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MARIO PRATA:
Do acervo literário de A Gazeta de Lins
à fortuna crítica
TRÊS LAGOAS - MS
AGOSTO/2014
II
MARIO PRATA:
Do acervo literário de A Gazeta de Lins
à fortuna crítica
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Letras (Área de
Concentração: Estudos Literários) do
Câmpus de Três Lagoas da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS,
como requisito final para a obtenção do título
de Mestre em Letras.
TRÊS LAGOAS - MS
AGOSTO/2014
III
xxxxx
IV
PÁGINA DE APROVAÇÃO
___________________________________
Rauer Ribeiro Rodrigues (CPAN/UFMS)
Presidente
____________________________________
Aroldo José Abreu Pinto (UNEMAT)
1° Arguidor
____________________________________
Ricardo Magalhães Bulhões (CPAN/UFMS)
2° Arguidor
____________________________________
Luiz Carlos Santos Simon (UEL)
1° Suplente
____________________________________
Eunice Prudenciano de Souza (CPAN/UFMS)
2° Suplente
Neuza,
AGRADECIMENTOS
A Deus, essência de todas as coisas, razão da minha existência, por ter me sustentado
em todos os momentos desta árdua caminhada.
A família, razão e motivo de tudo isso, Francisco (pai), Neuza (mãe), Josiane (irmã),
João Pedro e Vinicius (sobrinhos), que souberam compreender meus momentos de
ausência, meus momentos de nervosismo, de trabalho, de stress, de neura, de alegria,
que sempre me incentivaram e agora compartilham comigo minha alegria e conquista:
este trabalho também é de vocês.
A meu namorado Evandro, que bem de perto acompanhou o trabalho, que me conheceu
em uma mesinha de estudos (já sobre a obra de Mario Prata), obrigada por acompanhar
as noites em claro, os dias sem fim no computador, por trazer o café quentinho e a
Coca-Cola gelada e por ser a alegria dos dias nublados. Obrigada pelo apoio e paciência
nos dias de inquietação e cansaço.
A meu orientador, Profº. Dr. Rauer Ribeiro Rodrigues, pela paciência, dedicação,
preocupação, zelo e empenho com que exerce sua profissão: o senhor foi um verdadeiro
mestre.
A Mario Prata, que com sua obra me conquistou: suas palavras divertidas tanto me
ajudaram também neste trabalho. Obrigada pelas entrevistas informais, pelas conversas
não gravadas, pelos risos.
À Profª. Dr. Clara Avilla Ornella e ao Profº. Dr. Ricardo Magalhães Bulhões, pelas
preciosas contribuições na Banca de Qualificação.
As amigas Daniela, Ana Paula E Maria Amália, pelo incentivo em prestar o processo
seletivo, pelos livros, pelos conselhos, pelas palavras amigas sempre: vocês foram
fundamentais.
A Carlos Eduardo Motta Carvalho (Didu) por todas as entrevistas, por todas as palavras,
por todos os jornais, por toda a atenção, você foi essencial nesta pesquisa. Muito
obrigada pela generosidade em compartilhar seu material.
À Prefeitura Municipal de Lins, que em seu Estatuto prevê a Licença Especial para
estudo, proporcionando assim a oportunidade de seus funcionários se qualificarem, se
tornando assim, profissionais cada vez melhores, mais envolvidos e mais competentes.
E, por fim, a todos que por um lapso não mencionei nestes agradecimentos, mas que
colaboraram nesta pesquisa: abraços fraternos a todos!
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................... 1
CAPÍTULO I A VIDA....................................................................................... 6
1.1 Um linense de coração..................................................................................... 7
CAPÍTULO II A OBRA.................................................................................... 19
2.1 Obra múltipla........................................................................................... 20
2.2 Teatro, a TV e o cinema.............................................................................. 20
2.2.1 Teatro................................................................................................... 20
2.2.1 Televisão............................................................................................. 29
2.2.3 Cinema................................................................................................. 35
2.3 Literatura..................................................................................................... 41
2.3.1 Livros infantis e infanto-juvenis.......................................................... 44
2.3.2 Livros e coletâneas.............................................................................. 44
2.3.2.1 O Romance policial..................................................................... 45
2.3.3 A crônica............................................................................................. 61
2.3.3.1 A crônica ficcional...................................................................... 61
2.3.3.1.1 Crônica: Olha eu aqui, mãe!............................................... 68
2.3.3.1.2 Crônica: Minhas Bunda...................................................... 70
2.4 Premiações............................................................................................... 74
CAPÍTULO IV A FORTUNA........................................................................... 98
CONCLUSÃO....................................................................................................... 116
ANEXOS................................................................................................................ 126
APÊNDICES.......................................................................................................... 272
X
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
RESUMO
Este trabalho apresenta a vida e obra do autor Mario Prata, de Uberaba à Lins, e de Lins
para o universo literário. Faz o levantamento dos primeiros escritos de Mario Prata,
organizando o acervo do jornal A Gazeta de Lins, localizando o pseudônimo assumido
pelo autor (Franco Abbiati) e apresento outros (Di Franco, Ricardo Amaral, Newton e
Mario Alberto). Inicia a coleta de dados de sua fortuna crítica, demonstrando a
relevância do autor no cenário da literatura nacional. Realiza uma sucinta análise de
fragmentos de sua obra, como amostra da diversidade de sua obra, fazendo um histórico
das colunas sociais e um estudo das crônicas ficcionais, crônicas aliás, presentes na
carreira de Prata, desde o seu inicio, na pequena redação do interior de São Paulo.
ABSTRACT
This work presents the life and work of author Mario Prata, Uberaba to Lins, Lins and
for the literary universe. Does the survey of the first writings of Mario Prata, organizing
the collection of newspaper A Gazeta de Lins, locating the pseudonym assumed by the
author (Franco Abbiati) and others present (Di Franco, Ricardo Amaral, Newton and
Mario Alberto). Starts collecting data from its critical fortune, demonstrating the
relevance of the author on the stage of national literature. Performs a brief analysis of
fragments of his work, as a sample of the diversity of his work, doing a history of the
social columns and a study of fiction, chronicles chronicles also present in the career of
Silver, since its beginning, in small writing interior São Paulo.
INTRODUÇÃO
2
A leitura sempre esteve presente em minha vida, os clássicos no período escolar foram
devorados com prazer e dedicação de estudante, as indicações de leitura na faculdade de
Letras foram seguidas a risca, não por obrigação, mas por prazer. Nomes, muitos
nomes, autores, muitos autores. Sempre fui muito eclética e aprecio a leitura, seja do
que for.
Os caminhos da vida me conduziram a sala de aula e a outra graduação,
Pedagogia, e minhas leituras foram se ampliando, para outros nomes, outras ideias,
outros conceitos, mas o amor pela leitura sempre foi o mesmo, a leitura para estudo, a
leitura informação, a leitura fruição, a leitura para deleite, a leitura para ocupar o tempo,
para se divertir.
Da faculdade para as salas de aulas. Agora o meu papel era outro. Eu continuava
leitora, mas agora precisava formar leitores. E eu percebia que a minha vontade de ler
estendia-se aos meus alunos. Percebia neles o desejo em folhear e conhecer autores e
histórias. Também pude notar que alguns livros agradavam mais, outros menos e outros
nunca eram solicitados. Então, comecei a me questionar: qual o fator que desperta o
interesse do aluno por determinado livro ou autor? Passei para a função de
coordenadora pedagógica e o desafio era maior, formar os professores leitores, para que
esses levassem a leitura até os alunos. E os questionamentos continuaram.
No segundo semestre de 2011 solicitei uma vaga como aluna especial na UFMS
ao Profº Dr. Ricardo Magalhães Bulhões na disciplina ―Tópicos da Literatura
Brasileira- Literatura e Ensino‖, à procura de respostas para meus questionamentos
como docente e como formadora de professores. Nesta disciplina conheci diversos
autores e muitos teóricos que abordavam a temática da leitura. As discussões em sala e
os estudos particulares me auxiliaram a estabelecer alguns critérios entre o que era
literatura de qualidade, para a qual eu deveria ter um olhar mais atento para ler nas
entrelinhas.
Minhas leituras sempre foram das mais diversas, mas as crônicas de Mario Prata
sempre estiveram presentes, por ser uma leitura rápida, bem humorada, contextualizada,
que chamava a atenção e cativava, professores e alunos. A partir daí defini meu projeto
de pesquisa.
Sendo moradora da cidade de Lins/SP e conhecendo a biografia do autor, que
publicamente começou a escrever sob o pseudônimo de Franco Abiazzi, no Jornal A
3
Gazeta de Lins na década de 60, defini que faria o levantamento dos primeiros escritos
de Mario Prata nos arquivos do citado jornal.
Realizei algumas pesquisas sobre o escritor e percebi sua importância no
contexto nacional: as obras publicadas, o engajamento em vários setores culturais no
país. Desde então, Mario Prata tornou-se objeto de minha curiosidade e também de
minha leitura, não apenas suas crônicas, mas as peças de teatro, roteiros para filme,
novelas, romances.
Apesar do meu apreço inicial pelo escritor, a questão da qualidade literária
continuou me intrigando. Será que por ser um autor extremamente conhecido e
renomado, toda sua obra possui um caráter literário ou as questões teóricas devem ser
observadas e pensadas em relação a cada obra? Questionando isto e continuando a
refletir sobre as ideias apresentadas por diversos teóricos, já sob a orientação do Profº
Dr. Rauer Ribeiro Rodrigues a pesquisa foi ganhando vida e a fortuna crítica se tornou
parte do corpus, visando compreender o escritor e sua obra.
Mario Prata é um escritor presente no cenário nacional, possui uma vasta
coleção de obras publicadas e é também um dos mais destacados cronistas brasileiros.
Como escritor, estreou em 1969 com o livro O morto que morreu de rir, no teatro
estreou em 1970 com O Cordão Umbilical, na televisão em 1976 com a novela
Estúpido Cúpido, a partir de então não parou mais, tendo escrito 3000 crônicas de
acordo com informações de seu site pessoal.
Considerando a vasta produção de Mario Prata e sua importância para a
literatura contemporânea, iniciamos a pesquisa com sua vida e seu histórico
profissional, sua trajetória como escritor, de Lins para o mundo. Este material constitui
o primeiro capítulo desta dissertação.
Foi realizada uma pesquisa bibliográfica sobre todas as suas obras publicadas, o
que inclui livros, (coletâneas) de crônicas, livros históricos, livros infantis e infanto-
juvenis, peças de teatro, roteiros de novelas e filmes, novelas, além de contribuições
para jornais e revistas de todo o país. É apresentado um estudo sobre a crônica ficcional,
realizando a análise de quatro crônicas do autor como forma de demonstrar algumas
características principais de sua obra. É apresentado também ume estudo sobre o
romance policial, foco de trabalho atual do autor. Também elencamos as premiações
recebidas por essas obras, compondo assim o segundo capítulo.
4
CAPÍTULO I
A VIDA
centro das coisas. Aluno dedicado estudou no Grupo Escolar e depois por nove anos no
Colégio Salesiano.
Leitor fanático de crônicas, as quais tinha acesso semanalmente através da
Revista Manchete e O Cruzeiro, Mario Prata sempre foi leitor assíduo, e ainda jovem
(quatorze anos) começou a escrever uma coluna social no Jornal A Gazeta de Lins, do
então proprietário Cecílio Abrão, cuja sede e escritório se localizavam em frente a sua
casa, na Rua Oswaldo Cruz. Nesta coluna, de acordo com o site
www.marioprataonline.com.br, Mario Prata usava o pseusônimo de Franco Abbiazzi
para assinar os textos que escrevia.
