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Organização

Jeovânia P.

Coletânea

São Paulo – 2020

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Copyright © by Autoras diversas
Projeto gráfico:
Editora Ixtlan
Revisão:
Maria Valéria Rezende
Diagramação:
Márcia Todeschini
Capa:
Castilaine Carmo
Escultura de Bethânia Lira

Jeovânia Pinheiro do Nascimento (organizadora)

Escrituras negras - A mulher que reluz em mim - São Paulo/SP


- Ed. Ixtlan, 2020.

ISBN: 978-85-8197-859-8

1.Literatura brasileira 2. Coletânea


CDD B869

Editora Ixtlan - CNPJ 11.042.574/0001-49 - I.E. 456166992117


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qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei Federal 9.610/1998) é crime previsto no art.
184 do Código Penal.

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APRESENTAÇÃO

A Coletânea Escrituras Negras_ A Mulher que Reluz


em Mim é uma obra que busca a valorização da
literatura feminina negra, afinal, historicamente,
escrever sempre foi um privilégio dos homens brancos, não por
representar a realidade, mas por espelhar uma sociedade
machista e racista.
Na verdade, por um tempo absurdo, as mulheres
precisaram escrever e publicar usando pseudônimos
masculinos para que fosse possível que seus trabalhos
chegassem ao público, e essas mulheres eram brancas,
imaginem as negras?
Seriam mais quinhentos! Sem direito a serem
consideradas gente, sem acesso à educação, às condições de
vida dignas, essas precisaram ser resistência, a exemplo de
Carolina Maria de Jesus. Esta mulher negra catou lixo e desse
mesmo lixo colheu livros, alimentando sua alma com eles,
reutilizou cadernos velhos, fazendo deles o espaço de registro
de suas vivências literárias e pessoais, para depois ser
questionada se, como ela, “aqueles seres tão inferiores” eram
de fato capazes de produzir coisas tão lindas e profundas.

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A sociedade brasileira vive um racismo velado, é
preciso realizarmos um paredão de vozes femininas-negras a
fim de lutar pelo nosso lugar de direito nessa sociedade que nos
cobra cada pedaço de nós, que nos toma tudo: a autoestima, a
força, a vida. Somos resistência! Há mais aqui no fundo, pois
se vai a rigidez da carne, mantém-se a pujança da alma,
permanecemos.
Seguimos com múltiplas funções, sendo cada uma
várias em uma só. É essa variedade de ser mulher negra e com
intensidade de ser, que há em nós, que essa coletânea
manifestará: nossas lutas, angústias, amores, dissabores, as
entrelinhas de se Ser Mulher-Negra-Brasileira Cis e Trans.

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SUMARIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................... 5

CONTOS

ANAJARA TAVARES .............................................................................12


QUE HORAS ELE CHEGA?
JADE MARIAM VACCARI .................................................................17
A PRINCESA NEGRA E O MANDARIM
SHEILA MARTINS...............................................................................22
ANDANÇAS DE DONA ONI
CRÔNICAS

ALESSANDRA SAMPAIO...................................................................28
CONSUMISMO ENAMORADO
ANA PAULA CAMPOS........................................................................32
À ESPERA DO PRÍNCIPE BRANCO EM SEU CAVALO BRANCO
NINGUÉM NASCE NEGRA. TORNA-SE NEGRA!
ANDREIA SOUZA................................................................................36
DESISTI DE DESISTIR
ELISA MATTOS .....................................................................................40
O GIRO DA VIDA
FÁTIMA SOARES ..................................................................................42
CABELAÇO
MIRIAN SANTOS ................................................................................45
VOZES AO REDOR

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POEMAS

CECÍLIA PEIXOTO .............................................................................50


INTOLERÂNCIA
SILENCIAR? NÃO!
CRISTIANE LIMA ................................................................................54
CAJAZEIRAS: MÃE ETERNA!
RESISTÊNCIA
HELENA MONTEIRO ........................................................................57
RAÍZES ANCESTRAIS
SALVE NEGA
ISABETE FAGUNDES ALMEIDA ....................................................61
ESPERANÇA GARCIA
CABELEIRAS
JANAÍNA NERY ....................................................................................64
MULHER PRETA
SOZINHA
JÉSSICA RODRIGUES .......................................................................68
PROTÓTIPO
MUTANTE
JEOVÂNIA P. ..........................................................................................71
RELUZ
TUM TUM
DIVISÃO
JULIANA SANTOS ...............................................................................74
PALAVRA
ORA HORA
MARA FARIAS .......................................................................................77
MARCA PRETA
A ARMA ANCESTRAL

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PATRÍCIA ANUNCIADA ...................................................................80
SER NEGRA
MULHER PERIFÉRICA
PATRÍCIA DE PAULA ANICETO ....................................................82
NOS BRAÇOS DE ODOYÁ
MURMÚRIOS
SHIRLEY PINHEIRO .........................................................................84
SOBRE ELA
ELA E OS NÃOS
DESCOBERTAS!

AS AUTORAS .........................................................................................87

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Contos

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Anajara Tavares

QUE HORAS ELE


CHEGA?

Sabendo do atraso
dele e temendo a
solidão, mantive
silêncio nos corre-
dores, para não
precipitar o despertar
do hóspede. A noite é de chuva, o noticiário informa o trânsito
intenso, talvez ele não chegue na hora do jantar. Desconsiderei
o mau tempo, fui à cozinha ao entardecer, fiz uma massa e um
molho de ervas. Domino a arte de alimentá-lo bem. Quem sabe
depois de bem chegado, lá no caminhar da noite para
madrugada, entre um chamego e outro, lhe desperte outra
fome. Tinha planejado abrir aquele vinho que compramos na
nossa última viagem, noites especiais combinam com Merlot.
Após um banho, me refugiei no meu quarto, segui os planos.
Liguei a nossa vitrola, iniciei a primeira taça. O disco é uma
relíquia de 1974, Cartola embriaga mais meus sentidos do que

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um Merlot, mas nunca embriaga tanto quanto lembrar de
nossos corpos nus, desfeitos em orgasmos, regulando a
respiração na batida de “O mundo é um moinho”.
As cortinas estão fechadas, mas as janelas entreabertas.
A luminosidade dos raios interrompe a penumbra do quarto.
Sinto a força do trovão tremendo a casa.
“Oba no sa ka woo. Ka biye si Sango!”
Saúdo em voz alta aquele que lhe guarda o Orí, me
acalmo. Mesmo aceso o incenso, sinto o aroma de terra
molhada que vem lá de fora, ouço a sinfonia da natureza, o balé
das folhas com a chuva, a força dos pingos que gotejam a sua
chegada.
Meu íntimo teme que ele não chegue. Aconchego-me
nos lençóis e mando mensagem ao hóspede que ainda descansa
no último quarto. O cheiro daquele que espero invade o
ambiente da memória, dizem que o talco granado (polvilho
antisséptico) é inodoro, mas não no corpo dele, não misturados
às notas de sua melanina. Nem mesmo o açaí do seu hidratante
corporal é capaz de camuflar esse cheiro inebriante que me
lembra da minha primeira vez em sua cama.
Os cães ladram rompendo o silêncio da estrada, o
relógio de algum lugar distante badala, passa das 21h. Só a
presença da saudade distancia-me do cheiro dele, me traz de

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volta a realidade da cama morna. Em lençóis preaquecidos,
meu corpo deseja loucamente o corpo volumoso e a quentura
dele. Qualquer outra presença será sempre morna, se estou a
esperá-lo.
Estou espalhada em lençóis e braços, Cartola ainda nos
embala enquanto penso nele. Sinto o toque macio da minha
camisola de seda e seu leve atrito na calcinha de renda branca.
Sempre que uso lingerie branca, recordo quando ele manifestou
a sua tara em me ver vestida assim, em íntimos e minúsculos
trajes brancos, e elogiou como eles ressaltam a minha
melanina.
Fugindo dos lapsos das minhas memórias, desperto o
corpo para outra presença, sinto a mão firme que movimenta os
meus quadris, o hálito que arrepia a minha nuca e a quentura
aflorando as entranhas. Deslizo os meus dedos na parte interna
das minhas coxas, apreciando a maciez. Sou novamente
roubada pela memória, ele costuma ressaltar que essa maciez é
única. Alterno o ir e vir das minhas unhas sobre essa região
apreciada, as unhas estão pintadas de jabuticaba, gosto de
jabuticabas, me lembram a boca desse forasteiro que demora a
chegar. Também gosto do efeito do tom sobre tom nos meus
dedos alongados, enquanto se movem na pele dele, se
misturando e se destacando quando deslizados em suas nádegas

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ou enterrados em seu peito, quando tento conter os efeitos de
abrigá-lo em mim.
As respirações intensas encaminham-se para ritmos
ofegantes. Cada inspiração capta o perfume de rosas que a
minha pele exala. As rosas tocam fundo a minha feminilidade,
ele gosta dessa combinação, eu e as rosas, uma expressão
poderosa da fêmea. Hoje não me depilei inteira como de
costume, deixe uma trilha de vontades guiando o caminho,
todas se depilam inteiras para ele, mas eu decidi que hoje vou
regar os meus pelos com seu suor, assim posso ter algo só
nosso. Até pressinto os dedos dele em atrito no meu crespo,
antes de afundá-los na umidade morna das minhas águas e me
revirar o curso deste rio. A percepção é quase real.
Fantasiarmos é um prazeroso exercício de nossas
possibilidades, nossa liberdade. Sigo aquecendo meu corpo no
desejo de sua chegada, me perco no pincelar de uma língua
sobre a tela da minha virilha. Os meus, já não tão tímidos,
gemidos são interrompidos pelo toque da canção "Por onde
anda você". Recolho o corpo espalhado no edredom, aprecio
por alguns segundos a canção enquanto me refaço os sentidos...

