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Quarta fase

Promulgação e controlo

JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., ns. 84 ss., pgs. 302 ss.;

J. J. GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição…, 4.ª ed., anotações aos


arts. 136.º, 137.º, 278.º, 279.º;

Quais são os actos normativos sujeitos a promulgação?

art.º 134.º, al. b), 1.ª parte;

cfr. art.º 137.º

Regime do veto político (entendimento do Professor JORGE


MIRANDA) ou “veto em geral” (RUI MEDEIROS) - arts. 136.º, n. 1 a 3;

Regime do “veto jurídico” (Professor JORGE MIRANDA) ou “veto


por inconstitucionalidade” apenas (RUI MEDEIROS) está previsto nos arts.
278.º, ns. 1, 3 e 8 (e também n.º 7, 2.ª parte, “a fortiori”)1; 279.º, n. 1, 2 e
3.

1
Note-se que os números 4 a 7 são regras especiais, relativas apenas às literalmente às leis orgânicas (v. a
tipificação destas no art.º 166.º, n.º 2)
QUADRO
PROMULGAÇÃO E VETO

(para efeitos didácticos, são transcritos os fragmentos de normas da Constituição; todavia, nas
provas escritas, geralmente não é necessário transcrever os artigos – basta citá-los).

AR aprova decreto envia ao PR

(Ficará a AR impedida de introduzir alterações no diploma ou alterá-lo?

Segundo o Professor JORGE MIRANDA, a Assembleia fica impedida de se pronunciar


sobre o seu objecto2).

O PR:

a) entre o 1.º e o 8.º dia, poderá:

i) promulgar (arts. 136.º, n.º 1; 134.º, al. b), 1.ª parte);

ii) exercer veto político (art.º 136.º, n.º 1)

iii) requerer a fiscalização preventiva da constitucionalidade ao Tribunal


Constitucional (art.º 278.º, n. 1 (no fragmento de norma: “O Presidente da República
pode requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da
constitucionalidade de qualquer norma constante (…) de decreto que lhe tenha sido
enviado para promulgação como lei (…)”) e n. 3).

b) entre o 9.º e o 20.º dia, o PR poderá:

i) promulgar (art.º 136.º, n.º 1 (“No prazo de vinte dias contados da recepção
de qualquer decreto da Assembleia da República para ser promulgado como lei, (…)
deve o Presidente da República promulgá-lo (…)”) e art.º 134.º, al. b), 1.ª parte);

ii) ou exercer veto político (art.º 136.º, n.º 1, no fragmento: “No prazo de vinte
dias contados da recepção de qualquer decreto da Assembleia da República para ser
promulgado como lei, (…) deve o Presidente da República (…) exercer o direito de veto,
solicitando nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada”);

2
JORGE MIRANDA, Manual..., V, 3.ª ed., pg. 281.
(já não pode requerer a fiscalização preventiva – há um fenómeno de
preclusão do exercício desse poder).

c) A partir do 21.º dia, o PR deverá promulgar (esta promulgação fora do prazo do art.º
136.º, n.º 1, é uma inconstitucionalidade formal, mas que acarreta o desvalor da mera
irregularidade). Esta promulgação fora do prazo é um “mal menor” em face da pura e simples
omissão de promulgação, que violaria mais gravemente a norma do art.º 136.º, n.º 1.

Há uma preclusão (ou seja, exclusão) do poder de veto do art.º 136.º, n.º 1.

c’) Problema da omissão de promulgação:

Quid juris se o PR não promulga nem veta após o prazo de 20 dias?

A omissão de promulgação é inconstitucional; no entanto, não há possibilidade de


suprimento; pelo que a falta de promulgação acarreta a inexistência do decreto (art.º 137.º) 3.

I. Primeiro cenário – o Presidente da República promulga o decreto

A promulgação deve ser expressa (como decorre da letra do n.º 1 do art.º 136.º).

(Em geral, em Direito, o silêncio não significa assentimento ou aquiescência (cfr. art.º
217.º do Código Civil. Não é verdadeiro, na sua pureza, o brocardo “Qui cala consens”.

A promulgação do decreto deve ser no seu todo (proibição de promulgação parcial).

