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Preconceito familiar: um determinante da depressão na comunidade

LGBT em Uberlândia-MG.

Family Predjudice: a determinant of depression in the LGBT community in


Uberlândia-MG.

Autores: PEREIRA, Alan Alves, alanpereirapsi@gmail.com [1], SILVA, Gilvia Aparecida de


Araújo gilviaaparecida@yahoo.com.br [1], BOTELHO, Luíza de Souza, lzsbotelho@gmail.com[1],
MACEDO, Sonia Beatriz Motta, sonia-macedo@hotmail.com [2].

RESUMO

Nos últimos anos os índices de depressão na população brasileira têm subido


expressivamente, porém, são os indivíduos da comunidade LGBT que ganham
espaço aqui para a seguinte discussão: Essa população se sobressai nesse
importante índice? O estudo em questão investigou o nível de depressão das
pessoas da comunidade LGBT em relação à rejeição familiar na cidade de
Uberlândia – Minas Gerais e respondeu a seguinte questão: A rejeição familiar
causa no indivíduo da comunidade LGBT de Uberlândia, sofrimento intenso,
levando consequentemente a depressão? A amostra de 31 participantes da
comunidade LGBT de Uberlândia, sendo 74,2% do gênero feminino, 12,9% do
gênero masculino, com idade média 26,9 anos. Da amostra, 51,6% se
denominaram lésbicas, 22,6% gays, 19,4% bissexuais, 3,2% pansexual e 3,2%
transexual. Para esse estudo foi utilizado como instrumento um questionário
sociodemográfico e a Escala Beck de Depressão - BDI (Cunha, 2001). Obteve-
se como resultado que os indivíduos investigados sofreram ou ainda sofrem
preconceito familiar, preconceito em ambientes públicos e no trabalho.
Entretanto, esses indivíduos não têm depressão de modo severo. Assim,
conclui-se que mesmo com o preconceito sofrido, boa parte dos entrevistados
consegue em algum momento de sua vida encontrar uma saída e/ou solução
na forma de encarar esse preconceito.

Palavras-chave: Comunidade LGBT, preconceito familiar, depressão.

ABSTRACT

In the last few years, depression in the Brazilian population has increased
significantly. But the ones who have space here for the following discution are
the individuals in the LGBT community. Does this population stand out in this
important index? The present study aimed to investigate the level of depression
of people in the LGBT community related to the family rejection in the city of
Uberlândia-Minas Gerais. It answered the following question: Does the family

1
Graduandos em Psicologia pelo Centro Universitário do Triângulo - UNITRI.
2
Mestra em Avaliação Psicológica pela Universidade de São Francisco - USF, professora do curso de
Psicologia no Centro Universitário do Triângulo - UNITRI.
rejection in the LGBT individual from Uberlândia cause intense suffering leading
to depression? The sample is consisted on 31 participants from the LGBT
community of Uberlândia-MG. For this study were used as instruments; a
sociodemographic questionaire and the Beck Depression Inventory - BDI
(Cunha, 2001). As a result, the investigated individuals suffered or still suffer
from family prejudice, prejudice in public places and at work. However, these
individuals do not have severe depression. Therefore, even with the prejudice
suffered, a good part of the interviewees are able to find an exit and/or a
solution on facing this prejudice.

Key words: LGBT community, family prejudice, depression.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos o índice de depressão na população brasileira tem


subido expressivamente, porém, são os indivíduos da comunidade LGBT que
ganham espaço aqui para a seguinte discussão: Por que essa população se
sobressai nesse importante índice? A organização atual da família é
socialmente influenciadora para que estes dados aumentem? Os indivíduos da
comunidade LGBT propendem a estar em sofrimento devido ao preconceito
que se passa no interior do grupo familiar. Como afirmam as pesquisas, a
necessidade de cuidado desse indivíduo faz-se necessária de acordo com o
grande número de rejeição familiar que eles sofrem.

