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redesencontros: conversas no Morro

Bernardo Stumpf

Daniel Figueiredo

Mariana Rocha

Thiago de Souza

(organização)

1ª edição

Petrópolis, 2021
Cara pessoa leitora,

Apresentamos a você uma publicação dos redesencontros — um projeto


que integra o programa de chamada emergencial Retomada Cultural RJ,
promovido pelo Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Estado de Cultura e
Economia Criativa, Governo Federal e Lei Aldir Blanc.

A ação se desdobra de uma parceria das artistas e agentes culturais


Bernardo Stumpf, Daniel Figueiredo, Fabia Rossignoli, Mariana Rocha
e Thiago de Souza com os agitadores comunitários Bruno Gonçalves e
Jerônimo Bordignon, coordenadores do Projeto do Morro — centro de
artes e formação técnica atuante no Morro da Oficina, bairro Alto da Serra,
em Petrópolis (RJ).

Inicialmente, a ideia consistia em reaproximar antigas parcerias artísticas


em uma oficina de interações, experimentações e criações comunitárias
(nas instalações do Projeto do Morro) que culminariam na realização de
diversas situações participativas em espaços locais de convivência. Essa
proposta, que parecia viável no momento de sua elaboração, encontrou um
cenário muito diferente do planejado, quando iniciamos a pré-produção do
projeto — em março de 2021, pico da pandemia de covid-19 no país.

Surgiu o desafio: como concretizar o que havíamos proposto e, ao mesmo


tempo, manter o posicionamento ético de evitar e desestimular encontros
presenciais?

E como começar?

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Dizem que no começo era o verbo. Há também quem diga que era o movimento.
Oscilações, forças e tensões. Sinais do não-dito, dos quais o verbo teria
transbordado como num relâmpago.

No começo não havia começo.

Talvez tudo isso seja verbo.

Talvez tudo isso seja movimento.

Talvez tudo isso seja o que chamamos corpo.

Não sabemos. Arriscamos.

Pedimos a Bruno e Jerônimo para criar uma lista de pessoas que eles
considerassem importantes histórica, política, cultural e/ou afetivamente
para a comunidade Morro da Oficina. Entre todas as indicações e tentativas
de estabelecer contato e vínculo de parceria, formamos um grupo de dez
pessoas com as quais nos convidamos a conversar sobre quaisquer assuntos
que lhes interessassem, tendo a oportunidade de apostar na construção de
uma rede cujo abraço vai muito além das individualidades, já que nossas
memórias, vontades e corpos — incluindo os seus, cara pessoa leitora —
derramam luzes, encarnam sons, tons e sentidos, imaginam e ressoam
presenças impossíveis.

Em um espaço de nove meses, Ana Lúcia Faria Chandrette, Ana Lúcia ‘Naná’
da Costa Azevedo, Bruno Gonçalves, Jerônimo Bordignon, Maria das Graças
‘Dona Fia’ Paiva Destro, Marionete Cavalcanti Lima, Marquinho Sapateiro,
Roberta Barcellos, Samuel de Freitas Mattos e Sueli nos deram o prazer de
compartilhar centenas de horas de interações por videochamadas, ligações
telefônicas, aplicativos de mensagem e, muito recentemente, alguns
encontros presenciais.

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Dessa gestação, nasce aqui um recorte daquilo que temos chamado de
redesencontrar: compartilhar e se deixar atravessar por atenções, tempos,
ideias, assuntos, histórias, documentos e materialidades incontáveis;
emprestar-se umas às outras, transformar e ressignificar engajamentos
sensíveis, em relação às nossas práticas de interesse e rotina, aos nossos
jeitos de fazer o que fazemos, e às vontades comuns construídas.

Como um almanaque, esta publicação não tem como foco explicar ou


definir. Não se trata da possibilidade da verdade ou da mentira. O que se
expressa aqui são transcrições editadas e recombinadas de conversas e
entrevistas, colagens e recriações de imagens e gestos compartilhados,
coleções de histórias ficcionalizadas pelo atravessamento de memórias,
jogos de linguagem interessados em replicar processos criativos ocultos.
São medidas daquilo que se mostrou impossível não se compartilhar.
Respostas abertas e respeitosas ao lugar-comum que inventamos, juntas.

Ao longo das dezenas de páginas que compõem as conversas no Morro,


distintas famílias de materialidade se organizam quase que acidentalmente
e cada encontro comunica um arranjo particular de interação entre pessoas,
personagens, histórias, fazeres e lugares. Portanto, sejamos instigadas
a folhear e desfolhear livremente este objeto, e criar nossas próprias
coreografias e dramaturgias. Nos redesencontros, as autorias se misturam,
por isso optamos por não identificar os textos (exceto nas cartas que abrem
a publicação), como forma de destacar o aspecto atravessado da aventura.

Esta publicação quer celebrar encontros e permitir suas continuidades,


tornando-os acessíveis e pertencentes a novas e diferentes pessoas.

Esta publicação é uma conversa de

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& AABB ABC ABELHA ACADEMIA ADALTO ÁGUA ALAN ALCEU
AMAURI AMBROSIA AMI AMILTON ANA ANGELA ANGÉLICA
ASSIS ASSOCIAÇÃO AUGUSTO AVENIDA AVON AZEVEDO
BAR BARÃO BARBER BARBOSA BARCELLOS BATALHA BATATA
BINGEN BITENCOURT BLANC BNH BOENING BOFF BONSUCESSO
CAIO CALÇADOS CAMILLE CAMPINHO CANAL CAPELINHA
CAROL CAROLINE CASAS CASCATINHA CASTELINHO CAVALCANTI
CHANDRETTE CHAPEUZINHO CHARME CHATINHO CHECKMATH
COMETA CONFEITARIA COPACABANA CORPO CORRÊAS CORRIDA
CRISTO CRUZADO CULTURA CURVA DADADO DAIANE DANÇA
DEBBYNHA DECO DEFESA DEIR DENISE DESTRO DEUS DEZ DIANA
DUMBO DURVAL ECONOMIA EDNA EDUARDA EDUARDO EIRICH
ESTADO ESTHEFANIE ESTRADA EUTERPE EXTRA FABIA FABIANO
FEIJÓ FEIJOADA FELIPE FERNANDA FERREIRA FERROVIÁRIOS
FONSECA FORMIGÃO FRANCISCO FREI FREITAS FUBÁ FUNK
GILBERTO GIRO GISELE GLÓRIA GONÇALVES GOVERNO GRAÇA
HELOISA HERMES HILDA HIP HIPERSHOPPING HOP HORTÊNCIA
ITAMARATI IVO JACKSON JAIME JANAÍNA JANEIRO JANET JEFINHO
JUDAS JÚLIA JÚLIO JUNINA JUNINHO JURACI KAIPPERT KAROLINE
LARISSA LEÃO LEI LENA LENYR LEONARDO LEOPOLDINA
LUCIANO LUCINHA LUDMILA LUIS LUISA LUIZ LUIZA LUIZÃO
MÁRCIA MARCINHA MARCINHO MÁRCIO MARCOS MARIA
MARLEY MARQUIM MARQUINHO MARTA MATINÊ MATTOS
MILTON MINAS MIUDINHA MOAGEIRA MÔNICA MONIQUE
MUNDICA MUNICIPAL NANÁ NÃO NARI NATAL NATANAEL NEGÃO NEI
NOEL NOEMI NOEMIA NOSSA NOVEMBRO OBELISCO OFICINA
PANELA PAPAI PASTEL PASTORAL PATRÍCIA PAULINHO PAULO
PETERMAN PETRO PETRÔ PETRÓPOLIS PIPOCA PIRAÚBA POLÍCIA
PRIMOS PRINCESA PRÍNCIPE PROJETO PRONTO-SOCORRO PSS
QUITANDINHA RAIMUNDA RAINHA RAMALDES RAMALHO
RESENDE RETIRO REYMARUS RIO RIOS RIQUINHO RITA
ROLINHA RÔMULO RONALDO ROQUE ROSSIGNOLI RUA
SANFONEIRO SANTCLAIR SANTA SANTO SANTOS SÃO SAPATEIRO
SEBASTIÃO SECRETARIA SENAI SENHORA SENSEI SERRA
SIMONE SOARES SOLANGE SÔNIA SOUL SOUZA SPENASSATTO
THIAGO THIERRY TIA TIAGO TIDA TINA TIO TONINHO TOQUE TRÊS
VÂNIA VASCO VENTO VERA VERMELHO VILA VILAÇA VINÍCIUS VINTE

