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Resumo Crítico – Administrativo I

Aluna: Alana Ramos Raimundo Santana

Matrícula: 217120884

GABARDO, Emerson. A Eficiência na Administração Pública Contemporânea.


In: GABARDO, Emerson. Princípio constitucional da eficiência administrativa. São
Paulo: Dialética, 2002. cap. 1, p. 23-72.

O texto é a parte inicial do livro de Emerson Gabardo, intitulado como “Princípio


constitucional da eficiência administrativa” – cuja compreensão é de suma importância
para o desenvolvimento e a revisão das atividades promovidas pela máquina pública,
não apenas na aferição de sua legitimidade, como também na otimização dos
recursos públicos para atingir os melhores resultados possíveis. O autor é especialista
em direito administrativo e sua experiência enquanto professor de direito público é
facilmente percebida na construção bem encadeada, lógica e didática de seu texto –
sem deixar de lado a necessidade de atender ao aspecto técnico da questão
levantada. Dessa maneira, o presente resumo crítico se debruçará nos principais
pontos que a obra apresenta e trará as críticas em relação ao que foi tratado.

Depois de fazer uma breve consideração acerca da dificuldade de gerar uma


definição exata do termo “eficiência”, a obra resgata autores que versaram sobre a
temática de diferenciar os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade. Nas Ciências
Econômicas, cada um tem seu próprio sentido: será eficiente aquele(a) que fizer a
melhor alocação de recursos possível (o que muitos economistas denominam como
ótimo de Pareto1), eficaz aquele(a) que atinge os objetivos que foram designados e
efetivo aquele(a) que consegue mudar a realidade e gerar o impacto que pretendia
(impacto agregado)2. A utilização dessas noções abre um leque de oportunidades
para o próprio direito, enquanto regulador do comportamento humano, se ajustar da

1
Mankiw (2005);
2 (SECCHI; COELHO; PIRES, 2019);
melhor forma possível – seja diretamente através da formulação e revisão de
legislações, na interpretação da lei, na formulação e avaliação de políticas públicas
ou até mesmo no processo decisório da administração pública.

Evidentemente, a aplicação desse ferramentário disposto pela economia sofre


adaptações para que funcione devidamente nas mais diversas áreas do
conhecimento. Nessa perspectiva, considerando a proposta de elucidar a eficiência
na administração pública contemporânea, Gabardo apresenta o debate teórico, da
administração pública, frente a definição e diferenciação entre os termos, e habilmente
aproveita para inseres certas noções ao leitor, tais como escolha ótima, racionalidade
e produtividade. Tal debate provocou ainda mais reverberações e o autor pontua
também que a ambiguidade muitas vezes gerada pela ideia de eficiência foi
combustível para a inclusão das ideias de economicidade e celeridade enquanto
atributos da eficiência. Enquanto a economicidade existe para ilustrar o sentido de
produzir mais com o mínimo de recursos possível, a celeridade se refere ao dispêndio
do menor tempo possível e, sendo tempo um recurso, estaria essa incluída àquela.

O texto segue ao abordar o próximo grande ponto: não há como falar de


administração pública sem compreender como ela é operada e qual a legitimidade da
mesma. Intrinsecamente fundida com o processo de formação do Estado Nacional
Moderno, a saída do feudalismo provocou a centralização do poder e a Revolução
Francesa consolidou o Estado Moderno como o coordenador e regulador de uma
nação – legítimo não por determinação divina ou pelo acaso, mas sim pelos
procedimentos que o regem: racional, previsível, impessoal e não-patrimonialista.
Essa compreensão permite que a conclusão da burocracia enquanto instrumento
legitimador da administração público e permite, inclusive, o tecimento de críticas ao
modelo brasileiro – cujas raízes remetem ao tradicionalismo patrimonialista.

