METODOLOGIA DO ENSINO
DA LÍNGUA PORTUGUESA
REPÚBLICA DE ANGOLA
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
VOLUME I
2010
Equipa ESE de Setúbal (Portugal)
Ana Pires Sequeira
Fernanda Botelho
José Victor Adragão
Luciano Pereira
MP Benguela (Angola)
Colaboração dos professores de Língua Portuguesa de Metodologia
do ensino da Língua Portuguesa
Criação e Design
JL Andrade
www.jlandrade.com
I. Introdução, 07
II. Metodologia Geral, 11
III. Oralidade, 13
Introdução
A. Língua e linguagem
1. O nascimento das línguas
2. A estrutura de uma língua
B. A língua materna
- sua importância no desenvolvimento pessoal
- sua importância na aprendizagem de outras línguas
C. A questão da oralidade
D. Princípios orientadores do ensino do Português
1.A oralidade na escola
2.O ensino e a aprendizagem da oralidade
3. Compreensão e expressão
4. A avaliação da oralidade
E. Da Escola do Magistério Primário à Sala de aula do Ensino Primário
Propostas de actividades para o desenvolvimento da compreensão e expressão oral
IV. Funcionamento da Língua, 41
A. Introdução
1. A língua, uma dupla convenção
2. A gramática
3. A gramática implícita
4. Importância do ambiente e da escola
5. A questão da terminologia
A. Conteúdos desenvolvidos neste módulo
1. Razão das escolhas
2. Desenvolvimento de cada tema
A. A morfologia verbal
1. Noção e importância do verbo
2. Categorias verbais
3. O tempo verbal
4. O modo verbal
D. A sintaxe
1. Noção de frase
2. Estrutura da frase simples
3. Da frase simples à complexa
E. A semântica
1. Introdução
6 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
2. Semântica vocabular
3. Significado e significação
4. Campos (ou áreas) lexicais
a. O parentesco
b. O meio ambiente
c. Os sentimentos
F. Da Escola do Magistério Primário à sala de aula do Ensino Primário
1. Morfologia verbal
2. Sintaxe
3. Semântica
V. Bibliografia Geral, 81
I
INTRODUÇÃO
O facto de a língua portuguesa não ser a língua materna de uma alta per-
centagem das crianças angolanas (e, provavelmente, dos seus professores) im-
plica que o seu ensino se faça com metodologia adequada, capaz de minorar
as dificuldades de acesso a uma língua que não se aprende desde o berço e de
promover o sucesso dos alunos, como estudantes e como cidadãos. Com efeito,
o correcto domínio da língua portuguesa, como receptores e como produto-
res, nas suas vertentes oral e escrita, ditará o percurso dos alunos nas restantes
disciplinas curriculares e a sua inserção na sociedade, como membros activos
de pleno direito. Por outro lado, só professores de comprovada competência no
uso reflectido e na metodologia da língua portuguesa (que ensinam e em que
ensinam) poderão assegurar o perfeito cumprimento dos objectivos do sistema
educativo.
8 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
2. Estrutura do Módulo
– Metodologia Geral
– Oralidade
– Funcionamento da Língua
– Leitura e Escrita
– Texto Literário
Volume I
Introdução
Metodologia Geral
Oralidade
Funcionamento da Língua
Bibliografia Geral
Volume II
Introdução
Metodologia Geral
Leitura e Escrita
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 9
Bibliografia Geral
Volume III
Introdução
Metodologia Geral
Texto Literário
Contos Angolanos
Bibliografia Geral
10 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
II
METODOLOGIA GERAL
ORALIDADE
INTRODUÇÃO
A. Língua e linguagem
-se hoje muito acerca da forma como ele funciona, como recebe as impressões
colhidas pelos órgãos dos sentidos (pela vista, pelo ouvido…), como escolhe
aquelas que lhe interessam e rejeita outras, como as organiza e faz delas ideias
que se articulam com outras ideias já existentes… E ainda a forma como imagi-
na, como cria ideias «a partir do nada», como é capaz de se separar do objectivo
e do concreto e partir para descobertas e invenções, sonhos e aspirações.
