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abordagens-para-trabalhar-com-criancas-autistas

Publicado em NOVA ESCOLA 12 de Junho | 2019

Inclusão

Autismo: conheça o PRT e Denver,


duas abordagens para trabalhar
com crianças com autismo
O Treinamento de Respostas Pivôs e o Modelo Denver de Intervenção
Precoce partem de propostas lúdicas para ajudar crianças com Transtorno do
Espectro Autista a se comunicar melhor logo no início da vida,
desenvolvendo comportamentos de interação social
Beatriz Vichessi

Crédito: Getty Images

Resultado do trabalho de pesquisadores como Robert Koegel, o Treinamento de Respostas Pivôs


(Pivotal Response Treatment®, PRT® (na sigla em inglês) é um método de intervenção
comportamental e considerado uma ramificação da Análise do Comportamento Aplicada (ABA). Esse
tratamento lança mão da motivação da criança com autismo para ensinar a ela novas habilidades em
situações naturais e em ambientes variados. O achado de Koegel e seus colaboradores, que deu
origem ao PRT®, foi perceber que crianças com autismo se revelavam bastante desinteressadas em
aprender. Apesar disso, quando expostas a situações naturais, sem formalidade e com respeito às
escolhas feitas por elas, a aprendizagem acontecia com maior frequência e de modo mais natural.

LEIA MAIS Conheça a ABA, uma base científica para trabalhar com crianças com autismo

Já o Modelo Denver de Intervenção Precoce (Early Start Denver Model® / ESDM®, na sigla em inglês)
deriva do PRT® (e, consequentemente, da ABA) e é um método desenvolvido por Sally Rogers e
estudiosos que atualmente fazem parte da equipe do Centro de Excelência em Autismo, no Uc Davis
MIND Institute, na Califórnia (Estados Unidos). Focado em jogos e brincadeiras e na interação entre
paciente e terapeuta mediada por eles a fim de promover a interação social, o Modelo Denver é um
dos métodos de tratamento do autismo com eficiência comprovada cientificamente, tal como o
Teacch®. Em 2012, foi eleito pela revista norte-americana Time como um dos 10 maiores avanços da
medicina.

LEIA MAIS Conheça o TEACCH®, um programa para melhorar a comunicação com crianças com
autismo

Para entender melhor os dois métodos, NOVA ESCOLA conversou com três especialistas: Carolina
Salviano de Figueiredo, psicóloga e mestre em Psicologia clínica pela PUC-RJ, com ênfase em autismo e
desenvolvimento da linguagem e da subjetividade, e que atua como terapeuta comportamental no Rio
de Janeiro; Michele Matsumoto, psicóloga, especialista em ABA da clínica Nexo Intervenção
Comportamental, em São Paulo; e Edinizis Belusi, fonoaudióloga, especialista em intervenção precoce
em autismo e supervisora do Instituto Farol, em Florianópolis.

1. Qual o foco do PRT®?


Explorar técnicas motivadoras para aumentar as imitações e as vocalizações espontâneas da criança
com autismo, além de fazer com que ocorra a generalização do comportamento em vários ambientes
e a diminuição dos chamados comportamentos disruptivos – e a consequente substituição deles por
comportamentos comunicativos.

2. Quais os principais focos do trabalho com PRT®?


Valorizar a escolha da criança, usar reforçadores naturais (oferecer objetos, elogios ou atividades
diretamente relacionadas ao que está sendo ensinado, como consequência às respostas corretas),
recompensar as tentativas, intercalar tarefas já aprendidas e de aquisição de novos comportamentos,
investir na variação de tarefas e lançar mão de múltiplas pistas.

3. O que são áreas pivôs?


Segundo o PRT®, pivôs são áreas críticas no desenvolvimento da criança com autismo, que provocam
mudanças e avanços no desenvolvimento de outras áreas se estimuladas adequadamente. Foram
identificadas por Keogel e sua equipe. A motivação é considerada a primeira e mais importante área
pivô.