A promulgação, enquanto acto peremptório4, não deve ser praticada com reservas 5. A
promulgação, tal como o veto, é “in totum”; ou seja, apenas se admite a chamada “promulgação
simples” (em sentido contrário, cfr. CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito
Constitucional, I, 2.ª ed., n.º 571, pg. 461 (na 1.ª ed., pgs. 416-417)

3
V. JORGE MIRANDA, Manual..., V, 3.ª ed., pg. 301-302; GOMES CANOTILHO / VITAL
MOREIRA, Constituição..., 3.ª ed., anot. ao art.º 139.º, V, pg. 599.
4
AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 585.
5
Em sentido contrário, CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, I, 2.ª ed., n.º
571, pg. 461.
Após a promulgação, é necessário ainda a referenda do Governo (arts. 140.º, n.º 1,
134.º, al. b), 1.ª parte)

→→, o que implica o fim do processo legislativo parlamentar.

Contudo, a lei da AR só entrará em vigor após a publicação no Diário da República.

“Promulgando, o Presidente da República não está necessariamente a concordar com


os diplomas. Se assim tivesse de ser, no caso de contrastes significativos entre as orientações
políticas de base do Presidente em concreto e a maioria parlamentar de momento, correr-se-ia
o risco de permanentes ou sucessivas crises institucionais.” (JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª
ed., n.º 85.V, pg. 311)

Algo diversamente, segundo CARLOS BLANCO DE MORAIS,

“O acto de promulgação não significa uma codecisão ou co-responsabilização [co-


responsabilização] do Presidente com o ato legislativo do Parlamento. Significa,
essencialmente, que, na contabilidade entre as hipotéticas valorações positivas e negativas do
ato feitas pelo Chefe de Estado, as primeiras superaram as segundas no juízo do mesmo
titular.” CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, I, 2.ª ed., n.º 570,
pg. 461).

II. Segundo cenário – o PR exerce veto imediato (art.º 136.º, n.º 1)

O veto deve ser fundamentado (art.º 136.º, n.º 1, “in fine”: “solicitando nova
apreciação do diploma em mensagem fundamentada”).

Existem duas opiniões essenciais acerca da natureza deste veto:


i) O Professor JORGE MIRANDA tem defendido, desde a revisão constitucional de 1982,
que se trata de um veto político;

ii) O Professor RUI MEDEIROS entende que aí está consagrado o veto em geral ( RUI
MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade , pg. 85; RUI MEDEIROS, Artigo 233º, III, in Constituição
Portuguesa Anotada, tomo III, pg. 423).

Expliquemos melhor ambas as posições:

O Professor JORGE MIRANDA admite apenas como fundamentação razões políticas (interesse
público, conveniência para o país, bem comum) 6, pelo que, apesar de não estar expressamente
previsto no art.º 136.º, se trataria de um veto político, assim precludindo como
fundamentação válida a invocação de quaisquer outras razões (v. JORGE MIRANDA, Manual...,
V, 4.ª ed., n.º 87.I, pg. 314; no mesmo sentido, MARCELO REBELO DE SOUSA / JOSÉ DE MELO
ALEXANDRINO, Constituição…, pg. 254; JOSÉ MANEL SÉRVULO CORREIA Legalidade e autonomia
contratual…,
pgs. 222, 228 (mas acompanha a posição de GOMES
CANOTILHO, na pg. 215, e defende o veto de decretos regulamentares por
razões de inconstitucionalidade (pg. 237)); JOSÉ DE MATOS CORREIA, A fiscalização da
constitucionalidade e da legalidade, 2.ª ed., pg. 41

b) Em sentido contrário, outros Autores admitem, não só considerações


políticas, mas também:

i) de inconstitucionalidade (GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA 7;


RUI MEDEIROS, )
(em sentido contrário, CARLOS BLANCO DE MORAIS).

ii) ou mesmo de ilegalidade


Admitindo ambas as razões, RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, pg. 85; IDEM,
Artigo 233.º, III, in Constituição Portuguesa Anotada, tomo III, 1.ª ed., pg. 423.

