia de
bras de reanimação em sala de parto e pode ser necessária a drenagem cloaca, digenesia gonadal e sirenomelia.
imediata de efusões serosas para reduzir o comprometimento respiratório
e cardíaco. O manejo na UTI inclui (consulte o capítulo de Hidropsia Fetal): Gêmeos unidos: quando a gemelaridade monozigótica ocorre tar-
estimativa do volume intravascular circulante por meio da monitorização diamente na segunda semana depois da concepção, a divisão incompleta
da PVC e balanço hídrico rigoroso; uso de diuréticos e fluidos de acordo dos embriões pode ocorrer, resultando em gêmeos teratópagos. Estes são,
com este indicador; dosagem de albumina e de hemoglobina, com trans- obrigatoriamente, monoamnióticos e monocoriônicos. Se a separação
fusão para corrigir níveis baixos, além de medidas de suporte usualmente do material embrionário for incompleta durante a formação de um par
empregadas para manter adequada ventilação, pressão arterial, glicemia monozigótico, os gêmeos resultantes poderão se apresentar ligados por
e eletrólitos, bem como um controle térmico adequado. Quando um dos intermédio de uma estrutura comum, que permitirá a comunicação de
fetos está macerado, o sobrevivente deve ser cuidadosamente investi- seus sistemas circulatórios. Tais tipos de gêmeos são denominados tera-
gado quanto ao risco de CIVD, sinais de necrose renal, encefalomalácia tópagos, o que não é um termo muito apropriado, pois, em grego, téras
cística e malformações estruturais outras. No caso de um dos fetos vir a ser = monstro e pagos = unido, mas é a designação mais frequentemente
acardíaco ou amorfo, o outro deve ser acompanhado de perto, pelo risco utilizada para indicar a união física de gêmeos, que já foi descrita inclusive
de descompensação cardíaca e ICC. em trigêmeos e em quadrigêmeos (Schinzel et al., 1979).
Dentre os fatores associados à formação de teratópagos, destaca-se
a história de patologia de tireoide e de tratamento para infertilidade das
– CAPÍTULO 1 | 1.6 GEMELARIDADE: UMA ABORDAGEM PARA O NEONATOLOGISTA –

gestantes. Na Hungria, notou-se também uma associação entre o nasci- Doença da membrana hialina:
mento de teratópagos e o uso frequente de esteroides sexuais no início
Autores como De La Torre Verduzco et al. descrevem que gêmeos
da gestação (International Clearinghouse for Birth Defects Monitoring
abaixo de 35 semanas têm duas vezes mais chance de desenvolver doen-
Systems, 1991). Os gêmeos são sempre unidos por pontos idênticos e são
ça da membrana hialina (DMH) do que fetos de mesma idade gestacional
classificados em:
de gestação única. A incidência de DMH foi duas vezes maior em gêmeos
• Toracópagos (20%-67%) – unidos pelo tórax. monozigóticos do que em dizigóticos, mas não houve diferença signi-
• Xifópagos ou onfalópagos (18%-33%) – unidos pela parede ficativa entre gêmeos monocoriônicos e dicoriônicos. Provavelmente,
anterior do abdome. essa maior incidência deva-se a um maior grau de prematuridade entre
• Pigópagos (18%-28%) – unidos pelas nádegas. gêmeos monozigóticos. Norman et al. estudaram o grau de maturação
• Isquiópagos (6%-11%) – unidos pelo ísquio. pulmonar em 30 pares de gêmeos por meio de dosagem de fosfolipídeos
• Craniópagos (2%) – unidos pela cabeça. no líquido amniótico (LA). Verificaram que não houve diferença significa-
É possível realizar o diagnóstico a partir da 7a semana de gestação tiva quando a dosagem foi feita antes do início do trabalho de parto. No
(ultrassonografia, ressonância magnética); no entanto, o ideal é a partir de entanto, quando o LA foi colhido durante o trabalho de parto, alguns va-
12 semanas de gestação. A interrupção terapêutica da gestação é permi- lores obtidos no LA do primeiro gêmeo foram significativamente maiores
tida a partir de uma autorização que leva em consideração os Princípios do que os obtidos do segundo gêmeo.
Constitucionais da Dignidade Humana. Nomura RM et al., do Hospital
das Clínicas-SP, analisaram 30 casos de gêmeos siameses, com critérios Retinopatia da prematuridade:
de inclusão: ausência de prognóstico após separação cirúrgica pós-natal;
fusão complexa de órgãos vitais; malformação cardíaca complexa, IG < Foi demonstrada maior incidência de ROP em gestações múltiplas
25 semanas. Setenta e seis por cento dos pais optaram pela interrupção do que únicas. ROP em estágio ativo ocorreu 1,25 vez mais, e a incidência
da gestação x 24% pela manutenção; 63,2% dos pedidos de interrupção de doença cicatricial foi três vezes maior entre gêmeos.
foram aceitos; nos 26,3% não autorizados, todos foram a óbito no período
neonatal. Doença por Streptococcus do Grupo B:
Na presença de monocorionicidade e monoamniocidade, excluir Pass et al. acompanharam e avaliaram 5.000 gestações únicas e múl-
presença de gêmeos siameses. Fatores confundidores incluem: mem- tiplas quanto à incidência de colonização e infecção pelo Streptococcus
brana que divide os fetos muito fina; aproximação excessiva dos fetos. O do Grupo B tanto nas gestantes quanto nos RNs. As taxas de colonização
diagnóstico no 1º trimestre deve ser dado com cautela. Sinais sugestivos foram similares tanto em mães quanto em RNs; no entanto, a taxa de
incluem: embriões que se movem ao mesmo tempo; embrião com apa- sepse precoce por Streptococcus do Grupo B em menores de 2500 g foi
rência bífida antes de 10 semanas de idade gestacional; e presença de cerca de cinco vezes maior em gêmeos do que em RNs de gestação única.
vesícula vitelínica única extra-amniótica. A ressonância magnética é um
exame complementar à ecografia fetal: auxilia no planejamento cirúrgico; Enterocolite necrosante:
proporciona excelente resolução dos tecidos sem expor a gestante à ra-
diação; diferencia tecidos moles. Deve ser realizada entre 24-40 semanas. A incidência de ECN foi três vezes maior em gestação dupla ou
A ecocardiografia fetal é importante considerando-se a maior incidência tripla, de acordo com estudos de Samm et al. Neste estudo, apenas um
de doenças cardíacas congênitas. Tem a finalidade de avaliar o grau de dos gêmeos foi afetado, a IG foi significativamente maior para os RNs de
complexidade e a possibilidade cirúrgica pós-natal. Ao nascer, realizar gestação única, mas a mortalidade foi similar.
exame físico detalhado, ultrassom torácico, abdominal e transfontanela,
ecocardiograma, ressonância magnética de crânio e de tórax. Aproxi- Crescimento e desenvolvimento:
madamente 70% dos afetados são do sexo feminino. A maioria dessas A alta incidência de prematuridade, baixo peso ao nascer e restrição
crianças nasce prematura. Em bebês a termo, o prognóstico vai depender do crescimento intrauterino já foi abordada anteriormente. Na maioria 43
da extensão da área unida e, especialmente, dos órgãos compartilhados. dos casos, o crescimento pós-natal inicial é rápido e os gêmeos atingem
O objetivo da separação é tornar possível uma existência independente, o percentil mais alto de peso x idade por volta do primeiro ano de vida.
com escolhas individuais, sempre observando os princípios éticos e com- Embora gêmeos apresentem este maior ganho de peso em relação ao
partilhando todos os riscos com os pais. peso de nascimento, o peso médio permanece baixo, significativamente
Por exemplo, o sucesso na separação de gêmeos toracópagos menor que o peso dos RNs procedentes de gestação única. A altura média
depende do tipo de conexão cardiovascular. RNs com conexão em peri- também é levemente menor em gêmeos, mas a relação peso x altura é
cárdio ou mesmo atrial podem potencialmente ser salvos, mas aqueles similar àquela encontrada em crianças de gestação única. A média do PC
com conexão ventricular apresentam múltiplos defeitos cardíacos e, não apresenta diferença significativa. Os autores concluíram que o maior
em geral, são inviáveis. A separação cirúrgica dos toracópagos, que são crescimento compensatório dos gêmeos ocorre nos dois primeiros anos de
os mais frequentes e mais bem estudados do ponto de vista clínico- vida e parece cessar por volta do terceiro ano.
-cirúrgico e radiológico, tem suscitado grandes debates entre médicos Entre gêmeos com grande discrepância de peso ao nascer, o
e teólogos de diversas religiões, tendo em vista os problemas éticos crescimento pós-natal inicialmente acelerado do gêmeo menor reduz a
implicados em grande número de casos. De fato, uma alta proporção percentagem desta diferença de peso durante o primeiro ano de vida. No
desses gêmeos apresenta um coração muito complexo (62%) ou apenas entanto, essa diferença pode ser mantida, dependendo do percentil do
duplicação dos ventrículos (13%). Em consequência disso, somente nos PN de cada gêmeo e da diferença de peso entre eles. Babson e Phillips
casos em que há dois corações independentes (25%), uma intervenção acompanharam oito pares de gêmeos monozigóticos que tinham dife-
cirúrgica para separar os toracópagos pode dar esperança de sobrevida rença de PN maior que 25%, durante 18 anos. Eles notaram que a média
aos dois elementos do par. Nos casos restantes, tal intervenção signifi- de peso, estatura, PC e testes comportamentais padrão permaneceram
ca, obrigatoriamente, a morte de um desses gêmeos para que o outro significativamente menores para o gêmeo menor, mesmo na vida adulta.
eventualmente se salve. Parece, então, que, para gêmeos com grandes diferenças de peso no nas-
Concordância: gêmeos, em geral, são discordantes para malformações cimento, o menor deles mostra um pior desenvolvimento/crescimento
congênitas; no entanto, as taxas de concordância para gêmeos monozigó- e ganho intelectual. Lamentavelmente, gêmeos parecem sofrer perdas
ticos são consideravelmente maiores do que para gêmeos dizigóticos. Para tanto no desenvolvimento físico quanto mental. A incidência de paralisia
uma desordem como a Síndrome de Down, com etiologia genética bem cerebral é quatro vezes maior entre gêmeos do que na população em
definida, a concordância para gêmeos monozigóticos aproxima-se de 100%! geral. Conclui-se que gêmeos, especialmente aqueles com baixo peso
ao nascer e restrição do crescimento intrauterino, são de alto risco para
morbidade neurocomportamental.
Outros problemas neonatais
Os gêmeos nascem com menos semanas de gestação que os re- Mortalidade perinatal:
cém-nascidos de gestação única. Estudos anteriores comprovaram que Os óbitos perinatais incluem os natimortos, isto é, os conceptos que,
o grupo racial das mães não exerce influência sobre a idade gestacional ao nascimento, não manifestam qualquer sinal vital, e os óbitos neonatais
dos recém-nascidos, o que permitiu estudar os gêmeos e os nascidos precoces, isto é, os conceptos que nascem com vida, mas que vão a óbito
de parto único sem distinção de raça e constatar que, em média, os gê- na primeira semana após o nascimento. Em todas as populações humanas
meos tiveram idade gestacional de 36,6 semanas, ao passo que a idade estudadas, a taxa de mortalidade perinatal de gêmeos é maior do que a de
gestacional dos nascidos de parto único foi de 39,5 semanas, o que dá nascidos de parto único. No Brasil, essa situação não é diferente. De fato,
uma diferença média de três semanas a menos para os partos gemelares. ao analisar dados a respeito de 116.699 partos (1.062 gemelares e 115.637
Esses valores são muito semelhantes às estimativas obtidas na Europa em únicos) ocorridos no período entre 1984 e 1996 na maior maternidade
diferentes épocas e países. RNs prematuros são de alto risco para doença da cidade de Campinas/SP, Beiguelman e Franchi-Pinto (2000) consta-
da membrana hialina, retinopatia da prematuridade (ROP), septicemia por taram que, a despeito da baixa incidência de nascimentos gemelares (9
Streptococcus do grupo B e enterocolite necrosante (ECN). A alta incidên- por 1.000 partos), as taxas de óbitos neonatais precoces (55 por 1.000
cia de prematuridade e baixo peso ao nascer entre gêmeos aumenta o recém-nascidos) e de natimortos (19 por 1.000 recém-nascidos) entre os
risco para essas complicações. gêmeos foram responsáveis por 10,7% dos óbitos neonatais precoces e
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3,5% dos natimortos. Em relação aos recém-nascidos de parto único (8,4


óbitos neonatais precoces e 10 natimortos por 1.000 nascimentos), as
Conclusões
probabilidades de mortalidade neonatal precoce e de natimortalidade Gêmeos têm alta taxa de mortalidade perinatal, prematuridade e
foram, respectivamente, 6,5 e 1,9 vezes maior. A taxa de óbito perinatal de
suas complicações, baixo peso ao nascer, restrição do crescimento intrau-
recém-nascidos do sexo masculino foi mais alta do que a dos recém-nas-
cidos do sexo feminino, tanto entre os gêmeos quanto entre os nascidos terino, anomalias congênitas e morbidade neurocomportamental em
de parto único. longo prazo.
Gêmeos monozigóticos apresentam menor peso ao nascer e maio-
Os pais res taxas de anomalias congênitas do que os dizigóticos, o que sugere
que a etiologia desses problemas pode estar relacionada ao processo de
Cuidar de um bebê pequeno consome tempo e pode ser extenuan-
divisão monozigótica.
te. Satisfazer os desejos e as necessidades de dois bebês da mesma idade
pode ultrapassar o limite da capacidade humana dos pais. O sentimento de Gêmeos monocoriônicos apresentam maior taxa de mortalidade
ambivalência da mãe é comum, e alguns casos a leva a atribuir qualidades perinatal, discrepância de peso ao nascimento (fetos discordantes) e RCIU
negativas a um dos gêmeos e positivas ao outro. Na maioria das vezes, a
do que gêmeos dicoriônicos, o que sugere que tais complicações podem
expressão de desespero e apreensão é um passo para afetar a relação futura
com ambos os filhos. Algumas mães parecem satisfeitas com a atenção ex- estar relacionadas a anastomoses vasculares placentárias. A comunicação
tra que recebem por estarem cuidando de gêmeos; para outras, essa missão vascular monocoriônica também pode ser responsável pela síndrome de
parece ser uma ferida que nunca sara. Por exemplo, algumas vão alegar que transfusão feto-fetal, CIVD ao nascimento e defeitos disruptivos estruturais.
amamentar gêmeos consome muito tempo e é praticamente impossível.
Estudos de follow-up indicam que gêmeos estão em desvantagem
De fato, é perfeitamente possível amamentar gêmeos exclusivamente ou
para crescimento físico subsequente e aquisições intelectuais.
parcialmente; já foi demonstrado que a produção de leite nessas mulheres
é, aproximadamente, o dobro das mães que amamentam um único bebê. O manejo de gêmeos é desafiador e fascinante, por causa dos va-
riados problemas perinatais, neonatais, de desenvolvimento e parentais
que podem ocorrer.

44
– CAPÍTULO 1 | 1.7 ESTATÍSTICA NEONATAL –

1.7 ESTATÍSTICA NEONATAL


Paulo R. Margotto, Marta David Rocha de Moura

Onde estamos e para onde vamos? A resposta desta pergunta sim- 1. Coeficiente de mortalidade neonatal: óbitos de 0 a 27 dias
ples é de vital importância para os avanços nas Ciências Biológicas. em relação ao total de nascidos vivos (por 1.000). Pode ser
A busca de dados estatísticos deve ser a premissa de qualquer ser- subdivido em:
viço neonatal. A disponibilidade de informação apoiada em dados válidos 1.1. Coeficiente de mortalidade neonatal precoce (0 a 6
e confiáveis é condição essencial para a análise objetiva da situação do dias, inclusive): podemos interpretar este coeficiente com
serviço, assim como para a tomada de decisões baseadas em evidências e uma medida capaz de estimar o risco de um nascido vivo
para a programação de ações de saúde. morrer durante a primeira semana de vida. Reflete, de
maneira geral, as condições socioeconômicas e de saúde
Os indicadores de saúde foram desenvolvidos para facilitar a quanti- da mãe, bem como a inadequada assistência pré-natal, ao
ficação e a avaliação das informações produzidas de forma a horizontalizar parto e ao recém-nascido. A partir deste indicador, pode-
o conhecimento e servir para a vigilância das condições de saúde de um mos identificar tendências e situações de desigualdade
grupo populacional. que demandem ações e estudos específicos. Contribuir
A construção de um indicador é um processo cuja complexidade na avaliação dos níveis de saúde e de desenvolvimento
pode variar desde a simples contagem direta de casos de determinada socioeconômico da população, prestando-se para compa-
doença até o cálculo de proporções, razões, taxas ou índices mais sofisti- rações nacionais e internacionais. Subsidiar processos de
cados, como a esperança de vida ao nascer. planejamento, gestão e avaliação de políticas e ações de
São muitos os indicadores de saúde em Neonatologia. A qualidade saúde direcionadas para a atenção pré-natal, ao parto e ao
destes indicadores depende das propriedades dos componentes utiliza- recém-nascido.
dos em sua formulação (que podem perpassar por dados simples, como 1.2. Coeficiente de mortalidade neonatal tardia (7 a 27
a frequência de casos, o tamanho da população em risco), e, sem dúvida, dias): estima o risco de um nascido vivo morrer dos 7
da precisão dos sistemas de informação empregados (registro, coleta, aos 27 dias de vida. Reflete, assim como o coeficiente de
transmissão dos dados). O grau de excelência de um indicador deve ser mortalidade neonatal precoce, as condições socioeco-
definido por sua validade (capacidade de medir o que se pretende) e nômicas e de saúde da mãe, bem como a inadequada
confiabilidade (reproduzir os mesmos resultados quando aplicado em assistência pré-natal, ao parto e ao recém-nascido. Serve
condições similares). Em geral, a validade de um indicador é determinada como uma forma de avaliar como o serviço se comporta
por sua sensibilidade (capacidade de detectar o fenômeno analisado) e na assistência do recém-nascido de risco atendido.
especificidade (capacidade de detectar somente o fenômeno analisado). 1.3. Coeficiente de mortalidade perinatal: segundo a Clas-
Outros atributos de um indicador são: mensurabilidade (basear-se em da- sificação Internacional de Doenças em vigor (a CID-10),
dos disponíveis ou fáceis de conseguir), relevância (responder a priorida- o período perinatal vai da 22ª semana de gestação até
des de saúde) e custo-efetividade (os resultados justificam o investimento a primeira semana de vida. Dessa maneira, o coeficiente
de tempo e recursos). atualmente é dado pela seguinte razão: óbitos fetais a
partir da 22ª semana de gestação somados aos óbitos de
Espera-se que os indicadores possam ser analisados e interpretados menores de 7 dias de vida tendo no seu denominador o
com facilidade, e que sejam compreensíveis pelos usuários da informação, número de nascidos vivos somado aos nascidos mortos
especialmente gerentes, gestores e a equipe assistencial. Outro ponto im-
portante é garantir que a manutenção deste conjunto dessas informações
na mesma comunidade e ano. 45
Dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, em 2014, no que se re-
colhidas seja simples, para facilitar a sua extração regular dos sistemas fere aos componentes da mortalidade infantil no Brasil, ressaltam a maior
de informação, com segurança na coleta do dado a fim de assegurar a importância do período neonatal (menos que 28 dias), especialmente a
confiança dos usuários na informação produzida. Para isso, é preciso mo- primeira semana de vida (51,9%), enfatizando que, do total de óbitos no
nitorar a qualidade dos indicadores, revisar periodicamente a consistência primeiro ano de vida, 7,1% acontecem na primeira hora de vida e 24,7%
da série histórica de dados, e disseminar a informação com oportunidade no primeiro dia de vida. Esta concentração dos óbitos infantis nos primei-
e regularidade. ros 7 dias de vida mostra a relevância da assistência à saúde prestada à
Além de prover matéria-prima essencial para a análise, a disponibi- gestante e ao RN durante o período que antecede o parto, o momento
lidade de um conjunto básico de indicadores tende a facilitar o monito- do nascimento e o atendimento imediato à criança. Uma assistência de
ramento de objetivos e metas em um serviço, estimular o fortalecimento qualidade neste período é fundamental para se evitar as mortes neona-
da capacidade analítica das equipes e promover o desenvolvimento de tais, considerando-se que 98,4% dos partos no país são realizados em
sistemas de informação à interligação de unidades neonatais. São consi- ambiente hospitalar.
derados indicadores básicos em Neonatologia o registro de mortalidade Ressalta-se que as tecnologias de assistência perinatal têm tido im-
e morbidades. pacto na redução da mortalidade neonatal no país, embora o acesso a este
O compromisso de atendimento ao recém-nascido criticamente tipo de assistência ainda seja desigual se considerarmos as regiões Norte e
enfermo e com a diminuição da sua morbimortalidade é de toda a equipe Nordeste, com taxas de mortalidade neonatal superiores a 12/1.000 NVs,
de profissionais de saúde que atuam na Unidade Neonatal. O conheci- enquanto a região Sul apresenta 7,6/1.000 NVs.
mento das doenças e dos agravos que acometem este grupo de pacien- Entretanto, para compreender melhor a MN, é necessário analisar as
tes é imprescindível para que o serviço avalie a qualidade da assistência causas dos óbitos, a distribuição por idade gestacional e o peso ao nascer
prestada e defina estratégias de ação; ao gestor financeiro da instituição, do RN. O grupo das afecções perinatais reúne causas que demandam
permite avaliar custos, estabelecer metas e definir orçamentos. intervenções bastante diferenciadas, algumas delas consideradas com
Cada serviço opta por um tipo de registro e análise estatística de maior potencial de evitabilidade. Dessa forma, uma abordagem mais
seus dados, que podem ser apenas descritivos ou analíticos. Mas, para se detalhada das causas de óbitos neonatais representa uma necessidade
ter acesso a dados estatísticos confiáveis, que possam expressar as reais premente.
condições da assistência à saúde, a informatização dos serviços torna-se A recomendação proposta de Wigglesworth ampliada – do Con-
imprescindível. fidencial Enquiry into Maternal and Child Health (CEMACH, 2005 ), da
Organização Mundial da Saúde (WHO, 2007) e de Lawn et al. (2006) – visa
avaliar alguns grupamentos definidos que permitem observar as causas
A construção de indicadores de relacionadas aos fatores maternos e à gravidez, bem como a afecções
mortalidade respiratórias.
Foram, então, definidos os seguintes grupamentos de causas, os
A avaliação da mortalidade é o indicador mais simples de ser quais podem ser
construído e foi o primeiro indicador de saúde utilizado para avaliar uma
população. É fácil de operar: a morte é clara e, objetivamente, todo óbito relacionados a diferentes momentos da assistência em saúde da
hospitalar tem de ser registrado. Há numerosos indicadores baseados na mulher e da criança:
mortalidade. Os dados nacionais sobre o número de nascidos vivos, óbitos 1. Prematuridade.
neonatais precoces e fetais do registro civil encontram-se disponíveis na 2. Infecções (congênitas e sepse neonatal).
internet (www.datasus.gov.br ), assim como os dados provenientes do 3. Asfixia/hipóxia, subdivida em hipoxia intrauterina e asfixia ao
Sistema de Mortalidade (SIM) e do Sistema de Nascidos Vivos (SINASC). nascer.
Os indicadores neonatais mais utilizados são: 4. Malformações congênitas.
5. Fatores maternos e relacionados à gravidez.
6. Afecções respiratórias do RN (doença de membrana, pneumo-
tórax e displasia broncopulmonar).
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Para a redução do óbito neonatal, a integração dos serviços é pri- » Uso de corticoide antenatal.
mordial e vai desde a atenção pré-natal, o parto, a assistência ao RN de • Sexo do RN:
médio e alto riscos, até as rotinas estabelecidas de cuidados, permitindo, » Feminino.
assim, alcançar um objetivo comum de atender à população de maneira » Masculino.
qualificada, oferecendo a melhor assistência possível na prática disponível. » Indeterminado.
• Taxa de prematuridade por faixa de idade gestacional:
» < 22 semanas.
Avaliação descritiva da unidade e » 22 a 27 semanas.
» 28 a 31 semanas.
indicadores de morbidade » 32 a 36 semanas.
A utilização de prontuário estruturado e informatizado tem a fina- » 37 a 41 semanas.
lidade de oferecer à equipe da Unidade Neonatal dados quantitativos e » > 42 semanas.
estatísticos sobre o atendimento, permitindo que o serviço seja avaliado • Taxa de partos por faixa etária materna:
e possa apoiar a tomada de decisões médicas e administrativas na busca » < 10 anos.
contínua da qualidade no atendimento ao paciente. » 10 a 14 anos.
» 15 a 19 anos.
Vários são os programas e as empresas hoje no mercado que realiza- » 20 a 24 anos.
ção a informatização de formulários utilizados na prática diária. As criações » 25 a 29 anos.
de banco de dados digitais devem sempre observar as características de » 30 a 34 anos.
cada serviço, permitindo ao médico facilidade e rapidez no preenchi- » 35 a 39 anos.
mento das informações, facilitando a coleta de dados de forma ampla e » 40 a 44 anos.
organizada, preenchendo as necessidades de: » > 45 anos.
1. Registro da informação de maneira padronizada.
2. Ganho de tempo no registro e busca de informações. • Baixo peso ao nascer:
3. Cruzamento de variáveis com facilidade. » < 500 g.
4. Permitir a construção de relatórios e gráficos. » 500 a 999 g.
5. Baixo custo de implantação e fácil manutenção. » 1000 a 1499 g.
6. Preferencialmente, sem necessidade de licença de uso. » 1500 a 1999 g.
7. Arquivos exportáveis e importáveis para qualquer outro banco » 2000 a 2499 g.
de dados. » 2500 a 2999 g.
8. Informações estatísticas em tempo real. » 3000 a 3499 g.
9. Tornar-se um registro de dados de valor legal. » 3500 a 3999 g.
10. Facilitar a investigação médica e colaborar com a capacitação » > 4000 g.
da equipe de saúde.
As Unidades de Cuidados Intensivos Neonatais são serviços essen- • Escolaridade materna:
ciais para o atendimento dos prematuros e RNs de risco e têm custo-be- » Nenhuma.
nefício inquestionável. » 1 a 3 anos.
» 4 a 7 anos.
Uma das estratégias adotadas nos países desenvolvidos, nos últi- » 8 a 11 anos.
mos anos, para a melhoria dos serviços neonatais, tem sido a realização » 12 anos ou mais.
de estudos relacionados à avaliação tecnológica e de qualidade do
46 atendimento, por meio da associação de Unidades Neonatais em redes • Dados de internação:
ou núcleos de pesquisa. Estas redes são responsáveis pela produção dos » Realizado surfactante durante a internação.
estudos mais importantes da área da Neonatologia, desde a década de » Recebendo O2 com 36 semanas de idade corrigida.
1990. Em 1999, um grupo de pesquisadores nacionais se reuniu com o » Diagnóstico de canal arterial.
objetivo de implementar no país uma estratégia semelhante, por meio » Diagnóstico de enterocolite necrosante.
da criação da Rede Brasileira de Pesquisas Neonatais. Esse grupo realiza, » Realizada Ultrassonografia Transfontanela (USTF) antes de
por intermédio de um banco de dados próprio e conjunto, estudando as 28 dias de vida:
práticas, os resultados e os custos dos diferentes serviços; revisa os dados › Sem hemorragia.
de mortalidade e morbidade; define as tecnologias e os procedimentos › HIV Graus 1 e 2.
com a melhor relação de custo-efetividade, e, com isso, fornece subsídio › HIV Graus 3 e 4.
ao Estado para planejamento de investimento e alocação de recursos; for- • Realização de fundo de olho durante a internação:
nece relatórios a respeito do desempenho de cada Unidade, estimulando, » Faixas de ROP 0, 1 e 2; 3 e 4 a 5.
assim, a excelência do cuidado. » Realização de cirurgia.
São considerados marcadores importantes de morbidade nas Uni- • Sobrevivida por faixa de peso e idade gestacional.
dades Neonatais aqueles que não devem faltar em serviços que buscam • Tempo de internação.
a excelência no serviço e que monitoram, de forma sistemática, a assis- • Malformações:
tência em suas unidades, considerando as recomendações do Ministério » Deformidades congênitas dos pés.
da Saúde. » Fenda labial e fenda palatina.
» Malformações congênitas do aparelho circulatório.
São indicadores assistenciais básicos apresentados como frequên- » Malformações do sistema nervoso central.
cias absoluta e relativa: » Malformações do fechamento de parede abdominal.
• Dados maternos: » Malformações do sistema digestivo.
» Realização de pré-natal < 6 consultas. » Anomalias cromossômicas.
» Gestantes com hipertensão arterial. Na Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasília
» Gestantes com diabetes. (HMIB), utilizamos uma plataforma on-line de coleta de dados seguindo a
» Tipo de gestação única, dupla, tripla ou mais. ficha de coletas de dados abaixo.
» Tipo de parto.
– CAPÍTULO 1 | 1.7 ESTATÍSTICA NEONATAL –

FICHA ESTATÍSTICA – NEONATOLOGIA SES-DF


SES
Data de nascimento Data de internação
Procedência Nascido no seu hospital Nascido fora do seu hospital
Sexo Masculino Feminino Indeterminado
Peso ao nascimento Perímetro cefálico
Idade gestacional Classificação peso/IG AIG PIG GIG
Apgar 1 minuto Apgar 5 minutos
Reanimação na sala de parto Sim Não Ignorado
Somente O2 inalatório Sim Não Ignorado
VPP Sim Não Ignorado
IOT Sim Não Ignorado
Massagem cardíaca Sim Não Ignorado
Adrenalina Sim Não Ignorado
CPAP na sala de parto Sim Não Ignorado
Transferência da SP para outro hospital Sim Não Qual:
A temperatura do RN foi medida na 1ª hora de admissão na UTI Sim Não Tempo:
Neonatal

Dados maternos
Branca Preta Amarela Parda Indígena Ignorada
Raça
Pré-natal Sim Não Nº de consultas

Hipertensão arterial Sim Não Ignorado


Tipo de hipertensão ( ) DHEG ( ) HAC ( ) HAC + DHEG ( ) HELP ( ) Eclâmpsia ( ) Pré-eclâmpsia
Corioamnionite Sim Não Ignorado
Esteroide antenatal Sim Não Ignorado
Sulfato de mg Sim Não Ignorado
Tipo de gestação Única Múltipla Ignorado 47
Tipo de parto Normal Cesáreo Ignorado

Dados do recém-nascido – sistema respiratório


Pneumotórax Sim Não Ignorado Oxido nítrico Sim Não Ignorado
SDR Sim Não Ignorado Cânula de alto fluxo Sim Não Ignorado
Ventilação mecânica Sim Não Ignorado Surfactante Sim Não Ignorado
CPAP Sim Não Ignorado Fez uso da 1ª dose Horas
CPAP pré e pós-VM Pré Não Ignorado Oxigênio 28 dias Sim Não Ignorado
Oxigênio 36 semanas Sim Não Ignorado VM com 36 semanas Sim Não Ignorado
VNI com 36 semanas Sim Não Ignorado VAF Sim Não Ignorado
Cânula AF Sim Não Ignorado Corticoide inalatório Sim Não Ignorado
Corticoide sistêmico Sim Não Ignorado

Dados do recém- nascido – sistema nervoso central


Ecotransfontanela Sim Não Ignorado Pior grau de HIV I II III IV
Leucomalacia Sim Não Ignorado Local de ocorrência Seu hospital Outro hospital

Dados do recém-nascido – retinopatia


Fez exame do fundo de olho? Sim Não Ignorado Pior grau I II III IV V
Fez uso de anti-VEGF? Sim Não Ignorado Cirurgia a laser Sim Não
Local da cirurgia Seu hospital Outro hospital

Canal arterial
Canal arterial patente Sim Não Ignorado
Tratamento medicamentoso Sim Não Qual medicação? Paracetamol Ibuprofeno

Abdome
Enterocolite necrosante Sim Não Ignorado Perfurou Sim Não
Local de ocorrência Seu hospital Outro hospital Cirurgia Sim Não
Cirurgia em que local? Seu hospital Outro hospital Intestino curto Sim Não
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Infecção
Usou probióticos? Sim Não Ignorado Infecção em algum momento? Sim Não
Sepse precoce (até o 3º dia de vida) Sim Não Ignorado
Agente isolado Sim Não Ignorado
Qual o agente? Estrepto grupo B Gram positivo Gram negativo
Sepse tardia ou meningite após 3º dia de vida Sim Não Ignorado
Agente isolado Sim Não Ignorado
Qual o agente? Estrepto grupo B Gram positivo Gram negativo
Infecção fúngica Sim Não Ignorado

Cirurgias fora PCA, ROP e ECN


Realizou cirurgias? Sim Não Qual?

Malformações ou anomalias cromossômicas


Apresentou malformações? Sim Não Ignorado
Se sim, qual?

Saída
Alimentação LM exclusive LM + fórmula Fórmula Dieta zero
Peso de saída Perímetro cefálico
Oxigênio na alta Sim Não Ignorado
Óbito nas primeiras 12 horas de admissão na UTI Neonatal Sim Não
CRIB I II III IV
Transferido
Para onde foi transferido? Outro hospital Cuidados domiciliares
Motivo transferência Cirurgia HMIB Cardiopatia IC-DF Cirurgia HBASE

48
UNIDADE DE CAP. 2
TERAPIA INTENSIVA:
UM OLHAR PARA O
RECÉM-NASCIDO,
SUA FAMÍLIA E A
EQUIPE DE SAÚDE
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

2.1 UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA: UM OLHAR PARA O


RECÉM-NASCIDO, SUA FAMÍLIA E A EQUIPE DE SAÚDE
Evely Mirela Santos França
Ludmylla de Oliveira Beleza

Já no Brasil, o período colonial é caracterizado pela visão da criança como


Introdução um instrumento para as famílias, recebendo muitos castigos físicos e sendo
Nas últimas décadas, o surgimento das Unidades de Terapia Inten- abandonada frequentemente. Os partos eram realizados por parteiras inexpe-
siva Neonatal (UTIN), equipadas com tecnologia elevada e profissionais rientes, e o aleitamento por amas-secas, as quais viviam em péssimas condições
capacitados, tem permitido a sobrevivência de prematuros com extremo de vida e de higiene.
baixo peso, de crianças com malformação, síndromes genéticas e que Um marco para saúde neonatal no Brasil ocorreu em 1882, no Rio
passaram por cirurgias graves, além de bebês que apresentaram alguma de Janeiro, quando foi inaugurada a Policlínica Geral, e o médico Arthur
intercorrência ao nascer. Moncorvo de Figueiredo organizou um consultório infantil e cursos sobre
Mas o caminho até o que existe hoje em relação a conhecimentos, doenças infantis. Sete anos depois, este mesmo médico criou o Instituto
evidências científicas, ambiente de cuidado e comportamentos/paradig- de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro, o qual prestava
mas profissionais foi longo, e faz-se necessário dar uma pincelada neste assistência a crianças desde sua vida intrauterina até os 14 anos. Apenas
histórico. em 1908 foi instalada a primeira incubadora no Brasil, demonstrando que
todas as inovações no conhecimento e na tecnologia ocorrendo no mun-
do demoraram décadas para chegar aqui.
História Todos os avanços tecnológicos e científicos e a maior participação
dos pediatras para ciência da Medicina Neonatal culminaram na redução
Na Antiguidade, o recém-nascido (RN) viveria ou não de acordo importante da mortalidade infantil e da infecção hospitalar, mas também
com a vontade de seu pai. A mortalidade infantil era elevada e esperada. trouxeram consequências negativas, como a institucionalização do parto
Já no século XVIII, a família começou a organizar-se em torno da criança, e a separação entre as crianças e suas famílias durante o processo de
e os pais passaram a valorizar e a cuidar melhor de seus filhos. Perdê-los doença.
tornou-se uma enorme dor (Aries, 1986 ), e o desejo passou a ser a sobre-
vivência, a qualquer custo.
A partir da terceira década do século XIX, com a mortalidade O prematuro
infantil muito elevada e a ameaça de despovoamento, principalmente
na França, definiu-se a família como incapaz de proteger a vida de suas A prematuridade tornou-se um problema de saúde pública. Os
crianças. A Medicina Social entrou nas famílias por meio da higiene, com prematuros apresentam elevados índices de comorbidades no período
conceitos sobre educação física, moral, intelectual e sexual (Costa, 2004). neonatal e durante toda a infância, quando podem surgir doenças respi-
Promoveu-se o incentivo à amamentação materna (não mais por amas ratórias, atraso motor e/ou paralisia cerebral, coeficiente de inteligência
diminuído, dificuldade escolar, problemas de comportamento, baixa
50 de leite) e maior contato dos pais com os filhos. O sentimento de infância
qualidade de vida relacionada à saúde e estresse familiar.
e os laços afetivos começaram a desenvolver-se.
Em 1878, foi desenvolvida a primeira incubadora por um emprega- O processo de crescimento e desenvolvimento da criança prema-
do do zoológico de Paris por solicitação do professor e obstetra Étienne tura está subordinado às condições biológicas e sociais da concepção, da
Tarnier. Esta inovação fez com que fossem reduzidas as taxas de mortali- gestação, do parto e do período neonatal. Além desses fatores, o ambien-
dade entre as crianças que nasciam com menos de 2000 g. O surgimento te da criação, o modo de vida da família e do seu grupo social também
da Neonatologia é relatado por Avery (1984) em seu livro “Neonatologia, implicam diretamente o seu desenvolvimento em longo prazo, podendo
Fisiologia e Tratamento do Recém-Nascido”. Segundo este autor, a Neona- beneficiar ou dificultar a habilidade dos pais em cuidar do RN (Jackson et
tologia, como especialidade, surgiu na França, quando um obstetra, o Dr. al., 2003).
Pierre Budin, resolveu estender suas preocupações além da sala de parto e A qualidade dos cuidados que uma criança recebe de seus pais nos
criou o Ambulatório de Puericultura no Hospital Charité em Paris, em 1892. primeiros anos de vida é de grande importância para a sua vida mental
Seus princípios e métodos são considerados a base da Medicina Neonatal. futura. Este bebê deve ter a vivência de uma relação calorosa, íntima
Posteriormente, ele chefiou um Departamento Especial para Debilitados e contínua com a sua mãe ou com quem a substitua, em que ambos
na maternidade estabelecida por Madame Hery, antiga parteira-chefe. encontrem satisfação e prazer. Nos primeiros anos, essa rica e complexa
Em 1914, foi criado, pelo pediatra Dr. Julius Hess, o primeiro Centro relação com a mãe, enriquecida pelas relações com o pai e os irmãos, é a
de Recém-Nascidos Prematuros no Hospital Michael Reese, em Chicago. base do desenvolvimento da personalidade e da saúde mental do bebê
Ele foi considerado uma autoridade em prematuridade e responsável pela (Bowlby, 2006).
entrada da Neonatologia na universidade. Posteriormente, outros centros O RN continuará extraútero o processo de maturação, o qual se
surgiram, seguindo os mesmos princípios do Dr. Budin e do Dr. Hess para encontra acelerado no terceiro trimestre de gestação. Deste período até o
cuidar dos recém-nascidos prematuros, com a finalidade de lhes assegurar final do segundo ano de vida, o encéfalo está em um período crítico de de-
enfermeiras treinadas, dispositivos próprios, como as incubadoras, e pro- senvolvimento acelerado e requer uma quantidade suficiente de nutrien-
cedimentos rigorosos para a prevenção de infecções. tes, um ambiente adequado e experiências interpessoais favoráveis. Há
Em 1924, o pediatra Albert Peiper interessou-se pela maturação neuro- grande desenvolvimento, diferenciação e organização do encéfalo. Mas,
lógica de prematuros. Outros ícones no campo da Pediatria e grandes estu- quando um bebê nasce prematuro ou com alguma patologia, todo este
diosos foram destacando-se, tais como Silverman, pioneiro em estabelecer o crescimento e essa diferenciação ocorrerão em um ambiente, por vezes,
uso de processos cuidadosamente controlados em berçário de prematuros. impróprio e agressivo. Ele terá que desenvolver habilidades adaptativas
Já o interesse da Dra. Dunhan sobre problemas clínicos dos recém-nascidos para formar resposta ao lidar com o estresse e capacidade para aprender
levou-a a enfatizar a importância do controle dos dados sobre a mortalidade novas informações. Por isso, necessita de cuidados especializados, respei-
de recém-nascidos. Isto serviu de base para a política federal, o aumento do to ao sono, manuseio adequado, leite materno e presença responsiva da
interesse nos serviços de cuidados materno-infantis, assim como as pesqui- mãe, que regula, atenua e filtra estímulos do meio ambiente, ajudando-o
sas peri e neonatais (Avery et al., 1984). na autorregulação.
Um centro criado em 1947 na Universidade do Colorado, além Nos últimos meses de gravidez, o útero passa a ficar mais apertado,
dos cuidados prestados aos prematuros, possuía leitos para mães com o que diminui a movimentação de maior amplitude do bebê e gera um
gravidez de risco para parto prematuro e programas de treinamento para tônus flexor. Além disso, haverá uma sequência específica de desenvolvi-
médicos. Enquanto isso, Arvo Ylppö, pediatra finlandês, publicou sua mo- mento sensorial, a saber, com os sentidos interagindo e aprendendo:
nografia sobre patologia, fisiologia, clínica, crescimento e prognóstico de • Sistema tátil: mais precoce, havendo diferenciação entre toque
recém-nascidos, relatos que serviram como ponto inicial para pediatras leve e profundo, reflexos e possibilidade de sentir dor.
clínicos, professores e investigadores. • Sistema vestibular: muito influenciado enquanto o feto está
A primeira UTIN surgiu no Centro Médico da Universidade de Yale, intraútero.
em 1960. Em 1963, o filho prematuro do então presidente dos Estados • Sistema químico: olfativo desenvolve-se integralmente de
Unidos, John Kennedy, morreu por doença da membrana hialina, o que 29 a 32 semanas de gravidez, com RN respondendo a odores
motivou um investimento financeiro significativo para o desenvolvimento agressivos ou aversivos a partir das primeiras 48 horas de vida;
de tecnologias voltadas para o tratamento do RN de risco. a deglutição está presente desde o segundo trimestre de
– CAPÍTULO 2 | 2.1 UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA: UM OLHAR PARA O RECÉM-NASCIDO, SUA FAMÍLIA E A EQUIPE DE SAÚDE –

gravidez, já sendo possível a percepção do sabor a partir de


30 semanas.
Fatores estressantes presentes na UTIN e
• Sistema auditivo: exposição a ruídos de baixa frequência suas repercussões
quando dentro do útero, com o bebê respondendo com
piscar ou susto de 25 a 28 semanas. 1. Ruídos: frequência maior que 45-50 dB pode causar alteração
• Sistema visual: de 22 a 40 semanas de gravidez há uma certa na frequência cardíaca, hipertensão, dessaturações, apneia,
organização estrutural e, a partir do nascimento, com a ativa- aumento da pressão intracraniana, outros efeitos neuroen-
ção da luz, haverá um aprendizado de acordo com as expe- dócrinos e imunológicos, distúrbios no sono, aumento das
riências visuais do RN. Há respostas do prematuro em relação respostas negativas ao manuseio e alterações anatômicas,
à luz quando este está com cerca de 30 semanas de IGPC. comportamentais e cognitivas pelo aumento crônico do cor-
Esse desenvolvimento sensorial é bidirecional consonante à estru- tisol (o que leva ao estresse). Problemas na fala, na linguagem
tura e à função dos órgãos responsáveis, ou seja, à medida que uma estru- e na aprendizagem podem estar relacionados à experiência
tura anatômica vai se formando, o bebê vai experimentando, e as funções auditiva do prematuro na UTIN.
desses sistemas vão tornando-se ainda mais complexas e estimulando a 2. Iluminação: o bebê prematuro possui menos defesas diante
formação estrutural, e assim por diante. da luz ambiente, o que pode levar à bradicardia, às alterações
no sono, às dessaturações e ao aumento da atividade motora.
Já o desenvolvimento cerebral do feto passa pelas etapas de Esta exposição na fase de desenvolvimento visual pode estar
neurulação, segmentação, proliferação glial, migração, organização e mie- relacionada a deficit cognitivos, de acuidade, a alterações
linização, as quais podem ser alteradas ao se submeter o prematuro ao visoespaciais e de funcionamento visomotor (Brasil, 2011).
ambiente da UTIN e estresse constante. Nesse momento, cabe ressaltar a Cabe ressaltar que ausência de estímulo visual e auditivo
neuroplasticidade, fenômeno que demonstra a capacidade de adaptação também não é desejável, como se pôde perceber em estudo
do cérebro, que pode alterar, integrar e organizar informações, produzindo que vendou bebês e colocou-lhes protetores auriculares, o
maior número de conexões entre neurônios e nervos. Ou seja, o cérebro que repercutiu no aumento do estresse. Em compensação,
é capaz de manter ou fortalecer conexões que são mais utilizadas, assim uma pesquisa americana verificou, de forma alarmante, que o
como eliminar as que não o são. Então, falta ou excesso de informações nível de ruídos e iluminação vai aumentando à medida que o
pode comprometer o cérebro. tempo de internação dos prematuros extremos vai passando,
e que é modificada sua assistência ventilatória.
3. Manuseio: pode ter como consequências taquicardia, taquip-
As UTINs do presente neia, alterações no fluxo sanguíneo cerebral, na saturação de
O RN de alto risco convive com terapias agressivas, estressantes e oxigênio e comportamentais importantes (como choro, agita-
dolorosas advindas do avanço tecnológico da assistência, que produz ção, hipotonia, alterações faciais, espasmos e hiperextensão),
desorganização fisiológica e comportamental nos neonatos, refletindo aumento do risco de infecção e da pressão intracraniana, hi-
negativamente nos cuidados. É inquestionável que a evolução da tecno- poxemia, apneia, mudanças na coloração da pele, intolerância
logia modificou o prognóstico e a sobrevida dos bebês de alto risco. No alimentar e até dor. Todas estas complicações relacionadas
entanto, a fragilidade da pele e a passagem de tubos e sondas induzem ao manuseio podem ter consequências no desenvolvimento
ao sofrimento, pois os recém-nascidos não estão preparados para tais cognitivo, emocional, físico, neurológico e sensitivo do RN.
estímulos estranhos e assustadores que não existiam na vida intrauterina. 4. Posicionamento inadequado: fará com que o prematuro de-
senvolva padrões de hiperextensão de pescoço e tórax, assi-
A UTIN pode ser vista como um ambiente inóspito. Condizente com
metria postural, cabeça lateral, podendo levar, ainda, à tensão
o exposto por Moreira et al. (2003), o estado de estar hospitalizado em
e à dor muscular, à dificuldade de oxigenação, a deformidades
uma UTIN insere o bebê em um meio de pouca hospitalidade, subme-
cranianas, à rotação externa de extremidades, à irritabilidade, 51
tendo-o a estímulos como estresse e dor por procedimentos invasivos e
ao estresse e à redução de movimentos peristálticos. Assim,
de rotina, ruídos em excesso, luz intensa e manuseio exacerbado. A UTIN
num futuro próximo, o bebê poderá apresentar problemas de
passar a ser um ambiente não acolhedor ao RN, ser que acabou de passar
adaptação ao ambiente, alterações no sono e de coordenação,
da vida intrauterina para a vida extrauterina.
dificuldade para sentar-se e acalmar-se.
O ambiente de UTIN é de medo, angústia e preocupação. Um local 5. Dor: prematuros são mais sensíveis às experiências dolorosas,
de ruído excessivo produzido pelos alarmes dos dispositivos e conversas/ especialmente se ocorrem em caráter repetitivo ou se são su-
discussões, muita luminosidade e um grande número de profissionais cir- bestimadas pelos profissionais. Este último fator pode implicar
culantes. Toda essa tecnologia permite a sobrevida do paciente. Porém, o uma ausência de analgesia ou analgesia ineficaz. A dor pode
cuidado prestado poderá gerar impacto negativo ou positivo no cérebro, provocar alterações fisiológicas (hipertensão, dessaturação
dependendo de como é operacionalizado. de oxigênio, catabolismo, hipermetabolismo, maior vulne-
O fato de estar internado neste ambiente pode gerar conflitos fu- rabilidade a infecções, alterações na coagulação sanguínea
turos na vida da criança, desde aspectos cognitivos até sua capacidade e hemostasia), comportamentais (choro, expressões faciais,
de aprendizagem. Assim, é válido destacar que os profissionais atuantes movimentos de retirada, hipotonia, hipoatividade, diminuição
devem estar devidamente capacitados, a fim de usar de instrumentos dos períodos de sono, irritabilidade) e até no desenvolvimento
cabíveis para contornar as situações que lhe forem apresentadas, evitando do sistema nervoso central.
riscos presentes e futuros.
As influências dos fatores sensório-ambientais podem fazer com que Humanização das UTINs
o neonato pré-termo sofra iatrogenias. Os ciclos de sono são interrompi-
dos, contribuindo para o surgimento do estresse, dificultando o processo A humanização da saúde tem que ir além da informatização e da
de desenvolvimento orgânico e aumentando o risco de óbito. Assim, instrumentalização tecnológica, impedindo que ocorra a supressão dos as-
medidas intervencionistas devem ser tomadas pela equipe de saúde, de pectos éticos e humanos que estas tecnologias implicam. A humanização
modo a evitar ou minimizar essas iatrogenias. É necessário dar condições representa um conjunto de iniciativas que visa à produção de cuidados
para que o RN se desenvolva em toda sua plenitude como ser humano, em saúde, conciliando a melhor tecnologia disponível com a promoção
em um momento muito peculiar e único do seu desenvolvimento. de acolhimento e respeito ético e cultural ao paciente, tornando espaços
Como já foi visto, ocorre uma sequência específica de desenvol- de trabalho favoráveis ao bom exercício da saúde e de seus usuários.
vimento sensorial intrauterino, a qual é muito vulnerável e influenciável A relevância da humanização da assistência neste ambiente, no
diante dos cuidados recebidos na UTIN. Alguns fatores que podem alterar intuito de tentar reduzir os fatores estressantes, passa pela qualificação
o desenvolvimento sensorial estão abaixo explicitados: e pela assistência dos profissionais de saúde. Sabe-se que, quando se
• Tátil: manuseio frequente, que varia de 5 a 10,2 distúrbios/ humaniza uma assistência, está se olhando para o ser humano como um
hora. A maior parte da equipe subestima o número de ma- todo, integralizado e cheio de peculiaridades e necessidades individuais.
nuseios executados e afasta-se em menos de 2 minutos, sem É oferecer os cuidados de rotina, direcionando sua atenção para o esta-
consolar o bebê, que continua reagindo por até 10 minutos. do psíquico, afetivo e o desenvolvimento geral, ou seja, prestando uma
• Gustativo/olfativo: exposição a sabores e odores desagradá- assistência integrada. E, em Neonatologia, humanizar a assistência deve
veis, o que não é levado em consideração durante os cuidados. significar o reconhecimento e o tratamento apropriados dos fatores es-
• Audição: nível de ruído alto; picos de ruídos frequentes e tressores do bebê, da família e do profissional de saúde.
inesperados; diferença nas frequências, intensidades e ritmos. Assim, qualidade de vida e do clima emocional ao redor do bebê
Pouca exposição à voz materna. tornou-se motivo de preocupação. O ambiente das UTINs vem sendo re-
• Visual: iluminação excessiva, luzes acesas 24 horas, impedin- pensado como fonte de estresse para os pequenos pacientes, sua família
do distinção entre dia e noite. e os profissionais de saúde que estão intimamente envolvidos com eles.
No Brasil, o Programa Nacional de Humanização do Pré-Natal e Nas-
cimento foi criado por meio da Portaria no 569/2000, com o objetivo de
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

