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Diversos outros campos acadêmicos tangenciam em maior ou menor grau o cineclubismo: a recepção
cinematográfica, a teoria feminista, os Estudos Culturais, entre outros. Mas, definitivamente, não se
pode falar de uma Teoria Cineclubista.
As tentativas e experiências de apropriação da imagem que chamaríamos posteriormente de cinema são
absolutamente contemporâneas dos cineclubes. Paralelamente às atividades comerciais e de
entretenimento desenvolvidas por empresários e outros aventureiros em busca de resultados
financeiros, muito cedo já se usavam projeções para acompanhar conferências e provocar debates nos
meios educacionais laicos e religiosos, assim como nos ambientes politizados de trabalhadores. Gauthier
menciona diversos casos, desde 1898 pelo menos. A primeira década do século 20 viu essas atividades
crescerem em número, mas igualmente em complexidade, em organização. Em torno de 1910 já
existiam salas e organizações constituídas política e juridicamente, mas sem o nome de cineclube.
Se Gauthier (1999) trabalha com a ideia de um protocolo cinéfilo, isto é, um conjunto de práticas que
identificam a cinefilia – projeções sistemáticas, debates, publicações – ele também elimina outras, que
sempre fizeram parte das experiências não comerciais com o cinema, como as coleções (arquivos), as
atividades educativas e, principalmente, a produção. Esse autor constrói a posteriori e valida um
conjunto de práticas estabelecido paulatinamente entre os anos 20 e 30, particularmente na França, e
depois adotado, com algumas variações, em todo o mundo. É essa “definição”, supostamente baseada
nas iniciativas de Delluc e outros, ao longo dos anos 20, nunca exatamente enunciada, mas tornada
hegemônica, que foi parar nos dicionários, sem passar por uma verdadeira avaliação crítica.
Nos anos 70 do século passado, coincidindo com uma ampla crise do modelo preponderante de
cineclube, alguns autores retomaram a ideia inicial do cineclube como uma organização do público. Essa
concepção tem a vantagem de criar um amplo campo de ações que podem ser reconhecidas como
iniciativa do público, mas também demonstra a incapacidade de estabelecer uma definição mais precisa
para cineclube.
Responder à questão: O que é um cineclube? certamente não é possível no espaço deste resumo nem
em uma exposição de alguns minutos. O mais provável é que não seja possível simplesmente encerrar a
riqueza da experiência cineclubista em algum tipo de taxonomia, mas que suas formas de organização e
suas práticas possam ser melhor compreendidas nos diferentes contextos históricos e sociais em que se
desenvolvem. Nesse sentido, como temos observado, não existe atualmente um modelo predominante
e estável de cineclube. Num contexto de transformações revolucionárias nas formas de comunicação e
expressão audiovisuais, tal situação crítica aponta possivelmente para ricas possibilidades. Gostaríamos
de retomar a experiência original do cineclubismo popular e revolucionário para pensar em novas
práticas cineclubistas em contextos midiáticos e digitais, especialmente na América Latina.
Felipe Macedo
GAUTHIER, Christophe. 1999. La passion du cinéma. Cinéphiles, cinéclubs et salles spécialisés à Paris de
1920 à 1929. Paris : Association Française de Recherche sur l’Histoire du Cinéma.