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“...E por falar em saudade onde anda você
Onde andam os seus olhos
Que a gente não vê
Onde anda esse corpo
Que me deixou morto
De tanto prazer
E por falar em saudades...”.
Peço licença ao habilidoso artista plástico que ainda se
inspira na foz do meu rio. A canção é um recorte de nossa
trilha, ele usou para declarar-me saudades uma vez, desde
então é o toque que personalizei em seu número. Procuro o
celular na lateral da cama. É o seu nome que pisca na tela, a
ligação se encerra.
A prévia do bate papo revela: “ Minha preta, hoje não
dará tempo te ver.” Um emoticon de rosa vermelha e um trevo
da sorte recepcionam as três consoantes que encerram a noite:
-”Bjs! ”.
Lamento o desperdício da surpresa, ele enlouqueceria
ainda mais por mim, se nos visse agora. Abandono o celular,
me viro para o lado, volto a minha mente para o corpo quente
com quem compartilho a cama. Agora seremos só nós dois,
madrugada a dentro.

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Jade Mariam Vaccari

A PRINCESA NEGRA E O
MANDARIM

Era o ano de Deus de 1777, na


bucólica Vila Rica, o Contratador
dos diamantes, servo da rainha D.
Maria I, teve uma filha com uma
negra forra. A negrinha que
nasceu fruto dessa relação foi
chamada Amara. Sua mãe era uma
negra de ancas largas chamada Ana Crioula, ou seja, sua filha
deveria ser uma reles crioulinha, porém Amara havia sido
criada como filha legítima do senhor dos diamantes, o homem
mais importante das Gerais, aquele que deveria pôr ordenm
naquela terra angariando fundos para a Coroa.
“Macaca” Amara tinha 7 anos quando ouvira tal palavra
lhe ser proferida ao passear por Vila Rica, junto a aias de
confiança do Contratador, pois ela era criada na propriedade do
pai com todas as regalias dignas de uma princesa. Até então
não saíra da propriedade a conhecer a maldade da cidade,

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estava acostumada a todos os luxos, tendo bondosos escravos a
seu dispor. Ao passear pela cidade conheceria o desprezo da
sociedade ao ver aquela mulatinha trajada de princesa, sofreria
o rechaço por tal atrevimento. Macaca, negra, peça assim foi
chamada. Tais nomes lhe doeram mais que uma cuspida. Ela
estava trajada de branco, mas jamais seria branca.
Amara cresceu, chegou à idade de casar, o burburinho
em Vila Rica era grande, pois não se tinha ideia de quem se
casaria com aquela negrinha. O casarão onde ela vivia poderia
ser chamado de paraíso, onde os negros eram bem tratados,
não havia tortura para os escravos. A Escravidão era justificada
pelo fato de que alguém deveria servir aos senhores, a mãe de
Amara havia até sido promovida ao posto de concubina do
homem mais importante das Gerais. Na cidade corria o
burburinho de que Ana Crioula só poderia ter parte com o
Tinhoso, ela teria o Diabo no corpo e assim teria enfeitiçado o
Contratador com suas ancas largas.
Um belo dia, o Contratador foi convidado a um jantar
na casa do Sargento Mor afinal era preciso estreitar os laços
entre os fidalgos. Amara foi a esse jantar junto com seu pai.
Além da família do Sargento Mor, lá estava Su Can, um
comerciante mandarim que havia chegado àquelas terras e, por
seu jeito espirituoso, havia caído nas graças do Sargento Mor

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que o conhecia bem, após noites na taverna de Su Can. O
mandarim não parava de dirigir galanteios a Amara durante a
ceia na casa do Sargento Mor. Ela ficara curiosa para conhecê-
lo melhor, saber como aprendera a falar português, como teria
ido parar ali. Depois de uns dias Amara sentiu que precisava ir
à igreja, pois já não tirava da cabeça o galanteador mandarim.
Pôs-se a rezar sem perceber que passara horas ali e já havia
anoitecido. Ao sair da igreja encontrou Su Can, os dois
seguiram conversando, Su Can contou-lhe quais os lugares que
já teria conhecido, da Ásia às Américas, falava sobre como
aprendeu a se comunicar nas línguas desses lugares, tudo
aquilo que teria vivido. Então, Amara lhe perguntou quantos
anos ele teria, devia ter uns 30… aparentava isto no máximo.
Nesse momento Amara viu uma transfiguração diante de si e,
naquelas ruas inóspitas àquela hora, o encantador Su Can
revelou seus olhos translúcidos, encostou Amara em um beco,
e disse: devo ter 400 anos agora. Vivi na época da dinastia
Ming, na China de uma época de ouro que já não existe, fui
transformado por uma bela vampira de África, Nzinga que
outrora fora destruída por inimigos que a expuseram ao nascer
do sol. Soube posteriormente que era possível se proteger da
luz solar, então uma poderosa feiticeira preparou um amuleto
que me serviria de proteção. Ao usá-lo, posso transitar à luz do

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sol, ainda que me cause um mal-estar. Assim posso viajar e
negociar no comércio, vivo viajando, pois não posso viver mais
que 10 anos no mesmo lugar. Se descobrissem o morto-vivo
me reduziriam a cinzas.
Amara estava pasmada, perplexa diante de tal
revelação, porém não poderia resistir àquele olhar vampírico.
Su Can havia roubado a sua mente, o seu corpo, os seus
sentidos. Por mais que ela tentasse resistir ao beijo do vampiro,
acabou se entregando. Assim Su Can lhe mordeu o pescoço, em
seguida lhe deu a beber do seu sangue, fazendo dela um ser
imortal como ele, agora a princesa negra e o mandarim
estariam juntos por toda eternidade e, ali nos seus braços, a
princesinha havia se tornado alguém mais parecida com ela
mesma. O casal imortal casou-se diante da benção da Santa
Madre Igreja no altar, e receberam a benção do sacramento que
os fez uma só carne. Um príncipe e uma princesa das trevas
que logo iriam desbravar outros lugares.
Ao deixar Vila Rica rumo à Corte, no Velho Mundo,
Amara se questionava se algum dia haveria um mundo sem
Escravidão, em que um homem não fosse dono de outrem
afinal, ainda lhe restava um fio de humanidade em sua
consciência vampírica. Naquela nau rumo ao mundo que se
abria, a cor da pele já não importava, afinal a eternidade

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guardava um segredo que faria aquele casal imune a qualquer
tribulação livres do pecado, livres da morte, onipotentes diante
de um mundo a desbravar.

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Sheila Martins

ANDANÇAS DE DONA ONI

Acordou...
E lá vai Dona Oni mais um dia
cuidar dos seus. Viver vidas que
são suas. Corre, cuida de filhos
que não gerou mas está criando.
Leva pra escola Zezinho, arruma
a cama de Mariazinha e prepara a
comida de todos da casa. Família
grande demanda cuidados
rigorosos e uma correria de tirar o folego.
Dona Oni sente-se cansada pois desde pequena, quando
nem se via como gente, cuidava e criava gente. Aos noves anos
de idade não morava mais com os pais. Pai? Ela não conheceu.
E a mãe? Tinha que cuidar de mais doze irmãos. Nessa
situação, para a mãe dela, menos uma a seus cuidados seria um
certo “alívio” talvez. Com essa tenra idade, Oni foi levada para
casa de sua madrinha, também no interior da Bahia mas um
pouco melhor do que o local em que ela vivia com os irmãos.
Chegando lá ficou com a incumbência de cuidar de duas

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crianças enquanto sua tia Dora trabalhava numa fábrica de
sutiã. Oni sobreviveu e aprendeu a zelar por todos. Não sabia
fazer outra coisa além de cuidar de gente. Pensava nisso
constantemente.
Dona Oni, mulher preta, grande para os lados e intensa
no olhar. Criada por pretos e criava pretos. Pensando bem de
preto ela entendia e, sendo assim, das mazelas da vida não
existe alguém nesse mundo que conhecesse tão bem como ela.
Depois de crescer e ver tanta gente crescer, ela sabia bem como
a vida caminhava.
O tempo passa, Dona Oni se vê uma mulher casada,
com três filhos crescidos e morando numa casebre na cidade
grande. E lá estava ela cuidando dos seus pretos.
Um certo dia uma vizinha entrou correndo em sua casa
aos gritos. Acorda! Dona Oni Acorda! A vizinha sacodiu-a para
abrir os olhos.
Os olhos fechados, recusava-se a se abrir pois, no
fundo, sabiam que algo de ruim havia ocorrido. Pronto! Não
tem jeito! Ela tem que abrir os olhos e deixar os ouvidos
atentos ao que a vizinha afobada tem para contar de tão
urgente.
Uma notícia!
Um tiro!