Essa rejeição é causada muitas vezes pela forma de organização


dessas famílias, pela educação intrínseca dos integrantes, do conflito entre
tendências, o tratamento hierárquico e a rigidez de pensamento. De acordo
com Costa (1994) nestes últimos dez anos, porém, a homossexualidade
passou a ser um tema falado, ouvido e debatido por todos. O estudo em
questão objetiva investigar o nível de depressão das pessoas da comunidade
LGBT em relação a rejeição familiar na cidade de Uberlândia – Minas Gerais e
responder a seguinte questão: A rejeição familiar causa no indivíduo LGBT de
Uberlândia, sofrimento intenso, levando consequentemente a depressão? É
nosso objetivo específico: Investigar o preconceito familiar perante o quadro de
depressão dos sujeitos avaliados.

Esta pesquisa possibilitou investigar o estado psicológico do indivíduo


LGBT em condição familiar a fim de fundamentar propostas de intervenções
psicoterapêuticas que proporcionarão melhor qualidade na vida social, física e
mental desses sujeitos. Para os pesquisadores, a realização da pesquisa
propiciará a ampliação dos conhecimentos sobre as consequências que o nível
de rejeição familiar acarreta no indivíduo, o desenvolvimento do espírito
investigativo e a aprendizagem das etapas que compõem uma investigação
científica. Essa é uma pesquisa estatística descritiva com dados obtidos a partir
de questionário e aplicação de escalas psicológicas com correlação dos dados
obtidos a partir do teste de correlação de Spearman.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A comunidade LGBT

Foi apenas em 1990 que a OMS alterou a sua classificação de doença


mental para a homossexualidade. Jesus (2012) elucida que LGBT é o
acrônimo de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Ainda para
Jesus (2012) a população inclusa na comunidade LGBT é, historicamente,
estigmatizada, perseguida e marginalizada, por isso no Brasil, o espaço
reservado para a comunidade LGBT é de segregação. Uma parcela dessas
pessoas reconhece sua condição individual desde pequenas, outras
tardiamente.

Rodrigues, Assmar e Jablonski (2015) definem preconceito sendo uma


atitude hostil ou negativa em relação a um determinado grupo, não levando
necessariamente, pois, a atos hostis ou comportamentos discriminatórios. A
comunidade LGBT sofre também com a hostilidade e abandono de pessoas do
seu círculo de convívio e da própria família. Essa população não possui uma
legislação específica que a proteja e criminalize a homofobia. Para a pessoa
LGBT é imprescindível viver integralmente, exteriormente, sem julgamentos,
como ela é.

Jesus (2012) esclarece que a definição de sexo decorre da categoria


biológica. Gênero é social, construído de acordo com as diferentes culturas. O
gênero vai além do sexo, sua definição não depende do sistema genital em que
nasce o indivíduo, mas do seu discernimento particular. Orientação sexual é a
forma de se relacionar afetivo-sexualmente com alguém que pertence a algum
gênero, é a vivência interna relativa a sexualidade. Gênero e Orientação sexual
são duas definições que fazem partes de categorias distintas e não dependem
uma da outra.

A família

O fato de as pessoas tornarem públicos e externos seus


comportamentos que afirmam orientação afetivo-sexual diferente da
heterossexual, tem causado discordância nas formas de pensar e agir nos mais
diversos segmentos da sociedade, tal como o ambiente intrafamiliar. A família
tem espaço histórico e simbólico na divisão do trabalho, das capacidades. É na
interação constante familiar que se elabora os valores e os objetivos pessoais
dos homens e mulheres com relação a seu contexto social.

Para Gomes, Silva e Pessini (2011) a família enquanto


instituição corresponde a essa estruturação social, afetiva e econômica do
sujeito, quando é a partir dela que o mesmo se constrói nas relações. A família
será a primeira instância que lhe transmitirá valores e ensinamentos sobre
questões de papéis, formação enquanto pessoa, moralidade e conceitos de
mundo. Por isso, o papel da família deve ser de compreensão, para que a
decisão de se viver integralmente, não se torne um momento de forte e
exposição e intensa fragilidade.

Resende (2016) afirma que as pessoas LGBT na tentativa de melhorar


a sua própria aceitação de condição homossexual, se deparam exatamente
com o posicionamento conservador e inflexível de sua família, atitudes
negativas e discriminatórias, reproduzindo os mesmos modelos hierárquicos e
opressores vividos ou ensinados para eles, levando a ruptura do laço afetivo
temporário ou permanente e até expulsão da casa dos responsáveis.