Todavia, em caso de confirmação parlamentar, e uma vez que não


existe entre nós um”poder de apelação” para o TC a fim de que este
resolva o conflito, o Chefe de Estado não pode invocar a ilegalidade para
se furtar à promulgação (RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, pg. 85).
6
JORGE MIRANDA, Manual..., V, 3.ª ed., pg. 293.
7
“[e]ntre os motivos do veto previsto no n.º 1 do art.º 136.º, pode incluir a dúvida do PR acerca da
constitucionalidade do diploma”, GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição..., 4.ª ed.,
anot. ao art.º 136.º, VI, pg.|.
Não se poderia defender que o veto imediato estivesse dependente de pronúncia do
TC; a intervenção deste seria dispensável, não obstaculizaria o veto imediato, uma vez que o
pedido de fiscalização preventiva é facultativo.

Ainda que o TC se pronunciasse pela não inconstitucionalidade, o PR poderia vetar,


para que normas inconstitucionais não vissem a luz do dia.

c) Como “media via”, CARLOS BLANCO DE MORAIS propugna que o veto político
“exprime um juízo de discordância relativamente ao mérito (jurídico e político)” (CARLOS
BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, I, 1.ª ed., pg. 420); não admite dúvidas de
constitucionalidade como fundamento deste veto, mas admite outros “argumentos jurídico-
constitucionais”, designadamente a objecção ao “mau Direito” (CARLOS BLANCO DE MORAIS,
Curso de Direito Constitucional, I, 1.ª ed., pg. 421)

“se o Presidente convocar argumentos jurídico-constitucionais como fundamento do


veto, sem com eles sustentar a inconstitucionalidade do a|c|to, essa fundamentação jurídica
deve ter-se como legítima

e o veto não enfermará de desvio de poder.

CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, Tomo I, As Funções do Estado e o


Poder Legislativo no Ordenamento Português, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2012, Parte III, 4, n.º 581, pg.
468)

“Isto porque a norma legal pode exibir defeitos técnicos ao comprimir direitos
fundamentais ou depreciar certos princípios constitucionais, a uma ‘escala de baixa
intensidade’,

a qual não resultará ser suficiente para gerar uma inconstitucionalidade.” CARLOS
BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, Tomo I, As Funções do Estado e o Poder Legislativo
no Ordenamento Português, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2012, Parte III, 4, n.º 581, pg. 468).

vs.

“Ainda assim, essa depreciação ou compressão podem ser


estimadas pelo Presidente como desnecessárias ou nocivas,

sob um ponto de vista jurídico-político

e justificar uma obje|c|cão de mérito presidencial, materializada


num veto político.” (CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, Tomo I, As
Funções do Estado e o Poder Legislativo no Ordenamento Português, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2012,
Parte III, 4, n.º 581, pg. 469)

Inadmissibilidade do chamado “veto construtivo”, ou seja, do veto que sugere


propostas de alteração, dada a natureza do veto como “faculdade de impedir”, no sentido que
lhe foi dado por MONTESQUIEU (i.e., o PR não participa positivamente na feitura da lei e na
determinação do seu conteúdo).

(neste sentido, GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA: apesar de o PR dever


fundamentar o veto, deve abster-se de propostas concretas de alteração
(GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição..., 4.ª ed., II, anot. ao artigo 136.º, VI, pg.|).

Em sentido oposto, CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, I, 2.ª


ed., n.º 579): “implica
uma discordância parcial ou condicionada em relação à
oportunidade do diploma, especificando a fundamentação do veto as
matérias onde recaem essas obje|c|ções

e podendo, ainda, a mesma apontar explícita, ou implicitamente,


algumas pistas para a ultrapassagem do impedimento presidencial em
sede de reformulação parlamentar”

d4) Proibição do veto parcial - o veto é “in totum”8;

d5) Proibição do “veto de bolso” (“pocket veto”)9.

Admitindo o veto de bolso em circunstância de final da legislatura, art.º I, secção VII, n.º 2, da Constituição
norte-americana.

Após o veto do art.º 136.º, n.º 1, não é possível que o PR requeira a fiscalização
preventiva ao TC (mesmo dentro do período dos primeiros oito dias) (cfr. art.º 278.º, n. 1 e
3)10.

8
JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 85.IV, pg. 311.
9
AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 589.
10
Em sentido contrário, GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria..., 7.ª ed., pg.
626.
PR devolve o diploma à AR. A AR tem várias opções ao seu dispor:

a) Nada faz (desiste11)- a situação de veto mantém-se12.