Em 2012, durante a realização da FLIQ (Feira de Quadrinhos e Livros de Natal),
concede uma entrevista a estudante de jornalismo da Universidade Federal da Paraíba
Kathlen Nóbrega, nesta entrevista a estudante pergunta a Mario Prata se ele era um
garoto normal, se brincava, ou se já sabia que seria um escritor aos 14 anos. Prata dá o
seguinte depoimento à pesquisadora:
Eu era uma garoto absolutamente normal e eu tive uma sorte muito grande,
minha carreira é toda feita de sorte, eu acho que eu tenho mais sorte que
talento, e não estou me modestiando não. Porque meu pai alugou uma casa
em frente ao principal jornal da cidade, que era a Gazeta de Lins, e eu ia lá
justamente por causa de brinquedos. A gente jogava botão, e eu pegava
chumbo de uma máquina chamada linotipo, que fazia os tipos para fazer,
imprimir os livros, jornais, que era de chumbo derretido, e eu ia lá para pegar
o chumbo para fazer o goleiro do jogo de botão, porque com o chumbo o
goleiro ficava pesado e a bola podia bater que não caia para dentro entendeu.
E assim eu conheci o linotipista, e na minha casa lia-se muito, minha mãe lia
muito, minha mãe gostava de escrever, as vezes publicava crônicas no jornal
da cidade, e eu engatinhei em cima de livros. Eu tinha um primo muito
importante na literatura brasileira, que se você não conhece deve conhecer,
que se chama Campos de Carvalho, ele era primo da mamãe e mandava
livros prá ela, e nessa época com 4 anos, eu lia, eu tive a sorte de ler nesta
época os melhores cronistas do Brasil na Manchete, no Cruzeiro e na Última
hora, então com 14 anos eu lia Paulo Mendes Campos, Nelson Rodrigues,
Millor Fernandes, Rubem Braga, Fernando Sabino semanalmente, e isso me
mostrava que a literatura não era aquela coisa chata que me davam na escola,
que eu podia escrever aquelas bobagens que aqueles caras escreviam
entendeu, então eu cresci sabendo que eu podia escrever outras coisas além
daqueles índios chatos do José de Alencar, sabe falsos, e isso me ajudou
muito. Mas nessa idade, com 14 anos, eu escrevia coluna social no jornal, de
brincadeira, falava bem de mim e tal...eu comecei a gostar da coisa, gostar,
mas nunca imaginei...(PRATA, 2012, entrevista anexa DVD).
Mario Prata será um grande escritor. É o que dizia dona Clara, clarividente
professora do Grupo Escolar. Inventou de fazer um jornal da classe e ele
virou redator. Depois o padre Pedro, professor de português do Salesiano,
que achava a mesma coisa. Ou o Cecílio Abrão, da Gazeta de Lins, que
deixava ele escrever a coluna social com o ridículo nome de Franco
Abbiazzi. Tinha o quê? Uns 14 anos, voz de taquara rachada e aparelho nos
dentes. Quando não escrevia ou jogava botão, lia Manchete, que tinha uns
cronistas muito bons. Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Rubem
Braga, Henrique Pongetti. Lia e ficava imaginando se um dia ia escrever tão
bem e publicar em algum jornal da capital. E não é que apareceu a Última
Hora, com um tal de Samuel Wainer, que resolveu dar espaço para o interior?
O Mario Alberto topou. E Lins passou a ter crônica social em jornal da
capital. (ANTUNES, apud PRATA, 1995).
Além de escrever bem, Mario Prata se dedicava também aos esportes, jogava
tênis, e na década de 60, defendendo o Clube Atlético Linense, se tornou Campeão
Noroestino Infantil. Desta fase vem sua paixão pelo Clube Atlético Linense, seu time de
coração, o qual sempre seguiu fiel, mesmo o time estando durante mais de 50 anos na
segunda divisão. A paixão de Mario Prata pelo Clube Atlético Linense é expressada na
crônica ―De Pai para Filho‖, escrita pelo seu filho Antônio Prata, também cronista,
publicada no Jornal Folha de São Paulo, em 17 de janeiro de 2011, (Anexo 01), crônica
que o pai tem, inclusive afixada em quadro em seu escritório na cidade de Florianópolis,
onde mora atualmente.
Uma curiosidade sobre o título de campeão do qual o autor tanto se orgulha foi
exposta pela jornalista Débora Giannini, na Revista da Folha, em 09 de outubro de 2005
(Anexo 02):
O tio do Mario Alberto, era muito amigo do Jorge Jacob, Vicente de Paula
Prata, era dentista em Lins, hoje mora em Minas Gerais, era um dos diretores
do Hospital Sanatório Clemente Ferreira, foi ele que arrumou prá mim o
emprego nas Lojas Arapuã, então a minha amizade por ele é fantástica, vai
até hoje, é uma pessoa que eu tenho consideração, eu amo o Vicente, e ele
me falou, olha Taka eu tenho um sobrinho que escreve, será que você
publicaria a matéria dele? Olha depende, ele escreve bem? Ele falou: escreve.
Bom então manda ele que a gente publica, né. E o Mario Alberto começou a
trazer a matérias, trazia escrita a mão, e nós começamos a publicar, o menino
1
[Informações fornecidas por Mario prata em entrevista realizada através do Skype em outubro de 2013].
10
opinião contrária de familiares e amigos, após trabalhar por oito anos no Banco do
Brasil, pede demissão e abandona a faculdade de Economia.
Com relação a sua saída do Banco e a desistência do curso de Economia, quando
resolveu abandonar tudo e seguir a carreira de escritor, Mario Prata dá o seguinte
depoimento, em 2012, para a estudante de jornalismo da Universidade Federal da
Paraíba Kathlen Nóbrega, na cidade de Natal, durante a realização da FLIQ (Feira de
Quadrinhos e Livros de Natal):
Eu tenho um tio (que é irmão do meu pai) que é padre, e sempre que a gente
tinha problema na família era o padre que intervinha. Meu pai mandou o
padre para São Paulo para conversar comigo, porque ele achava que além de
louco eu tinha virado viado, porque no Banco do Brasil na época (sei lá, eu
tinhas uns 23 anos) eu ganhava um dinheiro assim, tipo 6 ou 7 ‗paus‘ de hoje,
era uma grana, e eu era Oficial de Escrita 050, e pô, foi fazer teatro...na época
teatro era coisa de puta. Até que meu pai foi assistir minha primeira peça que
foi ‗O Cordão Umbilical‘, naquela época o teatro tinha oito sessões por
semana, 32 por mês, e meu pai apesar de médico sempre foi muito bom em
matemática, ele chegou e estava lotado o teatro, num sábado, e ele me
perguntou ‗quanto é que você ganha‘, e eu falei ‗eu ganho 10% do ingresso‘,
e ele perguntou ‗e quanto é o ingresso?‘ que ele não sabia porque eu tinha
dado, eu respondi ‗é tanto‘, e ele ‗e quantos cabem aqui?‘, eu respondi
‗tanto‘, ai ele fez uma conta rápido e disse ‗então quer dizer que hoje vc tá
mil‘ e eu disse ‗não pai, hoje tem duas sessões, eu tô ganhando dois mil‘, ai
ele disse ‗então você está ganhando mais do que eu‘ e eu respondi ‗bem
mais‘. Ai ele começou a ver que o negócio era lega, mas era arriscado,
porque eu não tinha mais nada, eu tinha que escrever para viver, mas as
coisas foram dando certo, e até hoje eu estudo muito. (PRATA, 2012,
entrevista anexa DVD).
Mario Prata fala pouco de sua vida pessoal, mesmo em entrevistas e em fontes
de pesquisa de sua biografia. Casou-se jovem, em 1976, com a jornalista Marta Góes;
dessa união nasceram dois filhos, Antônio (1977) e Maria (1979). O casamento dura
sete anos.
O autor casou-se em 1976 usando tênis All Star e calça jeans; a cerimônia
aconteceu na sala de estar da sogra, em uma casa no Itaim Bibi. A noiva (a
jornalista Marta Góes) estava de vermelho. (GIANNINI, 2005).
Com o fim do casamento, Mario Prata tem muitas namoradas, uma delas tem
influência direta em sua carreira profissional: em 1991 foi para Portugal a convite de
uma namorada, Eugênia de Melo Castro. O relacionamento durou 16 dias, mas ele
permaneceu no país por dois anos, onde teve a oportunidade de trabalhar para televisão,
cinema e jornais do país.
Em 1990, foi para Portugal por amor, a convite de uma namorada nativa, a
cantora Eugênia de Melo Castro. O romance durou 16 dias, mas ele ficou por
lá dois anos. Um dos frutos dessa experiência foi o livro Schifaizfavoire,
dicionário bem-humorado da língua portuguesa falada pelos portugueses, seu
primeiro best-seller.(GIANNINI, 2005).
Eu fui prá lá por dois motivos: primeiro porque eu estava com uma namorada
portuguesa e ela me convidou para ir prá lá, ela era uma cantora muito
famosa...ela me convidou para passar um mês na casa dela e eu fui. O
segundo motivo é que eu estava fugindo do cara que tinha sido eleito
governador de São Paulo, que era o Fleury (que foi aquele cara que teve
aquele problema no Carandiru, com aquelas mortes). E eu ajudei o Fleury no
segundo turno, eu tralhava na Secretaria de Cultura, com o Fernando Morais
no governo anterior e a gente fez uma lista de artistas, porque no segundo
turno era o Fleury e o Maluf, então a gente apoiou o Fleury, toda a
intelectualidade brasileira, e eu que organizei a lista, ai o Fleury queria me
dar o Memorial da América Latina pra eu ser diretor, e as pessoas falavam
prá mim ‗nossa todo mundo de olho nesse cargo e você não quer‘, e o
Fernando Morais vinha intermediar ‗ó, o Fleury quer conversar com você‘, e
eu dizia ‗Fala que eu tô em Portugal‘. E fui prá Portugal. Mas eu ia voltar
depois de um mês, quando já tivesse alguém no cargo, mas ai estava
passando uma novela minha, que eu tinha feito na Manchete, e me
convidaram para fazer um filme na África, em Cabo Verde, de um romance
de um cabo-verdiano, na época eu fiquei meio assim, era uma grana muito
boa, mas eu pensava ‗porra, África, eu não conhecia a África, nada‘. Ai,
quando eu li o livro eu pirei porque era maravilhoso, eu sou amigo do escritor
até hoje, Germano Almeida, ai eu adorei a ideia do filme, fiz o roteiro. Vim
prá cá, conversei com meus filhos que eram adolescentes, conversei com a
mãe deles, a Marta, e os três me deram a maior força, e ai eu fui e acabou
nisso, depois me convidaram prá fazer um projeto para televisão lá, ei eu fiz
e quando eu vi já ia fazer dois anos, já estavam me oferecendo cidadania
portuguesa, e meu filho com 16 anos ‗tomou pau‘ no primeiro colegial, e eu
comecei a achar que eu estava fazendo falta aqui, ai eu voltei, mas foi um
pulo, foi muito bom, quando eu estava lá eu viajei muito pela Europa, foi
muito bom. (PRATA, 2012, entrevista anexa DVD).
Casou-se pela segunda vez com a fotógrafa Luciana De Francesco. Mario Prata
tem um terceiro filho, Pedro Prata (1983) fruto de outra relação.
Mario Prata, nesse período, era uma celebridade, um famoso como utilizaríamos
o termo atualmente, e os jornais da época exploravam isso. Seu retorno de Portugal teve
notas no Jornal “O Estado de São Paulo” nos meses de janeiro e de fevereiro de 1993.
Em 31/01/1993 na capa do citado jornal há uma nota sobre o retorno de Mario Prata, e
no dia 09/02/1993, na coluna Galeria, de Nirlando Beirão, no Caderno 2, há a nota sobre
o desembarque do escritor no Brasil:
14
No mesmo ano Mario Prata começa a colaborar para o jornal O Estado de São
Paulo, sua primeira reportagem no jornal foi em 22 de março de 1993, com uma matéria
intitulada ―Senhor Cunha ou Fred do Caniçal‖, sobre um padre homossexual brasileiro,
morador de Portugal, acusado de assassinato, onde já começa a explorar as palavras de
seu dicionário a ser lançado em abril de 1993.