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ALDIR ALESSANDRA ALICE ALINE ALMOÇO ALTO ALZIRA AMARAL
ANGELITA ANIL ANTHONY ANTÔNIO APARECIDA ARI ARTHUR
BACABAU BACKSTREET BACOLLO BAIRRO BAIXADA BANHA
BATISTA BELLANI BENOÎT BERNARDO BEST BETE BETO BIM
BORDIGNON BOYS BRANCO BRASIL BRUNO CACIQUE CAEMPE
CARANGOLA CAREY CARINE CARLA CARLOS CARMINHA CARMO
CAXAMBU CECÍLIA CEFAS CÉLIA CELINHO CENTRO CEOP CHÁ
CHURRASCO CINEMA CIVIL CLARA CLÁUDIO COLÉGIO COMDEP
COSTA COTINHA CRECHE CRIANÇAS CRIATIVA CRISTINA
DANCE DANI DANIEL DANIELA DARINCA DARLY DAVI DÉBORA
DILMA DINÉIA DININHA DJALMA DOLORES DOM DONA DONANA
ELAZIR ELI ELIAS ELIZANGELA ELZA ELZINHA ENOQUE ENTRA EPA
FABINHO FÁBIO FÁBRICA FAGAM FALCÃO FARIA FÁTIMA FEDERAL
FESTA FESTIVAL FIA FIGUEIREDO FLAMENGO FLÁVIO FLORESTA
FUSCÃO GABI GABRIEL GABRIELA GABRIELLE GANG GANSO GETÚLIO
GRAÇAS GRAHIRZINHO GRUPO GUARANI GUSTAVO HANG
HUK IGREJA IMPERATRIZ INTERNACIONAL ISABEL ITA ITÁLIA
JERÔNIMO JESUS JOÃO JOICE JOINVILLE JORGE JOSÉ JOSIÉLI
KATE KATLEN KEKA KEVIN LADIOMAR LAGOINHA LANIFÍCIO
LETÍCIA LIBERDADE LÍBIA LIMA LOLITA LOPES LÚCIA LUCIANA
LUIZINHO MAGÉ MAIO MAIS MANOEL MANUEL MARCELINO
MARIAH MARIALVA MARIANA MARILENE MARILZA MARIONETE
MAUÁ MEIO MENESES MENOS MIA MICHELE MIGUEL MILITAR
MORADORES MORAIS MOREIRA MORIN MORRO MOVIMENTO
NEIVA NELSON NENÉM NENO NEUCI NEUZA NICHOLAS NICK
OLINDA OLÍVIA OSWERO OTTO PADRE PAGODE PAIVA PALHAÇO
PAZ PEDREIRA PEDRINHO PEDRO PENHA PEREIRA PESSOA
PRAÇA PRAIA PRÉDIO PREFEITURA PRETA PRETO PRIMAVERA
QUATRO-QUATRO-CINCO QUEZA QUINCÃO QUINZE QUISSAMÃ
RAMOS RANCIÈRE RAQUEL REGINA RELÂMPAGO RENATA
ROBERTA ROBERTO ROCHA ROCIAN RODRIGO RODRIGUES
RUAN RUI RYAN SÁ SADI SAFIRA SAMBA SAMUEL SANDRA
SARGENTO SATYRO SAUDADE SCHMIDT SEBASTIANA
SERVIDÃO SEU SHEILA SILVA SILVANA SILVÃO SILVEIRA SIMÃO
STREET STUMPF SUELI TAMANCOLDI TERESA TEREZINHA
TRISTEZA TROVÃO TUPAC TUPPERWARE TVI VALENTINA VANESSA
VITOR VIVI WALDEMAR WERNER WILLIAM WILLIAN YASMIN ZÉ

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Ouça bem a história que vou contar. É daqui desse lugar. Bem no Alto, onde eu
chamo de lar.

Menina pequena minha avó era, quando veio para cá. Meu pai também cresceu
aqui, jogando bola, botão, búlica e soltando pipa. Coisa que eu aprendi tudinho.

Dizem que antes era tudo barro, época em que mãezinha ia para o colégio com
caderno feito de saco de pão. Eu sou do tempo mais moderno, voltava da escola
na kombi sobe-desce dirigida pelo filho do tio Quincão.

Me lembro bem, se a memória não falhar, do tempo do bar da Glória. As crianças


corriam para comprar.

— Grória! Me vê uma groselha.

Docinha. Criança da minha época adorava tomar.

Um pouquinho mais para cima, tinha sim uma oficina. Seu Luiz, um grande
artesão, fazia ali brinquedos de madeira, mas eu gostava mesmo era da serragem
no chão.

Na casa da vó Cotinha eram onze irmãos. Tanta gente que a vizinha, dona
Heloisa, mal conseguia dividir a rapa dos doces que sobrava no fogão.

Tem o Gilberto e a Denise, o Neuci e a Diana, a Marionete costureira, o meu tio


Amilton, tão querido, e a tia Marialva. E assim vamos rua acima e encontramos
a Carminha. A Célia, grande amiga, ajudou a construir nossa capelinha.

Antes de ir para a escola, colhíamos flores para as professoras lá na vó Noemia.


Não posso esquecer da padaria e dos pães quentinhos, de frente para a casa da
Dinéia.

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Um pouco mais para cima, a crechinha da tia Alice. Tão estimada, mulher de
fibra, mulher de garra.

Sobe e sobe sem parar, onde é que nós vamos chegar?

Pelo meio do caminho, encontramos mais vizinhos. Márcia, Maria José e João,
Aparecida e suas promessas, seu Milton e dona Cecília. Não vamos esquecer do
Luizão, da Dona Miudinha, da Naná, Ana e Rita.

O som alto do Fubá, mas não tão alto quanto o do Campinho.

Ladiomar, Patrícia, Getúlio. Terezinha, mãe da Debbynha, minha grande amiga


e filha de seu João.

Chegamos enfim, no ponto final. Mas quem disse que termina aqui?

Bem ali a molecada joga bola, enquanto o Durval com seu radinho de pilha ouve
o Flamengo jogar. O Samuel, lá de cima da janela, fica ouvindo os seus pássaros
a cantarolar.

Me recordo bem depressa das nossas festas.

Tinha teatro, cachorro-quente, pipoca e o palhaço que fazia a criançada


gargalhar. Também me lembro das paquitas, do clubinho na casa da vizinha e do
angu à baiana feito pela dona Mundica.

Se for um pouco mais para lá, vai encontrar a Noemi, o Zé Maria e a Lucinha. A
casa da vó Alice com o Willian a brincar. E se subir as escadinhas, tem tanta
gente por ali… Os meninos da Angelita, a Keka e a Sandra, que está sempre
correndo para lá e para cá.

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Ali na servidão, na descida do lado do bar, as vizinhas Lena, Edna, Lolita e
Aparecida estão sempre a prosear. Por ali também encontramos a Ana Lúcia e o
Bim. De frente temos os quatro filhos do Marquim, a Marta e o Riquinho.

Essa é a servidão onde cresci, dividindo porta com a Regina e a Vivi. As crianças
se reuniam no portão do Paulo Rolinha. Pedrinho e Juninho sempre juntinhos.

Vê se pode um negócio desses. Jogar bola em uma rampa? Essa era a diversão da
vizinhança. E se a bola caísse na casa da Dininha, ela não devolvia. O jeito era
chamar o Silvão para resolver o problema em questão.

Esse é o nosso Morro da Oficina, onde a gente se encontra, reencontra e


redesencontra todo dia.

Petrópolis, 3 de setembro de 2021.

Roberta Barcellos

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UMA CARTA PODE SER FALADA?

(Transcrição de conversas por áudio com outros artistas da minha terra)

Tô falando com você, supondo que você vá compartilhar minhas… Não sei nem se
são observações. Não sei nem qual é o nome do que eu vou falar agora. Um… jorro
pós-leitura sobre esses desencontros, tentando também estar dentro deles.

Fico emocionado com a potência da conversa, que tá muito evidente nessa


escrita, sabe? É um trabalho de escuta forte e sensível, que evidencia essa
potência. Talvez seja alguma coisa que possa tirar a gente desse fundo de
poço, dessa merda que a gente tá vivendo, desse colapso social todo… falando
de Brasil, falando de mundo. A potência da conversa tá toda aí, impressa…
literalmente. Fico muito feliz, muito contemplado com a ideia de que eu
participei mesmo de uma conversa com vocês.

Começo por um ponto que me toca sensivelmente. É que eu conheço um pouco


desse universo, por ser petropolitano. Algumas coisas são muito específicas.
Por exemplo, quando aparece a enchente de 88, o ruço, o hábito de soltar balão
e pipa — hábitos muito presentes na infância petropolitana, na infância de
rua. Eu não era morador do Alto da Serra, mas meu tio e meus primos tiveram
uma oficina de torneiro mecânico no Morro da Oficina. A Igreja de Santo
Antônio… Parte da minha família morava no Alto da Serra, então a igreja
foi um personagem presente. Já teve gente que casou lá, missa de sétimo dia,
batizado… Eu fiz um passeio nessa geografia. Uma experiência que tem a ver
com história, tocando num lugar sensível pra mim.

Aproveito pra falar de uma coisa que tem a ver com a forma desse texto, com a
maneira que ele tá organizado. Tem uma introdução que fala de dança… e parte
de vocês tem uma relação com dança. O texto tem ritmos, é uma coreografia… e
quando ele se dá ao luxo de ter páginas com uma palavra, isso leva a gente para
um tempo de leitura… ou uma coisa que vai num fluxo mais contínuo, começa
uma contagem… ou coisas que de repente te interrompem, te suspendem.

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O texto é uma dança enquanto texto. Tem movimento. Em alguns momentos, a
gente vai prum lugar que, visualmente, lembra poesia concreta. Em alguns
casos é mesmo, né? Aquelas onomatopeias…

Cês tão vendo que eu não tô indo na ordem. Caguei pra ordem. Acho que é
justamente sobre isso… Essa história toda se inaugura fazendo um relato que
é parte do projeto ético… e se é ético, é ético-estético, né? A relação com o
que seria realizado, que tava planejado para ser realizado… e a pandemia
interrompe tudo isso. Acho que a gente ainda vai conseguir, mais adiante, dar
nomes pra essas relações que foram totalmente atravessadas pela pandemia. O
que é você deixar de ver pessoas por, pelo menos, um ano e meio? O que é você
perder familiares? O que é você ter medo de perder familiares e, por isso,
deixar de ver pessoas e deixar de realizar coisas, sabe? O início que relata
esse bastidor de processo tem a ver com o projeto ético. Isso é parte da poética
dessa história.