Pouco sabemos acerca dos tempos em que nenhum dos homens sabia escre-
ver e, portanto, acerca da forma como apareceu a linguagem humana – não há
registos desses tempos. No entanto, o que conhecemos hoje acerca dos povos
não alfabetizados diz-nos que desenhos nas árvores e pedras no chão serviram
muitas vezes para transmitirem informações uns aos outros, para «falar» com os
que não estavam perto. Mas tudo leva a crer que, desde sempre, quando esta-
vam em presença uns dos outros, os homens terão usado a voz para comunicar,
tanto os seus pensamentos, como os seus desejos. E assim nasceram as línguas.
Como foi a primeira língua? Ninguém sabe. Uma coisa é certa: é que ela servia
para comunicar, quer dizer, ela era a mesma para os interlocutores, era conhecida
por todos dentro da comunidade falante. E mais: ao nascerem, as crianças eram
logo «mergulhadas» nessa língua e, muito cedo, aprendiam a comunicar com os
pais, com os irmãos, com os velhos. Não custa a acreditar que, mesmo nas socie-
dades mais primitivas, essa língua pudesse ir mais longe do que responder às
necessidades imediatas e servisse para contar a história dos avós, para partilhar
os desejos mais profundos, para dizer o amor e a raiva. Também é compreensível
que, sendo sociedades fechadas, cada grupo (tribo, povo) tivesse uma língua
própria, que transmitia de pais para filhos e que, de alguma forma, manifestasse
a sua organização mental, a sua estrutura social, as suas crenças: língua que era,
ao mesmo tempo, vínculo de unidade entre os membros daquele grupo e fron-
teira que os separava dos outros, amigos ou inimigos. Muito cedo, na história da
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 15
Muitas vezes, aquilo que nos parece ser uma enorme riqueza de uma língua
em relação a outra não é mais do que o fruto de uma organização social espe-
cífica ou de um conjunto de oportunidades e circunstâncias. A língua de um
povo que distinga, na família, diferentes relações na linha matriarcal e patriarcal
distinguirá provavelmente o irmão da mãe e o irmão do pai com palavras dife-
rentes, enquanto outras terão uma só palavra para dizer tio. Tal como as línguas
de povos que não conheçam a cultura do vinho ou o uso dos computadores não
terão muitos termos para designar a actividade vinícola ou informática.
B. A língua materna
Cada um de nós, como atrás se dizia, é confrontado com uma língua mal aca-
ba de nascer. Alguns garantem que, ainda no seio materno, o nascituro ouve e
reage aos sons da fala da mãe. Essa primeira língua, a que chamamos «língua
materna» é essencial para o desenvolvimento das relações sociais (que permi-
tem à criança exprimir as necessidades básicas e obter satisfação – comida, hi-
giene, carinho) e da organização mental (que lhe permite construir um pensa-
mento próprio e compreender o mundo que a rodeia). Daqui decorre também a
importância de proteger e reforçar esta língua no sentido do desenvolvimento
pleno do indivíduo e do crescimento das suas capacidades. Aí radica a responsa-
bilidade da sociedade em facultar à criança condições externas e internas para
que ela atinja o domínio completo e eficaz da sua língua materna. É nela que a
criança, o jovem, o adulto vai pensar, imaginar, sonhar, rezar; é ela que lhe vai
fornecer as categorias mentais, as percepções da sociedade que o envolve, os
instrumentos que lhe permitirão exercer os seus deveres cívicos e reclamar os
seus direitos como membro dessa sociedade.
Mesmo nos casos acima descritos (especialmente nos casos acima descritos),
é a língua materna porta de entrada para a aprendizagem de outras línguas que,
eventualmente, serão mais úteis ao falante para participar na sociedade em que
as circunstâncias o inseriram ou, meramente, por interesses culturais ou acadé-
micos. É por comparação com a sua língua materna, por aproximações e diferen-
ciações, que cada indivíduo aprende uma nova língua e a assimila. Isto é válido
tanto para a gramática, com as suas regras e categorias, como para o vocabulá-
rio, com as suas especificidades, riquezas e aparentes deficiências.