Indivíduos pertencentes a comunidade LGBT afirmam já terem


enfrentado tentativas de controle por parte dos pais, em relação a suas formas
de expressão e verbalização. Sendo o gênero social, a instituição familiar e seu
formato social a melhor forma de afirmá-lo e assim, difundi-lo. Esses indivíduos
também devem poder sustentar-se psicologicamente com ajuda da sua família,
para ter dignidade em um mundo preconceituoso, e que em muitas vezes,
exclui essas pessoas, ignorando-os como seres humanos.

Depressão

A palavra depressão expressa sentido sobre um estado afetivo normal,


um sintoma, uma síndrome e uma ou várias doenças. Os sentimentos de
alegria e tristeza permeiam a vida psíquica normal das pessoas. A tristeza é
causada de acordo com as adversidades e a resiliência - fenômeno relacionado
com a resistência ao estresse - é utilizada para superação dessas situações.

O DSM-IV (1995) e a CID 10 (1993) descrevem os sintomas


da depressão tais como: humor deprimido, alterações do sono, alterações do
apetite, agitação ou retardo psicomotor, fadiga, culpa excessiva, pensamentos
de morte, ideação suicida, tentativa de suicídio, etc. A tristeza é tratada como
sinônimo da depressão, algo que se aproxima a ela. Muitas pessoas que estão
em estado de tristeza e angústia se declaram ou são consideradas como
depressivas. E, devido ao preconceito por parte da sociedade e vergonha que
ele causa, muitas dessas pessoas se afastam de ambientes do convívio
pessoal. O preconceito contra o depressivo é causado devido a crença de que
as pessoas não podem sofrer, não tem o direito de chorar ou de ficarem tristes.
Além disso, hoje é possível perceber os altos valores dedicados a
investimentos em drogas antidepressivas, assim como seu elevado consumo.

A tristeza é tratada como sinônimo da depressão, algo que se aproxima


a ela. Muitas pessoas que estão em estado de tristeza e angústia se declaram
ou são consideradas como depressivas. E, devido ao preconceito por parte da
sociedade e vergonha que ele causa, muitas dessas pessoas se afastam de
ambientes do convívio pessoal. O preconceito contra o depressivo é causado
devido a crença de que as pessoas não podem sofrer, não tem o direito de
chorar ou de ficarem tristes. Além disso, hoje é possível perceber os altos
valores dedicados a investimentos em drogas antidepressivas, assim como seu
elevado consumo.

Associando a depressão com a composição familiar, Yunes (2003)


afirma que no geral, os estudos sobre família enfatizam os aspectos
deficitários e negativos da convivência familiar. Fairchild e Hayward (1996)
ainda apontam que as expectativas geradas pelos pais, relacionadas a
casamento e netos, e os sentimentos de culpa, são fatores importantes.

As adversidades diante a vida, situações controvérsias ao esperado,


respostas a perdas, derrotas, desapontamentos acabam criando o sentimento
de tristeza, que é a forma humana universal de responder de acordo com as
contingências. Essa forma singular de adaptação pode produzir a depressão,
gerando retraimento na intenção de poupar energia e recursos para o futuro.
Porém, constitui-se em sinal de alerta para quem convive com esses indivíduos,
de que essas pessoas estejam precisando de companhia e ajuda.

Segundo Porto (1999) enquanto sintoma, a depressão pode surgir nos


mais variados quadros clínicos, entre os quais o transtorno de estresse pós-
traumático. Pode ainda ocorrer como resposta a situações estressantes, ou a
circunstâncias sociais e econômicas adversas. Enquanto síndrome, a
depressão inclui não apenas alterações do humor (tristeza, irritabilidade, falta
da capacidade de sentir prazer, apatia), mas também uma gama de outros
aspectos, incluindo alterações cognitivas, psicomotoras e vegetativas (sono,
apetite).

MÉTODO
O método estabelecido no presente estudo é quantitativo e descritivo
em concordância com Berelson (Ancora, 2001) que define metodologia
quantitativa como descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo
manifesto da comunicação. Foram utilizadas como fontes primárias as
informações colhidas em campo; as fontes secundárias subsidiarão o estudo
por meio de revisão bibliográfica, com a identificação de referências teóricas
que venham de encontro ao tema.