Após fazer essa recapitulação histórica e etimológica, Gabardo toca em uma


das principais atividades do Estado contemporâneo: a regulação. Assim, o autor
apresenta aos juristas diversas formas que a administração pública possui enquanto
atua como reguladora, seja aumentando ou diminuindo barreiras de entrada para
setores econômicos, definições acerca de quantidade e qualidade de determinadas
produções e como agente que tem como dever assegurar um ambiente competitivo
entre as empresas. Não obstante, Gabardo também questiona a aplicação da
eficiência enquanto conceito meramente econômico mesmo dentro de atividades
completamente ligadas ao mercado, indicado possivelmente certa incompatibilidade
com o interesse público.

Tal contradição, todavia, não existe, como já demonstrado por teóricos como
SALAMA (2013) que, resumidamente, que destaca um dos principais pilares do
interesse público e sua relação com a eficiência: a justiça.

A questão, portanto, não é tanto se eficiência pode ser igualada à


justiça, mas sim como a construção da justiça pode se beneficiar da
discussão de prós e contras, custos e benefícios. Noções de justiça
que não levem em conta as prováveis conseqüências de suas
articulações práticas são, em termos práticos, incompletas (SALAMA,
2013, p. 14).

Em outras palavras, mesmo considerando seu conceito econômico, é


absolutamente relevante para o interesse público. Ainda que eficiência não seja um
critério suficiente para a justiça (uma vez que essa é mais complexa e abarca outros
fatores também relevantes), é um critério necessário – má alocação de recursos
implica em desperdício e recursos são escassos, o desperdício deles resulta na não
utilização em outro setor (SANTANA, 2020). A ineficiência é injusta por definição.

Outro fator de extrema importância é que eficiência, eficácia e efetividade,


enquanto critérios, podem variar extremamente de acordo com os parâmetros
estabelecidos para uma norma, política pública ou decisão administrativa. Por esse
motivo, mesmo em seu sentido mais ligado à Ciência Econômica, não é incompatível
com o interesse público – muito pelo contrário, pois se adequa a ele. Se o objetivo é
redução da miséria extrema, o Bolsa Família foi efetivo e as discussões subsequentes
em relação a eficiência e eficácia ligadas ao mesmo são instrumentos de melhorias
de uma política pública: se é possível ter uma melhor alocação de recursos e/ou
promover resultados que gerem mais impacto, tudo isso deve ao menos ser discutido.
Talvez uma das maiores críticas ao autor venha exatamente no sentido de pegar uma
área eminentemente multidisciplinar, principalmente no que tange a discussão sobre
eficiência, e limitar a discussão da temática apenas ao Direito e à Ciência Política –
crítica essa que não é exclusiva apenas a esse seguimento do texto.

Há também seção puramente dedicada à teoria da Public Choice (Escolha


Pública), que consiste no estudo de arranjos institucionais que promovam melhores
redes de incentivos para pautarem as relações entre os agentes. É uma escola de
pensamento nitidamente marcada pelo individualismo metodológico ao considerar
que todo e qualquer indivíduo reage a incentivos, incluindo os próprios políticos,
focando sua discussão no ambiente institucional que os cerca. Ainda na temática,
Gabarde “ressalta” visão de que “a Public Choice acredita na inutilidade do Estado,
defendendo a absoluta não-intervenção na sociedade” e a caracteriza como teoria na
qual prevalece a ideologia “neoliberal”.

Novamente o autor falha ao retratar com precisão uma área multidisciplinar –


um dos principais vícios da academia moderna. Dentre outros, Gordon Tullock e
James McGill Buchanan Jr. são os principais expoente a teoria da escolha pública,
em momento algum colocando o Estado como inútil e advogando pela não intervenção
dele, apenas reconhecendo esse ente enquanto promotor de incentivos que podem
ser tão positivos quanto negativos. Reconhecer as instituições como promotoras de
uma rede de incentivos e os agentes como seres altamente responsivos a tais
estímulos, são sinais de uma administração pública responsável e assertiva – bem ao
contrário de, como o autor caracteriza, “inútil” ou “não intervencionista”3.