Em abril de 1993 Mario Prata lança o livro Schifaizfavoire, um dicionário de
português, uma espécie de tradução das expressões utilizadas no português de Portugal.
Mario Prata coletou durante os dois anos morando no país palavras e expressões que
compuseram a obra. É o seu primeiro livro, até então Prata só tinha escrito contos,
livros infantis e trabalhos para televisão, cinema e teatro, sendo um roteirista Portugal.
No mesmo ano é homenageado pela Câmera Municipal de Lins, (projeto do
Vereador Alicio Mendes) com o título de Cidadão Linense:
15
Este site pessoal também falava do início de sua carreira, como redator do jornal
A Gazeta de Lins:
Ele já fez de tudo. Como escritor, se envolveu em todos os setores que a
atividade pode abordar: teatro, cinema, literatura, televisão. Para Mario
Alberto Campos de Morais Prata, escrever é uma profissão séria como outra
qualquer, mas não deixa de ser um grande prazer. Até integrar por nove
vezes a lista dos ‗mais vendidos‘ e, muitas vezes, liderá-la, Mario Prata
passou por algumas provações. O caminho começou em Uberaba (Minas
Gerais), onde nasceu. Ele viveu a infância e juventude em Lins (interior de
São Paulo), e lá descobriu os prazeres da literatura. ‗Eu sempre gostei de
escrever mas, naquela época – anos 50, 60 – não imaginava que isso pudesse
ser uma profissão. Não tive uma formação para ser escritor, acho que fui
educado para ser gerente do Banco do Brasil‘. Seguindo o destino, aos 20
anos, Mario Prata foi gerenciar uma agência em São Paulo e preparar-se para
o ‗futuro garantido‘ que a função lhe ofereceria. Mas o amor pela escrita não
foi abandonado. Desde os 14 anos, ele colaborou com a Gazeta de Lins, onde
foi colunista social, redator e editor. (CHALUPPE, disponível em
<www.marioprataonline.com.br>).
17
CAPÍTULO II
A OBRA
18
Em sua obra, Mario Prata não se restringiu a nenhuma faixa etária: há, nas várias
etapas de sua carreira como escritor, textos direcionados a todos os públicos. Trabalhou
como jornalista, repórter, cronista, redator, roteirista, sendo muito premiado em diversas
categorias. Como podemos observar no Apêndice 2, a produção do autor é relevante,
tendo se dedicado a diversas áreas da arte e cultura de nosso país e exterior. É uma
produção vasta, em diversos setores da atividade cultural.
Em seu site atual (http://marioprata.net), o autor assim divide sua produção: TV,
Cinema, Teatro, Livros e Crônicas; com esse critério, abordamos a seguir a obra de
Mario Prata.
2.2.1 Teatro
No teatro Mario Prata escreveu 9 peças, sendo uma delas Papai e Mamãe
conversando sobre sexo em parceria com Marta Suplicy. Prata tem 4 textos inéditos
para teatro.
19
Mario Prata estreou no teatro em 1970 com a peça teatral O Cordão Umbilical,
que se tornou um grande sucesso. Prata, em entrevista concedida a pesquisadora Karina
Gomes em 2012 relata que a ideia surgiu de uma situação de sua vida, quando era
estudante de economia e dividia apartamento com um amigo linense, Dade:
Mario Prata: Entrei na USP, em economia e não tava pensando em escrever,
ai, não sei como eu conheci um cara, e a gente escreveu um show de calouros
juntos, e a gente fez o show, eu trabalhei de ator no show, fazia tudo [...] e foi
assistir o show um cara chamado José Rubens Siqueira que gostou de mim
como ator e me chamou prá entrar prum grupo de teatro, Sedes, o grupo de
teatro da psicologia da PUC, e ai eu comecei a trabalhar em teatro. Ai, eu
tinha duas amigas que moravam na casa da sogra do Zé Rubens, e elas quase
puseram fogo no apartamento, a Soninha e a ...como é o nome da outra...elas
deixaram um ferro de passar em cima do móvel e saíram, ligado, o ferro foi
caindo e queimando tudo, e o móvel era da velha, dona Filomena, ai essas
duas meninas ficaram na rua, a dona Filomena pôs as duas prá fora na hora.
Elas tavam lá porque eram amigas do Zé Rubens, ai a Soninha foi procurar
outro lugar prá morar, e o Zé Rubens levou elas lá prá minha casa, a Soninha
era a Soninha Braga, que na época era Soninha, trabalhava no Bradesco, e a
outra foi morar comigo. (Não lembro o nome dela...). a outra era atriz
também, e eu morava com um cara que fazia medicina, que era careta prá
caralho, só andava com puta, e ele achou que por essa menina ser atriz ela era
meio puta, isso foi 66, 67, e até que um dia ele apareceu com uma grávida lá
em casa, de uns 5 meses, ele falava que ia levar ela na Santa Casa, fazer uns
exames nela, num sei que, e eu sei que essa puta começou a morar lá
também, nós 4, ai o Zé Rubens falou prá mim: ‗pô, escreve uma peça, vocês
4‘. Ai eu comecei a forçar a ...(puta sacanagem eu não lembrar o nome
dela...) essa menina a andar de calcinha e sutiã pelo apartamento, prá
enlouquecer o Dade, e o Dade ficava louco, e a puta ia trabalhar, eu a puta, a
gente se dava bem...
Karina: Era tipo uma kitnet?
Mario Prata: Não, eram dois quartos, que a mãe dele tinha herdado de um tio,
foi uma sorte, ai eu fui morar com meu amigo de Lins, Dade. Julia Miranda.
(Prata fala o nome sozinho, se lembrando do nome da companheira de
apartamento). Ai eu comecei a escrever as cenas, e a inventar mesmo teatro,
e escrevi minha primeira peça, O Cordão Umbilical, e foi um sucesso filho da
puta, não só aqui em São Paulo, como também no Rio, foi montad no rio
também, Nanini que fez no Rio imagina...e nós todos com 23 anos. (PRATA,
2012, entrevista anexa DVD).
E Prata começa sua carreira teatral ficcionalizando sua própria história: a peça O
Cordão Umbilical tem quatro personagens: Kátia (Grávida de 8 meses), Marco (Marco
Aurélio Cunha Campos de Morais), Gladys Regina (atriz) e Didi (estudante de
medicina), numa história que segundo Rios, 2010, p. 55 ―oferece [...] a espontaneidade
e irreverência de uma juventude que está aí para o que der e vier, apanhando a vida
pelas pontas e dando o testemunho do seu tempo‖.
20
Foi assim sua estreia. Rios, conclui (2010, p. 58) conclui: ―O Cordão Umbilical
é explosão de vitalidade, esta densa, ainda imperfeita e entusiasmante vitalidade que se
derrama sobre o teatro brasileiro. Deve ser visto‖.
Dono de uma linguagem fluente, viva, carregada de uma vibração que se
extravasa em contínuos trocadilhos e achados humorísticos, o autor faz um
primeiro ato de risadas, mostrando sua gente, cinco criaturas, quatro adultas e
um feto que se manifesta apenas no fim, inesperadamente, dando um tranco
violento na plateia.[...] autêntico escritor que em sua estreia construiu uma
história com quatro personagens, fugindo do esquema de duas pessoas em
conflito e sabendo caracterizá-las com habilidade de bom observador.
(RIOS, 2010, p. 55,56).
poder‖ (Anexo 05) elenca algumas das ações do governo de Dionísio (nome dado ao
personagem): Baixa um decreto transferindo o Pelé para o Coríntians, cassa deputados,
declara guerra ao estado da Guanabara (RJ) em decorrência de uma discussão por causa
de futebol, declara a independência do estado do Espirito Santo, que passa a se chamar
Coríntians, estado onde tem dois carnavais e dois natais por ano.
Vinicius de Moraes e Toquinho compuseram o hino oficial do país de
Dionísio. Cantado pelos atores e interrompido pelos aplausos do público no
final do espetáculo, completa os delírios de grandeza e encerra os sonhos
incendiários de sua Majestade Dionísio I, ex-sargento do Corpo de
Bombeiros. (Revista Veja, 1971, p. 94).
A terceira peça de Prata, Fábrica de Chocolate (1979), dirigida por Ruy Guerra,
inova em um tema que, de acordo com o diretor que escreveu o prefácio da publicação
da peça teatral em livro ―é um desafio para todos‖ (PRATA, 1979, p. 9).
Mario Prata sentiu a necessidade deste questionamento, durante o
velório de Wlado Herzog. Porque a tortura, não sendo uma inovação do
regime militarista dos últimos quinze anos (basta lembrar os horrores da
polícia política do falecido senador Filinto Müller, quando chefe de policia
da ditadura Vargas), conseguiu uma proletarização, de baixo par cima na
escala social, na qual o caso de Wlado é um exemplo marcante.
Mas Mario Prata não deixou que a forte emoção pessoal o desviasse
de um questionamento que julgou mais urgente, talvez porque menos visível.
E para isso, eve a preocupação de acrescentar um dado fundamental nesta
terrível história que nos é contada sem pudor, com um humor irreverente que,
pro vezes, rompe a crueza da situação: a de transformar a sua mais direta
ligação com o jornalista e intelectual barbaramente assassinado, num
operário, mais revelador do processo repressivo no corpo social. (GUERRA
apud PRATA, 1979, p. 11)
conversas semissigilosas, por meio de fatos verdadeiros, mas difíceis de provar. E nos
protestos que aumentam à medida que a sociedade civil pode articular um mínimo de
resistência ao arbítrio. Generosa contribuição da dramaturgia ao esforço geral de
coragem e entorpecimento. O escritor quis retratar o brasileiro que tortura o semelhante
como alguém que tem família, se confunde na rua com a multidão e gosta de futebol. O
burocrata da morte. (RIOS, 2010, p. 82)
Impossível não relacionar a coluna social de Mario Prata na década de 60 com a
peça Fábrica de Chocolate. Em 13 de junho de 1963, Prata escreve sua coluna sob o
pseudônimo de Franco Abbiati, no jornal A Gazeta de Lins, fazendo um comentário
sobre a premiação de cinema e teatro, do Prêmio Saci2, se referindo a Ruy Guerra como
o verdadeiro merecedor do prêmio, que foi dado a Anselmo Duarte (Anexo 43). Prata
nem imaginava que este mesmo Ruy Guerrra viria a dirigir uma peça teatral de sua
autoria:
O SACI DE ANSELMO
Saci para o povo é o Pretinho de uma perna só que fica a espera de
alguém em lugares escuros a implorar; me dá um cigarro! Saci para os
artistas é uma estatueta de Vitor Brecheret que todos os anos serve para
premiar o que uma comissão de censura julgar ser o melhor em cinema e
teatro. Há 12 anos isto acontece, e de tanto persistir acabou com fóros de
máximo prêmio.
A semana passada realizou-se no teatro municipal uma dessas
premiações que consagrou mais ainda a Leonardo Vila, ―ator‖ da versão
cinematográfica de ―O Pagador de Promessas‖ e Maria Fernanda, estrêla da
peça de T. Willian ―Um bonde chamado desejo‖.
A consagração começou no cinema, e a Anselmo Duarte foi dado um
prêmio que ignora-se, era um prêmio especial quando Anselmo era o
favorito, pois é um dos únicos na história do sací a obter para si as vistas
gerais após o acontecimento do Festival Internacional de cinema de Cannes.
O prêmio dado a Anselmo era como ―consolação‖ quando o verdadeiro era
de Rui Guerra (português) diretor de ―Os Cafajestes‖, muito severamente
atacado pelos críticos nacionais e estrangeiros. (ABBIATI, 1963).