4. O que o terapeuta que trabalha com PRT® faz na prática com a criança ou o jovem com
autismo?
Além de trabalhar com brinquedos e brincadeiras com crianças pequenas, tal como faz o Modelo
Denver, é possível ensinar a criança a ler usando os pacotes de biscoito preferidos dela, ensinar
expressões faciais lançando mão de tirinhas da turma da Mônica ou de outros personagens que sejam
queridos por ela. Para trabalhar sentimentos, é possível usar os filmes preferidos, parando em
momentos importantes e falando sobre eles, como se colocar no lugar do outro, pedindo para a
criança com autismo dizer o que acha que o personagem está sentindo e o que acha que ele pode
fazer na próxima cena.

5. Qual a estratégia central de trabalho do Modelo Denver?


A construção de uma relação afetiva com a criança pequena com uso de jogos e brincadeiras. Quem
trabalha com o Modelo Denver defende que interações sociais positivas são capazes de aumentar a
motivação da criança com autismo na busca de novos contatos sociais e ampliar a capacidade dela de
aprender.

6. A partir de que idade o tratamento com o Modelo Denver pode acontecer?


Desde o primeiro ano de vida da criança. A precocidade é valorizada no Modelo Denver, pois seus
estudiosos defendem que quanto mais cedo comecem as intervenções, mais fácil será minimizar os
sintomas do autismo e os comportamentos disruptivos – consequentemente, com melhores resultados
alcançados no desenvolvimento, com maior proximidade ao de uma criança sem autismo – chamada
de neurotípica.

7. Há determinação de brincadeiras e jogos específicos no Modelo Denver?


Existem dois tipos de modelos de jogos e brincadeiras centrais que precisam ser explorados: com
objetos (carrinhos, blocos lógicos, quebra-cabeça), sem objetos em que a interação social é o centro da
atividade (siga o mestre, brincadeiras de roda, esconde-esconde) e atividades de mesa (desenhar,
pintar, brincar com massa de modelar). Brinquedos eletrônicos, que emitem luzes e sons, não são
bem-vindos porque roubam o foco da interação e podem deixar a criança focada demais nele próprio.
O melhor é que os brinquedos selecionados demandem a participação do outro para brincar.

8. Como o terapeuta determina os jogos e as brincadeiras a explorar com a criança?


Quem escolhe não é ele e sim a criança. Levando isso em conta, o profissional desenvolve o trabalho
durante a sessão, considerando também a avaliação de desenvolvimento inicial, que determina o nível
de desenvolvimento, identifica atrasos e potencialidades e estabelece as habilidades que precisam ser
ensinadas (como comunicação e independência social). Apesar de parecer que é a criança que dita o
desenrolar das sessões terapêuticas, a intervenção profissional é bastante planejada com um plano
terapêutico estabelecido e revisto continuamente.

9. Por que brincar ajuda no desenvolvimento de crianças pequenas com autismo?


Segundo o Modelo Denver, brincando as crianças têm oportunidade de desenvolver competências
sociais e aprendem a se comunicar de forma natural, tal como crianças neurotípicas. Durante a sessão
com jogos e brincadeiras, são desenvolvidas também motricidade fina e grossa. As habilidades de
motricidade grossa compreendem movimentos motores complexos como saltar, correr ou atirar
objetos. A motricidade fina compreende destrezas como agarrar objetos, recortar figuras ou abotoar
botões.

10. O terapeuta ensina a criança com autismo a brincar?


Sim, ele se torna um parceiro de brincadeira e de jogo. O terapeuta também ajuda a criança a se
interessar por brincar, dando instruções verbais, mostrando com gestos como fazer, pegando na mão
dela para fazer junto. Isso se justifica porque a interação da criança com autismo com o meio é atípica.
Diferentemente da criança neurotípica, ela perde muitas oportunidades de aprendizagem, se fixa em
partes específicas de objetos, foca atenção em movimentos repetitivos, não presta atenção ao que é
relevante.

11. Crianças com e sem autismo podem brincar juntas?


Devem. Os ganhos para ambas são imensuráveis no que diz respeito à aprendizagem da convivência,
tolerância e respeito às diferenças. No Modelo Denver, inclusive, é previsto, em determinada parte do
tratamento, brincadeiras e jogos com várias crianças reunidas, aproveitando diversas situações de
aprendizagem fruto da interação entre elas. Isso acontece no ambiente escolar, com participação do
educador. Estando junto de crianças neurotípicas, crianças com autismo têm exemplos nelas de como
brincar, são expostas à situação de pedir para brincar junto e fazê-lo, dentre outros ganhos e
interações sociais valiosas para o desenvolvimento delas.

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