Essa palavra também é objeto, né? Às vezes, ela aparece de uma maneira
minimalista… A coisa é um título mas é uma coisa por si, é uma frase mas é uma
frase por si…

Outra coisa que quero comentar é sobre a ficcionalização a partir do real.


Essa falsa dicotomia entre o ficcional e o factual… Ela já tá véia, né? A
gente não tem que ficar mais se segurando nisso, mas acho que tá num momento
muito importante da gente pensar sobre… Porque tem-se usado muito a palavra
narrativa, né? Esse trabalho acontece a partir do poder da narrativa e essa
palavra tem sido muito desgastada. Narrativa hoje tem uma falsa equivalência
a “narrativa como ficção” e a “ficção como mentira”. Se você pega a CPI da covid,
os caras toda hora vão falar disso — Senador Fulano está vindo aqui produzir
uma narrativa. Eles não tão falando que ele foi produzir uma narrativa falsa.
Eles tão falando sobre produzir narrativa, e narrativa como sinônimo de
mentira.

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Essa publicação faz o contrário disso. Ela trabalha no limiar… nas bordas e
nos borramentos entre a ficção e o real. Quando fala dos tecidos, da sapateira,
das tecelagens, da Fábrica Dona Isabel… Essa história da vida privada é uma
parte muito importante da história social. E essas pessoas tão só contando
histórias. Aí eu me lembro daquele pensamento do Rancière — No regime em que
estamos, contar histórias e contar a história têm o mesmo peso de verdade. É a
construção da história pelo ato privado, comum e ordinário de narrar… Tenho
preferido olhar pra essas histórias e perceber o quanto elas são poderosas
em fazer eventos maiores. Quer dizer, eu consigo saber a história de uma
comunidade a partir da história de uma família que migra, a partir de como
são feitas as festas… ou como a creche foi construída. Essas narrativas que
são vistas num lugar mais privado têm tido muito poder em contar a história…
em ser a história. Tô muito mais interessado nessa história de Petrópolis do
que na oficial… oficializada… que tá sempre romantizando os imperadores, o
reinado e o colonialismo fodido que a cidade tem.

Quando conta daquela migração… Porque Petrópolis tem uma história de


migração muito romantizada, né? A história da migração alemã é super
sofrida… mas ela acaba fazendo com que não se olhe para uma outra história…
a da escravidão, que tá muito relacionada com a cidade de Petrópolis, mas
praticamente não se fala de escravos. No Obelisco cê tem todos os sobrenomes
das famílias alemãs e não tem nenhum sobrenome de família dos negros africanos
escravizados.

Aqui tem uma migração não romantizada… migração como ela é, sabe? — Tinha
lá um pedacinho de terra… vendeu… comprou uma casinha na cidade, mas não
tinha trabalho e tiveram que mudar pra cá e aí começaram a viver uma vida.
Essa é a história real de Petrópolis, de um povo migrante que vai chegando
pra construir vida e vai gerando os bairros. A todo momento isso volta… Tem
o Jesus negro, tem o Pagode como ritmo… que é uma coisa que se espera pouco
de Petrópolis. Essa cidade imperial não é a cidade do ritmo preto, né? Nessas
brechas aí, a gente vai encontrando uma história interessante sobre a cidade.

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Tem um “jogo de corpo”, quando faz a brincadeira — Peguei a menina pelo
braço e botei a bicicleta nas costas… e vai fazendo a derivação, né? A frase
vai viajando e vira outra ideia. A dança aparece aí de novo. Outra também…
Tem assim — Acontece alguma coisa? Pra uma publicação que tá cheia de
movimento, cheia de acontecimento… essa frase tem um poder, sabe? O livro
é um acontecimento em si… ele é cheio de acontecimentos… Essa frase é bem
emblemática.

Encerro minha correspondência parabenizando a todas as pessoas envolvidas


no trabalho. Tá fino, tá lindo, tá honesto, tá sincero, tá generoso… no sentido
de ser uma partilha de depoimento. Eu vou ouvindo os depoimentos… lendo uma
coisa que tá a fim de ser dividida comigo, que não quer criar empecilhos, que
me tem como amigo. Poderia ser diferente também, né? Às vezes a gente lê uma
coisa que é cheia de obstáculos, de entraves… Também é bom, mas nesse caso
aqui é gostoso, sabe? É fluido poder ler assim. Ler essa experiência assim.

Arrasou, viado. Beijo pra vocês.

São Paulo, 4 de setembro de 2021.

Fabiano de Freitas, o Dadado

(artista petropolitano exilado desde muito tempo atrás)

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O
LANCE
DA
DANÇA
Vinte e quatro de setembro de mil novecentos e setenta e oito. À noite. Eu,
cinco filhos e o marido em uma kombi com tudo que a gente podia trazer.
Aqui a gente ia encontrar um barraco de menos de quatro por quatro metros.
Não tinha banheiro separado, não tinha cozinha separada. Era tudo um
cômodo só, cimentado e de tijolo direitinho, mas um cômodo só. A gente
teve que dividir como pôde. Saímos de lá dia vinte e quatro, umas onze
horas, porque o rapaz que trouxe a gente só podia viajar à noite. Chegamos
aqui na madrugada do dia vinte e cinco.

Esse foi o começo, entendeu? Bastante labuta, muito choro. Mas graças a
Deus, nós chegamos num domingo, e na segunda meu marido saiu para
procurar serviço. Um tempo antes, ele tinha trabalhado aqui, ali em frente
à Praça Dom Pedro na Confeitaria Copacabana, em frente ao Obelisco.
Ele morou e trabalhou ali por seis meses, mas não aguentou porque era
longe da família. Desistiu e foi embora. Lá ele tentou, mas era uma cidade
muito pequena, com pouca possibilidade de trabalho. Um dia chamavam
ele para capinar algum quintal, outra hora para cortar madeira, coisa de
cidade pequena mesmo. Eu ajudava no que podia, lavava roupa para fora,
fazia algumas faxinas, mas não ganhava um salário, porque lá, até hoje, as
pessoas fazem os trabalhos mais por troca de favor.

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Às vezes, ganhávamos um quilo de feijão, um pouco de arroz, uma ajuda…
não tinha aquele salário, aquela diária fixa que nem aqui. Faz uma faxina e,
no final, cem, cento e cinquenta no bolso. Não era assim. Era o que a pessoa
podia pagar. Era bastante complicado.

Nós fomos nos enrolando com a conta onde comprávamos, né? No armazém
que a gente chamava de venda. Aí o vendeiro vendia, a conta ia aumentando,
a gente não tinha condição de pagar, ele começava a segurar… A gente
mandava numa lista dez quilos de arroz e só vinha a metade, entendeu? Uma
situação bem precária mesmo. Graças a Deus, fome a gente não passava,
mas estava vendo a coisa ficar igual bola de neve, a dívida aumentando… E
eu e meu marido sempre fizemos questão de ter honestidade com as coisas,
então a gente foi se apertando.

A gente tinha herdado um pedacinho, um cantinho de terra lá na roça, que


era do meu sogro. Aí dividiu entre os filhos e sobrou uma tirinha pra gente.
Ele segurou enquanto pôde. Quando viu que não dava mais, vendeu pros
irmãos e comprou um lote na cidade com uma casinha… simples também,
mas era um terreno com uma casinha. Aí ficou nessa situação: tinha a casa
onde morar, mas não tinha trabalho para trabalhar. Ele teve que sair mesmo.
Veio, ficou aqui, voltou, tentou de novo lá, não conseguiu. Viemos para cá. Na
terça-feira ele já começou a trabalhar na antiga Casas da Banha, aqui onde
tem o Formigão no Alto da Serra. Perto de casa, não tinha que pagar ônibus,
era assim… bem fácil para ele trabalhar. Isso foi setembro. Passou outubro,
quando foi novembro eu também já estava ajudando em casa de família,
fazendo uma diariazinha, ganhando um troquinho… Coloquei currículo, fiz
ficha lá no BNH e quanto foi março de mil novecentos e setenta e nove, me
chamaram para trabalhar de carteira assinada. Passaram dois anos que a
gente já estava aqui, e nasceu a nossa sexta filha, a caçula.

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Minha mãe, quando veio me visitar

— Vocês estão que nem cabrito, pulando de pedra em pedra.

Era verdade. Era assim que a gente vivia.

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Então assim cara, como eu posso fazer pra desabafar?

UM DOIS TRÊS QUATRO CINCO SEIS SETE OITO

Eu vou pra matinê dançar.

Um passinho universal… que eu acho que existe no mundo todo.

Você CHUTA

UMMM DOISSS E CHU-TAPRA-CI-MA

CRU-ZAA-PERNA

Um passinho basicão.

Todo mundo queria fazer parte.

Galera, de novo.

Todo mundo podia fazer parte.

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De domingo a domingo. Acordava e dormia dançando.

Era só querer e ter disponibilidade.

UM DOIS TRÊS QUATRO CINCO SEIS SETE OITO

Beleza.

Só que no tempo tem o contratempo, né?

Não falo pra me engrandecer.

Tô falando porque é verdade.

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Eu tenho um canarinho aqui que também gosta.

Botou Pagode, Samba, ele canta.

PARARATATATATATA

Eu fico até com pena.

Acho que o pulmãozinho dele vai estourar.