Participaram da pesquisa 31 sujeitos constituintes da comunidade


LGBT, incluindo a universalidade dos gêneros e orientação afetivo-sexual, de
diferentes idades, mas que apresentem no mínimo 18 anos, que estejam
inclusos em uma organização familiar sob as diversas formas e que se
disponham por livre e espontânea vontade em participar da pesquisa,
consentindo através da assinatura do TCLE. Esta pesquisa foi realizada em
uma cidade do interior de Minas Gerais chamada Uberlândia.

Dada a impossibilidade do universo de pesquisa ser estimado na


cidade de Uberlândia, o estudo em questão foi realizado por amostra
probabilística por conveniência, composta por 31 participantes, seguindo assim
as orientações de Barbetta (2002). A escolha dos participantes foi dada pela
indicação de pessoas conhecidas, isto é, o público participante é fruto de uma
busca que seguiu a acessibilidade dos contatos partindo de informações
fornecidas aos pesquisadores em seus próprios círculos de convivência e por
fontes próximas.

Em função do número de amostras e da insuficiência de dados devido


a inexistência de cadastros em ONG’s e grupos da comunidade LGBT de
Uberlândia, os participantes foram recrutados em diferentes espaços físicos, e
também a partir de indicações de pessoas conhecidas dos pesquisadores e
fontes conhecedoras da comunidade LGBT. A critério de apresentação formal
da proposta da pesquisa, o primeiro contato realizado com os participantes foi
de modo indireto, através de contato telefônico, e-mail e redes sociais.

No primeiro momento os participantes realizaram o questionário


sociodemográfico elaborado pelos pesquisadores. No segundo momento foi
aplicado o teste BDI das Escalas Beck (Cunha,2001), corrigido de acordo com
as instruções do manual. As respostas dos participantes foram codificadas
numa planilha do programa estatístico Systat (versão 10.2), segundo as
categorias especificadas nos instrumentos de pesquisa, para obtenção de
médias, desvios padrões e amplitudes para as variáveis numéricas, e de
frequências percentuais para as variáveis categóricas (SYSTAT, 2002). O teste
de correlação de Spearman foi realizado para verificar se existe relação entre
as pontuações obtidas nas no Questionário BDI com a idade dos participantes
da pesquisa (ZAR, 1984).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram entrevistados 31 participantes, sendo que 23 participantes se


consideram do gênero feminino (74,2%), e 8 do gênero masculino (12,9%).
Idade média de 26,9 anos, desvio padrão é de 8,1 e a variância é de 18,52.
Dos 31 participantes, 16 se denominaram lésbicas (51,6%), 7 se denominaram
gays (22,6%), 6 se denominaram bissexuais (19,4%), 1 se denominou
pansexual (3,2), 1 se denominou transexual (3,2). Desses 31 participantes 17
exercem atividade remunerada (54,8%), e 14 não exercem atividade
remunerada (45,2%).

O gênero vai além do sexo, sua definição não depende do sistema


genital em que nasce o indivíduo, mas do seu discernimento particular, a forma
como se enxerga e se expressa socialmente, sua autopercepção. Em suma, o
que define as pessoas LGBT é a forma como elas se identificam e sua
singularidade. Além disso, para Jesus (2012) a sociedade em que vivemos
dissemina a crença de que os órgãos genitais definem se uma pessoa é
homem ou mulher. Porém, a construção da nossa identificação como homens
ou como mulheres não é um fato biológico, é social.

Perguntados sobre quando perceberam sua orientação sexual os


entrevistados alegaram que se sentiram confusos ou perdidos (21,7%), com
medo (19,5%), estranhos (6,5%), tensos (3,2%), tristes (3,2%), preocupados
(3,2%), presos (3,2%), com dúvidas (3,2%) ou culpados (9,7%) por causa da
religião ou porque achavam que era errado. Entretanto houve também
entrevistados que se sentiram curiosos, normais, tranquilos (6,5%). Um
entrevistado alegou que se sentiu “conturbado depois aliviado” e outros
afirmaram: “ignorei até os 26 anos”, “Apanhei muito e fui tirado da cidade” ou
“não entendi o que sentia”.

