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AS CONDIÇÕES PRECÁRIAS DA PENITENCIARIA AGRÍCOLA DO MONTE


CRISTO DE RR: MOTIVAÇÃO PARA REBELIÕES E REIVINDICAÇÃO DE
DIREITOS

AL. SD. PM. RAFAEL DOS SANTOS BARROS1, CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS DA PMRR
2021.1

Com base no artigo cientifico do Prof. Gibton Pereira de Andrade, sob o Título:
Rebeliões e Crimes Bárbaros na Penitenciária Agrícola do Monte Cristo, esta Resenha
consiste em analisar criticamente o referido artigo, que trata das deficiências e fragilidades da
estrutura fisico-administrativa do sistema carcerário local. A análise terá como objeto
principal os fatores reais que corroboram para o desejo e a necessidade da prática de rebelião
por parte dos internos do cárcere da penitenciária de Roraima, como por exemplo, a
superlotação e a ineficiência dos direitos humanos essenciais aplicados. Considera-se
importante analisar a grande falta de adequada estrutura física negligenciada por parte do
poder público durante anos, sendo capaz de contribuir para que a insatisfação dos internos
fosse um estopim para os massacres que aconteceram a cada rebelião. Dessa forma, a análise
crítica que constitui esta resenha usará como base teórica os dados e as elucidações presentes
no artigo citado e seguirá a defesa de que, diante de tantos fatores negativos que cercaram a
realidade do sistema prisional de Roraima, é muito provável que as rebeliões foram, para os
internos, uma forma de reivindicação de direitos e melhorias na estrutura física e
organizacional da PAMC/RR.

O SISTEMA PRISIONAL DA PAMC: ESTRUTURA FÍSICA E ORGANIZAÇÃO


PRECÁRIA

Basta um mínimo de conhecimento acerca do referido sistema para entender ser falido e
antiquado, além de altamente fragilizado em questão de segurança, já que há muito tempo
vem prevalecendo o domínio pelas facções criminosas, que evidencia uma administração
defasada. De acordo com Gibton Pereira de Andrade, essa realidade é, em parte, causada pelo
Poder Público:

Não obstante a responsabilidade estatal pela custódia do preso, não éraro sermos
surpreendidos pelos meios de comunicação de massa e/ou mídias digitais osquais

1
Email: raffaelsbarros@gmail.com.
2

denunciam a real situação de presos frente ao problema da superlotação carcerária,


espalhados pelas penitenciárias brasileiras, onde os direitos mais básicos relativos
àdignidade humana são deixados de lado em faceda precariedade em termos de
estruturas físicas e das condições desumanas a que osdetentos são
submetidos.(ANDRADE, 2020, p.80)2.

Entende-se, a partir dessa passagem, que a maioria dos presídios brasileiros, incluindo
os de Roraima, subexistem com o objetivo quase que único de reclusão das pessoas que têm
sua liberdade bloqueada pela justiça. Dessa forma, a reeducação para o retorno ao convívio
em sociedade é inexistente. O art. 85º da Lei de Execução Penal3 dispõe que o
estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua finalidade, o que não existiu
propriamente na PAMC, então, a superlotação existente sem a devida organização das
finalidades penais, foi e é um dos fatores impulsionadores das práticas de rebeliões e conflitos
internos.

A CARÊNCIA DE DIREITOS MÍNIMOS INERENTES AO SER HUMANO

Se analisarmos o histórico sociofamiliar de cada interno de uma penitenciária, serão raros


os casos de uma boa base familiar, com ambientes sem violência ou sem algum nível de
miséria, fatores capazes de, juntamente com uma má índole, levar um indivíduo ao
cometimento de infração penal. É inegável que a inexistência dos direitos básicos de um
cidadão (acesso à moradia, à saúde, à educação, ao lazer, à leitura, à alimentação etc.) pode
ser um fator causador de marginalização, revolta e desejo de prosperidade por vias ilegais.
Sabe-se que uma vida digna tem por base os direitos humanos e garantias fundamentais
asseguradas, dessa forma, é dever dos Estados respeitarem e tornarem efetivos tais direitos,
proporcionando, assim, uma vida digna a sua população.