reduzir a mortalidade materna e neonatal, proporcionar um atendimento De acordo com Tamez (2013), os pais com bebês internados na UTIN
humanizado e melhorar o acesso, a cobertura e a qualidade do acompa- passam por cinco etapas em seu processo emocional: choque (choro,
nhamento no pré-natal, no parto e no puerpério das gestante e do RN. sensação de impotência e de necessidade de fuga); negação (geralmente
Neste mesmo ano, o Ministério da Saúde lançou, pela Portaria n° 693, a há um retorno à religiosidade para barganhar com Deus); tristeza, raiva e
Norma de Atenção Humanizada do Recém-Nascido de Baixo Peso – o ansiedade (raiva dos profissionais e de Deus; pais retraem-se e não falam
Método Canguru –, a qual recebeu uma nova edição em 2011. muito); equilíbrio (maior tranquilidade, esperança e confiança em si e na
No que diz respeito aos cuidados prestados no ambiente da UTIN, equipe); e reorganização (atuação mais independente dos pais, maior
desde 2002, são preconizadas, pelo Ministério da Saúde, medidas que vi- participação nos cuidados).
sam alcançar o respeito e a valorização da particularidade e da dignidade Ao observar essas etapas, não parece surpresa que a maioria dos
humanas, com posturas baseadas na ética e na solidariedade, garantindo pais conviverá com uma reação de luto pelo filho perfeito que não tive-
ações de acompanhamento no parto e no nascimento e evitando situa- ram. Necessitam de tempo e apoio para que possam aceitar seu filho real.
ções de risco para a mãe e o bebê. Os pais podem apaixonar-se pelo RN logo à primeira vista, mas, em geral,
Em 2011, surge o Programa Rede Cegonha, que tem como metas a a permanência deste amor é um processo de aprendizagem, constituindo
implementação de um novo modelo de atenção à saúde da mulher e da o apego ou o vínculo. Isso não acontece rapidamente e é um processo
criança, garantindo acesso, acolhimento e resolutividade e diminuindo os contínuo.
índices de mortalidade materno-infantil. Muitas melhorias foram conquis- O processo de apego é influenciado pelo estado de saúde da mãe
tadas a partir da criação deste programa, como aumento das consultas de e do RN, pelas circunstâncias do ambiente e pela qualidade da assistência
pré-natal e ampliação da triagem neonatal e das estratégias de qualifica- prestada ao RN. A imaturidade da criança afeta negativamente a quali-
ção profissional. dade da relação pais-bebê. Moreira et al. (2003) relatam que os pais de
Fica claro que a abordagem da prematuridade necessita de estraté- prematuros acreditam ter fracassado ao gerarem uma criança fisicamente
gias de saúde pública, incluindo: frágil, incapaz de sobreviver sem cuidados médicos especiais, sob risco de
vida, e que esses sentimentos podem dificultar o início da relação afetiva
• Garantia de realização de parto de alto risco num hospital entre pais e bebê. Os pais também se questionam se vale a pena iniciar a
terciário. construção de uma relação com filhos prematuros sob a ameaça da pos-
• Acompanhamento das complicações neonatais. sibilidade de morte. Podem sentir-se inadequados, culpados, deprimidos,
• Acompanhamento do RN egresso da UTIN. ressentidos e assustados.
• Atenção aos problemas relacionados à saúde emocional e men-
tal das famílias do RN. Os pais também podem criar fantasias ameaçadoras em torno das
Assim, também pela primeira vez, surge uma portaria voltada para situações que vivem em uma UTIN. O desequilíbrio emocional gera confli-
o atendimento em UTIN, que aborda importantes aspectos, mesmo que tos, agravando a sensação de culpa dos pais, dificultando a compreensão
superficialmente, relacionados à humanização. A Portaria no 930, de 10 da importância da presença familiar no processo de hospitalização. A fa-
de maio de 2012, trata de como deve ser organizada a atenção integral mília vive uma tensão entre a aproximação e o distanciamento da criança,
e humanizada ao RN grave ou potencialmente grave no Sistema Único devido à doença e à possibilidade de terminalidade. E a equipe de saúde
de Saúde (SUS), com destaque para os recursos humanos, materiais e os deve considerar a existência desses sentimentos no processo cotidiano
equipamentos necessários, assim como a estrutura física. Cita que ações de cuidado intensivo ao RN e ter em mente que a recuperação do bebê
devem ser realizadas para reduzir ruídos, para controle da iluminação não depende unicamente dos cuidados médicos e de enfermagem, mas
e para garantir a presença dos pais em período integral, com visitas de também do afeto e do carinho que receberão de seus pais. Um ponto im-
familiares programadas. portante a ser considerado no tratamento do RN de risco é que a equipe
deve agir para reduzir a ansiedade dos pais, oferecendo apoio e ajudando
na expressão de seus sentimentos.
52 Do nascimento ao vínculo Silva e Viana afirmam que o ambiente da UTIN pode ser intimida-
dor. Reforça a sensação de perda que a família sente com o nascimento
e apego de uma criança prematura, que precisa ficar afastada de seus pais, sob
Ao nascimento de cada bebê, o pediatra assistente deve indagar se risco de morte e necessitando de tratamento médico. Essa família pode
o bebê é a termo, se o líquido amniótico tem mecônio, se o bebê chorou sentir-se deslocada e até alienada de seu próprio bebê. Para minimizar tal
ou respirou e se o tono muscular dele é bom. Se a resposta for favorável situação, a família precisa sentir-se confortável na UTIN e perceber que ela
para todas as indagações, o bebê deverá ser levado à sua genitora e, com é parte dos cuidados a seu filho. Os pais que visitam pela primeira vez o
sua permissão, mantido junto a ela. Isso será um elemento facilitador da seu filho na UTIN assustam-se ao se depararem com o novo cenário. Nesse
formação do apego, do vínculo, da amamentação e, consequentemente, primeiro contato, os pais devem estar acompanhados por um membro
da estruturação neurológica e psíquica do sujeito emergente. A portaria da equipe de saúde, que deve estar capacitado a apresentar aos pais o
do Ministério da Saúde que trata do aleitamento materno estabelece, nos bebê e o espaço, com as devidas explicações sobre a tecnologia e as ações
dez passos para o sucesso do aleitamento, que se deve auxiliar a mãe, que ali se realizam. Com o tempo e com os esclarecimentos adequados, a
estimular e facilitar a amamentação nos primeiros 30 minutos após o tecnologia passa a significar para os pais a segurança de seus filhos.
nascimento, e que todo RN deverá ser colocado junto a ela para sugar Assim, na UTIN, aspectos relevantes no cuidado aos bebês inter-
durante a primeira hora de vida, sempre que ambos estiverem em boas nados referem-se à humanização da assistência e ao fortalecimento do
condições, proporcionando, assim, contato olho a olho e pele a pele. vínculo mãe-filho. Em virtude da prematuridade, da dificuldade desses
Para isso ocorrer, a equipe de saúde presente na sala de parto de- recém-nascidos na sucção ao seio materno e da impossibilidade de a
verá manter um ambiente de apoio, confortável física e emocionalmente, maioria permanecer junto à mãe, o vínculo pode ser comprometido. Em
de modo a facilitar o contato íntimo mãe-filho recém-nascido imediata- decorrência destes fatores limitantes e de fatores externos que prejudi-
mente ao nascimento. O cuidador deve limpar e secar o recém-nascido cam a qualidade do ambiente, os riscos a que estes recém-nascidos estão
junto de sua mãe e com a ajuda desta, facilitando que ela o segure e o leve sujeitos intensificam-se pela dificuldade de se estabelecer um vínculo
ao seio. A equipe deve criar condições para que o bebê acompanhe sua materno.
mãe desde o nascimento até o alojamento conjunto. E, se for necessária O estabelecimento e a manutenção do vínculo afetivo durante o
reanimação, após as primeiras manobras e com a estabilização clínica do período de hospitalização são fundamentais para despertar o cuidado
bebê, a equipe de saúde deve, mesmo que por pouco tempo, permitir da família e para acelerar o processo de recuperação da saúde do RN. O
que a mãe olhe e toque seu filho, para que seja possível iniciar o processo contato íntimo dos pais com o bebê e o apego deles exercem profundos
de formação do apego. efeitos no futuro crescimento e desenvolvimento do filho. Há evidências
Shaw et al. (2006) e Nystrom e Axelsson (2002) relatam que a sepa- na Neurociência de que ligações afetivas fortes e duradouras com os pais
ração pais-filho, consequente à internação de um RN na UTIN logo após podem ser capazes de protegê-lo dos efeitos adversos do estresse, e que
o parto, é um acontecimento que gera um nível elevado de estresse aos essas relações iniciais são como protótipos de relações sociais no futuro.
seus pais. Lefkowitz (2010) observou que 35% das mães e 24% dos pais A equipe multiprofissional pode auxiliar nessa formação de laços
apresentam estresse emocional agudo já nos primeiros três a cinco dias afetivos duradouros por meio de ações simples e baratas, tais como:
após a internação de seus filhos na UTIN. • Garantir que a mãe veja e toque seu bebê enquanto ainda
A mãe do prematuro é uma puérpera que vivencia situações estiver na sala de parto.
peculiares, diferentes daquela que teve um bebê a termo, enfrentando • Informar aos pais onde o bebê irá ficar e que podem ir vê-lo
estresse emocional por ter gerado uma criança que necessita de cuidados assim que estiverem dispostos.
intensivos. No processo de separação mãe-filho, há fatos que levam a • Se possível, visitar a mãe antes que ela vá ver o bebê para falar
alterações no seu cotidiano, na sua vivência e na dinâmica familiar. Após das condições deste e ouvir suas apreensões.
o nascimento, surge um contraste entre a criança imaginada pelos pais e • Acompanhar a mãe em sua primeira visita na UTIN, expli-
aquela que eles visualizam. A situação crítica e a instabilidade clínica do cando-a sobre dispositivos e equipamentos ligados ao bebê,
RN de risco geram estresse na família e uma possível crise, especialmente estimulando o toque e a conversa com o bebê. Pode ser inte-
para os pais, sendo este intensificado pelo próprio ambiente físico da UTIN ressante apresentar o bebê aos pais, sempre ressaltando uma
e pela falta de informação.
– CAPÍTULO 2 | 2.1 UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA: UM OLHAR PARA O RECÉM-NASCIDO, SUA FAMÍLIA E A EQUIPE DE SAÚDE –

característica específica que ele possa ter (como não gostar de favorece, em curto prazo, o lidar com a ansiedade, a construção do vínculo
luz, ter dedos longos e muito ou pouco cabelo etc.). e a permanência junto ao RN; em longo prazo, diminui a possibilidade de
• Ressaltar com os pais sua importância na vida do bebê, como alterações do desenvolvimento da criança.
sendo a única coisa que este reconhece e que pode lhe trazer Autores recomendam que seja adotado o programa para apoio aos
amor e segurança. pais denominado Cuidado Centrado na Família (CCF). Este baseia-se numa
• Garantir entrada e permanência dos pais na UTIN por quanto parceria entre equipe de saúde e família, com presença irrestrita dos pais
tempo eles quiserem. na UTIN, seu envolvimento no cuidado com a criança e a comunicação
• Apoiar os pais quando aparecem para visitar o bebê, respon- aberta da equipe de saúde com os pais. Este tipo de cuidado permite à
dendo às perguntas e ouvindo. família sentir-se mais acolhida na UTIN, minimiza o nível de ansiedade dos
• Permitir a participação dos pais durante os cuidados com o pais e promove maior aproximação com o filho.
bebê, sempre que for possível. Às vezes, só de os pais poderem
levantar o bebê para ajudar na troca de coxins e lençóis já é o O CCF reconhece a importância da família como centro do cuidado,
suficiente. e não apenas a criança. É uma estratégia de humanização na assistência
• Tentar coincidir administração da dieta com a presença dos da criança, com finalidade de incentivar a participação no planejamento
pais. das ações em torno da família. Possui conceitos que devem ser seguidos
• Colocar em posição canguru assim que o RN estiver estável e para melhoria da assistência, com benefícios para os profissionais de
os pais estiverem prontos, sem realizar qualquer tipo de pres- saúde, pacientes e familiares. E a relação entre estes três personagens
são; o processo deve ser prazeroso para ambos os envolvidos. deve basear-se nos seguintes conceitos: dignidade e respeito; compar-
• Estabelecer a visita dos irmãos, de modo a inserir o bebê no tilhamento de informações; participação e colaboração. Eles consagram,
contexto familiar e diminuir o estresse do próprio irmão. respectivamente, que os profissionais devem ouvir e honrar as escolhas
Nos casos em que a interação mãe-RN é impossibilitada por compli- do paciente, e que seus valores, conhecimentos, crenças, devem ser incor-
cações de saúde de um ou de ambos, a troca de ideias, o apoio e o confor- poradas no planejamento de cuidados; que se deve comunicar e compar-
to emocional devem ser oferecidos por parte da equipe multiprofissional, tilhar informações completas e que as famílias também têm informações
com o objetivo de facilitar o vínculo afetivo mesmo sem o contato prévio. a fornecer; que a família deve participar dos cuidados e do planejamento
Tal contato facilita e acelera o tempo para que o apego se desenvolva, mas do RN; assim como colaborar na implementação do que foi planejado.
não limita a ocorrência deste somente neste período. A mãe, após um par- Dessa forma, percebe-se a importância de que a mãe se sinta segura
to prematuro, inconscientemente, culpa-se por ele e busca esconder-se e tenha orientação e apoio tanto de sua família quanto dos profissionais de
sob uma depressão. Esse sentimento interfere no estabelecimento de um saúde. Esses profissionais de saúde devem organizar-se para que possam
relacionamento com o filho, visto que as mães se sentem perigosas para fornecer informação e aconselhamento às mães, assim como orientações
ele. Desta forma, as mães conformam-se em deixar os cuidados para a sobre amamentação, dispondo, ainda, de um sistema de acompanhamen-
figura da enfermeira, quem a mãe julga ter maior competência para cuidar to do cuidado após a alta.
do seu filho sem colocá-lo em risco. Apesar de décadas de trabalho para implementar práticas de cuida-
O relacionamento afetivo entre a mãe e o filho é um fator essencial dos centrados na família, a falta de alojamentos próximos e acesso restrito
na influência do desenvolvimento da identidade materna e é relacionado são as principais preocupações dos familiares de pacientes internados. As
com a realização do papel da mãe, que busca proporcionar amparo físico, diferenças na experiência hospitalar relacionadas às diferenças demográ-
bem como psicológico para o filho. Uma mãe deve desenvolver o laço ficas, clínicas e a fatores hospitalares devem ser exploradas e os resultados
emocional com o filho, provendo-lhe cuidados apropriados e desenvol- devem ser usados para melhorar as oportunidades para o envolvimento
vendo a sua própria identidade como tal. das famílias, projetando-se serviços que melhor atendam às necessidades
O apego é resultado de um processo, dependente de troca mútua destas. Por exemplo, quartos individuais de pacientes estão tornando-se
de estímulos. O processo de vinculação, que se inicia no momento em mais comum no ambiente hospitalar, mas, geralmente, não fornecem
que se planeja ter um filho e desenvolve-se com as experiências que a alojamento adequado para mais do que um membro da família. Além 53
mãe e o filho vivem durante a gestação e após seu nascimento, culmina disso, cama auxiliar está associada a um pior sono quando comparado ao
no apego. Esse sentimento influencia o desenvolvimento da criança e as alojamento nas proximidades, como o programa de acomodação familiar
suas relações sociais, bem como auxilia a mãe a desempenhar, com maior Ronald McDonald House.
competência, o seu papel materno.
Como mesmo após a alta hospitalar essas crianças continuam sendo
de alto risco, já que suas reinternações são frequentes durante o primeiro
O Método Canguru
ano de vida, sua mortalidade é alta e seu crescimento e desenvolvimento Trata-se de uma mudança de paradigma assistencial, objetivando-
em longo prazo sofrem influência de muitos fatores, torna-se essencial o -se a realização de um cuidado integral e contingente aos recém-nascidos
precoce contato mãe-filho para a formação de vínculo e apego. e suas famílias. É mais do que uma posição. É somar os avanços tecnoló-
Neste momento, cabe destacar algumas iniciativas e paradigmas gicos e de conhecimento a uma atenção humanizada. Estratégias foram
que têm como metas a assistência integral e holística e a melhoria da instituídas não apenas com o objetivo de elevar o padrão da assistência,
qualidade do cuidado fornecido ao RN e à sua família, de forma a garantir mas também de mudança da visão profissional, que deve ser completa,
a estes qualidade de vida futura e cidadania ativa. analisando a necessidade do indivíduo.
Neste método, a família passa a assumir o papel de cuidadora do
RN. Muitos pais não se sentem capazes de atender às necessidades de
Atenção à família cuidados de seu filho prematuro e, apesar de passarem por sentimentos
paradoxais, como gratidão e ciúme em relação à equipe de saúde, acre-
Para os pais, a UTIN é um ambiente de esperança e de medo. ditam que os profissionais são mais importantes do que eles no cuidado
Esperança por saber que este é o melhor local para o seu filho, o qual ao seu bebê. O Método Canguru é uma estratégia para o fortalecimento
depende dos cuidados ali realizados para aumentar as chances de sobre- emocional dos pais.
vida, e medo por saberem dos riscos inerentes aos seus filhos. Existem
também sentimentos de frustração por não estarem preparados para esta Ele abrange questões como o manuseio do bebê, o acolhimento à
separação. família, a promoção do vínculo mãe-bebê e o aleitamento materno. Gera
impacto positivo nos resultados da assistência intensiva neonatal, como
Para compreendermos o significado e a percepção da UTIN para a diminuição do tempo de internação e aumento da frequência de alta para
mãe de um bebê internado, bem como sua influência no vínculo afetivo casa em aleitamento materno exclusivo. Em uma revisão sistemática, foi
mãe-bebê, é necessário conhecer a história desta mãe. As histórias mater- verificado que o Cuidado Mãe Canguru foi associado à redução da mor-
na, gestacional e do parto são importantes no processo de transformação talidade, da sepse e do tempo de internação, além de melhorar algumas
das mudanças físicas e emocionais e nos aspectos intrapsíquicos que in- medidas de crescimento, aleitamento materno e vínculo mãe-bebê.
fluenciam este período. A existência de experiências de perdas anteriores Assim, são consideradas vantagens do Método Canguru:
e história pregressa da mãe influenciam a vivência atual. A presença de
angústia de morte é intensificada por sequelas emocionais de perdas e • Aumento do vínculo mãe-filho.
óbitos anteriores, o que, por sua vez, contribui para a construção do signi- • Menor tempo de separação mãe-filho, evitando longos perío-
ficado da UTIN para estas mães. São geradas questões referentes à onipo- dos sem estimulação sensorial positiva.
tência materna, evidenciando que o poder feminino de gerar um filho é • Estímulo ao aleitamento materno, favorecendo maior fre-
frustrado pelo nascimento de um bebê diferente do que era imaginado e quência, precocidade e duração.
fantasiado por esta mãe. • Maior competência e confiança dos pais no manuseio do seu
filho de baixo peso, mesmo após a alta hospitalar.
O vínculo é facilitado quando a mãe e a família são apoiadas pela • Melhor controle térmico.
equipe de saúde e quando a comunicação entre eles é adequada. O mé- • Menor número de recém-nascidos em unidades de cuidados
dico e os outros membros da equipe, de acordo com Klaus e Kennell, são intermediários, devido à maior rotatividade de leitos.
a ponte entre o RN e seus pais. Ouvi-los permitirá compreender melhor a • Melhor relacionamento da família com a equipe de saúde.
forma como se sentem. Ensinar esses pais a entender os sinais de com- • Diminuição de infecção hospitalar.
portamento de seus bebês nos diferentes momentos de hospitalização • Menor permanência hospitalar.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

O Método Canguru é composto e dividido em três etapas. A primei- • Proporcionar ciclos de luz/escuridão ao bebê (estudo mostra
ra etapa vai desde o pré-natal de risco, nascimento, até a permanência do que esta estratégia pode aumentar ganho de peso e diminuir
RN em uma unidade de cuidados intensivos ou intermediários neonatais, tempo de internação).
onde é estimulada a presença e a participação dos pais, a amamentação • Reduzir o número de manipulações e procedimentos doloro-
e a realização da posição canguru. Já a segunda etapa refere-se ao tempo sos/estressantes sempre que possível.
em que o bebê já está estável clinicamente e fica com a mãe 24 horas por • Garantir ambiente menos ruidoso e iluminado: abrir e fechar
dia, realizando a posição canguru sempre que possível e quisto. A terceira portinholas com cuidado, não apoiar objetos na incubadora,
etapa corresponde ao momento após o bebê e a família receberem alta retirar água condensada das traqueias de ventilação, atender
hospitalar, com necessidade de acompanhamento ambulatorial criterioso. prontamente a alarmes, desligando-o quando manuseando o
Por meio deste método, entende-se que se deve orientar a família bebê; realizar alterações estruturais (pias menos barulhentas,
sobre as condições de saúde da criança, ressaltar sempre a importância luzes individuais, vidros para isolar alas e/ou leitos), instituir a
da atuação da família na recuperação da criança, prestar todos esses en- “Hora do Soninho ou Psiu”, colocar lençóis em cima de incuba-
sinamentos e treinamentos, tornando a mãe apta para permanecer em doras e berços para reduzir a luminosidade.
enfermaria conjunta, onde a posição canguru será realizada pelo maior • Realizar cuidados antes de procedimentos dolorosos/estres-
tempo possível. Dessa forma, a família torna-se mais preparada para a alta santes, como respeitar o estado comportamental do bebê,
e para o período pós-alta hospitalar. não o manuseando durante o sono; falar suavemente antes
de tocar, posicionar adequadamente e dar contenção elástica;
Permitir a presença ilimitada dos pais e oferecer rotineiramente a realizar procedimentos em dupla; atentar para respostas fisio-
posição canguru para ambos os pais são políticas de apoio aos genitores lógicas e comportamentais do bebê.
que cresceram significantemente a partir de 2004. A importância da não • Após procedimentos, posicionar e dar contenção ao bebê por
separação pais-bebês é conhecida internacionalmente e está presente 10 minutos ou até que este se acalme e estabilize suas respostas.
em várias recomendações internacionais. O Método Canguru é altamente • Não realizar banhos de rotina e pesar bebê apenas após 1
recomendado, mesmo em ambientes com um público de maior renda. semana de vida, sempre utilizando enrolamento para tal.
Com base nos princípios e conceitos do Método Canguru e traba- • Posicionar o bebê com cabeceira elevada, pescoço em
lhos de outros autores, são recomendadas algumas ações que visam à semiextensão, extremidades em flexão (sem abdução do
humanização do cuidado na UTIN: quadril), cabeça em posição média (queixo alinhado com o
• Ter uma relação pessoal com o bebê, chamando-o pelo nome esterno) e mãos próximas à boca.
e iniciando o plantão apresentando-se a ele. • Utilizar mecanismos que facilitem o posicionamento adequa-
• Aquecer as mãos antes de tocar o RN e não utilizar perfumes do, tais como ninho, coxins, rede de descanso, entre outros.
fortes. • Deixar sempre o bebê organizado e em estado de sono.
• Compreender as necessidades de toque amoroso, carinho e
atenção ao bebê ao evitar procedimentos estressantes logo
antes da visita dos pais, permitindo e estimulando a partici-
NIDCAP – Newborn Individualized
pação destes nos cuidados, assim como uma interação direta Developmental Care and Assessment
com seu bebê.
• Tocar o bebê gentilmente, oferecer-lhe o dedo para segurar Program
e falar com ele de modo carinhoso, fornecendo sempre um
O Programa de Avaliação e Cuidados Individualizados para o De-
estímulo de cada vez.
senvolvimento do Neonato tem como base a teoria síncrono-ativa de
• Proporcionar medidas não farmacológicas para controle da
Als, a qual postula que existem subsistemas desenvolvendo-se de forma
dor e do estresse, tais como enrolamento, contenção facilita-
54 da, sucção não nutritiva e administração de glicose 25%.
independente, ao mesmo tempo em que interagem entre si e com o meio
ambiente, como mostra a figura 1.
• Agrupar os cuidados ao redor dos ciclos de sono, atentando
para as respostas do bebê.

Figura 1 – Esquema de desenvolvimento dos subsistemas

Fonte: Brasil (2011) apud Als et al. (1986).

Os subsistemas envolvidos são: • Motor: refere-se à postura, ao tônus muscular, aos movimentos
• Autônomo ou fisiológico: recebe maior atenção pela equipe voluntários e involuntários; postura harmoniosa, movimentos
de saúde; envolve a respiração, o ritmo cardíaco, a saturação sincrônicos – segurar as mãos e os objetos ou colocá-las na
de oxigênio, a cor da pele e os sinais viscerais (soluços, saliva- boca indicam estabilidade; já hipo ou hipertonia temporárias,
ção, regurgitação e movimentos peristálticos). Por meio deste arqueamento e torções indicam estresse.
subsistema, pode-se verificar comportamentos que indicam • Estados comportamentais: são listados seis estados compor-
estabilidade (pulso e respiração regular etc.), demonstrando tamentais, sendo eles: sono profundo, sono leve, sonolência,
gestão adequada de estímulos internos e externos. alerta, alerta com atividade e choro, todos com significados e
funções próprias.
– CAPÍTULO 2 | 2.1 UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA: UM OLHAR PARA O RECÉM-NASCIDO, SUA FAMÍLIA E A EQUIPE DE SAÚDE –

• Atenção/interação: surge por volta de 25 a 28 semanas de rosto; garantir a administração de colostro e leite da própria
idade gestacional pós-concepcional; capacidade do bebê de mãe; reduzir ruídos e atender alarmes prontamente; cobrir os
se comunicar, ficar alerta e apreender informações do meio; olhos do bebê durante procedimentos que necessitam de luz
sorriso, movimentos da boca como se quisesse falar e fixação mais forte.
temporário do olhar mostram estabilidade. • Parceria com famílias (partnering with families): afirma
• Regulador: refere-se a mecanismos usados pelo bebê para a necessidade de envolver a família nos cuidados do bebê,
manutenção ou retorno ao equilíbrio entre os subsistemas, tornando a UTIN um ambiente confortável, acolhedor e
mesmo que estes estejam relacionados ao que ele precisa compreensivo. Tem como meta a participação ativa e o acesso
receber do meio para que o alcance do equilíbrio seja facilita- irrestrito dos pais, vendo-os como essenciais para recuperação
do. Os subsistemas podem sobrecarregar-se ou fortalecer-se, do bebê e tornando-os seguros em seus papéis de cuidadores,
mas, geralmente, um prematuro da UTIN acaba por utilizar assim como promover o vínculo e o apego. São algumas ações
muita energia para o funcionamento dos subsistemas autô- relacionadas a esta medida: verificar em que estágio de aflição
e perda a família está para individualizar suas necessidades;
nomo e motor, sobrando muito pouca para os demais. ouvir preocupações e sentimentos das famílias; comunicar o
Quando o bebê consegue estabelecer uma integração equilibrada que o bebê precisa em termos médicos e desenvolvimentais;
entre o fisiológico e o comportamental, fala-se que ele está organizado. E garantir pele a pele precoce e prolongado; educar pais em
a equipe de saúde deve trabalhar para manter esta organização e ler os como podem participar dos cuidados, tornando-os aptos e
sinais que indicam que o bebê está ou não pronto para receber estímulos. confiantes.
Assim, surge o cuidado desenvolvimentalista, voltado totalmente para as • Posicionamento e manuseio (positioning and handling):
necessidades do paciente, e não da equipe, e tendo como metas preser- medida que tem a finalidade de que o bebê tenha estabili-
var a energia do bebê, diminuir estresse e morbimortalidade, facilitar sua dade autonômica durante posicionamento e manuseio, de
capacidade de autorregulação, prevenir agitação e promover crescimento prevenir ou minimizar deformidades posicionais, de realização
e desenvolvimento adequados. de procedimentos de acordo com as respostas dos bebês. O
Dessa forma, o RN que nasce prematuro dispende muita energia posicionamento terapêutico é fundamental para adequados
para o funcionamento adequado de seu sistema autonômico, não so- desenvolvimento cerebral, neuromotor e musculoesquelético,
brando muita para os demais sistemas (motor, estados comportamentais, função fisiológica, integridade da pele, regulação térmica, estabi-
atenção/interação e regulador). Daí a importância de fornecer limites físi- lidade, facilitação do sono e descanso, crescimento, organização
cos para a movimentação do bebê (ninhos, redes, coxins), ajudando em comportamental e menor gasto de energia. Bebês sentem-se
sua organização e na geração do tônus flexor. Essa organização mostra a mais seguros e menos estressados. São intervenções, neste
habilidade do RN de integrar o funcionamento dos sistemas fisiológicos e caso: diminuir estressores ao antecipar e apoiar necessidades
comportamentais, gastando menos energia (Brasil, 2011). individuais do bebê; usar ferramentas que auxiliem no posicio-
No livro de diagnósticos de enfermagem (Nanda, 2015), há um namento; manter linha média, flexão, contensão e conforto para
que atende por Comportamento Desorganizado do Lactente, o qual é posicionamento; avaliar ciclo de sono que o bebê está para rea-
definido como desintegração de respostas fisiológicas e neurocompor- lizar o cuidado; mudar decúbito a cada 4 horas; enrolar durante
tamentais do lactente a estímulos procedentes do ambiente. A presença banho e peso; manter mãos dos bebês próximas à boca; orientar
das seguintes características definidoras ou sinais e sintomas define a pais quanto aos princípios do posicionamento, contenção e
existência deste diagnóstico: dificuldade para acalmar-se e de sustentar o manuseio.
estado de alerta, estremecimentos, hiperextensão de extremidades, mãos • Proteção do sono (safeguarding sleep): ciclos de sono são
cerradas ou espalmadas, movimentos descoordenados, reação de susto essenciais para desenvolvimento neurossensorial precoce,
exagerada, reflexos e cor da pele alterados, arritmias, bradi ou taquicardia, aprendizagem e memória, e preservação da plasticidade ce-
dessaturações, sobressaltos, irritabilidade, agitação, choro, intolerâncias rebral. Esta estratégia tem como objetivos garantir períodos 55
alimentares, olhar fixo, soluços, boca aberta, extensão de língua e oscila- de sono ininterrupto e que o estado comportamental seja
ções de estados. avaliado antes da realização de cuidados e procedimentos.
São intervenções neuroprotetoras: evitar interromper o sono e
Como exigência para instituição deste programa, membros da
aspectos que podem atrapalhá-lo (ruídos, luz, procedimentos
equipe são treinados e capacitados para reconhecer se o bebê está ou
desnecessários); proteger olhos de iluminação direta e reduzir
não pronto para interação e quando ele precisa de alguma mudança faci-
iluminação do ambiente sempre que possível (como ao pro-
litadora; procura-se alcançar sempre a organização do bebê, o equilíbrio teger incubadoras com lençóis); evitar altas doses de drogas
entre os subsistemas. Nesse processo, o ambiente é considerado e são sedativas e depressoras e prover cuidado desenvolvimental
seguidos alguns passos diante do bebê que se quer intervir, sendo eles: apropriado para o nível de maturação do bebê, agrupar cuida-
observar, responder ao estado, atuar e estabilizar. Ou seja, após a obser- dos de acordo com seu estado comportamental e respostas;
vação e a avaliação do bebê na UTIN, são planejadas ações consideradas estimular posição canguru; orientar pais quanto à importância
apropriadas para cada um individualmente, não o deixando até que este do sono.
esteja novamente organizado. • Redução de estresse e dor (minimizing stress and pain): o
estresse traz várias consequências, tais como gasto energético,
retardo de crescimento e recuperação, estabilidade fisiológica
Modelo de cuidado desenvolvimentalista prejudicada, alteração do desenvolvimento cerebral e aumento
integrativo neonatal dos níveis de cortisol, limitando a reorganização neural e, con-
sequentemente, a aprendizagem e a memória das habilidades
Este modelo, descrito no artigo de Altimier e Phillips (2013), basea- motoras. A meta desta medida é promover a autorregulação e a
do em outros modelos de cuidados desenvolvimentais universais, utiliza organização neurodesenvolvimental, tendo como intervenções:
intervenções neuroprotetoras para amparar conexões neurais sinápticas utilizar rotineiramente uma ferramenta segura de avaliação da
ótimas, promover o desenvolvimento adequado e prevenir sequelas. presença de dor; prover medidas não farmacológicas (posiciona-
Neuroproteção é definida como um conjunto de estratégias capazes de mento, enrolamento, contenção, sucção não nutritiva e sacarose)
prevenir morte celular neuronal, apoiar o desenvolvimento cerebral ou em procedimentos menos invasivos; verificar sistematicamente a
facilitar a recuperação neuronal após injúrias ao criar novas conexões e necessidade de medidas farmacológicas; estimular envolvimento
caminhos funcionais. Já as intervenções neuroprotetoras atingem suas dos pais durante procedimentos dolorosos, se estes o quiserem,
metas por criar medidas modificadoras organizacionais, terapêuticas e do seja contendo o bebê, seja o mantendo pele a pele; orientar pais
ambiente, como o cuidado desenvolvimental centrado na família. em como podem confortar o bebê em caso de sinais de estresse
Por este modelo de cuidado, foram criadas sete medidas fundamen- e dor.
tais neuroprotetoras, assim explicitadas e distribuídas: • Proteção à pele (protecting skin): para garantir adequada
termorregulação, balanço hidroeletrolítico, barreira contra
• Ambiente restaurador (healing environment): constituído
bactérias e toxinas e condução de informações sensoriais ao
pelo ambiente físico (espaço, privacidade e segurança) e
cérebro (toque, pressão e dor). São ações possíveis: utilizar,
sensorial (temperatura e toque, propriocepção, odor, sabor,
na admissão e rotineiramente, uma ferramenta segura de
audição e ruídos, visão e iluminação. Esta medida tem o
avaliação da pele (como Braden Q); fornecer umidificação aos
objetivo de minimizar o impacto do ambiente da UTIN no
prematuros extremos nas primeiras duas semanas de vida;
desenvolvimento do cérebro do bebê por meio das seguintes
posicionar bebê adequadamente; minimizar uso de adesivos e
intervenções: estrutura da UTIN adequada (preferencialmente
removê-los cuidadosamente; evitar sabonetes e uso de rotina
quartos privados); garantir ambiente térmico neutro (incuba-
de emolientes; enrolar durante banho, o qual deve ocorrer a
dora umidificada ou não, de acordo com a necessidade); tocar
cada três a quatro dias e sem sabão nos menores de 1000 g;
bebê gentilmente e mudar decúbito devagar; facilitar o cuida-
orientar pais quanto aos cuidados com a pele.
do pele a pele; providenciar objetos com cheiro da mãe para
• Otimização da nutrição (optimizing nutrition): o leite mater-
ficarem próximos ao bebê; manter as mãos do RN próximas ao
no é o que o bebê realmente precisa para obter uma nutrição
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

adequada. As finalidades desta medida neuroprotetora são práticas de alimentação direcionadas para cada bebê; estimular
garantir que a alimentação será segura, funcional, nutritiva e posição canguru precoce e prolongada; estimular e apoiar a
apropriada e que aversões orais sejam prevenidas. São estra- amamentação e o aleitamento materno.
tégias relacionadas: cuidado individualizado, incorporando-se A figura 2 mostra a esquematização deste modelo de cuidado.

Figura 2 – Esquematização do Modelo de Cuidado Desenvolvimentalista Integrativo Neonatal

Fonte: Altimier e Phillips (2013).

entre os profissionais da UTIN e as demais equipes do hospital é limitada,


Cuidado com o cuidador devido à sobrecarga de trabalho e à superlotação da unidade.
A equipe de profissionais que trabalha na UTIN, em especial a Enfer- Outro fator desgastante está no tempo de atuação do profissional.
magem, também é submetida a vários estímulos estressantes. O ritmo de Além do desgaste emocional, existe um “desgaste físico” importante. Os
trabalho é intenso e exaustivo. Há uma exigência crescente de eficiência profissionais que atuam em UTI convivem com diversos fatores desenca-
e atualização de conhecimentos. É necessário ter habilidade de relaciona- deadores de desgastes, tais como a dificuldade da aceitação da morte,
mento, bem como segurança na execução de técnicas e manipulação de a escassez de recursos materiais e humanos, a superlotação e a tomada
56 máquinas e equipamentos complexos. de decisões conflitantes relacionadas com a seleção dos pacientes que
Apesar desse cenário que dificulta o atendimento humanizado por serão atendidos. Estes são alguns dos dilemas éticos e profissionais que
parte de alguns profissionais de saúde, vem sendo observada uma mu- geram tensão entre os profissionais e acabam por influenciar a qualidade
dança de consciência e comportamento em alguns profissionais quanto à da assistência prestada aos usuários. Em relação ao ambiente de cuidado
importância de prestar uma assistência mais humanizada. humanizado, a atmosfera de integração, segurança e confiabilidade deve
ser compartilhada e de forma coletiva, tanto para pacientes quanto para
Um dos aspectos que envolvem a prática da humanização está os profissionais de saúde.
relacionado ao modo como lidamos com o outro. O processo de trabalho
no meio da saúde funda-se em uma relação interpessoal muito intensa. Os recursos materiais também são obstáculos e fonte de desgaste
Sendo assim, temos que aprender a fazer diferença no modo como li- na produção da assistência humanizada. Os profissionais lidam com falta
damos com o colega, tratando-o com dignidade e respeito, valorizando de equipamentos e materiais. A compra, a distribuição e a manutenção de
seus medos, pensamentos, sentimentos, valores e crenças, estabelecendo recursos materiais estão vinculadas à administração hospitalar, que deve
momento de fala e de escuta. suprir todas as áreas da organização a fim de garantir a produção de cui-
dados com qualidade, conformidade e continuidade para o paciente. Na
Temos que ficar atentos ao fato de que as propostas de humanização aquisição do material, também é considerado o menor preço e a qualida-
em saúde também envolvem o processo de formação do profissional, cen- de do produto. No processo de trabalho em saúde, é a administração que
trado no aprendizado técnico e individualizado. deve cuidar para que a falta de material não se transforme em prejuízos
para o paciente. Mas é o profissional da ponta e o paciente que acabam
sofrendo as consequências de compras insuficientes ou de qualidade
Limitações técnicas encontradas pelos duvidável.
profissionais de saúde
em uma UTIN Considerações finais
Os elementos relativos à organização do trabalho (como divisão Pode parecer impossível que mudanças tão profundas ocorram no
do trabalho), situações adversas das condições e relações de trabalho, modo de pensar e agir dos profissionais de saúde envolvidos diretamente
carência de recursos humanos ou materiais, escassez de espaço físico e no cuidado dos recém-nascidos. Porém, mudanças no cuidado desenvol-
impotência do profissional, podem constituir-se como fontes laborais de vimental e na forma de cuidar de prematuros podem, frequentemente,
tensão e de sofrimento. O desgaste e o sofrimento podem ser gerados serem iniciadas por poucos cuidadores motivados. Dando o exemplo,
não somente pela atividade que o trabalhador executa, mas também instruindo e colaborando são ações essenciais para a promoção de um
pela atividade que ele tem como impedida, ou seja, aquela atividade não cuidado desenvolvimental apropriado. O principal seria fornecer um am-
realizada. biente efetivamente restaurador, tranquilo e prazeroso, tanto para o bebê
e as famílias quanto para os funcionários.
Em relação aos desgastes, os profissionais frequentemente criam
alguns atalhos e elaboram mecanismos que transgridem a prescrição das Não se deve esquecer que cérebros em desenvolvimento estão
tarefas definidas pela rotina, geralmente com a finalidade de compensar em nossas mãos, e que a produtividade futura do nosso bebê e de sua
as dificuldades e atender com qualidade o usuário. família dependem, e muito, de como cuidamos deles. A assistência em
Neonatologia deve pautar-se pela busca constante de artifícios que aqui-
A impotência pode resultar das situações conflituosas que emer-
latem a qualidade de vida destes prematuros, sempre buscando o melhor
gem das formas objetivas impostas pelas prescrições e das exigências
desenvolvimento neuropsicomotor possível.
subjetivas dos aspectos afetivos e relacionais presentes no cotidiano. A li-
teratura aponta que a disponibilidade de espaços públicos de discussão e Humanizar o cuidado em saúde significa unir as ações tecno-
administração de conflitos pode representar um fórum estratégico para a lógicas com as ações de acolhimento e respeito ético e cultural ao
politização dos problemas e construção de intervenções. Mas a integração paciente. Corresponde, também, sobremaneira, aos espaços em
que se trabalha, favorecendo o perfeito exercício da técnica aliado à
satisfação dos trabalhadores e usuários.
– CAPÍTULO 3 | ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO –

57

ASSISTÊNCIA AO CAP. 3
RECÉM-NASCIDO
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO


Paulo R. Margotto, Virginia Lira da Conceição, Jefferson Guimarães Resende

O desenvolvimento anormal, neurológico e intelectual afeta as vidas Iodopovidona colírio 2,5 % – 1 gota em cada olho após o nascimen-
de, aproximadamente, 10% das crianças na sociedade moderna, e, entre to.
as grandes causas, estão a síndrome hipóxico-isquêmica e a hemorragia Durante 48 horas, avaliar a ocorrência de efeitos colaterais, como
intraventricular, ambos relacionados com a asfixia perinatal. conjuntivite química, por exemplo.
A asfixia neonatal contribui muito para a morbimortalidade neona-
tal, estando entre as três maiores causas de morte neonatal. Profilaxia da doença hemorrágica do RN:
O estabelecimento de uma respiração adequada na transição da Vitamina K IM – (1 mg).
vida intrauterina para a extrauterina é decisivo para a adaptação satisfa-
Nos RNs cujas mães fizeram uso de antiepilépticos, fazer 2 mg-3 mg
tória por parte do bebê.
IM.
O consciencioso manuseio perinatal baseado na antecipação da
asfixia está relacionado com a detecção dos fatores de risco, na melhor Procedimentos finais:
compreensão de suas atuações fisiopatológicas, para uma melhor condu-
ta a nível profilático e terapêutico ao bebê asfíxico na sala de parto. Realizar um exame físico simplificado no RN. Verificar peso, estatura,
perímetros cefálico, torácico e abdominal e a existência de malformações.
Sempre que possível, pesar, classificar seguindo a idade gestacional e
Cuidados examinar a placenta. Recomenda-se, de rotina, a coleta de amostra de
sangue materno e do cordão umbilical para a tipagem sanguínea e para
as reações sorológicas (no caso da Sífilis, colher sangue do RN). Consulte o
Cuidados com o coto umbilical: capítulo sobre Avaliação da Idade Gestacional.
Laquear o cordão umbilical a uma distância de 2-3 cm do anel Realizar, sempre que viável, encaminhamento, o mais precocemen-
umbilical, envolvendo-o com gaze embebida em clorhexidina a 0,5% ou te possível, ao alojamento conjunto.
em álcool etílico a 70%. A presença das duas artérias e uma veia umbilical
deve ser verificada, pois anomalias dos vasos umbilicais associam-se a
malformações do trato gastrintestinal, renais, cardíacas e a anencefalia. Reanimação neonatal
Manter a limpeza diária do coto umbilical com clorexidina a 0,5% ou
Nos últimos anos, observou-se, no mundo, um decréscimo na mor-
álcool etílico a 70%, até a sua queda.
talidade infantil – crianças menores de 5 anos, principalmente no período
Recomenda-se atrasar o clampeamento do cordão por 1-3 minutos pós-natal (James; Apgar, 1975). A mortalidade neonatal, entretanto, man-
nos recém-nascidos (RNs) que não requeiram reanimação. O clampea- tém-se elevada: corresponde a cerca de 70% dos óbitos infantis e ocorre,
mento tardio do cordão umbilical após aeração do pulmão vai além da principalmente, nos primeiros seis dias de vida, associada a RNs de baixo
transfusão placentária: mantém o débito cardíaco, reduz a hipertensão risco com peso superior a 2,5 Kg e sem anomalias congênitas associadas.
pulmonar e o risco de hipertensão pulmonar nos RNs com hérnia dia-
O Brasil e o 10o país do mundo em número de nascidos vivos prema-
58 fragmática (nesses RNs, é surpreendente o resultado quando o cordão
turos (menores de 37 semanas) e 16o na mortalidade decorrente de com-
umbilical é clampeado no momento em que a ventilação chegar a um
plicações relacionadas à prematuridade, segundos dados da Organização
volume corrente, e a transição será mais fácil). A pressão arterial pulmonar
Mundial da Saúde (OMS) (American Heart Association, 1994). A maioria des-
é 20 mmHg menor do que naqueles RNs com hérnia diafragmática com
ses bebês prematuros necessita de auxílio durante a transição e a adaptação
clampeamento imediato do cordão umbilical. O clampeamento imediato
à vida extrauterina. Dos bebês nascidos entre 23 e 34 semanas, 62% rece-
do cordão nestes RNs força o sangue a passar por vasos estreitos, e, com
beram ventilação com máscara logo ao nascer, segundo a Rede Brasileira
isto, aumenta a pressão no leito vascular arterial pulmonar, o que leva à
de Pesquisas Neonatais; e no estudo do National Reserch Network (NICHD)
hipertensão pulmonar.
para prematuros extremos de 22 a 28 semanas, cerca de 67% receberam
ventilação com ventilação positiva, 8% massagem cardíaca e 5% medica-
Profilaxia da oftalmia: ções na sala de parto. Este capítulo visa ao reconhecimento de situações de
A conjuntivite neonatal é definida pelo Ministério da Saúde como asfixia no momento do nascimento e à prática das intervenções necessárias
uma conjuntivite purulenta do RN no primeiro mês de vida, usualmente ao pronto atendimento dos RNs que necessitam de auxílio na transição
contraída durante o seu nascimento, a partir do contato com secreções para a vida extrauterina, baseadas nas últimas publicações do International
genitais maternas contaminadas, sendo considerada um problema de Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR) e da Sociedade Brasileira de
saúde pública em todo o mundo. Pediatria (SBP), e, assim, assegurar os adequados atendimento e assistência
Os principais agentes causadores da infecção são Chlamydia tracho- aos RNs e reduzir a mortalidade neonatal precoce. A reanimação neonatal
matis e Neisseria gonorrhoeae, podendo também ser causada por Strepto- consiste em práticas de cuidado imediato, devendo ser iniciadas dentro do
coccus aureus do Grupo D, Moraxella catarrhalis, Herpes simplex, Escherichia primeiro minuto de vida (Minuto de Ouro), que tem por objetivo favorecer
coli e outros Gram-negativos. a transição bem-sucedida da vida intrauterina. A cada dez nascidos vivos,
um bebê necessita de auxílio para iniciar respiração espontânea efetiva; um
Estima-se que a incidência seja de 30% a 50% das crianças nascidas bebê em cada 100 nascidos vivos necessitará de intubação traqueal; e um
por via vaginal de mães infectadas e leva a cerca de 10.000 casos ao ano a dois bebês de 1.000 nascidos vivos necessitarão de reanimação neonatal
de cegueira em RNs ao redor do mundo, principalmente em países sub- avançada, com intubação, massagem cardíaca e medicações.
desenvolvidos.
É indispensável que exista uma equipe exclusiva para o atendi-
O uso da iodopovidona colírio 2,5% previne a incidência de con- mento dos RNs. Recomenda-se, no mínimo, dois a três profissionais:
juntivite neonatal com menor ocorrência de efeitos colaterais, sendo enfermeiro, técnico em Enfermagem e médico pediatra. A presença do
considerado o melhor medicamento quando comparado aos utilizados pediatra é fundamental para estabilizar e reanimar os RNs asfixiados e os
atualmente, como nitrato de prata, cujo uso leva à conjuntivite química prematuros, e esses casos devem ser previstos por meio do conhecimento
e até à queimadura ocular quando em doses inadequadas. Ultimamente, das condições antedatais e do periparto (quadro 1).
o nitrato de prata colírio tem sido substituído pelo valelinato de prata,
que, apesar de ser discretamente menos irritante para a mucosa ocular, é É importante lembrar que o parto cesariano entre 37 e 39 semanas
também menos eficaz na prevenção da oftalmia neonatal. de gestação, mesmo sem fatores de risco detectáveis, eleva a necessidade
de ventilação ao nascer.
– CAPÍTULO 3 | 3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO –

Quadro 1 – Condições antenatais e fatores relacionados ao parto associados à necessidade de reanimação neonatal ao nascer

Condições antenatais

Idade < 16 anos e > 35 anos Idade gestacional < 39 semanas ou > 41 semanas
Diabetes Gestação múltipla
Síndromes hipertensivas Rotura prematura de membranas
Doenças maternas Polidrâmnio ou oligoâmnio
Infecção materna Diminuição da atividade fetal
Aloimunização ou anemia fetal Sangramento no 2o e 3o trimestres
Uso de medicações Discrepância de idade gestacional e peso
Uso de drogas ilícitas Hidropsia fetal
Óbito fetal ou neonatal anterior Malformação fetal
Ausência de cuidado pré-natal

Fatores relacionados ao parto


Parto cesáreo Padrão anormal de frequência cardíaca fetal
Uso de fórceps ou extração a vácuo Anestesia geral
Apresentação não cefálica Hipertonia geral
Trabalho de parto prematuro Hipertonia uterina
Parto taquitócico Líquido amniótico meconial
Corioamnionite Prolapso ou rotura de cordão
Rotura de membranas > 18 horas Nó verdadeira de cordão
Trabalho de parto > 24 horas Uso de opioides 4 horas anteriores ao parto
Segundo estágio do parto > 2 horas Descolamento prematuro da placenta
Placenta prévia
Sangramento intraparto significante

A seguir, devemos realizar a conferência e o preparo de todo o temperatura; 3. Aspiração de vias aéreas; 4. Ventilação; 5. Intubação; 6.
material necessário à reanimação, que deverá estar testado e disponível Administração de medicações; 7. Cateterismo umbilical; 8. Materiais de 59
antes de cada parto e em local de fácil acesso. O material é organizado apoio (quadro 2).
de acordo com a sua finalidade: 1. Avaliação do RN; 2. Manutenção da
Quadro 2 – Check-list de material necessário em cada mesa de reanimação neonatal

Avaliação do RN:
Termômetro digital clínico (manter temperatura do RN de 36,5 oC a 37,5 oC)
Termômetro de parede (manter temperatura da sala de 23 oC a 26 oC)
Estetoscópio neonatal
Oxímetro de pulso com sensor neonatal
Monitor cardíaco de três vias com eletrodos
Bandagem elástica não adesiva

2. Manutenção da temperatura:
Mesa de reanimação com acesso em três lados com fonte de calor radiante
Dois campos cirúrgicos para recepção do RN e para trocar campos úmidos
Um saco de polietileno de 30 cm x 50 cm (recortar gola para servir de touca plástica)
Touca de algodão ou lã
Colchão térmico químico

3. Aspiração de vias aéreas:


Aspirador a vácuo com manômetro e mangueira de látex
Uma sonda traqueal de cada tamanho: nos 6, 8 e 10
Um dispositivo transparente para aspiração de mecônio

4. Ventilação:
Fonte de oxigênio com mangueira de látex
Fonte de ar comprimido com mangueira de látex
Misturador de gases (blender) com fluxômetro graduado em litros
Balão autoinflável com válvula de segurança 40 mmHg e reservatório de O2
Ventilador manual em T com circuito completo (mangueira e tubo corrugado com peça T)
Máscara redonda com coxim de cada tamanho (nos 00, 0 e 1)
Máscara laríngea no 1
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

5. Intubação:
Um laringoscópio infantil com lâminas retas de cada tamanho (nos 00, 0 e 1)
Um fio-guia para intubação
Cânulas traqueais sem cuff, mínimo de duas de cada tamanho (nos 2,5, 3,0, 3,5, 4,0 mm)
Fitas adesivas para fixação da cânula no RN
Duas pilhas AA + duas pilhas AA sobressalentes e uma lâmpada de laringoscópio sobressalente

6. Administração de medicações:
Solução de adrenalina 1:10.000 em seringas identificadas de cada tamanho (1 ml, 5 ml e 10 ml)
Duas ampolas de adrenalina 1:1000
Cinco flaconetes de SF 10 ml
Um frasco de SF 0,9% 100 ml
Duas seringas de cada tamanho (1 ml, 5 ml, 10 ml, 20 ml)
Cinco agulhas 40 mm x 12 mm (rosa)
Duas torneiras de três vias

7. Cateterismo umbilical:
Bandeja com material estéril para cateterismo umbilical
Cateteres umbilicais de cada tamanho (nos 3,5-4,0 F e 5,0-6,0 F)
Lâmina de bisturi
Fita umbilical de algodão

8. Materiais de apoio e avaliação:


Relógio de parede com ponteiro de segundos
Clamp umbilical
Álcool 70% para higienização das mãos
Dois pacotes com gazes estéreis
Um pacote de compressas de algodão estéreis

8. Material para transporte ate a UTI Neonatal (mínino):


Incubadora de transporte sempre ligada à tomada e aquecida – luz acesa de bateria incubadora
Ventilador manual em T com blender e fluxômetro
Oxímetro de pulso
Bomba perfusora (ou bomba de seringa) ligada à rede elétrica e com autonomia de bateria
60 Bala de oxigênio
Bala de ar comprimido
Maleta com medicações de emergência

Fonte: Kattwinked (1999); Dargaville et al. (2001).

A reanimação neonatal seguirá as etapas descritas a seguir (flu- Todos os bebês com idade gestacional diferente do termo – meno-
xograma de reanimação, Anexo 1 ), favorecendo a transição para a vida res de 36 6/7 semanas e maiores de 42 0/7 semanas – deverão ser levados à
intrauterina da forma mais fisiológica possível. mesa de reanimação independentemente do tempo em que foi realizado
o clampeamento do cordão e da condição do nascimento.
Logo ao nascer, realiza-se uma rápida avaliação do concepto, por A presença de temperatura axilar menor do que 36 oC na admissão
meio de três perguntas: é fator de risco independente para mortalidade e morbidade por agravar
1. A gestação é a termo? ou favorecer distúrbios metabólicos, desconforto respiratório, enterocolite
2. O RN está respirando ou chorando? necrosante e hemorragia intracraniana em menores de 34 semanas.
3. O RN apresenta tônus muscular em flexão?