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VÃO
FAZER
UM
NEGÓCIO?
Eu fazia uma pipa. Ela devia ter quase o que… um… vão botar aí uns vinte e
cinco metros de rabiola. Pipa grande, pra tu passar um cerol e cruzar bem
longe. Hoje não dá, cara. O pessoal panha um saco de mercado na lixeira,
faz um papagaio, vai e te corta.

A rabiola eu fazia assim: botava por exemplo uns… meio metro, mais ou
menos… ou mais… quase… um metro, com ela bem juntinha, e depois
ia disfarçando, aumentando ela e diminuindo a fitinha. É rabiola pra
caramba, mas pô, pra uma pipa grandona, mais ou menos aí, uns… vão
botar uns quarenta centímetros ou mais… É pipa mesmo, não é essas cafifa.
Pipa redonda, que leva uma porção de varetas… mas muita vareta mesmo,
pra você poder colar o papel e ela ficar redondinha, sabe? Ainda faz uma
paradinha assim, tipo dumas bandeirinhas dependuradas nela. Eu nunca
fiz não, mas já vi senhor de idade que fazia, muitos anos atrás aqui no
Morro. Era uma pipa, mais ou menos, vou te falar a verdade… quase uns
dois metros de comprimento. Redonda.

A vantagem da pipa, quando faz ela grandona mesmo, com a rabiola grande,
é que quando você consegue desbicar, você puxa ela descendo e se bobear
ela vem até no chão. Tu é obrigado a parar pra ela voltar ao normal e você
subir. E quando arrasta também, ela arrasta alguns metros pra cortar outra
pipa, porque ela tem muito peso, né? Sai arrastando que sai danado.

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Você vai ajeitando ela… no que desbicar, tu faz com a pipa o que você quiser.

Tem uns camaradas aí que só cortam as pessoas com a barriga da linha. A


pipa tá lá no não sei naonde, pessoal tá entrando na barriga e só voando…
só voando… só voando…

Não sei se tu sabe de uma mania… Eu aprendi depois de velho. Quando o


papagaio tá dando de lado, os caras furam um pouquinho a seda com a
ponta do cigarro, pra dar uma equilibrada. A gente botava uma bandeirinha
colada. Papel colado, né?

Eu pego e faço.

Só se não der mesmo, se estiver muito ruim.

A gente vai fazendo, ganhando um trocadinho daqui e dali.

É a vida.

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Minha cabeça fez uma coisa assim, trezentos e sessenta graus

— Meu Deus, a história.

É aquele negócio que eu te falei. Sei fazer algumas coisas, mas não participei
de nenhum concurso, nada disso não… Do meu jeito.

Não vou te dizer que sou expert, mas faço algumas coisas que agradam.

Tive um problema com água invadindo a minha casa e os meninos vieram


para cá me ajudar. Então eu fiz essa galinhada. É uma coisa simples, à base
de frango. A gente frita. Lá na roça a gente mata galinha. Aqui a gente vai
no mercado, compra o frango, corta, frita e faz junto com arroz, cenoura,
cebola e pimentão. Faz soltinho com esse frango… É a tal da galinhada.

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Quando eu era adolescente aqui no Morro, a gente não tinha praticamente
nem atalho. A gente descia pro Colégio Rui Barbosa, aqui embaixo, de
tamanco e… com um bornal — esses sacos de farinha de trigo — cortado pra
fazer tipo uma mochilazinha, entendeu? E tem outras histórias também que
é o seguinte: a gente ia num poço aqui na Lopes Trovão, tomava uns banhos
lá e pegava carona no trem pra subir, entendeu? E outras coisas também:
faltou muita água aqui em cima no Morro. Caminhão pra subir tinha que
botar corrente nos pneus. Aí faltava água, a gente pegava a roupa tudinho,
a mãe da gente ia pra Lagoinha — aqui pertinho, uns quinze, vinte minutos
descendo por um atalho —, pra poder lavar a roupa enquanto a gente ficava
tomando banho numa cachoeirazinha que tinha lá. Daqui a pouco, botava
a roupa nas costas, subia a Lagoinha de novo pra botar a roupa no varal
pra secar. Depois a água piorou ainda mais. Meu pai era cristão… O que
acontecia? A gente chegava da igreja eram dez horas da noite, ia daqui no
ponto final da Lagoinha, levava lata de vinte pra pegar água pra trazer pro
Morro da Oficina. Depois tinha, assim, um senhor que era dono de um time
chamado Guarani. Ele fazia umas festinhas no Morro, bacana pra caramba.
Dava bastante gente. Teve festa aqui dentro do meu quintal. Vendia… vão
botar… vinte caixas de cerveja na festinha.

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O vento entra cortando, ali que vem da avenida, sabe?

Entre a pedreira da Vinte e Quatro de Maio e


a pedreira que vai lá pro Morin.

Ele vem por cima do Extra ali, vem cortando e vem danado.

O vento melhor é quando bate daqui pra avenida.

O vento que vem da avenida pra cá é vento forte.

48
49
MUITA LUTA,
MUITA LUTA…
Artesanal, né? Por exemplo, eu não bloqueio
as placas. Construo elas na mão. Estufa para
sapato não uso. É cola e costura. A gente
continua com pé de ferro, lixadeira… A minha
tem opção lixa, escova, frisador, queimador…
É a alma do negócio, né? Sem ela não dá para
trabalhar. A gente ainda usa a sovela… como uma
agulha de crochê. Faz o ponto na mão.

Primeiro, você enrola a linha no dedo, frisa,


passa a cera, enrola. Aí, para o trançado
no sapato, você usa a sovela que tem uma
ponta fininha — quebrei muitas pontas.
Agora a linha já vem pronta, igual uma linha
de tricô já trançada. Mudou muito… Os saltos
não são mais de couro, são de plástico com
pinho. Todo sapato de mulher já tem um
canhão dentro, um caninho fininho, uma
bitola certa…

Mudou muito, facilitou muito. De primeiro, a


coisa era meio complicada.

53
Na associação, nada de atividade…
Aquilo já tava dando um tédio que a gente não tava aguentando.

— Não vai dar não. Vamos agitar isso aí


porque não tá bom não.

Aí nós entramos. Começamos a fazer Pagode.

Disseram que aqui não dava… que não podia… que a rua era muito estreita…
e nos ofereceram uma kombi sobe-desce. Essa kombi ficou durante muito
tempo com a gente. Muito tempo não… ficou um tempinho. Acontece que não
faziam manutenção, as kombis sempre quebrando, sempre estragando…
Até que um dia nós descobrimos que os bancos da kombi eram feitos de
caixote, aqueles de madeira de feira. Pronto, aí foi um vuco-vuco danado,
nós prendemos a kombi aqui — isso quem sempre fazia eram as mulheres,
porque os homens… A gente tinha muito homem aí pra ajudar, mas na hora
do pega-pega era difícil. Então as mulheres resolvemos prender a kombi
aqui em cima e obrigamos a presença de um… de alguém representante do
poder público. Ficamos até com pena do motorista, tudo… mas não sei se fui
eu ou alguém falou que se ele tentasse descer a gente incendiava a kombi.
O homem ficou com medo, tomamos a chave da mão dele, mas ninguém
ia fazer isso não. Era só pra botar medo e ter um responsável aqui. Acho
que foi nessa época que tiraram a kombi e colocaram um ônibus. Acontece
alguma coisa? Acontece. Agora a gente tem mais força pra exigir e cobrar.

54
Fiz muita faxina. Trabalhei de doméstica e também como
passadeira. Foi assim, bastante variada a minha rotina. Mãe
de família, cuidando de casa e de neto, o que não me faltou
foi atividade, graças a Deus. Me casei com dezesseis e fui mãe
antes de completar dezessete. Avó com trinta e três, bisavó
com cinquenta e um. Meu primeiro bisneto fez dezoito.

55
A gente tem a tradicional fogueira. A família se reúne e bota mais de cem
pessoas dentro de casa no aniversário do meu pai. Os amigos todos já
contam que vai ter festa com fogueira. Meu pai pega madeira no mato e
monta. Fogueirão. Tem gente pulando fogo, tem um monte de coisas. Tu
não lembra não? As paquitas…

59
Quando tem festa nem cabe dentro de casa. Graças a Deus.
Entra genro, nora, namoradas dos netos.

Aí já viu, né?

61
AS
VEIAS
VÃO
ABRINDO
AS
VEIAS
VÃO SE
DILATANDO
Vou comprar uma cartolina pra fazer tipo… a subida do Morro aqui, por
exemplo. Subindo o Morro, na primeira curva tem um atalho que vai pro
Projeto, tem outro que sai na rua de cima. A gente bota as entradas, assim
na curva, né? Aí vai subindo o Morro, tem uma escadaria que sai no ponto
final do ônibus. Continua, vem perto da padaria, pra cima um pouco tem
outra entrada, uma servidãozinha que dá acesso pra rua de cima. Você
segue a rua, vem no ponto final, tem um rodeio aqui, um lugar maior. Tem
um atalho que sai pra Lagoinha, tem o final dessa escada que sai no ponto
final, aí a rua segue e vai sair na descida que sai pro Projeto também.

As comunidades de Petrópolis são setenta.


Eram setenta, agora deve ter umas noventa
comunidades, mais ou menos, com associação.
Ah, quase cem, já deve ter inteirado cem.