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Os olhos de Dona Oni fecharam-se e as lágrimas
jorravam. Olhos d’água.
Um tiro atingiu certeiro o peito do seu filho mais velho.
Toninho, a quem ela mais amava. O mais sorridente e quem
conquistava os sorrisos mais doces das pretinhas ao seu redor.
Preto alto, forte. Um tiro, numa briga de bar fez com que mais
um corpo preto caísse morto no chão. Dor e sofrimento fizeram
parte do banzo de Oni. Ela não queria mais cuidar de gente.
Sentia que tinha falhado em sua tarefa.
Depois de tantos anos, num final de tarde ela sente uma
brisa fresca no rosto. Um sorriso leve vem a seus lábios, algo
incontrolável. Sentimento de conforto e afeto. Oni olha para
calçada da sua casa e vê um pretinho correr com a bola na mão,
sorriso enorme e voz estridente. Era parecido com Toninho. O
menino olha para ela e diz “Vó não fica triste não!” Pega a bola
e lá se vai correndo. O coração de Oni pulsa tranquilo, em paz.
Resta um sentimento de que seu filho mais velho está a olhar
por ela. Sendo assim, ela continuará a cuidar de pessoas como
se fosse sua própria vida.
Acordou...
Dessa vez, Dona Oni estava a esperar sua família para
almoçar, num belo domingo ensolarado. Em seu casebre cabem
todos. Ela ainda está a viver com os filhos, netos, bisnetos ao

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seu redor, ouvindo suas histórias. Afinal de contas, vivências
não faltam para essa preta porreta!

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CRÔNICAS

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Alessandra Sampaio

CONSUMISMO
ENAMORADO

Onira nunca se divertira tanto no


dia dos namorados... A matu-
ridade traz esse presente: perceber
a graça nas coisas mais simples
do cotidiano.
Com apenas uma hora para
almoçar, foi ao shopping não para
atender ao apelo comercial e comprar um presente, mas para
fazer aquilo que considera bom motivo para passar horas nele
além de ir ao cinema: pagar as contas num mesmo lugar.
Mas esse pequeno tempo que tinha disponível pareceu-
lhe ser um dia diante de tantos comportamentos aos seus olhos
apresentados.
Demorou, mas não na fila do caixa eletrônico e sim
observando as posturas das pessoas ao seu redor.

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Pra começar, no estacionamento do shopping, deparou-
se com um casal que se beijava, abraçava e olhava para os
lados verificando e desejando, se estavam sendo observados.
Em seguida, ainda no estacionamento, ouviu um casal
perguntando a uma garota que saia do carro do namorado sobre
o que houve com eles, se haviam brigado. Como foram se
afastando, não ouviu a resposta dela. Provavelmente aconteceu
algo que o consumismo consegue: destruir o dia dos
namorados.
Ao passar pela porta do shopping, encontrou saindo do
mesmo, uma criatura de “asas” abertas, peito estufado, mãos
estendidas, carregando uma pequena sacola. Enfim,
apresentando à sociedade o presente que daria à namorada ou
ao namorado. Que figura!
Observando a vitrine da loja do time do Bahia, um
rapaz se aproximou para ver artigos expostos e falou para a sua
companheira: Veja que interessante! E ela gritou: Não adianta,
rapaz! Eu não vou comprar presente pra você! Eu não já disse?
E se afastaram. Ele, disfarçando sua frustração, afirmando que
não estava sugerindo nada e ela reafirmando a não compra.
Mais adiante ouviu uma mulher falar que comprou um
carrinho de plástico para o rapaz "cara de pau" com quem tem

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ficado há menos de três meses e já lhe pediu um carro de
presente.
Viu uma mulher desconfortavelmente calçada em saltos
altíssimos quase caindo por cima do namorado tentando
transparecer uma alegria que o andar torto negava. Desejou que
ele tenha conseguido levá-la a um lugar legal ao invés de uma
clínica ortopédica.
Viu homens e mulheres idosas tentando correr. Isso
mesmo. Correr pra comprar a tempo o presente do (a)
namorado (a).
Ainda testemunhou pessoas exibindo orgulhosamente
enormes pacotes e outras timidamente carregando os seus
pequenos presentes como se o tamanho fosse o mais
importante. Mas é assim que o consumismo se fortalece:
"Compre o maior ou o mais caro que é melhor!". Só não
avisam pra quem...
Ah! Tinha também um homem com um enorme
“bambolê” no dedo que ignorando o seu que não é tão grande
ficou encarando-a e dando piscadinhas. Pensou: "Certamente
ele quer ganhar mais uma namorada, um presente extra ou
apenas um “presente”. De repente, não ganhará nada porque,
com esse comportamento, é provável que sua amada não o
considere merecedor..."

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Sentiu por não ser fotógrafa como Alile Dara para poder
registrar além da memória alguns looks bastante exagerados de
namoradas (os) ao lado da(o)s companheira(o)s completamente
indiferentes a preocupação com a estética para o tal encontro
reafirmando a velha e célebre frase: Os opostos se atraem.
Enfim, presenciou no shopping inúmeras pessoas
programando o dia ou noite dos namorados, pensando nos
presentes, no jantar, no encontro ou mesmo no fato de ter ou
não namorada(o). Onira só não conseguiu ver nas faces das
pessoas aquilo que o consumismo não nos faz pensar: Quais
as coisas que dão o verdadeiro sentido ao namoro? Namoro é
exibição ou uma relação afetiva onde os envolvidos se
propõem a estarem juntos compartilhando novas vivências?

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Ana Paula Campos

À ESPERA DO
PRÍNCIPE BRANCO EM
SEU CAVALO BRANCO...

Durante muitos anos sonhei


com a chegada do príncipe
encantado, que pela minha
experiência leitora de contos de
fadas eurocêntricos, deveria ser um homem, hétero e branco.
Não haviam príncipes negros e princesas negras nos livros que
eu lia, então, muito cedo o peso da realidade caiu sobre mim:
eu não era uma princesa. Por mais que me esforçasse, jamais
seria uma princesa. Uma mulher negra, dona de uma risada
escandalosa e um atrevimento típico de mulheres
independentes.
Passei boa parte da minha vida na labuta diária de mãe
solo, conciliando uma rotina de trabalho estafante na esperança
de um dia me casar com meu príncipe e viver feliz para sempre
com esse homem que, finalmente, resolveria todos os meus
problemas e cuidaria de mim. Foi quando descobri o

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feminismo negro e as coisas clarearam na minha mente. Ou
seria escureceram? Sentindo-me representada e fortalecida,
compreendi que a vida poderia ser bem mais que simplesmente
almejar ser uma princesa presa num conto de fadas. O mundo
estava em minhas mãos e eu escolhi. Tornei-me uma feminista
negra e passei a militar pela causa. As urgências em denunciar
e combater o racismo levaram-me a criar um espetáculo de
contação de histórias de contos africanos, disseminando a
leitura e as culturas africanas, combatendo o racismo e o
preconceito.
Eu escolhi! Não quero ser uma princesa, tão pouco
preciso de príncipe ou princesa para ser feliz. Quero poder,
através da minha voz, contribuir para que outras meninas
negras e não negras percebam que elas podem ser e fazer o que
quiserem. A decisão não está nos contos de fadas. A decisão
está em suas mãos. Decida!

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NINGUÉM NASCE NEGRA. TORNA-SE NEGRA!