Assistência aos RNs com boa vitalidade Passos iniciais assistência ao RN


Em todos os bebês conduzidos à mesa de reanimação, ou seja, que
Nos casos com três respostas afirmativas, o bebê será considerado receberam resposta “não” a pelo menos uma das três perguntas iniciais,
com boa vitalidade e o clampeamento do cordão umbilical deverá ser inicia-se os passos iniciais da assistência na seguinte sequência:
realizado em tempo oportuno:
1. Prover calor: após serem recebidos em campos aquecidos,
• 1-3 minutos para RN maior de 34 semanas. são levados à mesa de reanimação sob fonte de calor radiante
• 30-60 segundos para RN menor ou igual a 34 semanas. em decúbito dorsal com a cabeça voltada para o profissional
Todos os bebês que nascem com idade gestacional igual ou maior de saúde que realiza o atendimento. A mesa de reanimação
de 37 semanas com boa vitalidade, ou seja, chorando e ativo, com bom deve estar sem inclinações – posição neutra para evitar que a
tônus, deverão ficar junto da mãe – contato pele a pele em seu tórax ou cabeça fique mais baixa do que o restante do corpo do bebê.
abdome – até a realização do clampeamento oportuno, independente- 2. Posicionar a cabeça em leve extensão: evitar hiperextensão
mente do tipo de líquido amniótico, segundo as diretrizes da OMS. e a flexão exagerada do pescoço do bebê, a fim de manter
Para RNs nos quais a circulação placentária possa estar comprome- permeabilidade das vias aéreas. Por vezes, uso de coxim de
tida, não existe evidência de segurança no clampeamento tardio nem compressa sob os ombros do RN facilita este posicionamento,
eficácia na ordenha do cordão quando comparado ao clampleamento principalmente nos prematuros, cujo tônus muscular é débil
precoce. O clampeamento deverá ser imediato em todas as situações que devido à sua imaturidade global.
comprometem a circulação placentária: descolamento prematuro de pla- 3. Aspirar boca e narinas (quando necessário): deve ser evitada
centa, placenta prévia ou em alterações no cordão, como rotura, prolapso ao máximo, sendo destinada ao RNs que apresentam excesso
e nó verdadeiro (Wiswell, Fuloria; 1999). de secreções em vias aéreas. Utilizam-se sondas de aspiração
O clampeamento tardio do cordão em menores de 34 semanas nos 6 e 8, dependendo do tamanho e da idade gestacional do
resulta na menor incidência de hemorragia intracraniana e enterocolite RN, conectadas por meio de um látex a um sistema de aspira-
necrosante, diminuindo a necessidade de transfusões sanguíneas, porém ção a vácuo com pressão máxima de 100 cmH2O. Evita-se a in-
pode aumentar a incidência de hiperbilirrubinemia. trodução da sonda até a hipofaringe, pois essa manobra induz
a estímulo vagal e espasmo laringe com apneia e bradicardia,
– CAPÍTULO 3 | 3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO –

além de causar atelectasia, trauma na mucosa e dificultar o


início de uma respiração efetiva. é prudente realizar a aspira-
Avaliação do RN na sala de parto
ção de vias aéreas de boca e narinas em RNs sem respiração A avaliação do RN baseia-se na análise da respiração e da frequên-
regular ou hipotônicos, cujo líquido amniótico foi meconial, cia cardíaca (FC) e determina as manobras a serem adotadas durante a
utilizando-se sonda de aspiração no 10. reanimação do RN. A oximetria de pulso será um instrumento desejável
4. Secar e retirar os campos úmidos: em RNs maiores de 1500 principalmente para controle do uso de oxigênio e facilita a avaliação da
g, após a secagem, pode-se usar também a touca de lã ou FC, mas está limitada a condições de bom débito e perfusão periférica
algodão. Os bebês menores de 1500 g ao nascer devem ser normal, como citado no item anterior.
colocados em sacos de polietileno e com touca dupla (plásti- A FC é o principal determinante das decisões durante as manobras
co sobre a fontanela + lã ou algodão), a fim de reduzir o risco de reanimação neonatal. Os métodos de avaliação da sequência cardíaca
de perda de calor e a perda hídrica cutânea. Esses bebês não têm vantagens e desvantagens, que devem ser conhecidas pelo profis-
devem ser secados ao nascer. E, nos bebês menores de 1000 sional de saúde a fim de se obter uma melhor avaliação dos casos em
g, pode-se utilizar o colchão térmico químico, sem realizar atendimento.
secagem da pele.
5. Reposicionar a cabeça em leve extensão: esse passo reforça Métodos de avaliação da FC: palpação do cordão umbilical, ausculta
a necessidade de manter a leve extensão adequada à manu- do precórdio, detecção da FC pela oximetria de pulso e pela atividade
tenção de vias aéreas pérvias após a mobilização do bebê no elétrica do coração por meio do monitor cardíaco.
passo anterior. A SBP orienta que, para avaliação inicial, seja utilizada ausculta do
O tempo máximo para realização destes procedimentos é 30 segun- precórdio com estetoscópio durante um período de 6 segundos, e este
dos. valor é multiplicado por 10 a fim de obter o valor da FC em 1 minuto. A FC
A temperatura corporal à admissão na UTI Neonatal é um forte é considerada adequada quando > 100 bpm e inadequada se < 100 bpm.
preditor de morbidade e mortalidade em todas as idades gestacionais, A palpação do cordão e a ausculta do precórdio subestimam a FC. A
sendo considerada indicador de qualidade de assistência. A presença oximetria de pulso, como já citamos, demora em obter uma medida con-
de temperatura menor do que 36 oC na admissão é fator independente fiável e depende de bom débito cardíaco e perfusão cardíaca adequada. A
de risco por favorecer distúrbios metabólicos, desconforto respiratório, detecção da atividade elétrica do coração pelo monitor cardíaco permite
enterocolite necrotizante e hemorragia intracraniana nos menores de 34 a monitorização mais acurada, rápida e contínua e independe do estado
semanas (Oselka, 2004; Keenan, 2004). do paciente, podendo ser muito útil nos bebês asfixiados com débito
Durante a reanimação neonatal, recomenda-se manter a normoter- cardíaco deficiente e perfusão periférica inadequada.
mia (temperatura axilar de 36,5 oC a 37,5 oC) para o RN desde o nascimento Todos os métodos que subestimam a FC nos primeiros minutos
até a admissão no alojamento conjunto ou nas Unidades Neonatais/UTIs levam a intervenções desnecessárias na sala de parto, e a monitorização
Neonatais. Visando a uma melhor manutenção da normotermia, recomen- cardíaca com três eletrodos é o método mais indicado para condução na
da-se manter a temperatura ambiente de 23 oC a 26 oC, controle de corren- sala de parto.
tes de ar mantendo as portas fechadas e diminuir a circulação de pessoas. Bebês com FC inadequada e/ou que não iniciaram movimentos
respiratórios regulares devem iniciar imediatamente a ventilação
com pressão positiva (VPP), e, de modo simultâneo, o auxiliar instala a
Monitorização do RN na sala de parto oximetria de pulso e a monitorização cardíaca.
Em todo RN menor do que 34 semanas, recomenda-se a oximetria Considera-se respiração adequada quando o RN apresenta movi-
na mão direita de modo simultâneo à realização dos passos iniciais, sendo mentos respiratórios regulares e espontâneos e respiração inadequada 61
item obrigatório no atendimento desses bebês. quando não apresenta movimentos respiratórios (apneia) ou quando
Recém-nascidos que necessitem de ventilação com pressão positi- apresenta movimentos respiratórios irregulares alternados com apneias
va devem estar com monitorização da oximetria da mão direita e da fre- (“gasping”).
quência cardíaca com três eletrodos, da maneira simultânea à realização A oximetria de pulso, como já explicado no item anterior, deve ser
das manobras. sempre na palma da mão ou no pulso radial direito seguindo a sequência:
A oximetria de pulso deve ser colocada no membro superior direito, a) ligar o oxímetro; b) aplicar o sensor neonatal na palma da mão direita ou
porque nesta posição obtemos a saturação de oxigênio pré-ductal, e esta pulso radial direito; e c) conectar o cabo do sensor ao cabo do oxímetro.
é maior do que a pós-ductal, refletindo, portanto, a saturação cerebral. A monitorização cardíaca é obtida por meio da colocação de três
O objetivo da monitorização da oxigenação visa detectar hiperoxia ou eletrodos, fixados com bandagem elástica não adesiva um em cada braço
hipoxia, ambas causas de lesão tecidual. e outro em um dos membros inferiores. Vale ressaltar que a monitorização
Realizam-se os seguintes passos, a fim de se obter leituras mais cardíaca é o objetivo principal e não levará em conta a existência de rit-
rápidas e precisas: mos cardíacos anômalos no tratado eletrocardiográfico.
a. Ligar o oxímetro. Importante lembrar que, após o nascimento, ou seja, desprendi-
b. Aplicar o sensor neonatal na palma da mão direita ou pulso mento completo do produto conceptual do corpo da mãe, o Boletim
radial direito, com o cuidado de que o sensor que emite luz de Apgar calculado no primeiro e no quinto minutos após o nascimento
fique na posição oposta do outro sensor; a fixação pode ser não é utilizado como indicador de manobras de reanimação. É útil para
feita com bandagem elástica não adesiva envolvendo os sen- avaliar a resposta do RN às manobras de reanimação no primeiro e no
sores à mão do bebê. quinto minutos de vida e, se necessário, no décimo, 15º e 20º minutos.
c. Conectar o cabo do sensor ao cabo do oxímetro. De igual modo, o Boletim de Apgar serve como um relatório numérico e
A leitura confiável do oxímetro de pulso ocorre 1 a 2 minutos após muito prático para descrever a condição de nascimento e a recuperação
o nascimento em condições de débito cardíaco e perfusão periférica do RN quando reanimado.
adequadas. Como os passos iniciais são realizados em 30 segundos e o
início da ventilação com pressão positiva deve ser no primeiro minuto de
vida, na maioria das vezes ainda não é possível detectar a saturação de
oxigênio, e ela não é o fator que determina a tomada de decisão durante
a reanimação neonatal inicial.
A saturação-alvo nos primeiros minutos de vida baseia-se nas curvas
estudadas em prematuros que não precisavam de reanimação (quadro 3).
Quadro 3 – Valores de saturação pré-ductais desejáveis, segundo
a idade pós-natal

Minutos de vida SatO2 pré-ductal


Até 5 70-80%
5-10 80-90 %
> 10 85-95%
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

RNs que já receberam cuidados iniciais, foram avaliados e estão de uma fonte externa que permite administrar, além da pressão inflação
com respiração regular, sem desconforto respiratório e FC > 100 bpm máxima, também a pressão positiva no final da expiração.
devem retornar para o contato pele a pele com a mãe, desde que fiquem VPP com CFR – como primeira opção, recomenda-se a aplicação
constantemente sob observação clínica de algum profissional de saúde; da VPP por meio de máscara por se tratar de um método eficiente, mais
exceção a esse procedimento serão os bebês < 34 semanas, que deverão prático e simples do que a intubação traqueal. Dar preferência às máscaras
permanecer em berço aquecido até a internação em Unidades Neonatais de silicone de formato anatômico e/ou com coxim, que melhor se adap-
e/ou UTIs Neonatais. tam à face do RN. Manter à disposição dois tamanhos de máscara: para o
neonato a termo e para o pré-termo.
Líquido amniótico meconial Conectar o CFR à fonte de oxigênio (fluxo de 5-7 l/min.). Em seguida,
aplicar a máscara sobre a face do RN, tomando-se o cuidado de cobrir
A presença de líquido amniótico meconial pode ser indicativo de a boca, o nariz e a ponta do queixo do paciente. Evitar aplicar pressão
algum grau de sofrimento fetal. A equipe de reanimação deve contar com sobre os olhos e o pescoço. Utilizar frequências entre 40-60 mov./min. A
o pediatra para pronto atendimento na sala de parto, e que este seja apto pressão inicial deve ser de 30-40 cmH2O e, em seguida, 15-20 cmH2O para
a realizar intubação traqueal se tal procedimento for necessário. pulmões normais e 20-40 cmH20 para pulmões com complacência baixa.
Independentemente da viscosidade do líquido amniótico, a aspira- É fundamental, durante a ventilação, observar continuamente a expansi-
ção de vias aéreas do RN logo após desprendimento cefálico pelo obstetra bilidade torácica por meio da inspeção e da ausculta. A ventilação efetiva
está contraindicada. deve elevar a caixa torácica em cerca de 0,5-1,0 cm.
Bebês a termo que nascem banhados em mecônio com boa vita- Se não for notada uma expansibilidade torácica adequada, obser-
lidade deverão permanecer no contato pele a pele com a mãe após o var os seguintes quesitos, em sequência, e corrigi-los, se necessário:
clampeamento do cordão. • Adaptação da máscara à face do RN.
Pré-termos tardios e pós-termos, independentemente da vitalidade • Permeabilidade das vias aéreas.
ao nascimento, deverão ser encaminhados à mesa de reanimação para • Se a pressão é suficiente.
62 realização de passos iniciais e avaliação de respiração e FC. O tempo de
clampeamento do cordão obedece às condições de nascimento (boa
vitalidade 1 a 3 minutos e vitalidade ruim, clampeamento imediato).
Oxigênio suplementar
Bebês banhados em mecônio que nascem com vitalidade ruim Quando indicamos VPP para maiores de 34 semanas, pode-se iniciar
(com apneia ou gasping, hipotônico) devem realizar o clampeamento com oxigênio a 21%, que é a concentração do ar ambiente, e, após início
imediato e serem levados à mesa de reanimação, dando início imediato da reanimação com monitorização da oximetria de pulso, pode-se fazer
aos passos iniciais incluindo, obrigatoriamente, a aspiração das vias aéreas os ajustes necessários conforme o quadro 4, que mostra a saturação de
superiores. O2 pré-ductal adequada de acordo com o tempo de vida do RN. Lembrar
que a saturação normal de oxigênio de bebês vigorosos e saudáveis ao
Se, após os cuidados e a avaliação inicial, apresentarem FC >100 nascer situa-se ao redor de 60-65% e só atinge valores 87-92% após o
bpm e respiração regular, retornar para a mãe cobertos com campos quinto minuto de vida.
secos e aquecidos e manter o contato pele a pele. Nos casos de respiração
inadequada e FC < 100 bpm, inicia-se a VPP no primeiro minuto de vida. Em prematuros, ainda não há consenso quanto à quantidade ideal
de O2 para iniciar a reanimação. Entretanto, sabe-se que a hiperoxia gera
A aspiração traqueal sob visualização direta não está indicada de radicais livres que levam à oxidação enzimática, à peroxidação lipídica, à
modo rotineiro no RN banhado em mecônio na sala de parto, sendo esta inibição de síntese de DNA e proteínas, o que acarreta lesões inflamató-
a recomendação oficial da SBP. Embora ainda existam poucas evidências a rias sistêmicas, e o prematuro tem imaturidade do sistema enzimático
respeito, o retardo na reanimação propriamente dita, devido às dificulda- antioxidante. Por outro lado, a FiO2 (Fração Inspirada de Oxigênio) 21%,
des técnicas na intubação, no uso correto do conector de mecônio e na possivelmente, é insuficiente para que esses pacientes atinjam a satura-
repetição da manobra de aspiração traqueal, leva a atraso no início da VPP. ção adequada na transição, podendo causar maior risco de morte e lesão
Além disso, observa-se que, em bebês asfixiados graves, a aspiração de neurológica.
mecônio provavelmente já havia ocorrido intraútero e o retardo no início
de VPP será mais prejudicial do que a não realização da aspiração traqueal Com base nesses princípios, não se recomenda concentrações
sob visualização direta. elevadas de oxigênio (> 65%). Recomenda-se iniciar a reanimação em
prematuros < 34 semanas com FiO2 30% e titular esta oferta após 30
Apesar de necessidade de maior evidência científica a respeito segundos para reavaliação da saturação, realizando incrementos de 20%,
dessa prática, enfatiza-se, atualmente, o início rápido da VPP em todo se necessário, para atingir a saturação esperada para o tempo de vida.
RN banhado em mecônio que não apresenta respiração regular ou está Lembrar sempre do ajuste da técnica de ventilação/CPAP e manutenção
bradicárdico no primeiro minuto de vida. da permeabilidade das vias aéreas, cuja correção, muitas vezes, é o sufi-
ciente para uma melhor oxigenação do paciente.
Ventilação com pressão positiva Quadro 4 - Saturação de oxigênio desejável ao nascer segundo a
idade do RN
A ventilação com pressão positiva ou VPP adequada é o ponto
crítico da reanimação neonatal, pois a insuflação pulmonar favorece a Minutos de vida SatO2 pré-ductal
queda da pressão pulmonar devido à vasodilatação dos vasos pulmona-
res, favorecendo a troca gasosa e o clareamento do líquido pulmonar que Até 5 70 a 80%
preenchia os pulmões na vida intrauterina. Por esse motivo, para bebês 5 a 10 80 a 90%
com respiração inadequada e FC menor de 100 bpm, no primeiro
minuto de vida, indica-se a VPP ou Minuto de Ouro. > 10 85 a 95%
Na Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil de Brasí- Para RNs que recebem VPP e não melhoram, recomenda-se corre-
lia (HMIB/SES-DF), administramos a VPP por meio do CFR, um gerador de ção da técnica de ventilação antes de aumentos na oferta de oxigênio,
pressão baseado no controle de um fluxo contínuo de gases proveniente e precisa-se de um tempo de cerca de 30 segundo para haver equilíbrio
– CAPÍTULO 3 | 3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO –

entre as concentrações de oxigênio do misturador ou blender. Visamos de modo a evitar escapes aéreos; os outros dedos formam a letra “E”, e
sempre à menor concentração possível para manter a saturação adequa- deve-se ter cuidado para não pressionar a laringe.
da de acordo com a idade do RN. É importante manter uma frequência de 40 a 60 ipm, por meio
Após verificação da técnica de VPP, se o RN persiste com saturação da regra mnemônica “aperta-solta-solta, aperta-solta-solta…”. A pressão
inadequada para o tempo de vida, pode ser aumentada a FiO2 e recomen- inspiratória pode ser individualizada, mas, em geral, inicia-se com 20 a 25
dam-se acréscimos de 20 pontos percentuais a cada 30 segundos. cmH2O; não ultrapassar o limite máximo de 30-40 cmH2O – pressões altas
Para os RNs que apresentem saturação acima do recomendado para não excedem esses valores e são usadas para pulmões doentes ou muito
o tempo de vida, pode-se reduzir a FiO2, desde que garantida a técnica imaturos. O fluxo de gases poderá variar de 5 a 15 l/min. A PEEP varia de 4 a
adequada de ventilação. 6 cmH2O (Kattwinked et al., 1999; Dargaville et al., 2001).
Os RNs prematuros (< 34 semanas) que apresentam respiração e FC Após iniciar a VPP, aguarda-se um período de 30 segundos para
adequados, mas evoluam com desconforto respiratório, deverão receber nova avaliação da frequência cardíaca. Se a FC aumentar para > 100 bpm,
CPAP na sala de parto. a VPP poderá ser suspensa. Caso contrário, deverá ser mantida e deve-se
avaliar a técnica de aplicação da VPP: posição cervical em leve extensão,
Já os RNs que permanecem com necessidade de VPP (permane- ajuste da máscara à face, necessidade de aspirar secreções de vias aéreas,
cem bradicárdicos ou apneicos), apesar da técnica adequada de VPP, têm leve abertura da boca, necessidade de aumentar pressões inspiratórias,
indicação de intubação traqueal independentemente da FiO2 utilizada na além da verificação dos equipamentos e dos fluxos de gases. Podemos,
VPP. ainda, aumentar a oferta da fração inspirada de oxigênio se a técnica e os
equipamentos e gases estão sendo usados de maneira adequada, titulan-
Equipamentos para a ventilação mecânica do a oferta de oxigênio à saturação detectada.
Se o RN mantiver bradicardia FC < 100 bpm por mais de 1 minuto
Considerando que a transição para a vida extrauterina depende de e necessidade de manutenção de VPP, indica-se a intubação orotraqueal,
liberação ou clareamento do líquido alveolar, assim como manutenção a fim de que a mudança da interface garanta uma via aérea segura. A VPP
da insuflação pulmonar e vasodilatação das artérias pulmonares para por mais de 1 minuto também indica a inserção de sonda orogástrica para
favorecer uma respiração efetiva, o equipamento ideal para auxílio de RNs diminuir a distensão gástrica. A técnica de medida da sonda orogástrica
que não iniciaram a respiração espontânea de maneira efetiva é aquele considera a distância do lóbulo da orelha-ponta do nariz até metade da
que fornece uma pressão inspiratória confiável e controlada no tempo distância entre apêndice xifoide e coto umbilical (Kattwinked et al., 1999;
e pressão inspiratória final de expiração positiva. Os equipamentos mais Dargaville et al., 2001).
utilizados no Brasil são o balão autoinflável e o ventilador manual mecâ-
nico em T; ambos não atendem a todas as características ideais para o
reanimador de sala de parto. Ventilação com cânula traqueal
O balão autoinflável é um equipamento de baixo custo, fácil aplica- A ventilação com cânula traqueal se processará nos mesmos mol-
ção, que não necessita de fonte de gases para fornecer pressão inspiratória. des da ventilação com máscara, com pressão inspiratória máxima de 20 a
É recomendável estar disponível para uso em todo atendimento em sala 25 cmH2O, PEEP 4 a 6 cmH2O, frequência de 40 a 60 ipm, fluxo de 5 a 15
de parto. Contudo, sua pressão inspiratória é variável, com controle apenas l/min., pressão inspiratória máxima de 30 a 40 cmH2O. A determinação da
da pressão inspiratória máxima por meio da válvula pop-off limitada em fração inspirada de oxigênio será determinada pela oximetria de pulso. A
40 cmH2O, a fim de evitar barotraumas. Outra limitação é que o balão au- FIO2 inicial para bebês maiores de 34 semanas será 21% ou ar ambiente,
toinflável não fornece Pressão Expiratória Final Positiva (PEEP), e o fluxo de e para menores de 34 semanas será 30%, ajustada no misturador de gases
gases não é contínuo, uma vez que só ocorre no momento da insuflação. (blender). 63
Em relação à Fração de Oxigênio fornecida, quando desconectado de fonte
de gases, fornece FiO2 21%; quando conectado à fonte de oxigênio puro, 5 Pode-se realizar incrementos de FiO2 de 20% conforme a oximetria,
l/min. com reservatório fornece FiO2 100%; quando conectado à fonte de desde que a VPP esteja sendo feita na técnica adequada, e aguarda-se 30
oxigênio puro 5 l/min. sem reservatório, essa FiO2 será variável de acordo segundos para verificar se a medida foi eficaz no aumento da SO2. Pa-
com a pressão exercida no balão, o tempo de compressão e a frequência cientes com indicação de massagem cardíaca devem ser ventilados com
aplicada. Pode, ainda, ser conectado ao misturador de gases ou blender, e, cânula e FiO2 de 100% (Kattwinked et al., 1999; Dargaville et al., 2001).
assim, o ajuste será mais adequado e feito pelo misturador. Devemos indicar precisamente a intubação, evitando ser realizada
O ventilador manual em T vem sendo usado, ultimamente, na rea- desnecessariamente por estar associada a várias e sérias complicações.
nimação neonatal, por se tratar de um dispositivo controlado por fluxo Lembrar que apenas um em cada 100 bebês nascidos vivos realmente
e limitado à pressão; ou seja, necessita estar conectado à fonte de gases necessitam ser intubados.
para fornecer as pressões desejadas. Recomenda-se o uso de um mistu- As principais indicações de intubação e ventilação com cânula
rador de gases – blender – conectado a um fluxômetro para escolha do traqueal na sala de parto são:
fluxo adequado (varia de 5 a 15 l/min.) e ligado às fontes de oxigênio e de a. VPP com máscara não efetiva, mesmo após correção de técnica
ar comprimido, com manuseio fácil para escolha da FiO2 mais adequada de aplicação e manutenção de FC < 100 bpm.
para cada caso. b. VPP prolongada, RN mantém FC > 100 bpm, porém não assu-
Em relação às interfaces para aplicação de VPP, utilizamos máscaras me a respiração espontânea.
faciais e tubos endotraqueais. c. RN com hérnia diafragmática que necessita de VPP, o que
As máscaras devem ser, idealmente, de material maleável, transpa- contraindica VPP com máscara.
rente ou semitransparente, com borda acolchoada, com espaço morto < d. RNs que têm indicação de massagem cardíaca devem, primei-
5 ml; existem três tamanhos disponíveis no mercado. A posição de coloca- ramente, ter via aérea segura.
ção da máscara juntamente à escolha do tamanho ideal são importantes Principais complicações do procedimento de intubação são piora
para o sucesso da VPP. O correto posicionamento da máscara será de da hipoxemia, apneia, bradicardia, pneumotórax, laceração de tecidos
modo que cubra a ponta do nariz, a boca e o queixo, e deverá estar bem moles, perfuração de traqueia e esôfago, risco de infecção.
acoplada à face, evitando os escapes, sem excesso de pressão na pele, o Estabelecemos limite de 30 segundos para cada tentativa, que deve
que pode causar traumas. ser registrada por um auxiliar. Se houver insucesso na tentativa, deve-se
As cânulas ou tubos endotraqueais devem ter diâmetro uniforme, retornar à VPP com máscara para nova pré-oxigenação antes da próxima
sem balão (cuff) e com linha radiopaca. De acordo com peso e IG, foram tentativa. Em intubações difíceis, como pacientes com via aérea difícil (por
estimados os diâmetros das canelas e a distância da rima labial para exemplo, Síndrome de Pierre Robin), pode-se recorrer ao uso de máscara
adequado posicionamento acima da carina traqueal (quadros 5 e 6). Por laríngea, que só poderá ser usada em maiores de 2,5 kg.
segurança, orienta-se ter sempre à disposição um diâmetro acima e outro O melhor indicador do bom posicionamento da cânula tra-
inferior ao diâmetro previsto, uma vez que podem existir patologias e/ou queal é o aumento progressivo da FC. Em pacientes bradicárdicos, é
variações anatômicas que não se encaixem nos valores estimados. desejável confirmação da posição da cânula traqueal, idealmente com o
detector colorimétrico de CO2 expirado, colocado entre a cânula traqueal
e o equipamento de ventilação, principalmente em RNs badicárdicos que
Ventilação com máscara não respondem às manobras de reanimação (padrão ouro). Na prática
O início da ventilação deve ser, idealmente, no primeiro minuto habitual, confirma-se a posição da cânula por outros sinais, como inspe-
ção do tórax, que apresenta insuflação adequada; pela ausculta de região
de vida ou Minuto de Ouro, e deve ser iniciada com balão autoinflável e
gástrica (que não deverá ter ruídos de ventilação) e nas regiões axilares an-
máscara ou com ventilador manual em T e máscara, seguindo a técnica
teriores, que apresentam murmúrio vesicular presente e simétrico; saída
de leve extensão cervical e aplicação da máscara com dedos polegar e
de vapor de água através da cânula traqueal. Recomenda-se confirmação
indicador da mão em forma de “C”, com leve pressão sobre a face do bebê,
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

radiológica, quando possível, com a ponta distal da cânula localizada no espontânea ou a saturação permanece abaixo dos valores desejáveis ou
terço médio da traqueia na altura da primeira vértebra torácica. Os qua- está indetectável.
dros 5 e 6 orientam sobre o diâmetro de cânulas e o comprimento a ser Verifica-se a técnica de intubação e se não houve deslocamento da
introduzido em relação à rima labial. Pode-se também usar a regra mate- cânula, a permeabilidade de via aérea, a pressão inspiratória aplicada, o
mática de Tochen “Peso estimado (kg) + 6” para calcular o comprimento correto funcionamento dos equipamentos e o fluxo de gases realizando
a ser introduzido. Para os RNs < 700 g, introduzir 6 cm. as correções necessárias.
Pacientes > 34 semanas que evoluem com FC maior do que 100 Pode-se realizar incrementos na FiO2 de 60% a 100%, mas se o RN
bpm e apresentem-se com respiração espontânea e tônus adequado permanece em apneia ou respiração irregular e/ou FC < 100, manter a VPP
poderão ser extubados na sala de parto e manter vigilância em Unidades com cânula. Se a FC estiver < 60 bpm, iniciar a massagem cardíaca, após
de Cuidados Neonatais, de acordo com o caso. intubação e aumento de FiO2 até 100%.
Considera-se falha da VPP com cânula traqueal se, após 30 segun-
dos, o RN permanece com FC < 100 bpm e não retorna para respiração
Quadro 5 – Material para intubação segundo idade gestacional e peso estimado ao nascer

Idade gestacional (semanas) Peso estimado (gramas) Cânula traqueal (mm) Sonda taqueal (F) Lâmina reta (no)

< 28 semanas < 1000 2,5 6 0.0


28 a 34 semanas 1000 a 2000 3,0 6 ou 8 0
34 a 38 semanas 2000 a 3000 3,5 8 1
> 38 semanas > 3000 3,5 a 4,0 8 1

Quadro 6 – Comprimento da cânula a ser inserida na traqueia segundo idade gestacional

Idade gestacional (semanas) Marca no lábio superior (cm)

23-24 5,5
25-26 6,0
27-29 6,5
30-32 7,0
33-34 7,5

64 35-37 8,0
38-40 8,5
> 40 9,0

tros no Brasil, na Argentina, no Chile e nos Estados Unidos, verificou que


CPAP na sala de parto 220.429 receberam reanimação avançada (74%: intubação intratraqueal;
O uso de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) ajuda a man- 13%: intubação + massagem cardíaca; e 15%: intubação + massagem
ter os pulmões abertos, principalmente pulmões imaturos e com deficiência cardíaca + medicação; houve seis mortes; 0,037% receberam significante
de surfactante pulmonar, e diminui a incidência de dependência de O2 às 36 reanimação e 0,0009% receberam compressões torácicas).
semanas de idade pós-menstrual e a necessidade de ventilação mecânica. Se você estiver fazendo muita massagem cardíaca na sala de
É importante que saibamos que o uso de pressão positiva no final da expi- parto, provavelmente há alguma coisa errada. A massagem cardíaca é
ração (PEEP) possibilita que o pulmão gradualmente se enche de ar e que um procedimento traumático.
permaneça ar no final da expiração. Assim, se não usar PEEP, o líquido está Lembrar que um em cada dez bebês necessita de auxílio para
repreenchendo as vias aéreas no final de cada respiração. É por esta razão ventilação; um em cada 100 precisa de intubação; e um a dois em
que devemos manter o gás no pulmão no final da expiração. cada 1.000 vão necessitar de massagem cardíaca e administração
Recomenda-se o uso de CPAP facial na sala de parto para RNPT < 34 de medicações. Nos últimos casos, a depressão do miocárdio foi tão
semanas com respiração normal, FC > 100 bpm e que apresentem des- intensa que comprometeu o fluxo sanguíneo pulmonar; portanto, está
conforto respiratório e/ou saturação abaixo do esperado para a transição indicada massagem cardíaca associada à ventilação. é importante frisar
normal logo após o nascimento. que, quando se indica massagem cardíaca, o RN deve ser intubado antes
Aplica-se o CPAP na sala de parto por meio do ventilador manual da realização do procedimento e deverá ser ventilado (VPP) com cânula
mecânico em T com máscara acoplada à face do RN, com pressão de 4-5 e FiO2 a 100%, uma vez que, em pacientes asfixiados, a oximetria não
cmH2O e fluxo 5-15 l/min., e a FiO2 deverá seguir a saturação de O2 espe- detecta sinais confiáveis, e a hipoxemia severa e persistente leva a efeitos
rada para o tempo de vida, de acordo com o quadro 4. deletérios, por vezes irreversíveis.
A massagem cardíaca está indicada para RNs que mantêm FC
< 60 bpm, apesar de com ventilação com cânula utilizando técnica
Massagem cardíaca adequada e concentração de O2 60 a 100%.
A asfixia logo ao nascer leva à vasoconstrição periférica, à hipoxe- A técnica de massagem cardíaca recomendada é a compressão do
mia tecidual, à diminuição da contratilidade miocárdica, à bradicardia e, terço inferior do esterno, logo abaixo da linha intermamilar, de profundi-
eventualmente, à parada cardíaca. Na maioria dos pacientes, uma boa dade de cerca de 1/3 do diâmetro ântero-posterior, com a técnica dos dois
ventilação reverte os quadros de asfixia, sendo o ponto crítico da reanima- polegares, que devem estar sobrepostos, de modo a produzir um pulso
ção neonatal. Nos casos em que a bradicardia é revertida pela ventilação, palpável. Estudos demostraram que esta técnica é mais eficaz em relação
o que causou a depressão miocárdica provavelmente foi a hipoxemia a um maior pico de pressão sistêmica e uma maior perfusão coronariana,
associada à acidose. e por ser menos cansativa do que a técnica de dois dedos.
É importante que se saiba que, sempre que expandidos os pulmões Orienta-se que o posicionamento da equipe seja feito da seguinte
sem massagem cardíaca, estes RNs conseguem restabelecer a circulação. forma: o reanimador responsável pela ventilação desloca-se para a lateral
Há um percentual muito pequeno de bebês que necessitam de massa- da mesa de reanimação, e o reanimador responsável pela massagem car-
gem cardíaca na sala de parto: estudo incluindo 58.429 RNs de nove Cen- díaca posiciona-se na cabeceira (cabeça do RN voltada para o reanimador).
– CAPÍTULO 3 | 3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO –

A massagem cardíaca é eficaz quando realizada de modo coor-


denado, mantendo uma relação três massagens para uma ventilação
(3:1), o que deve ser falado em voz alta entre os realizadores a fim de
manter o ritmo sincronizado. Desse modo, obtém-se uma frequência de
90 massagens para 30 ventilações em período de 1 minuto, favorecendo a
expansão pulmonar e a transição circulatória ao nascimento.
O período de aplicação da massagem cardíaca com VPP com cânula
será de, no mínimo, 60 segundos para se avaliar a eficácia da manobra.
Caso ocorra melhora da FC acima de 60 bpm, interrompe-se a massagem
cardíaca e mantém-se a VPP com cânula até a transferência do RN para
uma Unidade de Cuidados Neonatais. Nestes casos, não recomendamos a
extubação na sala de parto, uma vez que o RN passou por um processo de
asfixia grave e as repercussões/complicações a seguir podem necessitar
de via aérea segura. Assim, recomenda-se a transferência para a Unidade
Neonatal intubado e sob VPP.
Em pacientes que apresentam falha no procedimento de massagem
cardíaca e VPP com cânula com FiO2 100% após 60 segundos, mantendo
FC < 60 bpm, deve-se primeiro avaliar as técnicas de massagem cardíaca,
de intubação e permeabilidade de vias aéreas, de equipamentos e de
gases, devendo ser corrigidas. No caso de pacientes que não têm proble-
mas técnicos e mantêm a bradicardia < 60 bpm, sem nenhuma melhora,
considera-se o uso de adrenalina através de veia umbilical.

Uso de medicações
A bradicardia neonatal mantida resulta de hipoxia profunda e insul-
flação pulmonar insuficiente, assim uma ventilação adequada é o passo
Aspectos éticos da assistência ao RN
mais importante para o favorecimento da transição intrauterina. As questões relativas a quando interromper uma reanimação neo-
Para RN que persiste com bradicardia a despeito da técnica correta natal são extremamente controversas e envolvem muitos aspectos sociais,
de massagem cardíaca e ventilação com cânula e O2 a 100%, é indicada de moral, ética, cultura e religião.
realização de cateterismo venoso de urgência com técnica asséptica A primeira questão refere-se a pacientes com malformações
mínima (uso de campos estéreis, troca de luvas estéreis, uso de soluções congênitas letais e potencialmente letais. De preferência, o diagnóstico
tópicas de clorexidina aquosa) e administração de adrenalina endovenosa, antenatal, o diálogo com a família previamente ao parto, bem como o
cuja função é aumentar a pressão de perfusão coronariana por meio da respeito à vontade dos pais, desde que sejam claramente explicados os
vasoconstrição periférica. recursos terapêuticos disponíveis e a limitação da atuação médica no
Quando o cateterismo visar à infusão de drogas na sala de parto, sentido de promover o tratamento da malformação. É fundamental dar
não há necessidade de se medir o cateter, basta introduzi-lo cerca de suporte emocional à família e realizar medidas de conforto que promo-
vam um óbito com respeito e dignidade, deixar claro que podem ter
65
1,5 a 2 cm imediatamente após a passagem pelo anel umbilical, que
o cateter se localizará na própria veia umbilical antes da veia porta. Evitar contato com o bebê, colocá-lo no colo pelo tempo necessário, se este
deixar a ponta do cateter no sistema porta. for o desejo da família. Quando não se tem certeza do diagnóstico, é
prudente realizar todas as manobras de reanimação disponíveis e pro-
A adrenalina deverá estar diluída em concentração de 1:10.000 – 1
mover discussão clínica com vários membros da equipe médica, a fim da
ml da solução 1:1.000 disponível no Brasil para 9 ml de soro fisiológico
melhor decisão e investigação do caso.
(quadro 6). Pode-se administrar uma dose única traqueal 0,5 a 1 ml desta
diluição 1:10.000, que apresenta efeito questionável por ter distribuição Outro ponto controverso refere-se a interrupção da reanimação neo-
errática. A adrenalina endovenosa deverá ser administrada na veia umbi- natal na sala de parto. A presença de assistolia, ou seja, Boletim Apgar zero
lical na diluição de 1:10.000 dose de 0,1 a 0,3 ml/kg seguida de 0,5 a aos 10 minutos de vida, é forte preditor de morbimortalidade neona-
1 ml de SF para lavar o acesso umbilical. Poderão ser repetidas doses tal em todas as idades gestacionais. Entretanto, é importante compar-
de adrenalina 0,3 ml/kg a cada 3 a 5 minutos quando não há reversão da tilhar esta decisão com a equipe de assistência médica e com a família, e
bradicardia. cada caso deverá ser individualizado. As evidências atuais não deixam claro
qual a melhor conduta nos casos em que o paciente apresenta bradicardia
Não se recomenda utilizar adrenalina 1:1.000 em neonatos nem do-
persistente a despeito das manobras de reanimação avançada, quanto tem-
ses mais elevadas porque podem levar à hipertensão severa, à diminuição
po deveríamos manter a reanimação e/ou quais critérios para interrupção.
da função miocárdica e à piora do quadro neurológico.
Na prática médica habitual, orientamos avaliação individualizada dos casos,
Após a segunda dose de adrenalina, pode ser indicado o uso de com discussão em equipe e com a família.
expansor de volume (soro fisiológico), e está indicado principalmente para
Não existe consenso mundial em relação ao limite de viabilidade;
pacientes com suspeita de hipovolemia, quando não houve nenhum au-
contudo, os dados disponíveis mostram que bebês com menos de 23
mento da FC, a despeito de todas as manobras de reanimação realizadas
semanas são imaturos demais para sobreviver mesmo com o acesso à
com técnica correta, ou se há evidência de perda sanguínea no período
tecnologia conhecida até o momento e aos cuidados intensivos neonatais
periparto, ou, ainda, sinais de choque hipovolêmico com palidez, má
em cada unidade, inclusive em centro de excelência mundial.
perfusão e pulsos débeis.
A sobrevivência de RNs prematuros melhorou ao longo das últimas
A infusão de soro fisiológico deve ser lenta, pois a infusão rápida
cinco décadas. A idade gestacional em que pelo menos metade das crian-
pode levar à piora da lesão miocárdica no RN asfixiado. Recomenda-se
ças sobrevive diminuiu de 30 a 31 semanas, nos anos 1960, para 23 a 24
dose de 10 ml/kg de peso estimado ao nascer, em infusão lenta de 5 a
semanas, durante esta década. O aumento da sobrevida destes RNs cada
10 minutos em seringa. Essa dose poderá ser repetida uma segunda vez.
vez menores e vulneráveis representa uma enorme melhoria ocorrida no
Durante todos os procedimentos, lembrar de verificar as técnicas pré-natal e no período perinatal. A estreita colaboração entre a Perinatolo-
das manobras de reanimação, assim como checar os equipamentos e as gia e a Neonatologia e os avanças na compreensão da fisiopatologia fetal
fontes de gases. e neonatal com ênfase no período transicional teve importante papel.
Um dos desafios fundamentais na Medicina Perinatal, a partir de sua
criação, é definir o nível de maturidade, abaixo do qual a sobrevivência
e/ou o aceitável neurodesenvolvimento são extremamente improváveis.
Do ponto de vista ético, cada serviço deve ter o seu limite de via-
bilidade (cada serviço tem que conhecer a sua capacidade de manter
um RN naquelas condições com qualidade de vida). Eticamente, é muito
mais importante dar uma vida digna do que simplesmente salvar a vida.
Portanto, é importante que se estabeleça limite para cada serviço.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

O estudo realizado na Unidade de Neonatologia do HRAS/HMIB/ A decisão quanto à futilidade ou não do tratamento adotado deverá
SES-DF por De Castro, Rugolo e Margotto (2012), ao avaliar a proporção basear-se em discussões entre a equipe profissional e a família.
de sobrevivência por cada semana de idade gestacional, observou que o Para os pacientes que estão na zona cinzenta, é recomendada uma
limite de viabilidade foi de 26 semanas; no entanto, quase metade (45,4%) análise cuidadosa de certos fatores adicionais e constante reavaliação do
dos RNs com 25 semanas sobreviveram até 28 dias, aumentando para 91% efeito do tratamento na sala de parto e, depois, na UTI Neonatal. A atuação
nos RNs de 31 semanas. da Obstetrícia desempenha importante papel na decisão do neonatolo-
gista (consulte o capítulo sobre Limite de Viabilidade).
Limites de viabilidade adotados nas Unidades Neonatais da SES-DF:

Malformações CFR (Continuous Flow Reviver)


Precisamos reconhecer a certeza e as incertezas do nosso diagnós- É um gerador de pressão baseado no controle de um fluxo contínuo
tico. Se tivermos um diagnóstico genético-molecular preciso, podemos de gazes provenientes de uma fonte externa. Usa duas válvulas: uma exa-
agir com base nesta informação, podendo até recomendar a interrupção latória – válvula PEEP (no 3) – e outra limitadora da pressão de insuflação
da gravidez no início do 2º trimestre com estes dados. Não devem ser máxima – válvula PI (no 4).
reanimados os RNs com malformações facilmente reconhecíveis, com A câmara tem, ainda, a via de entrada de gazes (no 1) e a via de saída
desfecho letal ou estado vegetativo em 100% dos casos, e deve-se ter do paciente (no 2). Tem, também, um orifício para se acoplar um monitor
uma confirmação laboratorial. de pressão.
Defeitos estruturais incompatíveis com a vida, segundo Golds- Para regular o equipamento, siga atentamente as instruções abaixo
mith et al. (1996), citado por Marba et al. (2014): (figura 1):
• Hidranencefalia. 1. Conecte o látex proveniente da fonte de gazes na via de en-
66 • Anencefalia-holoprosencefalia. trada – no 1.
• Trissomia do cromossomo 18 2. Conecte o monitor de pressão no orifício correspondente.
• Trissomia do cromossomo 13. 3. Defina, no fluxômetro, o fluxo adequado ao paciente. Sugerimos
• Triploidia. 5 a 7 litros/minuto para recém-nascidos. Pacientes maiores po-
• Agenesia renal bilateral. derão necessitar de fluxos maiores.
• Sirenomelia. 4. Mantenha a via de saída do paciente – no 2 – ocluída durante
• Síndromes de nanismo – membros curtos: todo o processo de regulagem das duas válvulas.
» Acondrogênese tipos 1A e 1B. 5. Regule a PEEP rosqueando para um lado ou para o outro a
» Acondrogênese-hipocondrogênese tipo II. tampa da válvula exalatória – no 3.
» Fibrocondrogênese. 6. Para regulagem da pressão de insuflação máxima, mantenha
» Atelosteogênese. o botão da válvula no 3 pressionado, pois isso fará com que a
» Síndrome de polidactilia com costela curta, tipo Saldino- única via de saída possível seja por meio da válvula reguladora
-Noonan. de pressão máxima. Regule, então, esta pressão, girando o bo-
» Displasia tanatofórica. tão desta válvula para um lado ou para o outro. Cicle algumas
» Osteogênese imperfeita tipo II. vezes pressionando e soltando o botão da válvula exalatória,
• Síndromes complexas: certificando-se de que ambas as pressões – PI e PEEP – estão
» Síndrome do pterígio múltiplo letal. nos níveis desejados; volte a manter pressionado o botão da
» Síndrome de Neu-Laxova. válvula exalatória e rosqueie o anel fixador – no 5 – de en-
» Síndrome de Meckel-Gruber. contro à tampa da válvula no 4, de sorte a fixar pressão nos
É importante que seja dado ao RN o benefício da dúvida, pois a sala níveis desejados. Algumas vezes, este movimento provocará
de parto é o local mais inadequado para se decidir, devido à dificuldade alterações nos níveis pressóricos; se necessário, regule nova-
da realização de um cuidadoso exame físico no espaço curto de tempo mente. Entenda que, com o passar do tempo, o processo de
disponível para a tomada de decisão. Tão logo o RN esteja estabilizado na regulagem não despenderá mais que 30 segundos.
UTI Neonatal, o exame cuidadoso possibilitará identificar o distúrbio e os 7. Conseguidas as pressões, normalmente não haverá necessida-
defeitos estruturais. Iniciar a reanimação nestes casos não significa que é de de novas regulagens, exceto se houver alterações no fluxo.
mandatória a manutenção do suporte. Aos pais, devemos oferecer fortes 8. Conecte o equipamento ao paciente através de máscara facial
argumentos relacionados à condição letal da criança. ou através da conexão da cânula endotraqueal, se este estiver
Nenhum RN deve ir a óbito no leito. Quando o suporte médico for intubado.
interrompido ou a morte for inevitável, um tempo deve ser dados aos pais 9. Cicle o aparelho pressionando o botão da válvula exalatória de
e aos demais membros da família para tocar o bebê, levá-lo aos braços e modo intermitente. Os tempos inspiratório e expiratório serão
interagir com ele, se assim for o desejo da família. A família deve ser tratada definidos pelo médico durante a assistência.
sempre com dignidade.
– CAPÍTULO 3 | 3.1. ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO NA SALA DE PARTO –

Figura 1 – O CFR

Legenda: O ponto A é o local de inserção da mangueira com gases aferentes. O ponto B corresponde à válvula reguladora do pico de pressão inspiratória. O ponto C corresponde à válvula exalatória, que
permite a definição de pressão positiva ao final da expiração e acionamento da ciclagem. Não demonstrado, há um ponto para a conexão do manômetro que acompanha o equipamento.

Anexo 1

67
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.2. EXAME FÍSICO NEONATAL


Fabiana Moreira Pontes

Antes de recepcionar o recém-nascido (RN) na sala de parto, o


médico neonatologista deve levantar a história materna para avaliar os O exame físico
riscos tanto da mãe quanto do feto e, sempre que possível, acompanhar Providenciar iluminação e aquecimento adequados. Inspecionar
sua evolução, estando atento às manobras obstétricas e ao uso de me- cuidadosamente o RN, avaliando: estado geral, fácies, atitude espontânea,
dicamentos, oferecendo apoio emocional e efetivo à parturiente e seus reatividade, postura, malformações grosseiras e choro.
familiares, se presentes na sala de parto.
Atenção especial para o padrão respiratório: ritmo, profundidade,
Logo após a assistência imediata (vide capítulo Recepção do Recém- utilização de músculos acessórios (tiragens), batimento de asa de nariz
-Nascido), o neonato deverá ser mantido em ambiente aquecido até a (BAN), sons emitidos (gemência). Caso necessário, determinar o Boletim
estabilização da temperatura. Diminuir ao máximo possível a separação de Silverman-Andersen (descrito adiante).
mãe-filho, liberando o RN para o alojamento conjunto tão logo as condi-
Aferir os sinais vitais: temperatura, frequência cardíaca, respiratória e
ções clínicas permitam. O objetivo é que o bebê seja encaminhado da sala
pressão arterial, com manguito adequado.
de parto para o quarto, com a mãe.
Neste período inicial, observar rigorosamente o neonato (ritmo res-
piratório, palidez, cianose, tremores, gemidos, hipo ou hipertonia, malfor- Pele
mações, tipo de choro etc.). O médico avalia a idade gestacional, classifica
o RN e a placenta, estimando o risco para patologias – monitorização da Sempre que possível, realizar o exame da pele sob luz natural. Ob-
glicemia com fitas reagentes para RN Pequenos para a Idade Gestacional servar textura, presença de cianose ou icterícia (zonas de Kramer), palidez,
(PIGs) e Grandes para a Idade Gestacional (GIGs), sorologia para infecção pletora (pele rosada, policitemia, hematócrito elevado). Os principais
congênita, entre outros. achados são:
Confirmar a aplicação de 1 mg IM de vitamina K1 (Kanakion) para • Descamação fisiológica em pós-maturos (pés e mãos) e esca-
prevenção da doença hemorrágica do RN, nitrato de prata 1% (uma gota mas endurecidas na ictiose congênita.
em cada um dos olhos) para prevenção da oftalmia gonocócica na sala de • Epidermólise bolhosa: doença genética que determina a for-
parto e vacina para prevenção da hepatite pelo vírus B (Engerix BÒ 0,5 ml mação de bolhas disseminadas, que se originam a partir de
IM), logo após. qualquer lesão por pressão.
• Eritema tóxico: rash cutâneo com lesões eritemato-papulosas;
Fazer o exame físico completo após o nascimento, objetivando: regride espontaneamente.
• Detectar anormalidades anatômicas. • Escleredema: edema endurecido, mais frequentemente ob-
• Determinar o estado de saúde do RN e avaliar riscos. servado em infecções neonatais graves e cardiopatias com
• Avaliar a adaptação do RN à vida extrauterina. débito cardíaco diminuído. Não depressível.
• Hemangioma: manchas vermelho-violáceas mais comumente
observadas na nuca, na região frontal e nas pálpebras superio-
Histórico materno res. Desaparecem em alguns meses. Com o desenvolvimento,
68 Gestações e paridade, antecedentes maternos (uso de drogas ilí- a pele torna-se espessa, opaca e queratinizada. Avalia-se a
citas, tabagismo, álcool, cirurgias, doenças crônicas, medicamentos etc.), visibilidade dos vasos e sulcos.
informações sobre gestações anteriores, abortos, ocorrências no pré-natal. • Lanugem: são pêlos finos sobre o corpo, estão em menor
proporção em região de atrito. Surgem por volta da 19ª a 20ª
semanas e têm máxima aparição entre a 27ª e a 28ª semanas
Histórico familiar de vida intrauterina.
• Linfomas císticos: presentes em qualquer parte do corpo.
Enfermidades atuais e significativas em membros da família, con-
• Milium sebáceo: pontos claros na face, especialmente no
sanguinidade, malformações.
nariz, devido à hiperplasia de glândulas sebáceas.
• Nevus pigmentosus (mancha mongólica): assemelha-se à pe-
Histórico neonatal quena equimose. Mais comum na região sacra. Desaparece na
segunda infância.
Ocorrências no pré-parto e na sala de parto, Boletim Apgar, necessi- • Petéquias e púrpuras: não desaparecem na digitopressão. São
dade de reanimação, amamentação. de etiologia mecânica (tocotraumatismo), fragilidade capilar
(infecção) e plaquetopenia. Localização no pescoço e na ca-
beça não tem grandes repercussões; em tronco e membros,
Placenta deve-se investigar a causa.
Peso, coloração, odor, relação do peso da placenta com o peso • Superfície plantar: avaliam-se as rugas que se dirigem dos
do RN (classificação da placenta e do RN com as respectivas curvas – dedos para o calcanhar. Quando há oligoidrâmnio, apresen-
consultar o capítulo Classificação do Recém-Nascido), avaliar o cordão tam-se acentuadas.
umbilical (presença de duas artérias e uma veia).
Crânio
Avaliação da idade gestacional Sua circunferência varia entre 32 e 36 cm (vide gráfico no capítulo
Classificação do Recém-nascido); observa-se a simetria do crânio na pal-
Consultar o capítulo correspondente. pação, se há cavalgamento de suturas (sagital, coronárias, bregmáticas
e lambdoide) e se há fechamento precoce das fontanelas anterior e
posterior, as únicas com possibilidade de serem palpáveis. Um perímetro
Medidas antropométricas cefálico acima do percentil 90 indica macrocrania, em que as causas fre-
Aferir o peso, em balança digital, e o comprimento com RN deita- quentes são a hidrocefalia e a megalencefalia. O perímetro cefálico abaixo
do sobre superfície firme, utilizando a régua/toesa móvel, com joelhos do percentil 10 indica microcrania, que pode estar presente em malforma-
estendidos. Mensurar a circunferência torácica, tomando os mamilos ções cromossômicas, defeitos de migração neuronal e agenesias.
como ponto de referência e a circunferência abdominal à altura do coto Outras alterações observadas no exame do crânio são:
umbilical.
• Craniossinostose: fechamento precoce das suturas cranianas
Medir o perímetro cefálico em sua maior circunferência (região geralmente isoladas ou em associações variáveis. Observam-
frontal e occipital, passando por cima das orelhas). É cerca de 2 cm maior -se assimetrias cranianas e as linhas de suturas bem visíveis
na apresentação pélvica. Até 32 semanas, é maior que a circunferência ou palpáveis. São: escafocefalia, turrincefalia, braquicefalia e
abdominal; de 32 a 36 semanas, aproximadamente igual; e, após 36 se- plagiocefalia.
manas, menor. • Cefalohematoma: coleção sanguínea subperiostal, de consis-
O perímetro cefálico é sempre maior que o torácico, em cerca tência endurecida, delimitada pelas linhas de suturas crania-
de 3 cm, nos primeiros meses de vida.
– CAPÍTULO 3 | 3.2. EXAME FÍSICO NEONATAL –

nas, que ocorrem após um parto traumático, e desaparecem • Teratoma cervical: grande tumoração na porção mediana do
em meses, de localização geralmente parietal. pescoço. Possibilidade para malignização. Pode causar obs-
• Bossa serossanguínea (ou caput succedaneum): coleção de trução respiratória.
líquido e sangue no subcutâneo, não respeitam as linhas de • Higroma cístico: tumoração cística de tamanho variado, com
sutura, de limites imprecisos, cacifo positivo, e que involuem rápido crescimento, invadindo o assoalho da boca, o mediasti-
em dias. no e as axilas; também pode obstruir a respiração.
• Craniotabes: diminuição da consistência dos ossos do crânio. • Bócio congênito: de causa idiopática ou ocasionada por in-
A palpação assemelha-se à compressão de uma bola de pin- gesta materna de iodo na gestação. Consistência elástica em
g-pong. forma de colar cervical, pouco móvel.
• Sopros intracranianos audíveis com o estetoscópio: são raros
no RN, geralmente associados a sinais de insuficiência cardía-
ca. Se presentes, sugerem fístulas arteriovenosas ou aneurisma
Tórax
da veia de Galeno. O perímetro torácico em RN a termo é, em média, de 2 cm menor
• Encefalocele: tumoração sob a pele que representa a exterio- que o cefálico, como descrito anteriormente. Observar sua simetria, forma-
rização de tecido nervoso por defeitos nas linhas de sutura to (geralmente arredondado) proeminência ou afundamento esternal; sua
dos ossos do crânio, com dimensões variáveis. Mais comuns maior dimensão é a ântero-posterior.
na região occipital, e, depois, na região frontal e na fossa nasal.
Respiração predominantemente abdominal, com frequência em
O neonato possui seis fontanelas, que são espaços entre os ossos do
torno de 40-60 movimentos por minuto.
crânio ocupados por membrana. Se abauladas, indicam a possibilidade da
ocorrência de meningite, hidrocefalia, hemorragia intracraniana, hiper-hi- Discretas retrações sub e intercostais são comuns em RNs sadios
dratação, edema cerebral, insuficiência cardíaca. Ou se deprimem como pela elasticidade das paredes torácicas. Retrações supraclaviculares são
na desidratação. Duas delas são facilmente palpáveis: sempre patológicas.
• Bregmática ou anterior, situada na porção central e alta do crâ-
nio, de formato losangular, medindo cerca de 2-3 cm (variação Clavículas
entre 1 e 5); fecha-se, por aproximação dos ossos, em torno dos
18 meses de vida. Atentar para a ausência de clavículas (aplasia clavicular), disostose
• Posterior ou lambdoide, situada na linha média posterior, de cleidocraniana (cleidocraniodisostose – doença autossômica dominante,
formato triangular, medindo 0,5 cm; fecha-se aos 2 meses. caracterizada por aplasia clavicular, atraso no fechamento de fontanelas,
atraso na ossificação, alteração na dentição etc.), ou fraturas (a maioria do
tipo galho-verde, que podem causar pseudoparalisia do plexo braquial). A
Face conduta é conservadora (não requer imobilização, atadura), a não ser nos
Observar simetria, aparência sindrômica, implantação das orelhas, casos de fratura completa, com diminuição ou ausência de movimenta-
distância entre os olhos (hiper ou hipotelorismo – aumento ou diminuição ção do braço no lado afetado.
da distância), tamanho do queixo (micrognatia: diminuição da mandíbula
inferior, que pode afetar a amamentação), nariz e língua.
Mamas
Olhos:
Verificar assimetria, distância intermamilar (característica de algu-
Abrir as pálpebras, observar pregas epicânticas, verificar o reflexo
mas doenças genéticas), presença de mamilos extranumerários. 69
pupilar e vermelho normal usando oftalmoscópio, hemorragia subcon-
juntival, estrabismo (frequente no RN), pupila branca (catarata congênita, Ao nascer, é comum o aumento das glândulas mamárias com a
retinoblastoma, fibroplasia retrolental), opacificação da córnea (glaucoma secreção leitosa ou sanguinolenta.
congênito, rubéola congênita, ruptura da membrana de Descemet,
secreção ocular: se até 48 horas frequente devido à credeização; após,
considerar hipótese de infecção). Avaliar icterícia. Exame cardiovascular
• Hipertelorismo: aumento da distância entre os olhos e achata- Inspeção: cianose, padrão respiratório (taquipneia, dispénia, am-
mento da base nasal; presente em malformações. plitude respiratória, BAN), abaulamento precordial, turgência jugular,
• Enoftalmia; depressão dos olhos (encovados). ictus cordis (mais propulsivo em sobrecarga de volume e persistência
• Exoftalmia: olhos salientes. do ducto ou canal arterial – PDA ou PCA).
Orelhas: Palpação: realizar palpação de pulsos nos quatro membros,
Forma, tamanho, implantação (na mesma linha dos olhos), testar comparando-os (sincronia, ritmo e intensidade):
reação a ruídos e confirmar aplicação de testes preconizados para identi- A presença de pulsos simétricos descarta presença de Coarctação de
ficar surdez neonatal; apêndices pré-auriculares. Alterações na forma e na Aorta (CoAo), cardiopatia congênita ocasionada por estreitamento daquele
implantação da orelha relacionam-se à agenesia renal. vaso, geralmente na porção descendente, possibilitando fluxo aumentado para
Nariz: cérebro e braços (carótida e subclávias) e fluxo diminuído para coxas e pernas.
Avaliar forma, tamanho, testar permeabilidade obstruindo uma nari- Palpação do precórdio, verificando posição do ictus (entre o terceiro
na de cada vez, canal nasolacrimal, secreção nasal (se serossanguinolenta, e o quarto espaço intercostal esquerdo), sua impulsividade, presença de
pesquisar sífilis congênita). frêmitos. Frequência cardíaca entre 120-160 batimentos por minuto.
Boca: Pressão arterial (PA): deve ser realizada rotineiramente em
Examinar coloração dos lábios e língua, presença de fissura labial braço e perna direitos, preferencialmente com bebê tranquilo, sem
e fenda palatina (visualização e palpação do palato duro), dentes congê- choro:
nitos, rânula (tumoração cística no assoalho da boca, sem indicação de Utilizar manguito apropriado, neonatal, com cerca de 2-3,5 cm
exerese e imediata), pérolas de Epstein (pontos brancos no palato), úvula de largura. A escolha deve ser realizada após mensuração do perímetro
bífida. braquial. A largura do manguito ideal corresponde a 40% desta medida
A posição da mandíbula (retrognatia) e o arqueamento do palato (exemplo: circunferência de 6 cm x 40% = manguito com largura de ~2,4).
(ogival) dependem da não atividade motora na vida intrauterina da O valor normal da PA sistólica e diastólica, em RN a termo, é de
língua contra o palato e o relaxamento da mandíbula. 75-80x50-55 mmHg, e, em RN prematuro, 50-60x30-40 mmHg. Conside-
ramos o valor normal da pressão arterial média quando maior ou igual
à idade gestacional. Valores convergentes, estreitados, significam falência
Pescoço miocárdica ou colapso vascular; valores divergentes, alargados, indicam
malformação arteriovenosa, truncus arteriosus, PCA. Aguardar queda da
Pesquisar massas, fístulas, mobilidade, excesso de pele.
pressão arterial pulmonar para avaliação.
• Torcicolo congênito: contratura do músculo esternocleidomas-
Ausculta:
toideo na segunda semana de vida. Resolução espontânea na
maioria dos casos, podendo evoluir para assimetria facial e posi- Identificar B1:
ção viciosa da cabeça. • Bordo esternal esquerdo superior (BEE). Definir sua intensida-
de e presença de desdobramento (anomalia de Ebstein). Sua
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

intensidade diminui na insuficiência cardíaca congestiva (ICC) É patológico após a fase de transição. Audível em dilatações de
e condução atrioventricular prolongada. grandes vasos: truncus arteriosus, T4F, obstrução na saída do ventrículo
• Bordo esternal esquerdo inferior. Aumenta de intensidade esquerdo ou direito (VD).
com o aumento de fluxo pela valva atrioventricular, em pre- Sopro:
sença de PCA, insuficiência mitral, retorno venoso pulmonar
totalmente anômalo (RVPTA) etc. Identificar como sendo sistólico, diastólico ou contínuo. Quanti-
Identificar B2: ficar de 1+ a 6+, de acordo com sua intensidade. Identificar se é proto,
meso, telessistólico ou diastólico.
• No bordo esternal esquerdo superior. Hiperfonese sugere
hipertensão arterial sistêmica ou pulmonar. Desdobramento Quanto ao timbre, observar se é suave, rude ou aspirativo.
amplo, pensar em estenose pulmonar, anomalia de Ebstein, Poderão estar ausentes ao nascimento mesmo em cardiopatias
RVPTA e Tetralogia de Fallot (T4F). graves; 60% dos RNs normais terão sopro nas primeiras 48 horas de vida,
Identificar B3 e B4: em decorrência do fechamento do ducto arterial e do forame oval.
• Na base ou ápice. B3 surge com o aumento de fluxo pelas val-
vas átrioventriculares, PCA e ICC. B4 surge em miocardiopatias
com menor elasticidade do ventrículo esquerdo (VE).
Exame pulmonar
Estalido: Inspeção: avaliar o padrão respiratório quanto à frequência, à am-
plitude dos movimentos, à presença de tiragens e retração xifoidiana, aos
batimentos de asas do nariz, a estridor expiratório, a gemido. Utilizar o
Boletim de Silverman-Andersen (quadro 1).
Quadro 1 – Boletim de Silverman-Andersen adaptado