C. A questão da oralidade
O que se tem vindo a dizer assume uma particular relevância no que toca à
oralidade.
das relações com os que nos estão próximos, sejam eles amigos, companheiros,
rivais. É com eles que estabelecemos as relações preferenciais, é a eles que te-
mos de compreender, explicar as nossas ideias, exprimir os nossos sentimentos
e desejos, conversar, discutir, namorar. E, na maior parte dos casos, a oralidade
da nossa língua materna é bem suficiente para tal. Aprender (compreender, utili-
zar) a componente oral de outra língua parece supérfluo, para não dizer artificial.
Não é por acaso que, durante muitos anos, o ensino das línguas estrangeiras
privilegiava a componente escrita – particularmente a leitura e compreensão de
textos –, em detrimento da prática da oralidade – da conversa, da discussão…
O ensino de uma língua que não a materna não pode ignorar todos estes
factores e os programas escolares que o suportam devem tê-los em linha de
conta. Ensinar uma língua não é como gravar uma informação em cima de uma
«tábua rasa» – o aprendiz já dispõe de um instrumento (mais ou menos conso-
lidado) para comunicar com os outros e exprimir a sua originalidade e, através
dele, já organizou a sua capacidade de compreender e interagir com o mundo.
Aprender uma segunda língua não é só aprender a articulá-la com a que ante-
riormente existia (e, preferencialmente, continua a existir e a desenvolver-se); é
muitas vezes apreender uma nova visão do mundo, uma nova cultura, uma nova
teia de relações sociais.
1. A oralidade na escola
Tudo o que atrás se diz se reveste de contornos muito mais prementes quan-
do se trata de ensinar uma língua oficial a crianças analfabetas na sua língua ma-
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 19
3. Compreensão e expressão
Este último aspecto comporta dois elementos que se hão-de ter em conta e
a que atrás brevemente nos referimos.
4. A avaliação da oralidade
fazer apelo a competências mais complexas para avaliar as mais simples. Por ou-
tras palavras, a avaliação da oralidade terá de ser oral, sem recurso a materiais
escritos.
Por outro lado, a expressão oral implica uma componente psicológica incon-
tornável – a timidez ou a desenvoltura do aluno podem encobrir ou potenciar
a competência linguística –, do mesmo modo que a memória auditiva tem par-
ticular incidência na compreensão oral. Não ter estes factores em conta pode
induzir situações de injustiça mais ou menos evidente.
Por estas razões, parece ser de bom senso que, procurando sempre e insis-
tentemente alcançar a boa proficiência das competências de oralidade dos seus
alunos, não será justo o professor fazer dela componente determinante para os
classificar.
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 25
A descrição ouvida deve ser objecto de discussão, em turma. Esta deve ali-
cerçar-se em:
- dicção utilizada;
Segue-se o colocar em comum das conclusões obtidas, por cada um dos gru-
pos de trabalho. Exemplo:
..... .....
..... .....
A descrição deve ser repetida mais do que uma vez, bem como a leitura da
legenda.
-…
O professor pede aos alunos que refiram palavras de que não saibam o signi-
ficado. Lista as palavras no quadro, e escreve o seu significado. Lê, em voz alta,
28 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
-…
Exemplo:
In: Pepetela (2002) “As aventuras de Ngunga” Lisboa: Publicações Dom Quixote.
Nota: o professor pode ditar palavras que não estejam no texto. É uma forma
de tornar mais aliciante e complexo o jogo.
ACTIVIDADE nº 3 – Noticiário
O professor elabora vários cartões, cada um deles tem uma instrução diferente.
Em seguida, organiza os alunos em pares. A um dos elementos dá um conjunto
de cartões. O estudante lê a instrução e o par tem de a executar. Em seguida,
trocam de papéis.
Nota: o professor pode solicitar aos estudantes que refiram as instruções a inserir
nos cartões.
O professor elabora vários cartões, cada um deles tem uma instrução diferente.
Em seguida, lê a instrução e os alunos executam.