A caracterização da mesma enquanto produto da “ideologia neoliberal” também


demonstra certa incompatibilidade, uma vez que o neoliberalismo enquanto política
só veio surgir com o Consenso de Washington, em 1989, e a Teoria da Escolha
Pública vem como resultado de um longo e complexo processo com o avanço do
movimento realista na academia norte americana4, que começou no final da década
de 40. Se trata, portanto, de mais um reducionismo presente no texto analisado.

Logo em seguida, o autor se propõe a elucidar o modelo gerencial ideal,


colocando a racionalidade gerencial-pragmática como ponto de encontro entre a
public choice, a teoria do agente-principal e o gerencialismo propriamente dito –
momento em que destaca aparente “paradoxo no neoliberalismo gerencialista”, uma
vez que afirma a autonomia do indivíduo ao mesmo tempo em que ressaltaria sua
incapacidade de mudar o mundo. Além de tecer uma crítica a utilização da
flexibilização das normas jurídicas, Gabarde também apresenta o Plano Diretor de
Reforma do Aparelho do Estado – novamente o referenciando no ideário “neoliberal”

3 Mackaay (1999) e Butler (2015);


4 Mackaay (1999);
– e ressaltando as diversas tentativas contemporâneas de enfraquecer o Regime
Jurídico Administrativo.

Nesse seguimento, o texto ficou ligeiramente confuso e faltou profundidade


para compreensão do ponto do autor. O neoliberalismo enquanto teoria existe em
pedaços, consistindo principalmente em uma seleção recortada de aspectos a serem
promovidos no Consenso de Washington. Não obstante, ainda que seja considerado
uma política moderna, é uma visão desatualizada na qual teóricos ainda tendem a se
perder com facilidade atualmente, uma vez foi questionado e revisitado e alterado na
academia e na realidade fática, em consonância com o processo científico que toda e
qualquer disciplina pautada pela ciência precisa passar e com o processo racional que
a realidade impõe.

Na tentativa de desmistificar a fuga para o regime privado que, frequentemente


é colocado como panaceia, o autor resgata duas ideias relevantes para o interesse
público: externalidades negativas e as distinções entre avaliação e realidade. A
ausência de Ronald Coase nessa seção é particularmente alarmante, faltando abordar
não apenas a complexidade da questão das externalidades negativas (com o
Teorema de Coase), como também a complexidade que os padrões atuais exigem
que as avaliações de impacto socioeconômicos sejam feitas. Nessa perspectiva, uma
análise baseada meramente num modelo econométrico que, por definição, é uma
simplificação da realidade, já deixou de fazer parte da realidade desde a queda da
Escola Neoclássica de economia, no início do século XX.

Por fim, ressalta novamente o mal uso da eficiência como instrumento de


legitimação da desestatização. De fato, a má utilização acontece, mas assim como a
crítica tecida, seu autor também incorre no mesmo erro: generalização.
Desestatização não necessariamente é algo negativo e o mesmo também é válido
para a estatização – tudo vai depender caso a caso.

Outras referências:

BUTLER, Eamonn. Escolha pública: um guia. São Paulo: Bunker Editorial, 2015.
SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é “Direito e Economia”?. Revista Direito UNIFACS
– Debate Virtual, Salvador, ed. 160, 2013. Disponível em:
https://revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/2793. Acesso em: 19 mar.
2020.
SANTANA, Alana Ramos Raimundo. A Análise Econômica do Direito como base
teórica para a Avaliação de Impacto Legislativo. Orientador: Danielle de Jesus Silva
Vasconcellos. 2020. 75 p. Monografia (Bacharelado em Ciências Econômicas) -
Universidade Salvador, Salvador, 2020.
SECCHI, Leonardo; COELHO, Fernando de Souza; PIRES, Valdemir. Políticas
Públicas: Conceitos, Casos Práticos, Questões de Concurso. 3. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2019.
MACKAAY, Ejan. History of Law and Economics. University of Montreal, Montreal, p.
65-117, 1999. Disponível em: https://reference.findlaw.com/lawandeconomics/0200-
history-of-law-and-economics.pdf. Acesso em: 14 jul. 2020.
MANKIW, N. Gregory et al. Introdução à economia. São Paulo: Pioneira Thomson,
2005.

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