65
BAR BNH RUA ALTO ANGU FREI LEÃO PIPA BALÃO CURVA
FESTA KOMBI MORRO SAMBA SERRA VENTO BAIRRO CRECHE
IGREJA MATINÊ ÔNIBUS OSWERO PAGODE PIPOCA VILAÇA
BATALHA CERVEJA CRIANÇA CRUZADO CULTURA GUARANI

OFICINA PROJETO SAUDADE CAMPINHO CAPELINHA


CLUBINHO FLAMENGO LAGOINHA PAQUITAS PEDREIRA
SERVIDÃO CHURRASCO LIBERDADE MORADORES SAPATEIRO
ASSOCIAÇÃO CASTELINHO PASSARINHOS FERROVIÁRIOS

66
aí graças a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graças a deu
entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graça
a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né?
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graças a deus
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entendeu
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né?
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entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graça
a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né? aí graças a deus entendeu né?
SE DESSE PRA
ENGARRAFAR
ESSE RUÇO
E VENDER,
IA GANHAR UM
DINHEIRO, HEIN?
SE DESSE PRA
ENGARRAFAR
ESSE RUÇO
E VENDER,
IA GANHAR UM
DINHEIRO, HEIN?
Daí eu vi uma casa e tava com um dinheirinho guardado. Dei minha kombi,
que valia treze mil, mais uns dois mil… e comprei a casa pra eu morar, lá
no alto do Morro. Tinha uma laje muito boa, e aí eu estiquei meu decorflex,
comecei a dançar e decidi que ia fazer a Primeira Batalha do Barro. O lugar
não tinha a menor condição de fazer evento, só tinha barro, mas eu decidi
fazer mesmo assim. Aí o pessoal pediu pra eu botar o nome de Batalha do
Morro, porque aqui é o Morro da Oficina. Deu trinta cabeças e a premiação
era de cinquenta reais. Toda a batalha que tinha, chovia. Era impressionante.
Imagina um lugar inapropriado pra fazer evento… Eu colocava cem pessoas.
De repente alguém me avisava — Tá chovendo. O que a gente vai fazer? Vai
ter batalha com goteira? Nisso, o pessoal já escorregando e a gente tentando
secar… Eu corria na loja de material de construção, comprava uma lona e
esticava lá na hora. O som alto, comendo solto, o pessoal gritando uhu…
Quando o tempo tá meio ruim, ele não canta. Não sei se ele vê
que o tempo vai virar… Isso é coisa da natureza mesmo.

Tem época que ele… época de muda, né?

E tem o crônico. Faz a muda cantando.

72
GENTE,
É UMA COISA DE
LOUCO
É UMA COISA DE
LOUCO
Extra!
77
78
, em agosto.

79
mas era Alessandra Alice Aline Alzira Ambrosia Ana Angela
Angélica Angelita Aparecida Bete Camille Carine Carla
Carminha Carol Caroline Cecília Célia Clara Cotinha Cristina
Daiane Dani Daniela Darinca Débora Debbynha Denise
Diana Dilma Dinéia Dininha Dolores Donana Edna Eduarda
Elazir Elizangela Elza Elzinha Esthefanie Fabia Fátima
Fernanda Fia Gabriela Gabrielle Gisele Glória Graça Heloisa
Hilda Hortência Isabel Janaína Janet Joice Josiéli Júlia Juraci
Teve gente pensando que era Joaquim, Karoline Kate Katlen Keka Larissa Lena Lenyr Leopoldina
Letícia Líbia Lolita Lúcia Luciana Lucinha Ludmila Luisa
Luiza Márcia Marcinha Maria Mariah Marialva Mariana
Marilene Marilza Marionete Marta Michele Miudinha
Mônica Monique Mundica Naná Neiva Neuza Nick Noemi
Noemia Olinda Olívia Patrícia Penha Queza Raimunda
Raquel Regina Renata Rita Roberta Sandra Sebastiana
Sheila Silvana Simone Solange Sônia Sueli Teresa Terezinha
Tida Tina Valentina Vanessa Vânia Vera Vivi Yasmin
80
Disseram à reportagem — A decoração é com bandeirinha,
com lacinho, com essas paradinha tudo. A gente decora a rua
inteira. Decora tudo. Quando pode comprar bandeirinha —
ou ganhar — tudo bem, mas quando não… folha de revista.
A gente mesmo corta, cola e estica… A rua inteira. Inteira. Os
bares da comunidade fecham pra não atrapalhar o movimento
e gastam com a gente na festa. Barraquinha no quintal,
angu à baiana, tudo feito ali na hora. Fogão, geladeira, a
gente arranja tudo. Tira de dentro de casa e leva. Era assim…
É assim… Na minha casa tem até as toalhas.

81
— Ó, só tem cinco.

— Cinco o quê?

— Cinco tique, e tu?

— Cinco garrafas de cerveja aqui.

82
Por vezes, a gente botava as crianças num ônibus e levava pra
AABB do Carangola. Piscina, futebol, essas coisas…

Almoço, tudo.

83
BATEU VENTO
SUBIU
MERMÃO
O balão que bota fogo no mato é o balão lanternado.

O que está acontecendo? Você compra uma bobina a metros, de plástico, tá


entendendo? Aí você corta ele na metragem que você quer e marra a boca
dele dum lado. Pode encher com um abanador, até com um ventilador.
Depois marra do outro, fecha ele. Fica tipo uma barriga, sabe como é que é,
um tambor grande, tá entendendo? Aí tu bota em cima da laje e o próprio
sol faz ele ir embora. Sobe e vai embora. Você bota uma guiazinha com a
linha, pra não esbarrar em lugar nenhum. Vai embora…

Poucos tempos, subiu um daqui de cima da minha laje. Foi pra lá do


Cascatinha, voltou, passou por aqui… Só cai quando o sol acaba. Foi lá pro
Rio de Janeiro. Tal de salsichão…

Eu tô pra fazer um, botar uma bandeira do Flamengo, levinha, pra ele levar.
Porque eu sou flamenguista.

87
Nunca pensei que me casaria.
Eu cresci ali, ela cresceu ali.
Às vezes, a gente sai para
uma Festa de Santo Antônio,
meu camarada…

Não vai não.


Não vai lá não que tu casa.
Foi lá que eu quebrei.
89
MUTIRÃO
Aqui são três… Três não, né? São
duas casas e uma quitinete. A casa
de trás é a principal, onde minha
bisavó morava. Ela nasceu naquela
casa. A da frente, minha avó
construiu com meu avô. A gente
morava, na verdade, no porão, né?
É a quitinete que meu pai fez com
a minha mãe, debaixo da casa da
minha avó. Quando ela faleceu, a
gente se mudou para a casa de cima.

Meu pai nasceu na casa de trás. A gente vive assim. Em família. Avó, bisavó,
tia-avó, o marido dela, o filho dela e meu pai — que é filho único. Todo
mundo no mesmo quintal. Descendo a escada você dá de cara com a família
da minha mãe também.

93
Fazer uma coisa em benefício de alguém que esteja
necessitando, a gente pode fazer. Pra um só ganhar
dinheiro… aí não, sabe?

Pra um só não.

94
O tecido chegou, vai pro corte. Estica na mesa, enfesta ele todinho, vai
lá e pega… esqueci como é que chama… tipo os moldes, né? Já tá tudo
riscado no papel. Tu bota em cima daquele pano esticado, aí o rapaz…
Cada um tem sua profissão.

Depois vem o cortador. Você já esticou, o cortador vai… O


enfestador enfestou os tecidos, vem o outro que coloca os
riscos. Quem riscou, coloca… alfineta… Pra lidar com seda,
a gente alfineta tudo direitinho. Tem um jeitinho de alfinetar,
tá? Senão espeta o dedo e não espeta o tecido.

Aí vem o rapaz com a máquina e corta aquilo tudinho.


Depois tem a seção de separação, mas ali já tá tudo escrito:
a gola quarenta, com a manga, com o punho, com a frente,
com as costas… tudo escrito nos desenhos por cima. Tipo
um bolo. Aí vai tudo pra separação. Tem as meninas da
separação que vão contar, vamo supor… pra ficar mais
prático de entender… de dez em dez. Dez mangas, dez
golas, dez punhos, dez frentes… E é tudo numerado. Ó,
tem que ter uma cabeça… que vou dizer.

Hoje em dia sai tudo do computador, tá? Tem a máquina


que tu bota o desenho, bota o programa… Vamo supor

— Quero uma camisa polo. Tamanho P, M, G, GG, extra G.

— Tá.

A máquina já vai sair com o desenho lá na frente, tudo riscadinho. Só vai


jogar ali em cima, né? Na hora de cortar, ela já sai também com as tirinhas,
tudo pra você colocar, fazer os embrulhadinhos… E já tá escrito ali.

96
Botava crachá em todo mundo.
Quando chegava no pé do Morro, ninguém tinha crachá,
já tinha descolado, trocado, jogado fora…
Era um tal de catar criança…

Meu Deus, se eu perco o filho de alguém.

97
NÓ DE TECELÃO
Minha avó e meu avô trabalharam em fábrica até se aposentar. Uma na
Dona Isabel, outro na Cometa. Ele diz que era noivo de uma prima dela e,
nessa de frequentar o Morro, se encantou. Certo dia, perguntado por um
amigo sobre quando iria se casar, ele pegou na mão da minha avó e disse
— Quando ela quiser. Foi aí que ele terminou o noivado e começou a namorar
minha avó. Logo se casaram.