Questionados sobre como lidam com sua orientação sexual no


cotidiano, os entrevistados responderam que se sentem tranquilos e normais,
agindo de forma natural, sem disfarçar (51,6%) ou de forma reservada (48,4%).
Apenas um entrevistado afirmou que somente manifesta sua orientação sexual
em determinados ambientes.
Foi observado que a puberdade, fase de transição da infância para a
adolescência é importante para os sujeitos que se definem LGBT.
Primeiramente eles tem o desafio de reconhecer, aceitar e compreender a
condição que está incluso, fazer decisões pessoais sobre se e quando irão se
apresentar da forma como se identificam as pessoas do seu convívio, e de
acordo com os entrevistados, na adolescência, período de descoberta sexual
que a maioria se constitui e se define LGBT. Jesus (2012) relata que ao
contrário da crença comum hoje em dia, adotada por algumas vertentes
científicas, entende-se que a vivência de um gênero (social, cultural)
discordante com o que se esperaria de alguém de um determinado sexo
(biológico) é uma questão de identidade, e não um transtorno.

As famílias da maioria dos entrevistados têm conhecimento de sua


orientação sexual (96,8%), mas em alguns casos somente alguns de seus
membros (pai, mãe ou pessoas mais próximas). Apenas um entrevistado (3,2%)
afirmou que sua família não tem conhecimento deste fato. Outro entrevistado
afirmou: “meu pai finge que não sabe”.

Segundo os entrevistados, ao saberem da sua orientação sexual, seus


pais reagiram com: surpresa (6,5%), choque (22,6%), susto e desconforto
(9,7%), violência (3,2%), frustração (3,2%) e confusão (6,5%) tensão (3,2%) e
recusa (6,5%). Alguns afirmaram: “minha mãe chorou por três dias e não
conversou comigo”, “fui encaminhado para o psicólogo”, “fui expulso de casa
por meu pai, que considerou minha escolha um pecado”, “fui questionado se
estava usando drogas”. Um entrevistado afirmou que não teve o apoio dos pais
e outro disse que não falou sobre este assunto com seus pais. Entretanto, em
dois casos (6,5%), os pais receberam a informação com naturalidade ou
afirmaram que já sabiam da orientação sexual de seu filho (a).

Goffman (2004) sugere que um atributo que estigmatiza alguém pode


confirmar a normalidade de outrem, portanto ele não é, em si mesmo, nem
horroroso nem desonroso. É frequentemente visível a quantidade de violências
homofóbicas que vivem esses indivíduos, geradas a partir de conceitos e
influências socioculturais internalizadas no processo de desenvolvimento de
todas as pessoas. Essa violência está, sem dúvida, vinculada nas crenças,
atitudes e valores transmitidos pelo eixo familiar, causando sentimentos como
medo, tristeza e rejeição. Os sujeitos que se definem LGBT primeiramente tem
o desafio de reconhecer, aceitar e compreender a condição que está incluso,
fazer decisões pessoais sobre se e quando irão se apresentar da forma como
se identificam as pessoas do seu convívio.

Questionados sobre o preconceito familiar, 96,8% dos entrevistados já


sofreram preconceito de seus familiares. Foram investigados os sentimentos
que foram elucidados no momento do preconceito sofrido. Sabe-se que 35,5%
dos entrevistados se sentiram tristes, 25,8% se sentiram humilhados e 22,6%
se sentiram rejeitados. Ao analisarmos os sentimentos que os sujeitos
demonstraram e elucidaram na pesquisa, mesmo que não seja algo positivo
para essa situação, por ser algo “diferente”, por parte dos familiares existe uma
expectativa de que seu filho ou filha vá cumprir com as normalidades impostas
pela sociedade quando se diz orientação e gênero. O gênero e a sexualidade
são construções históricas e sociopolíticas sendo noções instrumentalizadas
em nossa sociedade para se apresentarem enquanto um dado natural, rígido e
imutável. (ARAGUSUKU; LOPES 2016 apud FOUCAULT, 1988; SCOTT, 1986;
WEEKS, 2002).