Esta actividade pode ser ainda aproveitada para trabalhar noções como: esquer-
da, direita, em cima, em baixo, atrás, à frente, … para tal o professor só tem de
incluir instruções nesse sentido. Por exemplo:
TEMPO
Previamente o professor solicita aos estudantes que tragam, para a sala, recortes
de jornal com a previsão do tempo (imagens), para uma semana.
Com os diferentes recortes o professor propõe que os estudantes, em grupos,
organizem os seus recortes pelos dias da semana, de domingo a sábado.
Em seguida, o professor solicita a um grupo que refira:
Um dos elementos do grupo questiona outro colega (de outro grupo) sobre a
informação ouvida. Sempre que necessário corrige o colega.
Este exercício pode repetir-se o número de vezes que o professor considerar ne-
cessário, com recurso aos outros grupos de estudantes.
Finalizado este exercício, o professor propõe a elaboração de gráficos. Cada gru-
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 33
po vai elaborar o seu próprio gráfico da previsão do tempo para uma semana.
Antes da elaboração o professor deve definir os elementos a contemplar.
Exemplo de um gráfico:
A tabela tem como objectivo o registo diário do tempo (dos dias em que as
crianças vão à escola).
Exemplo:
…..
Esta actividade pode ser adaptada a alunos do Ensino Primário. Contudo o pro-
fessor deve ser criterioso na escolha do texto a ler, deve escolher não só um texto
rico em pormenores como não deve ser um texto longo.
36 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
De novo na EMP elaboram uma lista, no quadro, com todas as palavras recolhi-
das.
Exemplo:
Esta actividade possibilita ainda uma discussão mais alargada a outras palavras
do conhecimento dos estudantes de modo a que se consciencializem da varie-
dade de vocábulos com os quais os seus futuros alunos estão em contacto e que
podem ser inibidoras de sucesso na aprendizagem em português.
Os alunos registam, mentalmente, o nome dos diversos alimentos que vão ob-
servar. O professor vai referindo o nome de cada um dos produtos observados
(ananás, banana, batata, feijão, beringela, …) e solicita a um ou mais alunos que
repitam o nome por si referido.
De novo na sala de aula o professor solicita aos alunos que desenhem os dife-
rentes produtos que observaram. De seguida, cada aluno refere à turma o nome
dos diferentes alimentos desenhados. No final, mostra fotografias (cartazes, de-
senhos, …) de vários produtos alimentares (carne, peixe, frutas, legumes, …) e
pede a vários alunos que indiquem o nome do produto que vai assinalando.
38 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
MONTANHA
RECURSO – 10 palavras
A narrativa considerada e votada, por toda a turma, como a mais criativa pode
ser redigida e editada (se houver possibilidade) no jornal da Escola.
Em seguida, cada aluno imagina uma história onde as dez palavras estejam in-
seridas. Segue-se o relatar à turma, por cada um dos alunos, das histórias ima-
ginadas.
40 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
O professor refere que vão jogar um jogo em que têm de adivinhar o animal que
está a descrever de acordo com um conjunto de características que vai enunciar.
Nota: a enumeração das características pode ser feita não só com animais como,
também, com objectos, alimentos, …
FUNCIONAMENTO DA LÍNGUA
A. Introdução
Para atingir este estatuto, a língua teve de aceitar ser fruto de uma série de
convenções que passam despercebidas aos falantes. O vocabulário é disso uma
boa prova: nada nos obriga a dar a uma árvore o nome de “árvore”, a uma mesa o
nome de “mesa” ou a uma cabra o nome de “cabra”, por exemplo. Porque é fruto
de uma convenção/tradição que herdámos dos nossos antepassados, a língua
não pertence a nenhum indivíduo em particular mas a todo o povo que a tem
de guardar e respeitar, velando mesmo pela sua constante evolução. Se o não
42 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
Isto é válido para qualquer língua, mesmo para aquelas que não se escrevem,
que só têm componente oral. Daí a importância de conhecermos o funciona-
mento da língua e sabermos utilizá-lo: estamos ao mesmo tempo a garantir a
boa comunicação entre os membros da nossa comunidade e a defender este
património extraordinário que é o nosso idioma, tanto mais frágil quanto menos
conhecido e estudado.