A iniciativa legislativa não pode ser renovada na mesma sessão legislativa, salvo nova
legislatura (art.º 161.º, n.º 3, do RAR).

b) A AR age (v. art.º 160.º do Regimento - pode proceder a nova apreciação do diploma a
partir do 15.º dia posterior ao da recepção da mensagem fundamentada do PR (art.º 160.º, n.º 1, do
Regimento da AR))13

b1) A AR reformula (= aprova propostas de alteração) (não está


expressamente previsto no art.º 136.º; a Jurisprudência do TC admitiu-a já (em
relação à maioria de aprovação, aplica-se a regra supletiva do art.º 116.º, n.º
3).

(Não faz sentido o expurgo, na perspectiva do Professor JORGE MIRANDA, uma


vez que não há nenhuma norma que contrarie a Constituição).

 o decreto é enviado ao PR (art.º 161.º, n.º 2, do Regimento)

 considera-se que existe um novo diploma, pelo que é aberto um


novo processo; o PR poderá:

i) promulgar;

ii) vetar politicamente;

iii) ou requerer a fiscalização preventiva.

b2) A AR confirma (= não aprova propostas de alteração)

art.º 161.º do Regimento

11
CARLOS BLANCO DE MORAIS, Curso de Direito Constitucional, I, 1.ª ed., pg. 463|.
12
Cfr. AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 571.
13
Cfr. os trâmites previstos pelo Regimento da AR.
Em relação à maioria de confirmação, é necessário:

i) averiguar primeiro se cabe na regra especial do art.º 136.º, n.º 3,


caso em que a maioria terá de ser dois terços (desde que superior a 116
deputados);

Esses casos abrangem literalmente quatro matérias:

- leis orgânicas (v. art.º 166.º, n.º 2, que remete para certas alíneas do
art.º 164.º (chama-se a atenção em particular para as eleições para PR e para a
AR (art.º 164.º, al. a)), e para as assembleias Legislativas das Regiões
Autónomas (art.º 164.º, al. j)).

- as três alíneas14.

Há ainda um quinto caso, se não couber no primeiro: os casos das


alíneas do art.º 168.º, n.º 6, por coerência sistemática: pois, se carecem de
dois terços na terceira fase do processo legislativo parlamentar, não faria
sentido que lhes fosse aplicada uma regra de maioria inferior para a
confirmação (neste sentido, JORGE MIRANDA; ALEXANDRE SOUSA PINHEIRO / MÁRIO
JOÃO FERNANDES).

ii) caso não caiba no n.º 3, aplica-se a regra geral do art.º 136.º, n.º 2,
que é a maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções (116
deputados).

O veto político do PR não é absoluto, mas suspensivo:

 a AR devolve ao PR;

este tem o dever de promulgar (“o Presidente da República deverá promulgar”


(art.º 136.º, n.º 2)).

b3) A AR pretende confirmar, mas sem atingir a maioria exigida (116 deputados)

14
“a) Relações externas;

b) Limites entre o sector público, o sector privado e o sector cooperativo e social de


propriedade dos meios de produção;

c) Regulamentação dos actos eleitorais previstos na Constituição, que não revista a forma de lei
orgânica.”
 o veto persiste (se houver devolução irregular do diploma ao PR, a Doutrina
dominante entende que não há confirmação15).

III. Terceiro cenário

– o PR requer a fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional

RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, pgs. 65-66, 394-396

A utilização do veto jurídico por não transparentes motivações políticas acarretaria uma fraude
à Constituição (JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 87.I, pg. 314).

(arts. 278.º, n. 1 e 3, 134.º, al. g))

(e também 136.º, n.º 5 (por remissão))

Trata-se de um “‘poder funcional’, e não ‘direito’ de iniciativa” (JORGE MIRANDA,


Manual..., VI, 4.ª ed., n.º 76.I, pg. 295)

O prazo é de 8 dias (art.º 278.º, n.º 3).

O prazo de 8 dias para a interposição do pedido de fiscalização


constitui um pressuposto processual16 – a tempestividade.

A sua inobservância implica o indeferimento liminar do pedido por parte


do TC (art.º 52.º, n.º 1, parte final, da Lei do TC

Após o decurso do prazo, existe um fenómeno de preclusão.