Parâmetros 0 1 2

Gemência Ausente Audível com esteto Audível sem esteto

Batimento de asa de nariz Ausente Discreto Acentuado

Tiragem costal 3 últimas intercostais + de 3 intercostais


Ausente
inferior Leve Intensa

Retração esternal/xifoide Ausente Discreta Acentuada

Ausente/ Discreto/ Acentuado/


Movimento de tórax e abdome
sincronismo declínio inspiratório Balancim

70 Valores entre 1-5 indicam desconforto respiratório moderado e, O coto umbilical deve ser cuidadosamente avaliado, em busca de
acima de 6, grave. exsudato purulento e, posteriormente, granuloma.
O sinal da “dançarina do ventre” avalia a presença de paralisia dia- Ausculta:
fragmática unilateral. Pode ser investigado na expiração completa, onde Procurar ruídos hidroaéreos, nos quatro quadrantes. Sua ausência é
o umbigo toca uma caneta situada sobre ele. Na inspiração, o umbigo se significativa para íleo paralítico.
deslocará para cima e para o lado paralisado.
Palpação:
Ausculta:
Verificar diástase de músculos reto-abdominais (separação habitual
Realizada com estetoscópio neonatal, com campânula e diafragma. da musculatura, na linha média; desaparece no primeiro ano de vida),
Deve ser bilateral e comparativa. Auscultar as regiões axilares. Avaliar a presença de ascite, aumento no fígado (normal se em torno de 2 cm do
presença de creptos, sibilos, roncos e diminuição do murmúrio vesicular. rebordo costal), baço, rins, bexiga.
A palpação para checar a expansibilidade e a distensibilidade torá- São três as principais causas de distensão abdominal no RN: ascite,
cicas também é realizada. Registrar a frequência ventilatória, que gira em visceromegalias e distensão gasosa.
torno de 40-60 movimentos por minuto.
Pesquisar massas abdominais; cerca de metade são de origem
A percussão nos espaços intercostais identifica o som claro pulmo- genitourinárias. Nos rins, massas palpáveis podem sugerir hidronefrose,
nar. nefroblastoma, cisto solitário, rins policísticos e trombose de veia renal. No
fígado, hematoma, hemangioma, cisto hepático, de colédoco, de ovário.
No trato gastrointestinal, duplicação de duodeno, de jejuno, ou de íleo,
Abdome volvo, teratoma e neuroblastoma.
Inspeção: Para palpação de rins: colocar o RN em posição semissentada e com
Observar a forma do abdome: geralmente globoso; pode apre- a outra mão palpar o hipocôndrio, estendendo o polegar anteriormente
sentar-se escavado (hérnia diafragmática, urgência cirúrgica), com e os dedos na face posterior; elevar os membros inferiores do bebê com
abaulamento supraumbilical (atresia duodenal ou distensão gástrica), a mão esquerda e, com a direita, palpar o hipocôndrio realizando movi-
abaulamento infraumbilical (distensão de bexiga e graves retardos de mentos de báscula.
crescimento intrauterino), presença de circulação colateral e ondas peris-
tálticas.
Pesquisar presença de hérnias umbilicais e inguinais. As hérnias um-
Genitália masculina
bilicais são frequentes em bebês com peso inferior a 2.500 g, em meninas Observar comprimento do pênis (normal maior do que 3 cm),
e em negros; podem variar entre 1 e 5 cm; em geral, desaparecem antes posição do orifício uretral centralizado na glande (hipospádia, epispádia),
dos 4 anos; a herniorrafia pode ser indicada em situações específicas. fimose (aderência do prepúcio à glande), posição dos testículos na bolsa
Em neonatos, especialmente os prematuros, a herniação intestinal escrotal (criptorquidia: testículos locados fora da bolsa: canal inguinal,
para a região inguinal pode levar ao encarceramento, sendo necessária a abdome), presença de hérnia escrotal.
avaliação da equipe cirúrgica. A hidrocele escrotal (acúmulo de líquido em volume anormal) pode
O neonato pode apresentar malformações do tipo onfalocele (defeito ser identificada pela técnica da transiluminação, que consiste em escure-
da parede abdominal com exteriorização de vísceras recobertas por âmnio, cer o ambiente e aproximar uma lanterna da região escrotal, que ficará
cordão e peritônio parietal) e gastrosquise (defeito da parede abdominal translúcida. A descida testicular para a bolsa escrotal ocorre por volta do
com exteriorização e exposição de alças e vísceras, à direita do cordão um- 3º trimestre, e a bolsa escrotal se toma mais enrrugada próximo ao termo.
bilical) evidentes na ultrassonografia, durante a gestação.
– CAPÍTULO 3 | 3.2. EXAME FÍSICO NEONATAL –

Genitália feminina b. Paralisia inferior ou Klumpke (C8 a T1), onde o braço está adu-
zido e o antebraço e a mão em supinação, preensão palmar
Tamanho do clitóris, fusão dos grandes lábios (sinéquia labial), ausente e reflexos bicipital e triceptal presentes.
posicionamento do orifício da vagina e da uretra, distância anovulvar e c. Paralisia total: braço imóvel, flácido, sem reflexos.
fístulas. Praticamente todas as RNs apresentam excesso de tecido himenal Paralisia em membros inferiores é rara e se deve a tocotraumatismos
ao nascimento, que desaparece em semanas. graves ou anomalia congênita da medula espinhal.
O tamanho final do clítoris é adquirido bem antes da deposição • Artrogripose (imobilidade articular): pode ser congênita,
de gordura nas estruturas vizinhas, e, por isso, aparenta-se falsamente devido a deficit musculares e à compressão fetal por oligoi-
hipertrofiado. drâmnio; os distúrbios neurológicos parecem ser uma causa
Genitália externa com morfologia suspeita (genitália ambígua) ne- comum, entre eles a meningomielocele, a deficiência das cé-
cessita de investigação com ultrassonografia, genótipo etc. lulas motoras da medula anterior, a espasticidade pré-natal, a
anencefalia, a hidranencefalia e a holoprosencefalia. Levantar,
• Hipospádia: meato uretral na face períneo-escrotal do pênis; na história, presença de movimentos fetais e o oligoidrâmnio.
excesso de pele dorsal. Associa-se a alterações dos testículos • Pé torto congênito: é a anomalia congênita de membros
como criptorquidia. inferiores mais comum. Diferenciar entre pé torto congênito
• Epispádia: falha no fechamento da uretra na parede dorsal. e posicional.
Pode acometer toda a uretra, inclusive com extrofia vesical. • Prega palmar única: uni ou bilateral, está presente em 2,5% dos
• Ectopia testicular: 5% dos RNs apresentam testículos não pal- nascimentos normais.
páveis ao nascimento. Verificar os canais inguinais. • Osteocondrodisplasia: evidente encurtamento dos membros
• Imperfuração himenal: pode levar à retenção de secreções (nanismo distrófico).
uterinas e vaginais e causar abaulamento himenal, e, às vezes, • Displasia congênita de quadril (ou luxação congênita do qua-
retenção urinária por compressão extrínseca. dril): o diagnóstico deve ser o mais precoce possível, devido à
• Anomalias anorretais: estenose anal, ânus perineal anterior, boa resposta ao tratamento. Pesquisá-lo em todas as oportu-
fístula anocutânea, ânus vulvar, fístula anovulvar, fístula ano- nidades do exame físico do RN, pois poderá estar ausente em
vestibular, fístula retrovestibular, atresia retal, imperfuração alguns momentos. Verificar simetria das pregas cutâneas. Se
anal, estenose anal membranosa. necessário, radiografar. É mais frequente em meninas.
• As manobras de Ortolani e de Barlow identificam anomalias
Coluna no quadril:
• Manobra de Ortolani: realizada com o bebê em decúbito
Coloca-se o RN em decúbito ventral, inspeciona-se e palpa-se a re- dorsal; mobilizar as articulações coxofemorais, em rotação,
gião da coluna vertebral. Procura-se desvios, tumorações e malformações aduzindo e abduzindo-as, com os joelhos em flexão. O sinal é
ósseas, presença de tufos de pelos, hemangiomas e manchas hipercrô- positivo quando se percebe o deslocamento da articulação e
micas. um “click” com os movimentos.
• Espinha bífida: falha no fechamento dos ossos, principalmente • Manobra de Barlow: flexionar joelhos e quadris. Segurar per-
da coluna lombossacra. Podemos observar a exposição do nas e coxas com as mãos colocando o dedo médio sobre o
tecido nervoso. Pode se apresentar de duas formas: meningo- grande trocanter e o polegar na parte interna da coxa, man-
cele e mielomeningocele. ter as articulações em abdução média, pressionar o grande
• Meningocele: lesão cística composta por líquor, meninges e trocanter. Observar o deslocamento da articulação. Depois,
pele. Causas maternas: deficiência de ácido fólico e uso de aplicar força contrária e observar deslocamento da cabeça 71
álcool. do fêmur.
• Mielomeningocele: lesão da linha média contendo líquor, me-
ninges e elementos da medula. Pode ser aberta ou rota onde
o tecido nervoso está; e exposta ou fechada, quando o tecido
Mecônio e urina
nervoso está recoberto pelas membranas meníngeas ou pele. Aproximadamente 99% dos RNs urinam nas primeiras 48 horas de
Neste caso, avalia-se a sensibilidade e a motricidade de mem- vida, sendo que 23% o fazem na sala de parto. O volume urinário nas
bros inferiores, que, além de alteradas, na dependência da al- primeiras 24 horas de vida é de cerca de 15 ml.
tura da mielomeningocele podem apresentar vários graus de As causas mais comuns de incapacidade de urinar no primeiro dia
distrofias e posturas típicas dos membros inferiores. O controle de vida são: prepúcio imperfurado, estenose de uretra, valva de uretra pos-
esfincteriano deve ser avaliado estimulando-se a região peria- terior, bexiga neurogênica, ureterocele, tumores renais, rins multicísticos,
nal e a musculatura controlada pelo nervo pudendo. Fossetas hipovolemia, baixa ingesta líquida, agenesia renal bilateral (Síndrome de
ou hipertricose podem indicar espinha bífida oculta, em que Potter), necrose tubular (secundária à hipóxia), trombose de veia renal,
algumas vértebras estão ausentes, mas o tecido nervoso está síndrome nefrótica congênita e pielonefrite congênita.
protegido.
• Teratoma sacrococcígeo: tumoração arredondada, de tama- A primeira evacuação, em 90% das vezes, também ocorre nas pri-
nho variado, podendo ser gigante. Pele que o recobre é, em meiras 24 horas de vida, sob a forma de mecônio, que são fezes escuras,
geral, íntegra. Passível de malignização. preto-esverdeadas, pegajosas, presentes nos primeiros dias, compostas
por muco, bile, líquido amniótico, lanugo. Causas de atraso na eliminação
são: obstrução intestinal, mucoviscidose, hipermagnesemia, doença de
Membros superiores Hirschsprung/megacólon congênito (denervação do cólon, em decorrên-
Examinar com o RN em decúbito dorsal. Verificar simetria e propor- cia da falha de migração crânio-podálica da crista neural do nervo vago,
ções do braço e antibraço, examinar articulações à procura de luxações, prejudicando o peristaltismo, com consequente constipação).
palpar ombros à procura de fraturas na clavícula, por tocotraumatismo.
As paralisias braquiais são divididas em três tipos: Exame neurológico
a. Paralisia alta ou Erb-Duchenne (C5 a C7), onde o braço per- Consulte o capítulo sobre Exame Neurológico do Recém-nascido.
manece em adução (junto ao corpo) e rotação interna com
punho levemente desviado para fora. Força do braço e reflexo
de preensão palmar preservados.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.3. AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA DO RECÉM-NASCIDO


Sergio Henrique Veiga

Para a avaliação neurológica do recém-nascido (RN) e lactentes, as parte do SNC. Ou resultar de agressões agudas ou crônicas,
seguintes condições são necessárias: como: defeitos de multiplicação, migração e organização de
Local do exame: ambiente tranquilo, iluminação moderada (muito neurônios, neuroinfecções, quadros metabólicos e síndrome
clara pode irritar o bebe; se escura, perdemos a observação da ectoscopia). hipóxico-isquêmica.
A temperatura da sala deve estar entre 24 ºC e 27 ºC. ser entre mamadas. Assimetrias cranianas: cranioestenoses (craniossinostoses) e pla-
Despir o RN gradualmente, evitando reações indesejadas, como o choro e giocefalia posicional:
a regurgitação. Realizar as manobras de forma gentil e suave. • Craniossinostoses: fechamento precoce das suturas crania-
Devemos observar o ciclo de sono e vigília do recém nascido para nas geralmente isoladas ou em associações variáveis. Obser-
estabelecer o melhor momento para realizar seu exame neurologico. vam-se assimetrias cranianas e as linhas de suturas visíveis ou
Baseando-se nos trabalhos de Prechtl desde a década de 1960 o bebê palpáveis. Ocorre parada de crescimento na direção perpendi-
pode ser encontrado em um de 5 estados comportamentais (Diament cular a sutura comprometida, e um crescimento longitudinal
A, C. S, 2010) compensatório. Toda craniossinostose deve ser avaliada por
um neuropediatra ou neurocirurgião e geneticista.
Estado 1: Olhos fechados, respiração regular, profunda e sem movi- • Escafocefalia: sinostose sagital, forma mais comum, 40 a 60%
mentos (sono quieto). dos casos, mais frequente no sexo masculino, crânio alongado
Estado 2: Olhos fechados, respiração irregular, rápida, movimentos no sentido anteroposterior e estreitado no sentido lateral, a
faciais suaves, sem movimentos grosseiros ( sono ativo). sutura sagital pode ser palpada. A fontanela anterior pode ou
Estado 3: Olhos abertos, sonolência, movimentos suaves de braços não ser palpada. Tratamento é cirúrgico entre 3 e 12 meses.
e pernas ( acordado e quieto). • Braquicefalia: sinostose coronal ou lambdoide bilateral,
comum como parte de quadros sindrômicos,O tratamento
Estado 4: Olhos bem abertos, respiração regular, com movimentos
cirúrgico é indicado devido ao risco de distúrbios visuais e
grosseiros e sem choro (acordado e ativo).
Hipertensão Intracraniana. Pode ser observado, entre outros
Estado 5: Olhos abertos ou fechados, atividade corporal aumenta- processos,nas síndromes de Apert, Seathre-Chotzen, Pfeiffer,
da e chorando. Crouzon e Carpenter.
Os Recém-Nascidos devem ser preferivelmente examinados nos es- • Plagiocefalia anterior: sinostose coronal unilateral, achata-
tados 3 e 4 pois as respostas obtidas serão mais consistentes; os estados 4 mento frontal e do arco orbital ipsilateral associado a bossa
e 5 refletem hiperexitabilidade; nos prematuros os melhores estados para compensatória contralateral.No Rx simples de crânio frontal
a realização do exame físico são os 1,2 e 3. observamos elevação da asa do osso esfenoide ipsilateral
(olho de arlequim). Ocorre desvio da base do crânio, assime-
tria da posição das orbitas das sobrancelhas, das orelhas e da
Fases do exame mandíbula. Risco aumentado de ocorrer Hipertensão Intracra-
niana.O tratamento cirúrgico é indicado entre o 6° e o 9° mês.
72 Ectoscopia • Plagiocefalia posterior: sinostose lambdoide unilateral,
rara, causando um formato trapezoide do crânio, assimetria
Descrição da forma da cabeça, colunas, mãos, pés, pele, fácies, tro- no posicionamento da orelha e bossa parietal compensató-
fismo, assimetrias. ria. A alteração de fossa posterior pode estar associada com
Cabeça e colunas: malformação de Chiari tipo I, e com grande risco de HIC. O
a. Crânio: tratamento pode ser cirúrgico com muitos riscos ou tração.
Observa-se simetria das distâncias biauricular e anteroposterior, • Trigonocefalia: sinostose da sutura metópica, pode levar ao
conferindo o aspecto esférico e simétrico ao crânio. Palpa-se as suturas hipotelorismo e diminuição do crescimento da fossa anterior,
(sagital, coronárias, bregmáticas e lambdoide e metópica) e as fontanelas está associada as alterações cognitivas e comportamentais
anterior e posterior. por restrição do crescimento dos lobos frontais. O tratamento
é cirúrgico entre o 6° e 9° mês.
Fontanelas: o RN possui seis fontanelas. São espaços entre os ossos • Turrencefalia ou oxicefalia: sinostose com fechamento
do crânio, onde palpa-se apenas membranas e couro cabeludo. Se abaula- precoce de suturas coronária, lambdoide e/ou sagital em
das, indicam a possibilidade da ocorrência de meningite, hidrocefalia, he- combinações variadas, associa-se frequentemente a hiper-
morragia intracraniana, hiper-hidratação, edema cerebral. Se deprimidas, tensão intracraniana, e como diagnóstico diferencial devemos
pensamos na desidratação; se muito amplas, pensamos em deficiências lembrar de microcefalia, pode estar associado a alterações da
da ossatura, entre elas o raquitismo. Duas delas são facilmente palpáveis: orbita e face.
• Fontanela anterior ou bregmática: situada na porção cen- • Plagiocefalia posicional: é a forma mais comum de plagio-
tral e alta do crânio, de formato de um losango, medindo entre cefalia, ocorre devido a ação prolongada de forças gravita-
2-3 cm (variação entre 1 e 5); fecha-se, por aproximação dos cionais na região occipital. Se prolongada pode evoluir com
ossos, em torno dos 18 meses de vida. deformidades faciais. Fatores de risco: torcicolo congênito,
• Fontanela posterior ou lambdoide: situada na linha média prematuridade, multiparidade e posição de dormir fixa. O
posterior, de formato triangular, medindo 0,5 cm; fecha-se aos diagnóstico é clínico e necessita o diagnóstico diferencial com
2 meses. a plagiocefalia sinostótica. Na plagiocefalia do lactente, e os
Pode ter as membranas mais espessadas, tornando sua palpação melhores resultados são observados antes dos seis meses.
difícil. O que não significa fechamento precoce se for um achado isolado. Outras alterações do crânio:
Proceder apenas com observação e medidas quinzenais do perímetro • Cefalohematoma: coleção sanguínea subperiostal, de
cefálico. consistência endurecida, delimitada pelas linhas de suturas
Dimensões do crânio: macrocranias e microcranias: cranianas; ocorre após um parto traumático, e desaparece em
• Macrocrania: perímetro cefálico acima do percentil 90. Pode meses, localização geralmente parietal. Sua ocorrência alerta
ser familiar ou representar espaço subdural aumentado. Nesta para o trabalho de parto prolongado com sofrimento fetal.
situação, é um achado isolado, em um lactente com o DNPM • Bossa serossanguínea (ou caput succedaneum): coleção
normal. Mas, pode estar presente também na hidrocefalia, na de líquido e sangue no subcutâneo; não respeita as linhas
megaencefalia ou na hemimegaencefalia, como nas síndro- de sutura, de limites imprecisos, consistência amolecida,
mes de Sotos e Canavan, e outros defeitos de multiplicação, desaparece em dias, ocorre durante um período expulsivo
migração e organização dos neurônios. prolongado, tem menor possibilidade de estar relacionada ao
• Microcrania (microcefalia): perímetro cefálico abaixo do sofrimento fetal.
percentil 10. Nunca dever ser avaliado como constitucional, • Craniotabes: depressão devido à diminuição da consistência
nem achado isolado. Merece investigação. Está presente em dos ossos do crânio. A palpação assemelha-se à compressão
quadros genéticos e congênitos, como defeitos de multipli- de uma bola de ping-pong.
cação, migração e organização neuronal e/ou agenesias de
– CAPÍTULO 3 | 3.3. AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA DO RECÉM-NASCIDO –

• Encefalocele: tumoração consistente e bordas bem delimi- (tecido granuloso com um sulco no centro que repre-
tadas sob a pele que representam a exteriorização de tecido senta o canal central da medula); à sua volta, observa-se
nervoso por defeitos nas linhas de sutura dos ossos do crânio, tecido de transição formado pela membrana aracnoide.
de dimensões variáveis. Mais comuns na região occipital, e, de- A pele é friável e de difícil cicatrização.
pois, na região frontal, principalmente próxima da linha média • Meningocele: hérnia das membranas meníngeas. Não há
e da fossa nasal (onde podem ser confundidas por outros tipos comprometimento direto do tecido nervoso. O tratamento é
de tumorações. Sugerimos cuidados na manipulação de qual- cirúrgico. Após, pode evoluir para medula presa, e, se a menin-
quer tumoração no crânio, principalmente das fossas nasais). gocele for craniana, pode evoluir para hidrocefalia.
• Craniolacunias: pequena depressão ou abaulamento de Estão entre as fechadas (defeito congênito coberto por pele
consistência diminuída na calota craniana que representa íntegra):
ausência da ossificação de um dos núcleos de ossificação do • Diastematomielia: divisão da medula por um septo ósseo ou
osso. Não há tecido nervoso palpável neste caso. cartilaginoso (esporão), podendo estar associada à divisão do
• Perímetro cefálico (PC): diâmetro da cabeça passando pela saco dural.
glabela e a proeminência occipital, distância biauricular (DBA: • Seio dérmico: pequena depressão em que se observa o
ponto de implantação superior dos pavilhões auriculares) e orifício de um canal fistuloso que liga o saco dural e a pele,
distância anteroposterior (DAP: glabela até a proeminência frequente na região lombo-sacra. Podendo ocorrer em outras
occipital), DAP/DBA = 1, região cervical. O PC está normal en- partes do neuroeixo.
tre as medidas de 32 a 36 cm, deve ser realizado no primeiro • Lipomielomeningocele: a medula é ancorada por lipoma
exame e confirmado com 24 horas de vida. O PC aumenta de que se origina no subcutâneo e invade o canal vertebral, ul-
10 a 12 cm no primeiro ano de vida. É interessante sempre trapassa a dura-máter e se fixa na medula ou no filo terminal,
utilizar um gráfico para analisar os percentis. A linha deve estar envolvendo raízes e cauda equina.
paralela às linhas do gráfico. Qualquer inclinação com ângulo • Filo terminal espessado: observado na ressonância mag-
diferente das curvas paralelas ou segmentos horizontais deve nética; quando apresenta mais de 3 mm de espessura, está
ser avaliada, pois é indicador de alteração no ritmo de cresci- associado à medula presa.
mento. O diagnóstico dessa classe de alteração é confirmado pelos exames
• Sopros intracranianos audíveis com o estetoscópio: raros, de imagens. O tratamento, geralmente, é cirúrgico.
e se estão associados a sinais de insuficiência cardíaca, suge-
rem fístulas arteriovenosas ou aneurisma da veia de Galeno. e. Membros:
• Craniorraquisquise, anencefalia, hidranencefalia, holo- Nas mãos e nos pés, avaliar os dedos (postura, proporções entre as
prosencefalia (lobar, semilobar ou alobar): são defeitos falanges, mobilização, sindactilias), avaliar as palmas das mãos e as plantas
complexos do fechamento do tubo neural do neuroporo dos pés (dermografismos). Nos membros, avaliar a limitação do movimen-
anterior, abertos ou fechados, que estão associados a vários to das articulações (artrogriposes) e a desproporção entre o comprimento
defeitos no crânio, fácies e colunas. Facilmente visíveis no do braço e do antebraço (rizomelia).
primeiro exame ou, nos casos mais leves, devem ser suspei- f. Pele:
tados pelas alterações nas respostas do exame neurológico Manchas hipocrômicas ou hipercrômicas, café com leite (número,
como um todo e confirmados pela ecografia transfontanelar. tamanho, bordas e locais), hemangiomas e anexos (implantação, aspecto,
Geralmente, sua presença é observada pelas ecografias do consistência dos cabelos, pêlos e unhas).
período gestacional.
b. Fácies: Avaliação das funções motoras 73
Descrever a assimetria da face, as alterações nas fendas palpebrais, pálpe- Postura, motricidade espontânea e tônus ativo, tônus passivo e
bras, pregas epicanto, forma do nariz, boca e lábios (fissuras), filtro nasal, altura mobilidade e reflexos miotáticos.
de implantação dos pavilhões auriculares e sua formação, proporção e aspecto
da fronte, se olímpica, depressões temporais, região maxilar e região mandibular a. Movimentação e tônus ativo:
(micrognatia e/ou retrognatia). Mobilidade da articulação temporomandibular, RN de termo (necessita estar em estado de alerta, estágios 3
palato (ogival, fissuras), orofaringe, tamanho e aspecto da língua. Pescoço alado, e 4):
postura atípica, limitação no movimento cervical, torcicolos, comprimento, sua Os movimentos, geralmente, são simétricos. Os membros inferio-
relação com a base do crânio. Implantação do cabelo etc. res: ora flexão, ora extensão; em outros momentos, ocorre o cruzamento
c. Tronco: das pernas e sua fricção, ocorre abertura dos pododáctilos. Os movi-
Seu formato, assimetrias e proporção em relação aos membros, mentos são ora lentos, ora abruptos. O tronco apresenta movimentos
posição e formação dos mamilos, costelas, esterno, localização e forma- de lateralização e encurvamentos lentos; em outros momentos, tende
ção dos retos abdominais e do abdome, cicatriz umbilical e genitálias. Os a uma retificação. Podemos observar contração generalizada, e, como a
membros serão avaliados em tópico posterior. musculatura posterior é mais forte que a anterior, pode-se observar um
opistótono momentâneo. A cabeça tende a manter uma postura centrali-
d. Colunas (cervical, torácica, lombo-sacra): zada, porém, se causamos sua lateralização, provocamos o reflexo tônico
Deve-se realizar uma inspeção visual e palpação em toda sua cervical assimétrico. Os membros superiores: apresentam movimenta-
extensão, as apófises espinhosas e, principalmente, a coluna lombo- ção menos frequente, permanecendo a maior parte do tempo fletidos e
-sacra, onde podemos observar: paralelo ao tronco. Podemos observar breves movimentos de flexão das
• Disrafismos espinhais: falhas no fechamento posterior do mãos (abrem-se e fecham-se espontaneamente) e, às vezes, os membros
tubo neural que ocorrem na embriogênese (até a 4a semana). superiores buscam a linha média. Estes movimentos ficam mais intensos
Podem ser abertas ou fechadas. durante a provocação dos reflexos ou no choro, quando são assimétricos.
Estão entre os fatores predisponentes: deficiência de ácido fólico, Observam-se tremores no queixo e, principalmente, nos membros supe-
deficiência de zinco, diabete melito materno, uso de estimulantes da riores, finos, rápidos e rítmicos durante o choro e/ou frio; duram poucos
ovulação, uso de ácido valproico, carbamazepina, obesidade e história segundos.
familiar. Observar, nos membros superiores, a ausência de movimentos,
Sinais de alerta locais: assimetria das nádegas, sulco glúteo assimé- a postura assimétrica em adução, semiflexão e pronação ou extensão e
trico, profundo, Dimple raso, Dimple profundo, manchas, hemangiomas, supinação, e alteração na postura dos dedos, que ocorre nas lesões de
nevo, pêlos apêndices cutâneos e cicatrizes congênitas. plexo braquial (Erb – C5 e C6; e de Klumpke – C8 a T1).
Os sinais gerais são: deformidades tróficas das pernas e dos pés, RN prematuro:
escoliose, bexiga neurogênica, agenesia do sacro, infecções urinárias de • Da 25a a 27a semanas: raros movimentos, lentos assimétri-
repetição, incontinência urinária. cos como respostas aos estímulos.
As manifestações neurológicas são parestesias ou anestesias locais, • 28a semana: durante a mobilidade espontânea, observam-se
arreflexia ou hiperreflexia, atrofia muscular, espasticidade dos membros movimentos lentos, ora de um seguimento, ora generalizados,
inferiores, atraso na marcha. intercalados por movimentos abruptos e rápidos. Observam-
As abertas são: -se, também, longos períodos de inatividade, tremores finos e
rápidos, e os movimentos são mais observados nos membros
• Encefalocele: descrita anteriormente.
inferiores.
• Mielomeningocele: falha do fechamento do tubo
• 30a semana: os movimentos estão mais frequentes e a cabeça
neural evoluindo com hérnia e exposição das menin-
assume posição de linha média.
ges, medula, e raízes nervosas formando um placódio
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

• 32a semana: os membros inferiores estão mais ativos, observa- contração do músculo subjacente. Aparecimento: 2-6 meses de vida de
-se mobilidade dos quadris e mudança de postura e inicia-se a um lactente a termo.
movimentação dos membros superiores. Reflexo cremasteriano: no lactente do sexo masculino. Estimula-se
• Da 33a a 36a semanas: os movimentos vão se tornando face interna superior da coxa próxima à região inguinal; ocorre elevação
mais frequentes e mais complexos, chegando à descrição do testículo do mesmo lado. Aparecimento: aos 6 meses.
dada aos RNs de termo.
b. Tônus e movimentação passiva: Reflexo cutâneo-plantar: estimula-se passando um instrumento
Tônus é a tensão que os músculos apresentam no estado de repou- rombo na linha da borda lateral do pé até a base dos cinco pododáctilos,
so. O RN deve estar com a cabeça na linha média em decúbito dorsal. Se obtendo-se a extensão do primeiro pododáctilo e/ou a abertura em leque
assim não estiver, provocará o RTCA e o tônus sofrerá alterações. dos demais. Obtido do nascimento até o 9º mês de vida. Se persistir após
24 meses de idade, é chamado de Sinal de Babinski e indica lesão do
Podemos avaliar o tônus por meio da movimentação passiva e do trato córtico-espinhal lateral ou da área cortical motora no encéfalo.
balanço passivo, através da manobra do cachecol e da mobilidade dos
ângulos cubital, poplíteo, pé-perna, coxa-tronco. e. Pares cranianos:
Primeiro par (olfatório): inespecífica breve reação nos odores
RN de termo: irritativos com alteração da expressão facial.
Apresenta flexão generalizada e tônus flexor aumentado nos quatro Segundo par (óptico): porção aferente com estímulo luminoso.
membros, enquanto a musculatura da região vertebral e paravertebral
apresenta tônus diminuído, incluindo a região cervical. Esta atitude per- Terceiro par oculomotor (porção eferente com estímulo lumi-
manece assim até o final do primeiro mês de vida. O ângulo poplíteo está noso): resposta pupilar reflexa com contração da pupila de forma simétri-
em torno de 80°; na manobra do cachecol, o cotovelo chega à linha média. ca e simultânea. Reflexo consensual: estimulando uma das pupilas, a do
olho contrário contrai-se de forma similar.
Durante o primeiro ano de vida, observa-se inversão progressiva na
direção crânio-caudal, com aumento dos tônus na região cervical, verte- Terceiro (oculomotor), quarto (troclear) e sexto (abducente)
bral e paravertebral, e diminuição nos membros, o que facilitara o lactente pares: observa-se, também no RN de termo, breve acompanhar do es-
nas aquisições motoras: tônus cervicais, rolar, sentar-se, ficar na posição de tímulo luminoso.
gatinho e de pé. Quinto par (trigêmio): inespecífico, pode ser observada reação no
RN prematuro: teste de sensibilidade na face com alteração da expressão facial na sensi-
bilização com algodão.
• Antes da 28ª semana, observamos hipotonia global impor-
tante com todos os membros estendidos. Ângulos poplíteo e Sétimo par (facial): assimetrias durante o choro. Ramo oftálmico:
cubital em torno de 180°. observa-se dificuldade no fechamento palpebral do lado comprometido.
• 28ª semana: o ângulo poplíteo está em torno de 180°, ângulo Ramo maxilar: apagamento do sulco nasogeniano do lado comprometido
pé-perna está em torno de 40°, mínima resistência à manipu- e maior expressão do lado normal. No ramo mandibular, observa-se des-
lação passiva de todos os segmentos. vio da comissura labial para o lado afetado (obs.: se o desvio for intenso e
• 30ª semana: a hipotonia mantém-se, mas se observa leve fle- em posição oblíqua durante o choro, é provável ocorrer a manifestação da
xão dos membros inferiores, ângulo poplíteo entre 150° e 160°. agenesia do músculo platisma. A fácie inexpressiva durante o choro está
• 32ª semana: o ângulo poplíteo está em torno de 140° a 150°, ligada à Síndrome de Moebius).
com leve ganho de tônus nos MMII. Oitavo par (vestíbulo-coclear): porção coclear, o RN reage breve-
• 35ª semana: o ângulo poplíteo chega a 90°, permanecendo mente ao estímulo sonoro, modificando seu comportamento, geralmente
74 assim até o nascimento, e o pé-perna em torno de 30°. com piscamento (é o reflexo cócleo-palpebral). A porção vestibular é
• 37ª semana: o ângulo pé-perna chega a 10°. E, ao nascimen- avaliada realizando, com estabilização da porção cervical e apoio no an-
to, poderá ser menor. tebraço do examinador, elevação para posição vertical, rotação do RN ora
c. Reflexos miotáticos ou profundos: para direita, ora para esquerda; observa-se, em primeiro lugar, lateralização
Nos RNs, sua importância reside em sua ausência, diminuição de dos olhos para o lado contrário ao do movimento seguido de correção
intensidade ou assimetria de sua resposta, indicando lesão em qualquer para a posição de mirador. Estas respostas, até o momento, determinam
nível da Unidade Motora Periférica (neurônio motor inferior, raiz anterior a integridade do mesencéfalo, ponte e fascículo longitudinal medial (é o
da medula, nervo, placa mioneural ou músculo estriado). A exacerbação reflexo dos olhos de boneca).
não significa necessariamente lesão; neste caso, devemos considerar lesão Nono, décimo, décimo primeiro e décimo segundo pares: são
se observarmos assimetrias das respostas. avaliados através da protrusão da língua, sucção e deglutição coordena-
Devido à dificuldade de obtenção, vamos nos limitar a descrever os das e da assimetria entre a altura dos ombros e a presença de postura
que apresentam respostas mais consistentes. viciosa da cabeça (obs.: o diagnóstico diferencial com o torcicolo congê-
• Reflexo patelar: Segurar o membro inferior pela fossa poplí- nito é importante).
tea deixando-o em semiflexão, proteger o tendão inferior da f. Reflexos primitivos (a ontogênese recapitula a filogêne-
rótula COM um dedo, aguardar um momento de relaxamento se):
do recém nascido e realizar a percussão sobre este dedo. A São transitórios, desaparecem em um período específico de tem-
resposta observada é a extensão do pé sobre a perna. po e são substituídos pelo controle neurológico observado no sistema
• Reflexo bicipital: com o polegar ou dedo indicador do exa- nervoso maduro. A permanência de um ou mais deles, além do período
minador, proteger o tendão de inserção do músculo bíceps específico, é preditiva de lesão no SNC do lactente.
na região da fossa cubital e utilizar o martelo de percussão; Manobra do arrasto: RN em decúbito dorsal: traciona-se os braços
aguardar um momento de relaxamento do Lactente para rea- que estão fletidos; a cabeça, que inicialmente está inclinada para trás,
lizar a percussão. A resposta observada é a flexão do antebraço desloca-se para a posição mediana, e, após, cai para frente. É reflexo até
sobre o braço. o 3º mês de vida.
• Reflexo tricipital: com o polegar ou dedo indicador do exa-
Rotação da cabeça em prono: o RN eleva a cabeça rapidamente
minador proteger o tendão de inserção do músculo tríceps
e faz rotação lateral, observada no 1º mês de vida. O RN realiza este movi-
braquial na região do epicôndilo cubital e utilizar o martelo de
mento para liberar as narinas e realizar a respiração.
percussão; aguardar um momento de relaxamento do lacten-
te para realizar a percussão. A resposta observada é a flexão do Rechaço dos membros inferiores: avalia a postura flexora; posi-
antebraço sobre o braço. cionam-se as pernas fletidas contra as coxas, e estas contra o abdome,
• Nasopalpebral: com o dedo indicador, o examinador percute liberando-as bruscamente; observa-se projeção em extensão dos dois
a região da glabela no recém-nascido ou lactente, e a resposta membros inferiores.
encontrada é o piscamento. Ocorre durante todo o primeiro Apoio plantar: segurando-se o RN pelas axilas, tocar com a planta
ano de vida. dos pés (aplicando leve pressão) a mesa de exame, obtendo-se alinha-
d. Reflexos cutâneos ou superficiais: mento e sustentação do corpo; observado até o 3º mês de vida.
Reflexos abdominais: RN em decúbito dorsal: estimula-se, com um Reflexos de Moro: observa-se, na queda súbita da cabeça ampara-
instrumento rombo, de cada lado do abdome alto, da linha axilar para a da pela mão do examinador, extensão e abdução dos membros superio-
linha mediana, com leve inclinação para baixo, seguindo os dermátomos, res seguidas de flexão e adução; com um pequeno “puxão” do lençol da
na linha das costelas (retos abdominais, seguimento superior) ao nível da incubadora, observa-se resultado semelhante. Esboça-se na 28a semana
cicatriz umbilical (reto abdominal, seguimento médio) e acima da região de idade conceptual apenas com a abertura das mãos; torna-se, a cada
inguinal (reto abdominal, seguimento inferior); observar presença de
– CAPÍTULO 3 | 3.3. AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA DO RECÉM-NASCIDO –

semana, mais evidente, e está completo após a 37a semana, quando é lembra as pernas de um batráquio, mantendo as plantas dos pés unidas,
nítido até o 3o mês de vida. Entre o 4o e o 6o mês de vida desaparece. segura-se o RN pelos pés, observa-se deslocamento do corpo do lactente
Preensão palmar: na posição em supino, obtém-se realizando para frente.
pressão digital na linha metacarpo-falangeana. Observa-se flexão rápida Reflexo de Landau: lactente é suspenso na posição prona, obser-
dos dedos das mãos, causando preensão forte sobre o dedo do exami- va-se elevação da cabeça acima do tronco; em seguida, o tronco é retifica-
nador. Também pode ser obtido na preensão da palma da mão. Na 28a do, as pernas estendidas. Está presente a partir dos 4 ou 5 meses de idade.
semana de gestação, pode ser observada apenas a fase de extensão dos Reflexo de Landau II: ao fletirmos a cabeça do RN, observamos
dedos. O reflexo está completo a partir das 32 semanas de gestação; na abaixamento da pelve e flexão dos membros inferiores. Este reflexo é
40a semana, é tão forte que o bebê pode ser tracionado para a posição observado além do 12º mês de vida.
sentada na sua sequência. Desaparece entre o 3o e o 6o mês de vida de
lactente a termo. Sua manutenção interfere na obtenção da preensão e Reflexo de apoio lateral: com o lactente sentado, faz-se um mo-
abertura voluntária da mão. vimento de lateralização do seu tronco, observa-se extensão do braço
ipsilateral, com apoio da palma da mão na mesa de exame. Está presente a
Preensão plantar: na posição em supino, obtém-se realizando partir dos 6 aos 8 meses de vida.
pressão digital na linha metatarso-falangeana. Observa-se rápida flexão
dos pododáctilos. Pode ser observado a partir da 33a semana de gestação, Reflexo de paraquedas: com o lactente segurado pelo tronco e
mantendo-se até o 6o mês de vida pós-natal nitidamente, mas podendo suspenso, coloque-o inclinado com a cabeça mais baixa e faça um mo-
chegar ao 9o mês. vimento no sentido do plano da maca de exame; observa-se a extensão
dos braços para frente, como se fosse se proteger da queda. Pode estar
Reflexo de busca, voracidade ou pontos cardinais (Piper): presente a partir dos 8 ou 9 meses, certamente aos 12 meses.
com o bebê em decúbito dorsal, com um cotonete umedecido toca-se
as comissuras labiais, o centro dos lábios superior e inferior. A resposta Apoio plantar: o examinador segura o bebê pelo tronco na posição
em um bebê normal é o movimento do lábio em direção ao estímulo vertical. Tocam-se as plantas dos pés na superfície da mesa de exame. A
realizado (busca). Este reflexo pode ser observado de forma fragmentada resposta normal é a extensão dos joelhos e quadril devido ao aumento
e incompleta desde a 28a semana de gestação; desde que o estímulo seja dos tônus extensor dos membros inferiores. Esta resposta é bem evidente
prolongado e com a cabeça apoiada, entre 30 e 32 semanas está com- desde o nascimento até os 2 meses de vida de um bebê. Este reflexo está
pleto, observado normalmente até os 2 meses de vida. Com o bebê em ligado à maturação do sistema nervoso extrapiramidal e inicia-se a partir
decúbito dorsal, introduz-se um cotonete umedecido em glicose entre os de 24 a 34 semanas de gestação.
lábios do bebê. A resposta observada é a sucção. Este reflexo pode ser ob- h. Sensibilidade:
servado desde o nascimento até o 5o mês, tornando-se menos frequente, Pode ser testada utilizando os estímulos táteis duradouros e in-
até que não é mais observado no 9o mês de vida de um bebê de termo. tensos e a dor. A resposta mais específica é a mudança da fisionomia, o
Este reflexo é observado entre 18 e 24 semanas de idade gestacional. E movimento dos membros e o choro, além da mudança da frequência res-
inicia sua coordenação com a deglutição e a respiração nas 34 semanas piratória e da frequência cardíaca. Tem seu valor principalmente na mie-
de gestação, estando completa nas 37 semanas. lomeningocele e na lesão total do plexo braquial, que, além da alteração
Reflexo de sucção: observa-se até o 8º mês de vida. na movimentação, a postura típica, observa-se ausência de reatividade à
dor. A alteração pode ser consistente mesmo no prematuro em torno de
Reflexo mão-boca (Babkin): obtém-se por meio de preensão 28 semanas de idade gestacional.
firme exercida pelos polegares do examinador nas palmas das mãos do
lactente. Podem ser observados abertura da boca, flexão dos membros
superiores, flexão da cabeça e fechamento dos olhos (é observado em Adendo I: estudo topográfico neurológico 75
prematuros após 28 semanas até os 3 ou 4 meses do lactente).
Marcha reflexa: obtém-se quando o examinador segura o bebê
para avaliação do coma no lactente
pelo tronco na posição vertical. Tocam-se as plantas dos pés na superfí-
cie da mesa de exame e realiza-se uma inclinação do tronco do RN para Escala de coma de Glasgow modificada: avaliação da
frente. A resposta normal é a realização de passos curtos e ritmados pelo função cortical
RN. Este teste está presente desde o nascimento até os 2 meses de forma
Melhor resposta ocular:
nítida, podendo ser observado até o 4o mês. O teste pode ser realizado
4 – Espontânea
mesmo com a superfície invertida, com o bebê de cabeça para baixo.
3 – Ao estímulo verbal
Começa a ser obtida na 35a semana de gestação, mas sem consistência
2 – Ao estímulo doloroso
e continuidade.
1 – Ausente
Reflexo da escada (Placing): o examinador segura o RN pelo tron-
Melhor resposta motora:
co na posição vertical. Toca-se o dorso dos pés na borda da mesa de exa-
6 – Movimentação espontânea
me. A resposta esperada, normalmente, é a flexão da perna sobre a coxa
5 – Retirada ao toque
seguida da flexão da coxa sobre o tronco e extensão da perna e colocação
4 – Retirada ao estímulo doloroso
da planta do pé na superfície da mesa de exame. Este reflexo está presente
3 – Flexão ao estímulo doloroso
desde o nascimento até os 2 meses de vida de um bebê de termo.
2 – Extensão ao estímulo doloroso
Reflexo tônico cervical assimétrico: com o RN em decúbito dorsal 1 – Ausente
e a cabeça na linha média em uma reta com o tronco, faz-se uma rotação
Melhor resposta verbal:
lateral da cabeça em 90°, dirigindo o mento para o ombro. Observa-se
5 – Balbucia
o RN assumir uma postura de esgrimista (extensão dos membros para o
4 – Choro irritado
lado da face e flexão dos membros que estão voltados para a região oc-
3 – Choro à dor
cipital). Este reflexo é normal até os 3 ou 4 meses de vida de um lactente.
2 – Gemido à dor
Reflexo de Galant: com o bebê em prono, estimula-se de cima 1 – Ausente
para baixo em uma linha paralela a coluna vertebral torácica e lombar
Resposta abaixo de 9 indica intubação.
entre a linha média e a lateral do tronco, mais próxima desta. Resposta:
observa-se flexão lateral do tronco para o lado estimulado. Idade normal
de aparecimento entre 0 e 2 meses, desaparece entre os 6 e os 12 meses Avaliação das funções subcorticais (tronco cerebral)
de vida. Significado: organização postural, equilíbrio do tronco. Avaliação do tipo respiratório:
Reflexo de extensão cruzada: estimula-se a planta do pé do mem- • Respiração de Cheyne-Stokes: oscilação lenta entre a hi-
bro em extensão mantido pelo examinador; observa-se flexão e abdução se- perventilação e a hipoventilação intercaladas por período de
guida de extensão e adução do membro oposto. Obtido no 1º mês de vida; apneia, ocorre um crescendo lento até um máximo seguido
no RN prematuro, com 28 semanas: sem resposta; com 30 semanas: apenas de um decrescendo lento da amplitude respiratória. Pode ser
a resposta flexora; com 32 semanas: aparece a abdução, após o movimento observada nas lesões hemisféricas bilaterais ou lesões dience-
de flexão; com 35 semanas: além da flexão inicial, notamos a resposta em fálicas.
abdução nítida; com 37 semanas: ocorre o aparecimento da fase extensora • Hiperventilação central: observa-se hiperventilação manti-
que domina todas as outras, da caracterizada por inspirações rápidas e profundas. Este tipo
g. Reações posturais: respiratório é observado em lesões mesencéfalo-pontinas.
Manobra de propulsão ou reptação: posição do neonato em • Respiração apnêustica: é uma inspiração profunda inter-
decúbito ventral, flexionar os membros inferiores, em uma postura que calada por um intervalo de 2 a 3 segundos antes de ocorrer
a expiração. Pode ser observada em lesões dorso-medial da
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

ponte causadas por trombose da artéria basilar, causando uma variação de 10% para mais ou para menos. Consulte o
infarto pontinho. capítulo sobre Hipertensão Arterial.
• Respiração em salvas: observa-se períodos de apneia in- b. Comunicação e aceitação dos familiares.
tercalados por períodos de hiperventilação. Observado nas c. Tempo de observação para que seja iniciado o diagnós-
lesões pontino-bulbar. tico mínimo de 6 horas. Quando a causa fora encefalopatia
• Respiração atáxica: a respiração não apresenta um ritmo hipóxico-isquêmica, a observação deve ser de 24 horas.
cíclico regular. Em alguns momentos, apresenta-se profunda d. Intervalo mínimo entre as duas avaliações clínicas de acordo
e prolongada, e em outros momentos rápida e superficial; os com a faixa etária:
intervalos são variáveis, podendo-se observar períodos de ap- • De 7 dias a 2 meses incompletos – 24 horas.
neia intercalados ao ritmo descrito acima. Este tipo respiratório • De 2 meses a 24 meses incompletos – 12 horas.
é observado quando a lesão atinge ponte inferior e bulbo. • Acima de 2 anos – 1 hora.
Avaliação das pupilas (reflexo oculomotor):
• Pupila uncal: a pupila, quando midiática e não responsiva ao
Testes clínicos
estímulo luminoso, podendo estar associada à ptose homola- Estão entre os testes clínicos: escala de coma de Glasgow e os se-
teral, é observada na herniação do uncos do lobo temporal e guintes reflexos:
compressão do trato corticoespinhal no mesencéfalo. • Reflexo córneo-palpebral (aparece com 30-32 semanas de
• Pupilas puntiformes: as pupilas estão contraídas bilateral- idade gestacional): com um pequeno chumaço de algodão,
mente, podendo ou não ser reativas ao estímulo luminoso. tocam-se as córneas do paciente. A resposta normalmente
Estas alterações pupilares ocorrem nas lesões localizadas na ocorre com um piscamento. O nervo aferente é o quinto par
ponte. (trigêmeo) e o eferente é o nervo facial.
• Pupilas medianas: as pupilas medianas não reagem ao estí- • Reflexo óculo-cefálico (aparece com 28-32 semanas de
mulo luminoso, podendo apresentar flutuação espontânea do idade gestacional): apoiando a cabeça do paciente com
tamanho, às vezes hippus. Estas alterações pupilares ocorrem as duas mãos, realiza-se movimentação rápida da cabeça
nas lesões mesencefálicas. nos sentidos horizontal e vertical. A resposta de demonstrar
• Pupilas midiáticas: bilateral: nesta alteração, as pupilas estão integridade é a manutenção do olho na posição que se
dilatadas e não reagem ao estímulo luminoso; podem estar encontrava, parecendo que se desvia para o lado contrário
associadas à paralisia do VI par craniano (abducente). Esta da movimentação da cabeça. A ausência do movimento de-
alteração é observada nas lesões mesencéfalo-pontinas. monstra lesão do 8o par aferente e a eferência ocorre pelos 3º,
Avaliação da postura: 4º e 6º pares cranianos.
• Postura de decorticação: nesta postura, o paciente, quando • Reflexo óculo-vestibular: com a cabeça em um ângulo de
estimulado, apresenta-se com os membros inferiores estendi- 30°, irrigam-se os condutos auditivos externos com 50 ml de
dos e membros superiores fletidos nas articulações do cotove- soro fisiológico 0,9% gelado; a resposta normal é a ocorrência
lo e dos punhos e dos dedos das mãos. Os pés também estão de nistagmo com o componente rápido para o lado do ouvido
estendidos. Reflete disfunção diencefálica. instilado ou desvio dos olhos para o mesmo lado. O intervalo
• Postura de decerebração: nesta postura, o paciente, quando entre um ouvido e o outro deve ser de 5 minutos. O soro
estimulado, apresenta-se com todos os membros estendidos, quente faz com que o movimento ocorra em direção oposta.
nas articulações dos cotovelos e dos joelhos e dos pés. As ar- A aferência ocorre pelo 8º par craniano (vestíbulo-coclear) e
ticulações dos punhos e dos dedos das mãos estão em flexão. a resposta ocorre pelo sexto par (abducente). É fundamental
76 realizar otoscopia antes do teste.
Reflete disfunção diencefálica grave, mesencefálica e tronco
cerebral em sua porção superior. • Reflexo da tosse ou nauseoso (aparece com 32-34 sema-
• Postura flácida: a flacidez difusa e a ausência de resposta nas de idade gestacional): com a ponta de uma espátula,
motora com perda de tônus muscular refletem lesão ao nível estimula-se da base da língua à faringe posterior. A resposta
bulbo-pontino. normal é a ocorrência de reflexo da tosse com movimentos
• Postura da lesão de hemisfério unilateral: desvio da cabeça espásticos do tórax ou reflexos nauseosos. Sua aferência ocor-
e dos olhos para um lado e hemiparesia contralateral indicam re pelo 9o par craniano (glossofaríngeo) e a eferência pelo 10o
lesão supratentorial para o lado do desvio dos olhos/cabeça, par (vago).
enquanto o desvio para o mesmo lado da hemiparesia pode
indicar lesão de tronco cerebral. Rotação externa do membro Teste de apneia
inferior pode ser indicativa de hemiparesia do lado da rotação. Pré-requisitos:
Temp. ≥ 36,5 °C; PA sistólica ≥ 90 mmHg (adultos); balanço hídrico
Adendo II: protocolo de morte encefálica nas 6 horas positivo.
Ventilar o paciente (± 10 minutos com FiO2 de 100%), para atingir
Fonte: Adaptado do Conselho Federal de Medicina (CFM), Resolução 2173/17, de 15 de dezembro
PaO2 alvo ≥ 200 mmHg.
de 2017.
Realizar uma primeira gasometria, PaO2 = 200 mmHg, PaCO2 em
1. Na suspeita de morte encefálica, o paciente deve ser obser-
torno de 30-40 mmHg (para confirmar os parâmetros necessários).
vado e ter acesso a todos os tratamentos possíveis por, no
mínimo, 6 horas. Desconectar o circuito do respirador, mantendo uma cânula de O2
2. Poderá ser atestada por neurologista e neurologista pediátrico, na topografia da carina com fluxo de 6 l/min.).
medicina intensiva adulta ou pediátrica, neurocirurgia ou me- Observar a desconexão por 6 a 10 minutos e realizar uma segunda
dicina de emergência, com, no mínimo, 1 ano de experiência gasometria para avaliar as alterações na PaO2 e PaCO2.
no atendimento a pacientes em coma, além de ter realizado Observação:
curso de capacitação ou acompanhado/realizado, pelo
menos, dez determinações de morte encefálica. Os médicos De imediato, reconectar o ventilador do paciente em caso de queda
indicados a realizar a avaliação clínica não podem fazer parte da saturação ou hipotensão arterial, arritmia cardíaca. Se aparecerem mo-
da equipe de transplante. vimentos respiratórios torácicos ou abdominais neste intervalo de tempo
3. Devem ser iniciados em todos os pacientes que apresentarem ou se a PaCO2 não atinge níveis maiores ou iguais a 55 mmHg, não se
os seguintes prerrequisitos: caracteriza apneia.
a. Coma não perceptivo; ausência de reatividade supraespinhal; Observar movimentos respiratórios (se possível, com um ventilômetro
apneia persistente; presença de lesão encefálica de causa co- acoplado) por até 10 minutos ou até pCO2 ≥ 55 mmHg.
nhecida e irreversível; ausência de fatores tratáveis que confun- Atenção:
dam o diagnóstico; tratamento e observação no hospital pelo
período mínimo de 6 horas; temperatura corporal superior a PARa pacientes cujo PCO2 basal já é ≥ 55 mmHg, aguardar elevação
35 ºC; saturação arterial de oxigênio acima de 94% de acordo acima de 20 mmHg do pCO2 basal para teste confirmatório.
com critérios estabelecidos pela Resolução; e pressão arterial Interpretação:
(PA) sistólica igual ou acima de 100 mmHg (para adultos). Obs.: • Positivo: PCO2> 55 mmHg; aumento da PCO2 em 20 mmHg
como não há na Resolução critério determinado para crianças comparada com a gasometria inicial.
e lactente, uma possibilidade é que o paciente esteja com PA • Negativo: movimentos respiratórios; resultados de PCO2 na
sistólica igual à pressão sistólica média para faixa etária (avalia- gasometria inferior aos resultados anteriores.
do pelas tabelas de pressão arterial em lactentes e RNs) com
– CAPÍTULO 3 | 3.3. AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA DO RECÉM-NASCIDO –

• Inconclusivo: instabilidade hemodinâmica durante o teste; realizado um exame complementar que comprove a ausência de atividade
SaO2 < 90%; arritmias cardíacas. encefálica. Este exame deve comprovar: ausência de perfusão sanguínea
encefálica, ou ausência de atividade metabólica encefálica, ou ausência de
atividade elétrica encefálica. Estão entre os exames: Cintilografia Cerebral,
Arteriografia Cerebral, Eletroencefalograma, Doppler Transcraniano, Po-
Confirmação da morte encefálica tencial Evocado Multimodal, PET, SPECT e RM (associação de modalidades
Após os dois exames clínicos realizados por médicos diferentes, com angiorressonância, difusão, perfusão e espectroscopia).
especificamente capacitados para confirmar o coma não perceptivo e a
ausência de função do tronco encefálico e um teste de apneia, deve ser

77
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL


Paulo R. Margotto, Alessandra de Cássia Gonçalves Moreira

Quando a mãe desconhece a DUM, ou tem dúvidas a respeito dela,


Classificação do recém-nascido pode-se recorrer aos seguintes métodos:
Para estimarmos com maior precisão o risco de o recém-nascido • Idade gestacional obstétrica (IGO): se houve ecografia precoce
(RN) apresentar determinadas patologias ou morrer, torna-se necessária (antes de 12 semanas).
a análise de duas grandes variáveis em conjunto, que são a idade gesta- • Durante a gestação: medição do fundo de útero, medição do
cional e o peso. tamanho do feto pela ecografia (abaixo de 20 semanas).
• Ao nascer: exame clínico-neurológico do RN: para os RNs com
idade gestacional maior que 28 semanas, o método de Capur-
Avaliação da idade gestacional ro tem sido amplamente empregado, podendo ser realizado
A idade gestacional é o tempo transcorrido desde a concepção até logo ao nascer (método somático). Para os RNs saudáveis e
o momento do nascimento. Por métodos clínicos, é impossível determinar com mais de 6 horas de vida, é feito o somático e neurológico,
o momento da concepção, podendo ser inferido de forma indireta a partir ambas as formas têm apresentado alta correlação com DUM,
da data da última menstruação (DUM). Este método, de uso universal, é sendo menor para os RNs pequenos para a idade. Nestes RNs,
tanto mais confiável quando a mãe se recorda das datas das suas mens- tem sido observada uma subestimação da idade gestacional a
truações e quanto mais regulares sejam seus ciclos. partir da 35ª semana.