Totalizam (51,6%) os indivíduos que não sofreram agressões de algum


tipo devido a sua orientação sexual ou identidade de gênero. Porem totalizam
(48,4%) os entrevistados que já sofreram agressão de algum tipo. (19,4%) dos
entrevistados sofreram agressões físicas e (29%) sofreram agressões verbais.
(41,9%) dos entrevistados já sofreram coação pública devido a sua orientação
e (58,1%) disseram nunca ter sofrido coação pública.

O indivíduo LGBT vive em meio a hostilidades e preconceitos velados e


explícitos, violências caracterizadas com ódio e depreciação, exclusivamente
por sua orientação afetivo-sexual. Essa população não possui uma legislação
específica que a proteja e criminalize a homofobia. Pocahy e Nardi (2007)
revelam que a homofobia indica o ódio e a aversão aos homossexuais e a
todas as outras manifestações da sexualidade não hegemônicas. A diversidade
sexual sofre com a violência, o preconceito e a discriminação frequentemente
em nosso país.

Um dos questionamentos feitos aos entrevistados é se eles sentiam-se


pertencentes à comunidade LGBT e a maioria dos entrevistados não
respondeu este questionamento (45,2%) ou emitiu uma resposta indevida
(29,0%). Um entrevistado (3,2%) afirmou que não liga para a comunidade
LGBT. Dentre as respostas dadas estão; “meio que luta por igualdade,
reconhecimento e respeito”, “movimento visto com preconceito”, “liberdade”, e
“movimento importante”.
Foi demonstrado que 18 (58,1%) sujeitos se sentem pertencentes à
comunidade LGBT, enquanto 10 (32,2%) não se sentem pertencentes. Vale
ressaltar que mesmo os que responderam que pertence a comunidade, quando
questionados sobre a importância e papel dessa comunidade as respostas são
distintas e não correspondem com o real significado e propósito.

Para Facchini (2005) afirmar LGBT como sujeitos de direitos implica


um crescimento da importância das relações movimento e Estado, bem como
com o movimento LGBT e os movimentos por direitos humanos em nível
internacional. Isso ocorre não apenas pelo apoio financeiro que o Estado ou as
organizações internacionais passam a oferecer às organizações ativistas, mas
especialmente pela abertura de canais de interlocução política com os
governos e com atores internacionais.

Para Jesus (2012) esse sentimento existe, pois, a maioria das vezes,
os discursos expressam confusões sobre as práticas e expressões de gêneros,
mostrando como essas posições indicam a vulnerabilidade da população LGBT,
grupo alvo de inúmeras violações de direitos humanos. Embora nem toda
categorização explicite o viés estigmatizado, ao demarcar grupos exclusivos –
homens, mulheres, homossexuais, heterossexuais, etc. – tendemos a reforçar
um conjunto de características ressaltando a lógica do afastamento e
diminuindo a possibilidade de integração e compreensão das relações entre
grupos.

A pontuação média dos entrevistados no teste BDI, que afere os níveis


de depressão, foi igual a 14,8 (desvio padrão = 9,8) variando de 1 a 34 (n = 31),
Este valor equivale a 23,5% da pontuação máxima total aferida pelo
instrumento. A maior parte dos entrevistados (41,9%) apresentou nível mínimo
de depressão, mas houve também entrevistados com níveis leves (22,9%) ou
moderados (22,9%). Apenas quatro participantes desta pesquisa (12,9%) foram
diagnosticados com depressão severa, segundo o teste BDI.

O protocolo BDI tem o propósito de mensuração da intensidade da


depressão, e oferece importantes subsídios do ponto de vista clínico, não só
pelo nível em que recai o escore total, mas em relação ao conteúdo específico
da configuração assumida pelos itens assinalados, que revela o padrão
sintomático que o examinando descreve (CUNHA, 2001).

Ainda pra Cunha (2001), obtém-se o escore total do BDI somando os


escores de cada item, correspondentes às alternativas assinaladas pelos
examinandos nos 21 itens. Cada grupo apresenta quatro alternativas, que
podem ter escore 0, 1, 2 ou 3. Sendo o maior escore possível 63, porque, no
caso de o examinando ter marcado mais de uma opção, se usa a afirmação
com a avaliação mais alta para calcular o escore total.