2. A gramática
Neste módulo, vamos dar particular atenção às três componentes que for-
mam o “núcleo duro” da gramática: a morfologia, a sintaxe e a semântica. Por
morfologia, entendemos a generalidade dos estudos relacionados com a forma
das palavras, com as suas variações e derivações; por sintaxe, entendemos a
organização das palavras em grupos portadores de sentido, a que chamamos
frases; na semântica, enquadramos todos os estudos sobre a significação das
palavras ou das frases, tanto nas suas múltiplas acepções e sentidos, como nas
articulações significativas – mas de tudo isso se falará mais adiante.
3. A gramática implícita
habite num meio em que convivam duas ou mais línguas, terá maior facilidade
de pensamento abstracto e, consequentemente, um maior e mais rápido desen-
volvimento intelectual, desde que respeitadas certas normas na aprendizagem
(por exemplo, referência firme de cada falante à sua própria língua, ou seja, que
cada um dos membros do seu grupo lhe fale sempre na mesma língua).
Se, como vimos, a gramática implícita “se bebe com o leite da mãe”, é na es-
cola que se faz a aprendizagem da explicitação gramatical. Por outras palavras, é
na escola que se aprende a olhar para a língua como um objecto que se pode es-
tudar, analisar, compreender…, para bem se poder utilizar, para comunicar, para
inclusivamente brincar com ela. É na escola que se percebe quais os elementos
que compõem esta estrutura, para que servem, como se articulam uns com os
outros, como e quando se podem substituir. E isto faz-se desde os primeiros dias
e nunca se sabe quando está acabado.
1. A questão da terminologia
III. Todas elas têm presença visível nos programas do ensino primário
De uma forma mais ou menos visível, as questões escolhidas para serem de-
senvolvidas nesta parte do módulo estão presentes em todos os programas do
ensino primário, da 1ª à 6ª classe. Naturalmente que o seu tratamento terá de ser
diferenciado à medida que o aluno vai crescendo, não só devido à evolução da
sua capacidade de compreensão e de raciocínio abstracto, como por causa do
alargamento da sua rede de acesso à informação, designadamente com o seu
à-vontade no domínio da leitura.
Pelas razões anteriormente enunciadas, a forma como estas matérias são en-
sinadas aos alunos das EMP não pode ser descurada e procurar-se-á fazer pro-
postas metodológicas consequentes, tendo em especial consideração o facto
de, em muitos casos, particularmente em meios rurais, o professor do ensino
primário ser também um professor de língua segunda.
C. A morfologia verbal
Por definição, e tal como a própria palavra o diz, a morfologia ocupa-se da for-
ma das palavras, da sua organização em classes (nomes, verbos, conjunções…) e
48 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
da variação que lhes é introduzida quer pela flexão (plural, feminino, etc.), quer
pela derivação (mesinha, retomar…), quer ainda pela composição (matabicho,
chapéu de chuva…). Como se vê, a variação morfológica é um princípio impor-
tantíssimo para a economia da língua porque permite que a mesma palavra pos-
sa assumir significados diferentes só pela adjunção de pequenos elementos, que
fazem parte de uma lista muito reduzida; mas é simultaneamente uma fonte
“económica” de enriquecimento vocabular porque consegue criar palavras no-
vas por junção ou articulação das antigas.
2. Categorias verbais
trário de outras línguas, como o inglês e muitas línguas africanas, os verbos por-
tugueses têm uma variação riquíssima que, por vezes, se torna difícil para quem
os aprende como língua não-materna.
3. O tempo verbal
para estes anos de escolaridade (3º e 4º). Se isso não for sistematicamente traba-
lhado, não será possível cumprir o estipulado (ainda que de forma muito vaga)
nos programas da 5ª e 6ª classes.
Compete ao professor das EMP ajudar os seus alunos a organizarem uma pro-
gressão consistente dos conteúdos a transmitir e um conjunto de práticas me-
todologicamente adequadas à recepção e produção de textos (orais e escritos),
da 1ª à 6ª classes.