2
O Prêmio Saci foi uma premiação criada em 1951 pelo jornal O Estado de São Paulo que era dada
anualmente aos melhores da produção brasileira de cinema e teatro. Tinha como estatueta o saci, famosa
figura do folclore brasileiro, símbolo que foi sugerido por um leitor de Rio Claro por meio de um
concurso aberto pelo jornal e esculpido pelo artista Victor Brecheret.
24
Em 1980 Prata escreve Dona Beja, que é classificada como ―escandalosa‖ pela
revista Veja em 29 de outubro de 1980 (Anexo 7):
A peça Dona Beja rendeu a Mario Prata uma das suas histórias no livro Minhas
mulheres e meus homens (1999), sobre o professor Antônio Cândido, vizinho de Mario
Prata (Anexo 8).
Prata relata que sendo vizinho Antônio Cândido, em certa ocasião o professor
foi viajar, passar três meses em Havard dando aulas, e pediu a Mario que recebesse suas
correspondências em sua ausência, além de dar partida diariamente na Brasília bordô de
propriedade do professor. O filho de Mario Prata, Antonio, diariamente dava partida no
carro, e Mario recebia a correspondência, que dentro do primeiro mês não cabia mais
em sua casa e foi levada para a casa de sua sogra na época, Loli (mãe de Marta Góes).
No retorno do professor, Mario Prata foi levar os livros e encomendas recebidos em
uma Kombi, dada a quantidade de material, e relata que aproveitou e pediu ao professor
material, livros, para a peça que estava escrevendo sobre dona Beja. O professor ―meia
hora depois me levou uns dez livros sobre a doida e ainda me confidenciou que era
sobrinho-neto de um dos amantes da dona Beja. Amante este que, casado, tinha tido
uma filha com ela, a Joana‖ (PRATA, 1999, p. 30)
Dias depois, pesquisando no Araxá, descobri um documento
manuscrito, escrito pelo pai do do José Gaspar, farmacêutico da cidade, onde
informava, com toda a segurança, que a vagina da dona Beja era vibrátil,
atraente, deglutante, sucçátil, assimilante e mais uns três ou quatro adjetivos.
Mostrei aquilo ao Mestre, que leu seriamente:
- Interessante. Muito interessante.
E deve ter pensado lá no tio-avô dele que por lá andara e vibrara.
Dois meses depois, estou saindo de um cinema com a Marta Góes e
encontramos com ele. Demos carona para aquele homem sempre, sempre
muito elegante, bem barbeado, terno e gravata, cabelinho perfeito e, sempre,
sempre com o seu guarda-chuva, para sol ou chuva.
Já no carro:
- Como vão os ensaios da dona Beja?
- Estreamos em um mês professor.
- O cenário como é?, perguntou curioso.
Expliquei todo o cenário, feito por um uruguaio.
- Mas já está pronto?
- Praticamente. Por quê?
25
No mesmo ano escreve Salto alto, com direção de Nitis Jacon. No ano de 1994
escreve Papai & Mamãe, conversando sobre sexo, em 1984, em parceria com Marta
Suplicy. No mesmo ano Purgatório, uma Divina Comédia, é montada pela companhia
Teatro cultura Artística.
Sua última peça é Eu falo o que elas querem ouvir (2001), que inicialmente se
chamava O Caçador de Rolinhas e teve seu nome alterado em decorrência do conto de
Grandeza e decadência de um Caçador de Rolinhas, de Carlos Heitor Cony.3
Tem quatro textos inéditos para teatro:
Rê Bordosa, A peça (Vida e morte de uma porralôca) – adaptação dos
quadrinhos de Angeli;
Pilatos: vida e obra – adaptação livre do livro homônimo de Carlos
Heitor Cony;
O Caminho da Roça – tragicomédia;
O príncipe encantado – tradução da peça de Eugênio Griffero.
Prata também trabalhou como ator na peça Reveillon, de Flávio Márcio, no ano
de 1975 (Anexo 9).
3
Informação dada por Mario Prata por e-mail em 21 de junho de 2014.
27
Figura 12 - Ênio Gonçalves (à direita) com Regina Duarte, Mario Prata, Yara Amaral e Sérgio Mamberti
na peça Reveillon.
Fonte: http://astrosemrevista.blogspot.com.br/2012/08/enio-goncalves-nas-novelas-teatro-e.html
2.2.2 Televisão
4
Caso Verdade foi um série da televisão brasileira exibida pela Rede Globo de 26 de abril de 1982 a 18
de abril de 1986, com 152 episódios, onde a cada semana havia uma história diferente, sempre baseada
em fatos reais.
5
Bang Bang – 1989, projeto de novela para Manduri Filmes.
O Testamento do senhor Napomuceno da Silva Araújo – 1991, minissérie em 5 capítulos baseada no
romance do cabo-verdiao Germano Almeida, para a Opus Filmes de Portugal.
Hotel Europa- 1991, projeto de seriado para Herman José, produzido pela Videoarte e Costa Castelo, em
Portugal.
Viva a Vida – 1991/2, assessoria de teledramaturgia para os Palops para um programa da RTP
Internacional de Portugal.(PRATA, 1995, p. 207)
28
A novela Estúpido Cúpido foi a última novela da Rede Globo gravada em preto
e branco, seu último capítulo foi transmitido a cores. De acordo com site
www.memoriaglobo.com.br, o LP da trilha sonora da novela, gravado pela Som Livre,
vendeu mais de um milhão de cópias, superando a marca anterior da novela Escalada
(1975).
José Márcio Penido, em 27 de outubro de 1976 (Anexo 11) afirma:
Estava Mário Prata posto em sossego no Rio de Janeiro fazendo uma
pontinha na peça ―Reveillon‖, de Flávio Márcio, quando de repente, numa
noite de março passado, à saída do teatro, Régis Cardoso cutuca-lhe a
omoplata e, depois de apresentar-se, convida-o a discutir a idéia de escrever
uma novela para a Globo. Prata não apenas aceita conversar como, dias
depois, trabalhar. A emissora pagaria 400.000 cruzeiros ao autor em troca da
seguinte tarefa: escrever 160 capítulos de dezenove páginas cada um,
contendo diálogos e rubricas capazes de rechear 30 minutos diários, entre 25
de agosto de 1976 e 28 de fevereiro de 1977. (PENIDO, 1976).
Uma curiosidade sobre a novela Estúpido Cúpido é que o autor José Saffioti
Filho moveu uma ação contra a Rede Globo acusando Mario Prata de plágio da peça
Anabela no mundo das maravilhas, de autoria de José Saffioti, que nunca foi editada ou
encenada. Na revista Veja de 18 de maio de 1977, Mario Prata afirma: ―Eu, plagiando
minha própria vida?‖ (Anexo 12).
A segunda novela de Mario Prata, Sem lenço, Sem documento (1977) teve 149
capítulos, e foi ao ar de 13 de setembro de 1977 a 04 de março de 1978, sem o mesmo
sucesso e repercussão da novela anterior.
A ideia de Mario Prata era fazer uma novela diferente, com vários temas se
cruzando e ampliando os debates proporcionados pela novela, porém este modelo não
demonstrou bons resultados, pois o ibope da novela caiu e Prata acabou acelerando seis
meses na novela para conseguir concluir as histórias, pois começaram a surgir muitos
personagens sem ‗núcleo‘, soltos.
A principal personagem dessa novela é o desemprego. Ele une todas as outras
numa espécie de cadeia de fatalidades, acasos, coincidências felizes ou
infelizes, e faz de ―Sem lenço, sem documento‖ uma história angustiada. [...]
A falta de trabalho – e dinheiro – é a sina compartilhada pelo casal classe
média, pela família da empregada, pelo rapaz que chegou do nordeste, pelo
garotão que planeja o golpe do baú. [...] Um dos achados de Mário Prata, em
sua segunda novela para a televisão, é que, dessa vez, as empregadas
domésticas não surgem como peças decorativas, têm um lugar na trama. Há
vida inteligente além da porta da cozinha. (KEHL, 1977, p. 154)
30
Sua última novela foi Bang Bang (2005), retornando a Rede Globo após 20
anos. A novela foi ao ar de 03 de outubro de 2005 a 22 de abril de 2006, com 173
capítulos. De autoria de Mario Prata, foi escrita por Mario Prata, Antônio Prata, Ana
Ferreira, Chico Mattoso, Felipe Miguez, Márcia Prates e Reinaldo Moraes, com revisão
de texto de Carlos Lombardi, e este é que, de acordo com Mario Prata, foi o grande
problema, por ele não saber escrever em equipe.
Prata se afastou da novela no primeiro mês de exibição, com um problema de
saúde, nas articulações do ombro. Sobre a novela Bang Bang Mario Prata afirma em
entrevista a Paulo Lima, para a rádio Trip FM, que a novela Bang Bang foi uma
experiência muito dolorida, que o levou inclusive a psicoterapia:
PAULO LIMA: Você tem uma história muito rica em sua obra, mas tem um
episódio que eu queria saber, que eu acho que não foi muito, tão legal assim,
você mesmo estava me dizendo aqui que foi uma passagem difícil de sua
carreira, que é a tal da novela Bang Bang, novela eu tinha a Fernanda Lima,
que também sofreu bastante com esse trabalho, o que aconteceu, e como você
analisa, agora que se passaram vários anos, foi em 2005 né?
MARIO PRATA: A novela Bang Bang é o seguinte: o Mario Lúcio Vaz,
instigado pelo Luiz Fernando Carvalho (era um projeto que eu tinha com o
Luiz Fernando Carvalho, prá fazer na Manchete em 86 quando a Manchete
faleceu), e um dia o Luiz Fernando me ligou e falou ―olha os caras tão a fim
de conversar‖, e ai eu falei ―mas é daquele jeito?‖, ele respondeu ―é daquele
jeito‖ [...]A novela das 7 o público classe C e D tá começando a perceber que
a gente tá fazendo a mesma novela a 30 anos, é a mesma novela, então a
gente queria dar uma mexida nessa novela, ver o que acontecia com todo
risco, e eu comecei...e anovela tinha uma historia bem novela das 7, era um
cara que teve a família toda metralhada, assassinada por um bandido, um
latifundiário no velho oeste, ele tinha 6 anos, ele viu e volta 20 ano depois
para matar o cara que matou a família dele. Na diligência ele encontra a
Fernanda Lima e se apaixona por ela, e ela é filha do cara que ele vai
matar...quer dizer, mais novela das 7 do que isso não existe, inclusive já deve
ter sido feita umas 40 com essa história, só que o que a gente fez, e quando
eu falo a gente é porque foi com a conivência da Globo, foi que a gente tirou
vários ícones que a novela das 7 tem sabe, vários símbolos, que nesses 25,
30, 40 anos foi indo devagar e o público foi assimilando aquilo sem perceber
que dentro dele tinha aquilo, e a gente tirou tudo isso, e quando ele (o
público) viu a novela e não tinha aquilo ele não entendeu. E foi tão violenta a
coisa que o 1º capítulo deu 37, e o 2º deu 29, e uma novela, por pior que seja,
se ela estrear com 37, prá ela chegar a 29 demora 2 meses pro público
perceber que ela é ruim, e não no 2º capítulo, ou seja quase 30% das pessoas
que viram o 1º capítulo não viram o 2º. E eram coisas bobinhas assim (quer
dizer, eu achava que era, mas não era) por exemplo o personagem não falava
sozinho entendeu, então tava proibido de falar sozinho, tiramos várias
coisinhas né, o chão não era de sinteco, do sallon, era sujo, tinha bosta de
cavalo, tal. Tem um negócio que o Gilberto Braga falou prá mim: ―meu se tá
tirando areia de Copacabana e pondo a poeira do velho oeste no lugar, isso
não vai dar certo‖, ele tinha razão. Nós tiramos a areia de Copacabana e
colocamos a poeira do velho oeste, as pessoas suavam, sabe, ficavam
despenteadas, e isso tudo às 7hs e o mais grave é que a gente tirou o
personagem principal da novela das 7, que é o sofá, a novela das 7 é toda
feita em função de um sofá, toda casa tem um sofá e tem 2 mulheres sentadas
33
no sofá 180 capítulos, e agente tirou o sofá, e o povo não percebeu que não
tinha o sofá, mas ele não entendeu.