O PR tem a obrigação de identificar as normas do diploma que pretende ver apreciadas


(pedido) e as normas ou princípios violados (causa de pedir) (art.º 51.º, n.º 1, da Lei do TC – “1.
O pedido de apreciação da constitucionalidade (…) das normas jurídicas referidas nos artigos

15
Em sentido contrário, porém, AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 571.
16
Noção que será aprofundada na disciplina de Direito Processual Civil.
278.º (…) deve especificar, além da normas cuja apreciação se requer, as normas ou os
princípios constitucionais violados.”; cfr. n.º 5).

O TC só se pode pronunciar pela inconstitucionalidade das normas indicadas pelo PR


(princípio do pedido) (art.º 51.º, n.º 1, 2.ª parte, e n.º 5, 1.ª parte, da Lei do TC: “O Tribunal só
pode declarar a inconstitucionalidade (…) de normas cuja apreciação tenha sido requerido”),
embora possa considerar que essas normas são inconstitucionais em virtude de outros
fundamentos diversos dos indicados pelo PR (a causa de pedir não vincula, em virtude do
princípio “jura novit curia” (que significa “o tribunal conhece acerca do Direito” (art.º 51.º, n.º
5, 2.ª parte, da Lei do TC: “O Tribunal (…) pode” pronunciar-se pela inconstitucionalidade “ com
fundamentação na violação de normas ou princípios constitucionais diversos daqueles cuja
violação foi invocada.”)).

Depois de aberto um processo de fiscalização preventiva e antes da


decisão do Tribunal, o PR não pode promulgar (promulgação temporariamente vedada (v.
art.º 278.º, n.º 7, última parte, aplicável por argumento de maioria de razão (“ a fortiori”): “o
Presidente da República não pode promulgar os decretos a que se refere o n.º 4 (…) antes de o
Tribunal Constitucional sobre eles se ter pronunciado, quando a intervenção deste tiver sido
requerida.”).

Há uma promulgação temporalmente vedada.

Neste sentido, cfr. JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 85.I, pg. 307.

Pode também ser invocado o art.º 136.º, n.º 1, 2.ª parte, “a contrario sensu”.

Igualmente o PR não pode exercer veto do art.º 136.º, n.º 1

(neste sentido, JORGE MIRANDA, Manual…, V; AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação,


pg. 570 (nota 43),

com os seguintes fundamentos:

i) a norma do art.º 278.º, n.º 7, última parte, também aplicável por argumento de
maioria de razão (“a fortiori”), mas, neste caso, por via de interpretação extensiva (ou seja,
não está na letra, mas no espírito).

ii) Com efeito, vetar ao abrigo do art.º 136.º, n.º 1 (que a Doutrina do Professor JORGE
MIRANDA entende ser um veto político, seria um verdadeiro “venire contra factum proprium”,
uma vez que o PR requerera a fiscalização preventiva).
Do mesmo modo, tal como em relação ao caso anterior, o art.º 136.º, n.º 1, 2.ª parte,
“a contrario sensu”, corrobora a inadmissibilidade.

Qual o desvalor no caso de o PR promulgar ou vetar?

a) Segundo alguma Doutrina, seria o da mera irregularidade (JORGE MIRANDA)

b) Outros Autores entendem que se trata de uma nulidade.

Em todo o caso, sem prejuízo de ser uma norma jurídica, ela é desprovida de sanção.

só “a posteriori” poderiam funcionar os mecanismos


No primeiro caso,
de fiscalização (admitindo, de novo, que o PM não houvesse recusado a
referenda) (JORGE MIRANDA, Manual…, VI, 2.ª ed., pg. 252).

E, no segundo caso de o PR vetar, o processo legislativo não fica concluído, pelo que o
decreto não se transforma em lei, sendo juridicamente inexistente (art.º 137.º).

Sublinhe-se, em todo o caso, que o PR pode desistir do pedido (art.º 53.º da Lei do TC).
Porém, essa desistência deveria ser expressamente formulada.

Neste sentido, cfr. AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 570 (nota 43)).

O regime do veto jurídico ou veto por inconstitucionalidade está previsto nos arts.
278.º e 279.º

(JORGE MIRANDA utiliza ambas as expressões; diversamente, RUI MEDEIROS considera


que se trata do “veto por inconstitucionalidade”, uma vez que, no veto do art.º 136.º, n.º 1,
admite a invocação de razões jurídicas).