4. O modo verbal
Falar acerca do modo verbal é bastante mais complexo do que falar sobre
qualquer outra categoria, sobretudo porque muitas línguas ignoram a flexão
modal. Duas questões tornam complexo o que se possa dizer acerca do modo
em português. Por um lado, a noção de modo diz respeito à perspectiva do fa-
lante acerca da acção de que se trata, isto é, a atitude subjectiva (certeza, desejo,
dúvida…) a propósito da realidade descrita pelo verbo; por outro lado, a evolu-
ção da língua portuguesa impôs que a escolha do modo verbal dependa mais
da construção sintáctica do que da original atitude do falante (da qual se acabou
de falar).
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 53
D. A sintaxe
1. Noção de frase
No que diz respeito à estrutura sintáctica das frases, distinguem-se frases sim-
ples e complexas, sendo estas últimas uma acumulação de frases simples, por
coordenação ou por subordinação. Por esta razão, interessa sobremaneira estu-
dar a estrutura da frase simples. Pode haver frases muito longas, cheias de com-
plexidades de todos os tipos, e frases curtíssimas, reduzidas a uma só palavra.
Embora, por regra, o verbo seja o núcleo da frase, de tal forma que se diz que,
sem verbo, não há frase, é possível encontrar expressões desprovidas de verbo
que são consideradas correctas e perfeitas (“Atenção!”, “Proibido fumar”, “Perigo
de incêndio”, são exemplos possíveis) e, por isso, reconhecidas como verdadeiras
frases.
Chama-se frase simples àquela que tem um só verbo principal, o qual se reco-
nhece facilmente por estar numa forma flexionada. Na frase “Vou à rua comprar
bananas”, o verbo principal é “vou”. E, mesmo a frase “Vou à rua procurar o meu
pai, comprar bananas e falar ao meu primo”, continua a ser uma frase simples,
porque só tem um verbo flexionado – “vou”. Por vezes, a forma flexionada não
é do verbo principal mas de um auxiliar; nesses casos, todavia, a compreensão
da frase é suficiente para retirar a dúvida. Na frase “Ele tinha escrito uma carta”,
percebe-se que o verbo principal é escrever numa forma de mais-que-perfeito
composto, com o auxiliar ter; a frase “O edifício foi derrubado” é uma passiva em
que o verbo principal é derrubar com o auxiliar ser.
O que sabemos acerca dos tipos de verbos é a base distintiva mais impor-
tante das diversas estruturas possíveis de serem encontradas nas frases simples.
Assim, de acordo com o tipo de verbo, temos:
Ou
Eis a descodificação das siglas: F - frase, SN - sintagma ou grupo nominal, SV - sintagma verbal, SP
- sintagma preposicional, SAdj - sintagma adjectival, V – verbo, SAdv – sintagma adverbial. Estas
representações não têm em conta nem as funções sintácticas desempenhadas por cada elemento,
nem a sua estrutura interna, nem as diferentes manifestações possíveis na estrutura de superfície.
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 57
considerando-se, tal como atrás ficou dito, que a forma entre parêntesis é
facultativa.
a. A coordenação
Entre as frases coordenadas, algumas assumem particular relevo, pela sua fre-
quência e pelo seu encadeamento lógico: são as copulativas, as adversativas e as
disjuntivas. No primeiro caso, trata-se de proposições que se podem “adicionar”
sem que a lógica de cada uma seja questionada (“o Carlos é cabo-verdiano e a
Alzira é guineense e o Filipe é português”); no segundo caso, uma das frases só é
possível se a verdade da outra puder ser limitada (“estavam todos sentados mas
a Fernanda estava de pé”); no terceiro, cada uma das frases anula a outra (“ou
vais para Luanda ou ficas em Benguela”).
b. A subordinação
E. A semântica
1. Introdução
2. Semântica vocabular
O léxico de uma língua pode ser estudado tendo em conta a sua organiza-
ção semântica (áreas lexicais, sinonímia, polissemia) e a sua articulação com a
experiência do sujeito falante (denotação e conotação), bem como em outras
diferentes perspectivas, entre elas a sua história (formação, evolução, consolida-
ção), os processos internos e externos de crescimento e renovação (derivação,
composição, empréstimos, neologismos), a sua organização fonética (homoní-
mia...). De qualquer forma, não poderemos nunca separar o léxico de uma língua
e o povo que a fala, uma vez que é pelas palavras, pelas escolhas que faz, pelos
sentidos que privilegia, que o povo diz a sua cultura, a sua visão do mundo, a sua
filosofia de vida.