Método de Capurro na avaliação da idade gestacional: somático e neurológico

Mamilo puntiforme;
Mamilo nítido; aréola Mamilo puntiforme;
Mamilo pouco visível; aréola de borda não
Formação mamilo lisa diâmetro aréola de borda elevada
sem aréola elevada
A < 0,75 cm > 0,75 cm
0 > 0,75 cm
5 15
10

Algo mais grossa, com Grossa, com sulcos


Grossa, apergaminhada
Textura da pele Fina, gelatinosa Fina e lisa discreta descamação superficiais, descama-
com sulcos profundos
B 0 5 superficial ção de mãos e pés
20
10 15

Pavilhão parcialmente
78 Forma da orelha
Chata, disforme pavi- Pavilhão parcialmente
encurvado em toda
Pavilhão totalmente
lhão não encurvado encurvado na borda encurvado
C borda superior
0 8 24
16

Tamanho da glândula Ausência de Diâmetro Diâmetro Diâmetro


mamária tecido mamário < 5 mm 5 mm a 10 mm > 10 mm
D 0 5 10 15

Marcas mal definidas Marcas bem definidas Sulcos em mais da


Sulcos na metade
Sulcos plantares Ausentes na metade anterior da na metade anterior e metade anterior da
anterior da planta
E 0 planta no terço anterior planta
15
5 10 20

Entre a linha axilar Entre a linha média e a


Sinal do xale (posição Na linha axilar do lado
anterior do lado oposto Ao nível da linha média linha axilar anterior do
do cotovelo) oposto
e a linha média 12 mesmo lado
F 0
6 18

Posição da cabeça ao Totalmente deflexio-


levantar o RN (ângulo nada  entre 180º-270º  = 180º  < 180º
(Â) c érvico-torácico) Â = 270º 4 8 12
G 0

Idade gestacional:
Somático: somatório dos pontos em A, B, C, D, E + 204 /7.
Somático-neurológico: somatória dos pontos em b, c, d, E, F e G + 200 / 7.

Para os RNs com peso de nascimento abaixo de 1500 g, utiliza-se o térios físicos, neurológicos e físicos e neurológicos, pelo método de Ballard
método de Ballard et al. (1979) modificado por Constantine et al. (1987). et al, (1979). Os autores observaram melhor correlação (0,81) com a idade
Constantine et al. (1987). correlacionaram com a DUM três métodos gestacional obtida por critérios físicos. O diagnóstico do RN PIG, utilizando
clínicos na determinação da idade gestacional dos RNs de baixo peso (cri- esta idade gestacional, embora seja menos sensível, é mais específico e
com altos valores preditivos, como pode ser observado:

RN PIG Sensibilidade Especificidade Valor preditivo positivo Eficiência


Idade gestacional
Critério físico 65 86 73 78
Critério neurológico 79 54 51 63
Critério combinado 78 71 62 74
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

Ballard modificado por Constantine

Maturidade
0 1 2 3 4 5
física
Descamação superfi-
Gelatinosa, verme- Lisa, rosa, veias Fenda superficial, Apergaminhada, Fenda profunda
Pele cial e/ou rash, poucas
lha, transparente visíveis raras veias fenda profunda enrugada
veias
Pequena quanti- Praticamente sem
Lanugo (no dorso) Nenhum Abundante Delgado
dade lanugo

Aréola puntiforme, Aréola puntiforme, Aréola bem


Aréola chata, sem borda não elevada, borda elevada, formada, glândula
Seio Apenas perceptível glândula mamária mamária
botão glândula mamária 1
a 2 mm 3 a 4 mm 5 a 10 mm

Pavilhão leve- Pavilhão bem


Pavilhão liso, perma- mente encurvado Pavilhão encurvado, formado e firme, Cartilagem grossa,
Orelha
nece dobrado desdobra lenta- desdobra facilmente desdobra imediata- orelha rígida
mente mente

Sulcos somente no Sulcos nos Sulcos em toda


Sulcos plantares Sem sulcos Marcas
1/3 terço anterior 2/3 anteriores a sola

Genital Bolsa escrotal vazia, Testículos descendo, Testículos na bolsa, Testículos na bolsa,
masculino sem rugas poucas rugas rugas rugas profundas

Pequenos e grandes Grandes lábios Clitóris e pequenos


Genital Pequenos lábios,
lábios igualmente quase cobrindo os lábios completa-
feminino clitóris proeminente
proeminentes pequenos lábios mente cobertos

TOTAL X 2

Escore 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Semanas 26 28 30 32 34 36 38 40 42 44

Para os RNs extremamente pré-termos (< 26 semanas), adotamos saudável; Centro Latino-Americano de Perinatologia e 79
duas formas para a avaliação da idade gestacional: Desenvolvimento Humano – CLAP). A tabela, além de
fornecer a idade gestacional com o desvio padrão, mostra
1. Segundo valores do perímetro cefálico ao nascer também o peso médio ao nascer e os valores máximos
(medidas provenientes da população latino-americana (percentil 90) e mínimo (percentil 10).

PC (cm) IG (semanas) Peso (g)


Mínimo Médio Máximo
18 20 ± 1,5 180 380 580
19 21 ± 1,5 240 450 670
20 22 ± 1,5 320 530 740
21 23 ± 1,5 360 610 860
22 24 ± 1,5 420 700 980
23 25 ± 2 480 770 1070
24 26 ± 2 560 820 1160
25 27 ± 2 620 960 1350
26 28 ± 2,5 700 1100 1550
27 29 ± 2,5 840 1280 1800
28 30 ± 2,5 1000 1460 2000
29 31 ± 2,5 1160 1640 2200
30 32 ± 3 1300 1840 2370
31 33 ± 3 1510 2070 2590
31,5 34 ± 3 1770 2320 2900
32 35 ± 3 2060 2610 3210
33 36 ± 3 2320 2890 3510
Fonte: CLAP (OPS/OMS), 1991.

2. Longitude da Espinha Dorsal (LED), medida a partir de um de vida, permitindo um diagnóstico retrospectivo da idade
RX de tórax: distância entre margem superior da 1ª vértebra gestacional. Abaixo de 32 semanas, há uma superestimativa
torácica e margem inferior da 12ª vértebra torácica. A corre- de 1 semana.
lação entre este método não se altera durante a 1ª semana
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Longitude da Espinha Dorsal (LED) em mm


LED IGEST LED IGEST LED IGEST LED IGEST
50 22.8 63 27.3 76 32.7 89 38.0
51 23.1 64 27.6 77 33.1 90 38.6
52 23.5 65 27.9 78 33.5 91 38.9
53 23.8 66 28.3 79 33.8 92 39.3
54 24.2 67 28.6 80 34.2 93 39.6
55 24.5 68 29.0 81 34.5 94 40.0
56 24.8 69 29.3 82 34.8 95 40.3
57 25.2 70 29.7 83 35.2 96 40.7
58 25.6 71 30.0 84 35.5 97 41.0
59 25.9 72 30.4 85 35.9 98 41.4
60 26.3 73 31.0 86 36.2 99 41.7
61 26.6 74 32.1 87 36.6 100 42.0
62 26.8 75 32.4 88 37.0
Fonte: Martell et al. (1997).

New Ballard Score (NBS) – 1991 Estudo recente de Donovan et al. (1999), a cada semana (de 22 a
28 semanas de idade gestacional pela história menstrual precoce), o NBS
O NBS é um método de avaliação da idade gestacional (IG) do re-
excedeu a idade gestacional por 1,3 a 3,3 semanas, havendo uma grande
cém-nascido (RN) por meio da análise de seis parâmetros neurológicos
variabilidade (6,8 a 11,9 semanas). Vejam, assim, que, na ausência de pré-natal
(postura, ângulo de flexão do punho, retração do braço, ângulo poplíteo,
iniciado precocemente, deve ser suspeita a acurácia da avaliação da idade
sinal do xale, calcanhar-orelha) e seis parâmetros físicos (pele, lanugo,
gestacional nos RNs pré-termos extremos.
superfície plantar, glândula mamária, olhos/orelhas, genital masculino,
genital feminino), a cada um dos quais se atribui uma pontuação que,
na somatória, determinará a estimativa da idade gestacional. Este é um Maturidade neuromuscular
método modificado da versão original, sendo agregados alguns itens, Postura:
permitindo, assim, a avaliação de RN com IG a partir de 20 semanas. A cor- Enquanto a maturação progride, o feto assume gradualmente o
relação entre o NBS e a IG calculada pela amenorreia é de 0,97; para o RN tônus passivo dos flexores que progridem em um sentido centrípeto e
< 26 semanas, esta correlação foi mantida quando o método foi aplicado caudal-cranial, com extremidades inferiores ligeiramente antes das ex-
nas primeiras 12 horas de vida. tremidades superiores. Conforme o termo se aproxima, o RN apresenta
Vantagens: progressivamente menos oposição ao tônus flexor; assim, a postura fletida
• Mais rápido que o método de Dubowitz. é um indício de maturação cerebral.
• Pode ser realizado em RNs doentes. Com o RN em repouso, observar a atitude dos quatro membros:
• Inclui RNs com IG até 20 semanas. 0. Deflexão total dos quatro membros.
80 • Pode ser realizado em até 96 horas de vida. 1. Flexão ligeira dos quadris e joelhos.
Inconveniente: 2. Flexão moderada ou acentuada dos membros inferiores e
O NBS superestima significativamente em 0,6 a 1,7 semana a IG de discreta flexão do antebraço.
RNs entre 32 e 37 semanas de IG, sendo atribuído ao estresse intrauterino, 3. Membros inferiores em flexão, quadris abduzidos, com mem-
que acelera a maturação fetal. bros superiores com alguma flexão (posição de batráquio).
4. Os quatro membros apresentam flexão igual e forte.

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM
SINAL
DO SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Postura                                 

Ângulo de flexão do punho – flexionar a mão sobre o punho, exer-


cendo pressão suficiente para obter o máximo de flexão possível. Medir o
ângulo entre a iminência hipotenar e a face anterior do antebraço.
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM
 SINAL
DO SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Ângulo de
flexão do             
punho

Retração do braço – flexionar ao máximo o antebraço durante 5 Atentar para não prender o braço na posição estendida por um período
segundos; depois, estender ao máximo através de tração das mãos, sol- prolongado, porque isto causa fadiga, e os resultados serão falsamente
tando em seguida, observando o ângulo entre o braço e o antebraço. baixos devido ao pobre recolhimento do flexor.

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM DO
SINAL
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Retração do
                                
braço

81

Ângulo poplíteo – com o RN em supino, sem fralda e com a pelve Tomar cuidado para não exercer pressão nas extremidades, porque isto
apoiada na superfície da mesa de exame, a coxa é colocada delicadamen- pode interferir no exame. A perna é estendida até que uma resistência
te sobre o abdome com o joelho flexionado inteiramente. Depois que o definitiva à extensão seja percebida. Neste momento, o ângulo formado
infante relaxou nesta posição, o examinador segura delicadamente o pé no joelho entre a perna e a coxa é medido.
pelos lados com uma mão e suporta lateralmente a coxa com a outra.

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM
 SINAL
DO SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Ângulo
 
poplíteo
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Sinal do xale – com o RN em supino, o examinador ajusta a cabeça -1: cotovelo na linha axilar contralateral.
na linha média e segura a mão do infante, estabilizando o tórax com a 0: cotovelo na linha mamilar contralateral.
outra mão ao mesmo tempo em que o polegar é colocado no cotovelo. O
examinador conduz o cotovelo através da caixa torácica, sentindo a flexão 1: cotovelo no processo xifoide.
passiva ou a resistência à extensão dos músculos flexores posteriores da 2: cotovelo na linha mamilar ipsilateral.
cintura escapular; o ponto na caixa torácica para que o cotovelo se move 3: cotovelo na linha axilar ipsilateral.
facilmente antes da resistência significativa é anotado.

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM DO
 SINAL
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Sinal do
                    
xale

Manobra de calcanhar-orelha – o RN é colocado em supino e a 0: nariz.


extremidade inferior flexionada é trazida para descansar no colchão ao 1: queixo.
lado do tronco do infante. O examinador suporta a coxa lateralmente ao
lado do corpo com a palma de uma das mãos. A outra mão é usada para 2: mamilo.
82 3: umbigo.
segurar o pé e puxá-lo para a orelha ipsilateral. A posição do calcanhar
onde a resistência significativa é percebida deve ser anotada.
4: linha femoral.
-1: orelha.

CONTAGEM DA MATURIDADE NEUROMUSCULAR


CONTAGEM
SINAL
DO SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Calcanhar à orelha    

Maturidade física ou descamada, podendo-se desenvolver um rash enquanto a maturação


fetal progride. Para pontuar, o quadrado que descreve melhor o aspecto
Pele:
da pele deve ser selecionado.
A maturação da pele fetal envolve o desenvolvimento de suas estru-
turas intrínsecas simultaneamente à perda gradual de seu revestimento
protetor, o vérnix caseoso. Então, ela engrossa, seca e torna-se enrugada e/
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


SINAL CONTAGEM DO SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Rash ou Apergaminha-
Pegajosa, Gelatinosa, Homogenea- Descamação Coriácea, fissu-
descamação da, fissuras
Pele friável, trans- vermelha, mente rosa, grosseira, veias ras profundas,  
superficial, profundas,
parente translúcida  veias visíveis raras enrugada
poucas veias sem vasos

Lanugo: enquanto o corpo fetal se curva para frente ao longo do processo de


Lanugo é o cabelo fino que cobre o corpo do feto. No prematuro maturação, assumindo a posição fletida. As áreas “calvas” surgem e tor-
extremo, a pele não apresenta lanugo. Ele começa a aparecer aproxima- nam-se maiores sobre a área lombo-sacra. No termo, a maioria do dorso é
damente na 24a a 25a semanas e é geralmente abundante, especialmente desprovida de lanugo. Ao pontuar para o lanugo, o examinador seleciona
entre os ombros e na parte superior do dorso, na 28a semana da gestação. o quadrado que descreve melhor as quantidades relativas de lanugo nas
A rarefação ocorre primeiro na parte mais baixa do dorso, desgastando-se áreas superiores e mais baixas da parte traseira do infante.

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


SINAL
SINAL
CONTAGEM
-1 0 1 2 3 4 5

Na maior
  Lanugo      Nenhum      Escasso   Abundante Lanugo fino Áreas calvas          
parte calva
  83

Superfície plantar: relacionado à flexão do pé intraútero e à desidratação da pele. Os infantes


muito prematuros e extremamente imaturos não têm nenhum sulco
Este tópico refere-se aos sulcos principais na planta do pé. Os pri-
detectável no pé. Para auxiliar na definição da idade gestacional destes
meiros sulcos aparecem na porção anterior da planta do pé. Isto pode ser
infantes, usa-se a medida do comprimento do pé.

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


CONTAGEM DO
SINAL
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

 Calcanhar-
> 50 milíme- Sulcos na Sulcos nos Sulcos em
Superfície de -dedo do pé Marcas
tros, superfície 2/3 ante- toda a super-             
plantar 40-50mm: -1 tênues
sem marcas anterior riores fície plantar
< 40mm: -2
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Glândula mamária: rio abaixo da pele, prendendo-o entre o polegar e o indicador, estimando
A glândula mamária consiste no tecido do peito, que é estimula- seu diâmetro em milímetros, e selecionando o quadrado apropriado na
do para crescer por estrógenos maternos, e pelo tecido adiposo, que é folha da contagem.
dependente do status nutritivo fetal. O examinador anota o tamanho da Sub ou sobrenutrição do feto pode afetar o tamanho do peito para
aréola e a presença ou a ausência de borda (criada pelo desenvolvimento a idade gestacional. O efeito materno do estrogênio pode produzir a
das papilas de Montgomery). O examinador deve palpar o tecido mamá- ginecomastia neonatal do segundo ao quarto dias de vida extrauterina.

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


SINAL
SINAL
CONTAGEM
-1 0 1 2 3 4 5

Aréola Aréola
Aréola parcialmen- elevada, Borda eleva-
Impercep- Pouco
Peito lisa, sem te elevada, da, glândula                           
tível perceptível glândula
glândula glândula 5-10 mm
1-2 mm 3-4 mm

Olhos e orelhas: o quadrado que descreve melhor o grau de desenvolvimento cartilagi-


noso. Em RNs extremamente prematuros, anotar o estado de desenvol-
84 O pavilhão auricular fetal muda de configuração e aumenta a quan-
vimento da pálpebra como um indicador adicional da maturação fetal:
tidade de cartilagem enquanto a maturação progride. A avaliação inclui
a palpação da espessura da cartilagem, dobrando, então, o pavilhão para frouxamente aderidas no caso de uma ou ambas poderem ser separadas
frente e soltando-a. O examinador observa a velocidade com que a orelha com leve tração, e fortemente aderidas quando ambas as pálpebras não
dobrada retorna à posição de repouso quando liberada; selecionar, então, são separadas por leve tração.

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


SINAL
SINAL
CONTAGEM
-1 0 1 2 3 4 5

Pavilhão Pavilhão
Pálpebras Pavilhão
Pálpebras comple- comple-
fundidas parcialmente
abertas, pa- tamente tamente Cartilagem
frouxamente: encurvado,
Olho/orelha vilhão plano encurvado, encurvado, grossa,            
-1; mole com
permanece mole com firme com orelha firme
firmemente: recolhimento
dobrado recolhimento recolhimento
-2 lento
rápido instantâneo
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


CONTAGEM DO
SINAL
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Testículo Testículo Bolsa escrotal


Testículo Testículos na
Genital Escroto fora da bolsa no canal em pêndulo,
descendo, bolsa, rugas                   
(macho) plano, liso escrotal, superior, rugas pro-
poucas rugas bem visíveis
sem rugas rugas raras fundas

Genital masculino: 32a semana. Ambos os testículos são geralmente palpáveis ao longo dos
Os testículos fetais começam sua descida da cavidade peritoneal à canais inguinais ao fim da 33a até a 34a semanas. Simultaneamente, a pele
bolsa escrotal aproximadamente na 30a semana de gestação. O testículo escrotal engrossa e desenvolve rugas mais profundas e mais numerosas.
esquerdo precede o direito e alcança o escroto geralmente durante a

Genital feminino: lábios tornam-se mais proeminentes. Aproximando o termo, o clitóris e os


Para examinar a menina, os quadris devem ser parcialmente abdu- pequenos lábios retraem e podem ser envolvidos pelo desenvolvimento
zidos, isto é, a aproximadamente 45° da horizontal com a RN em supino. dos grandes lábios.
A abdução exagerada pode fazer com que o clitóris e os pequenos lábios Os grandes lábios contêm gordura e seu tamanho é afetado pela 85
pareçam mais proeminentes. Por outro lado, a adução pode fazer com que nutrição intrauterina. A sobrenutrição pode resultar no desenvolvimento
os grandes lábios cubram essas estruturas. precoce dos grandes lábios. Por outro lado, a subnutrição, a restrição do
Na prematura extrema, os lábios são planos e o clitóris é muito crescimento intrauterino e o pós-datismo podem resultar em grandes
proeminente e pode assemelhar-se ao falo masculino. Enquanto a ma- lábios hipodesenvolvidos e clitóris e pequenos lábios relativamente proe-
turação progride, o clitóris torna-se menos proeminente e os pequenos minentes tardiamente na gestação.

CONTAGEM FÍSICA DA MATURIDADE


CONTAGEM DO
SINAL
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5

Lábios
Clitóris Clitóris Lábios maio-
menores Lábios maio-
Clitóris proeminen- proeminente, res recobrem
Genital e maiores res grandes
proeminente, te, lábios pequenos o clitóris    
(fêmea) igualmente e menores
lábios planos menores lábios e lábios
proeminen- pequenos
pequenos evidentes menores
tes
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Resultado
Usar esta ficha da contagem para avaliar a maturidade
gestacional de seu bebê. Na ex tremidade do exame, a conta-
gem total determina a maturidade gestacional nas semanas.

CONTAGEM CONTAGEM DO
SINAL
-1 0 1 2 3 4 5 SINAL

Postura      

Ângulo de flexão
   
do punho

Retração do
     
braço

Ângulo poplíteo  

Sinal do Xale    

Calcanhar à
 
orelha

CONTAGEM TOTAL DE NEUROMUSCULAR  

86 CONTAGEM
CONTAGEM DO
  SINAL SINAL
-1 0 1 2 3 4 5
Rash ou Apergaminha-  
Pegajosa, Gelatinosa, Homogenea- Descamação Coriácea, fissu-
descamação da, fissuras
Pele friável, trans- vermelha, mente rosa, grosseira, veias ras profundas,
superficial, profundas,
parente translúcida  veias visíveis raras enrugada
poucas veias sem vasos
 
Na maior
Lanugo     Nenhum      Escasso   Abundante Lanugo fino Áreas calvas  
parte calva
 
 Calcanhar-de-  
> 50 milíme- Sulcos na Sulcos em
Superfície do do pé Sulcos nos 2/3
tros Marcas tênues superfície toda a superfí-
Plantar 40-50mm: -1; anteriores
sem marcas anterior cie plantar
< 40 mm: -2
Aréola Aréola  
parcialmente elevada, Borda elevada,
Pouco Aréola lisa
Peito Imperceptível elevada, glândula
perceptível sem glândula glândula
glândula 5-10 mm
1-2 mm 3-4 mm
Pavilhão Pavilhão com- Pavilhão com-  
Pálpebras Pálpebras
parcialmente pletamente pletamente
fundidas abertas, pa- Cartilagem
encurvado, encurvado, encurvado,
Olho/orelha frouxamente: vilhão plano grossa,  
mole com mole com firme com
-1; permanece orelha firme
recolhimento recolhimento recolhimento
firmemente: -2 dobrado
lento rápido instantâneo
Testículo Bolsa escrotal  
Testículo no Testículo Testículos na
Genital Escroto fora da bolsa em pêndulo,
canal superior, descendo, bolsa, rugas  
(macho) plano, liso escrotal, rugas profun-
rugas raras poucas rugas bem visíveis
sem rugas das
Clitóris Lábios  
Clitóris Lábios meno- Lábios maio-
Clitóris proeminente, maiores
Genital proeminente, res e maiores res grandes
proeminente, pequenos recobrem o  
(fêmea) lábios meno- igualmente e menores
lábios planos lábios eviden- clitóris e lábios
res pequenos proeminentes pequenos
tes menores
CONTAGEM FÍSICA TOTAL DA MATURIDADE  
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

Avaliação da maturidade:

TOTAL SCORE 
SEMANAS
(NEUROMUSCULAR + PHYSICAL)

-10 20
-5 22
0 24
5 26
10 28
15 30
20 32
25 34
30 36
35 38
40 40
45 42
50 44

Consideramos a idade gestacional obstétrica se a ecografia foi rea- • RN Grande para a Idade Gestacional (GIG): peso acima do
lizada precocemente (até 12 semanas) e se a diferença em relação à do percentil 90.
exame físico for ≤ 2 semanas. Consideramos a idade gestacional do exame • RN Adequado para a Idade Gestacional (AIG): peso entre
físico se a mãe não tem ecografia precoce ou se a diferença em relação à os percentis 10 e 90.
idade gestacional obstétrica for ≥ 2 semanas. • RN Pequeno para a Idade Gestacional (PIG): peso abaixo
Em estudo sobre a viabilidade e a segurança de um novo dispositivo do percentil 10.
médico, o Preemie-Test se propõem a estimar a idade gestacional através
da pele do recém-nascido.
Estudo na Unidade de Neonatologia do Hospital Materno Infantil
de Brasília (HMIB), realizado por Castro e Moura (2020) em 98 casos, ve-
rificou a concordância entre esse método e o cálculo da data da última
menstruação (DUM) e o ultrassom precoce. Comparando com a IG pela
DUM e ultrassom precoce, mostrou uma sensibilidade de 100%, especi-
ficidade de 95,8% com um valor preditivo negativo de 99,1%. Não houve
diferença estatística entre a média da IG no modelo testado e confirmado.
A correlação (Spearman) foi de 0,99, com diferença entre as duas medidas 87
de apenas quatro dias.

Classificação do
recém-nascido
Qualquer dos métodos usados para obter a idade gestacional per-
mite classificar os RNs em:
• Pré-termos: idade gestacional inferior a 37 semanas.
• A termo: idade gestacional entre 37 e 41 semanas e 6 dias.
• Pós-termo: idade gestacional igual ou maior que 42 semanas.
Quando associamos o peso à idade gestacional, o RN é classificado Fonte: Margotto (1995).
segundo o seu crescimento intrauterino em (veja figura a seguir):
Adotamos, na Unidade de Neonatologia do Hospital Regional da Asa Sul (HRAS), o padrão de crescimento intrauterino elaborado por Margotto (1995),
estudo este feito com uma população de RNs saudáveis entre 29 e 44 semanas nascidos na Maternidade do HRAS (8.271 RNs vivos entre 01/07/1989 a
01/03/1991), sendo reduzido para 4.413 RNs após a exclusão dos principais fatores interferentes no crescimento intrauterino (figura 1 e tabelas 1 a 7).
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

88
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

89
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

90

Tabela 7 - As médias para o peso, estatura, perímetro cefálico, peso da placenta, índice ponderal
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

Para a classificação dos recém-nascidos entre 24 e 28 semanas: oncológica, renal, endócrina ou autoimune. Gestantes que tiveram san-
Foi realizado um estudo de longitudinal de caráter observacional, gramento grave, com comprometimento hemodinâmico e necessidade
envolvendo RNs prematuros nascidos na Maternidade do HMIB, no perío- de hemotransfusão e gestantes portadoras de hipertensão crônica sem
do de novembro/2013 a setembro/2017. A amostra envolveu prematuros pré-eclâmpsia sobreposta.
com idade gestacional entre 24 e 28 semanas e 6 dias, avaliada conforme Foram incluídas as gestantes portadoras de hipertensão gestacional
história materna e ecografia precoce e exame físico do RN. diagnosticada após a 20ª semana de IG com ou sem proteinúria.
Foram excluídos: gemelares, portadores de malformações congê- Calcularam-se as médias, os desvios padrão e os percentis 5, 10, 25,
nitas maiores, infecções congênitas, doença hemolítica neonatal, além 50, 75, 90 e 95 do peso ao nascer, o comprimento e o perímetro cefálico,
dos RNs cujas mães eram tabagistas ou usuárias de drogas ilícitas, dia- de acordo com a idade gestacional, para construção das tabelas.
béticas, portadoras de anemia crônica ou patologia crônica de natureza
Tabela 8 – Peso ao nascer – ambos os sexos

Tabela 9 – Comprimento – ambos os sexos

91
Tabela 10 – Perímetro cefálico – ambos os sexos

Restrição do Crescimento Intrauterino (RCIU): • Infecções perinatais crônicas (rubéola, citomegalia, toxoplas-
mose, doença de Chagas).
A frequência do RCIU está entre 10% e 15% dos nascimentos. Nos
• Anomalias congênitas.
países subdesenvolvidos, 2/3 dos RNs de baixo peso (peso inferior a 2500
• Insuficiente ganho ponderal materno.
g) apresentam RCIU. Os fatores de risco mais comumente associados ao
• Sangramento persistente no 2o trimestre de gestação.
RCIU são os seguintes:
• Consumo de álcool.
• Hábito de fumar. • Desnutrição materna.
• Hipertensão arterial crônica ou gestacional. De acordo com o tempo em que se teve início o insulto perinatal,
• Gestação múltipla. poderá haver, também, comprometimento da estatura e do perímetro
• Antecedentes de RCIU. cefálico (PC).
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Peso, estatura e PC: diferentes tempos em que ocorrem os picos de crescimento

92
Para o RN GIG

Restrição do Crescimento Intrauterino (RCIU) e Pequeno para a


Idade Gestacional (PIG):
Nem todo RN com RCIU é PIG, assim como nem todo RN PIG tem Em estudo realizado por Margotto PR et al. (1999) em 200 RNs no
RCIU. A condição RCIU é definida como um deficiente crescimento e de- Setor de Terapia Intensiva da Unidade de Neonatologia do Hospital Regio-
senvolvimento do embrião/feto durante a gravidez, sendo detectado pela nal da Asa Sul, com as suas respectivas placentas, observamos associações
diminuição na velocidade do crescimento identificada pelo ultrassom se- significativas entre anemia materna e placenta PIG (RR = 3,90; IC 95%:
riado. Assim, um RN com peso abaixo do percentil 10 não necessariamente 1,42 - 10,69), RN PIG com placenta PIG e doença hipertensiva especifica
é um RN com RCIU, pois pode corresponder a um RN normal, porém com de gravidez (RR = 4,16; IC 95%: 2,23 - 7,78), assim como com os achados
baixo potencial de crescimento. Também não é verdade que todo RN com anátomo-patológicos (RR = 8,7; IC 95%: 4,67 - 16,21). RN GIG com placenta
peso entre os percentis P10 e P90 corresponde a um RN com crescimento GIG e hipoglicemia (RR = 10,2; IC 95%: 4,94 - 20,32), RN PIG com placenta
normal (pode corresponder a um produto com crescimento no P90 que GIG/AIG e infecção inespecífica (RR = 1,62 - IC 95%: 1,10 - 2,40).
desacelerou para o P15). Ananth e Vintzileos (2000) sugerem  que, em
gestações pré-termo mais precoces, a definição de PIG pode ser definida Portanto, é necessário que o médico que assiste o RN, em especial
como RCIU. Já os RNs  PIG concebidos a termo têm maior probabilidade na sala de parto, tenha o conhecimento das associações de alterações do
de ser constitucionalmente pequenos. crescimento fetal e placentário para uma adequada assistência destes RNs
e a correlação direta destas associações com patologias perinatais.
Crescimento da placenta:
Observações:
O crescimento placentário cessa quando o feto e a placenta atin-
gem, respectivamente, 2300 g e 300g (sem cordão e membranas), aproxi- Idade gestacional pós-concepcional:
madamente após a 36ª semana de gestação. (IGpc): tempo transcorrido desde o nascimento do bebê (idade
O maior interesse em avaliar o peso da placenta consiste em detec- gestacional + tempo em semanas de vida pós-natal).
tar discrepância entre o peso placentário e o fetal, em particular nos RNs Idade gestacional corrigida:
com RCIU: (IGc): tempo transcorrido em semanas após o bebê prematuro ter
atingido 40 semanas.
– CAPÍTULO 3 | 3.4. AVALIAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL –

Exemplo: RN com idade gestacional de 29 semanas. Transcorridas Curva de peso


12 semanas, a sua IGpc é: 29 + 12 = 41 semanas, e a IGc é de 1 semana
(é como se ele tivesse 7 dias de vida se não tivesse nascido prematuro).
Então: IGc = IGpc – 40.
Curvas de crescimento intrauterino

Curva ponderal

Fonte: Margotto (1995).

Curva da placenta

93

Curva de crescimento
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS


E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU
Rosângela Cândido Marinho, Vitória Simões, Maria Luiza Almada, Miza Vidigal, Hélida Maia

a. Promover o aleitamento materno.


Introdução b. O alojamento conjunto possibilita a atenção integral à saúde
Até o início do século passado, o lugar natural dos recém-nascidos da mulher e do RN, por parte do serviço de saúde.
(RNs) era junto de suas mães, já que nasciam em suas próprias casas. Os O sistema de berçário tradicional separa o RN de sua mãe, impedin-
hospitais existentes tinham recursos técnicos tão escassos que faziam do o aleitamento em livre demanda, contribuindo para o aumento nos
pouco a mais do que era feito na própria residência dos pacientes. Neste índices de desmame.
contexto, mesmo os grandes hospitais que iam surgindo com o desen- Em sistema de alojamento conjunto (AC), os RNs mamam com mais
volvimento das ciências médicas, eram construídos sem locais destinados frequência, o que leva à apojadura mais precoce e ao pleno estabeleci-
aos recém-nascidos. mento da lactação antes da alta. É nos primeiros dias pós-parto que se
Crê-se que o primeiro berçário foi construído em 1893, em Paris, evidenciam as dificuldades circunstanciais (fissuras, pega incorreta, ma-
destinado aos bebês “débeis”, por Madame Henry, enfermeira-chefe da milos planos etc.), as quais poderão ser vencidas com o auxílio de pessoal
Casa de Partos, onde já se usava incubadoras rudimentares. Este berçário especializado e apto a detectá-las.
tomou impulso anos mais tarde, com o obstetra francês Pierre Budim, con- A amamentação precoce provoca a contração do útero e de seus
siderado um dos pais da Neonatologia. Um de seus maiores legados foi a vasos, atuando como profilaxia em hemorragias pós-parto, diminuindo o
constatação de que crianças não amamentadas ao seio ficavam sujeitas a risco de anemia e infecção puerperal.
afecções do tubo digestivo, e as que não recebiam carinho da mãe eram • Supervisão da adaptação à vida extrauterina:
mais sujeitas ao abandono. A mãe é a pessoa mais atenta no que diz respeito ao seu RN, sendo
No início do século XX, já havia promissoras fórmulas lácteas para de grande auxílio na detecção precoce de distúrbios que este possa vir a
alimentar RNs internados e progressos satisfatórios foram conseguidos apresentar, permitindo a pronta intervenção médica (apneia, taquipneia,
com as incubadoras, visando isolar e aquecer os RNs. Essas novas técnicas cianose, hipoglicemias etc.).
deram credibilidade às instituições, havendo, então, disseminação de • Favorecimento do vínculo mãe-filho:
medidas rigorosas de isolamento com o intuito de reduzir o manuseio, as A mãe é o principal agente de estimulação do bebê, uma vez que o
visitas e, consequentemente, a contaminação dos RNs, o que levou a um contato entre os dois é íntimo e frequente. O AC permite essa interação,
definitivo afastamento entre mães e filhos, até mesmo dos considerados favorecendo o estabelecimento de vínculos afetivos, indispensáveis para o
saudáveis. desenvolvimento afetivo-emocional e social, ao longo de toda a infância.
Nos anos 1940, a sociedade estava se voltando para a saúde mental • Redução na incidência de infecção no RN:
e pediatras e psiquiatras apresentaram trabalhos sobre distúrbios psicoló- O AC retira o RN de dentro dos berçários tradicionais, em geral
94 gicos da mãe e do bebê, confirmando a suspeita de que a separação logo muito populosos, diminuindo suas chances de colonização e infecção
após o nascimento deixa as mães despreparadas para cuidar e amamentar por germes hospitalares. Além disso, ao favorecer o aleitamento, contribui
seus filhos, bem como bebês insatisfeitos, levando à  repercussão negativa para a melhoria precoce de seu perfil imunológico graças à transmissão
em seu desenvolvimento emocional futuro. de agentes imunologicamente competentes via leite materno.
Com o propósito de humanizar o nascimento, promover o aleita- • Promoção do bem-estar familiar:
mento e trazer o bebê para junto da mãe, foi criado, em 1946, o projeto Ao permitir visitas de outros membros familiares, o AC ajuda a inse-
“Alojamento Conjunto”, por Edith Jackson, no Grace New Haven Hospital. rir o novo membro no contexto familiar, melhorando a qualidade de seu
Esse experimento teve resultados positivos, com grande repercussão entre acolhimento na chegada ao lar, e, principalmente, a perfeita integração do
os pais, a comunidade médica e a sociedade em geral, que, então, passou trinômio pai-mãe-filho. Favorece o intercâmbio biopsicossocial entre a mãe,
a insurgir contra os hospitais que insistiam em manter os RNs totalmente a criança e os demais membros da família, reforçando a unidade familiar.
isolados, renegando a “promiscuidade” de mães e filhos. Estava instituído
de forma definitiva o alojamento conjunto. • Possibilita orientação à mãe e ao acompanhante (fami-
liar) pela equipe interdisciplinar:
No Brasil, a primeira experiência de implantação e utilização do É no AC que a mãe receberá orientações adequadas para que se tor-
alojamento conjunto deu-se em 1971, no Primeiro Hospital Distrital de ne autoconfiante a fim de cuidar de seu bebê integralmente (higienização,
Brasília (hoje Hospital de Base do Distrito Federal – HBDF), por Ernesto cuidados com o coto umbilical, alimentação etc.). Deverá, também, ser
Silva, apesar de já existirem Santas Casas de Misericórdia nas cidades do conscientizada a respeito do possível surgimento de sentimentos dúbios
interior que mantinham os bebês com as mães. (ansiedade, cansaço, medo, baixa autoestima etc.) e receber ajuda para
Em 1977, a 5ª Reunião de Perinatologia do Ministério da Saúde saber como lidar com eles, eliminando quaisquer sentimentos de culpa.
recomendou que os bebês sem risco deveriam ficar ao lado de suas mães, Ao participar ativamente da visita médica para o exame do bebê,
e não mais em berçários. a mãe tem a oportunidade de trocar informações com o pediatra, tirar
Em 1982, foi realizado o I Encontro sobre Alojamento Conjunto em dúvidas e compreender melhor o comportamento do RN.
Brasília, criando as normas básicas para a organização do sistema de alo- • Favorece trocas de experiência entre as mães.
jamento conjunto a serem cumpridas por todas as unidades hospitalares • Aumenta o número de crianças acompanhadas no servi-
do país. ço.
Finalmente, em 1993, foi feita a portaria ministerial (MS/GM nº 1.016, • Para a equipe de saúde:
de 26 de agosto), publicada no Diário Oficial da União nº 167, de 1º de Permite o treinamento da equipe, favorecendo o conceito da
setembro de 1993, aprovando as normas básicas para a implantação do superioridade da saúde familiar sobre os cuidados individuais; diminui o
sistema de alojamento conjunto em todo o território nacional. risco de infecção hospitalar e otimiza a utilização das unidades de risco
Em 2016, a Portaria nº 167, de 1º de setembro de 1993, foi revogada neonatal; permite uma melhor integração entre as equipes obstétricas e
pela Portaria nº 2.068/GM/MS, que instituiu novas diretrizes para atenção neonatais.
integral e humanizada à mulher e ao RN no alojamento conjunto.
Admissão
Definição O binômio mãe-filho ingressará no setor de alojamento conjunto
O alojamento conjunto é o local em que a mulher e o RN sadio, logo procedente da sala de parto ou do setor de cuidados intermediários, na
após o nascimento, permanecem juntos, em tempo integral, até a alta. ausência de patologia que contra indique seu contato imediato.
Mães atendidas no alojamento conjunto:
Mulheres que, no pós-parto, encontram-se em boas condições de
Objetivos saúde física e mental.
– CAPÍTULO 3 | 3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU –

A permanência do binômio em alojamento conjunto deve ser Recomenda-se a permanência mínima de 24 horas em alojamento
dinâmica, permitindo que o AC seja iniciado, suspenso e recomeçado a conjunto, momento a partir do qual a alta pode ser considerada, desde
qualquer hora, dependendo das condições físicas e emocionais da mãe que preenchidos os critérios abaixo listados:
e do RN. Recém-nascido:
Ao ingressar no alojamento conjunto, a mãe deverá receber infor- • A termo e com peso adequado para a idade gestacional, sem
mações verbais e por escrito sobre o funcionamento deste setor. comorbidades e com exame físico normal.
• Com ausência de icterícia nas primeiras 24 horas de vida.
RNs atendidos no alojamento conjunto normal: • Com avaliação de icterícia, preferencialmente transcutânea,
(PRT MS/GM 2.068/2016, Art. 4º) para avaliar a necessidade de acompanhamento dos níveis de
bilirrubina, quando necessário (consulte o capítulo sobre Hiper-
• Peso ≥ 1800 g.
bilirrubinemia Neonatal).
• Idade gestacional ≥ 34 semanas.
• Apresentando diurese e eliminação de mecônio espontâneo e
• Boa vitalidade e capacidade de sucção e deglutição e controle
controle térmico adequado.
térmico.
• Com sucção ao seio, com pega e posicionamento adequados,
De acordo com o Ministério da Saúde, sugere-se que, periodica-
com boa coordenação sucção/deglutição, salvo em situações
mente, sejam realizadas as seguintes avaliações:
em que há restrições ao aleitamento materno.
a. Dos resultados quanto ao incentivo do aleitamento materno. • Em uso de substituto do leite humano/fórmula láctea para si-
b. Do desempenho da equipe. tuações em que a amamentação é contraindicada, de acordo
c. Da aceitação do sistema pela mãe e pelos familiares. com atualização OMS/2009 “Razões Médicas Aceitáveis para
d. Dos resultados quanto à morbimortalidade neonatal dentro uso de Substitutos do Leite”.
do serviço.
e. Dos conhecimentos maternos quanto aos cuidados das crian-
ças. Exames de triagem neonatal
a. Triagem auditiva (teste da orelhinha).
Normas gerais b. Oximetria de pulso (teste do coraçãozinho).
c. Triagem ocular (teste do reflexo vermelho ou teste do olhinho).
a. Os cuidados ao RN, como exame físico, banho e higienização, d. Triagem biológica (teste do pezinho).
devem ser realizados no próprio setor de AC. Procedimentos
como coletas de sangue e curativos serão realizados num local Teste da orelhinha:
reservado. A triagem auditiva propicia a detecção precoce de alterações audi-
b. As mães serão gradualmente treinadas pela equipe quanto à tivas capazes de interferir na qualidade de vida do indivíduo. A detecção
amamentação por livre demanda, higienização, cuidados com deve ser realizada o mais precocemente possível, preferencialmente antes
o coto umbilical etc. dos 3 meses de idade, a fim de que a intervenção possa ser iniciada até
c. A visita médica deve ser diária, pela manhã, com reavaliação os 6 meses.
dos bebês de risco à tarde e/ou noite (RN com risco para
hipoglicemia, icterícia precoce, mães com dificuldade para O procedimento de triagem auditiva envolve o conhecimento dos
amamentar etc.). indicadores de risco para a deficiência auditiva (IRDA) e a observação
comportamental auditiva do neonato. A observação é realizada pelo
fonoaudiólogo e se estende a todo o berçário. A triagem neonatal é reali- 95
Visita pediátrica zada em alojamento conjunto, assumindo a finalidade de triagem auditiva
neonatal, em que pelo menos 95% dos nascidos são avaliados. O objetivo
a. Conversa com a mãe.
é a triagem universal neonatal.
b. Avaliação das mamas e da mamada.
c. Orientações. Os procedimentos eletrofisiológicos selecionados para a triagem
envolvem a realização de emissões otoacústicas evocadas (EOAE) e audio-
Conversa com a mãe: metria de tronco encefálico (AABR, BERA triagem).
Quando da visita diária no alojamento conjunto ao binômio mãe- Quando o teste da orelhinha é falho, há um reteste em 15 dias. Em
-RN, é importante que, antes de realizar o exame físico do RN, se converse caso de negativa para ambos, realiza-se BERA triagem, no mesmo local.
com a mãe, enfatizando as seguintes questões, que, algumas vezes, a Ao transcrever o resultado dos testes na caderneta de saúde, as
parturiente não informou na sala de perto: mães são orientadas, no momento da alta, como deve ser e ocorrer o
• Uso de medicamentos durante a gestação (qual e há quanto desenvolvimento de fala e linguagem.
tempo). Teste do coraçãozinho:
• Realização de ultrassom morfológico.
• Explicar a classificação do RN e os controles realizados quando Realizado através da oximetria de pulso. O tempo gasto na sua reali-
for necessário (ex.: glicemia, peso etc.). zação é inferior a 4 minutos. Deve haver um treinamento dos profissionais
• Informar a TS do RN e explicar quando houver incompatibili- antes da sua implantação.
dade sanguínea. Cerca de um a dois em cada 1.000  RNs vivos apresentam cardiopa-
• Se o RN recebe leite materno exclusivo ou recebe também tia congênita crítica. Em torno de 30% destes RNs recebem alta hospitalar
complemento. sem o diagnóstico, e evoluem para choque, hipoxia ou óbito precoce,
• Se apresenta dificuldade nas mamadas ou alguma alteração antes de receberem tratamento adequado.
durante (tais como cianose e/ou cansaço). • Local de aferição: membro superior direito e em um dos
• Observou a presença de diurese e mecônio. membros inferiores. Para a adequada aferição, é necessário
Avaliação das mamas e da mamada: que o recém-nascido esteja com as extremidades aquecidas e
• Observar o tipo dos mamilos (protuso, plano ou invertido). o monitor evidencie uma onda de traçado homogêneo.
• Observar a presença de colostro. • Momento da aferição: entre 24 e 48 horas de vida, antes da
• Observar a presença de fissura. alta hospitalar.
• Solicitar que coloque o RN no seio materno e observar posi- • Resultado normal: saturação periférica maior ou igual a 95%
cionamento, pega e sucção. em ambas as medidas (membro superior direito e membro
Orientações na enfermaria: inferior) e diferença menor que 3% entre as medidas do mem-
• Ofertar leite materno exclusivo (LME) em livre demanda. bro superior direito e membro inferior.
• Não oferecer bicos ou chupeta. • Resultado anormal:  caso qualquer medida da SatO2 seja
• Proibida amamentação cruzada. menor que 95% ou houver uma diferença igual ou maior que
• RN dormir somente no seu berço e na posição supina. 3% entre as medidas do membro superior direito e membro
• Limpeza do coto umbilical somente com álcool 70%. inferior, uma nova aferição deverá ser realizada após 1 hora.
Caso o resultado se confirme, um ecocardiograma deverá ser
realizado dentro das 24 horas seguintes.
Alta hospitalar • Limitações:  este teste  apresenta  sensibilid de  de  75%  e  es-
pecificidade  de  99%.  Sendo  assim, algumas cardiopatias
(PRT MS/GM 2.068/2016, Art. 9º)
críticas podem não ser detectadas através dele, principalmente
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

aquelas do tipo coarctação de aorta. A realização deste teste não so e  detalhado  em  todo  recém-nascido,  antes  da  alta  hos-
descarta a necessidade de realização de exame  físico minucio- pitalar.