REBELIÕES OCORRIDAS NA PAMC: UMA MANEIRA DE REIVINDICAR


DIREITOS E MELHORIAS

Tendo contato ao que é mostrado pela mídia e pelas pesquisas referentes às condições que
se encontraram a Penitenciaria Agrícola do Monte Cristo é fato que a dignidade da pessoa
humana não fazia parte da vida dos internos da referida penitenciária, que viviam sob
condições de subsistência. Segundo o estudo de Gibton Pereira de Andrade:
2
ANDRADE, Gibton Pereira de. REBELIÕES E CRIMES BÁRBAROS NA PENITENCIÁRIA
AGRÍCOLA DO MONTE CRISTO. Artigo Científico componente do livro Digital: DIREITO: POLÍTICAS
PÚBLICAS E AS RELAÇÕES ENTRE ESTADO E SOCIEDADE, 2021. Disponível em:
<https://educapes.capes.gov.br/handle/capes/585699> Acesso e download em 04 de agosto de 2021.
3
Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210compilado.htm> Acesso em: 04 de agosto de 2021.
3

Com base em relatórios específicos de comissões de direitos humanos, nos massacres


cometidos durante as últimas rebeliões, e considerando a estrutura física precária da
citada penitenciária, e ainda a existência de facções criminosas entre os internos,
somos conduzidos a firmar convencimento pela Declaração Universal do Direitos
Humanos que no Sistema Prisional de Roraima existe a possibilidade de tutela dos
Direitos Humanos aplicáveis aos detentos da PAMC, mas com certeza não podemos
asseverar a sua eficácia plena. (2020, p. 86).

Partindo dessa realidade, com certeza há uma grande insatisfação por partes dos
internos, o que pode ser um dos fatores responsáveis pela prática de rebelião como forma de
reivindicar melhorias, como por exemplo, melhores condições de higiene pessoais,
alimentação digna e de qualidade, melhores estruturas no local de dormir e a redução de
internos em cada cela. E não é novidade que esses anseios são vistos pela grande parte da
sociedade como exagero e indigno, já que são criminosos.
Assim, considerando que na estrutura física e na organização da PAMC existem
precariedades e deficiências, o excesso de presos foi mais um fator agravante, que já
ultrapassou há muito tempo o limite que foi estabelecido em seu planejamento e finalidade,
causando, assim, uma facilidade para a tão conhecida rivalidade entre as facções criminosas
existentes, já que uma das rebeliões citadas abaixo (2017) foi motivada pelo domínio das
facções existentes na PAMC4.
Segundo o Departamento Penitenciário Nacional5, o cometimento da primeira rebelião
ocorrida na referida penitenciária no ano de 2016 foi devido à superlotação como um fator
determinante para os massacres, enquanto a segunda rebelião ocorreu em janeiro de 2017,
provavelmente pelos mesmos motivos já que nada mudou, e esta última teve grande
repercussão nacional pelo grande número de mortes e a forma que cada uma acontecia.

O DEVER DO ESTADO E AS MEDIDAS PÓS-REBELIÃO: EXEMPLO DE


ALGUMAS QUE FORAM APRESENTADAS E EFETIVADAS

Percebendo a real situação dos presos, as condições em que se encontravam e os


acontecimentos que foram motivadores para as rebeliões, é inegável que a participação do
Estado estava ineficiente, tanto na criação das políticas públicas como na melhoria da
estrutura física e administrativa da penitenciária. Segue abaixo as medidas apresentadas por
Gibton Pereira de Andrade em seu artigo, que segundo o Ministério Público Estadual, o
Governo do Estado de Roraima deveria seguir. Dentre elas estão:

4
Facções conhecidas como Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV).
5
Órgão cuja a atuação se dá na área de segurança pública, especificamente na execução penal nacional, e é
subordinado ao Ministério da Segurança Pública.
4

I. Garantia de construção de novos presídios na capital Boa Vista e a conclusão da


obra de novo presidio, localizado na região sul do Estado de Roraima.