Meu avô tinha duplo serviço. Sempre trabalhou com sapatos, em paralelo.
Ele aprendeu bem novinho, com um vizinho dele, acredito que do Caxambu…
não tenho certeza. Provavelmente tenha aprendido com o cunhado,
que sempre foi sapateiro. Depois que ele se aposentou, assumiu de vez a
profissão.

Aí meu pai, quando tinha mais ou menos dezesseis anos, decidiu que não
queria mais estudar. Falou que queria trabalhar. Meu avô pensou — Vou
colocar ele pra ralar bem cedo e ele vai desistir. Desistiu nada. Meu pai começou
a trabalhar cedinho com meu avô, que sempre foi muito rígido… e deu
conta. Quando meu pai fez os dezoito anos, apareceu uma pessoa que tava
querendo passar um ponto de sapataria lá no centro da cidade… e ele pegou.
Meu avô pegou pra ele, né? A partir dos dezoito anos foi que meu pai passou
a assumir a sapataria. Meu avô ficava num ponto e meu pai em outro, os
dois no Centro, um ali pela Paulo Barbosa… a primeira loja do meu pai.

101
Depois meu avô veio pro Alto da Serra e falou pro meu pai — Eu tô pegando
outra, vem pra cá. Aí meu pai foi, pegou a Padre Feijó, que é ali perto de onde
ele tá agora. Ele tava lá há uns vinte e cinco anos já, muito tempo de Padre
Feijó, até que a menina do lado fez alguma coisa, moradora ali, e desmoronou
um pedaço da casa dela que é colado na sapataria. Aí a proprietária pediu
o imóvel. Pouco tempo depois pegou fogo… Caiu tudo, né? Meu pai tinha
saído um pouco antes, graças a Deus… As coisas acontecem do jeito que tem
que ser. Se tu passar ali tu vai ver, tá tudo escombro mesmo, tá tudo caído. E
assim, todo mundo ligando em desespero, porque meu pai tava lá há muitos
anos… A gente teria perdido tudo. Meu pai e minha mãe não trabalham com
banco, eles são tudo do tempo do Epa.

Enfim, a gente teve que correr pra achar outra lojinha. Acabou que achou
uma pra alugar na entrada do Morin.

Aí o que aconteceu? Minha mãe casou com meu pai com dezenove anos. Ela
tava fazendo o último ano do ensino médio e trabalhava na Chapeuzinho
Vermelho, na Rua Teresa, que era… acho que uma loja de roupa infantil.
Pra casar, dizem que naquele tempo era comum a mulher largar tudo pra
ficar dona de casa. Ela largou… estudo, trabalho… e ficou dona de casa.
Eles acharam que logo em seguida minha mãe ia engravidar, mas ela não
engravidou. Ficou durante seis anos sem trabalhar, só dentro de casa e não
engravidava. Até que veio minha irmã e, dois anos depois, veio eu. Ela ficou
dona de casa e mãe. Tempo integral. Aí ela pegava pra vender revista… essas
Avon, Hermes, Abelha Rainha… ela vendia essas coisas tudo, e vendia muito,
tá? Ela era premiada. A gente tem várias coisas em casa que ela ganhou da
revista por bater meta.

Quando eu tinha mais ou menos uns doze ou treze anos, meu avô precisou
fazer uma cirurgia de coração… Como que é o nome?… Cateterismo. Ele

102
precisou ficar afastado, né? Então ele chamou a minha mãe pra ficar de
atendente. Ela atendia, pegava os serviços, meu pai ia à noite e fazia… Ele
continuava na sapataria dele e à noite pegava no serviço do meu avô, pra dar
conta, né? Só que a minha mãe começou a se enfiar lá e fazer uma coisa ou
outra, e costura… Minha mãe sempre costurou e sabe fazer tricô também.
Aí ela começou a fazer essas coisas lá. Conserta bolsa aqui, costura coisa
ali… Quando meu avô voltou, ela continuou com ele por oito anos. Ele não
mandou ela embora e ela continuou. Acabou que se desentenderam… Ele se
desentendeu — meu avô é rabugento, meu filho… essa é a verdade, né? Ele
é e vou te falar, já fizeram até Judas dele lá no Morro.

Minha mãe ficou chateada e falou — Então é melhor eu não voltar. — É, melhor
tu sair. Minha mãe ficou, né?… O orgulho… — Não vou voltar mais. E aí o que
ela começou a fazer? Faxina. Ela já tinha entrado no mercado de trabalho e
não queria parar de ter o dinheirinho dela, mas ela não gostava muito.

Eu passei por muitas questões de saúde, muitas cirurgias… Numa dessas,


fiquei afastada um ano da empresa que eu trabalhava. Quando eu voltei, me
demitiram. Eu tava recém formada na faculdade e fiquei bem triste, bem
frustrada… Crise, né? A gente tava entrando em 2015, Dilma saindo… Sei
lá, uma doideira. Aí o que aconteceu: com o dinheiro da minha rescisão de
contrato, meu avô decidiu se mudar pra Minas com a coroa dele lá. Minha
avó faleceu bem nova, com sessenta e dois anos, e ele se juntou com essa
senhora que tá com ele até hoje, né? O filho dela tem uma casa lá em Minas
e eles decidiram ir pra lá. Aí ele falou assim pro meu pai — Ô, você quer pegar
a minha loja daqui de cima? Meu pai ficou — Pô, será que eu vou dar conta?
Como ele sabe que a minha mãe ama a sapataria com tudo na vida dela, e
não gostava de trabalhar com faxina, ele falou assim — Você não quer pegar
a sapataria do meu pai? Tu assume lá e vê o que vai dar.

103
Minha mãe ficou com muito medo — Ah, não vou pegar não, porque não sei se
eu vou dar conta. Vai que não dá, vou ficar com dívida pra pagar. Tem que pagar
aluguel, tem que pagar um monte de coisa. Aí eu falei assim — Mãe, eu to com
o dinheiro da minha rescisão. A gente pega a sapataria juntas. É um jeito de eu
estar trabalhando, e se der tudo errado no primeiro mês, eu tenho dinheiro pra
pagar as despesas, a gente fecha a porta e cabô. Vamo tentar. Aí fomos nós.

Minha mãe não largou a faxina. Ela fazia pelo menos, acho que… duas vezes
na semana. E a gente ficou assim… Eu ficava na loja os dias que ela não
podia e, quando ela podia ir, tinha dia que eu ficava com ela e tinha dia que
ela ficava sozinha. Eu costurei um monte de coisa lá também, fiz um monte
de coisa. Aí o que aconteceu… Chegou no final do mês, deu muito certo o
negócio e minha mãe falou assim — Então tu vai seguir a tua vida, tá? Isso
aqui não é pra tu não. Tu é formada, vai atrás de alguma coisa. Aí eu falei — É,
preciso correr atrás de alguma coisa, porque a minha mãe como sócia… ela tá
me passando a perna. Eu trabalhei de graça mesmo, foi isso. Ela ama… e é
raro, né? Acho que eu nunca conheci outra mulher sapateira.

104
Tem o algodão. Do algodão, faz um pavio fininho que vem numa bobina.
Dessa bobina, o fio desce, você emenda ele e sai enrolando no… como é que
eu vou te explicar? Tem uma espula. Ele sai da caldeira grossão, vem pra
essa máquina de fiadeiro, fininho. De fininho vai enrolando e sai a linha
pronta pra tecelagem, pra fazer o pano. O processo vem dum fardo, do fardo
pra caldeira, pra sair tipo dum algodão grosso, pra fazer essas bobinas, pra
fazer a linha. É um troço bem feito, só a pessoa vendo… Um fardo de algodão
virar uma linha. Aí tem uns maquinários e as coisas vão se aperfeiçoando,
né? Eu trabalhei de tecelão também, mas não aperfeiçoei. Meu pai tinha
cinco teares antigos em casa. Meu pai era tecelão.

105
COMISSÃO DE
MULHERES
109
110
Se eu quiser juntar uma turma pra poder fazer, eu vou juntar, entendeu?

— Ó, gente, vamos juntar.

E é assim, eu gosto de tratar das pessoas, gosto de dar comida…

O mutirão da capina é engraçado. Aquele caminhão enorme, desce um, dois,


três… Pô, fui contando, veio quinze homens pra cá. Meu Deus do céu, fazer
café pra isso tudo. Aí eu já vou com a chave da associação na mão.

— Vou dar o café pra vocês, vou colocar lá em cima da mesa, mas não vou dar
na mão de ninguém não, que eu não posso. Tenho que trabalhar. Aí eu botei
o café, já deixei tudo adoçado direitinho em cima do fogão, os tabuleiros
tudo cortadinho de pão com manteiga, o bolo que eu ganhei da padaria —
eu ganho salame dum, presunto do outro, é tudo assim. Aqui em cima todo
mundo se ajuda. Todo mundo me ajuda.

— Ô tia, de tarde tem café?

— Pô, cês nem tomaram café da manhã e já querem o da tarde?

— Não, a gente quer saber, porque falaram que aqui a senhora trata muito bem.

— Ó, só que eu tô cheia de serviço. Sexta-feira pra mim é enrolado.

Aí eu não fiz almoço. Eles tinham que trazer o deles mesmo. Mas nem todo
mundo traz sexta-feira, porque é dia de receber. Aí falei — Quer saber duma
coisa? A padaria aqui em cima me deu quinze franceses, a de baixo me deu
dez, eu ganhei bolo também… Eles comeram bolo, né? Foram tomar café já
eram quase onze horas porque não queriam parar o serviço. Sobrou muito
pão. — Vou fazer uma panela de cachorro-quente. Eu tenho um aparelhinho
da tupperware… é muito bom. Tu bota, tritura tudo, tu só puxa com a mão.