(Para este regime do veto jurídico ser aplicado, é pressuposto necessário que o PR tenha
requerido a fiscalização preventiva).
Será o PR obrigado a requerer a fiscalização preventiva?

A Doutrina divide-se.

a) MIGUEL GALVÃO TELES e JORGE MIRANDA inclinam-se no sentido negativo;


requerer a fiscalização preventiva seria uma faculdade de exercício livre (desde logo, em virtude
da letra do art.º 278.º, n.º 1 – “pode”17; cfr., do mesmo passo, o art.º 281.º n.º 2, proémio).

b) Em sentido contrário, RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, pgs. 78-


82; AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 569; aparentemente, VIEIRA DE
ANDRADE, Os direitos fundamentais…, 5.ª ed. (nota ); PAULO OTERO (pelo menos, “de jure
condendo”);

designadamente com o argumento do juramento do PR (art.º 127.º, n.º 3) 18.

A) O TC pronuncia-se19 pela inconstitucionalidade

17
V. AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 569.
MIGUEL GALVÃO TELES, Liberdade de iniciativa do Presidente da República quanto ao
processo de fiscalização preventiva da constitucionalidade, in O Direito, ano 120.º, 1988, I-II,
Jan.-Junho, pgs. 35-43; IDEM, Parecer, in O Presidente da República e o Parlamento, pgs. 178-180
(com matizações); JORGE MIRANDA, Manual..., V, 3.ª ed., pg. |293; IDEM, Veto, in DJAP, VII, pg.
599;
(também VIEIRA DE ANDRADE, Parecer, in O Presidente da República e o Parlamento, pg.
223; GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição..., 3.ª ed., anot. ao art.º 139.º, III, pg.
598; CARLOS BLANCO DE MORAIS, Justiça Constitucional, II, 1.ª ed., pgs. 43 ss.; ALEXANDRE
SOUSA PINHEIRO / MÁRIO JOÃO FERNANDES, Comentário..., pg. 270).
O dever de o PR ter jurado cumprir e fazer cumprir a Constituição é reconduzido a violações grosseiras
da mesma.
18
Argumento histórico favorável a esse entendimento era o art.º 277.º, n.º 3, da versão originária da
Constituição: “Se o Conselho da Revolução tiver dúvidas sobre a constitucionalidade de um decreto e
deliberar apreciá-lo, comunicará o facto (…) ao Presidente da República para que não efectue a
promulgação.”
Todavia, o TC, enquanto órgão jurisdicional, caracterizado pela passividade, não poderá ter idêntica
iniciativa.
19
A fórmula utilizada pela Constituição para a decisão do TC – “pronunciar-se pela
inconstitucionalidade” – é diferente da usada a propósito da fiscalização sucessiva abstracta – “declaração
de inconstitucionalidade” (arts. 281.º e 282.º) – e traduz a diferente natureza e enquadramento dos dois
juízos de inconstitucionalidade. Enquanto que, na fiscalização sucessiva, a decisão do TC implica
automaticamente a declaração de nulidade da norma, na fiscalização preventiva, a decisão do TC incide
sobre normas ainda não perfeitas, e a sua eficácia consiste em impedir a prática do acto de que depende a
sua perfeição, acto que, todavia, e apesar do juízo de inconstitucionalidade, pode vir a ser praticado,
verificadas certas condições (GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição..., II, 4.ª ed.,
anot. ao art.º 279.º, I, pg. 929).
O PR deve vetar (veto obrigatório e expresso), cuja fundamentação é a decisão do TC,
e devolver o diploma à AR.

(art.º 279.º, n.º 1: “Se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela


inconstitucionalidade de norma constante de qualquer decreto (…), deverá o diploma ser
vetado pelo Presidente da República (…), e devolvido” à AR).

Este é certamente um veto jurídico (embora não esgote todas as possibilidades de


veto por razões jurídicas – v. supra); rectius, trata-se de um|do veto por inconstitucionalidade.

Qual o prazo?

a) “acto contínuo” (GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA)

b) 20 dias (por aplicação analógica do art.º 136.º, n.º 1) (AFONSO D’OLIVEIRA


MARTINS);

c) em prazo razoável (JORGE MIRANDA).