Permitam que eu me apresente. Sou Ana Paula Campos,


uma mulher negra de 39 anos. Por que preciso dizer isso?
Porque sou negra há muito pouco tempo. Por ser dona de um
cabelo cacheado e volumoso, sempre ouvi, quando criança.
expressões do tipo: “Prenda esse cabelo ruim!”.
Eu não conhecia a literatura negra, não me sentia
representada em lugar nenhum. A minha cor em si nunca foi
um problema. Já o cabelo... ah, o cabelo era um problema.
Alisava a cada três meses porque a raiz crescia rápido e eu não
queria nem sinal daquele “pixaim”. Eram quatro horas de
sofrimento com um produto que fazia arder e queimar meu
couro cabeludo e frequentemente deixava feridas. Mas eu fazia
qualquer coisa para me sentir aceita.
Tomei coragem e fiz o “Big Chop”. Quem eu era foi-se
com os cabelos. Mas na realidade nada é tão simples assim.
Frequentemente eu prendia os cabelos ou perguntava se
estavam “muito armados”. O que estou tentando dizer é: sou
uma mulher negra, ainda em construção. A transição capilar
pode durar em média um ano, já a consciência identitária varia
de preta para preta e pode durar uma vida inteira.

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O tão sonhado empoderamento não é algo que acontece
magicamente. É fruto de leituras, reflexões e lutas internas
contra os padrões de opressão. Então, ao cruzar com uma
crespa ou cacheada que alisa o cabelo, não diga que ela precisa
deixar o cabelo natural. Não decida por ela se está ou não
bonita. O empoderamento é um processo lento, doloroso e
individual, e cada uma decide como é feliz.

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Andreia Souza

DESISTI DE DESISTIR

Num teclado de fundo preto e letras


brancas, dedilho e discorro sobre
minhas vivências. Numa folha em
branco com letras pretas. Preto &
Branco que tão bem se combinam na
paleta de cores, nos indispõem como
seres humanos.
Inicialmente citarei duas mulheres que me servem de
referência. Primeira Pandora, a primeira mulher, filha de Zeus,
aquela que sem maldade, por mera curiosidade libertou todos
os males guardando cuidadosamente consigo a Esperança. A
segunda é Eva, aquela que carrega nos ombros todo o peso e
culpa pela expulsão do Paraíso. Afinal somos todas:
degredadas filhas de Eva.
Ser mulher já é em si um exercício de coragem. Ao
tentar recordar sobre minha essência, me pergunto: Quando foi
que me percebi Negra?

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Lembro-me de ser chamada de tantas formas: Preta,
Nega, Neguinha, Negona. A grande diferença era o tom. Um
toque sutil distinguia entre chamamento e escárnio... Levei
muito tempo para entender que “excesso de melanina” era fator
de distinção. Até hoje insistem em nos chamar de quota ou
minoria! Elogios duvidosos afirmam que minha Pele não é
deveras escura, que meus traços são até delicados e que meus
cabelos não são demasiadamente crespos ou deveria dizer
ruim? Quem nunca ouviu um comentário inflamado de alguém
enraivecido por ter sua moral denegrida. O ápice foi ter minha
Alma desbotada, clareada a força. Ouvi o atroz: “preta de alma
branca” dito de forma indulgente quase comemorativa.
Por muito tempo era assim que se referiram a mim e eu,
eu não reagia. Cheguei a aceitar e até adotar a alcunha de
Moreninha. Tanto se esforçaram, diminuindo minhas
conquistas que eu mesma por determinado tempo, aceitei os
limites pré-estabelecidos e me encolhi para caber no pequeno
espaço que me era reservado. Sentia-me desconfortável na
Casa Grande que me acolhia, muitas vezes era latente em mim
a sensação de não pertencimento. Como já dizia o Grande
Camões, “um não querer mais que bem querer...”. Habitava em
mim um encolhimento interior, eu possuía um andar sem
altivez meu olhar para o mundo era ligeiramente passivo, pois

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eu achava que tinha vindo como figurante, não possuía o
direito ou capacidade para ser protagonista. Não nasci
empoderada, fiz-me... Após descobrir-me capitã de minha
alma, tatuei-me com as palavras Soul e Free. Muitos aos ler,
desconhecendo o idioma inglês, liam Sofri. Mas garanto que
não sofro mais. Muito pelo contrário, minha Alma é Livre.
Assim como meu horizonte é amplo. Não aceito mais as
barreiras invisíveis e muito menos os olhares condescendentes.
Não serei definida por conceitos arcaicos que distorcem e
retorcem falsas verdades. Eu me pertenço e mereço tudo oque
quiser conquistar. Não me definam ou limitem com seus
limites.
Atualmente ao perceber uma atitude de desdém, me
reservo à serenidade. Não ergo a voz para afirmar minhas
verdades, não me igualo ao agressor. Eu sei quem eu sou. Ao
ser ofendida, pela cor da minha pele, ou ser chamada de
macaca, com certeza não é o meu cérebro que parece menor ou
menos desenvolvido. Inferior é essa atitude vil e medíocre. Que
os propagadores de tais crimes sejam responsabilizados. Mas
se a intenção for tentar me diminuir, desculpem sublimei.
Vivenciei todos os tipos de Violência contra a Mulher,
acrescido do racismo que em nosso país muitas vezes é velado
e, portanto mais difícil de ser comprovado e combatido, sempre

38
existe a desculpa que foi um erro de interpretação. E daí a
culpa é quase nossa por nos sentirmos ofendidas Apesar de
tudo, não utilizo a alcunha de vítima, não me identifico, sou
mais do que a agressão que me causaram. Eu sou Sobrevivente.
Para encerrar vou citar a terceira mulher de minhas
referências. Uma mulher contemporânea que me emociona em
essência. É ela, Carolina de Jesus, essa mulher, preta, favelada,
mãe solo, considerada uma das primeiras escritoras negras
brasileiras. Autora do livro “Quarto de Despejo”, um Best
Seller lançado nos idos de 1960, traduzido para 16 idiomas,
vendido em 40 países. Um sucesso improvável. Uma catadora
de papel que muitas vezes guardava oque lhe traria sustento,
pois escrever era para ela mais que entretenimento, era vital...
É ela que me comove e me move para escrever e desvendar os
diários de minhas memórias mais secretas. Assim como
Carolina, não gosto do mundo como ele é, minha meta é
modifica lo, como eu puder. Não me move a demagogia fria de
palavras vazias, eu sou a Luta que Luto. Eu sou a pele preta,
que é a mais barata do mercado. Por Eva, por Pandora, por
Carolina, por mim, por todas nós mulheres divergentes,
resilientes e também por aquelas que ainda estão adormecidas,
entorpecidas, sufocadas, Eu desisti de desistir...

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Elisa Mattos

O GIRO DA VIDA

Deixei de ser filha, sou


apenas mãe.
Apenas?
Não! É muito, muito, muito.
A vida é um vai e vem de
voltas intermináveis.
Teve um tempo, que eu era apenas filha.
Tempos depois, vivi por muito tempo
o papel duplo de filha e mãe... mãe e filha....
de cuidar e ser cuidada.... de ficar exausta
e provocar cansaço... de dar e receber...
dar e receber, dar e receber.
Até que minha mãe saiu de perto de mim.
Deixei de ouvir a voz dela nas manhãs de domingo
ao telefone, só para me contar se chovia
ou fazia sol em Niterói. Se foi à missa, com que foi
almoçar....
E saber como seria o meu domingo.

40
Hoje é domingo e dona Heloisa faria aniversário.
Certamente teria muito para me contar
mas o telefone não vai tocar.
A filha aqui vai ficar só na saudade.
Ah! Mas hoje, a mãe aqui, já recebeu o telefonema
da filha que está longe. Ela só queria me contar
sobre a nova vida e que não deixou de estar bem
perto de mim.
A outra filha aproveita os encantos do domingo,
como deve ser na idade dela.
Eu?
Eu não estou sozinha neste domingo, estou com todas elas,
juntas, aqui, em volta de mim.