Teste do pezinho (colhido na mãozinha) Mesmo que os recém-nascidos prematuros e de baixo peso estejam
no Alojamento Conjunto devem também seguir a rotina estabelecida
acima.
É uma triagem que detecta doenças genéticas ou congênitas.
Caso os recém-nascidos abaixo de 37 semanas ou com peso ao
Quando essas alterações são identificadas precocemente, as crianças
nascer abaixo de 2500g caso fiquem internados menos de 5 dias, seguir a
poderão ser tratadas e acompanhadas pelos serviços de referência, ga-
norma estabelecida para os demais recém-nascidos a termo.
rantindo assim que elas se desenvolvam bem e tenham qualidade de
96 vida.  O ideal é que o teste do pezinho seja realizado entre o 3º e o 5º dia
de vida. São triadas as seguintes doenças: fenilcetonúria, hipotireoidismo Unidade de Cuidados Intermediários
congênito, doença falciforme e outra hemoglobinopatias, fibrose cística,
deficiência da biotinidase e toxoplasmose congênita. Na Secretaria de Externa (UCIN Externa)
Saúde do DF, com o teste do pezinho ampliado são diagnosticadas 30
Definição:
doenças.
Área do alojamento conjunto específica para recém-nascidos neces-
Na Unidade de Neonatologia do HMIB/SES/DF, fazemos o teste do
sitando de cuidados especiais, porém estáveis e em oxigênio sob cateter
pezinho com 48 horas na mãozinha. Segundo Anand, um dos maiores
com oximetria de pulso nos casos de displasia broncopulmonar em fase
estudiosos de dor no mundo, os RN prematuros são mais susceptíveis
de retirada gradual deste.
à dor que os RN a termo. Os prematuros têm limiares mais baixos para
o reflexo de retirada do membro (reflexo flexor vaso-cutâneo) que tem Admissão:
uma porção aferente medida pelas fibras C, fibras que mediam estímulos RNs que estiveram moderada ou gravemente enfermos, mas que
neurológicos. Também há uma maturação retardada das fibras inibitórias tiveram sua condição clínica estabilizada, não mais necessitando de UTIN,
descendentes (a porção excitatória deste sistema se desenvolve cedo, não devem ser privados da companhia diuturna de sua mãe, devendo ser
não havendo inibição descendente que se desenvolve mais tarde). Há 3 transferidos para um AC especial, onde receberão cuidados semi-intensi-
estudos evidenciando que os bebês têm um limiar mais alta de dor nas vos de médico e de enfermagem especializada.
extremidades superiores em comparação com as extremidades inferiores, A participação ativa da mãe e do pai (enquanto a visita não deve ser
porque as fibras inibitórias descendentes alcançaram a porção cervical restringida) em muito contribuirá para a pronta recuperação do RN, dando
da coluna dorsal e ainda tem que crescer para a porção lombar. Assim, tranquilidade à família e ao pediatra, no momento da alta, e permitindo
existem diferentes  níveis de dor (muito mais dor será produzida nas ex- que a mãe seja treinada e supervisionada pela equipe quanto ao cuidado
tremidades inferiores que nos braços e mãos). Shah BS et (1997), Ogawa de seu bebê (prematuros, colostomias etc.), quando irá adquirir segurança
S et al (2005), Larsson BA et al (1998) abordam a diferença da dor entre a para transição da UTIN até o domicílio.
coleta de sangue na mãozinha e com a lanceta nos   calcanhar, FRISANDO
QUE A venopunção no dorso das mãos é muito menos dolorosa do que  • RN com IG > 33 semanas.
a coleta no calcanhar, além de que a primeira é um procedimento rápido • RN com peso > 1250g (com ou sem dieta por SOG).
e se obtém  mais freqüentemente sucesso com apenas uma punção. • RN em tratamento de distúrbios metabólicos.
Na coleta de sangue, fazemos na mãozinha precedida de 2 minutos de • RN em tratamento de infecção inespecífica, porém já estável.
glicose a 25% para liberar endorfinas (para glicemia capilar não usamos • RN em tratamento de infecção congênita específica (sífilis em
a glicose a 25%!). uso de antibioticoterapia venosa, retinopatia da prematurida-
de etc.).
Critérios de coleta especiais: • RN portador de malformação que não permita sua permanên-
1. recém-nascidos prematuros (abaixo de 37 semanas) que per- cia em AC normal.
manecem internados por mais de 5 dias • Em uso de oxigênio, oximetria de pulso.
2. recém-nascidos de baixo peso (abaixo de 2500g) que perma- • Cardiopatas.
necem internados por mais de 5 dias e • Pacientes cirúrgicos (gastrosquise, colostomias, hérnia diafrag-
3. recém-nascidos agudamente doentes admitidos na UTI mática etc.).
Em que momento realizamos as coletas: • Asfíxicos e neurológicos.
1. 1ª amostra: na admissão na UTI, antes de qualquer procedi-    Grande é o número de bebês que podem e devem se tratados ao
mento lado de suas mães na dependência da estrutura do serviço, e  a equipe
2. 2ª amostra: no 5º dia de vida e não deve medir esforços para que a separação do binômio mãe-filho seja
3. 3ª amostra: no 30º dia de vida do bebê retido ou logo à alta, o a mais breve possível.
que ocorrer primeiro
– CAPÍTULO 3 | 3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU –

Critérios de alta Definição:


1. “Método Canguru” é um tipo de assistência neonatal que
Para recém-nascidos pré-termos: implica contato pele a pele precoce entre a mãe e o recém-
• Idade gestacional ≥ 35 semanas. -nascido de baixo peso, de forma crescente e pelo tempo que
• Peso ≥ 1800 g – embora, segundo as normas do Ministério da ambos entenderem ser prazeroso e suficiente, permitindo,
Saúde para o atendimento humanizado do RN de baixo peso/ dessa forma, uma maior participação dos pais no cuidado a
Método Canguru, o peso mínimo seja de 1600 g, esse critério seu recém-nascido.
foi consenso entre os colegas do Serviço Neonatal do Hospital 2. A posição canguru consiste em manter o recém-nascido de
Materno Infantil de Brasília/Secretaria de Saúde do Distrito baixo peso, ligeiramente vestido, em decúbito prono, na posi-
Federal (HMIB/SES-DF), devido à clientela ser do entorno e de ção vertical, contra o peito do adulto.
cidades próximas de Brasília, podendo haver exceções a serem 3. Só serão considerados como Método Canguru os sistemas
avaliadas caso a caso. que permitam o contato precoce, realizado de maneira orien-
• Curva ponderal ascendente com ganho superior a 15 g por tada, por livre escolha da família, de forma crescente e segura
quilo por dia por um período mínimo de três dias consecuti- e acompanhado de suporte assistencial por uma equipe de
vos, preferencialmente em seio exclusivo. saúde adequadamente treinada.
• Bom controle térmico em berço comum Vantagens:
• Ausência de apneia há pelo menos 5 dias do episódio, em uso • Aumento do vínculo mãe-filho (diminuindo o risco de aban-
ou não de cafeína. dono, negligência e maus-tratos).
• Estabilidade clínica. • Menor tempo de separação mãe-filho, evitando longos perío-
• Ausência da necessidade de medicação endovenosa. dos sem estimulação sensorial.
• Tolerância alimentar adequada por via oral, sem cianose, • Estímulo ao aleitamento materno, favorecendo maior fre-
engasgos ou dificuldade respiratória. Em casos excepcionais, quência, precocidade e duração.
os bebês poderão ter alta com dieta por sonda orogástrica, • Maior competência e confiança dos pais no manuseio de seu
enteral ou gastrostomia. filho de baixo peso, mesmo após a alta hospitalar.
  A alta deve ser planejada pela equipe interdisciplinar da Unidade • Melhor controle térmico.
de Risco Intermediário e requer o preparo dos familiares ou responsáveis • Menor número de recém-nascidos em unidades de cuidados
pelo bebê. Preparo tal que garanta que o RN tenha a mesma qualidade intermediários, devido à maior rotatividade de leitos.
de cuidado do hospital em seu domicílio. Assim, estes pacientes deverão • Melhor relacionamento da família com a equipe de saúde.
receber o resumo de alta, tabela de peso, resultados dos exames e do teste • Diminuição da infecção hospitalar.
da orelhinha, cartão da criança devidamente preenchido, receita (medica- • Menor permanência hospitalar.
ção oral), orientações sobre dieta, retorno agendado no ambulatório de • Favorece o ganho de peso.
prematuros/Canguru, oftalmologia (segmento de ROP) e vacinação já em • Previne apneia.
andamento. • Bebês mais calmos.
• Funciona como medida antirrefluxo, uma vez que o bebê é
favorecido pela posição.
Unidade Canguru População a ser atendida:
Em todo o mundo, nascem, anualmente, 20 milhões de crianças prematu- • Gestantes com situações clínicas ou obstétricas com maior
ras e com baixo peso. Destas, um terço morre antes de completar 1 ano de vida. risco para o nascimento de crianças de baixo peso. 97
No Brasil, a primeira causa de mortalidade infantil são as afecções pe- • Recém-nascidos de baixo peso, desde o momento de ad-
rinatais, que compreendem os problemas respiratórios, a asfixia ao nascer e missão na Unidade Neonatal até sua alta hospitalar, quando
as infecções, mais comuns em crianças prematuras e de baixo peso. Além deverão ser acompanhados por ambulatório especializado.
disso, muitos bebês são acometidos de distúrbios metabólicos, dificuldade • Mães e pais que, com suporte da equipe de saúde, deverão ter
em alimentar-se e para regular a temperatura corporal. contato com seu filho o mais breve possível e receber adequa-
O Brasil, hoje, vem trabalhando com a visão paradigma, que é a da da orientação para participar do programa.
atenção humanizada à criança, à mãe e à família, respeitando-as em suas Aplicação do método:
características e individualidades (consulte o capítulo Atenção Humaniza- O método é desenvolvido em três etapas:
da ao Recém-nascido). a. 1ª etapa (na UTI Neonatal):
A humanização do nascimento, por sua vez, compreende ações Período após o nascimento de um recém-nascido de baixo peso
desde pré-natal, em que todo o esforço para evitar condutas intempesti- que, impossibilitado de ir para o alojamento conjunto, necessita de proce-
vas e agressivas para o bebê deve ser realizado. A atenção ao recém-nasci- dimentos que deverão seguir os seguintes cuidados especiais:
do deverá caracterizar-se pela segurança técnica da atuação profissional e • Orientar a mãe e a família sobre as condições de saúde da
condições hospitalares adequadas, aliadas à suavidade no toque durante criança, ressaltando as vantagens do método.
a execução de todos os cuidados prestados. Especial enfoque deve ser • Estimular o livre e precoce acesso dos pais à Unidade Neona-
dado ao conhecimento do psiquismo fetal, da mãe e da família. Traba- tal, proporcionando, sempre que possível, o contato tátil com
lho importante também deve ser desenvolvido com a equipe de saúde, a criança. É importante que essas visitas sejam acompanhadas
oferecendo-lhe mecanismos para melhor qualidade no trabalho interdis- pela equipe assistencial, para que orientações como medidas
ciplinar. de controle de infecção (lavagem adequada das mãos), infor-
A equipe responsável pela assistência ao recém-nascido deverá ser mações sobre os procedimentos hospitalares utilizados e as
habilitada para promover: particularidades ambientais possam ser mais bem compreen-
• A aproximação, o mais precocemente possível, entre a mãe e o didas pela família.
bebê, para fortalecer o vínculo afetivo, garantindo o alojamen- Nessa etapa, deverão ser iniciadas as medidas para estímulo à
to conjunto, desde que possível. amamentação. Dessa forma, ensinam-se os cuidados com as mamas, a
• O estímulo ao reflexo de sucção ao peito, necessário para o ordenha manual e a armazenagem do leite ordenhado. Deve-se implantar
aleitamento materno e para estimular a contratilidade uterina, a coparticipação da mãe no estímulo à sucção e na administração do leite
logo que possível. ordenhado, além dos adequados cuidados de higienização.
• A garantia de acesso aos cuidados especializados necessários Nas situações em que as condições clínicas da criança permitem,
para a atenção ao recém-nascido em risco. deverá ser iniciado o contato pele a pele direto entre mãe e criança, pro-
A promoção desses aspectos inclui o respeito às condições físicas e gredindo até a colocação do recém-nascido sobre o tórax da mãe ou do
psicológicas da mulher diante do nascimento. pai.
Nessa linha de pensamento, desde o início dos anos 1980, após • Ressaltar sempre a importância da atuação da mãe e da família
experiência pioneira realizada na Colômbia, vários pediatras têm atribuí- na recuperação da criança.
do importância especial, no aspecto psicológico, ao contato pele a pele • Após o parto, os primeiros cinco dias deverão ser utilizados
entre a mãe e seu bebê. Assim, espera-se que haja um vínculo mãe-filho para prestar todos esses ensinamentos à mãe e à família. Por-
muito maior, que auxilie o desenvolvimento psicomotor dos recém-nas- tanto, deve ser assegurada à puérpera a permanência na uni-
cidos, notadamente os de baixo peso, e promova o aleitamento materno. dade hospitalar pelo menos durante esse período, recebendo
Conhecido como Método Canguru, tal forma de atendimento tem sido todo o suporte assistencial necessário.
utilizada em unidades de saúde também em nosso país.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

• Decorrido esse período, se a criança não preencher os critérios • Corrigir as situações de risco, como ganho inadequado de
de entrada na etapa seguinte e houver necessidade da volta peso, sinais de refluxo, infecção e apneias.
da mãe ao domicílio, deverão ser assegurados a puérpera as • Orientar e acompanhar tratamentos especializados, como
seguintes condições: exame oftalmológico, avaliação audiométrica e fisioterapia
» Vinda diária à unidade hospitalar, onde manterá contato motora.
com seu filho, receberá orientação e manterá a ordenha • Orientar esquema adequado de imunizações.
do leite. O seguimento ambulatorial deve apresentar as seguintes caracte-
» Auxílio-transporte para a vinda diária à unidade de saúde. rísticas:
» Refeições durante a permanência diurna na unidade (lan- • Ser realizado pela equipe interdisciplinar treinada e familiariza-
che pela manhã, almoço e lanche à tarde). da com o seguimento do recém-nascido de risco.
» Espaço adequado para a permanência, que permita • Observar a periodicidade já referida em item anterior.
descanso e possa ser utilizado para palestras. Esse espaço • Ter agenda aberta, permitindo retorno não agendado caso a
servirá também para congraçamento entre mães, o que criança necessite.
propiciará maior confiança materna. • Levar em conta que é a criança que determinará o tempo de
» O pai terá acesso à unidade e será estimulada sua partici- permanência em posição canguru, o que ocorre, de modo
pação nas reuniões com a equipe de saúde. geral, quando ela atinge o termo ou o peso de 2000 g.
b. 2ª etapa (no alojamento de cuidados intermediários): • Após o peso de 2500 g, o acompanhamento passa a ser orien-
O recém-nascido encontra-se estabilizado e poderá ficar com tado de acordo com as normas para acompanhamento de
acompanhamento contínuo de sua mãe. Nessa etapa, após os períodos crescimento e desenvolvimento do Ministério da Saúde.
de adaptação e de treinamento realizados na etapa anterior, a mãe e a • Além dos já descritos anteriormente.
criança estarão aptas a permanecer em enfermaria conjunta, onde a po-
sição canguru será realizada pelo maior tempo possível. Essa enfermaria
funcionará como um “estágio” pré-alta hospitalar da mãe e do filho. O acompanhamento ambulatorial
São critérios de elegibilidade para a permanência nessa enfermaria: A terceira etapa do Método Canguru dá continuidade à assistência
Da mãe: ao recém-nascido prematuro de baixo peso após a alta hospitalar. Apesar
de, na segunda etapa, não se estipular obrigatoriedade de tempo em po-
• Certeza de que quer participar desse tipo de assistência, se
sição canguru, na terceira, por motivo de segurança, recomenda-se essa
tem disponibilidade de tempo e existência de um serviço
posição em tempo integral. Portanto, a participação do pai e de outros
social de apoio.
familiares deverá ser estimulada na colocação da criança em posição
• Certeza de que a decisão seja tomada por meio de consenso
canguru. São emprestados kits cangurus para casa.
entre mãe, familiares e profissionais da saúde.
• Capacidade de reconhecer as situações de risco do recém- Essa etapa é mais simples em sua organização estrutural, mas exige
-nascido (mudança de coloração da pele, pausas respiratórias, da equipe atenção cuidadosa para o reconhecimento de situações de
regurgitações e diminuição de movimentação). risco imediato (bebê-família), para que uma adequada intervenção possa
• Conhecimento e habilidade para colocação da criança em ser estabelecida.
posição canguru. Um grande desafio nessa fase é a manutenção do aleitamento
Da criança: materno. Assim, a equipe deve estar adequadamente preparada para
• Estabilidade clínica. lidar com as dificuldades que podem surgir.
98 • Nutrição enteral plena (peito, sonda gástrica ou copo).
• Peso mínimo de 1250 g. Objetivo do acompanhamento ambulatorial:
• Ganho de peso diário maior que 15 g. Atribuições do ambulatório
Para que haja ganho de peso, deve-se garantir a amamentação a
cada 2 horas no período diurno e a cada 3 horas no período noturno. • Garantir a continuidade da assistência ao bebê e à sua família.
• Observar e incentivar a realização do método nesse período.
As crianças que não apresentarem ganho adequado de peso devem • Avaliar, incentivar, encorajar e apoiar o aleitamento materno.
realizar complementação láctea com leite posterior da própria mãe, via • Realizar exame físico do bebê tomando como referências
sonda gástrica ou copo. básicas o grau de desenvolvimento, ganho de peso, estatura
A utilização de medicamentos orais (complexo vitamínico, medi- e perímetro cefálico, levando em conta a idade gestacional
cação contra o refluxo gastroesofágico, xantinas etc.) não contraindica a pós-concepção.
permanência nessa enfermaria. • Realizar ecotransfontanelar/fundo de olho.
A administração de medicação intravenosa intermitente, através de • Observar a administração dos medicamentos prescritos.
dispositivo intravascular periférico, também não contraindica a perma- • Avaliar o equilíbrio psicoafetivo entre o bebê e a sua família.
nência em posição canguru. • Detectar e intervir em situações de risco, como ganho de
peso inadequado, sinais de refluxo gastroesofágico, infecções,
São critérios para a alta hospitalar com transferência para a 3ª etapa: apneias, uso de O2 etc.
• Mãe segura e bem orientada e familiares conscientes quanto • Orientar e acompanhar tratamentos especializados que o caso
ao cuidado domiciliar da criança. venha a requerer.
• Mãe psicologicamente motivada para dar continuidade ao • Orientar esquema adequado de imunização.
trabalho iniciado na maternidade.
• Compromisso materno e familiar para a realização do método
por 24 horas/dia. Necessidades de vitaminas do prematuro
• Garantia de retorno frequente à unidade de saúde. Em estudos sobre as necessidades nutricionais dos prematuros,
• Condição de acompanhamento ambulatorial assegurada, verificou-se que é durante o último trimestre de gravidez que se dá, no
sendo que, na primeira semana, a frequência deverá ser de feto, o acúmulo de vitaminas. Com isso, fica subentendido que o recém-
três consultas; na segunda semana, de duas consultas; e, na -nascido prematuro, com a sua rápida velocidade de crescimento, apre-
terceira semana e nas seguintes, de pelo menos uma consulta senta enorme risco de desenvolver deficiência destes elementos. E, além
até o peso de 2500 g. disso, o estado de doenças, metabólico e estresse em que se encontram
• Condição de recorrer à unidade hospitalar de origem a qual- aumenta o consumo destes, que também são utilizados nas funções de
quer momento de urgência, quando ainda na terceira etapa. defesa do organismo e reconstrução tecidual.
• Além dos já citados nos critérios descritos anteriormente.
Ao procurar determinar as necessidades de vitaminas do recém-
c. 3ª etapa
-nascido prematuro em dieta enteral plena, devemos estar atentos para
Esta etapa consiste no adequado acompanhamento da criança no
prevenir deficiências, acumular reservas (aquelas que seriam feitas no
ambulatório após a alta.
último trimestre de gravidez), evitando o consumo excessivo, pois este
São atribuições do ambulatório de acompanhamento: tem efeito tóxico.
• Realizar exame físico completo da criança tomando como Abaixo temos a lista das vitaminas necessárias aos prematuros.
referências básicas o grau de desenvolvimento, o ganho de
peso, o comprimento e o perímetro cefálico, levando-se em Vitaminas hidrossolúveis:
conta a idade gestacional corrigida.
• Avaliar o equilíbrio psicoafetivo entre a criança e a família. Funcionam como cofactores enzimáticos e a sua utilização pelo
organismo depende do aporte calórico e proteico da dieta, bem como da
– CAPÍTULO 3 | 3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU –

taxa de utilização de energia. Têm pouco tempo de armazenamento nas Dose: 1,2-3 mg/dia.
células, sendo facilmente eliminadas na urina. O LM contém quantidade insuficiente, atingindo os valores reco-
1. Vitamina C: mendados se fortificado, e os leites especiais para pré-termo contêm
O ácido ascórbico é um antioxidante, o que o torna importante suplementação em quantidade muito variável.
para o recém-nascido pré-termo (RNPT) submetido a estresse oxidativo. 9. Ácido fólico:
A vitamina C é excretada na urina. Administrada juntamente ao ferro, a Participa na síntese de DNA e RNA e no metabolismo de alguns
vitamina C facilita a sua absorção. aminoácidos, o que o torna fundamental nos processos de divisão celular e
Dose: 24 mg/kg/d. crescimento, sendo as suas necessidades ainda maiores no prematuro numa
O conteúdo do leite materno (LM) em vitamina C é inferior à fase de crescimento rápido. A sua carência leva à anemia megaloblástica.
quantidade recomendada. A congelação (-20 ºC) durante um mês e a Dose: 50 a 60 µg/kg/d.
refrigeração (4 ºC) durante uma semana levam a uma perda de um terço No LM, as quantidades de ácido fólico aumentam cerca de dez vezes
da vitamina. com a duração da amamentação, atingindo os valores recomendados.
Os leites especiais para pré-termo contêm suplementação adequa- Os leites especiais para pré-termo têm uma quantidade superior de
da em vitamina C, assim como os fortificantes do leite materno. folato.
2. Tiamina (vitamina B1):
Funciona como cofactor no metabolismo dos hidratos de carbono e Vitaminas lipossolúveis:
atua ainda na membrana neuronal, facilitando a condução nervosa. Metabolicamente, não formam coenzimas clássicas nem grupos
Dose: 200 a 300 µg/dia. prostéticos, mas participam no crescimento e na diferenciação celular.
Dependem dos mecanismos de absorção das gorduras; a insuficiência
O LM contém esta vitamina em pouca quantidade, atingindo os
hepática e a colestase conduzem à carência destas vitaminas. Têm a possi-
valores recomendados se fortificado.
bilidade de serem armazenadas; quando consumidas em excesso, por um
Os leites especiais para pré-termo contêm suplementação em período prolongado, são potencialmente tóxicas.
quantidade muito variável.
1. Vitamina A:
3. Riboflavina (vitamina B2):
É essencial para as funções de visão, crescimento e reparação te-
É um componente das flavoproteínas que atua como transportado- cidual, diferenciação celular e imunocompetência. O desenvolvimento
res de hidrogênio nas importantes reações de oxirredução do metabolis- pulmonar e a integridade do epitélio das vias respiratórias dependem
mo energético, da síntese do colágeno, eritropoiese e ativação do folato. desta vitamina.
Facilita, ainda, a fotodegradação da bilirrubina. Fototerapia é uma causa
Dose: 700 a 1500 IU/kg/d, seja por via entérica, seja parentérica.
reconhecida de deficiência de riboflavina, verificando-se que as suas con-
centrações séricas reduzem-se para metade após 24 horas de fototerapia, Os leites especiais para prematuros suprem estas necessidades, mas
sendo importante a sua suplementação o leite humano pré-termo necessita de fortificação ou suplementação.
Dose: 360 µg/kg/d. 2. Vitamina E:
O LM não fornece quantidade suficiente, atingindo os valores re- É um antioxidante e impede a peroxidação dos lipídios das mem-
comendados se fortificado, e os leites especiais para pré-termo contêm branas celulares, onde está incorporada. É particularmente importante
suplementação em quantidade muito variável. para os recém-nascidos submetidos a terapêuticas que os colocam em
4. Piridoxina (vitamina B6):
estresse oxidativo. A deficiência desta vitamina compromete a imunidade 99
humoral e celular.
Intervém na síntese de neurotransmissores e em funções metabóli-
Dose: 6 a 12 UI/kg/d.
cas do cérebro. A deficiência em vitamina B6, embora rara, pode originar
um quadro neurológico grave de convulsões no recém-nascido. O colostro e o LM pré-termo contêm uma maior quantidade de
vitamina E do que o LM de termo, mas esse valor diminui após duas ou
Dose: 180 µg/kg/d.
três semanas.
O conteúdo em vitamina B6 do leite materno varia muito com a
Geralmente, os leites especiais para prematuros são suplementados
dieta, mas é insuficiente para o prematuro em crescimento.
em vitamina E em proporção ao seu conteúdo em PUFA, e é recomen-
Os fortificantes e os leites especiais para pré-termo contêm a suple- dado que contenham um mínimo de 1 UI de vitamina E/grama de ácido
mentação adequada. linoleico. Os fortificantes do leite materno também são suplementados. É
5. Cianocobalamina (vitamina B12): importante suplementar com esta vitamina os lactentes amamentados ao
Participa em reações de síntese de nucleotídeos do DNA e na peito e a receberem ferro adicional.
transferência de grupos metil. A absorção da vitamina B12 ao nível do íleo 3. Vitamina D:
distal requer a ligação ao fator intrínseco, produzido pelas células gástricas É um pró-hormônio que se transforma no hormônio biologicamen-
parietais, pelo que está alterada em recém-nascidos submetidos à gas- te ativo, 1,25(OH) 2D, após metabolização nas células renais dos túbulos
trectomia ou à ressecção do íleo terminal. proximais. Este atua de forma concertada com a PTH para a manutenção
Dose: 0,3 µg/kg/d. da homeostase do cálcio e fósforo.
O LM não fornece quantidade suficiente, atingindo os valores re- Estudos recentes mostraram que a deficiência de vitamina D na
comendados se fortificado, e os leites especiais para pré-termo contêm gestante aumentava o risco de parto prematuro, e esse risco era maior
suplementação em quantidade adequada. quando a mãe também tinha hipocalcemia.
6. Niacina: A fonte principal de vitamina D no período neonatal imediato é
Participa no metabolismo energético, ao nível da cadeia respiratória. a transferência transplacentária que ocorreu durante a gravidez. Após
Tem, ainda, uma ação importante na glicólise e lipogênese. o nascimento, com o súbito desaparecimento do suprimento de cálcio
fornecido pela placenta, verifica-se uma elevação dos níveis de PTH e da
Dose: 4,8 mg/kg/d. 1,25(OH) 2D, sem correlação com os níveis de vitamina D, e que refletem
O LM contém quantidade insuficiente, atingindo os valores reco- a descida do nível sérico de cálcio. Este período de hipocalcemia é mais
mendados se fortificado, e os leites especiais para pré-termo contêm grave e prolongado no prematuro. No RNMBP, a hipocalcemia não conse-
suplementação em quantidade muito variável. gue ser corrigida apesar de níveis elevados de PTH e de 1,25(OH) 2D, dado
7. Biotina: que não pode haver aumento de reabsorção intestinal por não receberem
alimentação entérica, e, também, verifica-se não haver uma mobilização
É uma coenzima que intervém na biossíntese de aminoácidos e
efetiva de cálcio do osso. A administração intravenosa de cálcio com au-
ácidos gordos, bem como na neoglicogênese.
mento dos seus níveis séricos consegue impedir o aumento da PTH sérica.
Dose: 1,2 µg/kg/d a 15 µg/dia.
A vitamina D só pode ser iniciada quando o recém-nascido tem
O LM contém quantidade insuficiente e nem todos os leites espe- mais de 10 dias e está em dieta plena e tolerando bem; é importante
ciais para pré-termo são suplementados. salientar que a absorção intestinal de cálcio é dependente dos níveis de
8. Ácido pantotênico: vitamina D circulantes.
É componente da coenzima A, que é essencial ao metabolismo das Dose:
gorduras, hidratos de carbono e proteínas. a. 400 UI nos RNs maiores de 1000g.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

b. 800-1000 UI/dia em menores de 1000g (ESPGHAN, 2010) no Bebês prematuros apresentam algumas particularidades em relação
primeiro mês de vida, voltando a dose de 400 UI após esse à sua suscetibilidade a algumas doenças e inadequada resposta a algumas
período. Os níveis de vitamina D devem ser monitorados, vacinas. Há que se considerar a aplicação de alguns imunizantes espe-
preferencialmente. ciais nesses pacientes e um calendário personalizado deve ser utilizado.
As recomendações de vitamina D são variadas, de 90 a 1000 UI/            Uma importante medida de prevenção é vacinar todos os funcioná-
dia. No entanto, uma oferta entre 800 e 1000 UI/dia aumenta as concen- rios da Unidade Neonatal, pais e cuidadores com a vacina para influenza e
trações séricas do calcitriol e, consequentemente, a absorção de cálcio. com uma dose de reforço da vacina tríplice acelular do tipo adulto, a fim
O leite materno tem quantidades muito baixas de vitamina D. de evitar a transmissão da influenza e da coqueluche ao recém-nascido.
Os fortificantes do leite materno e os leites especiais para pré-termo Outra estratégia importante, mas pouco lembrada e praticada, é a
contêm esta vitamina em quantidade muito variável, sendo a suplemen- imunização da gestante contra influenza, pois protege o bebê nos pri-
tação adicional variável de acordo com o utilizado (FM 85 => 1 sachê 37 meiros 6 meses de vida, época que ele ainda não pode receber a vacina.
UI vitamina D). Essas vacinas, quase todas, estão disponíveis nos Centros de Refe-
rência de Imunobiológicos Especiais (CRIEs).

Vacinação do prematuro Vacinas, recomendações e cuidados especiais


A sobrevida de bebês prematuros com idade gestacional abaixo Vacina BCG ID:
de 28 semanas tem sido cada vez maior. A hospitalização prolongada Deverá ser aplicada em recém-nascidos com peso maior ou igual a
destes bebês, que, às vezes, permanecem hospitalizados por três meses 2000 g (poucos estudos mostram eventual diminuição da resposta imune
ou mais, não deve ser um fator limitante para o início da vacinação. Os ao BCG em menores de 2000 g).
prematuros devem receber suas vacinas segundo a sua idade cronológica.
E o momento adequado para iniciar a vacinação é quando eles se apre- Vacina hepatite B – recombinante (consulte o capítulo de He-
sentam em fase de ganho de peso, sem apresentar distúrbios agudos ou patite B):
patologias graves.
Tabela 1 – Prevenção da transmissão perinatal em recém-nascido prematuros com menos de 2 kg
RECÉM-NASCIDOS DE MÃES AgHBs POSITIVAS
Vacina + HBIG (0,5 ml IM) 1ª dose Nascimento (< 12 horas)
Vacina 2ª dose 1 mês
Vacina 3ª dose 2 meses
Vacina 4ª dose 6 meses

RECÉM-NASCIDOS DE MÃES SEM TRIAGEM AgHBs


Vacina + HBIG (0,5ml IM) 1ª dose Nascimento (< 12 horas)
Mãe AgHBs positiva Dar mais 3 doses da vacina

100 Mãe AgHBs negativa Aguardar peso > 2 kg para completar A 1ª dose pode ser retardada até 1 mês de idade se a mãe for AgHBs
esquema negativa
Legenda: HBIG: globulina hiperimune contra o vírus da hepatite B; IM: intramuscular; AgHBs: antígeno da superfície do vírus da hepatite B.

Palivizumabe: até 2 anos de idade. É recomendado para os demais prematuros até o


Durante o período de circulação do vírus sincicial respiratório em sexto mês de vida, especialmente para aqueles com idade gestacional
nosso país (março a setembro), sendo, no Distrito Federal, o período da de 29 a 32 semanas ou maiores de 32 semanas que apresentem dois ou
sazonalidade de março a julho, deve ser feito de fevereiro a julho, antes mais fatores de risco: criança institucionalizada, irmão em idade escolar,
do início desta. poluição ambiental, anomalias congênitas de vias aéreas e doenças neu-
romusculares graves.
É um anticorpo monoclonal contra o vírus sincicial respiratório
(VSR). É indicado para prematuros com idade gestacional menor de 28 Dose: 15 mg/kg de peso, em cinco doses mensais consecutivas,
semanas no primeiro ano de vida e para bebês com displasia broncopul- aplicadas por via intramuscular.
monar e cardiopatas em tratamento clínico nos últimos seis meses com
Quadro 1 – Portaria nº 09, de 26 de janeiro de 2016
– CAPÍTULO 3 | 3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU –

Art. 6º Estabelecer os seguintes critérios para aplicação do Palivizumabe:


I - Crianças menores de um ano que nasceram com idade gestacional até 28 semanas.
a - Os pacientes que se encontram internados nos hospitais da SES DF e se enquadram no critério de uso, no período da aplicação do Palivizumabe, devem
receber as doses necessárias do Palivizumabe durante a internação hospitalar, a partir de sete dias de vida, desde que observada a estabilidade clínica do
paciente. Ao iniciar a medicação deverá ser preenchido o formulário de solicitação do Palivizumabe e o termo de consentimento, este será encaminhado
a farmácia hospitalar da unidade que fará a autorização.
(...)
c - O (a) responsável pelo paciente internado receberá o formulário para solicitação do Palivizumabe na alta hospitalar, preenchido pelo médico assistente
e deverá ser encaminhado ao CRIE do Hospital de referência da sua área de residência para recebimento do Palivizumabe. Importante constar neste
documento as datas das doses anteriores, caso tenha recebido.
d - Pacientes em domicílio que se enquadram no critério de uso, o (a) responsável (a) deverá ser orientado (a) a procurar o CRIE do Hospital de referência
da sua área de residência no período de aplicação do Palivizumabe seguinte para o agendamento das doses mensais como formulário e termo consenti-
mento preenchido pelo médico assistente. O formulário devidamente preenchido será autorizado por um enfermeiro (a) do CRIE.
II - Crianças menores de seis meses que nasceram com idade gestacional de 29 semanas a 31 semanas e seis dias:
a - Os pacientes que se encontram internados nos hospitais da SES DF e se enquadram no critério de uso, no período de aplicação do Palivizumabe,
devem receber as doses necessárias do Palivizumabe durante a internação hospitalar, a partir de sete dias de vida, desde que observado a estabilidade
clínica do paciente. Ao iniciar a medicação deverá ser preenchido o formulário de solicitação do Palivizumabe e o termo de consentimento, estes serão
encaminhados a farmácia hospitalar da unidade que fará a autorização.
(...)
c - O (a) responsável, tanto pelo paciente internado na rede SES DF receberá o formulário para solicitação do Palivizumabe na alta hospitalar, preenchido
pelo médico assistente e deverá ser encaminhado ao CRIE do Hospital de referência da sua área de residência para recebimento do Palivizumabe. Impor-
tante constar neste documento as datas das doses anteriores, caso tenha recebido.
d - Pacientes em domicílio que se enquadram no critério de uso, o (a) responsável deverá ser orientado(a) a procurar o CRIE do Hospital de referência da sua área
de residência no período de aplicação do Palivizumabe seguinte para o agendamento das doses mensais com o formulário e termo consentimento preenchido
pelo médico assistente. O formulário devidamente preenchido será autorizado por um enfermeiro (a) do CRIE.
III - Crianças com displasia broncopulmonar (doença pulmonar crônica da prematuridade) menores de dois anos de idade que necessitaram tratamento
de suporte prolongado (oxigênio inalatório, diuréticos, broncodilatador, corticosteroide sistêmico ou inalatório) nos seis meses anteriores ao início da
sazonalidade:
a - Os pacientes que se enquadram no item III e que se encontram internados mas estáveis, no período de aplicação do Palivizumabe, devem receber
as doses necessárias durante a internação hospitalar. Ao iniciar a medicação deverá ser preenchido o formulário de para solicitação do Palivizumabe e o
termo de consentimento, estes serão encaminhados a farmácia hospitalar da unidade.
IV - Crianças menores de dois anos de idade com cardiopatia congênita ou adquirida com quadro clínico de insuficiência cardíaca, hipoxemia e/ou
hipertensão pulmonar significativos. Crianças portadoras de cardiopatias com discreta repercussão não necessitam realizar a profilaxia. Neste grupo
enquadram-se as seguintes cardiopatias: forame oval patente, comunicação interatrial pequena, comunicação interventricular pequena, persistência de
canal arterial pequeno, estenose pulmonar ou aórtica de grau discreto e coarctação da aorta de grau pequeno.
a - Os pacientes que se enquadram no item IV e que se encontram internados mas estáveis, no período de aplicação do Palivizumabe, devem receber 101
as doses necessárias durante a internação hospitalar. Ao iniciar a medicação deverá ser preenchido o formulário de para solicitação do Palivizumabe e o
termo de consentimento, este será encaminhado a farmácia hospitalar da unidade.
(...)
c - Os pacientes em domicílio receberão o formulário para solicitação do Palivizumabe preenchido pelo médico assistente antes do período de aplicação
do Palivizumabe e nele deverá conter ainda a assinatura e carimbo dos médicos autorizadores. A autorização será feita pelo Hospital da Criança de Brasília
José Alencar (HCBJA).
d - Para os pacientes que receberem alta durante o período de aplicação e que ainda se enquadrem no recebimento da medicação, o (a) responsável
receberá o formulário para solicitação do Palivizumabe na alta hospitalar, preenchido pelo médico assistente e que deverá ser encaminhado ao CRIE do
Hospital de referência da sua área de residência a fim de agendar o recebimento do Palivizumabe. Importante constar neste documento as datas das
doses anteriores, caso tenha recebido.
e - Após a autorização o responsável deverá comparecer pessoalmente com esta documentação no CRIE do Hospital de referência a fim de agendar a
aplicação.
§ 1º - A dose a ser administrada será na posologia de 15mg/kg, via intramuscular, de preferência na face anterolateral da coxa.
§ 2º - Cada criança deverá receber de 01 (uma) a 05 (cinco) doses do medicamento (no período de sazonalidade,) a cada trinta dias. O número total de
doses por criança dependerá do mês de início das aplicações, variando, assim de 01 a 05 doses. Para crianças nascidas durante a sazonalidade do VSR,
poderá ser necessário menos que 05 doses, uma vez que o medicamento não será aplicado após o término da Sazonalidade, em nenhuma situação. (A
dispensação e consequente administração do medicamento não serão estendidas fora do período de sazonalidade em nenhuma situação).
Fonte: Portaria nº 09, de 26 de janeiro de 2016.

 Vacina pneumocócica 10 (conjugada): Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis e Haemophilus in-
Realizar respeitando a idade cronológica. Bebês prematuros e de fluenzae b (conjugada):
baixo peso apresentam maior incidência de doença pneumocócica inva- Preferencialmente, utilizar vacinas acelulares. A utilização de vacinas
siva, cujo risco aumenta quanto menores forem a idade gestacional e o acelulares reduz o risco de apneias e episódios convulsivos pós-aplicação
peso ao nascimento. Três doses: aos 2 e aos 4 meses e um reforço após da vacina tríplice bacteriana. Em prematuros extremos, considerar o uso
1 ano. de analgésicos/antitérmicos profiláticos com o intuito de reduzir a ocor-
Vacina influenza (gripe): rência desses eventos, principalmente descompensação cardiovascular,
apneia e convulsão.
Respeitando a idade cronológica. Duas doses a partir dos 6 meses,
com intervalo de 30 dias entre elas. Vacina meningocócica C (conjugada):
Vacina poliomielite inativada: Respeitar idade cronológica.
Vacinar na idade cronológica, iniciando aos 2 meses de vida, de Vacinas MMR e febre amarela:
acordo com o calendário de vacinação. Respeitar a idade cronológica.
Vacina oral rotavírus humano G1P1 [8] (atenuada): Imunoglobulina humana antivaricela-zoster:
Por se tratar de vacina de vírus vivos atenuados, a imunização contra Está recomendada nas seguintes situações:
o rotavírus só deve ser realizada após a alta hospitalar, respeitando-se a • Para prematuros nascidos entre 28 semanas e 36 semanas
idade-limite para administração da primeira dose. Primeira dose: 1 mês de gestação expostos à varicela, quando a mãe tiver história
e 15 dias a 3 meses e 7 dias. Segunda dose: 3 meses e 7 dias a 5 meses e negativa para varicela.
15 dias.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

• Para prematuros nascidos com menos de 28 semanas de ges- O acompanhamento se dá até o bebê alcançar o peso de 2500 g ou
tação ou com menos de 1000 g de peso expostos à varicela, ter inserção em ambulatório de seguimento de risco.
independentemente da história materna de varicela.
A dose é de 125 UI por via IM e deve ser aplicada até 96 horas de vida Tipos de consulta:
do RN. Independentemente da idade gestacional ou PN, recomendar para
Devemos ter conhecimento de que não se trata de uma consulta de
RNs cujas mães tenham apresentado quadro clínico de varicela de cinco dias
puericultura, e sim de um momento de troca, de uma atividade na qual
antes até dois dias depois do parto.
vamos pontuar o atendimento com base na demanda da família.
Imunoglobulina humana antitetânica:
A consulta pode ser individual, quando há apenas uma família e
Está recomendada na dose de 250 UI, por via IM. Para RNs prema- bebê (a ser avaliada e orientada), ou coletiva, quando trabalhamos com
turos com lesões potencialmente tetanogênicas, independentemente da mais de uma família e bebês. O atendimento no primeiro momento é co-
história vacinal da mãe. Independentemente da idade gestacional ou do letivo, baseado nas situações apresentadas pelas mães. Provocamos uma
peso ao nascer, deve ser aplicada para RNs prematuros sob risco potencial discussão em grupo sob nossa orientação. Posteriormente, no mesmo
de tétano. ambiente, os bebês são submetidos a um exame clínico sumário, aferindo
Nota importante: o uso simultâneo de múltiplas doses injetáveis dados antropométricos necessários, e informamos à família individual-
em recém-nascidos pré-termo pode associar-se à apneia, devendo-se mente, de acordo com suas necessidades.
dar preferência à administração de menor número de injeções em cada Sempre que necessário, a consulta deve ser interdisciplinar, solici-
imunização. tando o profissional em questão ou encaminhado informalmente.
Natureza das consultas:
Assistência ambulatorial na Há necessidades de estabelecermos uma sistematização nas con-
sultas para que, mais uma vez, possamos anteceder possíveis dificuldades
terceira etapa ou desvios da normalidade.
O objetivo principal da avaliação ambulatorial é manter a periodici- É importante ficarmos atentos aos seguintes aspectos:
dade das consultas individualizadas, de acordo com o fator de risco, para • Sempre iniciar o primeiro contato de retorno à unidade per-
que a intervenção, quando necessária, ocorra precocemente, diminuindo guntando:
a possibilidade de reinternação dos bebês observados. a. Como foi o primeiro dia de vocês?
Periodicidade das consultas: b. Que dúvidas você necessita esclarecer?
Devemos estabelecer critérios baseados no peso de alta da segun- c. E o aleitamento, como está?
da etapa, conforme o quadro a seguir: d. Como está o Manejo Canguru domiciliar?
• Não perder a oportunidade de estabelecer laços de confiança,
Quadro 2 – Retornos posteriores, salvo situações especiais de demonstrar o quanto é importante a participação da famí-
Semanas Programação de retorno lia na terceira etapa do Manejo Canguru e a vital importância
do aleitamento exclusivo.
Primeira semana Três consultas • Se houver oportunidade, visitar a residência da família pre-
Segunda semana Duas consultas viamente e, se possível, orientá-la da melhor maneira, não
se esquecendo de que devem ser respeitadas as condições
Terceira semana Uma consulta
socioculturais de cada um.
102 A primeira consulta deve ocorrer 48 horas após a alta. • Lembrar-se de rever a realização de exames durante a inter-
nação, como TSH/PKU, ultrassom, transfontanela, teste da
orelhinha, entre outros.
Consultas Avaliação/conduta

Primeira consulta Avaliação pondero-estatural.


Trabalhar com a Exame clínico sumário.
demanda da família Avaliar o equilíbrio psicoafetivo mãe-bebê.
Diagnóstico, tratamento e orientação.
Enfatizar o aleitamento exclusivo.
Imunização: anti-hepatite B.
Rever sumário de alta e atentar para controles especiais.

Segunda consulta Avaliação pondero-estatural.


Trabalhar com a Exame clínico sumário.
demanda da família Avaliar o equilíbrio psicoafetivo mãe-bebê.
Diagnóstico, tratamento e orientação.
Prevenir risco de anemia da prematuridade.
Prevenir risco da doença metabólica óssea da prematuridade.
Rever sumário de alta e atentar para controles especiais.
Avaliar risco de reinternação.

Terceira consulta Avaliação pondero-estatural.


Trabalhar com a Exame clínico sumário.
demanda da família Avaliar o equilíbrio psicoafetivo mãe-bebê.
Diagnóstico, tratamento e orientação.
Enfatizar o aleitamento exclusivo.
Avaliação com nutricionista, assistente social e psicólogo.
Avaliar risco de reinternação.
– CAPÍTULO 3 | 3.5. ALOJAMENTO CONJUNTO PARA BEBÊS SAUDÁVEIS E DE CUIDADOS ESPECIAIS/UNIDADE CANGURU –

Quarta e quinta Principal enfoque: consulta de Enfermagem.


consultas Avaliação pondero-estatural.
Trabalhar com a Avaliar o equilíbrio psicoafetivo mãe-bebê.
demanda da família Enfatizar o aleitamento exclusivo.
Palestras educativas com folder explicativo.
Avaliar risco de reinternação.

Sexta consulta e Principal enfoque: consulta de Enfermagem.


demais Avaliação pondero-estatural.
Trabalhar com a Avaliar o equilíbrio psicoafetivo mãe-bebê.
demanda da família Enfatizar o aleitamento exclusivo.
Palestras educativas com folder explicativo.
Realizar encaminhamentos necessários.
Avaliar risco de reinternação.

• Realização do manejo preferencialmente por profissional da


Sinais de alerta equipe de assistência intra-hospitalar (etapa 2).
• Mudança de coloração da pele (cianose, pele marmórea, pali- • Ter a agenda aberta, permitindo que o bebê possa ser trazi-
dez intensa, icterícia). do em caso de necessidade, mesmo que não esteja agendado.
• Pausas respiratórias. • Frequência de retorno mínima de três consultas na primeira
• Desconforto respiratório. semana; duas na segunda; e uma a partir da terceira semana
• Hipoatividade. até o peso de 2500 g (observar que o primeiro retorno deverá
• Irritação intensa. ser obrigatoriamente dentro das primeiras 48 horas pós-alta
• Regurgitação frequente. hospitalar).
• Vômitos. • Ter um sistema de busca ativa para o bebê que não compare-
• Diminuição ou recusa do seio/dieta. ce no retorno previsto (através do Serviço Social).
• Ganho ponderal insuficiente ou perda de peso. • Ter um sistema de referência/contrarreferência com o sistema
Algumas dessas situações clínicas (regurgitação frequente, vômitos, de saúde da região.
ganho ponderal insuficiente ou perda de peso leve/moderada) poderão • Ter em mãos o resumo de alta e evolução durante o programa
ser criteriosamente manejadas no ambulatório. Considerar sempre a intra-hospitalar (etapas 1 e 2), além do cartão atualizado e
reinternação do bebê (na dúvida, uma solução intermediária pode ser últimos exames.
a observação na unidade por algumas horas enquanto se aguarda, por
exemplo, os resultados de exames laboratoriais). Recursos humanos:
• Médico pediatra com treinamento no Método Canguru, em
acompanhamento de bebês de risco, em aleitamento mater-
Reinternação no e em alimentação de bebês prematuros/de baixo peso ao 103
nascer.
Após a alta hospitalar e durante o programa ambulatorial (etapa
• Auxiliar de Enfermagem com conhecimento do Método Can-
3), o serviço deverá garantir à família assistência 24 horas por profissional
guru e de aleitamento materno.
habilitados.
• Enfermeira responsável com conhecimento do Método Can-
Havendo necessidade de reinternação, ela deverá ser preferencial- guru e de aleitamento materno.
mente no hospital onde o programa é realizado. Não existindo essa pos- • Possibilidade de assistência dos Serviços de Psicologia e As-
sibilidade, a equipe será responsável pelo adequado encaminhamento sistência Social.
desse bebê para a unidade de referência. A família é orientada a procurar
o hospital regional mais próximo de sua residência. Recursos físicos e materiais :
Causas mais frequentes de reinternação: Sala de consulta ambulatorial que obedeça às normas já existentes
• Apneia. para essa área, com:
• Broncoaspiração. • Maca com possibilidade para elevar cabeceira.
• Problemas respiratórios (infecção de vias aéreas/pneumonia). • Pia.
• Diarreias. • Cadeiras.
• Infecção do trato urinário. • Mesa.
• Ganho ponderal insuficiente ou perda de peso. • Balança.
• Anemias graves com necessidade de hemotransfusão. • Estetoscópio.
• Cardiopatias descompensadas. • Otoscópio.
• Lanterna.
• Régua antropométrica.
Recursos mínimos para a implantação da • Fita métrica.
terceira etapa • Termômetro.
• Impressos para encaminhamento/solicitação de/receituário.
• Planilha de controle ambulatorial.
Características do ambulatório: • Material para avaliação oftalmológica/auditiva.
• Ter uma norma escrita sobre o manejo do “bebê canguru” em
cuidado ambulatorial de fácil acesso para toda a equipe.

Recomendações
Idealmente, os serviços que atendem bebês prematuros deveriam organizar um programa de acompanhamento follow-up, com retornos regulares
aos 3, 6, 9, 12, 18 e 24 meses, pelo menos. Assim, poder-se-ia garantir, nessa fase mais precoce do bebê, um acompanhamento mais adequado de seu
crescimento e desenvolvimento global. Nesse acompanhamento, deveriam ser incluídas reavaliações oftalmológica e auditiva.
Por ocasião da alta do programa, os serviços que ainda não possuem um programa de acompanhamento deverão encaminhar o bebê para ser
acompanhado em outra unidade que possa recebê-lo (centro de referência ou ambulatório da rede básica – nesse caso, tentar sensibilizar e treinar um
pediatra da rede para que possa servir de referência para esses bebês).
Follow–up com equipe multidisciplinar (consulte o capítulo Follow-up  do Recém-nascido de Risco).
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE


Vanessa Macedo Silveira Fuck, Aline de Aquino Barbosa, Ana Célia dos Santos Brito, Nathalie de Abreu Cardoso Zambrano, Raquel
Prata

 A amamentação previne metade das mortes causadas por doen-


Cenário atual da amamentação no Brasil e ças infecciosas até o segundo ano de vida. A proteção contra otite média
no mundo também se prolonga até 2 anos e, possivelmente, além. Os estudos sobre
sobrepeso e obesidade mostram que durações mais longas da amamen-
A amamentação está relacionada a diversos aspectos da vida do tação estão associadas a risco mais baixo de excesso de peso na vida adul-
bebê e da mãe, que vão além de questões nutricionais. O ato de ama- ta. Estima-se que 500 ml de leite materno no segundo ano de vida podem
mentar é um processo de interação profunda entre mãe e filho, com proporcionar à criança 95% das necessidades de vitamina C, 45% das de
repercussão na habilidade da criança de se defender de infecções, além vitamina A, 38% da necessidade proteica e até 30% do total de energia.
de promover melhor desenvolvimento cognitivo, emocional, nutricional, Achados de estudos imunológicos, epigenéticos, microbiômicos
fisiológico, repercutindo na saúde da criança no curto e no longo prazos. e com células-tronco, realizados durante as últimas duas décadas, elu-
Recentes pesquisas têm sido realizadas envolvendo o aleitamento cidaram os potenciais mecanismos por meio dos quais a amamentação
materno. Nunca antes na história da ciência se soube tanto a respeito da pode melhorar os desfechos. Provavelmente serão seguidos por outras
complexa importância da amamentação para o binômio mãe-filho. Em 2016 descobertas ainda mais animadoras sobre o extraordinário medicamento
foi publicado um suplemento pela revista The Lancet sobre amamentação, personalizado fornecido pelo leite humano.
em que foram descritos padrões atuais e tendências da amamentação no Enfim, com base em todos os achados científicos e epidemiológicos
mundo, foram revistas as consequências em curto e longo prazos da ama- recentes, não há dúvidas de que a amamentação é essencial para a cons-
mentação para a criança e a mãe, além de avaliar o potencial de vidas salvas trução de um mundo melhor para as gerações futuras em todos os países,
por ano pela ampliação da amamentação. Estima-se que poderia se prevenir sejam ricos, sejam pobres.
823.000 mortes a cada ano em crianças menores de 5 anos e 20.000 mortes
por câncer de mama.
É destacado na publicação que: A importância da amamentação
Globalmente, as prevalências mais altas de amamentação Estudo de diversas meta-análises publicado em 2016 (Victora et
aos 12 meses foram encontradas na África Subsaariana, no Sul al., 2016) concluiu que crianças que são amamentadas por mais tempo
da Ásia e em partes da América Latina. Na maioria dos países têm menor morbidade e mortalidade, menos maloclusão dentária e uma
de alta renda, a prevalência é inferior a 20%. Foram pequenas tendência à proteção contra excesso de peso e diabetes na vida adulta. A
as desigualdades na amamentação relacionadas à renda, mas amamentação foi consistentemente associada a maior desempenho em
as disparidades nas taxas de amamentação continuada foram testes de inteligência em crianças e adolescentes, com um incremento
consistentes: as pessoas mais pobres tendem a amamentar por combinado de 3,4 pontos no quociente de inteligência (QI) em longo
mais tempo do que as pessoas mais ricas em todos os grupos de prazo.
104 países, mas especialmente nos países de média renda. Entretan-
Em relação aos efeitos no curto prazo na saúde da criança, foi
to, mesmo nos países de baixa e média renda, apenas 37% das
observado que a amamentação (alguma vez na vida) associou-se a uma
crianças menores de 6 meses são exclusivamente amamentadas
redução de 36% na ocorrência de morte súbita infantil. Ainda nessa pu-
(Victora et al., 2016).
blicação, uma meta-análise de quatro ensaios controlados randomizados
As análises globais mostram que mais de 80% dos recém-nascidos mostrou redução de 58% na ocorrência de enterocolite necrotizante.
recebem leite materno em quase todos os países. Apesar da recomenda- Além de diversos estudos controlados randomizados, demonstrando
ção da Organização Mundial da Saúde (OMS) de amamentar na primeira que a amamentação protege contra diarreia e infecções respiratórias.
hora de vida, apenas cerca de metade dos recém-nascidos o fazem e, in- Aproximadamente metade de todos os episódios de diarreia e um terço
felizmente, na maioria dos países, as taxas de amamentação exclusiva são das infecções respiratórias poderiam ser evitadas pela amamentação. A
bastante inferiores a 50%. proteção contra internações hospitalares devido a estas doenças é ainda
Em relação ao cenário nacional, segundo a última pesquisa (realizada maior: a amamentação pode prevenir 72% das internações por diarreia
em 2008) de prevalência de aleitamento materno publicada pelo Ministé- e 57% daquelas por infecções respiratórias. Observou-se, também, uma
rio da Saúde (MS) até dezembro de 2017, observou-se que a prevalência proteção importante contra otite média em crianças menores de 2 anos
do aleitamento materno exclusivo (AME) em menores de 6 meses foi de de idade.
41% no conjunto das capitais brasileiras e Distrito Federal. O leite humano é um fluido biológico muito complexo influenciado
Em 2008, a duração mediana do AME foi de 1,8 mês, e a duração pelos genes e pelo ambiente; produzido pela mãe para fornecer cuidados
mediana do aleitamento materno (AM) de 11,2 meses. Dados que de- nutricionais protetores e, também, para atender a todas as necessidades
monstram melhora significativa evolutiva, já que, em 1975, a duração do desenvolvimento do lactente conforme a idade. Isso faz do leite huma-
mediana da amamentação no país era de 2,5 meses; em 1989, de 5,5 no o padrão-ouro incontestável para uma nutrição precoce com a qual
meses; e, em 1999, de 10 meses. nenhuma fórmula de leite artificial pode competir.
Uma comparação de dados nacionais de 1999 e 2008 constatou O leite humano possui uma composição nutricional balanceada,
aumento da prevalência de AME em menores de 4 meses, de 35,5%, que inclui todos os nutrientes essenciais, além de fatores bioativos que
em 1999, para 51,2%, em 2008. A comparação entre as regiões apontou podem agir individualmente e/ou sinergicamente, tais como: agentes
aumentos mais expressivos nas regiões Sudeste, Norte e Centro-Oeste. A anti-inflamatórios, imunomoduladores, enzimas digestivas, hormônios,
comparação do percentual de crianças entre 9 e 12 meses amamentadas, fatores de crescimento, bactérias do microbioma do intestino da mãe,
entre 1999 e 2008, também mostrou aumento de 42,4%, em 1999, para células imunológicas e algumas células descritas mais recentemente
58,7%, em 2008. como os microRNAs e as células-tronco pluripotentes. Estas são capazes
Os resultados da pesquisa do MS de 2008 chamam a atenção para de promover um “sistema de reparação interna” que permanece no corpo
a introdução precoce (já no primeiro mês de vida) de água, chás e outros muito tempo depois do desmame.
leites – com 13,8%, 15,3% e 17,8% das crianças recebendo esses líquidos, Dentre os diversos trabalhos da literatura envolvendo questões
respectivamente. Além da prevalência elevada no uso de mamadeira relacionadas à amamentação, merece destaque um estudo de coorte,
(58,4%) e de chupeta (42,6%) em menores de 12 meses de idade. iniciado em 1982, realizado com crianças nascidas na cidade gaúcha de
Foi observada uma melhora significativa da situação do aleitamen- Pelotas e que foram acompanhadas por 30 anos. Este estudo iniciou com
to materno no país no período analisado, persistindo diferenças entre as um número aproximado de 6.000 participantes e terminou com 3.493.
regiões e capitais analisadas. Porém, o documento conclui que o Brasil Foram avaliados, ao longo dos anos, fatores como: teste de QI, renda e
ainda está distante do cumprimento das metas de aleitamento materno escolaridade. Os resultados concluíram que a amamentação melhora o
exclusivo até 6 meses de vida e amamentação complementar até os 2 desempenho em testes de inteligência na vida adulta, além de ter influên-
anos de idade ou mais, propostas pela OMS (World Health Organization, cia no aumento da renda familiar. Houve, também, menos propensão na
2001) e pelo MS. vida adulta a excesso de peso ou obesidade entre as crianças que foram
amamentadas na infância.
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