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 61
3. Significado e significação
Esta reflexão, aparentemente complexa, será útil ao professor das EMP para
poder explicar aos seus alunos que as palavras não têm apenas o valor referido
pelos dicionários. Aliás, em qualquer língua viva, é notório o uso que os falantes
fazem de algumas palavras bem para lá do seu significado original e neutro.
Neste módulo de língua portuguesa foi decidido integrar uma reflexão mais
aprofundada sobre três áreas lexicais, presentes em todo o percurso do aluno
ao longo do Ensino Primário: o parentesco, o meio ambiente e os sentimentos.
a. O parentesco
b. O meio ambiente
Nascida no seio de uma família, numa ou noutra etnia, em meio rural ou ur-
bano, a criança começa muito cedo a interagir com o meio circundante, o espaço
natural ou edificado, as plantas e os animais, os fenómenos meteorológicos e
a alimentação. Não admira que, ao longo dos programas de ensino, esta área
lexical se vá desenvolvendo e se torne mesmo uma das mais presentes entre os
conteúdos de aprendizagem.
c. Os sentimentos
Propostas de actividades
MORFOLOGIA VERBAL
Escreve de novo as frases mas substituindo por outras as palavras que estão
a negrito.
Na 3ª pessoa do singu-
lar
Na 1ª pessoa do singu-
lar
Na 1ª pessoa do plural
E pô-lo devagarinho:
Na cabeça da menina,
O trigo ressuscitou.
Tirou-o devagarinho,
E, chapéuzinho na mão,
De cabeça levantada,
Vê o exemplo.
E ___________ devagarinho:
Na cabeça da menina,
O trigo ressuscitou.
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 71
Tirou-o devagarinho,
E, chapéuzinho na mão,
De cabeça levantada,
SINTAXE
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
_______________________________.
______________________________
Volume I | Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa • 73
A B
o avião o Ricardo
os meninos as meninas
Escreve as frases que encontraste, dividindo-as nas suas duas partes mais
importantes.
74 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
3) Repara na frase.
Se quiseres dividir a frase nas suas duas partes mais importantes, encontra-
rás:
escolhe a palavra que permite completar melhor cada uma das frases
seguintes.
O robalo é um peixe.
O limão é amarelo.
SEMÂNTICA
De que cor é?
Bebe-se?
Onde vivia?
Tinha escamas?
Vê os exemplos.
78 • Projecto de Formação de Formadores de Professores para o Ensino Primário em Angola
O cozinheiro sabe muito sobre culinária (cozinha, fogão, tacho, balança, faca,
receita, …).
A enfermeira sabe muito sobre saúde (hospital, doença, seringa, vacina, ade-
sivo, comprimido, …)
Feiticeira
Feiticeira
Nosso musse- Reconheço 4 de Novem-
quer dizer
que, de José a palavra bro
Já ouvi várias uma pessoa
Luandino “feitiço” e o que faz bru- Frase –
histórias que
Vieira bocadinho xarias “Aquela fei-
me contou a
“eira” que ticeira fazia
“Toma, toma, minha avó Posso subs-
encontro em mal às pes-
toma, fei- lavadeira tituir por
ticeira sem soas”
bruxa
vergonha”
5) O Jogo da Escada1
eufórico
feliz
contente
más, zangadas…
V
BIBLIOGRAFIA
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Porto: Porto Editora.
BETTELHEIM, Bruno (1991). Psicanálise dos Contos de Fadas. Lisboa: Livraria Ber-
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