(Se o PR, indevidamente, promulgar, a promulgação é inconstitucional, tal equivalendo


à ausência de promulgação (cfr. art.º 137.º) 20).

Será o veto jurídico é cumulável com o veto (político) do art.º 136.º, n.º 1?

A nosso ver, cumpre distinguir:

quanto a razões políticas, não pode o PR aduzi-las para aditar um veto do art.º 136.º,
n.º 1;

já quanto a outras razões jurídicas, não especificamente relacionadas com a


inconstitucionalidade (ilegalidade ou mau Direito), será possível ao PR aduzi-las na
fundamentação.

Pese embora a redacção do n.º 1 do art.º 279.º, este procedimento parece não ser de
excluir: esse preceito é taxativo, referindo que o PR deverá vetar, sendo a fundamentação,
“prima facie”, a decisão do TC; todavia, nada impede a existência de outros motivos, dir-se-ia

20
GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição..., 4.ª ed., anot. ao art.º 279.º, XI, pg.|.
que supérfluos ou excedentários (todavia, poderão influir na inibição da deliberação
confirmatória por parte da AR).

Assembleia da República:

a) Nada faz

b) A AR age21

Qual o prazo?

v. art.º 161.º, n.º 3, do Regimento da AR.

b1) A AR expurga a norma (ou normas) considerada inconstitucional (art.º


279.º, n.º 2, 1.ª parte: “o decreto não poderá ser promulgado (…) sem que” a AR
“expurgue a norma julgada inconstitucional”). É designado o expurgo simples, sem
mais alterações ao diploma.

devolve ao PR

No prazo de 20 dias (por aplicação analógica do art.º 136.º, n.º 1), o


PR:

i) promulga;

ii) veta politicamente;

iii) Poderá o PR requerer de novo a fiscalização preventiva ao


TC? Divergência na Doutrina:

Opinião afirmativa - GOMES CANOTILHO / VITAL


MOREIRA, JORGE MIRANDA, PAULO OTERO, MARCELO
REBELO DE SOUSA.

Argumentos:

a) O expurgo pode não ser total;

21
Salvo se existir inconstitucionalidade orgânica.
b) A retirada de uma norma poderá afectar o equilíbrio
do diploma e tornar outras normas inconstitucionais
(“A emenda poderá ser pior do que o soneto” (Prof.
PAULO OTERO).

versus

Opinião negativa - AFONSO D’OLIVEIRA MARTINS 22

Argumentos: …

poderá sempre haver fiscalização sucessiva.

b1’) não expurga, mas devolve

→→ promulgação vedada por parte do PR (art.º 279.º, n.º 2, 1.ª parte)


(não é permitida pelo art.º 279.º, n.º 2 (cfr. n.º 3)

b2) A AR (expurga e) reformula o diploma (art.º 279.º, n.º 3)

b2’) abrange todas as normas consideradas inconstitucionais:

é iniciado um novo processo – o PR poderá:

i) promulgar;

ii) vetar politicamente;

iii) requerer novamente a fiscalização preventiva ao TC


em relação a “qualquer das normas” (art.º 279.º, n.º 3 -
“Se o diploma vier a ser reformulado, poderá o
Presidente da República (…) requerer a apreciação
preventiva da constitucionalidade de qualquer das suas
normas.”)

22
AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 573.
b2’’) se não abranger todas as normas pronunciadas inconstitucionais,
o veto mantém-se; o PR não pode promulgar (a promulgação é vedada)
(art.º 279.º, n.º 2, 1.ª parte).

b3) A AR confirma (art.º 279.º, n.º 2, 2.ª parte) (ou seja, não há aprovação de
propostas de alteração).

A maioria exigida é de dois terços dos Deputados presentes, desde que


superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções (i.e., desde que
superior a 116) (a maioria mínima é, pois, de 154 deputados).

O diploma é enviado ao PR, que tem a faculdade de promulgar, como resulta


da redacção da norma do art.º 279.º, n.º 2, 2.ª parte (“(…) o decreto não poderá ser
promulgado (…) sem que” a AR “(…) quando for caso disso, o confirme (…)”).