Cientistas também estão estudando seu potencial no tratamento nérgica à da lactoferrina e à da IgA secretória, possuindo efeito bactericida
de condições como lesões medulares, diabetes e doença de Parkinson. contra a maioria das bactérias gram-positivas e algumas gram-negativas.
No meio acadêmico, o leite materno é considerado para muitos autores A IgA secretória representa cerca de 90% das imunoglobulinas presentes
mais que uma coleção de nutrientes, é uma substância viva, de grande no colostro e leite maduro e possui maior resistência às alterações de pH
complexidade biológica, protetora e imunomoduladora, que estimula o e à digestão por enzimas proteolíticas. A IgA secretória liga-se às membra-
desenvolvimento do sistema imune, a maturação do sistema digestório nas mucosas, impedindo a aderência dos micro-organismos patogênicos,
e neurológico, além de melhora da acuidade visual. São encontrados e causa, também, a aglutinação de micro-organismos e a neutralização
no leite humano diversos fatores que contribuem para o crescimento de enterotoxinas.
e o desenvolvimento do RN, bem como para a maturação de seu trato A caseína tem a propriedade de formar micelas estáveis, com
gastrointestinal ainda na infância e, também, com capacidade de preve- cálcio e fósforo conferindo a aparência branca do leite e favorecendo o
nir doenças na vida adulta, como: diabetes mellitus tipo 2, sobrepeso e transporte desses minerais em quantidades bem maiores do que seria
obesidade. possível apenas através de sua solubilidade. Como a relação proteínas do
soro/caseína (90:10 no início da lactação) modifica-se rapidamente com o
passar dos dias, atingindo valores de 60:40 ou até de 50:50 na fase do leite
O leite humano – composição maduro, os conteúdos lácteos do cálcio e fósforo modificam-se também,
“O leite materno humano é, portanto, não apenas uma fonte já que mostram correlação significativa com o teor de caseína.
nutricional perfeitamente adaptada aos bebês, mas provavelmente Aminoácidos – o neonato, especialmente o prematuro, apresenta
o medicamento mais personalizado que o bebê receberá, oferecido imaturidade de alguns sistemas enzimáticos, que se traduz por limitada
em um momento em que a expressão genética está sendo aperfei- capacidade para conversão de determinados aminoácidos. A taurina
çoada para a vida.” exerce importante papel na conjugação de sais biliares, bem como no
Simon Murch – professor do Paediatrics and Child Health na transporte de zinco, além de ser encontrada em concentrações elevadas
Warwick Medical School. em tecido retiniano e cerebral, onde parece atuar como neurotransmissor
O colostro é um fluido acumulado nas células alveolares nos últi- excitatório cerebelar. A glutamina promove o crescimento de epitélio
mos meses de lactação e secretado nos primeiros dias pós-parto. Trata-se intestinal e é o principal combustível desse órgão durante período de
de um líquido espesso, de coloração amarelada e pequeno volume. estresse. A carnitina atua no metabolismo dos ácidos graxos de cadeia
Apresenta alto conteúdo de proteínas e minerais, baixa concentração de longa, facilitando seu transporte através da membrana mitocondrial, para
gordura e lactose, refletindo as necessidades do recém-nascido durante que ocorra sua oxidação e parcial conversão a cetonas no fígado.
a primeira semana de vida. Seu conteúdo energético oscila ao redor de 1.1 Função não nutritiva das proteínas:
58 kcal/100 ml, é rico em fatores de defesa, como imunoglobulinas e 1.1.1 No trato gastrointestinal:
outros agentes antimicrobianos, substâncias imunomoduladoras, agentes
Fatores de crescimento: fator de crescimento epidérmico (EGF)
anti-inflamatórios, dentre os quais se destacam os fatores de crescimen-
e fator de crescimento insulina simile 1 (IGF-1) promovem maturação
to e, ainda, os leucócitos. A duração do período do colostro não é bem
da mucosa gastrointestinal, restringindo a penetração de substâncias
definida, existindo grandes variações individuais. Considera-se colostro a
antigênicas, além de apresentar atividade anti-inflamatória, suprimindo
produção láctea até 7 dias de vida do RN.
a função linfocitária. Citocinas, prostaglandinas e somatostina possuem
O leite de transição é aquele produzido no período intermediá- funções tróficas, imunomoduladoras e anti-inflamatórias. Peptídeos atuam
rio entre o colostro e o leite maduro. Nesse período, a composição do sobre crescimento, maturação e regulação gastrointestinal. Enzimas – o
colostro muda, com decréscimo na concentração de imunoglobulinas, leite humano possui mais de 60 enzimas, algumas apresentam atividade
proteínas e um aumento dos níveis de lactose, gordura e do conteúdo na glândula mamária; outras atuam no transporte e na síntese de vários
105
energético. O processo de transição perdura, na verdade, por todo o pri- componentes do leite; outras têm atividade predominante no RN,
meiro mês de lactação, mas se convencionou definir como leite maduro atuando na digestão e/ou no metabolismo, podendo, ainda, contribuir
aquele produzido posteriormente ao 15º dia pós-parto. para a atividade antibacteriana do leite humano.
O leite maduro, produzido a partir do 15º dia, é uma mistura 1.1.2 Agentes anti-infecciosos:
homogênea que consiste em três frações: emulsão (gotas de gordura),
Glicoproteínas e glicopeptídeos: as principais glicoproteínas pre-
suspensão (micelas de caseína) e solução (componentes solúveis em
sentes no leite humano são a K-caseína, as imunoglobulinas IgG, IgM, IgA
água). O conteúdo energético do leite maduro varia de 65 a 75 kcal/dl.
e IgA secretória, a lactoferrina, as moléculas de adesão celular solúveis
O leite humano apresenta variações em seus componentes nutricionais,
ou seletinas, as mucinas e outras. Fatores estimuladores da proliferação
que dependem do estágio da lactação, do horário do dia, do período da
de colônias de leucócitos: granulócitos (G-CSF), macrófagos (M-CSF) ou
amamentação, da idade da mãe, da idade gestacional da criança, assim
ambos (GM-CSF). Fibronectina: substância que facilita a captação de vários
como de aspectos individuais de cada mãe nutriz.
tipos de partículas por células fagocitárias mononucleares.
1. Proteínas: 2. Carboidratos:
O recém-nascido e o lactente apresentam uma atividade anabólica
Lactose – constitui cerca de 70% do conteúdo de carboidratos do
intensa, que necessita de uma oferta correspondente de nitrogênio a ser
leite humano e fornece cerca de 45% a 50% do conteúdo energético total.
fornecida nos primeiros 6 meses de vida. O leite humano maduro fornece,
Lactentes e RNs, inclusive os RNs pré-termo, têm capacidade de absorver
em média, 1,2 g de proteína para cada 100 ml. As proteínas do soro cons-
mais de 90% do conteúdo de lactose do leite humano. A lactose parece
tituem cerca de 60% a 90% de seu teor proteico total. Sua composição
exercer ação facilitadora sobre a absorção de cálcio e fósforo na luz in-
inclui a alfa-lactalbumina, a lactoferrina, a lisozima, a soroalbumina e as
testinal, importante especialmente em RNs pré-termo. A permanência de
imunoglobulinas. A lactoferrina, a lisozima e as imunoglobulinas, especial-
pequena quantidade de carboidrato na luz intestinal é considerada como
mente a IgA secretória, são proteínas do soro do leite humano envolvidas
um efeito fisiológico normal da alimentação com leite humano, resultan-
no sistema de proteção.
do na eliminação de fezes mais amolecidas e reduzindo a incidência de
A alfa-lactalbumina constitui cerca de 40% das proteínas do soro constipação intestinal. Além disso, age em conjunto com o fator bífido
do leite humano. É necessária para o transporte de ferro, síntese de lactose para promover o crescimento do Lactobacillus bifidus, levando à queda do
na glândula mamária, além de ser rica em triptofano, que está envolvido pH local e tornando o ambiente impróprio ao crescimento de bactérias
no desenvolvimento neurológico. Estudos recentes relacionam sua ação, patogênicas.
associada ao ácido oleico, com a capacidade de induzir a apoptose de
Oligossacarídeos são responsáveis por:
mais de 40 tipos de cânceres, por meio de molécula conhecida como
HAMLET (Human Alpha-lactalbumin Made Lethal to Tumours). Além disso, • Ação facilitadora sobre absorção de cálcio e fósforo na luz
os estudos também têm demonstrado que a substância HAMLET tem intestinal, o que pode auxiliar na prevenção da doença meta-
atividade antibacteriana contra Streptococcus pneumoniae. Existem indi- bólica óssea em RN pré-termo.
cações de que esta possa contribuir para a diminuição da incidência de • Em conjunto com o fator bífido, levar à queda do pH e tornar o
câncer ao longo da vida em crianças que recebem leite humano. O fator ambiente impróprio ao crescimento de bactérias patogênicas,
mais importante observado nos ensaios laboratoriais é que essa molécula promovendo o crescimento da microbiota não patogênica na
não tem efeitos secundários, pois somente elimina as células canceríge- luz intestinal.
nas e não danifica células sãs do indivíduo. • Inibir a adesão bacteriana às superfícies epiteliais e promover
a interação entre leucócitos e endotélio, na fase inicial das
A lactoferrina possui propriedade bacteriostática, pois, ao se ligar
reações inflamatórias.
ao ferro, impede o uso desse mineral pelos micro-organismos patogêni-
cos. A lisozima tem ação lítica da parede celular bacteriana; sua ação é si-
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

• Modular o crescimento e a formação de biofilme de Strepto- materno exclusivo se a nutriz tiver uma nutrição adequada. Quando a
coccus agalactiae, que causa infecções invasivas em crianças oferta materna de vitaminas é baixa, seus níveis lácteos também o são,
e adultos. e a desnutrição materna pode ocasionar a diminuição da produção do
leite, mas mantém seu valor nutricional, embora possa haver diminuição
3. Gorduras: de algumas vitaminas hidrossolúveis, como vitaminas do complexo B e
A composição nutricional do leite humano, especialmente em rela- vitamina C.
ção ao componente lipídico, apresenta variações biológicas inerentes ao A concentração no leite humano de B1 (tiamina), B2 (riboflavina),
processo da lactação. Durante a mamada existe uma elevação significativa B6 (piridoxina) e vitamina A são influenciadas pela dieta materna, sendo,
do conteúdo de gorduras, possuindo o leite final ou posterior por volta de muitas vezes, necessária a suplementação na lactante se não há uma in-
três vezes a concentração lipídica do leite inicial ou anterior. As gorduras gesta adequada. Porém, muito melhor do que qualquer suplementação é
constituem a maior fonte de energia do leite humano, sendo sua síntese a orientação de uma dieta variada, balanceada e adequada para o período
estimulada pelo esvaziamento da mama, especialmente através da ama- da lactação.
mentação, e ainda pela prolactina, secretada no lobo anterior da hipófise.
Seu conteúdo no leite maduro varia entre 3 e 4 g/dl, aproximadamente
45% a 55% do valor calórico total; já no colostro e leite de transição, é A microbiota do leite humano
observada concentração lipídica menor.
O microbioma dos diferentes locais do corpo humano constitui
Os lipídeos do leite humano são facilmente digeríveis e absorvíveis uma rede dinâmica de comunidades inter-relacionadas. Estudos recentes
em decorrência da ação combinada de vários fatores, tais como presença sugerem que o contato com o microbioma da mãe pelo feto começa
de duas lipases no leite humano, organização do glóbulo de gordura, no útero, pois são várias alterações anatômicas e fisiológicas no sistema
composição de ácidos graxos e comprimento de suas cadeias. Os prin- mamário, incluindo ductos, aréola e mamilos durante a gravidez. Os resul-
cipais ácidos graxos existentes no leite humano são os ácidos linoleico e tados fornecidos por diferentes grupos de pesquisa sugerem que certas
linolênico, considerados como ácidos graxos essenciais e precursores bactérias do trato gastrointestinal da lactante poderiam se translocar
dos ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa (LCPUFA) – ácidos ara- através de um mecanismo envolvendo células imunes mononucleares
quidônico e docosaexaenoico que, sendo componentes dos fosfolípides e migrar para a glândula mamária, através da via entero-mamária e,
das membranas celulares, exercem importante papel no crescimento e subsequentemente, colonizar o trato gastrointestinal do recém-nascido
desenvolvimento do sistema nervoso, através da mielinização e também amamentado. Entender a natureza dessas bactérias e como elas afetam a
da função retiniana. Sugere-se, ainda, que os LCPUFA protegem contra o saúde infantil é de fundamental importância.
desenvolvimento de doenças autoimunes na vida futura; além de serem
precursores dos mediadores inflamatórios, como prostaglandinas, prosta- O leite humano pode, portanto, ser considerado um alimento
ciclinas, tromboxanes e leucotrienos. O RN pré-termo, em especial aquele simbiótico, pois, além da presença de oligossacarídeos (que atuam como
de muito baixo peso, possui capacidade limitada para sintetizar os LCPUFA prebióticos), ele também tem bactérias vivas (inúmeras bactérias comen-
a partir de seus precursores, de onde se infere a importância de sua oferta sais e/ou simbióticas viáveis). Essa microbiota tem uma variabilidade que
a partir do leite humano. pode ser sensível ao ambiente e relacionada ao hospedeiro. Compreender
a natureza simbiótica do leite humano pode ser um passo importante
Os lactentes consomem grandes quantidades de colesterol por para entender como todos os alimentos probióticos afetam a saúde e a
meio do leite humano, o que tem importância na mielinização do sistema doença ao longo do ciclo de vida.
nervoso, para a produção de hormônios esteroides, de ácidos biliares e
vitamina D; além de atuar na indução da maturação dos sistemas enzimá- Após o nascimento, a microbiota materna coloniza de forma gra-
dual o recém-nascido (através do contato pele a pele e do leite humano)
106 ticos que metabolizam o colesterol, influenciando a capacidade futura de
e a criança (microbioma da família e ambiente). Estudos comparando a
regulação de suas concentrações plasmáticas e auxiliando na prevenção
da doença aterosclerótica na vida adulta. microbiota intestinal de lactentes alimentados com fórmulas infantis (FI) e
os em aleitamento materno exclusivo revelam perfis bacterianos diferen-
tes. Os lactentes em uso de FI apresentam maior colonização por bactérias
4. Minerais: potencialmente patogênicas, como: E. coli, Bacterioides, Campylobacter e
O conteúdo mineral no colostro é superior ao do leite maduro. Estes Streptococcus, além de menor número de lactobacilos e bifidobactérias.
níveis parecem ser, na maioria das vezes, suficientes para a nutrição do RN. Além disso, a microbiota parece ter uma influência na prevenção de
Ferro – sua absorção chega a 40%, devido à elevada biodisponibi- doenças gastrointestinais, alérgicas, autoimunes e metabólicas, ao longo
lidade de ferro do leite humano, resultante de seu menor conteúdo de da vida. A relação da interação precoce do bebê com a microbiota ma-
proteínas e fósforo, bem como dos maiores níveis de lactose e vitamina terna durante a gravidez e a amamentação oferece uma nova ferramenta
C. O baixo teor de ferro no leite humano é desejável para permitir que a promissora para reduzir o risco dessas doenças.
lactoferrina permaneça, em sua maior parte, sob forma insaturada, man- Portanto, o leite materno é o padrão-ouro na alimentação do re-
tendo suas propriedades bacteriostáticas. cém-nascido, pois, mais que uma coleção de nutrientes, é uma substância
Cálcio – tanto o colostro quanto o leite maduro contêm, aproxima- viva, de grande complexidade biológica, protetora, imunomoduladora,
damente, 28 a 33 mg/dl de cálcio e 13 a 15 mg/dl de fósforo. O cálcio está que melhora a acuidade visual, estimula o desenvolvimento do sistema
ligado ao fosfato nas micelas de caseína, o que contribui para o transporte imune, a maturação do sistema digestório e neurológico, e previne doen-
dos minerais em quantidade maior do que seria possível através de sua ças na infância e vida adulta.
solubilidade. O cálcio também se encontra no leite humano sob a forma
ionizado, constituindo vários compostos, como citrato e fosfato. Assim, a
concentração láctea deste mineral provavelmente varia em função dos Anatomia e fisiologia da mama
conteúdos de citrato e caseína; os níveis de cálcio e fósforo elevam-se
A mama é formada pela glândula mamária, tecido conjuntivo, liga-
no leite humano de acordo com o tempo de lactação, acompanhando
mentos de Cooper e tecido adiposo. O volume da mama e seu contorno
a ascensão do teor de caseína. O leite produzido por mães de RNs pré-
arredondado estão diretamente ligados à quantidade de gordura que
-termo contém as mesmas quantidades de cálcio e fósforo em relação ao
circula o tecido glandular, e não indica sua capacidade funcional.
produzido por mães de RNs de termo.
Na aréola, encontram-se as glândulas de Montgomery, que aumen-
Magnésio – suas concentrações em colostro e leite maduro são
tam de volume durante a gestação, e cuja secreção tem a função de lu-
semelhantes e não se observa hipomagnesemia em RNs de termo em
brificar e proteger o mamilo e a aréola, inclusive com ação antibacteriana.
aleitamento materno exclusivo. Os prematuros nascem com reservas
Sob a aréola estão os ductos lactíferos, que se dilatam durante a produção
especialmente baixas desse íon, uma vez que seu depósito intrauterino
e a ejeção do leite (antigamente, eram denominados seios lactíferos). Por
é formado no terceiro trimestre da gestação e ainda há controversas em
isso é tão importante a pega correta do bebê, que deve mamar com a
relação às rotinas de suplementação.
boca bem aberta, pegando mais abaixo do que acima da aréola, para que
Zinco – tem elevada biodisponibilidade no leite materno e encon- os ductos lactíferos cheios de leite sejam pressionados pela língua do
tra-se em maior quantidade no colostro, com níveis decrescentes ao lon- bebê, expelindo o leite em direção à boca da criança.
go do processo de lactação. A maioria dos RNs de termo em aleitamento
O desenvolvimento da glândula mamária é influenciado pela ação
materno exclusivo não manifesta deficiência nesse mineral.
hormonal, sendo o estrógeno e o GH responsáveis pelo crescimento
ductal e a progesterona pela diferenciação dos lóbulos e alvéolos durante
5. Vitaminas: a puberdade. Na gestação, ocorre proliferação de ductos e ácinos e for-
O conteúdo vitamínico do leite humano é afetado por vários fatores, mação de novos alvéolos. A partir da 20ª semana de gestação, a mama
dos quais o mais importante é o estado nutricional materno, e, em geral, está pronta para produzir leite (pré-colostro), mas as grandes quantidades
não há deficiências vitamínicas ou de minerais em bebês em aleitamento de progesterona produzidas pela placenta inibem a produção da prolac-
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

tina. Com o parto e a saída da placenta, ocorre uma rápida elevação da aumento da pressão intra-alveolar, que bloqueia a ação da ocitocina, difi-
prolactina, aumento da produção do leite e consequente apojadura ou cultando o reflexo de ejeção e a descida do leite. Esse é um dos motivos
descida do leite. Nesse momento, o controle da produção do leite passa a pelo qual deve-se esvaziar as mamas que se encontrarem muito cheias
ser resultado da sucção do bebê e do esvaziamento da mama. e a importância da amamentação em livre demanda, para garantir uma
Logo após o parto, a sensibilidade tátil na região mamilo-areolar adequada produção láctea.
aumenta consideravelmente e mantém-se por vários dias. Esse parece ser
o evento-chave para ativar a liberação, induzida pela sucção, da ocitocina
e prolactina após o parto. Por isso a importância do contato pele a pele
Técnicas de amamentação
na primeira hora de vida. A sucção efetiva do bebê estimula terminações Amamentar é um ato natural e instintivo, mas, no momento inicial, o
nervosas no mamilo e na aréola, que enviam impulsos neurais para o hi- apoio e o incentivo são fundamentais para o sucesso e a continuidade do
potálamo materno, estimulando a produção da prolactina e da ocitocina. aleitamento materno. Algumas orientações básicas ajudam na primeira
A prolactina age estimulando as células secretoras nos alvéolos da pega e sucção do bebê ainda na sala de parto, e isso pode facilitar o pro-
mama a produzirem leite. Aproximadamente 30 minutos após o início da cesso natural. Todo profissional de saúde que atua com recém-nascidos
mamada, ocorre um pico de elevação da prolactina basal, que dura cerca tem que estar capacitado a orientar a mãe em relação ao bom posiciona-
de 3 a 4 horas. Com mamadas frequentes, mantém-se um nível basal alto mento do bebê ao seio materno, evitando fissuras e traumas mamilares
de prolactina, favorecendo a continuidade da amamentação. A produção futuros. Os primeiros 14 dias de vida do recém-nascido são cruciais para o
de prolactina é maior à noite e dá à mulher uma sensação de relaxamento sucesso da amamentação, pois é nesse período que a lactação se estabe-
e bem-estar. lece, semanas de intenso aprendizado para a mãe e o bebê.
A produção de leite materno será regulada pela sucção da criança, De fundamental importância é a garantia do contato pele a pele
dependendo do esvaziamento da mama e do controle autócrino, ou seja, precoce e o estímulo ao aleitamento materno na primeira hora de
a regulação da produção passa a ser feita no próprio local da produção vida, práticas garantidas pela Portaria nº 371, publicada pelo MS em 2014,
do leite, e o volume de leite passa a depender da frequência e eficiência que institui diretrizes para a organização da atenção integral e humaniza-
das mamadas. da ao recém-nascido. A sucção espontânea pode não ocorrer até 2 horas
após o parto; porém, os estudos evidenciam que o contato precoce com a
A simples sucção do bebê não é suficiente para a saída do leite; é
mãe está associado à maior duração da amamentação, à melhor interação
fundamental, também, a atuação da ocitocina na contração das células
mãe-bebê, ao melhor controle da temperatura do RN, a níveis mais altos
mioepiteliais ao redor dos alvéolos, promovendo o reflexo de ejeção do
de glicose, a menos choro do recém-nascido e à redução do risco de he-
leite. O reflexo de descida do leite pode ser influenciado por estímulos
morragia materna no pós-parto.
auditivos, visuais, sentimentos, pensamentos e emoções. Sentimentos
agradáveis podem ajudar o reflexo da ocitocina, enquanto estresse, dor, Na avaliação da mamada, é essencial observar dois pontos: posi-
preocupação e dúvidas podem inibir, por ação da adrenalina e noradrena- cionamento e pega. O corpo do bebê deve estar posicionado inteiramen-
lina. Por isso, o cuidado com a mãe, o uso de técnicas de aconselhamento te de frente para a mãe e bem próximo (barriga do bebê voltada para o
e uma boa rede de apoio são importantes para a continuação do aleita- corpo da mãe). É importante que a cabeça e a coluna do bebê estejam
mento materno. alinhadas, em linha reta, com a boca de frente para o bico do peito. A mãe
pode estar sentada, deitada, reclinada ou em pé e deve apoiar o braço e a
Existem, no leite materno, peptídeos supressores da lactogênese
mão no corpo do bebê, segurando-o em diferentes posições, que podem
que agem bloqueando a ação da prolactina na célula alveolar. Se o leite
ser de forma tradicional (figura 1A), posição invertida (figuras 1B e 1C) ou
não for removido, esses peptídeos supressores atuam inibindo a produção
de cavaleiro (figura 2), conforme se sinta mais confiante e confortável para
de leite. Com a sucção do bebê, o leite e os peptídeos supressores são
removidos e a mama volta a produzir leite materno. Além disso, com o
amamentar. Com a outra mão, a lactante pode aproximar o mamilo da 107
boca do bebê e ele mesmo vai procurar o seio materno.
aumento da produção de leite e o não esvaziamento da mama ocorre um
Figura 1 – Posição tradicional (1A) e posição invertida (1B/1C)
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Figura 2 – Posição de cavaleiro

É fundamental observar os reflexos de fome do bebê e como se • Os lábios virados para fora, realizando um correto selamento
desencadeiam os seus reflexos orais, divididos em: labial.
1. Reflexo de busca ou procura – consiste em localizar o seio • O queixo deve tocar o seio materno.
materno, ativado mediante o toque na bochecha ou pontos • A aréola deve ser mais visível acima da boca do bebê, e não
cardeais dos lábios. abaixo.
2. Reflexo de sucção – função de retirada do leite, desencadeado • A língua do bebê deve envolver o bico do peito e a bochecha
pelo toque na ponta da língua. se apresenta redonda – cheia de leite – ao mamar.
3. Reflexo de deglutição – mediante estímulo do leite na região O uso de mamadeiras e chupetas prejudica o correto posiciona-
posterior da língua e palato mole. mento do mamilo no palato do bebê, e, além disso, os músculos utilizados
Para a adequada amamentação, deve existir uma coordenação para sugar a mamadeira são outros. A língua apresenta-se retroposiciona-
108 entre os processos de sucção-deglutição-respiração, o que é natural em da e há pouca abertura da boca, o complexo aréola-mamilo não chega
bebês de termo e saudáveis, e em bebês de idade gestacional geralmente ao ponto de sucção, conforme exemplificado na figura 5. A pega incor-
maior que 34 semanas. reta prejudica a amamentação e a extração de leite pelo recém-nascido,
provocando o que conhecemos como confusão de bicos, muitas vezes
Para auxiliar no reflexo de busca, a mãe pode encostar o mamilo na responsável por traumas mamilares e desmame precoce.
boca do bebê e levar o bebê ao seio materno, e não o seio ao bebê. Para
uma pega adequada, o ideal é a mãe segurar a mama em formato de “C” Alguns sinais de que a pega está errada são: ruídos da língua durante
ou concha – com o polegar acima da aréola e o indicador e a palma da a deglutição, dor ou fissuras mamilares e baixo ganho ponderal do recém-
mão abaixo da mama, sustentando-a, conforme exemplificado pela figura -nascido. Na literatura, existem alguns instrumentos e questionários para
3. avaliar a mamada e a autoeficácia da amamentação. Um dos protocolos
mais utilizados é o Instrumento Bristol de Avaliação da Mamada, que leva
Figura 3 – Correta posição de sustentação da mama e ordenha ao em consideração o correto posicionamento do bebê, a pega adequada, a
seio materno boa sucção – efetiva em ambos os peitos, com uma deglutição audível, re-
gular, suave e sem estalos. Um dado importante levado em consideração
no instrumento é o questionamento às mães em relação ao conforto das
mamas e dos mamilos – se há dor ou trauma mamilar. Se o RN apresentar
dificuldades de pega e sucção e a mamada for ineficiente, ele ficará agi-
tado e insatisfeito após as mamadas, e pode adormecer de cansaço ou
querer mamar toda hora, ocasionando pouco ganho ponderal. A família
tende a interpretar erroneamente como “leite fraco ou insuficiente”, a
relação entre mãe e filho torna-se desgastante e, muitas vezes, ocasiona
o desmame precoce.
Figura 4 – Exemplo de pega correta ao seio materno

Fonte: Promovendo o aleitamento materno, Ministério da Saúde (Brasil, 2007).

Na adequada sucção, a mãe deve ouvir o ritmo cadenciado de


sucção, deglutição e pausa, com o bebê abocanhando a maior parte da
aréola, para que o mamilo fique encostado no céu da boca, e isso evite
Fonte: Promovendo o aleitamento materno, Ministério da Saúde (Brasil, 2007).
traumas. Para facilitar a pega adequada de toda aréola, é necessário que
a mama não esteja muito ingurgitada, por isso massagem e ordenha ma- Figura 5 – Exemplo de pega incorreta ao seio materno, com lábios
nual antes da mamada podem ajudar. do recém-nascido envolvendo apenas mamilo e não toda a região areolar;
Algumas dicas são fundamentais para avaliar se a pega está ade- consequentemente, o complexo aréola-mamilo não chega ao ponto de
quada, conforme figura 4: sucção e não há extração adequada do leite pelo bebê
• A boca do bebê deve estar bem aberta.
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

correta ao seio, e direcionada ao lábio inferior. Quanto mais alto estiver o


recipiente, mais rápido será o fluxo de leite e mais fácil para o bebê. Quan-
to mais calibrosa a sonda, mais fácil para o bebê. Deve-se ter cuidado para
não oferecer alto fluxo e não facilitar muito para não desestimular a sucção
ao seio materno quando estiver sem o volume extra oferecido pela sonda.
Inicialmente, o método pode ser complicado de realizar pela mãe sozinha,
até adquirir certa prática e posicionamento, e, por isso, é imprescindível
o apoio da equipe de saúde e da família no processo. Deve-se garantir
o acompanhamento do bebê, com avaliação do peso, das mamadas e
da produção de leite, e a redução/interrupção da translactação deve ser
programada e gradual.
Fonte: Promovendo o aleitamento materno, Ministério da Saúde (Brasil, 2007).
Relactação é o restabelecimento da produção de leite após a in-
Um aspecto a ser considerado nessa dinâmica de sucção do bebê terrupção temporária da lactação, que pode ocorrer devido à separação
é a anquiloglossia. Consiste em frênulo lingual anormalmente curto e da dupla mãe-filho ou desmame precoce, por exemplo. Grande parte
espesso/delgado, que pode restringir os movimentos da língua em dife- das mães volta a produzir leite em uma semana e as chances de êxito
rentes graus. Em 2014, foi instituída, no Brasil, a Lei Federal nº 13.002, co- são maiores quanto antes iniciado o processo de relactação. A sucção
nhecida como “Teste da Linguinha”, que recomenda a triagem neonatal frequente do bebê ao seio materno visa ao aumento da produção de
obrigatória da anquiloglossia em neonatos em todas as maternidades do prolactina e consequente aumento da produção de leite.
país. Após avaliação da amamentação por profissional capacitado, de pre- Figura 6 – Técnica de translactação
ferência por equipe multidisciplinar e fonoaudiólogo, a frenotomia pode
ser indicada e realizada por meio de procedimento cirúrgico por dentista
ou médico capacitado, visando à garantia da amamentação efetiva.
Um outro aspecto essencial para o sucesso do aleitamento materno
é a abordagem do aconselhamento em amamentação, técnica que visa
aprimorar a comunicação na assistência ao aleitamento materno. O prin-
cipal objetivo é aprender a ouvir e acolher as queixas apresentadas pelas
mães, valorizando o diálogo pessoal e a descoberta da autoconfiança.
Diversos estudos têm mostrado que os profissionais de saúde – princi-
palmente os médicos – estão inseguros em relação às abordagens e à
promoção ao aleitamento materno, fornecendo informações conflitantes
e, muitas vezes, provocando insegurança às nutrizes e atrapalhando o
processo de aleitamento materno. Muitas vezes, os profissionais de saúde
têm domínio teórico do assunto, mas ausência do domínio prático. É fun-
damental que os profissionais de saúde entendam a amamentação como Técnica sonda-dedo ou técnica do finger-feeding:
um processo biopsicossocial, dinâmico, sendo necessária, portanto, uma É uma técnica utilizada para promover a coordenação entre sucção-
abordagem multidisciplinar. -deglutição- respiração em bebês prematuros, com comprometimento
Dicas práticas para as mães de como amamentar: neurológico ou respiratório. Devido ao risco de interferência no padrão
1. Oferecer o peito sempre que o bebê quiser – livre demanda!
normal de sucção ao seio materno e risco de ocasionar possíveis disfun- 109
ções orais, essa técnica deve ser utilizada apenas em casos específicos,
Isso estimula e garante a produção de leite.
sempre por profissional capacitado (de preferência fonoaudiólogo), de
2. Em cada mamada, oferecer os dois seios, se o bebê desejar.
forma transitória e após esgotados os métodos convencionais de se ofe-
Oferecer um seio materno até o bebê soltar e depois oferecer
recer suplemento.
o outro – para o bebê receber o leite posterior – do final da
mamada, mais rico em gordura. Não limitar a duração das Geralmente, é usada para avaliar as condições para a alimentação
mamadas e, na próxima mamada, começar com o seio que por via oral e no início desse processo. Faz-se estímulo da sucção nutritiva
o bebê sugou por último e por menos tempo na mamada com o dedo mínimo enluvado, com a polpa voltada para cima e com
anterior. uma sonda gástrica número 4 ou 6 fixada, por onde fluirá o leite vindo da
3. O bebê tende a soltar a mama sozinho quando está satisfeito, seringa acoplada à sonda. O fluxo de leite deve ser controlado pelo profis-
mas se a mãe precisar interromper a mamada, pode utilizar sional, que, além de avaliar o padrão de sucção, deve controlar e analisar
a ponta do próprio dedo mínimo no canto da boca do bebê a coordenação, pausas, organização, sinais de aproximação, de estresse e
para desfazer a pressão e evitar traumas mamilares. estado de consciência do recém-nascido.
4. Não é necessário limpeza das mamas antes ou após as ma-
madas. Alimentação por copinho:
No bebê que apresenta os reflexos de sucção, deglutição e engasgo
Formas de oferecer suplemento presentes, pode-se usar a técnica do copinho, em que o bebê mantém
a estabilidade fisiológica e controla a frequência com que deseja tomar
o leite. Deve-se limitar o tempo da alimentação a 30 minutos para evitar
Técnica de translactação e relactação: fadiga, aumento de consumo calórico e estresse.
Translactação é uma forma de oferecer um maior volume de leite ao As principais vantagens dessa técnica são evitar a confusão de bicos;
bebê, sempre junto com o seio materno. O bebê suga o leite materno or- permitir o contato com o cuidador; diminuir o risco de otite média, devido
denhado ou suplemento necessário por meio de uma sonda nasogástrica à posição; requerer menos gasto energético do bebê; estimular os senso-
inserida no canto da boca da criança junto com o movimento de sucção res e receptores orais e olfatórios, aumentando a produção de enzimas
ao seio materno. Pode ser indicada para recém-nascidos pré-termo na digestivas; e promover o movimento da mandíbula, língua e músculos
transição da gavagem para o peito, nos bebês com ganho ponderal in- da boca. As desvantagens são a perda considerável de volume de leite; o
suficiente, sucção débil ou incoordenada, confusão de bicos, síndrome de risco de aspiração se o bebê não for colocado na posição correta; e o fato
Down, fissuras labiopalatais, cardiopatias e distúrbios neurológicos, entre de não utilizar os mesmos músculos que usa ao sugar o seio materno e
outros. nem satisfazer a necessidade de sucção do bebê.
Os principais benefícios da técnica de translactação são: evitar o uso Coloca-se o leite materno no copinho limpo, enchendo-o até a
de bicos artificiais, não interferir na habilidade de sugar o peito, garantir metade. O bebê deve estar na posição sentada e deve-se apoiar gentil-
o estímulo da mama para manter a produção láctea, otimizar o tempo mente o copinho no lábio inferior do bebê, tocando o lábio superior ex-
da mãe, reduzir o gasto calórico do bebê, possibilitar o retorno ao aleita- ternamente. O copo deve, então, ser inclinado levemente para que o leite
mento materno, reduzir o tempo de hospitalização e manter o vínculo e o toque apenas os lábios e a língua do bebê. Assim, o bebê testa o alimento
protagonismo da mãe na alimentação do seu bebê. com a língua e deglute na frequência que desejar. Deve-se ter o cuidado
Para realizar a translactação (figura 6), acopla-se uma sonda naso- de não despejar o leite na boca do bebê, e sim deixar o recém-nascido
gástrica ao recipiente que contém o leite (que pode ser um copo ou uma buscar o leite ativamente por meio dos movimentos ativos com a língua.
seringa). A extremidade da sonda pode ser fixada à mama antes de colo-
car o bebê para sugar ou ser inserida pela comissura labial após a pega
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Pacientes com necessidades especiais O bebê não deve ser levado ao seio faminto, podendo ser usado lei-
te materno ordenhado para acalmá-lo antes de ser colocado ao seio. Com
fissura labial única, geralmente a dificuldade na amamentação é pouca.
Prematuridade: Na fenda de grande extensão, deve-se orientar a mãe a introduzir a mama
A mãe do bebê prematuro produz um leite diferenciado, adequado pelo lado da fissura, apontando o mamilo para o lado contrário. Em casos
às necessidades do seu bebê, e deve ser estimulada a passar o maior tem- em que a fenda labial é bilateral ou em que há comprometimento da
po possível com o bebê; enquanto ainda não for possível amamentá-lo ao arcada, a posição de cavaleiro com apoio da mama e utilização do polegar
seio, ordenhar o próprio leite e oferecê-lo por técnica adequada (sonda da mãe para vedar a fenda podem facilitar a mamada.
gástrica, copinho ou translactação), de acordo com o desenvolvimento
neurológico. Síndrome de Down:
A decisão de início da alimentação por via oral deve levar em consi- Por apresentar atraso no desenvolvimento, redução do tônus mus-
deração não apenas o peso ou a idade gestacional corrigida, mas também cular e hipotonia de mandíbula, muitas vezes esses bebês necessitam de
a estabilidade clínica e a coordenação de sucção, deglutição e respiração; maior estímulo pelo toque gentil em extremidades. As mamadas geral-
habilidade que começa a se desenvolver em torno das 32 semanas, e, mente são mais curtas e mais frequentes. A posição cavaleiro, com apoio
geralmente, está estabelecida com 34-36 semanas de idade gestacional da mama e da mandíbula, pode facilitar a pega adequada.
corrigida.
Com o intuito de contribuir com o sucesso do aleitamento materno Fenilcetonúria:
do recém-nascido pré-termo, a equipe de saúde deve apoiar a mãe do O leite humano apresenta baixos níveis de fenilalanina, suficientes
bebê e estimular que toda a família também o faça; favorecer o contato para o crescimento do indivíduo, sem que haja sobrecarga metabólica. É
precoce entre mãe, pai e bebê; orientar a mãe sobre técnicas de coleta recomendável manter aleitamento materno, com seguimento dos níveis
e armazenamento do próprio leite enquanto o bebê não suga ao seio; de alanina, sendo a substituição do leite materno por fórmula livre de
fornecer um leite adequado às necessidades do bebê, em parceria com o fenilalanina justificada apenas se houver alteração clínica e laboratorial.
Banco de Leite Humano (BLH) de referência; ajudar a mãe com as técnicas
corretas de amamentação de acordo com o desenvolvimento neurológico Galactosemia clássica e doença da urina em xarope de
do bebê e garantir um acompanhamento adequado após a alta hospitalar.
bordo:
Gemelaridade: São doenças metabólicas que contraindicam a amamentação. No
caso da galactosemia clássica, os portadores devem receber fórmula isen-
A glândula mamária pode produzir leite suficiente para atender à
ta de galactose. Já os bebês com doença da urina em xarope de bordo
demanda nutricional de bebês múltiplos. Nesse momento, é importante
devem receber fórmula isenta de leucina, isoleucina e valina.
o apoio familiar, não apenas emocional, mas também no cuidado com os
bebês e nos afazeres domésticos. A mãe deve ser estimulada a ter uma
alimentação balanceada e descansar entre as mamadas. Patologias da mama
É possível tanto amamentar dois bebês ao mesmo tempo quan-
to um de cada vez. A escolha é da mãe e cabe ao profissional de saúde
Ingurgitamento mamário:
ajudá-la a encontrar posições que favoreçam a boa pega e o sucesso da
amamentação, em geral combinações das posições tradicional, invertida Na fase inicial do processo de lactação ocorre um ingurgitamento
ou cavaleiro entre os dois bebês, se amamentados simultaneamente. De- fisiológico, também conhecido como apojadura ou “descida do leite”;
110 ve-se respeitar os padrões individuais de sono e alimentação dos bebês, porém, se houver alguma falha nos mecanismos de autorregulação das
mas garantir um acompanhamento cuidadoso do ganho de peso, para mamas, este pode se tornar patológico. O leite adquire um aspecto visco-
determinar se algum bebê deve mamar em intervalos mais curtos e rece- so e passa de líquido para gelificado no interior dos ductos mamários, de-
ber maior quantidade de leite posterior. vido à estase, e o processo pode ser denominado popularmente de “leite
empedrado”. Há presença de congestão vascular e linfática, consequente
Cardiopatia: edema e retenção de leite nos alvéolos, em diferentes graus e níveis de
dor.
Dentre os benefícios do leite humano aos pacientes cardiopatas,
podemos ressaltar: baixo nível de sódio, fácil digestibilidade (pode se O ingurgitamento pode ser decorrente de início tardio da ama-
alimentar com volumes menores, com maior frequência), propriedades mentação, excesso de produção de leite, períodos muito longos entre as
imunológicas e melhor vínculo mãe-bebê. mamadas ou falhas no esvaziamento das mamas – por pega incorreta e
sucção ineficaz –, muitas vezes ocasionados pelo uso de chupetas, mama-
Durante a mamada ao seio, ocorre uma interação entre a deiras e suplementos. O ingurgitamento patológico pode ocasionar dor
mãe e o bebê, com consequente alteração da atividade autonô- intensa, áreas difusas brilhantes ou hiperemiadas, mal-estar e até mesmo
mica do coração e da vasculatura, com menor trabalho cardíaco. febre, com distensão da aréola e dificuldade ainda maior na pega e extra-
A mãe deve ser encorajada a manter o aleitamento materno, e dar prefe- ção correta do leite pelo bebê.
rência à posição cavaleiro, por períodos mais curtos de tempo e com uma
frequência maior, para garantir o aporte de nutrientes e evitar distensão O objetivo do tratamento é o esvaziamento das mamas, com a
abdominal. fluidificação do leite por meio de massagens e ordenhas, a fim de facilitar
a pega e a sucção. A técnica de massagem por meio do “sacolejo” é muito
eficaz porque rompe interações moleculares e ajuda no retorno do leite
Problemas neurológicos: da forma de gel para a forma líquida, além de facilitar a ejeção do leite e o
Assim que for clinicamente possível, a amamentação ao seio deve reflexo da ocitocina. Manter a mama sustentada e em posição anatômica
ser estimulada. Devido à hipotonicidade, é ideal apoiar a mama e a man- facilita a drenagem do leite e é indicado o uso de sutiãs de alças largas e
díbula do bebê e posicionar em cavaleiro, de forma que sua boca fique adequados para amamentação. Podem ser prescritos para a mãe analgé-
na altura do seio materno. Quando o bebê apresentar dificuldade de sicos ou anti-inflamatórios compatíveis com a amamentação. Em casos
coordenação da sucção e deglutição, pode-se tentar controlar o fluxo de criteriosos, o uso de compressas frias pode ajudar na redução do edema
leite utilizando os dedos em pinça ao redor da aréola, ou com inclinação – com aumento da drenagem linfática –; porém, não devem ser utilizadas
posterior do corpo da mãe em 30º. por mais de 15 minutos, porque podem causar efeito rebote de vasodila-
tação e aumentar ainda mais a produção láctea local. Compressas quentes
Meningomielocele: devem ser evitadas pelo risco de promover vasodilatação e aumentar a
Assim que possível, deve ser amamentado ao seio, de preferência produção de leite, com piora do ingurgitamento mamário.
em posição invertida ou sobre o corpo da mãe, deitada em decúbito Sem dúvida, a melhor maneira de se prevenir o ingurgitamento ma-
dorsal. Desta forma, impede-se a compressão do defeito ou da ferida mário é a amamentação precoce na sala de parto, o estímulo ao contato
operatória, evitando dor e desconforto durante as mamadas. pele a pele precoce e a livre demanda, com a garantia de mamadas fre-
quentes e eficazes. O tratamento do ingurgitamento previne a ocorrência
Fissuras labiais e palatinas: de mastites e garante a adequada produção de leite.
Devido à maior flexibilidade em relação aos bicos artificiais, a mama
facilita a vedação da fenda; durante a mamada ao seio, ocorre estímulo po- Traumatismos mamilares:
sitivo para o desenvolvimento dos músculos da face, da boca e da língua, Os traumatismos mamilares são a causa mais comum de dor para
e a pressão na tuba auditiva é menor, o que favorece o desenvolvimento e amamentar, devidos, principalmente, a dificuldades no manejo da ama-
melhora os resultados após correção cirúrgica. mentação, com posicionamento e pega do bebê inadequados. Em algu-
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

mas situações, o traumatismo pode ser resultado de disfunções orais da dentro das mamas. A pele do mamilo pode apresentar coloração rósea
criança, freio lingual curto, mamilos curtos/planos ou invertidos, sucção e, às vezes, descamação. A boca da criança pode, muitas vezes, não apre-
não nutritiva prolongada (hábito de “chupetar” o seio materno), ingurgi- sentar sintomas de infecção e, quando visíveis, são encontradas crostas
tamento mamário, uso de chupetas, mamadeiras, uso de intermediários brancas na cavidade oral.
de silicone, uso de pomadas, cremes e óleos inapropriados nos mamilos. Alguns fatores predispõem à candidíase mamária: uso recente de
A morfologia mamilar não é causa de insucesso no aleitamento ma- antibióticos pela mãe, contraceptivos ou esteroides orais, lesões mamila-
terno, porém, se a junção entre a pega incorreta e o aspecto morfológico res que foram mantidas úmidas ou abafadas por uso inadequado de ab-
do mamilo não estiver adequada e o bebê não abocanhar corretamente sorventes mamários ou conchas. Algumas vezes, há relatos de candidíase
toda a aréola, isso pode ocasionar traumas mamilares. Portanto, corrigir as materna genital na gestação e lesão por cândida em região genital do
técnicas de amamentação é fundamental para o tratamento e a preven- bebê.
ção dos traumas mamilares. A infecção fúngica mamária deve ser diagnosticada corretamente
Alternar diferentes posições de mamadas (tradicional, invertida, e tratada porque pode ser responsável por desmame, já que causa uma
cavaleiro) pode reduzir a pressão nos pontos dolorosos ou no local do dor persistente e recorrente, de difícil manejo. Os diagnósticos diferen-
trauma mamilar e diminuir a dor, ajudando no processo de cicatrização. ciais devem ser descartados, entre eles o fenômeno de Raynaud, pega
Incentivar a amamentação em livre demanda é fundamental, pois a crian- incorreta que cause lesões mamilares e infecções bacterianas da mama.
ça vai ao peito mais tranquila para mamar e com menos fome. Saber retirar Os traumatismos mamilares ocorrem nos primeiros dias de vida e tendem
o bebê do seio materno, quando necessário, de maneira correta, com a a resolver com a correção das técnicas de amamentação. Se a dor persiste
técnica de utilização do dedo mínimo no canto da boca do bebê, também mesmo após essas correções, deve-se pensar em candidíase mamária.
evita traumas. Manter a região mamilo-areolar sempre seca e arejada, evi- O diagnóstico é constituído primordialmente pelos sintomas clíni-
tando a fricção da área traumatizada com o sutiã ou a roupa e evitando-se cos, baseando-se nas queixas subjetivas de dor e sensibilidade mamária,
o uso de acessórios que abafem a região também são medidas essenciais recorrentes e de difícil tratamento, excluindo-se os diagnósticos diferen-
para evitar lesões mamilares. ciais principais. A detecção da Candida albicans em exames laboratoriais
Se a dor for muita intensa e a lesão mamilar muito profunda, pode no leite humano é muito difícil porque a lactoferrina presente no leite
ser necessário interromper a amamentação naquela mama por 24 a 48 humano tem um efeito inibitório sobre o crescimento do fungo, e a cândi-
horas. Depois desse período, a mama deve ser reavaliada e a pega orien- da pode ser encontrada em swab de mamilo de mulheres assintomáticas
tada. Lembrando de realizar massagem e ordenha da mama no momento (34%) e mesmo que não estão amamentando (18%), diminuindo a especi-
da suspensão temporária da amamentação e utilizando-se de métodos ficidade do uso de exames laboratoriais para o diagnóstico.
adequados de complementação. O tratamento consiste em medidas essenciais para manter os ma-
Atualmente, tem-se evitado o tratamento seco de fissuras mami- milos secos e arejados, evitando o uso de acessórios que abafem a região,
lares (banho de sol, banho de luz e uso de secador de cabelo), pois os como absorventes de mama, conchas, protetores de gel, excesso de
estudos têm mostrado que o tratamento úmido de cicatrização de feridas pomadas ou cremes inapropriados. Chupetas e mamadeiras são veículos
é mais eficiente: uso do próprio leite materno, cremes e óleos apropriados, importantes de recontaminação e devem ser evitados.
com o cuidado de não manter a pele do mamilo escorregadia e prejudicar O tratamento medicamentoso tópico pode ser feito com nistatina,
ainda mais a pega incorreta. O uso de práticas populares, como casca de clotrimazol, cetoconazol ou miconazol, preferencialmente, na apresenta-
banana e mamão sobre as fissuras, deve ser desencorajado pelo risco de ção de gel oral, de 6 em 6 horas, em mamilos e aréolas por 2 semanas. O
processos infecciosos e não comprovação científica de sua eficácia. ideal é aplicar uma camada fina, espalhando com os dedos nos mamilos,
após cada mamada, e o mesmo não precisa ser removido para amamen-
Obstrução de ducto lactífero: tar. A literatura é consensual em relação ao tratamento simultâneo de
111
É observada uma estase do leite em determinada área da mama, mãe e bebê, mesmo que a criança não apresente lesões fúngicas orais
que, por algum motivo, não flui de maneira adequada e forma um “ca- aparentes ao exame físico. Há relato de resistência importante de espécies
roço” à palpação, acompanhado de dor local, calor e eritema, mas sem a de cândida a nistatina, por isso a escolha preferencial pelo uso de mico-
presença de febre alta. Em alguns casos, há um ponto obstrutivo esbran- nazol. Em muitos casos é necessário também a prescrição via oral para
quiçado e doloroso na região mamilar. Pode acontecer devido à produção a nutriz de Fluconazol 150 mg/dia por 10 a 14 dias e o tratamento deve
exagerada de leite ou esvaziamento inadequado, por intervalos longos ser individualizado e acompanhado se houver persistência dos sintomas.
entre as mamadas, uso desnecessário de cremes nos mamilos, que po-
dem obstruir os poros, ou compressão da mama por sutiã muito apertado Mastite:
ou apoio da mão na posição de tesoura. Para tratamento, são necessários Mastite é um processo inflamatório da mama, que pode progredir
massagem e ordenha da mama, com correção das técnicas de pega e ou não para uma infecção bacteriana; resultante de estase do leite, o
posição da mamada, aleitamento em livre demanda e doação do leite que favorece o processo infeccioso – comumente pelo Staphylococcus
materno excedente ao BLH. Em alguns raros casos, pode ser necessária aureus, e, ocasionalmente, por Escherichia coli ou Streptococcus. As lesões
a desobstrução do poro mamilar com uso de agulhas esterilizadas por mamilares, muitas vezes, são a porta de entrada da bactéria. A mastite
profissional capacitado. pode acontecer em qualquer período da amamentação e é observada,
principalmente, na segunda semana pós-parto.
Fenômeno de Raynaud: Mamadas de horários fixos, não esvaziamento completo das mamas,
Consiste em uma isquemia mamilar com vasoespasmo, em resposta criança com sucção débil, uso de chupetas ou mamadeiras, produção
à exposição ao frio, trauma mamilar ou compressão anormal do mamilo na excessiva de leite, desmame abrupto, traumatismos mamilares, obstrução
boca da criança, resultando em uma palidez mamilar e dor, mais comum de ductos ou ingurgitamento mamário não resolvidos e qualquer fator
depois das mamadas. Mas pode ocorrer antes, durante ou depois das que favoreça a estase do leite predispõem ao aparecimento de mastite.
mamadas. Os espasmos e a dor característica são breves, mas a dor pode
Os sintomas são: dor, hiperemia, calor e edema da área afetada.
persistir por 1 hora ou mais. Muitas mulheres relatam dor em fisgadas ou
Quando há infecção, além de inflamação, observam-se manifestações
sensação de queimação enquanto o mamilo está pálido, o que ocasiona
sistêmicas como mal-estar, febre alta, calafrios, mialgias e vômitos. Geral-
dúvida com diagnóstico diferencial de candidíase mamária, embora a
mente, a mastite é unilateral. O sabor do leite pode se alterar, tornando-se
infecção fúngica por si só possa levar ao fenômeno de Raynaud.
salgado, e a criança rejeitar a mama. Grande parte das vezes, a produção
O manejo consiste em tratar a causa básica que está levando ao de leite na mama afetada torna-se comprometida. A cultura do leite é
vasoespasmo no mamilo e o uso de compressas mornas que podem aliviar recomendada nos seguintes casos: não resposta ao tratamento com an-
a dor. Por exemplo, se a criança apresenta uma pega muita compressiva, tibióticos, mastite recorrente (mais de duas vezes), mastite adquirida em
podem ser orientados exercícios orais para relaxamento da mandíbula. ambiente hospitalar e nos casos graves.
Existem alguns estudos indicando uso de nifedipina, ibuprofeno, vitamina
O componente mais importante do tratamento da mastite é o
B6, suplementação com cálcio e magnésio; porém, ainda não há consenso
esvaziamento adequado da mama por meio da manutenção da ama-
em relação à real necessidade de indicação de prescrição medicamentosa,
mentação em livre demanda e esvaziamento com massagem e ordenha
posologia e tempo de tratamento.
manual após as mamadas. Apesar da presença de bactérias no leite, elas
não oferecem risco para o bebê saudável. O manejo adequado dos casos
Candidíase mamária: de mastites é fundamental, porque, muitas vezes, os sintomas dolorosos
A infecção fúngica ocorre pela Candida albicans e pode atingir os da fase aguda levam ao desmame. As compressas mornas devem ser
mamilos ou até mesmo os ductos lactíferos. Os principais sintomas clíni- evitadas pelo risco de aumentar a produção de leite. Compressas frias só
cos são: ardência, dor tipo queimação e prurido durante e, principalmente, devem ser indicadas em caso específicos para redução de edemas exten-
após as mamadas. Algumas mulheres queixam-se de fisgadas contínuas sos em aréola, e não devem ser utilizadas por mais de 15 minutos.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