41
Fátima Soares

CABELAÇO

No calor do fogão prepara-se o pente


de ferro para o cuidado/tortura. O ar vai
ficando impregnado, odor de óleo e
cabelo queimado. A irmã mais velha
submete-se com freqüência ao
instrumento de suplício. Suporta o
sacrifício porque crê na ilusão do
cabelo liso, promessa da propaganda. Desde criança convive
com a dor de considerar uma parte de si algo defeituoso,
indesejado: cabelo pixaim, cabelo ruim.
“O liso é o bom, o liso é o belo”. Mas o liso
proporcionado pelo calor do pente de ferro é provisório,
fugidio. Não resiste a umidade ou movimento, seja brisa,
sereno, suor de trabalho ou diversão. O pente de ferro quente
engana e desengana a moça preta, atende o interesse de lucro e
poder simbólico para quem projeta, produz, divulga e vende.
À irmã mais nova pouco importam a textura dos fios,
volume, ou durabilidade do penteado. Assanhado, enrolado,

42
ininhado, embaraçado, cabelo é assim. E para ficar mais bonita,
basta um bom banho e um laço de fita.
_ Cala boca menina! Fica quieta para não suar! Fica
quieta para eu não te queimar! _ Deixe o meu cabelo!
Por ser pequena, a irmã mais velha não lhe permite
escolha. A sua inquietação, portanto, é um misto de raiva,
impotência e medo. O pente de ferro quente pode tocar seu
pescoço, sua testa, suas orelhas. Queimar o couro cabeludo. Ela
imagina que pode até incendiar sua cabeça. Estirar os cabelos a
força é dor imposta e tempo perdido. Pois quando escapa se
mistura à algazarra das amiguinhas. Algumas de cabelos
naturalmente lisos, outras, meninas pretas não submetidas essa
forma de cuidado/martírio.
O liso provisório do pente quente não harmoniza com
natureza nem com a cultura de nossa gente. A moça que passou
o dia se “embelezando” para festa, a noite pode maldizer o céu
e seus ancestrais. Infeliz, ficar em casa, odiando o inverno. A
moça infelizmente não compreende como essa estética se
alojou no modo de pensar/sentir/agir.
A menina inquieta guardou boas lembranças de
brincadeiras, festas e banhos de chuva. Mas, o fedor do pente
de ferro sobre as brasas do fogão ainda volta ao seu nariz de
mulher adulta. Volta à memória com imagens do passado, ou

43
quando lhes são oferecidos novos instrumentos termoelétricos
com as mesmas promessas de tratar/domar seus cabelos.
Propaganda, promessas vãs: “liso total, liso perfeito”. Evolução
tecnológica/ideológica do mesmo racismo. Carne humana
marcada a ferro quente, pelos donos de gente, produzia essa
mesma fumaça, exalava esse mesmo fedor, está convencida.
Hoje as duas irmãs fizeram as pazes com os espelhos.
Miram-se em moças e meninas onduladas, cacheadas, crespas,
que se afirmam negras. Mulheres de cabelos volumosos,
grossos, finos, pesados, tão diversos. Mulheres que sabem
quem são e como são os seus cabelos. Livres para deixar de
sentir algo em si irremediavelmente ruim. Livres para saber do
prazer da brisa do mar, do banho de chuva, suor de dança e de
luta, resistência... Não têm que gerar lucros para a
estética/negócio da opressão. Livres para escolher um corte,
uma cor, um trançado. Escolher um aroma de flor e usufruir da
beleza de um cabelaço.

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Mirian Santos

VOZES AO REDOR

Tem mais de três horas que eu


estou aqui trancada dentro deste
quarto. Escuto vozes altas na
maior parte do tempo. Homens
gritando, mulheres gargalhando,
crianças berrando. Copos
quebram, vasilhas caem,
campainha toca, os cachorros
latem e latem. Abro um livro e
outro, digito vírgulas, escrevo, apago, reescrevo – o mesmo
parágrafo, inúmeras vezes.
Da fresta da janela, eu vejo a minha irmã mais jovem
com o marido e as crianças. Duas meninas negras confortáveis
com seus brinquedos étnicos, que eu mesma dei. Mal o povo
entra, escuto mais gritos, algazarras e agora choros e bateção
de portas.
Lágrimas caem. Quero pegar minha mochila e sumir
daqui. Não tenho para onde ir. Minhas mãos suam e meu

45
cabelo crespo esquenta todo o meu corpo. As mãos que
vacilam em digitar mostram-se também incapazes de dominar
o verbo. Os olhos que já viram tanta coisa embaralham as letras
e cintilam angústias de passados subterrâneos. O corpo
desdobra-se em chamas, quer entregar o jogo, quer fugir, quer
parar de sofrer – se jogar no asfalto. Contrariamente, a cabeça
quer insistir, quer resistir.
Confusa em tanta angústia, olho a minha volta. Estantes
e estantes de papeis, diários e livros, muitos livros, e muito pó.
Pilhas de provas a avaliar, trabalhos a corrigir, diários a fechar.
Os gritos da casa aumentam, agora são ensurdecedores. Roo as
unhas, arranco fios mais ressecados dos meus cabelos, exprimo
espinhas da minha pele oleosa e molhada, os óculos já
escorregam do meu rosto. Olho no olho, um espelho redondo
no canto da mesa mal-ajambrada de estudos reflete uma pilha
de autoras negras, velhas cúmplices a me observar.
Agora gritam meu nome na porta, a música parece estar
mais alta, não consigo e não quero identificar quem me chama.
Gritam-me em uníssono coro. Isso não tem importância, pois
não vou atendê-los. Fico calada, finjo que estou dormindo. Um
grito-morto entalado na garganta é a velha tática de sempre.

46
Levanto da cadeira e caminho a passos lentos, pego
meu livro de cabeceira: Conceição Evaristo, página trinta e
nove. É preciso acolher outras vozes e seguir!

47
48
POEMAS

49
Cecília Peixoto

INTOLERÂNCIA

Hoje por vergonha ou medo


não nego minha religião
Os conhecimentos dos meus
valores étnicos dispensam sua
opinião.

Meus dogmas resplandecem em toda natureza


Nas matas, arco-íris, raios, nas águas em correnteza.

A ancestralidade pulsa em minhas veias, transpôs o oceano.


Sobreviveu nos corpos sofridos dos meus descendentes
africanos.
Herança, pertencimento, sentimento, valorização de uma
escolha.
Que habita no fogo, no ar, na terra, na água, nas folhas.

Não importa em que você acredita, filosofia de vida, ou crença


Não lhe é permitido julgar, emitir críticas, proferir ofensa.

50
A fé não escolhe lado, ela só tem um caminho, o sagrado!
Religião não é via de mão única apenas para reproduzir textos
decorados.

Entre nós não há espaços para exércitos armados de:


Empáfia
Imposição
Desconhecimento
Servidão
Intolerância?
Racismo religioso? Não!!

51
SILENCIAR? NÃO!

Inocência mutilada, pela subjugação da cor foi reprimida.


Os estereótipos que não possuía, marcou sua fase menina.
Neguinha! Sarara miolo! O que será que a definia?
Um misto de dor, raiva e tristeza era amenizada pela fantasia.

O pôr do sol, o mar, a leitura, refúgios do cotidiano.


Interrogações e mais interrogações.... Porque existem seres tão
medianos?
Medem: amor, solidariedade, atenção, afeto e direitos
A partir: de gênero, cifras, etnias. Criam seus (pre) conceitos.

As possibilidades de mudanças surgiram em asas coloridas.


As negações de outrora, agora são verdades atrevidas.
A História e a resistência dos ancestrais lhe deram guarida
O conhecimento, a faz erguer a cabeça e não se dar por
vencida.

Caminha altiva, cicatrizou as feridas, fez as pazes com a vida.


Desconstruiu seus medos, fez carão para o racismo, ficou
fortalecida.
Jogou fora, correntes e máscaras que a tentaram silenciar.

52
Nunca mais deglutiu seu choro ou se permitiu guardar.

Nunca mais calar, sufocar sua libido, suas vontades.


Nunca mais ser submissa, negar sua competência e habilidades.
Nunca mais ser objeto, aceitar ficar no limiar da mediocridade.
Nunca mais negar sua identidade, mudar paradigmas, é sua
prioridade.

53
Cristiane Lima

CAJAZEIRAS: MÃE
ETERNA!

Ainda que a violência angustie e


machuque teu velho coração
Ainda que sintas a maldade e a dor
das mãos predadoras dos alheios
Ainda que traves batalhas
instantâneas com negociadores do
voto
E que por vezes te tornes indefesa e pequena frente aos ataques
piratas do sistema
És nossa rainha, és a mãe que aconchega pela natureza tão
patente,

Pela força e beleza dos teus filhos aqui presentes


Pelo gostoso bate papo e doces abraços que registram
memórias em tuas praças
Pelas gingas cativantes e gestos insinuantes de teus filhos e
filhas reunidos na quadra

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Adiando os afazeres para sutis prazeres
Em exalar o suor da negra pele
Em envolver com torcidas, dengos e mimos

Cajazeiras: mãe eterna!


Abre tuas estradas, queremos caminhar
Vontade é grande, recurso é pouco
Suficiente mesmo é a alegria que nos dá
Pois és só poesia ao nosso olhar.

55
RESISTÊNCIA

Quero nutrir minha poesia


Com vivências temperadas por tambores de sabedoria

Quero alimentar minha poesia


Em tributo à raiz com vibrantes energias

Quero nutrir minha poesia


De beleza preta destemida e sem alegorias

Quero alimentar minha poesia


Dissolver a conspiração da luta de todo dia

Quero alimentar minha poesia


Em homenagem à flor enraizada
Resistência que me guia.