Na classificação dos níveis de depressão entende-se como nível


mínimo o indivíduo que não apresenta nenhuma anormalidade frequente no
seu bem estar nas últimas semanas da realização do protocolo. O sujeito que
se enquadra no nível leve, demonstra pouca gravidade em relação à depressão
e devido a algum fato recente de desacordo com alguma pessoa de seu ciclo,
tenha mudado a percepção em relação a si próprio, ou em relação aos outros.

Pode considerar no nível moderado aquele indivíduo que devido a


algum fato acontecido na atualidade, tenha elucidado fatos do passado que
têm semelhança ao fato atual, e isso tem causado certo desconforto. O sujeito
que se classifica no nível severo, é necessária maior atenção, pois em alguns
aspectos pode não mais enxergar sentido em sua vida, e consequentemente
buscar alternativas mais graves para a solução dos seus problemas, como um
isolamento repentino, ideias suicidas, e em alguns casos o próprio suicídio.

No protocolo, deve-se dar uma atenção especial à avaliação feita no


item 2, o item do pessimismo, e no item 9, de ideias suicidas, dada sua
relevância para estimar a existência de potencial suicida, especialmente em
pacientes depressivos (CUNHA, 2001). Nos resultados estão evidenciados que
na amostra de 31 participantes, poucos são os sujeitos que se enquadraram no
nível severo de depressão (12,9%). Foram também baixos os valores médios
referentes às pontuações dadas pelos entrevistados nas seguintes afirmações,
cuja pontuação máxima equivale a 3,0: (i) não estou especialmente
desanimado quanto ao futuro (0,35; desvio padrão = 0,55; variando de 0 a 2; n
= 31), (ii) não tenho quaisquer ideias de me matar (0,26; desvio padrão = 0,45;
variando de 0 a 1; n = 31).

Na tabela acima está descrito a tentativa de correlacionar as


informações da entrevista sociodemográfica às respostas obtidas no protocolo
BDI e não evidenciou relações significativas entre as pontuações no
Questionário BDI com a idade (rs = -0,343; p > 0,05). As pessoas da
comunidade LGBT mesmo sofrendo preconceito do ambiente familiar, esse
preconceito não têm interferência no fator social dos indivíduos da pesquisa
para causar depressão, independente de idade e ou situação social. Ainda que
esse preconceito familiar seja um fato, as consequências para quem é alvo,
não demonstram níveis de depressão que sejam preocupantes em escalas de
saúde para os indivíduos. Encontra-se em alguns casos pessoas entristecidas
com as situações que ocorrem no seio familiar, porém esse nível de tristeza
não se caracteriza como depressão.

Para Schulman (2009), o impacto do preconceito familiar irá variar de


acordo com outros tipos de sistemas de apoio que a vítima consiga acessar,
com o quão comprometida é a sua família no reforço da homofobia e com os
tipos de intervenção realizados por terceiros. Caso a vítima tenha uma rede de
apoio consistente e confiável e caso outros indivíduos na família ou na
comunidade intervenham ativamente na denúncia, portanto, na mitigação do
impacto da crueldade, a homofobia familiar pode ser um obstáculo
desnecessário, mas superável.

O apoio de grupos sociais para o enfrentamento desse preconceito é


muito importante. Entende-se que caso não se encontre acolhimento dentro da
família, encontrará esse apoio em grupos sociais para uma identificação e
reconhecimento. Mesmo que a sociedade não seja o meio mais adequado
devido a seu instinto de exclusão, é possível encontrar semelhantes que
promovam esse acolhimento.
Usualmente, a família é o refúgio das crueldades da cultura. Se a
família é a fonte da crueldade, a sociedade mais ampla é o refúgio da família.
No entanto, quando a família e a sociedade mais ampla põem em ação
estruturas idênticas de exclusão e inferiorização, o indivíduo não tem lugar para
onde escapar, especialmente quando as instituições de representação também
não permitem que a experiência e sentimentos subsequentes sejam expressos
(SHULMAN, 2009).

Portando, o teste de correlação de Spearman (ZAR, 1984) não


evidenciou relações significativas entre as pontuações no Questionário BDI
com a idade (rs = -0,343; p > 0,05). Dessa forma, entende-se que não ha
correlação, visto que “p” é maior que 0,05.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante a pesquisa podemos perceber que o campo de investigação


sobre a comunidade LGBT é muito amplo. Dessa forma no processo
investigativo descobrimos várias nuances das relações familiares e sociais que
os indivíduos LGBT estão inseridos usando-as como suporte para a superação
pessoal e assim encontrando novas formas de se relacionar.