PAULO LIMA: Sentia falta de alguma coisa...
MARIO PRATA: Sentiu falta de várias coisas, e eu quero deixar claro aqui
que a Globo topou isso até o fim, a Globo mesmo chamava a novela de
abusada, foi uma expressão que eles inventaram lá, e apesar de vários boatos,
da Revista Veja por exemplo que disse que eu fui demitido no 2º capítulo
pelo meu gênero ‗iracível‘ e com uma suposta tendinite calcária, a Globo
cumpriu meu contrato por mais de um ano e meio, eu fiquei recebendo,
foram muito legais comigo inclusive porque sabiam do meu problema no
ombro, tavam acompanhando e eu não tinha condições de fazer porque além
do meu ombro estar estourado eu não conseguia mesmo escreve 42 páginas
por dia, não eram as 19 do Estúpido Cúpido, e quando eu montei uma
equipe, ai eu me perdi, minha cabeça se perdeu, porque cada um dava tiro prá
um lado, inclusive meu filho, e eu não tinha capacidade de liderança, eu
nunca trabalhei, eu tava a 30, 40 anos com trabalhos isolados, só meus, tudo
o que eu fazia era eu, teatro, cinema, literatura, tudo era eu com eu, nunca
dividi isso, então eu não tava preparado prá trabalhar em equipe, ai eu me
retirei, minha equipe continuou, meu filho inclusive e mais prá frente entrou
o Carlos Lombardi, que é um cara eu entende de novela das 7 e o Carlos
Lombardi deu uma ajeitada e a novela foi até o fim, não teve que cortar
nenhum capítulo e tal. Foi uma experiência muito dolorida prá mim, porque
eu não consegui fazer o que eu queria, eu me arrebentei...o braço... eu fiquei
8 meses fazendo fisioterapia e 1 ano fazendo psicoterapia, foi muito violento
prá mim o negócio. (PRATA, 2011, entrevista anexa DVD).
2.2.3 Cinema
Para cinema Mario Prata escreveu 7 textos para longa metragem e 2 curta
metragens. Na categoria cinema Mario Prata elenca na obra Filho é bom, mas dura
muito outras produções (em uma categoria que ele classifica como vídeo-ficção) que
não estão incluídas em sua listagem no site atual. 6
Prata estreou no cinema com os diálogos para o filme O jogo da vida e da morte
(1971), que é uma adaptação de Hamlet, porém a luta no filme é pela liderança no
tráfico de entorpecentes. liderança no tráfico de entorpecentes. De acordo com o site
pessoal do autor www.marioprata.net ―Todas as personagens conservam os nomes
dados por Shakespeare, com exceção de Hamlet, que passa a se chamar João e é
interpretado por Walter Cruz‖ (PRATA, 2013).
Em 1985 produz o argumento para o filme Chico Rei, que conta a história de
Galanga, rei do Congo, que em meados do século 18 é aprisionado e vendido como
escravo.
―Trazido da África num navio negreiro, recebe o cognome de Chico Rei e vai
trabalhar nas minas de ouro de um desafeto do governador de Vila Rica.
Escondendo pepitas no corpo e nos cabelos, Galanga habilita-se a comprar
6
Os Dois – 1990, direção de Adriano Goldman e Hugo Prata.
Sexta-feira, de noite - 1994, direção de Hugo Prata (PRATA, 1995, p. 213)
34
Em 1987, Besame Mucho, peça teatral de Mario Prata vai para o cinema, com
direção de Francisco Ramalho Junior, ganhando diversos prêmios como o prêmio de
melhor roteiro nos festivais de Gramado (Brasil), Cartagena (Colômbia), Figueira da
Foz (Portugal) e Espanha. (PRATA, 1995, p. 215).
Banana Split, em 1988, foi um dos filmes que alcançou os melhores resultados
de bilheteria do ano. Com direção de Paulinho Almeida (Paulo Sérgio de Almeida) o
filme é uma comédia romântica ambientada na cidade de Petrópolis, Rio de Janeiro, nos
anos 60.7
Em 1990, Beijo 2348/72, onde foi co-autor com Walter Rogério, José Rubens
Chachá, Sérvulo Augusto, José Mariano, Crochiquia e Chico Botelho, narra a vida de
um operário que é flagrado beijando uma colega durante o expediente de trabalho,
sendo despedido por justa causa.
7
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Banana_Split_(filme).
36
O filme mais recente que Prata participou foi O Casamento de Romeu e Julieta,
no ano de 2003 (foi lançado em 2005). O filme é baseado no livro de Mario Prata
Palmeiras, um caso de amor, e teve o roteiro escrito por Marcos Caruso, Jandira
Martini e Mario Prata, com direção de Bruno Barreto.
Nesta comédia romântica, baseada no conto Palmeiras, um caso de amor, de
Mario Prata, o advogado e palmeirense inveterado Alfredo Baragatti (Luis
Gustavo) é membro do Conselho do Clube e pai de Julieta (Luana Piovani).
A mocinha é fanática pelo Verdão, joga como centroavante do time futebol
feminino do Palmeiras e foi até batizada em homenagem a Julinho e
Echevarietta, dois ídolos do time. Ela se apaixona por Romeu (Marco Ricca),
um médico oftalmologista de 45 anos e torcedor roxo do rival Corínthians.
Para conquistar o sogro, Romeu finge que é palmeirense, associa-se ao clube
e chega até a torcer pelo verdão no estádio. Logo a família dele começa a
desconfiar de suas atitudes, principalmente o filho Zilinho (Leonardo
Miggiorin) e a avó Nenzica (Berta Zemmel), ambos corinthianos roxos.
(PRATA, 2013).
pagantes), sendo classificado em 27º lugar nos filmes com melhor bilheteria entre 1995
e 2005. (p. 37).
De um total de 300 filmes nacionais estreados nos cinemas entre 1995 e
2005, apenas 43 superaram os 500 mil em audiência (14,3%) (BORGES,
2007, p. 36).
Curta metragem
2.3 Literatura
8
Fonte: www.marioprata.net.
9
Preto no Branco – 1978, coletânea de contos cariocas de vários autores (PRATA, 1995, p. 210)
40
A categoria crônicas é um capítulo a parte. Mario Prata afirma em seu site atual
(www.marioprata.net) que já escreveu 3000 crônicas. No site elas estão organizadas da
mesma forma que o último livro de crônicas publicado pelo autor Cem Melhores
Crônicas, que, na verdade, são 129 e reproduz as mesmas crônicas selecionadas para
este livro, organizadas por categorias/temas: Palavras, Homem, Mulher, Sexo,
Psicanálise, Crianças, Gente, Lugar, Objetos, Coisas, Portugal, Brasil e Copa do
Mundo. No antigo site (www.marioprataonline.com.br) a apresentação das crônicas era
diferente, havia um acervo de 589 crônicas disponíveis para leitura, porém, no novo
site, a opção foi por colocar a seleção das consideradas melhores pelo autor e já
publicadas em livro, porém como já dito anteriormente, Mario Prata afirma já ter escrito
3000 crônicas, o que pode realmente ser possível, tendo em vista que o autor colaborou
durante longo período em diversos periódicos e também porque costuma escrever e
publicar constantemente, como por exemplo a obra citada (Tulípio, Humor de
Botequim) que o autor nem inclui em suas obras, talvez por considerar um texto
descartável ou de menor importância.
Em conversa com o escritor por email em 26 de junho de 2014, eu o questionei
sobre a obra localizada Tulípio, Humor de Botequim:
Mario
Eu localizei a coletânea Tulípio, humor de botequim, que conta com a sua
participação, porém não consta em seu site pessoal ou em sua qualquer
biografia em sites e livros. Tomei conhecimento da obra através das
pesquisas nos acervos dos jornais, na época do lançamento, em uma matéria
do Jornal Folha de São Paulo ―Livro mostra por que personagem Tulípuo é
boêmio de verdade‖, de 30 de dezembro de 2009. A obra é organizada por
Eduardo Rodrigues e Paulo Stocker, no ano de 2009, pela Editora Devir
Livraria. O texto de sua autoria que faz parte desta coletânea é ―Um minuto,
por favor!‖.
Porque vc não a cita em suas obras? você considera uma literatura
descartável, um texto sem importância? (GOMES, 2014).
Oi, Karina,
Eu já colaborei com dezenas – provavelmente centenas – de revistas e jornais
nestes 54 anos de trabalho. Muitas eu nem me lembro mais, como é o caso
citado por você. Não queira ir atrás de tudo, porque vai enlouquecer. Pra ter
uma ideia, escrevi durante um ano numa revista de urologia...
Beijos.
Prata (PRATA, 2014, por email).
41
Desta forma é possível tem uma ideia da quantidade de textos que o autor
escreveu em colaboração para revistas de todo o país, sendo difícil realizar toda a coleta
e organização deste acervo, bem como a organização da fortuna crítica.
Outras obras não foram localizadas, porém são citadas pelo próprio autor quando
se refere a sua produção. Na coletânea de crônicas Filho é bom, mais dura muito,
primeira coletânea das crônicas de Mario Prata, no ano de 1995, o autor elenca, a partir
da página 205, suas obras para televisão, teatro, cinema, literatura, literatura infanto-
juvenil, jornalismo, vídeo-ficção e vídeo não-ficção (categoria que não aparece mais em
nenhuma outra lista de suas obras) e produção:
Vídeo – não-ficção:
Refinações de milho Brasil – 1988, Usina Filmes.
Heublein, 1988, Argumento Vídeo.
Ministério da Educação, 1988, Argumento Vídeo.
Caldo Knorr – 1989, TV1.
Refinações de milho Brasil – 1990, Receitas, TV1.
Metrô – 1990, AC Produções. (PRATA, 1995, p. 213).
Na orelha do livro Cem crônicas – O Estado de São Paulo Prata elenca sua
produção/colaboração no jornalismo:
―JORNALISMO: A Gazeta de Lins, Última Hora, Folha de S. Paulo, O
Pasquim, Isto é, Jornal da Tarde, O estado de S. Paulo, Playboy, Homem,
Lui, Status, Saque, AZ, Ícaro, Criativa, Placar, Motorshow.‖ (PRATA, 1997,
p. 231).
10
Mario Prata, 1979, p. 4.
11
Mario Prata, 1994, orelha 2.
42
Mario Prata divide suas obras para crianças em jovens em dois grupos, literatura
infantil: Chapeuzinho Vermelho de Raiva, 1970; O homem que soltava pum, 1983;
Sexta-feira, de noite, 1984; Ritos de Passagem de Nossa Infância e Adolescência,
(coletânea de textos de diversos autores) 1985; A viagem de Memoh, 1987.
A obra infanto-juvenil é composta, de acordo com a classificação do autor em
seu site pessoal www.marioprata.net pelos contos da coletânea ―Quem conta um conto‖,
organizada por Samir Curi Maserani, com 6 volumes, que se organizam em torno dos
elementos da narrativa. Cada volume tem 5 contos, todos com a mesma temática, e
colaboram, além de Mario Prata, os autores: Ignácio de Loyola Brandão, Marcia
Kupstas, Guilherme cunha Pinto e Vivina de Assis Viana. Os textos de Mario Prata
nessas coletâneas são:
Volume 1: As Meninas de Vinte Anos, 1989, estudo da ação;
Volume 2: E o Zé Reinaldo, Continua Nadando?, 1989, estudo da
personagem;
Volume 3; Love Story, 1990, estudo do espaço;
Volume 4: Quadrilha, 1990, estudo do tempo;
Volume 5: Tá me Ouvindo, Frei Vicente?, estudo do ponto de vista narrativo;
Volume 6: Vestibulando, 1990, estudo do gênero do conto.