56
Helena Monteiro

RAÍZES ANCESTRAIS

A vida transcorre...

Nos guetos, becos, vilas, favelas

Expandem os sons dos tambores,


caxixis e atabaques

Gritos ecoaram nas madrugadas

Abrindo frestas, portas e janelas

Ganhando os terreiros, praças e avenidas

Espalhando sementes de alegria

Viagem – miragem – negritude

Pertencimento - Ancestralidade

57
Raízes da África - Africanidade

Desperta o gingado - guerreiro

Atravessando os mares

Sobrevivendo nos Palmares

Adentrando as Universidades

Na trilha do saber, querer, bem- fazer

Meus quitutes, meus livros, meus discos

E tudo mais que caiba nos pensamentos.

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SALVE NEGA

Salve Nêga

Teu sorriso nêga

Protesto e irmandade.

Nêga quer emprego

Trabalhar e ter direitos

Nêga é a raiz da liberdade.

Nêga sonha sonhos

Além do morro, barraco, favela

Nêga também quer felicidade.

Filha de Yabá

Dança livre no terreiro

Samba, sorrisos

- o ano inteiro -

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Nêga luta por fraternidade.

Nêga nos canaviais

Tem o próprio ritual

Invoca romanceiros - cantigas.

Nêga nos cafezais

Sorri, mira o norte

Espanta as mandingas

Pede a Iansã sorte.

60
Isabete Fagundes Almeida

ESPERANÇA
GARCIA

Mulher negra...
Escravizada!
Em pleno século XVIII…
Alfabetizada.
Nada subserviente... Não
se acomodou,
Enfrentava com bravura as agruras do cativo.
Mulher Guerreira!
Que como muitos escravizados,
não aceitava as situações aviltantes à que eram submetidos.
Justiceira, não se calou... Questionou!
Demandou!
E num ato revolucionário fez uma carta denúncia a tantos maus
tratos.
Com essa ação fez uma petição.
Esperança Garcia!
Heroína!

61
Que nas lutas contemporâneas foi reconhecida como a 1ª
mulher advogada.
É exemplo de persistência, garra e resistência,
Por justiça e valorização.

62
CABELEIRAS

Cabelos! Cabelos!
Trancinhas, cacheados
Chapinha.
Rastafári ou Black Power
Aah! Esses cabelos tão “meus”
Minha Coroa!
Que os outros atormenta!
Que causa incomodação.
Tipo assim!
Alto, altíssimo, altão
Crespos, crespinhos, crespão
Chamando a atenção
Empoderando o meu povão.

63
Janaína Nery

MULHER PRETA

Não sou apenas tom de pele


Sou mulher preta
E isso é mais do que o outro
quer que eu seja
Sou resistência, sou história
Herdeira de vidas, trajetórias
coletivas, entrelaçadas
De mulheres guerreiras, mulheres pretas
Nzinga, Candaces, Mjibas
Dandara, Benguela, Mahin
Forças que me inspiram
Forças que renascem em mim
Que me impulsionam à luta
A negar o silêncio, a erguer minha voz
Que me mostram quem fui e quem sou
Mulher preta que ri, que chora, cai e levanta
Com a certeza de quem sabe que existe e resiste
Sem perder em si a confiança

64
Sou mulher preta e seguirei sendo mulher preta
Preta na história, nas buscas
Nos amores, nas dores
Preta na luta.

65
SOZINHA

O amor que você me deu


Me conheceu em profundidade
Me invadiu por inteiro
Corpo, alma e liberdade

Desarmou desconfianças
Desatou nós de amarguras e ressentimentos
De outros amores vãos

Amor preto
Amor meu

Me entreguei, apostei na sua verdade liberta de promessas e


ilusões
Me encaixei em seus abraços, beijos, sussurros...
Corpo, desejo, paixão

De repente tudo se desfez


O que era nunca foi
O amor se perdeu outra vez

66
Toques de carinho, proteção
Verdade, entrega, aceitação
Poesia em dispersão...
Laços desatados, corpos separados
Estou de volta ao vazio, estou de volta à solidão.

67
Jéssica Rodrigues

PROTÓTIPO

Não sou máquina ou


modelo
Sou minha versão e
ousadia
Não sou cópia, nem selo
Sou a que contraria

Não sou verso, ou prosa,


Sou entrelinha e viés
Não sou noite, nem dia
Onde alcançam meus pés
Sou alegria!

Sou negra, mulher, sou raça, cor e segredo


Sou fonte, sou vida, não um brinquedo

Sou nuance imperfeita


Sou grito incontido

68
Beleza, sou preta
Solução e sentido

Sou busca infinita, suspiro de amor


Chegada e partida, meu próprio sabor

Sou exatamente
Aquilo que quiser ser.
Sem mais.

69
MUTANTE

Sou uma, mas por vezes,


Pareço milhares
Quem nunca, não é mesmo?
Transvestida de diversas
Faço tudo e sempre
Ao mesmo tempo,
Incessantemente...
Ufa! Respiro.
Calma! Aviso-me.
Tantas coisas,
Tantos “poréns”
E pormenores...
Amanheço uma,
Adormeço infinitas.
Nua e intensa
Pulsante ou quase gélida
Sou mutante, eu sei.

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Jeovânia P.

RELUZ

preta
reluz na cama
nos lençóis
fica por baixo
na rua
fica de fora
fica junto
só na cama
na rua
fica sozinha
na vida
fica sozinha
na luta
fica sozinha
mas na cama
a preta reluz
uma meia luminosidade
que não a enxerga

71
TUM TUM

cabe dentro do peito


um mundo
que vez por outra
se despedaça
desmorona tudo
fica só a metralha
largada
na cratera
da caixa torácica
e pulsando
lá onde
não se sabe bem
nem como ainda
resiste
um
tum tum
e recomeça
a reconstrução

72
DIVISÃO

Uma metade absoluta


Do eu
Anda repartida

Feito aqueles seres mitológicos de Platão


Amaldiçoados
Divididos

Parte de um lado

E a outra sabe-se lá onde


Só se completam
Quando os extremos
Se tocam

E o mundo ganha um ar novo


Cores
Uma vida reluzente

Contudo
Só quando se encontram

73
Juliana Santos

PALAVRA

Com a palavra crio


Com a palavra destruo
Com a pá lavro
Cuidado
Atos
Sutis que reverberam
De mim
Letras soltas: desafio
Habitar sentimentos em pá larvas
Transformá-las
Em atuação
Então vem
Palavra
Laça, trança mundo-imagem-verbo

74
ORA HORA

Naquela casa a hora é:


refúgio
Ora enjeito
De um jeito Vertical
De interagir
Incidir
Com o Ecossistema-orixás

Hora de ver

Das alturas

Numa horizontal
O que se
Percebe na espiral
Duma casa de axé
E de muita fé

75
Reduzida

Por arranha céus, buzinas,


fumaça e papel

É hora de voar
Buscar
Horizontalizar

76
Mara Farias

MARCA PRETA

Encontrei uma marca preta no


meu corpo,
Desde o meu cabelo até o meu
retinto olho.
Encontrei a marca preta na
expressão das minhas mãos e
também do meu pé.
Encontrei a marca preta no que eu como e também no acarajé.
Depois descobri que a marca preta não está apenas no meu
corpo...
Está no morro, no vento silenciado, na esquina,
Nunca veio morno, está sempre acesa essa marca tingida.

Descobri essa marca ainda infante,


Com olhar fatal,
As marcas fundantes,
Sempre achei normal.
A marca preta em mim

77
Já está carimbada,
Veio forte e armada
A marca preta que não se acaba.

78
A ARMA ANCESTRAL

Armei-me de pau, foice, pedra.


Para ver se cada arma acerta o inimigo acovardado.
Pau da mais sublime árvore, do mais alto espaço
Que transcende a força da ancestralidade.

Foice que corta o pau. Corta-amola-trato.


Para fazer o berimbau. Da resistente mocidade.
Pedra que bate no cordão. Fazendo um bonito som
Para saudar a pouca liberdade.

Armei-me das entranhas, a força.


Que dança-canta-brinca-giros,
Que um dia fora censurado
E que no passado, àgbára dúdú,
Encontravam-se escondidos.
Armei-me da cantiga ancestral
Passada pelas gerações
Esse som espiritual
É o som que arrebenta os grilhões.