A antibioticoterapia está indicada na presença de sintomas sistê- No acompanhamento pediátrico, deve-se estar alerta para o ganho
micos desde o início do quadro, fissura mamilar e ausência de melhora de peso diário e, principalmente, para a perda ponderal inicial nas primeiras
dos sintomas após 12 a 24 horas da remoção efetiva do leite acumulado. semanas de vida – perda ponderal maior que 10% do peso de nascimento
As principais opções terapêuticas são: Cefalexina 500 mg, via oral, de 6 e não recuperação do peso de nascimento até aproximadamente 14 dias
em 6 horas; Amoxicilina 500 mg ou Amoxicilina + Clavulanato (500 mg + de vida são indicativos de que a amamentação não está bem sucedida.
125 mg), via oral, de 8 em 8 horas. No caso de alergias a betalactâmicos, Outros sinais de alerta são crianças com icterícia sem fatores de risco ou
está indicado uso de esquemas com Claritromicina ou Clindamicina. Os incompatibilidade e presença de fezes meconiais após 5 dias de vida.
esquemas de antibiotioterapia devem ser utilizados por dez dias, pois tra- Segundo documento científico publicado pelo Departamento
tamentos mais curtos têm demonstrado alta incidência de recorrências. Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria
Pode-se prescrever, também, analgésicos ou anti-inflamatórios não este- (SBP) em agosto de 2017, é:
roides compatíveis com a amamentação (como Ibuprofeno). O repouso
materno, aumentar a ingesta hídrica, iniciar a amamentação na mama não importante ressaltar que, diante das evidências da literatura,
afetada, usar um sutiã de sustentação firme e o suporte emocional devem a monitorização do ganho de peso (ou de perda, logo após o nas-
sempre fazer parte do tratamento. Faz-se necessária reavaliação do qua- cimento) e o exame clínico são ainda os métodos básicos de cui-
dro clínico e da eficácia do tratamento em 48 horas, sempre investigando dados de puericultura realizados pelos pediatras que irão nortear
a presença de complicações como abscesso mamário. suas tomadas de decisões quanto à necessidade de suplementar
ou não uma criança em amamentação exclusiva (SBP, 2017).
Abscesso mamário: O pediatra deve ter em vista as diversas variáveis clínicas do binômio
nutriz-bebê no pós-parto, e sempre avaliar e orientar as técnicas de ama-
Quando não há resolução do quadro de mastite, pode haver
mentação, antes de prescrever o uso de complemento.
complicação para formação de abcesso mamário, em 5% dos casos. Há
persistência de uma área bem delimitada, dolorosa, endurecida e averme- Uma pega incorreta é a principal causa de remoção ineficiente do
lhada, mesmo após 48 horas do tratamento medicamentoso da mastite. leite e consequente baixa produção. Mamadas em horários predetermina-
Muitas vezes, os sintomas de febre e mal-estar foram resolvidos. Se a ama- dos, por pouco tempo ou infrequentes, ausência de mamadas noturnas,
mentação for interrompida bruscamente ou não ocorrer o esvaziamento ingurgitamento mamário, uso de complemento, uso de chupetas, mama-
adequado da mama afetada pela mastite, pode acontecer a formação de deiras e protetores de mamilo também podem levar a um esvaziamento
uma coleção líquida palpável, com sensação de flutuação, caracterizando inadequado das mamas. Algumas situações mais raras devem ser descar-
o abscesso, mas nem sempre é possível confirmar apenas pelo exame tadas, pois podem ser associadas à sucção ineficiente do bebê: lábio lepo-
clínico. Portanto, o exame de ultrassonografia é útil para confirmar a pre- rino, fenda palatina, freio da língua curto, micrognatia, macroglossia, uso
sença do abscesso. de medicações pela nutriz que deixe a criança sonolenta, prematuridade,
síndrome de Down, síndromes genéticas e hipotireoidismo.
O tratamento consiste em procedimento de esvaziamento por
meio de drenagem cirúrgica ou aspiração com agulha, e a secreção deve Existem situações relacionadas à saúde materna que podem pro-
ser enviada para cultura. Não há contraindicação para a manutenção da vocar a diminuição da produção láctea e que devem sempre ser levadas
amamentação em livre demanda, apesar da presença de bactérias no leite em consideração: detalhes anatômicos da mama, que podem dificultar a
materno, reforçando a ideia de que o esvaziamento pleno da mama faz técnica de amamentação (mamilos muito grandes, invertidos ou muito
parte do tratamento do abscesso. planos), doenças maternas (infecção, hipotireoidismo, depressão pós-par-
to), retenção de restos placentários, fadiga materna, uso de medicamentos
Os estudos demonstram que aspirações por agulha tendem a
que provocam diminuição da síntese láctea, tabagismo, restrição dietética
ser menos dolorosas e invasivas do que incisão e drenagem cirúrgicas,
importante, realização prévia de procedimento cirúrgico na mama (ma-
112 e podem ser feitas com anestesia local e sem necessidade de hospitali-
moplastia, redução mamária, colocação de prótese de silicone).
zação. Porém, abscessos muito grandes ou múltiplos abscessos podem
necessitar de ressecções extensas e resultar em deformidades da mama, Portanto, processos anatômicos, fisiológicos, emocionais e sociais
bem como comprometimento funcional. Em alguns casos, há necessida- estão envolvidos no processo de produção de leite. A melhor forma de
de de interromper a amamentação temporariamente na mama afetada aumentar a produção láctea é a sucção e o esvaziamento adequados
devido à dor ou saída de muito pus; mas é imprescindível o esvaziamento da mama, com aumento da frequência das mamadas, evitando uso de
regular por ordenha da mama comprometida, e a amamentação deve mamadeiras e chupetas, que podem ocasionar confusão de bicos e preju-
ser mantida na mama sadia. A antibioticoterapia deve ser mantida após dicar o estímulo adequado.
procedimento e avaliada resistência bacteriana.
Muitas vezes, o abscesso mamário provoca o desmame precoce e Cuidados com a saúde materna e
interrupção da amamentação, por isso o ideal é a prevenção e o manejo
adequado dos quadros de ingurgitamento, obstrução de ducto e mastite, amamentação
com massagem e ordenha adequados, manutenção da amamentação em
Existem algumas questões envolvendo a saúde da mãe nutriz que,
livre demanda e orientação e reavaliação da nutriz.
muitas vezes, são motivo de desmame precoce, e cada caso deve ser
avaliado individualmente para se evitar a interrupção desnecessária do
Hipogalactia – pouco leite e necessidade aleitamento materno. É de fundamental importância levar em conside-
ração os potenciais riscos versus os benefícios do aleitamento materno e
de uso de suplemento as consequências de sua suspensão. Poucas são as doenças maternas que
contraindicam de maneira absoluta a amamentação, tais como HIV e HTLV-
O volume de leite materno produzido por dia varia conforme a
1 e HTLV-2. Para casos mais detalhados, pode-se recorrer a atualizações
demanda da criança e pode ser estimado em cerca de 850 ml/dia, após a
publicadas no site do MS e do CDC (Centers for Disease Control and Pre-
segunda semana de vida. A maioria das mulheres tem condições fisiológi-
vention), para auxiliar nas definições de condutas relativas ao aleitamento
cas para produzir leite suficiente para atender a demanda de seu filho. No
materno na presença de doenças infecciosas maternas.
entanto, muitas vezes a nutriz apresenta uma isegurança na sua capaci-
dade de nutrir plenamente seu filho e uma percepção errônea de “pouco Em relação ao HIV, é importante ressaltar que a amamentação não
leite” ou “leite fraco”, devido à frequência elevada de mamadas comum é contraindicada em caso de falta de resultado de sorologia para HIV.
nos primeiros meses de vida, o que culmina na introdução precoce de No Brasil, o aleitamento materno é contraindicado apenas em caso de
complemento e desmame. Com o uso de complemento, a criança passa sorologias sabidamente positivas para HIV. Nas maternidades brasileiras,
a sugar menos a mama, o que afeta negativamente a produção de leite. o teste rápido para diagnóstico de HIV deve ser realizado em todas as
gestantes não testadas para o HIV durante o acompanhamento pré-natal,
É importante avaliar os sinais clínicos de que o bebê está se alimen-
para a adoção de procedimentos de prevenção de transmissão vertical
tando bem e está saciado em amamentação exclusiva, para manter a mãe
da doença, e a amamentação não deve ser postergada devido à falta de
encorajada da sua capacidade de amamentar seu filho exclusivamente
resultado de teste rápido. Em mulheres com testes negativos ou com es-
com leite materno. Ela deve estar alerta para os sinais de fome e para a
tado sorológico desconhecido, os profissionais de saúde devem incentivar
técnica correta de sucção. Quando há insuficiência de leite, o bebê não
o aleitamento materno e ajudar as mães a iniciarem a amamentação na
fica saciado após as mamadas, que, em geral, são muito longas e, quando
primeira hora após o parto.
termina de mamar, já está querendo mamar novamente, com frequência
aumentada, chora muito e não ganha peso adequadamente. É muito Em infecções bacterianas graves e invasivas, pode ser necessária a
importante que os pais observem o número de diureses, que deve ser, interrupção temporária da amamentação, por 24 a 96 horas após o início
no mínimo, de seis vezes ao dia, pois pouca diurese é indício de pouco da terapia antimicrobiana materna e alguma evidência clínica de melhora,
volume de leite ingerido. sempre levando em consideração as condições maternas de amamentar.
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

Em casos de doenças diarreicas materna, deve-se orientar cuidados Influenza pelo vírus H1N1: não contraindica a amamentação.
higiênicos, com ênfase especial na lavagem das mãos após o uso do Deve-se seguir as medidas de higiene e precauções de contato, como
banheiro e o cuidado com contaminantes externos, principalmente leite lavagem constante das mãos. Pode-se vacinar a nutriz que está amamen-
materno ordenhado. Sabe-se que não há passagem dos micro-organis- tando.
mos responsáveis pela diarreia pelo leite humano, e que o leite materno Febre amarela: até o momento, não há relato de transmissão do
funciona como fator protetor de infecções do trato gastrointestinal, por vírus da febre amarela via leite materno de uma mãe infectada pelo vírus.
isso recomenda-se a manutenção da amamentação. Entretanto, recomenda-se como precaução razoável interromper tem-
Tuberculose: não há risco de passagem do Mycobacterium tuber- porariamente o aleitamento materno na fase aguda da doença por pelo
culosis pelo leite humano; entretanto, deve-se ter cuidado em relação ao menos quatro dias, com a ordenha frequente da mama e simultâneo des-
estado de doença da mãe. Se esta for abacilífera e considerada tratada, carte do leite ordenhado, além da proteção da criança contra picadas de
poderá amamentar sem qualquer restrição. Se a mãe apresentar sinais de mosquito. A vacina contra a febre amarela está contraindicada para mães
infecção ativa, deve ser restringido o contato com a criança, por risco de de bebês menores de 6 meses; porém, se existir indicação epidemiológica
transmissão da doença por meio das gotículas do trato respiratório; o leite de vacinação, a amamentação deve ser suspensa por dez dias e o leite
materno pode ser ordenhado e oferecido à criança. Nas primeiras duas deve ser extraído e descartado.
semanas da terapia antituberculose, a mãe poderá amamentar com uso Zika vírus, chikungunya, dengue: doenças transmitidas pela pica-
de máscara. A criança deverá ser investigada em relação ao contágio da da do mosquito Aedes sp infectado. Não há evidências científicas de trans-
doença e receber quimioprofilaxia específica. missão pelo leite materno ou contraindicação de amamentação; se as
Sífilis: não há contraindicação da amamentação, exceto se houver condições clínicas maternas permitirem, manter o aleitamento materno.
lesões em aréola/mamilo. A amamentação é contraindicada temporaria- Citomegalovirose (CMV): não há contraindicação de amamenta-
mente na mama afetada nesse caso, até a cicatrização das lesões median- ção no caso de recém-nascido a termo. Em casos específicos de recém-
te o uso da antibioticoterapia sistêmica. A criança deverá ser investigada -nascidos prematuros e de extremo baixo peso, há maior risco de desen-
e tratada com antimicrobiano. A manutenção da amamentação na mama volvimento de doença sintomática. De acordo com o protocolo para o
contralateral está indicada. uso do leite humano (fresco) nos prematuros extremos (< 28 semanas) no
Hepatite A: não é recomendado interromper a amamentação de Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB, 2017) e segundo a Academia
mães infectadas por VHA – se o parto ocorrer na fase aguda da doença Americana de Pediatria (2012), o valor da alimentação rotineira de leite
materna, é aconselhável que o recém-nascido receba imunoglobulina humano fresco de mães soropositivas para o CMV aos recém-nascidos
humana. prematuros supera os riscos de doença clínica, especialmente porque não
Hepatite B: não é contraindicada a amamentação, desde que o têm sido relatadas anormalidades no neurodesenvolvimento.
RN de mãe HbsAg positivo realize imunoprofilaxia, com administração da Sendo assim, o leite materno fresco é preferível para alimentar ro-
primeira dose da vacina contra hepatite B e, simultaneamente, o uso da tineiramente todos os prematuros. No entanto, face a evidências atuais,
imunoglobulina específica. propõem-se, para os pré-termo extremos (< 28 semanas de idade gesta-
Hepatite C: não contraindica a amamentação. Entretanto, sabe-se cional de nascimento), o seguinte protocolo: verificar o resultado da coleta
que o vírus da hepatite C é transmitido pelo sangue infectado, e se a mãe em papel de filtro de sorologia materna para CMV no pré-natal; se não foi
infectada tiver fissura de mamilo ou lesão com sangramento, ela deve colhido no pré-natal, deve-se colher na sala de parto. Vide figura 7.
parar de amamentar temporariamente na mama com sangramento, até Caso não se tenha informação sobre o status do CMV ou que a mãe
a cicatrização da ferida mamilar. apresente IgG+ e IgM- (sugerindo infecção crônica) ou IgM+ e IgG- (suge-
rindo infecção aguda), recomenda-se manter a colostroterapia pelo pe-
Herpes simples tipo 1 e tipo 2: a amamentação deve ser tempo-
ríodo de sete dias – estudo recente de Donalisio et al. (2018) mostrou que
113
rariamente suspensa em caso de lesões herpéticas na pele da mama que
possa ter contato direto com a boca da criança. Se houver lesões em ou- o colostro de mães soropositivas para citomegalovírus é o mais potente
tras localizações, estas devem ser protegidas e a amamentação mantida quanto à atividade antiviral que é reduzida pela pasteurização; assim, esse
com higiene criteriosa. estudo apoia o uso de colostro não pasteurizado mesmo em prematuros
extremos de mães CMV soropositivas –, e, após a primeira semana, de-
Varicela: não há contraindicação à amamentação; entretanto, se a ve-se prescrever leite humano pasteurizado, com baixa acidez, por oito
mãe desenvolveu varicela cinco dias antes e até dois dias após o parto, semanas. Para as mães com resultados de sorologias confirmadas IgG- e
deve ser separada de seu filho, e o seu leite deve ser ordenhado e ofe- IgM-, recomenda-se usar leite humano fresco. Devem ser triadas para CMV
recido para o RN, já que, nessas circunstâncias, não há tempo suficiente todas as gestantes, solicitando-se IgM e IgG no 1º trimestre do pré-natal
para produção e transferência via placentária dos anticorpos do vírus da ou na entrada da mulher no pré-natal, sendo repetidas as sorologias nos
varicela-zoster. 2º e 3º trimestres naquelas gestantes consideradas suscetíveis.
Figura 7 – Protocolo para uso de leite humano fresco em prematuros menores de 28 semanas
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

Uso de medicamentos pela mãe nutriz doado e de uma rede de apoio eficiente capaz de manter esta oferta. Por
isso, o MS, em parceria com a Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano
Outro aspecto que deve sempre ser considerado em relação à (rBLH), realiza, anualmente, campanhas, tanto para estimular a prática da
saúde materna é o uso de medicações pela nutriz. A maioria das me- amamentação quanto a doação de leite materno.
dicações é compatível com a amamentação, e poucos são os fármacos A captação exitosa de doadoras de leite materno é alcançada pelo
formalmente contraindicados. Existem manuais específicos que podem BLH quando este cumpre sua missão em promover, proteger e apoiar a
guiar a prescrição de medicações apropriadas e mais indicadas para as amamentação. A orientação e o atendimento às puérperas internadas na
mulheres nesse período da amamentação, evitando, assim, o desmame maternidade da mantenedora do BLH, incluindo a distribuição de material
precoce e a interrupção desnecessária da amamentação. Portanto, cabe escrito contendo informações referentes às técnicas de ordenha manual
ao profissional de saúde tomar decisões atualizadas e conscientes para do leite, conservação e doação, além do acolhimento às puérperas exter-
avaliar riscos e benefícios ao prescrever uma medicação para uma mulher nas que buscam ajuda no BLH de forma espontânea, são fundamentais
que esteja amamentando. A seleção cuidadosa da melhor medicação para alimentar a rede de doadoras. Outra iniciativa eficaz nesse processo é
permite que a amamentação continue sem interrupção e com segurança o contato por meio de ligação telefônica com as puérperas da maternida-
para mãe e bebê. O MS disponibiliza um guia de medicamentos e sua de, em um intervalo de sete a dez dias após a alta hospitalar, para avaliar
interação com a amamentação: “Amamentação e uso de medicamentos se esta nutriz necessita de apoio na amamentação, se de fato assimilou as
e outras substâncias”, disponível em: http://bvsms.saude.gov.br. orientações dadas a ela na maternidade, ou até mesmo iniciar um vínculo
que culminará na doação de leite materno.
Promoção, proteção e apoio à amamen- Faz-se imprescindível a conscientização da equipe do BLH e de toda
tação rede responsável pela captação, pelo acolhimento, pelo cadastro e pela
Dentre as políticas públicas de proteção e apoio à amamentação, coleta do leite materno que o valor depositado pela mãe no leite que
destaca-se a importância do conhecimento, pelos profissionais de saúde, ela coleta, sendo este em qualquer quantidade, é agregado de inúmeros
da legislação de proteção ao aleitamento materno, em especial as leis que elementos que o torna algo imensurável. Em contrapartida, quando se
protegem a mulher trabalhadora e a NBCAL (Norma Brasileira de Comer- agrega relacionamento entre a equipe do Banco de Leite e a doadora, pro-
cialização de Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância, movendo a aproximação desta com a realidade da unidade, envolvendo-a
Bicos, Chupetas e Mamadeiras), que regulamenta a comercialização de de forma humanizada com a finalidade de zelar pelos interesses dela e de
alimentos para lactentes e crianças de primeira infância (até os 3 anos de seu bebê e, acima de tudo, valorizando seu esforço, o processo de doação
idade) e produtos de puericultura correlatos. A legislação traz regras como torna-se não apenas uma ação de cidadania, mas também um momento
a proibição de propagandas de fórmulas infantis, o uso de termos que de imensa satisfação e superação das expectativas.
lembrem o leite materno em rótulos de alimentos preparados para bebês A prática da doação de leite materno deve ser fruto de ações con-
e fotos ou desenhos que não sejam necessários para ilustrar métodos de tínuas que promovam a conscientização sobre a sua importância, bem
preparação do produto. Além disso, torna obrigatório que as embalagens como o resultado de uma soma de atitudes que proporcionam nutrizes
dos leites destinados às crianças tragam inscrição advertindo que o pro- a amamentarem seus filhos de forma plena e segura. Um Banco de Leite
duto deve ser incluído na alimentação de menores de 1 ano apenas com com uma equipe sensibilizada, que tem em sua rotina acolher a doadora
indicação expressa de médico, assim como os riscos do preparo inade- em suas mínimas dúvidas e angústias, proporciona um ambiente favorável
quado do produto. A lei também proíbe doações de mamadeiras, bicos e para que essa mãe alcance o aleitamento materno exclusivo por 6 meses
chupetas ou a sua venda em serviços públicos de saúde, exceto em casos e continuado por 2 anos ou mais. Essa mesma mãe não será apenas uma
de necessidade individual ou coletiva. doadora, mas também será uma multiplicadora de informações e ações
114 Os instrumentos de proteção legal ao aleitamento materno no Brasil que fortalecerão essa rede de apoio criada ao redor do BLH. Se é sempre
podem ser encontrados na íntegra no site da Rede IBFAN (Rede Internacio- citado que doar leite materno é um gesto de amor, como não agir da
nal em Defesa do Direito de Amamentar – International Baby Food Action mesma forma com essa mulher doadora?
Network), e a legislação do Brasil de proteção ao aleitamento materno é Outras formas de captação de doadoras:
uma das mais avançadas do mundo. • Orientação nos ambulatórios, centros de saúde, locais de atua-
Com o intuito de proteger as mães, os bebês e a amamentação, a ção das equipes do Programa de Saúde da Família e em outros
legislação brasileira garante direito à estabilidade de emprego desde o serviços que acompanham crianças menores de 6 meses, e/
momento da concepção até cinco meses pós-parto; direito à licença-pa- ou distribuição de material escrito contendo informações
ternidade de cinco dias e à licença-maternidade de 120 dias consecutivos, referentes às técnicas de ordenha manual do leite excedente,
sem prejuízo do emprego e da remuneração; após os 120 dias, a mulher conservação, doação e outras.
ainda pode contar com dois intervalos de 30 minutos no seu horário de • Envolvimento das equipes das salas de vacina das Unidades
trabalho (até 6 meses pós-parto). Em 2008, foi estabelecido decreto que Básicas de Saúde para oferecer informações quanto à função
regulamenta a extensão da licença-maternidade por mais dois meses (60 do Banco de Leite e para distribuir material escrito contendo
dias), para as servidoras lotadas nos órgãos e nas entidades integrantes orientações referentes às técnicas de ordenha manual, conser-
da Administração Pública Federal direta, autárquica ou fundacional, e a vação e doação do leite materno. Esta última deve ser impre-
criação do Programa Empresa Cidadã, que determina que as empresas op- terivelmente acolhida e orientada por profissionais dentro da
tantes pelo programa estendam a licença-maternidade (para 180 dias) e a Unidade de Saúde, ou pelo menos encaminhada ao Banco de
licença-paternidade (para 20 dias), mediante incentivo fiscal às empresas. Leite mais próximo de sua residência.
De acordo com pesquisa publicada no Jornal de Pediatria (Monteiro • Sensibilização contínua de profissionais da saúde, em especial
et al., 2017), em que foi descrito o perfil das mulheres com filhos menores médicos pediatras e ginecologistas, para que estes também
de 4 meses residentes nas capitais brasileiras e no Distrito Federal, segundo promovam a amamentação e a doação.
a situação de trabalho, não estar em licença-maternidade aumentou em • Campanhas realizadas pelo MS, em parceria com a rBLH, para
23% a chance de interrupção do AME. Além disso, as crianças com baixo comemorar o Dia Nacional de Doação de Leite Humano (19 de
peso ao nascer, que usavam chupeta e filhas de mães primíparas também maio) e a Semana Mundial de Amamentação (SMAM), sempre
apresentaram maior chance de interrupção da amamentação exclusiva; na primeira semana de agosto.
e foi observado um componente dose-resposta entre a escolaridade • Divulgação de campanhas e orientações sobre o manejo da
materna e a interrupção do AME, ou seja, quanto menor a escolaridade amamentação com o envolvimento da sociedade civil orga-
da mulher, maior o risco de interrupção do AME (p = 0,01). Segundo essa nizada por meio de rádio, televisão, jornais, escolas, eventos
pesquisa de 2014, constatou-se que a licença-maternidade contribuiu e redes sociais. Esse último, inclusive, tem movimentado um
para aumentar a prevalência do AME nas capitais brasileiras, reforça a volume imenso de troca de informações e apoio a gestantes
importância da ampliação da licença-maternidade para seis meses e a e mãe nutrizes por meio de criação de grupos que favorecem
influência das leis que protegem a mulher trabalhadora que amamenta. o fortalecimento da cultura da amamentação e, consequente-
mente, doação do leite materno.
• Divulgação dos telefones para doação e mídias sociais dos
Bancos de Leite e doação de leite humano BLHs.
O sucesso de um BLH, em sua função primordial de distribuir leite Quem pode doar?
humano pasteurizado (LHP) aos recém-nascidos prematuros e de baixo
São consideradas possíveis doadoras toda mulher que amamenta
peso, que não podem ser alimentados diretamente pelas próprias mães,
e se dispõe a doar o leite por livre e espontânea vontade, e não tomar
internados ou não em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTI
nenhuma medicação que interfira na amamentação. Também são consi-
Neonatal), depende diretamente do volume de leite humano cru (LHC)
deradas doadoras as nutrizes que estão temporariamente impedidas de
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

amamentar seus filhos diretamente no peito, por razões ligadas à saúde de forma cuidadosa, evitando traumas nos tecidos durante a extração, a
desses bebês, mas consideradas compatíveis com a amamentação. Desse fim de não prejudicar a drenagem do leite e reduzir a possibilidade de
modo, as mães cujos filhos estão internados em Unidades Neonatais ou ingurgitamento e até mesmo de mastite. As autoras ressaltam, ainda,
outras unidades hospitalares, e que ordenham leite humano para estimu- que a ordenha não deve provocar sensações dolorosas. Silva utilizou um
lação da produção ou para consumo exclusivo de seus filhos, são também massageador eletromecânico no tratamento do ingurgitamento mamário
classificadas como doadoras. É contraindicado o aleitamento cruzado, ou e concluiu que, além de ser indolor e não causar desconforto às lactantes,
seja, o aleitamento da criança por nutriz que não seja a mãe biológica. No o aparelho proporcionou alívio, relaxamento e auxiliou a rápida saída do
Brasil, todo o leite humano oferecido a bebês de mulher que não seja a leite.
mãe biológica deve ser processado. Em que pese a ordenha mecânica ser uma opção para a retirada de
O controle clínico das doadoras através de exames específicos é de leite humano, antes de sua indicação, deve-se considerar a eficiência, a
suma importância. Por meio dele é possível detectar algumas doenças disponibilidade, o custo e a possibilidade de trauma mamilar. As bombas
que podem ser transmitidas aos recém-nascidos, as quais impedem a manuais são inadequadas para a manutenção prolongada da lactação por
amamentação e a doação do leite humano. As doações para posterior conta do movimento repetitivo - e muitas vezes cansativo - relacionado
distribuição a crianças prematuras, com baixo peso e/ou doentes, têm ao seu manuseio. As bombas elétricas modernas são as mais eficientes
de observar aspectos referentes a uma cuidadosa seleção, classificação e e, se forem adaptadas para ordenhar as duas mamas simultaneamente,
acompanhamento das doadoras. Esses requisitos devem integrar a rotina permitem que um mesmo volume de leite seja obtido na metade do
do BLH. tempo. A ordenha simultânea também estimula uma maior liberação
A seleção de doadoras é de responsabilidade do médico capacitado de prolactina, hormônio que influencia diretamente a produção do leite.
para as atividades médico-assistenciais do BLH. Para que a nutriz seja con- Segundo Lawrence (apud N ascimento, 2004) nos casos em que há ne-
firmada como doadora de leite humano, os seguintes requisitos devem cessidade de expressão mamária por um longo período, a diferença no
ser respeitados: estar amamentando ou ordenhando leite para o próprio melhor aproveitamento do tempo pode influenciar a disposição materna
filho, ser saudável, apresentar exames pré ou pós-natal compatíveis com em continuar ordenhando.
a doação de leite ordenhado, não fumar, não usar medicamentos incom- As mães de recém-nascidos admitidos em unidades neonatais
patíveis com a amamentação, não usar álcool ou drogas ilícitas, realizar precisam ser encorajadas e orientadas a iniciar a extração precocemente
exames (hemograma completo, VDRL, anti-HIV e demais sorologias usual- para estimular a lactação. O atraso no início da expressão mamária e a
mente realizadas durante o pré-natal) quando o cartão de pré-natal não inibição da ejeção de leite em decorrência da ansiedade e preocupação
estiver disponível ou quando a nutriz não tiver feito o pré-natal. com o bebê podem desencadear insuficiência láctea. De acordo com
Organização Mundial de Saúde (OMS , 2001), é importante que a ordenha
Acompanhamento das doadoras: mamária seja iniciada logo após o parto, se possível, pois a estimulação
precoce das mamas, especialmente nas primeiras 48 horas após o parto,
As doadoras aptas devem iniciar a ordenha o mais precocemente
parece ser crítica para a manutenção da produção láctea adequada nas
possível. Após o cadastramento, o BLH deve agendar a coleta e garantir
semanas subsequentes. Recomenda-se que a frequência de ordenha
informações sobre as boas práticas de manipulação do leite ordenhado.
nessas mulheres deva ser similar ao número de mamadas diárias de um
Durante todo o tempo em que a nutriz for doadora, o BLH deve recém-nascido a termo, ou seja, de oito a dez vezes, com o objetivo de
avaliar o surgimento de problemas à saúde da doadora ou de seu filho. estimular a liberação de prolactina e permitir a produção duradoura de
Se houver intercorrências, a doadora deve ser orientada a avisar à equipe quantidade de leite materno suficiente.
do BLH. Desta forma, o médico responsável pela unidade deverá analisar
Não é recomendado, entretanto, o uso de conchas para coleta de
se a doação será ou não aceita para a pasteurização. O médico também
deve avaliar a necessidade de encaminhamento da doadora a um servi-
leite humano pelo alto risco de contaminação bacteriana. Entretanto o 115
leite gotejado da mama contralateral durante a mamada ou ordenha
ço de saúde para que se garanta o tratamento específico.
pode ser aproveitado, desde que a concha tenha sido lavada com água
e sabão e bem enxaguada. Adicionalmente, conforme recomendação da
Processamento do leite humano ANVISA, os utensílios que entrarão em contato direto com o leite devem
ser previamente esterilizados.
Em que pese o leite humano possuir todos os nutrientes em qua- É importante que os profissionais de saúde que prestam cuidados
lidade e quantidade necessários para proporcionar o desenvolvimento à mãe e ao bebê conheçam a técnica correta da ordenha manual, a fim
adequado do lactente, caso certas condições ambientais favoráveis este- de garantir que todas as mães aprendam a ordenhar seu próprio leite. A
jam presentes, ele pode tornar-se um excelente meio para a cultura de ordenha deve ser realizada com rigor higiênico-sanitário adequado para
micro-organismos que compõem sua microbiota. Assim sendo, a coleta a preservação das características imunobiológicas e nutricionais do leite
e o armazenamento do leite necessitam ser rigorosamente controlados, materno. De acordo com o manual da ANVISA sobre o funcionamento,
a fim de evitar a proliferação de microrganismos, especialmente aqueles a prevenção e o controle de riscos em bancos de leite humano (BRASIL,
que degradam a lactose com produção de ácidos. 2008), deve-se orientar a nutriz quanto aos seguintes cuidados:
O leite humano recebido pelo banco de leite humano (BLH) deve • Usar utensílios previamente esterilizados para a coleta do leite
ser submetido a procedimentos rigorosos de seleção e classificação. Após humano.
o preenchimento de todos os requisitos de qualidade estabelecidos, o • Utilizar vestuário próprio e exclusivo quando a ordenha e a
alimento é pasteurizado e classificado de acordo com seu valor energé- coleta forem realizadas em ambiente hospitalar, BLH ou PCLH.
tico. Após a classificação, o produto é administrado aos recém-nascidos, • Prender os cabelos, com gorro ou touca, e proteger a boca e
conforme suas necessidades específicas. narinas com máscara ou pedaço de pano.
• Lavar as mãos e antebraços com água e sabonete até os co-
Ordenha e Coleta do Leite Humano tovelos. As unhas devem estar limpas e de preferência curtas.
A ordenha do leite humano consiste na ação de manipular a mama • Evitar conversas durante a ordenha.
da lactante, pressionando-a cuidadosamente para extrair o leite. A orde- • Usar luvas se a ordenha não for realizada pela própria nutriz.
nha é indicada sobretudo nos seguintes casos: alivio do ingurgitamento • Procurar uma posição confortável e manter os ombros rela-
mamário, alivio da tensão na região mamilo-areolar buscando uma pega xados.
adequada, alimentação de recém-nascidos que não conseguem sugar • Apoiar a mama com uma das mãos e com a outra posicionar
diretamente no peito da mãe (por prematuridade, doença e outras dificul- os dedos indicador e médio na região areolar; em seguida, ini-
dades relacionadas à amamentação), fornecimento de leite para o próprio ciar massagens circulares até chegar à base do peito, próximo
filho no caso de retorno ao trabalho da mãe, tratamento de mastite e às costelas.
coleta do leite para doação a um banco de leite humano. • Estimular o reflexo da ocitocina.
A ordenha deve ser realizada, preferencialmente, com as mãos, por • Inclinar-se levemente para frente, para iniciar a retirada do
ser a forma mais efetiva, econômica, menos traumática e menos dolorosa; leite.
além de reduzir possíveis riscos de contaminação e poder ser feita pela • Colocar o dedo polegar no limite superior da aréola e o indica-
mulher sempre que necessário. A extração do leite materno deve ser pre- dor no limite inferior, pressionando o peito em direção ao tórax.
cedida da higienização rigorosa das mãos. O local deve ser tranquilo e é • Aproximar a ponta dos dedos polegar e indicador, pressio-
importante que a massagem seja realizada de forma cuidadosa em todos nando de forma intermitente os reservatórios de leite (esses
os quadrantes da mama. Tal procedimento é imprescindível para facilitar movimentos devem ser firmes, do tipo apertar e soltar, mas
o reflexo de ejeção do leite, estimulando o aumento da produção láctea. não devem provocar dor; caso ela ocorra, a técnica estará
incorreta).
Para Lang e Mori (apud Herbele, 2011), a massagem não deve lesio- • Desprezar os primeiros jatos de leite (0,5 a 1 ml).
nar a pele ou os tecidos subjacentes da mama. Ela necessita ser realizada
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

• Mudar de cinco em cinco minutos, aproximadamente, a sinfecção e apresentar vedamento perfeito. Na prática é orientado o uso
posição dos dedos (de superior e inferior para lateral direita de embalagem de vidro, estéril, com boca larga, tampa plástica rosqueável
e esquerda, e para a posição oblíqua), buscando retirar o leite e volume de 50 a 500 ml (BLH-IFF/NT - 31.11).
de todo o peito. - Verificação de Sujidades: são considerados exemplos de sujida-
• Explicar à nutriz que nos primeiros minutos o leite não sai, ou des comumente encontradas no LH: pelos, cabelo, restos de alimentos,
sai em pequena quantidade, e que isso ocorre até a liberação fragmento de unha, insetos, pedaços de papel e vidro. Todo o conteúdo
do reflexo da ocitocina (descida do leite). Esclarecer também do frasco em que se encontrou a sujidade deverá ser descartado de ma-
que o tempo de ordenha varia de mãe para mãe, podendo neira apropriada (BLH-IFF/NT - 27.11).
demorar de 15 minutos a mais de uma hora, principalmente
nos casos de ingurgitamento mamário severo. - Verificação da Cor do Leite Humano: a coloração do leite
• Durante a ordenha, deve-se evitar puxar ou comprimir o ma- humano resulta da interação de seus componentes, podendo variar de
milo e fazer movimentos de deslizar ou de esfregar a mama, azul-claro muito tênue até um amarelo intenso, passando por padrões
pois podem lesar a pele e o tecido mamário. intermediários como verde-escuro (semelhante à tonalidade do caldo de
• A retirada de leite deve ser feita preferencialmente pela própria cana) e branco opaco, sem que isso sinalize qualquer anormalidade. As
nutriz, quando as mamas estiverem macias, daí a importância alterações na cor decorrem sobretudo das variações na composição do
de iniciar a ordenha nos primeiros dois dias após o parto. leite ao longo da mamada ou ordenha, em função da predominância das
• No caso de novas coletas para complementação do volume fases solúvel, suspensa ou emulsificada.
já coletado anteriormente, usar um copo de vidro fervido por O colostro geralmente varia do amarelo ao alaranjado. A cor do leite
15 minutos (contados a partir do início da fervura) e resfriado. maduro pode ser alterada por diversos fatores, dentre eles a dieta materna
• Ao final da coleta, acrescentar o leite ordenhado ao frasco e o uso de medicações. Normalmente, as cores róseas, avermelhadas ou
com leite congelado e levá-lo imediatamente ao congelador, mesmo amarronzadas podem ser significativas de contaminação por
evitando o degelo. sangue. Essa contaminação ocorre por descarga papilar sanguinolenta,
• Não preencher toda a capacidade do frasco, deixando sempre comum nas duas primeiras semanas de puerpério, ou por lesão do ma-
o volume 2 a 3 cm abaixo da borda. milo do tipo fissuras. Isso não torna o leite impróprio para o consumo
• No final da ordenha, aplicar as últimas gotas retiradas na re- pelo filho da doadora, mas invalida esse leite para doação. Cores anormais
gião mamilo-areolar. podem resultar também do desenvolvimento de micro-organismos no
A ordenha pode ser considerada como indicador do controle de leite humano. Neste caso, pode-se observar, por exemplo, uma coloração
qualidade do leite, uma vez que, se não for bem conduzida, o produto avermelhada causada pela bactéria Serratia marcescens, ou uma colora-
poderá apresentar sujidades ou odores estranhos, devendo, nesse caso, ção verde, produzida por bactérias do gênero Pseudomonas. Em todos
ser descartado. os casos, os frascos com leite humano deverão ser descartados. (BLH-IFF/
É de fundamental importância a eliminação dos primeiros jatos NT - 25.11).
no momento da ordenha, pois contribui para a redução de até 90% da - Determinação do Off-flavor: a lactose do leite humano apresenta
população inicial de bactérias. Outro aspecto relevante é a relação entre grande capacidade de sorção, ou seja, absorver e adsorver substâncias
as barreiras bioquímicas que o leite humano oferece ao crescimento mi- voláteis. A determinação do off-flavor (sabor e odor) se configura como
crobiano e a contagem total de bactérias presentes. Quanto maior a carga importante instrumento na detecção de não conformidades no leite
microbiana, mais rápida será a saturação dos fatores de defesa e, por con- humano ordenhado, sobretudo as que decorrem do crescimento de
seguinte, mais acentuado o crescimento bacteriano (BLH-IFF/NT - 16.11). microrganismos pertencentes à microbiota secundária do leite. Os
microrganismos lipolíticos promovem o desenvolvimento de ranço hi-
116 Armazenamento do Leite Humano drolítico e oxidativo, facilmente perceptíveis em sua fase inicial, devido
a um forte odor, que se assemelha ao do sabão de coco. A presença de
As melhores práticas associadas ao armazenamento do leite hu-
microrganismos proteolíticos, por sua vez, é facilmente evidenciada pelo
mano indicam que os recipientes ou frascos devem ser mantidos bem
flavor decorrente dos produtos da proteólise, que conferem um off-flavor
vedados para evitar que o leite absorva odores indesejáveis e outros volá-
semelhante ao de peixe e/ou ovo em fase de decomposição. Outros tipos
teis nocivos. Quando descongelado, é desejável o consumo o mais rápido
de off-flavor, como odor de cloro, plástico, borracha e remédio, decorrem
possível do leite humano, não sendo permitindo novo resfriamento ou
da capacidade de sorção da lactose e também impedem o consumo do
congelamento do alimento.
leite humano (BLH-IFF/NT - 26.11).
O leite humano ordenhado cru, em domicilio, pela própria lactante,
- Determinação da Acidez em graus Dornic: em decorrência de
pode permanecer no máximo 12 horas em geladeira. Já congelado, o leite
sua própria composição, o leite humano apresenta uma acidez original,
cru pode ser armazenado por um período máximo de 15 dias, a partir da
decorrente do ácido lático, produzido a partir do crescimento bacteriano,
data da primeira coleta, a uma temperatura máxima de -3º C. Uma vez
com fermentação da lactose do leite humano. Cada molécula de lactose
descongelado, o leite humano cru para uso do próprio filho deve ser man-
metabolizada produz 4 moléculas de ácido lático, o que, além de aumentar
tido sob refrigeração à temperatura máxima de 5º C, por no máximo 12
a acidez do produto, concorre também para o aumento da osmolaridade e
horas na geladeira, e não pode ser congelado novamente. Acima desses
para a diminuição da biodisponibilidade do cálcio e fósforo. Quanto maior
valores de temperatura, o leite deverá ser desprezado, independente do
a quantidade de ácido lático produzido, menor a biodisponibilidade de
aspecto físico do produto.
cálcio e fósforo no leite humano ordenhado.
Já o leite pasteurizado congelado pode ser estocado por um pe-
O leite humano recém-ordenhado, caso titulado imediatamente
ríodo máximo de seis meses, a uma temperatura máxima de -3º C. Após
após a ordenha, apresenta-se praticamente livre de ácido lático, e sua
descongelado, o leite pasteurizado deve ser mantido sob refrigeração por
acidez total pode ser considerada original, com valores oscilando entre
um período máximo de 24 horas, à temperatura limítrofe de 5º C (BRASIL,
1,0 e 4,0ºD. À medida que sua microbiota encontra condições favoráveis
200 8).
para o crescimento, ocorre a produção de ácido lático e a consequente
elevação da acidez. Acidez maior que 8,0ºD desqualifica o produto para o
Métodos utilizados para a avaliação da qualidade do consumo (BLH-IFF/NT - 29.11).
leite humano O leite humano ácido não atende aos requerimentos nutricionais
Todo leite humano recebido pelo BLH deve ser submetido aos pro- de crianças prematuras, baixo peso e recém-nascidos imunodeprimidos. A
cedimentos de seleção e classificação. A seleção compreende: condições acidez desestabiliza as micelas de caseína, promove coagulação, aumenta
da embalagem; presença de sujidades; cor; off -flavor e acidez em graus a osmolaridade, altera o flavor e reduz as propriedades imunobiológicas
Dornic. A classificação do leite compreende a verificação do período de do leite. Algumas bactérias utilizam os carboidratos do leite como fonte
lactação; da acidez em graus Dornic e do crematócrito. de energia produzindo ácido lático, que ionizado em meio aquoso torna
os minerais fósforo e cálcio indisponíveis.
Segundo Cavalcante (2005), o aproveitamento do leite humano or-
Seleção do leite humano denhado cru com acidez titulável maior que 7ºD para neonatos é inviável
De acordo com a Norma Técnica BLH-IFF/NT - 23.11, os seguintes por dois motivos: pela redução no teor de creme, gordura total e valor
aspectos devem ser avaliados quando da seleção e da classificação do energético; e pelo risco de causar acidose ou alcalose metabólica e ente-
leite humano ordenhado cru: rocolite necrosante. Nesse caso, é recomendado desprezar totalmente o
- Condições da embalagem: a embalagem destinada ao acondi- leite humano com acidez elevada.
cionamento do leite humano ordenhado deve ser de fácil limpeza e de-
– CAPÍTULO 3 | 3.6. ALEITAMENTO MATERNO E BANCO DE LEITE –

Classificação do leite humano O controle de qualidade microbiológico do leite humano orde-


nhado praticado pela rBLH no Brasil segue a lógica preconizada para
alimentos, que institui a utilização de micro-organismos indicadores de
Período de Lactação qualidade sanitária. Neste contexto, o grupo coliforme tem ocupado lugar
O leite humano deverá ser classificado em colostro, leite humano de destaque, por ser de cultivo simples, economicamente viável e seguro,
de transição e leite humano maduro, a depender da idade gestacional minimizando a possibilidade de resultados falso-positivos. Uma vez que
no momento do parto e a idade da lactação em dias em que o leite foi o objetivo da pasteurização é eliminar 100% das bactérias patogênicas,
coletado. a presença de coliforme em amostra de leite pasteurizado caracteriza o
produto como impróprio para consumo. Os resultados serão expressos
Determinação do Crematócrito como ausência e presença de coliformes totais.
O conteúdo energético do leite humano é determinado por meio
da técnica do crematócrito, proposta por Lucas em 1978 e modificada por Distribuição do leite humano
Wang et al. em 1999, que consiste em centrifugar amostras de leite, aferir
a quantidade de gordura existente e, por meio de cálculos matemáticos Os critérios a serem observados pelos Bancos de Leite na distribui-
específicos, determinar seu conteúdo energético. É a relação matemática ção do leite humano ordenhado pasteurizado e que integram o controle
entre creme, soro e gordura do LH (Wang, 1999 e Lucas, 1978 apud V ieira de qualidade de rotina dos Bancos de Leite Humano, são descritos na
et al., 2004). Norma Técnica BLH-IFF/NT- 41.11.
O uso de estratégias que permitam a avaliação do conteúdo energéti- A qualidade do leite humano ordenhado é uma grandeza dinâmica
co do leite humano nas unidades neonatais pode contribuir para a manuten- que se constrói a partir da interseção de duas dimensões – característica do
ção deste como alimento preferencial para o bebê, evitando o uso indiscrimi- produto e necessidades do receptor. A lógica que norteia a construção da
nado de fórmulas. Cuidados simples no ato da oferta do leite humano ao RN qualidade se estabelece a partir do espelhamento das necessidades decor-
tornam-se medidas eficazes para diminuir as perdas calóricas causadas pela rentes das peculiaridades fisiológicas do metabolismo do lactente sobre as
adesão das micelas de gordura à parede dos equipos, minimizando perdas características do leite humano ordenhado. De modo geral, no momento
nas propriedades calóricas do LHP, tais como: posicionar verticalmente as de definir qual produto deve ser destinado a um dado receptor, é preciso
seringas, diminuir ao máximo possível o tempo de infusão de dietas e ho- que se levem em consideração os seguintes aspectos:
mogeneizar regularmente o leite ofertado, proporcionando melhor aporte 1. Leite exclusivo: o leite da própria mãe sempre se mostra
calórico e, consequentemente, melhor ganho de peso. Além disso, o teor como o mais indicado.
de gordura do LHP pode ser estipulado por prescrição médica. Na utilização 2. Leite de baixo aporte energético: apesar de muitas vezes
exclusiva do leite humano procedente do banco de leite é fundamental que não ser valorizado, merece destaque o fato de os leites de
se tenha controle do valor calórico final ofertado para que se possa assegurar baixo aporte energético serem ricos em imunobiológicos e
ganho de peso satisfatório ao bebê. substâncias antioxidantes, particularmente importantes em
Pasteurização do leite humano situações em que a preocupação maior gira em torno de
questões relacionadas a danos oxidativos da mucosa, translo-
O leite humano ordenhado destinado ao consumo de recém-nasci-
cações bacterianas e patologias do tubo digestivo.
dos, particularmente os internados em Unidades de Terapia Intensiva, não
3. Leite de elevado aporte energético: indicado sempre em
deve apresentar micro-organismos em quantidade ou qualidade capazes
situações nas quais a preocupação maior é o ganho de peso.
de representar agravos à saúde. Dessa forma, é preciso que se disponha
4. Leite de baixa acidez Dornic: além de representar um pro-
de procedimentos capazes de assegurar a qualidade sanitária do leite
humano ordenhado (BLH-IFF/NT - 34.11).
duto de melhor qualidade microbiológica, a acidez Dornic 117
permite fazer inferências sobre uma maior biodisponbilidade
A pasteurização representa uma alternativa eficaz, há muito conhe- do cálcio: quanto mais baixa a acidez, mais biodisponível o cál-
cida e praticada no campo de Tecnologia de Alimentos. Trata-se de um cio no leite humano ordenhado. Este produto é recomendável
tratamento térmico aplicável ao leite humano que adota como referência nos casos de hipocalcemia.
a inativação térmica da Coxiella burnetti, por ser considerada o microrga- Deve-se sempre verificar na prescrição o aporte energético indica-
nismo patogênico mais termoresistente. Uma vez observado o binômio do, o volume demandado e demais características que componham o
temperatura de inativação e tempo de exposição capaz de inativar esse quadro clínico do receptor. Exemplo: receptor prematuro em fase inicial
microrganismo, pode-se assegurar que os demais patógenos também de alimentação, aporte energético de 500 kcal/l em risco de hipocalce-
serão termicamente inativados (BLH-IFF/NT - 34.11). mia. A hipocalcemia agrega valor à prescrição por demandar um LHOP
O leite humano ordenhado cru coletado e aprovado pelo controle com baixo índice de Acidez Dornic.
de qualidade deve ser pasteurizado a 62,5ºC por 30 minutos após o tempo O paciente submetido à nutrição com leite materno deve ser
de pré-aquecimento. A pasteurização não visa à esterilização do leite, mas controlado quanto à eficácia do tratamento, efeitos adversos e alterações
sim a uma letalidade que garanta a inativação de 100% dos microrganis- clínicas que possam indicar modificações da terapêutica. Esse controle
mos patogênicos passíveis de estar presentes, quer por contaminação deve observar: ingressos de nutrientes, tratamentos farmacológicos con-
primária ou secundária, além de 99,99% da microbiota saprófita ou normal comitantes, sinais de intolerância à nutrição, alterações antropométricas,
(BRASIL, 2008). bioquímicas, hematológicas e hemodinâmicas, assim como modificações
em órgãos, sistemas e suas funções. Qualquer alteração encontrada nas
Controle de qualidade – aspectos microbiológicos: funções dos principais órgãos e as consequentes alterações na formula-
O leite humano obtido de doadoras saudáveis é livre de micro-or- ção ou via de administração da nutrição deve constar na história clínica
ganismos patogênicos. Quando presentes, podem ser provenientes de do paciente.
fontes externas de contaminação. Entre os contaminantes externos, os
coliformes ocupam lugar de destaque devido ao seu próprio significado e
elevada probabilidade de sua ocorrência quando o leite não é obtido em
condições higiênico-sanitárias satisfatórias.
– ASSISTÊNCIA AO RECÉM-NASCIDO DE RISCO | 4ª EDIÇÃO - 2021 –

3.7. ABORDAGEM DO RECÉM-NASCIDO FEBRIL


Paulo R. Margotto, Carlos Moreno Zaconeta

• Febre que aparece nos primeiros dias de vida, mais frequente


Introdução entre o segundo e o quinto dias.
O atendimento ao recém-nascido (RN) febril constitui um desafio • Sem história sugestiva de infecção (ver tabela 1).
até para pediatras muito experientes. • Parto cesárea.
• Mães inexperientes têm maior risco.
A grande variabilidade de prováveis desfechos costuma gerar ansie-
• Mães com dificuldade de amamentação.
dade e preocupação nos pediatras atendentes.
• Ao exame, as mamas podem mostrar: pouco leite, mamilo
O reconhecimento e a intervenção precoces de algumas doenças invertido, mamas muito ingurgitadas (“peito empedrado”),
podem salvar a vida de um neonato. fissuras, cicatrizes cirúrgicas etc.
Uma abordagem serena, sistematizada e atenta é necessária e, na • RN suga pouco ou suga mal.
maioria das vezes, suficiente para resolver o problema do binômio mãe- • RNs com doenças que predispõem à dificuldade de sucção
-filho. (síndrome de Down, fenda palatina, micrognatia etc.) têm
maior risco.
• RN GIG tem maior risco.
Objetivos • O RN urina pouco.
• A incidência aumenta nos meses mais quentes.
Discutir uma abordagem racional e organizada do RN que foi de alta
• RN que perdeu mais de 10% do peso de nascimento.
saudável e retorna com febre pelo pronto-socorro (PS) ou ambulatório.
• Exame segmentar normal ou desidratação de grau variável.
Incrementar a resolutividade dos pediatras em relação ao RN. • É frequente que algum grau de icterícia acompanhe o quadro
Incentivar a suspeita de doenças potencialmente fatais para o RN. clínico.
• Hemograma normal.
• Os casos mais graves podem cursar com desidratação hiper-
Apresentação de casos cínicos natrêmica.
• A intensidade da febre está relacionada ao grau de hiperna-
tremia.
Caso clínico nº1
Em relação ao tratamento da baixa ingesta:
RN com 3 dias de vida, consultou no PS por febre de 38 ºC. Bom es-
• O paciente deve ficar internado para observação e tratamento.
tado geral, exame segmentar normal. Foi colhido hemograma completo
• As desidratações leves podem ser tratadas no alojamento
+ VHS. Leucócitos 6500 (seg 60% bast 0% linf 30%). VHS = 1. Alta do PS
conjunto, com leite materno ordenhado ou leite humano de
no mesmo dia.
banco.
RN retornou após 48 horas, mal perfundido, desidratado, apático. • Os casos mais graves requerem internação na UTIN.
118 Colhido novo hemograma + hemocultura. Recebeu fase rápida de expan- • Nos casos de intensa desidratação hipernatrêmica, a solução
são com solução glicofisiológica 50 ml/kg e HV 110 ml/kg. de eleição para a expansão inicial é o soro fisiológico (20 ml/
Evoluiu com crise convulsiva prolongada e aprofundamento do kg).
coma. Encaminhado à Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN). • Corrigir a hipernatremia devagar para evitar as complicações
Faleceu após algumas horas. O hemograma não apresentava alterações (Barbosa; Szajnbok, 1999).
e a hemocultura foi negativa. O laudo da necropsia informou presença • Considerar que se chegou a esse grau de hipernatremia ao
de edema cerebral importante e necrose tubular aguda provavelmente longo de alguns dias, portanto, a correção do sódio deve ser
devido a choque por desidratação. realizada em dias, não em horas.
• As convulsões aparecem mais frequentemente após a insta-
Caso clínico nº 2 lação do tratamento de correção de hipernatremia, principal-
mente com soluções hipotônicas.
RN com 15 dias de vida, nasceu com 39 semanas, parto cesárea,
• Após a expansão, a hidratação venosa de manutenção deve
Apgar 9 e 10. Consultou no PS por febre. Internado para observação.
ser feita com Na+ a 2-3 mEq/100 ml.
Hemograma normal. Na evolução, apresentou persistência da febre, irrita-
• É muito importante a prevenção, identificando os fatores de
bilidade e crise convulsiva. Novo hemograma também sem alterações. O
risco para problemas na amamentação no binômio mãe-filho,
líquor mostrou pleocitose com hiperproteinorraquia. Iniciado tratamento
no intuito de corrigi-los antes da alta.
com Aciclovir.
Leia novamente o caso clínico nº 1 e faça uma análise crítica dele.
Desenvolvimento: Isto ajudará a fixar conceitos importantes.
A definição de RN febril é uma criança com menos de 30 dias de vida e RN com infecção bacteriana:
temperatura retal ³ 38 ºC.
• A base do diagnóstico é o tripé: fatores de risco maternos,
A diferença do lactente e pré-escolar, no qual um episódio febril manifestação clínica do RN e exames laboratoriais (Silveira;
é, na maioria das vezes sinal, um processo benigno, é que a febre no Procianoy, 2004).
RN indica prioridade na elucidação diagnóstica e a conduta jamais deve Tabela 1 – Fatores de risco maternos para sepse neonatal precoce
limitar-se ao tratamento sintomático dela.
Perante um RN que foi de alta saudável e que retorna com febre Rotura prematura de membranas > 12 horas
no ambulatório ou na emergência, o pediatra deve orientar o seu
raciocínio para responder às seguintes perguntas: Febre materna intraparto
• É um caso de febre por baixa ingesta de leite?
• O paciente tem uma infecção bacteriana? Corioamnionite
• O RN tem uma pneumonia viral/bronquiolite?
• Trata-se de um caso de infecção por herpes vírus? Taquicardia fetal (BCF > 160 bpm)
• É um RN com cardiopatia congênita?
Como cada uma destas entidades demandaria por si mesma um Fisometria positiva (líquido amniótico fétido)
capítulo à parte, abordaremos a seguir cada uma delas de forma sucinta.
RN com febre por baixa ingesta de leite: Parto prematuro
A baixa ingesta de leite é a causa mais frequente de febre em RN Colonização materna por Estreptococo do Grupo B
a termo em bom estado geral, sem fatores de risco para infecção e sem
outras alterações no exame físico, fora sinais de desidratação, na primeira
Gestação gemelar
semana de vida. As características que fazem pensar nesta doença são:
– CAPÍTULO 3 | 3.7. ABORDAGEM DO RECÉM-NASCIDO FEBRIL –

• Importante suspeitar, pois o prognóstico depende muito da


Leucocitose materna terapêutica precoce.
• O diagnóstico fica dificultado, pois a maioria das mães tem
Qualquer infecção bacteriana na mãe (infecção do trato urinário, infecção herpética subclínica e os sintomas neonatais iniciais
abscesso dentário etc.) são inespecíficos (39% dos RNs jamais apresentam vesículas
na evolução).
• As manifestações clín