(a promulgação não é obrigatória (v. JORGE MIRANDA, Manual..., V, 3.ª ed., pg.
23
301 ) (diversamente do que sucede na confirmação após o veto do art.º 136.º, n.º 1):

i) pode promulgar, até 20 dias após a recepção;

ii) pode não promulgar;

iii) após decorrerem 20 dias sem que tenha havido promulgação, o


decreto considera-se definitivamente vetado24, sendo vedada a promulgação.

O Professor PAULO OTERO entende, porém, que existe uma excepção a essa faculdade
de promulgação, no caso de estar em causa um direito, liberdade e garantia, em virtude de os
preceitos que os prevêem serem dotados de aplicabilidade directa e vincularem todas as
entidades públicas (incluindo, portanto, o PR).

Neste caso, haveria, pois, um dever de não promulgação

PAULO OTERO, Ensaio sobre o caso julgado inconstitucional, pg. 145;

b3’) A AR pretende confirmar, mas sem atingir a maioria de 154 deputados;

se o decreto for enviado ao PR, este não o pode promulgar (promulgação vedada).

23
Para maior desenvolvimento, v. PAULO CASTRO RANGEL, O Tribunal Constitucional e o
Legislador, in IDEM, Repensar o Poder Judicial, pgs. 148 ss.
24
AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS, Promulgação, pg. 578. A regra é contrária em relação à
passagem do prazo no veto político.
A faculdade de promulgação (ou de assinatura) afigura-se uma via
de equilíbrio entre o órgão representativo e o órgão de fiscalização da
constitucionalidade (JORGE MIRANDA, Manual…, VI, 3.ª ed., n.º 78.IX, pg. 269; cfr. MARGARIDA
SALEMA, Veto, in Polis, 2.ª ed., colunas 1488-1489) (considerando, porém, que existem
casos de redução dessa discricionariedade a “zero”, designadamente
quando esteja em causa o conteúdo essencial de um direito, liberdade e
garantia, em virtude dos 1.º e 2.º incisos do art.º 18.º, n.º 1, PAULO OTERO,
Ensaio sobre o caso julgado inconstitucional, pg. 145; utilizando o idêntico raciocínio análogo, numa
hipótese diversa, em que inexistiu fiscalização preventiva, encontra-se em DIOGO FREITAS DO AMARAL /
PAULO OTERO, O valor jurídico-político da referenda ministerial, pg. 55).

B) O TC não se pronuncia pela inconstitucionalidade

 novo processo  aplica-se o art.º 136.º, n.º 1 (“No prazo de vinte dias
contados (…) da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se
pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da
República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do
diploma em mensagem fundamentada.);

i.e., o PR

i) promulga

ii) ou veta politicamente.

C) O PR desiste do pedido (art.º 53.º da Lei do TC) (o processo termina de modo anómalo.

IV. Quarto cenário – falta dos requisitos de qualificação

a) Casos de inexistência jurídica


Exemplos: a lei foi aprovada sem a existência de quorum de deliberação (menos de 116
Deputados) (art.º 116.º, n.º 2), conducente à inexistência jurídica.

a1) “Se a promulgação tem como função primária a qualificação de um acto frente aos
tipos constitucionais de actos

e se

sem a votação na especialidade de qualquer artigo, número ou alínea


do projecto ou da proposta de lei em causa, tal artigo, número ou alínea é
inexistente por natureza” (JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 85.II, pg. 308)

(Sobre a inexistência por natureza, JORGE MIRANDA, Manual…, VI, pp. 98 e 100-101)

então a Constituição impede a promulgação de um diploma em tais


condições)

(e este princípio vale também para quaisquer outras votações no Parlamento, tendo
em conta as regras respeitantes às diversas maiorias constitucionalmente exigidas – como a
dos artigos 117.º, 168.º, 284.º ou 286.º) (JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 85.II, pg. 308)

JORGE MIRANDA refere que “daqui resulta a necessidade de o Presidente receber


todos os elementos indispensáveis à verificação do cumprimento das normas procedimentais.
Sob pena de se frustrar a sua função de acertamento, quase notarial, ele tem o poder e o dever
de os exigir

- assim como tem o poder e o dever de não promulgar diplomas


juridicamente inexistentes.” (JORGE MIRANDA, Manual..., V, 4.ª ed., n.º 85.II, pg. 308)

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