79
Patrícia Anunciada

SER NEGRA

É ter uma herança ancestral


Ser descendente do berço da
humanidade
Ser herdeira da opressão,
Da desigualdade, da
bestificação
É resistir diariamente
À estereotipação
Ao preconceito velado
Ao racismo institucionalizado
Ao lugar reservado no porão da sociedade
É ter consciência de sua negritude
Da necessidade de afirmar-se
De romper com os grilhões invisíveis
Da escravidão atual disfarçada
Em falta de oportunidades
Ser negra é negar-se à resignação
É lutar por igualdade, respeito e dignidade

80
É manter-se íntegra e não sucumbir
Ao racismo impregnado na sociedade

81
MULHER PERIFÉRICA

Mulher periférica
Trabalhadora guerreira,
Mãe solteira, estudante, aprendiz
Mulher negra de fibra
Acorda cedo todo dia
Labuta pelo pão
Ora por proteção
Exige o respeito a sua ancestralidade
Preza pela educação de qualidade
Luta por melhores condições de vida
Batalha por suas convicções
Diz não ao genocídio do povo negro
Levanta sua voz contra a corrupção
Age contra o patriarcado
Defende seus ideais
Mulher periférica
Filha de Oxum

82
Patrícia de Paula Aniceto

NOS BRAÇOS DE
ODOYÁ

dentro de mim há um oceano


de saudade
que vive em plena ressaca
revirando memórias e
remorsos
trazendo à costa lamentações
transbordo
desvaneço
náufraga no balanço intermitente das águas
odoyá Iemanjá minha mãe negra
é quem me sustenta em seus seios
eu sobrevivo
renasço
em paz eu me encontro em seus braços

83
MURMÚRIOS

meu corpo indócil carrega a alma deserta


e cicatrizes no peito feito porta entreaberta
latejando as feridas que sangram
quando nelas esfolam o racismo e o assédio
queria carregar o selo de frágil exigindo o cuidado
de quem se atrevesse a violar meu corpo
ou dirigir-me malditas palavras profanas
aceito os insultos o açoite embargo a voz
mas há um passado que em mim ecoa
vozes afetivas e silentes
murmúrios e lamentos
gritos e suspiros
juras e orações
conjurações em confinamentos
sobrevivente resisto
e aceito diariamente os contemporâneos desafios
forjados e mitigados contra o meu
o nosso memorial corpo e suas vivências
seguindo os anseios constantes da nossa liberdade
ainda que vindoura

84
Shirley Pinheiro

SOBRE ELA

Um dia sufocaram seus


sonhos,
interromperam seus voos.
Ela no silêncio de sua
alma
aprendeu a voar em
pensamentos
e, quando chegou o dia.
Alçou um voo tão alto e majestoso
que quem viu disse,
que ela tinha imensos e majestosos par de asas.
Ela finalmente havia superado suas muralhas!

85
ELA E OS NÃOS

Ouviu tantos nãos em suas andanças,


achou com o tempo tão natural, que os buscava.
Pra poder continuar sua caminhada.
criou couraça, se fez armadura,
jamais se deixou ser tomada de amargura.
Hoje os nãos do passado retornaram.
E ela?
Ela rasga na face um largo sorriso,
põe as mãos na cintura e,
num misto de sorriso e riso,
solta uma gostosa e sonora gargalhada.
Balança os quadris ensaiando uma dança cigana e insana.
Não precisa ser amada.
Conheceu o amor verdadeiro,
aquele sincero e por inteiro.
O amor-próprio.
Hoje os nãos são seus!

86
DESCOBERTAS!

Nada mais abala sua vida.


Aprendeu que tudo acontece no tempo certo.
Não sofre por antecipação.
Deixou-se levar pela leveza de sua alma,
compreendeu que ninguém completa ninguém.
Cada um, é um ser único,
em busca de sua realização.
Depois destas descobertas sente que não anda.
Flutua dentro de si!

87
AS AUTORAS

88
Alessandra Sampaio
Nasceu em Feira de Santana/BA, em 19/06/1971. Reside em
Salvador. Graduada em Letras com Inglês pela UEFS –
Universidade Estadual de Feira de Santana, pós–graduada em
Estudos Literários na mesma instituição, professora
universitária de Literatura Infanto-juvenil. Atua como
professora de Língua Portuguesa da Rede Estadual de
Educação da Bahia e da Rede Municipal de Camaçari. É
membro da coordenação da Quartinhas de Aruá, evento
literário que acontece em Salvador.

Ana Paula Campos


Nascida e criada em Natal/RN, hoje com 39 anos. Sou filha de
uma mulher negra e de um homem branco. Ambos apaixonados
um pelo outro e pela leitura. Toda essa paixão passou pra mim.
Fiz pedagogia, apaixonando-me pela contação de histórias. Fui
integrante da equipe do PROLER/RN por muitos anos e com
eles/as aprendi muita coisa. Hoje sou servidora pública do
Município de Natal, feminista negra, ativista pelos direitos
humanos, pesquisadora das culturas africanas pela UFRN e
colunista do Jornal Potiguar Notícias.

89
Anajara Tavares
Natural de Salvador/BA, é graduada em fonoaudiologia pela
Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Uma mulher negra,
combativa e em movimento. Sempre foi amante da arte em
geral, graças ao incentivo de sua mãe, além da influência
resultante de sua presença nos saraus negros de sua cidade.
Acolheu a poesia em [si?]( EM SEU INTÍMO) em 2015,
estimulada por outras poetas negras do seu ciclo de amizades.
Inicia suas publicações em redes sociais na página do Colchas
de Retalhos, em 2016. Anajara publicou na coletânea poética
Outras Carolinas – Mulherio das Letras Bahia (2016), pela
editora Penalux, onde também participou como organizadora,
em Kama – Contos e Poemas Eróticos (2016) pela Cogito
Editora, na coletânea Nas Teias de Eros (2017), pela Darda
editora e na coletânea “poética periférica: novas vozes da
poesia soteropolitana(2018)” Editora Galinha Pulando.
Participa de Mulher Poesia – Antologia poética pela primeira
vez.

Andreia Souza
Andreia Souza 48 anos,,. paulistana de nascença, potiguar de
coração. Mulher preta,., mãe solo de dois filhos: Gabriel &
Aysha. Criou o Grupo Mulheres na Contramão em 2017. É

90
uma produtora cultural, apaixonada por audiovisual e, aspirante
a roteirista. Lançou seu primeiro livro em 2018 “Re Existir,o X
da questão”, tendo como tema a violência contra a mulher, dito
em primeira pessoa, incluindo sua própria história. O ano de
2019 foi o ano da virada. Participou do lançamento da Flipaut
na Praia de Pipa/RN, com uma roda de conversa sobre
Equidade, atuou em três curtas- metragens, formou se na
segunda turma do concorrido curso da Escola Política
RenovaBr, tornou se Embaixadora do Movimento
#vaitermulhersim e foi convidada pelo carioca Bruno Tete para
ser a representante Afroprogressistas do RN. Desistir de
desistir esse é o lema. Sororidade & Dororidade sempre.
Convicta que apesar de tudo não é uma vítima da sociedade
mas sim uma sobrevivente. Dias melhores já..

Cecília Peixoto
Cecília Peixoto da Silva, natural de Salvador/BA, licenciada
em Pedagogia e Matemática, Bacharel em Ciências Contábeis e
Direito. Pós-Graduação em Educação Matemática e Educação
de Jovens e Adultos (EJA), Curso de Extensão em Formação
para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira (UFBA).
Textos publicados em seu Blog no Correio Nagô, Jornal ébano
e nas Redes Sociais do Instituto Hori. Participações na Cogito

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Editora do Mulher Poesia – Antologia Poética v.1; v.2; v.3 e
v.4, pela mesma editora Antologia Poética Internacional, v.II
(2015); v III (2017) e v.IV (2019). Coletânea Artisti e Poeti
(Brasil/Itália) 3ª Edizione –Eclettica World Brasi. Mulher
negra, professora da rede pública estadual, integrante do
Coletivo Angela Davis (FACED/UFBA) e do Núcleo Poesia e
Arte do Movimento das Sete Mulheres e Conselheira do
Instituto Hori – Educação e Cultura.

Cristiane Lima Santos Rocha


Natural de Salvador é historiadora por formação, atuando na
Educação Básica pelo Estado (BA) e pelo Município
(Salvador) no bairro de Cajazeiras. Amadora na escrita poética
reúne alguns escritos que evocam a consciência ancestral
adquirida através da oralidade no período que viveu com sua
avó em Muritiba no Recôncavo Baiano. Participou do
Afluentes Poéticos (2018) com os poemas Arlinda e Cajazeiras
Guerreira. É autora do livro Moderna, mas honrada:
moralidade e honra sexual em Feira de Santana 1940-1960
(2018). Organizadora da coletânea Bahia das mulheres:
histórias, saberes, práticas, olhares (2020).