111
Ah, naquilo eu sou rapidinha. Piquei a cebola, piquei tudo… — Porra, não
tem alho. Aí fui pedir ali na padaria. Não tinha alho também. — Hoje vai ser
só cebola.

Eles tinham acabado de almoçar. Enquanto eu fui na padaria buscar o


refrigerante… de doação, né? Esqueci de pegar de manhã. — Na hora do
almoço eu pego pro lanche deles da tarde. Sexta-feira, geralmente, eles
largam três horas. Quando eu cheguei na associação tava todo mundo de
pãozinho na mão.

— Gente, na pandemia cês não pode pegar pão na mão.

— A senhora não deixou guardanapo.

— Não era pra comer agora.

Também não arrumo nada não. De manhã eu passei manteiga no pão de todo
mundo, mas não vou ficar aqui servindo cachorro-quente pra esse monte
de homem, não. Deixei uma conchinha lá. Com a colher vão demorar, né?

Um senhor virou pra mim e perguntou

— Por que existe associação de moradores?

— Existe pra gente poder ir lá pedir.


Se a gente não pedir, não vem, né?
Se a gente não for lá pedir, não vem.

112
113
O Pinga canta assim

PIU TIRATIAÇO

PIU TIRATIAÇO

Já o Corta Capim

TOM TOM TRIM

TOM TOM TRIM

CASA NELSO

Fala direitinho

Tem muitos cantos, brincadeira não

Tem o PIU SEM DONÇA

o JACATIRONÇA

o CAÇAR FAROFA

Tem muito mais

119
RI TIATIAÇO

TIL TIATIAÇO

PIL TIATIAÇO
IL TIATIAÇO

IL CAÇARAÇO

CATIALÇO

CURRICUTILS

SIDRA TIATIAÇO

JOÃOZINHO

SÃO JOSÉ

TEMPO QUENTE

QUE QUE EU FIZ MEU DEUS

120
O Caxambu diz

TEU TIO JOAQUIM FOI

O Baiano deve dar umas três notas e dá um FOI.

Ele corta uns sons e faz FOI no final

O Teresópolis dá a mesma cantada do Caxambu,

só que um canta mais lento e outro mais rápido

Tem o Boca Mole…

121
Meu marido é flamenguista, mas eu não ganho nada com isso,
não é verdade?

Não vai a gente trabalhar pra ver… Eles estão cheios do dinheiro.

122
123
LEVA FRITO
MURCHINHO
É MAIS GOSTOSO
A gente tinha um espaço muito bom pra fazer festa.
Pegava o entorno todo do final da rua. Ficava bom pra
caramba. Vinha gente de fora, vinha carro e tudo.
Muita gente mesmo. Tinha festa das crianças, da
primavera, almoço, feijoada, natal, festival de
pastel, festa junina — a nossa era em agosto, pra
não conflitar com as festas dos outros bairros.

Uma comissão de mulheres organizava, e o


pessoal ajudava… Montar barraquinha, pedir
doações. A gente pedia no comércio local, na
Rua Teresa, aos vereadores… A gente fazia
ofício e pedia.

Festa das crianças, por exemplo, não podia faltar


presente. Pô, não podia… E tinha sempre refrigerante
e bolo no final… Cachorro-quente. A gente fazia
com tudo, filhim. Seu João da Pipoca dava aquelas
pipocas de canjica, aquele monte de saco…

No natal, só de ver a carinha da criança ganhando um presentinho… Nada


paga. Nada paga. Uma vez nós ganhamos bicicletas… seminovas.

127
Acho que foram umas quatro… Quatro não… mais, seis… umas seis bicicletas,
mais ou menos. Seminovas.

— Como que a gente vai fazer com seis bicicletas e tantas crianças?

Todo mundo — Eu quero, eu quero. Eu quero, eu quero…

Damos de acordo com a idade. Vamos fazer um sorteio. Lembro como se


fosse hoje. A menina que ganhou, nem encostar ela… porque ela ficou assim,
tão feliz, tão feliz… que nem encostava na bicicleta.

Aí eu botei a bicicleta nas costas, peguei a menina pelo braço e levei ela em casa.

Botei a menina nas costas, peguei a bicicleta pelo braço

Botei a bicicleta no braço, peguei a menina pelas costas

Botei o braço da menina nas costas da bicicleta

Peguei a bicicleta pela menina, botei as costas no


braço e levei elas em casa, mais ou menos…

A gente tinha um palhaço na comunidade. Palhaço


Cruzado. Ele animava as festas, fazia fantoche…
No natal, se vestia de Papai Noel e subia o Morro
todo, meia-noite, tocando o sino. Todas as
festas tinham a participação dele. E a gente tinha
um palco de atrações, né? Tal hora isso, tal hora
aquilo. O Cruzado era sempre cedo, por causa das
crianças. Tinha um conjunto de umas meninas que
dançavam… Tinha grupo de Pagode. O último ou o
penúltimo foi até às quatro horas da manhã.

Nós trememos o Morro.

128
129
130
131
Um rapaz no papel de Jesus Cristo, carregando a cruz…
Começa lá do principio, vai subindo… fazendo as estações…
pra fazer a crucificação lá em cima no ponto final.

Nosso Jesus é negro.

132
133
ELE
DANÇA
BATE
PAGODE
ELE
E
OS
FILHOS
DELE
É ASSIM
137
Acredito eu que todo dançarino quer se soltar mais quando tem público.

Então eu acho que era o público me olhando, né? Porque eu percebia que
tava chamando a atenção… aí eu queria me destacar.

E eu acho que a música também… Nossa, mermão, ainda mais quando vem
aquela que tu realmente gosta muito…

TUM TUM TUM TUUUM TUM TUM TUM


TCHÁ
TSS
(ESTALO)

138
UUU
UAN TCHU UAN TCH
DO FOR LOVE
IUL DON RÉVI UEI
ISDAN LA-RA-IÁ…

Caraca, mermão, eu ficava louco, né?

Apesar de que eu não lembro…

não tocava essa música na matinê.

Tocava mais Charme.

139
VOU CONTAR
SÓ MAIS UMA
COISINHA…
Depois do almoço tinha a distribuição dos picolés, né? Aí tô vendo
aquele pequenininho com uma mochila, arrastando…

— Meu filho, o que cê tá levando aí nessa mochila que tá tão pesada?

Tinha mais de vinte picolés.

— Vou levar pra casa.

— Vamos distribuir aqui mesmo…

145
Quando vim morar aqui, eu tinha vinte anos. Casei e vim. Faz cinquenta e
três anos. Aqui era muito sacrifício, porque… começando pela água. Nós
tínhamos o mínimo. Eu tenho um poço no quintal, que agora tá fechado,
né? Nós conseguimos água, realmente. Mas era aquele… O falecido meu
sogro, que também é uma pessoa importante aqui, foi ele que conseguiu.
Muita luta depois que ele comprou a casa aqui. Ele conseguiu bombas, pra…
Colocou ali onde tem a polícia militar, aqui embaixo. Ali que era a caixa
— não sei se ainda é, se a água que vem cá pra cima passa por ali. Depois
eu não sei como ficou a encanação, a tubulação, mas ele conseguiu umas
bombas que jogavam água pra cima, e a comunidade fez uma caixa. A turma
todinha… fizeram esse reservatório aqui em cima. Parece que tem cem mil
litros. Só que acontecia que as bombas não tinham muita potência… viviam
queimando. Então as pessoas viviam constantemente sem água, porque
aí a bomba tinha que ir pra São Paulo fazer manutenção, né? Olha, era um
sacrifício total…

Depois que surgiu a ideia da água do Castelinho. Fizeram uma represa lá


em cima e, mais abaixo, fizeram uma caixa enorme, que era onde fazia o
tratamento da água pras pessoas. Eu sei que por muitos anos nós recebemos
água lá de cima… e vinha muito suja, sabe? Vinha só com o peso… a altura
de lá com a altura de cá, não precisava de bomba, porque só com o peso da
descida, ela subia aqui, entendeu? Aí passava pelas pessoas que moram em
cima da caixa d’água, na beirada do Lagoinha, e vinha pra esse reservatório
que era distribuído pra gente. Só que chegou a um ponto que ninguém podia
usar a água, porque rolava churrascada lá em cima…

Acho que depois de oitenta e oito, que teve a enchente, aquele problema com
a barreira. Tinha uma pessoa pra tomar conta da represa — uma casa muito
boa, que o rapaz e a família moravam. Então ninguém naquele período usava.

147
Depois que caíram as barreiras, a Caempe não quis mais resolver. O homem
saiu de lá, porque não tinha condição… com as barreiras não tinha mais
caminho, não tinha mais rua, né? Aí a casa foi demolida, tudo foi destruído.
Só que a nossa água continuava vindo de lá. Aí começou a luta pra tirar a
água de lá.

Então vieram as contenções… Muita barreira, né? Em vários pontos foram


feitos trabalhos. Depois foram as kombis, porque nós não tínhamos
transporte. Aquelas kombis duraram nove anos aqui e era uma coisa muito
sacrificante, né? Porque você chegava ali, descia do ônibus, esperava… E
eram só sete pessoas que entravam. — Então vamos pedir o ônibus. O ônibus
era… motor pra aeroporto, pra plano. Só quando fizeram um motor forte,
como o do ônibus grande, que tem a mesma potência, né?… foi que a gente
conseguiu ônibus aqui.