Mario Prata publicou dois romances policiais: Sete de Paus (2008) e Os Viúvos
(2010).
A origem da história policial tem relação histórica com o surgimento das
grandes cidades. Como o aumento da população, os problemas sociais ficam mais
44
evidentes e a busca por justiça se torna uma constante, uma necessidade, o que exige a
organização das forças policiais, que se instauraram sistematicamente no século XIX.
Este cenário foi o que principalmente impulsionou o nascimento deste estilo, e
Edgar Allan Poe é tido como o criador do gênero. O romance policial é considerado
um subgênero literário, e se caracteriza, em termos de sua estrutura narrativa, pela
presença do crime, da investigação e da revelação do malfeitor. Apesar de pertencer à
tipologia narrativa, também permite a inserção da tipologia descritiva:
O romance policial também demonstra que não pode haver crime perfeito, logo,
não há lugar para a impunidade, para o crime sem punição. A principal função
ideológica na literatura policial é a demonstração da estranheza do crime, já que o
criminoso é apresentado como um ser estranho à razão natural da ordem social. É
importante salientar que no romance policial prevalece a ideia de aventura, de bem
45
contra o mal, detetive bom, policial bom, criminoso mau, além do raciocínio lógico
espetacular dos detetives, característica muito marcante.
O universo do romance policial é permeado por esses vários elementos:
medo, mistério, investigação, curiosidade, assombro, inquietação, que são
dosados de acordo com os autores e as épocas. Através da palavra, o medo se
torna uma tortura da imaginação e estabelece uma relação poética entre
narrador e leitor; o mundo é, dessa forma, uma fonte de inspiração literária,
visto que, mistérios sempre existiram desde os primórdios da história da
humanidade. (PIRES, 2005).
Meu negócio agora é escrever romance policial. ―Ainda não estou como
quero, mas chego lá‖, analisa, revelando um dado impressionante: nos
últimos seis anos, tempo em que vem se dedicando às tramas de mistério, ele
leu 600 livros – média de três por dia. ―Levo muito a sério o meu trabalho.
Sou dedicado‖, justifica. (PRATA, 2011).
elas que animam a ação das estórias, do mesmo que, para Aristóteles, a alma anima os
seres, sendo a essência da vida‖.
Três elementos centrais de um desenvolvimento novelístico (o enredo e a
personagem, que representam a sua matéria, e as ideias, que representam o seu
significado) existem intimamente ligados, inseparáveis, nos romances bens realizados.
A personagem vive o enredo e as ideias, e os torna vivos. A personagem é um
ser fictício - expressão que soa como paradoxo. A criação literária repousa sobre este
paradoxo, e o problema da verossimilhança no romance depende da possibilidade de um
ser fictício, sendo uma criação da fantasia que comunica a impressão da mais lidima
verdade existencial, que se baseia num certo tipo de relação entre o ser vivo e o ser
fictício, manifestada, por sua vez através da personagem, que é a concretização deste. A
vida no romance é criada, estabelecida e racionalmente dirigida pelo escritor, que
delimita e encerra, numa estrutura elaborada, a aventura sem fim que é, na vida, o
conhecimento do outro.
Na obra de Mario Prata é uma constante a ficcionalização de seu dia a dia, fatos
e pessoas de seu cotidiano aparecem frequentemente em sua obra.
Em Sete de Paus, Mario Prata narra a historia da venerável grã-ordem de São-
Fuldêncio, irresponsável por vários assassinatos, no Brasil e no exterior, investigados
pelo agente federal Ugo Fioravanti Neto e seu fiel escudeiro Darwin Matarazzo.
Em Os Viúvos, Mario Prata traz uma nova aventura do detetive Ugo Fioravanti e
seu fiel companheiro Darwin Matarazzo na bela ilha de Florianópolis. Desta vez, o ex-
policial federal e agora detetive particular, Fioravanti, terá que desvendar dois
sequestros, encontrar uma mulher a pedido do príncipe de Dubai e descobrir quem é o
louco remetente E.R.N., que lhe envia e-mails com desabafos sobre sua vida tediosa,
seus problemas com a Receita Federal e com avisos dos vários crimes que cometerá.
Nas duas obras Mario Prata usa notas de rodapé para apresentar as personagens
ao longo do livro. Em Sete de Paus aparecem 99 personagens e 63 em Os Viúvos.
Ambas as obras tem as mesmas personagens principais Ugo Fioravanti Neto e
Darwin Matarazzo.
Observe a descrição das personagens nas duas obras respectivamente:
Ugo Fioravante Neto é agente da Polícia Federal de Santa Catarina. Entre 50
e 60 anos, idade que ninguém nunca soube direito, exceto o RH da
instituição. Cabelos totalmente brancos, com rabo-de-cavalo. Alto, bonito.
Tipo italiano, quase um metro e oitenta, olhos verdes. Honesto. Se ele não
48
Podemos observar que mesmo se tratando das personagens principais das obras,
as descrições são bastante superficiais, e não se aprofundam no decorrer das obras, o
que de acordo com a teoria de Brait são planas.
As personagens são divididas de acordo com a complexidade apresentada pelas
―classificação das personagens (flat) em plana, tipificada, sem profundidade
psicológica, e (round) redonda, complexa, multidimensional‖ (BRAIT,1985,p.40).
Antônio Cândido aponta a definição de Forster quanto às personagens planas:
Márcio, um dos mais simpáticos garçons do lugar. Faz caipirinha para o fiora
há mais de vinte anos. Bom garçom: não é surdo e fala pouco. Casado com
dona Maria Beatriz. 62 anos.(PRATA, 2008, p. 32).
Doutor José Carlos Abud, O Zeca Abud, 42 anos, médico, criador de uma
injeção que tira a vontade de fumar. A famosa ―Clínica Dr. José Abud‖ fica
numa pequena cidade do interior paulista: Guaiçara. Era gordo. Há cinco
anos fez a cirurgia de estômago e perdeu oitenta quilos. Tem uma imensa
gibiteca. (PRATA, 2008, p. 103).
Denise Cabral 50 anos (há anos), com quem ele também já trabalhava na
Federal. Solteirona, chegada numa igreja católica. O que poucos sabem é o
que esta mulher faz de noite pela Internet. (PRATA, 2010, p. 41).
Em Sete de Paus Mario Prata retrata momentos de sua vida em que passou por
um SPA, e também viagens a Portugal (em especial a Cabo verde).
Em Os Viúvos, Mario Prata se personifica na figura da personagem E.R.N.
(Escobar Rocha Neto):
Escobar Rocha Neto voltou com uma pequena mala, um paletó que devia ser
do tempo do Banco do Brasil, os olhos ainda vermelhos de tanto chorar.
(PRATA, 2010, p. 275-276).
pegar, por lei, como o salário. Mas direitos autorais, sim. Então, o livro foi
um desabafo. Também por causa desse sistema bancário absurdo, mentiroso,
eu quase perdi tudo o que tinha. Você não consegue conversar com a Receita,
com a Justiça, você é um número. É foda. Só não sequestrei ninguém... mas
tive vontade! (PRATA, 30/05/2010).
Sempre tem. É difícil criar um personagem que não tenha alguma coisa sua.
A Til, por exemplo, se parece muito comigo, meu lado feminino. O
Fioravanti tem essa coisa de se apaixonar por menina mais nova. Os homens
da minha idade são tarados por meninas novas. É coisa da minha geração,
mesmo. A minha namorada, por exemplo, é bem mais nova do que eu.
(PRATA, 30/05/2010).
Quando descobri que o contador não havia pago absolutamente nada durante
três anos – embora a papelada apresentada anualmente parecia estar certa,
com carimbos da Receita e tudo, fiquei meio sem saber o que fazer. Todo
mundo me dizia para ficar quieto porque em cinco anos prescrevia. Mas isso
é sonegação, é crime. E não tenho mais idade para começar a cometer crimes.
Então avisei a Receita de todo o faturamento da minha microempresa.
Pronto, soltaram os cachorros em cima de mim. Depois que o livro saiu,
52
Figura 20: Mario Prata e seu psicanalista; ao fundo, o enteado Joaquim filho da segunda esposa Luciana.
Fonte: Site pessoal do autor (www.marioprataonline.com.br)
No mundo fictício as personagens obedecem a uma lei própria, são mais nítidas,
mais conscientes, tem contorno definido. Candido aponta que Mauriac (2002, p.67), ―há
uma relação estreita entre a personagem e o autor‖. Este vínculo que há entre o autor e a
sua personagem estabelece um limite à possibilidade de criar, à imaginação de cada
romancista, que não é absoluta, nem absolutamente livre, mas depende dos limites do
criador. O romancista deve reconhecer os seus limites e criar dentro deles, e isso é uma
condição de angustia, impedindo certos voos sonhados da imaginação, que nunca é livre
como se supõe, como ele próprio supõe.
Autran Dourado salienta,
A obra de Mario Prata tem em sua essência a presença do riso, seja as para
televisão e teatro, seja as para o cinema ou as literárias, seja em suas crônicas ou em
seus romances. O riso literário é uma constante na obra de Mario Prata, o que pode ser
percebido já no título de algumas de suas publicações: Filho é Bom, Mas Dura Muito
(1995), Mas Será o Benedito? (1996), Diário de um Magro (1997), Minhas Mulheres
e Meus Homens (1999), e tantos outros.
Prata é especialista em escrever com humor sobre cenas do cotidiano, e
consegue como poucos autores contextualizar situações, ligar pessoas, fatos, criando
cenas repletas de chistes, de gozações, de piadas. Prata parece se adequar ao que é
proposto teoricamente por Rauer:
12
Em anexo, reproduzimos o quadro operacional do riso literário proposto por Rauer (2006). (Anexo 93)
55
O riso literário pode variar da sátira desbragada ao humor de fina ironia, pode
se manifestar em uma piada ou em um chiste ou apresentar-se como paródia;
pode ser cômico em trocadilho ou caricatura; pode ser de escárnio, de
exclusão, ou de simpatia, de aceitação. As manifestações do riso podem,
portanto, apresentar gradações extremas ou sutis, e os estudos literários
expõem, em diferentes epistemologias e configurações teóricas, as suas
nuances. (RAUER, 2006, p. 97).
Há, na primeira orelha de Sete de Paus, uma apresentação escrita por ninguém
menos que uma das personagens (Darwin Matarazzo): é o inicio de uma obra repleta de
gozação. Há piadas, palhaçadas, chistes e gozações em todas as páginas, tendo por mote
gordos, gays, maçons, ricaços, spas, universitárias casadouras, polícia e políticos. A
trama policial parece pretexto para o autor usar todo seu talento em criar situações
engraçadas e críticas.
O detetive Fioravante, responsável pela investigação criminal que é o fio
narrativo do romance, tem um filho pequeno, chamado Valentim. Ele conta
constantemente uma história para a filho, O homem que soltava pum, uma obra do
próprio Mario Prata, publicada em 1983, pela Editora Escrita (3ª. Edição pela Siciliano
em 1998).
Na obra Os Viúvos, a orelha também é escrita por Darwin Matarazzo
(personagem da trama), repetindo o mesmo ritmo de gozação.
Esse reiterado recurso apresenta características de piada. A piada é um gênero
que, embora seja considerado menor, é significativamente importante no discurso
interacional de todos os tempos. A partir de estudos de Sirio Possenti, Kassandra
Muniz define nos seguintes termos o gênero piada:
Sabemos que a piada precisa de fatores que influenciam seu texto e contexto
para ser compreendida; várias piadas precisam de conhecimento cultural, situação
56
política, notícia da mídia, entre outros elementos, para ser compreendida. É preciso
entender a piada para conseguir rir da mesma, ou então o discurso não se completou.
Os chistes também são uma constante na obra de Mario Prata. Para Freud,
[u]m chiste diz o que tem a dizer, nem sempre em poucas palavras, mas
sempre em palavras poucas demais, isto é, em palavras que são insuficientes
do ponto de vista da estrita lógica ou dos modos usuais de pensamento e
expressão. Pode-se mesmo dizer tudo o que se tem a dizer nada dizendo.