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Elisa Mattos
Jornalista e escritora, nascida no Rio de Janeiro em 1958 e
criada em Brasília, onde ainda reside. Aposentada desde janeiro
de 2019, trabalhou nos últimos 22 anos como editora de texto
na TV GloboBrasília. Tem Pós-graduação em Jornalismo
Político. Como escritora, tem como foco a poesia, contos e
crônicas. Começou a divulgar seus trabalhos pela internet, em
2011, por meio de um blog pessoal e nas redes sociais. Com
poemas publicados em diversas coletâneas, entre elas, o
primeiro de poesias editado pelo Mulherio das Letras e a
edição internacional Mulherio Pela Paz. Em agosto de 2018
lançou seu primeiro o livro MEU REVERSO, livro autoral,
pelo selo literário brasiliense Maria Cobogó.

Fátima Soares
Mulher, negra, brasileira. Nasci em 19/12/1954 em Recife-PE
Brasil. Trabalho, estudo, leio e escrevo desde a infância. Sou
professora, arte-educadora, escritora, mãe e avó. Atuei em
escolas públicas de 1978 a 2017, em salas de aula e bibliotecas
escolares. Aposentada, criei o LIVRO ABERTO Sebo
Itinerante, e vamos por bairros populares e comunidades rurais
espalhando livros. Publiquei MEMORIAL DA PROFESSORA
FÁTIMA SOARES – Quando Fala uma Operária da educação

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2010; Retalhos de Vida – 2016; Carta para mim, para você e
para outros – 2019. Também poemas, contos e ensaios em
diversas coletâneas. Participo do coletivo Mulherio das L.etras.
Email: fatimarsoares@hotmail.com

Helena Monteiro
Helena Monteiro (Maria Helena S. Lima), Santo Antônio/RN,
D.N. 29/06/1968, Graduada em Letras, Psicóloga, Especialista
em Saúde Pública, Escritora, Poetisa, Documentarista,
Pesquisadora da Cultura Popular e Antologista. FIcou em 4º
lugar no Concurso de Poesia Luís Carlos Guimarães- FJA/RN,
ano de 2002. Sócia - Fundadora da ALAAP – Academia de
Letras e Artes do Agreste Potiguar, Sócia - Efetiva do IHGRN
– Instituto Histórico e Geográfico do RN e fundadora do Grupo
Mulheres Tecendo Artes – Coletivo Feminino das Escritoras e
Poetisas de Santo Antônio/RN.

Isabete Fagundes Almeida


Brasileira de Porto Alegre/RS. Formação superior em
pedagogia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUCRS) e pós graduada em Neuropsicopedagogia.
Cursos de extensão em História e Cultura Afro-Brasileira,
coordenadora do grupo Haja Luz – Acervo Cultural

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Afrodescendente. Promotora em saúde da população negra,
poetisa, participante do Sarau Sopapo Poético – Ponto negro de
Poesia.

Jade Mariam Vaccari


Professora de Filosofia graduada em 2017, defendi a
monografia intitulada A Construção da Identidade de Gênero-
Transexual Errante Corpo Abjeto, graduanda do curso de
Letras com habilitação para Língua Espanhola, Transfeminista,
ativista da Associação de Travestis e Transexuais da Paraíba,
ativista do grupo feminista Fórum de Mulheres em Luta da
UFPB. Tradutora de textos de língua italiana e espanhola.
Fluente nos idiomas Italiano e Espanhol. Estudiosa de textos
com a temática da transexualidade. Tendo como autoras
favoritas nomes da Literatura consagrada como Anne Rice até
a Literatura de Cassandra Rios. Acreditando em um futuro
melhor através da Literatura e da Filosofia, que são
conhecimentos transcendentes que fazem o ser humano refletir
sobre questões existenciais, logo representam duas potências
que se completam.

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Janaína Nery
Me chamo Janaína Nery Viana ou Jana Nery como alguns
preferem. Nasci no Rio, mas fui criada em Saquarema, cidade
do interior do Estado. Sou graduada em Letras, especialista e
mestre em Educação; professora na rede pública de ensino,
pesquisadora, ativista em defesa de uma escola democrática e
antirracista. Milito também no movimento negro e movimento
de mulheres negras. Tenho paixão pela arte, pela literatura e
todas as suas possibilidades de manifestar livremente
pensamentos, sentimentos, sonhos, esperança... Escrever para
mim tem sido assim, um jeito próprio de me manifestar, de me
inquietar e de, também, me pôr no lugar.

Jeovânia P.
Poeta; bacharel, licenciada e mestre em Filosofia pela UFPB,
especialista em Educação pela UEPB, licenciatura em Letras
pela UFPB Virtual, atualmente faz uma especialização em
Educação Financeira e é aluna especial do doutorado em Letras
da UFPB; é professora de Filosofia. Obras lançadas: Palavras
Poéticas, pela editora Ixtlan, São Paulo, em 2016. Em 2019
foram lançou quatro obras, três individuais e uma coletânea
que organizou, a saber são elas: Poeticamente Entre Versos &
Bocas, pela editora Ixtlan; A-M-O-R, pela Sangre Editorial;

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Quem abriu a boca da pedra?, pela editora popular Venas
Abiertas; e a coletânea de poesias e contos O Livro das Marias,
pela editora Ixtlan.Ainda em 2019 teve seu livro
Re[s][x]istência selecionado no edital de obras poéticas da
UFPB, e espera pela publicação, prevista para março de 2020,
pela editora da UFPB. Contato: @jeovaniapinheiro
(Instagram).

Jéssica Rodrigues Romualdo


Mulher negra, de mãe branca. Embora não tenha sofrido
preconceito racial direto, sempre teve que lidar com olhares
velados por ser quem é. Professora, pedagoga, mãe. Autora
desde sempre, começou a publicar em 2019 em diversas
coletâneas e seu livro solo é o “A vez e a voz da palavra”. O
título faz parte de uma coleção do Mulherio das Letras, pela
editora Venas Abiertas.

Juliana Santos
Mulher preta, mãe, cria do solo fértil da zona sul, da periferia
de São Paulo, arte-educa-dora, versadeira das palavras e do
corpo em movimento, percussionista do bloco afro É Di Santo.

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Mara Farias
Tem 28 anos, nascida em Natal/RN. Moradora do bairro Felipe
Camarão, periferia da capital. Constrói o movimento Levante
Popular da Juventude desde 2012, escreve desde a infância e
tem como inspiração o lugar onde vive.

Mirian Cristina dos Santos


Mulher-negra-periférica, feminista negra, fazendo da escrita
lugar de cura. É professora, mestra e doutora em Letras, e
também especialista em Políticas de Promoção da Igualdade
Racial. Autora do livro Intelectuais Negras: Prosa Negro-
brasileira contemporânea, lançado pela editora Malê, em 2018,
onde reflete sobre o papel da mulher negra na luta por
transformações sociais, a partir de análises crítico-literárias de
narrativas das intelectuais Miriam Alves, Conceição Evaristo e
Cristiane Sobral.

Patricia Anunciada
Formada em Letras pela PUC-SP e mestranda em Literatura
pela Unifesp. Atua como professora da rede municipal de São
Paulo. Possui um canal chamado “Letras Pretas”, no qual
divulga obras que se adéquem à lei 10.639, que torna
obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-

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brasileira. Participou da antologia “O Feminino na Poesia:
Antologia Poética de Professoras Poetas”. Colabora com as
Blogueiras Negras e é pesquisadora de literatura negro
brasileira.

Patrícia de Paula Aniceto


Nascida em Santos Dumont (MG). É mestre em Literatura
Brasileira e doutoranda em Estudos Literários na Universidade
Federal de Juiz de Fora. Publicou em várias Antologias
poéticas e possui um vasto elenco de publicações acadêmicas
.
Sheila Martins
Nascida e criada na Baixada Fluminense, atualmente ouça se
desbravar pela Zona Oeste do Rio de janeiro. Além de atuar
como livreira na Livraria Nombeko, trabalha como intérprete
de LIBRAS no Instituto Nacional de Educação de Surdos,
pedagoga, pesquisadora de Literatura negro-brasileira bem
como sua difusão na comunidade Surda e co-autora de
“Vértice: escritas negras” (Ed. Malê, 2019).

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Shirley Pinheiro
Curitibana, escreve desde sua infância. Formada em Estudos
Sociais, Pós-graduada pela PUC, participou das antologias
folhetim dos poetas malditos (2015). Conexão III (2017) e
Parnaso Poético (2018). Lançou seu primeiro livro "Mercuria"
pelo Coletivo Marianas, em 2018. Conexão IV, em 2018.
Conexões Atlânticas III Brasil/Portugal. Antologia
Comemorativa Dia Internacional da Mulher, Mulherio das
Letras Lisboa, Parnaso III, Conexão V e Antologia das
Marianas, em 2019.

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