Acerca dessa medida, no ano de 2018 o Governo de Roraima (Suely Campos - PP)
assinou a ordem de serviço para a construção do novo presídio de regime fechado em RR, e a
Unidade teve a previsão de custar quase R$ 17 milhões, com a capacidade para 286 presos e
de início imediato, tendo o prazo determinado de um ano para ser finalizada. O valor que
havia sido liberado em dezembro de 2016 pelo Ministério da Justiça foi bloqueado por
constatação de irregularidades e foi desbloqueado no mesmo ano para a construção e melhoria
do sistema prisional. E na mudança de Governo (atualmente Antônio Denarium) a PAMC, a
Cadeia Pública Masculina de Boa Vista, a Cadeia Pública Feminina e a Cadeia de
Rorainópolis iniciaram suas reformas e ampliações. Já foram finalizadas as obras de alguns
blocos caminhando para a conclusão total da penitenciária.6

II. Realização de concurso público para o cargo de agentepenitenciário;

Referente a essa medida, no ano de 2019 o Governo de Roraima autorizou a realização do


Concurso Público para o cargo de Agente Penitenciário no qual foram ofertadas 423 vagas e
aconteceu no ano de 2020, com a proposta de convocação de uma parte dos aprovados de
forma imediata levando em consideração a alta necessidade existente no sistema prisional.7

III. Solicitação do Ministério da Justiça da manutenção do efetivo de Intervenção


Federal enquanto não terminada a situação de crise na penitenciaria;

A PAMC estava dominada pelas facções criminosas e era considerada como uma "bomba
relógio prestes a explodir", foi neste momento que o Governo Federal assumiu a gestão de
todas as unidades prisionais de Roraima enviando os agentes federais para atuarem no
presídio e estando neste desde o final de 2018 até o presente momento.8

6
Dados obtidos no Site G1.globo.com, 2018. Disponível em:
<https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/governo-assina-ordem-de-servico-para-construcao-de-novo-presidio
-de-regime-fechado-em-rr.ghtml>. Acesso em: 06 de agosto de 2021.
7
Dados obtidos no Site Portal.rr.gov.br, 2019. Disponível em:

<http://portal.rr.gov.br/index.php/noticias/item/879-governo-de-roraima-autoriza-concurso-publico-para-agente
-penitenciario>. Acesso em: 07 de agosto de 2021.
8
Dados obtidos no Site G1.globo.com, 2021. Disponível em:
<https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2021/08/03/intervencao-federal-na-penitenciaria-agricola-de-rr-e-pr
orrogada-pela-12a-vez.ghtml>. Acesso em: 08 de agosto de 2021.
5

IV. A separação dos presos, mesmo contra a determinação de alguma facção criminosa
que esteja atuando na unidade prisional, utilizando todos os meios lícitos para
efetivar essa obrigação do Estado;

Sobre esta medida, o foco foi na retirada dos líderes de facção que existiam na PAMC e o
envio destes para um presídio federal de segurança máxima, que no caso, foram conduzidos
para o presídio de Mossoró, no Rio Grande do Norte. Para essa ação, foram liberados 2,2
milhões de reais para o sistema prisional e o envio de homens do Departamento Penitenciário
Nacional.9
Diante de toda a análise feita até aqui, conclui-se que vários fatores negativos cercavam a
Penitenciaria Agrícola de Monte Cristo. Por um lado, a superlotação com o dobro de sua
capacidade e com isso o aumentando do número de faccionados dentro do presídio, e por
outro lado, os direitos mais básicos relativos à dignidade humana ignorados pelo Estado. Essa
realidade em união com a má índole que já faz parte de cada interno da unidade prisional
resultou em movimentos de rebelião como uma forma de reivindicar melhorias. E foi neste
intuito que no ano de 2017 os internos da PAMC promoveram a maior e mais cruel rebelião
do sistema penitenciário de Roraima, provocando, assim, o Estado e a Segurança Pública, a
partir de então, necessitou-se da intervenção federal que trouxe tratamentos violentos aos
presos, porém, resultados transformadores chegaram à saúde, assim como à estrutura física do
presidio e à separação dos presos líderes de facções, entre outras medidas benéficas ao
sistema carcerário e à segurança do Estado de Roraima.

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Dados obtidos no Site Veja.abril.com, 2016. Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/brasil/lideres-de-faccoes-em-roraima-vao-para-presidio-federal/>. Acesso em: 08
de agosto de 2021.

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