(FREUD, 1996, p. 21).
que gera o riso. Os chistes também mudam com o passar do tempo. Rimos de coisas
diferentes em lugares e épocas diferentes. Em cada sociedade uma determinada situação
tem um determinado teor de graça.
Na narrativa do romance policial Sete de Paus, Mario Prata utiliza-se destes
recursos a todo o momento. Vamos elencar e comentar algumas piadas e chistes
presentes no livro, visando conhecer a forma de escrita do autor e o uso do humor em
sua narrativa. Eis um primeiro exemplo de chiste:
Bom trabalho. Não acredito que ele entraria aqui com um passaporte
brasileiro. Estamos trabalhando com um profissional, senhor delegado. Sua
única falha foi a marca do baralho brasileiro. Mas, mesmo assim, pode ter
sido de propósito para rir da nossa cara. Para avisar que era ele. Vocês
falaram com o paraguaio? Pode ser um paraguaio falsificado. (PRATA, 2008,
p. 77).
Foi a primeira vez na vida que Fioravanti viu seis homens reunidos, oito com
ele e Darwin, todos tomando água mineral. (PRATA, 2008, p. 150).
O narrador faz uma gozação com o fato de homens terem o hábito do consumo
de bebidas alcoólicas em suas reuniões e eventos. Vejamos outra tirada cômica:
Depois disso, da passagem pelo ambulatório, uma mocinha simpática
revistou toda minha mala no quarto. Chegou a cheirar o creme de barbear:
-Tem gente que coloca leite condensado aqui dentro, acredita?
Acreditei piamente. (PRATA, 2008, p. 149).
58
A piada acima reforça a ironia feita aos portugueses, quando satiriza o fato da
personagem do policial português não compreender a frase ―Ela não tem nada a perder‖,
interpretando que no sentido denotativo, de perder coisas concretas, assim ela realmente
não teria nada a perder.
Sabemos também que um chiste pode ou não provocar riso ou sorriso,
dependendo da pessoa ou da cultura uma piada poderá ser considerada divertida ou até
imprópria. Nos livros de Mario Prata, o riso é apenas para os brasileiros.
59
2.3.3 A crônica
2.3.3.1 A crônica ficcional
Esse gênero de literatura ligado ao jornal está entre nós há mais de um século
e se aclimatou com tal naturalidade, que parece nosso. Despretensiosa,
próxima da conversa e da vida de todo dia, a crônica tem sido, salvo alguma
infidelidade mútua, companheira quase que diária do leitor brasileiro.
(ARRIGUCCI, 987, p. 51).
O termo crônica, do grego krónos, significa tempo, e do latim annu, ano e ânua,
anais. De acordo com Massaud Moisés, professor emérito da USP, em seu Dicionário
de termos literários:
o vocábulo crônica mudou de sentido ao longo dos séculos. Empregado
primeiramente no início da era cristã, designava uma lista ou relação de
acontecimentos, arrumados conforme a seqüência linear do tempo.
Colocando, assim, entre os simples anais e a História propriamente dita, a
crônica se limitava a registrar os eventos sem aprofundar-lhes as causas ou
dar-lhes qualquer interpretação. Em tal acepção a crônica atingiu o ápice na
alta Idade Média, ou seja, século XII. (MOISÉS, 2002, p. 132).
Nesse momento houve uma guinada para o lado mais histórico, em que se
distinguiam obras com predomínio de detalhes e pormenores, chamadas de ―crônicas‖, e
obras mais simples e impessoais, sem aprofundamento, chamadas de ―crônicas breves‖
ou ―cronicões‖. Foi a partir do Renascimento (século XIV) que o vocábulo ―crônica‖
passou a ser substituído por ―História‖.
Não por acaso a palavra crônica vem do latim chronica, que radica no grego
khronos, ―tempo‖, uma vez que é um texto destinado a registrar o tempo
histórico, o momento que passa, desde os cronicões medievais, de modo que
cronógrafo e historiógrafo se equivaliam: assim, o primeiro historiador em
língua portuguesa, Fernão Lopes, é conhecido como ―cronista‖; os reis, na
Idade Média, tinham o seu cronista-mor, que fixava as genealogias das
famílias nobres, da mesma forma que os grandes navegadores levavam em
suas viagens seus escrivães, com seus diários de viagem, verdadeiras
crônicas. Nunca é demais lembrar que o primeiro texto escrito sobre o Brasil
é de um cronista, Pero Vaz de Caminha, que, num misto de poeticidade e
referencialidade, informa ao rei de Portugal, na sua Carta, sobre as índias:
‗suas vergonhas tão nuas e com tanta inocência descobertas que não havia,
nisso, nenhuma vergonha‘ (apud Abdala; Campiddelli, 1997, p. 10). Neste
trocadilho com a palavra ―vergonha‖, com o ludismo aí implícito, intui o
autor, a modo quase profético, o estilo descontraído que dominará o gênero
aqui no Brasil.‖(GOTTARDI, 2007, p. 11).
No Brasil ela tem uma boa história, e até se poderia dizer que sob vários
aspectos é um gênero brasileiro, pela naturalidade com que se aclimatou aqui
e a originalidade com que aqui se desenvolveu. Antes de ser crônica
propriamente dita foi ―folhetim‖, ou seja, um artigo de rodapé sobre as
questões do dia – políticas, sociais, artísticas, literárias. Assim eram as da
secção ―Ao correr da pena‖, título significativo e cuja sombra José de
Alencar escrevia semanalmente para o Correio Mercantil, de 1854 a 1855.
Aos poucos o ―folhetim‖ foi encurtando e ganhando certa gratuidade, certo ar
de quem está escrevendo a toa , sem dar muita importância. Depois, entrou
francamente pelo tom ligeiro e encolheu de tamanho, até chegar ao que é
hoje. (CÂNDIDO, 1992, p. 15).
Arrigucci (1987) compartilha com a mesma ideia: no Brasil a crônica feita não é
igual à francesa, ela tem características próprias, peculiares:
Teve aqui um florescimento de fato surpreendente como forma peculiar, com
dimensão estética e relativa autonomia, a ponto de constituir um gênero
propriamente literário, muito próximo de certas modalidades da épica e às
vezes também da lírica, mas com uma histórica específica e bastante
expressiva no conjunto da produção literária brasileira, uma vez que dela
participaram grandes escritores, sem falar daqueles que ganharam fama
sendo sobretudo cronistas. (ARRIGUCCI, 1987, p. 53).
Essa profusão de formas dá a crônica uma mistura de sabores que permitem a ela
registrar os mais variados aspectos da cena brasileira. Aliada a isso, há a habilidade dos
escritores em utilizá-la, também, de um jeito bem-humorado na abordagem dos mais
variados assuntos e acontecimentos do cotidiano. Sua matéria é o fato pequeno que,
bem trabalhado, assume novas proporções no debate social.
Antônio Cândido, na obra Literatura e Sociedade, destaca a influência decisiva do
jornal sobre a literatura, criando gêneros novos, como a chamada crônica (CANDIDO,
2010, p. 43).
Assim, podemos afirmar que a crônica ocupa um espaço entre a poesia (lírica) e
o conto; estrutura-se por uma visão pessoal e subjetiva ante um fato qualquer do
cotidiano; acaba por estimular a veia poética do autor/prosador; abre margem para que
se revelem os dotes de contador de história dos cronistas; garante ao cronista o poder de
recriação da realidade sobre a mera transcrição desta; utiliza o humor como meio de
despertar o senso crítico no leitor; assume diferentes aspectos da linguagem, aderindo
ao coloquialismo, com a presença de elementos da oralidade, ou utilizando-se do
registro mais formal, como modo de valorização da própria forma escrita (cf. MOISÉS,
2002, e SÁ, 2005).
A crônica, produzida principalmente para veiculação na imprensa, tornou-se
uma seção da revista ou do jornal com uma finalidade própria, que é a utilidade
predeterminada de agradar aos leitores dentro de um mesmo espaço e localização, para
a familiaridade entre o escritor e o ledor. A crônica é um texto em prosa, aparentemente
despretensioso, mas sempre pontual, que retrata fatos corriqueiros, diários, até
considerados banais, sempre com um olhar muito pessoal do autor.
Com a aparência de um texto curto e narrado em primeira pessoa com o propósito
de afunilar o vínculo de seu autor e fazer com que o mesmo ―dialogue‖ com seu leitor,
apresentando uma visão mais pessoal do assunto, ou seja, a visão do cronista ao relatar
determinado tema, o cronista utiliza-se de fatos e acontecimentos diários, dando-lhes
um toque próprio, envolvendo fantasia, ficção e criticismo, marcas que diferenciam a
crônica do texto informativo dos repórteres.
Sendo assim, segundo Jorge de Sá, quando a crônica passa do jornal para o livro,
amplia-se a magicidade do texto, permitindo ao leitor dialogar com o cronista de forma
64
bem mais intensa, ambos agora mais cumplices no solitário ato de reinventar o mundo
pelas vias da literatura. (SÁ, 1987, p. 86)
Assim, a crônica de Mario Prata supera o limite de transitoriedade próprio do
jornal, ou seja, a crônica é recolhida em livro por possuir qualidades literárias que são
atribuídas a seus textos graças à sua capacidade de abordar de forma poética fatos
corriqueiros do cotidiano, narrando um fato do cotidiano das pessoas, algo que
naturalmente acontece com muitas pessoas, porém incrementado com um tom de ironia,
de bom humor, fazendo com que as pessoas vejam por outra ótica aquilo que parece
óbvio demais para ser observado.
Em entrevista a Paulo Lima, para a Radio TRip FM, Mario Prata é questionado
sobre a crônica, se ela é jornalismo com literatura, ou se é um filhote dos dois, se é uma
literatura menor, ou se é jornalismo maior, o que é a crônica afinal para ele, Prata
afirma:
A crônica é igual palavra cruzada, serve para divertir, a crônica é uma coisa
quase que brasileira, foi inventada em Portugal mas foi no Brasil que cresceu,
com uma força muito grande, nos anos 50 e 60. Nós tínhamos os maiores
cronistas do Brasil, e eu tinha sorte de garoto, ler todos eles: Fernando
Sabino, Rubem Braga, Millor Fernandes, Nelson Rodrigues. Tudo chegava
nas revistas e nos jornais quando eu morava lá em Lins, no interior, eu tenho
uma forte influência desse pessoal todo e hoje é difícil ter um cronista, tem
muito articulista, e eu sempre defino dizendo que a crônica é você
transformar o banal em arte, você partir do nada e transformar aquilo em algo
gostoso de ler (...)atualmente o melhor cronista para mim, bem distante do 2º
lugar é o Veríssimo, o Veríssimo é um cronista, não só um cronista, mas um
escritor importantíssimo. (PRATA, 2011, anexo no DVD).
A crônica ―Olha eu aqui, mãe!‖ foi publicada no jornal O Estado de São Paulo
em 20/10/2002 (Anexo 89) e também está reproduzida na coletânea Cem melhores
Crônicas, que na verdade são 129, compondo assim um dos textos que Mario Prata
considera um de seus mais importantes, uma vez que esta coletânea foi organizada por
ele próprio, organizando e selecionando. A crônica também aparece na coletânea 100
Crônicas: O Estado de São Paulo, sendo reconhecidamente um texto que é ‗do gosto‘
do leitor, como a maioria das crônicas que compõe esta coletânea organizada pelo jornal
O Estado de São Paulo. Diante da data do volume 100 Crônicas: O Estado de São
Paulo (1997), a crônica ―Olha eu aqui, mãe!‖ deve ter sido publicada em O Estado de
São Paulo entre 1993 e 1997, porém até o momento não a localizamos no acervo do
jornal.
Esta crônica tem características autobiográficas. Prata explora nesta crônica a
profissionalização de escritor, com ele e a mãe ficcionalizados, com a temática central
em torno da vida profissional de Prata.