A creche também foi uma luta. Tinha aquelas creches-lar, que as crianças
ficavam nas casas, a prefeitura dava apoio, mas… sem estrutura nenhuma,
né? Os anos iam se passando e as mulheres seguiam descendo com seus
filhos no colo, debaixo de chuva, debaixo de sol… — Porque não ter uma
creche aqui na Oswero Vilaça? Aí começou outra luta. — Onde? Conseguiram
visualizar um terreno que tinha ali perto da padaria. — Vamos lutar pra que
esse pedaço seja desapropriado. Teve muita gente envolvida…

Nossa creche foi construída, tudo direitinho, botamos lá dentro cadeirinhas


pras crianças, mesa pras professoras, esses negócios assim… Mas aí não
tinha um garfo, não tinha uma faca, não tinha um prato, não tinha um
copo, não tinha nada… — Vão fazer um negócio? Vão fazer um chá de panela
pra creche. Chamamos todo mundo, pedimos e conseguimos tudo. — Quero
comprar um pano pra botar uma cortina na creche. Quanto tu acha que vamos
gastar? — Nada, porque nós vamos fazer um evento.

148
Aí nós fazíamos um almoço. Foi com feijoada que ganhamos mais dinheiro.

Ela cortava a couvezinha na mão. Sentava assim, que nem uma preta véia…
a couvezinha na mão. Cortava cortava cortava tudinho.

— Quantos metros de pano? O que vamos colocar lá? — Eu quero um paninho


xadrez de vermelho. — Então tá bom… — Ó, agora senta e costura, que a gente
não sabe não.

Nossa creche ficou… Cada tijolinho, cada coisa que foi botada ali dentro… Pra
firmar a conquista, reunimos todas as pessoas, demos as mãos e selamos
um abraço em volta de toda a creche.

Hoje em dia a prefeitura tomou conta. É a prefeitura quem banca, entendeu?


Mas não foi construído pela prefeitura. É isso mesmo que acontece. São as
nossas conquistas. Foi muita luta, muita reunião, sabe?

149
EU PEGO MINHA
CAIXA DE FOTOS

VOU OLHANDO
E VOU
LEMBRANDO…
TROÇO
MUITO
LINDO
MESMO
Sobre o grupo de articulação criativa

Bernardo Stumpf tem mantido interesses em se reconhecer como pessoa


indisciplinar e autodidata, desejosa de articular distintas formas e condições
de construção de material e experiência sensíveis. Suas realizações têm
dialogado de maneira aberta e atravessada com a produção/agito cultural,
a educação e as artes performativas, sonoras, textuais, gráfico-visuais e
digitais.

Bruno Gonçalves é reconhecido, desde 1999, como um dos mais importantes


agitadores do Hip Hop em Petrópolis, tendo realizado inúmeros eventos em
escolas públicas e comunidades, aproximando cultura urbana, educação e
juventude. Desde 2009, realiza o Projeto do Morro. Sonhador, ama o que
faz, busca servir ao próximo e espera apenas de Deus.

Daniel Figueiredo é comunicador, diretor e editor de arte. Mobiliza


projetos artístico-culturais, bem como comerciais, para os segmentos
publicitário e institucional. Dirige a Netuhria Criações, empresa focada
no desenvolvimento de projetos de arte e comunicação. Suas experiências
artísticas conectam potencial estético e técnica comercial, envolvendo
audiovisual, dança e teatro.
Fabia Rossignoli atua como produtora cultural, com experiência em gestão
e produção de instituições públicas de cultura e turismo, espaços culturais,
casas de show, eventos de grande porte, exposições de artes visuais e
projetos artísticos de diversos segmentos.

Jerônimo Bordignon vive no Morro da Oficina desde 2015 e, em 2016, passou


a atuar no Projeto do Morro, exercendo atividades de auxílio a professores e
alunos, coordenação de inscrições, coordenação de limpeza, manutenção e
obras. É vice-presidente da Associação Projeto do Morro.

Mariana Rocha se dedica à fotografia desde 2011. Tem atuado como diretora
de fotografia em filmes, documentários e videoclipes. Também realiza
registros foto-videográficos em festivais, exposições, peças teatrais, shows
musicais e ações publicitárias. Graduanda em História pela UNIRIO, tem
interesse em anônimos e invisíveis da História e suas memórias. Em 2017,
lançou seu primeiro curta-metragem, o 8M-Petrópolis, que relata a luta
pelo direito das mulheres.

Thiago de Souza é artista desde 2005, interessado em trabalhos que


transitam entre dança, cinema, performance e literatura. Sua formação
técnico-afetiva passa por bailes Funk, dança de rua e balé clássico.
Atualmente é graduando em Teoria da Dança na UFRJ.
Ficha técnica

ARTICULAÇÃO CRIATIVA

Bernardo Stumpf Jerônimo Bordignon


Bruno Gonçalves Mariana Rocha
Daniel Figueiredo Thiago de Souza
Fabia Rossignoli

RELATOS E FOTOGRAFIAS DE ACERVO PESSOAL

Ana Lúcia Faria Chandrette Marionete Cavalcanti Lima


Ana Lúcia ‘Naná’ da Costa Azevedo Marquinho Sapateiro
Bruno Gonçalves Roberta Barcellos
Jerônimo Bordignon Samuel de Freitas Mattos
Maria das Graças ‘Dona Fia’ Paiva Destro Sueli

CONFECÇÃO DE CADERNOS DE CONVERSA

Clara Ramos Thiago de Souza

COORDENAÇÃO EDITORIAL

Bernardo Stumpf

ORGANIZAÇÃO E PROJETO GRÁFICO

Bernardo Stumpf Mariana Rocha


Daniel Figueiredo Thiago de Souza

ILUSTRAÇÕES E FOTOCOLAGENS

Bernardo Stumpf Jerônimo Bordignon


Bruno Gonçalves Maria das Graças ‘Dona Fia’ Paiva Destro
Daniel Figueiredo Mariana Rocha
Fernanda Satyro Samuel de Freitas Mattos
FOTOGRAFIAS

Mariana Rocha

REVISÃO DE TEXTO

Gustavo Bitencourt

LEITURAS BETA

Fabiano ‘Dadado’ de Freitas William Bellani


Roberta Barcellos

AGRADECIMENTOS

Angela Stumpf Darly Rodrigues


CheckMath Josiéli Spenassatto

PRODUÇÃO EXECUTIVA

Fabia Rossignoli

COORDENAÇÃO GERAL E PRODUÇÃO ADMINISTRATIVA

Bernardo Stumpf

REALIZAÇÃO

redesencontros

PARCERIA

Netuhria Criações Projeto do Morro

PATROCÍNIO

Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa,


Governo Federal e Lei Aldir Blanc
Créditos de imagem

FOTOS
acervo Ana Lúcia ‘Naná’ da Costa Azevedo p. 141, 114-1151, 146
acervo Bruno Gonçalves p. 30-31, 60, 140-141
acervo Marquinho Sapateiro/Roberta Barcellos/Sueli p. 93, 104, 1051
capa / p. 4, 24-25, 36-37, 44-451, 50-51, 56-57,
62-63, 68-69, 73, 74-75, 84-85, 87, 88, 90-91,
Mariana Rocha
98-99, 106-107, 124-125, 134-135, 142-143, 150-151,
152-161, 162-163

ILUSTRAÇÕES/FOTOCOLAGENS/MODIFICAÇÕES
capa / p. 1, 3, 33, 35, 412, 423, 494, 532, 592, 615, 66, 716,
Bernardo Stumpf 72, 732, 782, 815, 837, 89, 945, 956, 975, 1105, 1132, 116-
1173, 119, 1216, 1222, 123, 1275, 1282-5, 137, 1495, 170-171
Bruno Gonçalves p. 33, 137
Daniel Figueiredo p. 655, 67, 962, 1132, 1222, 1292, 1332, 152-161
Fernanda Satyro/Samuel de Freitas Mattos p. 18, 19, 132
Maria das Graças ‘Dona Fia’ Paiva Destro p. 55, 109-110
Mariana Rocha p. 29, 67, 152-161
Sueli p. 130-131

(1) modificada

(2) a partir de acervo Marquinho Sapateiro/Roberta Barcellos/Sueli

(3) a partir de foto Mariana Rocha

(4) a partir de acervo Marquinho Sapateiro/Roberta Barcellos/Sueli + foto Hung Chung Chih

(5) a partir de acervo Ana Lúcia ‘Naná’ da Costa Azevedo

(6) a partir de acervo Bruno Gonçalves

(7) a partir de acervo Marionete Cavalcanti Lima


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

redesencontros : conversas no Morro / Bernardo


Stumpf (organização). -- Petrópolis, RJ :
redesencontros, 2021.

Outros organizadores : Daniel Figueiredo, Mariana


Rocha, Thiago de Souza.
ISBN 978-65-996238-0-6

1. Almanaques 2. Arte brasileira I. Stumpf,


Bernardo. II. Figueiredo, Daniel. III. Rocha,
Mariana. IV. Souza, Thiago de.

21-85465 CDD-708.981

Índices para catálogo sistemático:

1. Arte brasileira 708.981

Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129

ACESSE O CONTEÚDO DIGITAL

http://byz.it/rdct

Este livro foi composto em Helvetica, Merriweather, Merriweather Sans e Special Elite,
em corpos e espaçamentos variáveis.

Exemplar digital.

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