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Hemoterapia pós-moderna - Paulo Buchsbaum (Crônica escrita em 30/Nov/2010)

Um executivo circunspecto, enquanto toma seu café, folheia ao acaso uma revista de sua
mulher, e se depara com um artigo sobre a auto-hemoterapia, uma técnica que tira o sangue de
uma parte do corpo e injeta em outras, para melhorar mais de 100 doenças.
Então ele solta uma sonora gargalhada. Quem acredita em um absurdo desses?
Uma terapia apregoada como natural, transpondo sangue do próprio corpo, como se o
sistema circulatório não tivesse fazendo o seu trabalho direito!
Mais tarde, com seu laptop black-piano, ele se encontra aboletado em uma poltrona,
assistindo a uma palestra incrível sobre Marketing pós-Moderno (*).
Lá ele fica "sabendo" que quase 350 das 500 empresas do Fortune 500 estão em caminho
de adotar essa nova excitante prática.
Não há mais retorno. Isso veio para ficar. Temos que tomar providências imediatas! Afinal
para que gastarmos tanto com Marketing, se as redes sociais podem fazer todo o serviço?
Ele volta para casa e vê seu filho adolescente lendo uma revista de divulgação científica,
que o palestrante condenou, junto com toda a mídia impressa. A filha está vendo TV, outro
veículo agonizante, e logo começa a pedir insistentemente aquela boneca que faz xixi.
O que está acontencendo?
É fácil ver o ridículo pelo nosso juízo de valores. Rimos da auto-hemoterapia e ficamos
impressionados com o potencial do Marketing pós-Moderno.
Com a diferença, que você ainda poderá estar jogando o "sangue" corporativo no lixo!
Será que o mundo realmente se reinventa o tempo todo ou quem está tentando enganar
quem?
Um doente grave que contrata uma terapia de luz, não está apenas desperdiçando
dinheiro, ele pode estar jogando fora a luz de sua vida.
O prejuízo de uma empresa "comprar" uma novidade pode ir muito além do dinheiro gasto
numa consultoria. A adoção de uma prática questionável consome recursos, tempo, pessoas e,
pode desviar a atenção do feijão com arroz, tão desprezado no "maravilhoso" mundo moderno.
Os embustes no ambiente corporativo são muito mais elegantes e bem embalados do que
enrolações em outras áreas como medicina, moda, estética, eletrônicos milagrosos, etc.
A verdade é que nem todos os gurus, consultores e acadêmicos do universo poderiam
desligar o que há de mais precioso no ser humano, que é o fato de ser racional, e,
portanto, raciocinar.
Lembrem da bolha da Internet que estourou em 2000, quando muitos "especialistas"
tentavam nos convencer que, com a nova economia, o lucro passou a ser supérfluo, e sua
miragem seria mais que suficiente.
É preciso que, além de toda a aparente unanimidade, a novidade tenha consistência,
conteúdo. Se ninguém, por trás de todo jargão sofisticado, consegue traduzir o que de fato
significa tudo isso em algo que faça sentido, esqueça.
Desconfie das revoluções, que derrubam todo o passado e criam uma nova era, onde nada
será como antes no quartel de Abrantes. Já basta a tão falada era de Aquarius, que alguns
disseram, e já devem ter se arrependido, que se iniciaria em 2009.
A verdadeira evolução é paulatina e avança como um trator, devagar, mas com força,
como a vida.
* N.A. - A propósito, existe mesmo o termo "Marketing pós-Moderno', mas aqui está sendo usado apenas como um
exemplo hipotético de modismo.

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