Toda mudança em favor da justiça e da igualdade começa quando


entendemos melhor quem são as outras pessoas, o que elas vivem, superando
nossos mitos, medos e enxergando mais de perto suas trajetórias. Sem
respeito à identidade de cada indivíduo, não garantimos o direito das pessoas e,
silenciosamente, calamos sonhos, esperanças e aumentamos os desafios que
as pessoas têm de enfrentar na vida.

Cada ser humano tem múltiplas formas de vivenciar sua identidade, e


isso não muda para as pessoas LGBT: não são todas iguais e sua
subjetividade não se restringe ao fato de pertencer à comunidade. Assim sendo,
o interesse por esse estudo surgiu durante a nossa percepção de situações de
discriminação e preconceito dirigidas a pessoas da comunidade LGBT do
nosso convívio, e até conosco.
Um dado interessante que foi levantado é que a família promove o
preconceito, porém boa parte dos entrevistados da amostra não sofre rejeição
por parte dessa família e também não têm depressão. Como a hipótese era
investigar o estado psicológico desses indivíduos, entende-se que, como
proposta para o entendimento da questão que não há rejeição e nem
depressão, mas há preconceito, um trabalho como psicoterapia com a família
desses indivíduos seria essencial para entender como se dá a formação desse
pensamento e suas interpretações promovendo melhores relacionamentos
entre essa família e melhorando o acolhimento e suporte por parte do indivíduo
LGBT para enfrentar os desafios da vida social.

A pesquisa evidenciou que o preconceito familiar existe, porém, não


podemos dizer que a depressão que esses indivíduos têm, é causada
exclusivamente pelo preconceito familiar. Apenas uma porcentagem da
amostra (12,9%) demonstrou ter nível severo de depressão conforme
instrumento utilizado, e além do preconceito familiar, esses indivíduos foram
alvos de preconceito em outras esferas sociais, por isso essa porcentagem não
foi significativa na totalidade da amostra para afirmarmos que o preconceito
familiar seja causador de depressão.

E, apesar do nosso objetivo ter sido refutado na presente pesquisa, é


inadmissível que se negue a existência do preconceito e o sofrimento que ele
acarreta. Por isso, temos a expectativa de que esta pesquisa auxilie em uma
melhor compreensão das diferentes dimensões da identidade de gênero e a
sexualidade humana, e com isso, promova: o incentivo a produção de novos
materiais, fundamentados em conceitos científicos atualizados e em diálogo
com a realidade das pessoas; e o respeito aos direitos humanos, eliminação
das homofobias e demais formas de discriminação e violência contra lésbicas,
gays, bissexuais, travestis, transexuais e demais indivíduos LGBT, enfrentando
o estigma e a difusão de informações pertinentes ao fortalecimento da
representação do movimento LGBT com vistas ao alívio do sofrimento, dor e
adoecimento relacionados aos aspectos de inadequação identitária, corporal e
psíquica nas pessoas LGBT.
Evidenciar essa pesquisa e seu resultado dá abertura para que a partir
dessa descoberta, outras vertentes de investigação venham à tona e
continuem contribuindo para novos diálogos sobre o tema nos meios familiares,
escolares, acadêmicos, midiáticos e políticos. Ainda que o cenário político não
favoreça a propagação de pesquisas com esse tema e as políticas públicas
continuem estagnadas, é importante que diálogos comecem, mesmo que seja
de forma breve. Fazer um movimento de propagação das diversidades
existentes na subjetividade humana irá contribuir para que a sociedade esteja
com informação em mãos, e assim começar um trabalho de prevenção de
violências e qualquer tipo de coação seja ela em meio público ou no meio
familiar.

Por fim este trabalho e suas discussões de acordo com as temáticas


abordadas, nos fez ver a real necessidade da inserção do diálogo sobre os
padrões impostos socialmente e o quão estas definições irreais podem
acarretar sofrimento nas pessoas que estão inseridas nessa realidade.

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