Primeiramente, a profissionalização do escritor aparece em outras crônicas de
Mario Prata, sendo um tema recorrente em sua obra como na crônica ―Quem escreve as
bulas?‖ (O Estado de São Paulo, 30/03/1997) onde Prata começa falando que escreve
de tudo, menos bula: ―Quando me perguntam a profissão e eu digo que sou escritor,
logo vem outra em cima: de quê? De tudo minha senhora. De tudo, menos de bula.
Romance, teatro, televisão, crônicas, ensaios, tudo-tudo, menos bula!‖ (PRATA, 2007,
p. 27). Outra crônica onde Mario Prata explora lembranças dos jornais onde já trabalhou
relacionando com as gripes famosas de cada período é ―Espirrando a crônica‖ (O
Estado de São Paulo, 03/09/2003), ―A Empregada‖ (O Estado de São Paulo,
19/12/2001), onde o autor relata casos de diversas empregadas que já teve e encerra
67
A mãe também ironiza o fato de Mario Prata estar escrevendo para o público
feminino:
– Não, mãe. Vou falar do meu ponto de vista sobre as mulheres.
– Meu filho, não faça isso. Você sabe muito bem que você não entende nada
de mulheres. Como marido foi um fracasso. Quantas mulheres você já teve,
menino? Nenhuma te aguentou. Volta para a Globo, meu filho. Vai escrever
novela, vai. Tão bonitas as suas novelinhas. (PRATA, 2007, p. 81).
A mãe faz uma trajetória da carreira do filho, sugerindo que ele volte para a
Globo, ou escreva para revistas mais conceituadas como a Cruzeiro, ou a Parati, ou
então para a Playboy:
68
A mãe satiriza o filho também pelo fato do atual marido (Nirlando Beirão) de
sua ex-mulher Marta Góes estar trabalhando na Playboy, uma revista masculina, e ele
em uma revista feminina.
Faz também uma referência ao inicio da carreira do filho:
– Eu me lembro, quando você tinha 14 anos e começou a fazer coluna social
lá em Lins. Comentei com o seu pai: Isso não vai dar certo. Olha onde você
terminou.
– Mãe, eu estou feliz. Isso é uma conquista profissional. (PRATA, 2007, p.
82).
Prata deixa claro para a mãe, que mesmo ela considerando que não acabou bem,
a satisfação com a vida profissional é clara, e mostra o processo da escrita e da evolução
profissional do escritor e o status de escritor, seja de novela da Globo, seja de revista
feminina.
Prata continua a ideia desta crônica em ―Outra vez com mamãe‖, publicada no
livro 100 crônicas O Estado de São Paulo, onde eles dialogam sobre a profissão que os
filhos Antonio e Maria pretendem seguir, no encerramento da ligação surge o diálogo:
- Bem, mãe, vou desligar. Tenho que trabalhar.
- Seu pai está mandando um abraço. (ouço meu pai gritar ao fundo:
‗Estou nada. Não mando abraço prá filho que escreve em revista de mulher.‖)
. Então fica com Deus. (PRATA, 1997, p. 141).
A crônica ―Minhas Bunda‖ (Anexo 92) faz parte da coletânea As Cem Melhores
Crônicas Brasileiras, organizada por Joaquim Ferreira dos Santos. Originalmente foi
publicada no livro Minhas Tudo (2001, Editora Objetiva) e reeditado pela editora
Planeta em 2012.
69
A escolha desta crônica para esta pequena análise amostral da obra de Prata é
interessante por compor uma coletânea que faz um histórico da crônica brasileira, de
1850 a 2000, incluindo assim o autor Mario Prata no rol de autores consagrados no
gênero no país, que vai de autores como Machado de Assis, João do Rio e Lima Barreto
à Antonio Prata, novo expoente da crônica no país.
A crônica selecionada de Mario Prata aparece na coletânea no capítulo ―Os anos
1990 – a vida privada virou uma comédia‖, ao lado de escritores como Arthur Dapieve,
Carlos Heitor Cony, Ferreira Gullar, Ignácio de Loyola Brandão, Luis Fernando
Veríssimo, Marcos Rey, Otto Lara Rezende, Roberto Drummond e Zuenir Ventura.
A temática da ‗bunda‘ retorna no romance policial “Sete de Paus” (2008, p. 87-
89) como um capítulo do livro, reescrevendo sua própria crônica, agora contextualizada
em uma obra, como um romance policial, como o capítulo 8 do livro, com pequenas
modificações. A mesma ideia também aparece na crônica ―Já ouviu falar em Germano
Almeida?‖ (O Estado de São Paulo, 02/11/1994) que também compõe a coletânea 100
crônicas O Estado de São Paulo, comparando as bundas brasileiras as irmãs africanas,
que de acordo com Mario Prata é a origem de nossa brasilidade, como ele afirma no
início da crônica ―Minhas bunda‖:
Mas de onde veio a nossa bunda? Não das alvas portuguesas, muito menos
das esparramadas italianas e, menos ainda, das desbundadas japonesas. Muito
menos das amassadas índias. Sempre me intrigou essa tanjúrica pergunta.
Quem arrebitou com pincel de ouro, com formão de prata, a bundinha
brasileira? (PRATA, 2012, p. 91).
batendo tambor e fazendo som com a boca: bun-da!, bun-da! Mas isso é
lenda. Na verdade, a palavra veio da língua quimbundo (quimbundo), da
palavra bunda (mbunda, tubundas, elebunda?), lá para os lados de Angola.
(PRATA, 2012, p. 93-94).
Outro texto da coletânea Minhas Tudo é ―Minhas zona‖, onde Prata reflete
sobre a traição e sobre como sua geração convivia com o sexo:
71
A minha geração consegue (ainda, com certa culpa) diferenciar amor e sexo.
E as culpadas disso são as próprias meninas da minha adolescência, que não
deixavam nada. Pegar num peitinho (por cima da blusa de banlon) levava
meses, às vezes, anos. Todas eram virgens. Eu disse todas. Estamos no
começo dos anos 60. Ficava-se no portão da casa da namoradinha até as 10
da noite (quando o pai começava a tossir lá dentro) e depois um grupinho se
juntava numa esquina e ia para a zona, tirar aquele calor do corpo. (PRATA,
2012, p. 47).
Melhor que um peito, só dois. Mas ensinaram para a gente que é feio olhar
para o seio. Eu nunca entendia os padres. Eu olhava e achava aquilo bonito,
menino ainda. Mas os padres diziam que não podia olhar. Era pecado.
(PRATA, 2012, p. 130).
2.4 Premiações
Lins dos jornalistas. Cecilio Abrão e Alcyr Fernandes que me deram espaço
na Gazeta de Lins quando eu ainda tinha 14 anos e ainda escrevia quinse com
z. Que boa irresponsabilidade. (PRATA, 1993, p. 8).
13
Primeiro lugar no 1º Concurso Universitário de Contos da PUC. (PRATA, 1995, p. 215)
73
CAPÍTULO III
O ACERVO
75
14
Carlos Eduardo Motta Carvalho, jornalista e proprietário do Jornal Correio de Lins. Didu nasceu em
São Paulo, em 14 de Dezembro de 1940 e viveu toda sua infância na Capital Paulista, até que em 1963
veio para o interior, mais exatamente para Lins com intuito de cursar faculdade de Odontologia, onde fez
grandes amizades. Em 1966 se forma Dentista e três anos após a formatura se casa com Irene Rodrigues
da Costa, sua colega de sala na Faculdade. O casal volta para a Capital onde exercem a profissão de
Dentista por mais de dez anos no bairro paulistano Brooklin. No ano 1979, com quatro filhos o casal
decide para Lins. Em 1983 Didu e Irene reativam o Jornal Correio de Lins, que havia sido o jornal de seu
sogro alguns anos atrás, se tornando assim o único jornal impresso da época, com o fim da A Gazeta de
Lins. Neste período de faculdade, Didu conviveu com o autor Mario Prata, e suas entrevistas,
depoimentos e memórias foram muito importantes na realização desta pesquisa.
77
Devo destacar o auxílio generoso que recebi de Didu, no trato com o acervo do
Jornal A Gazeta de Lins, na coleta de materiais e textos, sendo sua participação de suma
importância nesta pesquisa.
Didu é citado na obra James Lins, O Playboy Que Não Deu Certo, quando a
personagem principal (James), tem sua vida deflagrada, quando todos ficam sabendo do
crime que cometera (do qual é acusado), e também no final do livro, quando James Lins
se corresponde com Mario Prata (que se personifica na obra como colunista do jornal O
Estado de S. Paulo):
dias três (03) e vinte (20) de junho de 1963 aparece assinado Franco Abiatti (usando
duas letras T), nas demais colunas nos dias nove (09), doze (12), treze (13), dezesseis
(16), vinte e três (23) e vinte e cinco (25) do mês de junho do ano de 1963 aparecem
assinados Franco Abbiati (usando duas letras B), e ambas diferentes da forma como o
autor se refere ao pseudônimo que usava na adolescência.
Tanto Mario Prata como o poeta Sérgio Antunes usam Franco Abbiazzi (usando
duas letras B e duas letras Z), diferente das formas escritas nos textos originais, como
podemos ver nos anexos (40 a 47). Na produção deste trabalho optamos pela grafia
Abbiati, que é recorrente em 6 das 8 colunas localizadas.
Foram localizados apenas 08 (oito) textos com autoria do pseudônimo Franco
Abbiati, o primeiro datado de 03 (três) de junho de 1963 e o último deles, datado de 25
(vinte e cinco) de junho de 1963.
Mario Prata se apresenta ao público na coluna ―Fragmentos Sociais‖ do dia 09
de junho de 1963 (Anexo 41):
A coluna dura apenas o mês de junho de 1963, ele encerra a coluna social
―Fragmentos Sociais‖ do dia 25 de junho de 1963 (Anexo 47) anunciando uma eleição
dos ―mais mais‖ do momento na cidade de Lins:
No próximo domingo não deixem de ver o que escreverei, estou elegendo as
dez mais e os dez mais do semestre, e também, a mais simpática e outros
títulos, que são em número de 8 (oito). Esperem. (ABBIATI, 1963, p. 01).
Porém, após esta coluna o pseudônimo não aparece mais no jornal, sendo
aparentemente substituído por outro pseudônimo no mês seguinte.
15
[Segundo Nóbrega, pseudônimo, na verdade, é uma denominação genérica utilizada para dizer de um
escritor que mascara seu nome, já que são várias as artimanhas que podem ser empregadas: Anonímia
(obra anônima), Apocrifia (nome ―suposto‖, ―duvidoso‖, ―falso‖), Estigmonímia (substituição do nome
por três pontos), Asteronímia (substituição por asterisco), Inicialismo (autoria com apenas as primeiras
letras), Criptonímia (disfarce com as iniciais ou permutações anagramáticas), Alonímia (uso de nome
diverso do verdadeiro), Heteronímia (uso de nome alheio para obra literária), Pseudonímia (nome
―falso‖ou ―suposto‖), Metonomásia (latinização e helenização do nome do autor), Aristonímia (nome
nobiliárquico no lugar do nome civil), Nome religioso (nomes inspirados na preferência devocional),
Nome arcádico (evocação pastoril), Axioxímia (uso do pronome de tratamento por demonstração de
79
Nicinha era Rodrigues da Cunha antes de se casar nos anos 60 com James e
virar Nicinha Soares. Os Rodrigues da Cunha eram uma das famílias mais
ricas de Lins. Grandes fazendeiros de café, quando o chão de Lins se cansou
mudaram-se para Londrina, no norte do Paraná, onde o chão virgem pedia a
rubiácea. Mas mantinham a casa e as fazendas em Lins. Era, a Nicinha,
digamos, da melhor sociedade linense. Sua mãe, dona Danuza, estava sempre
na lista das mais elegantes da região. E o pia, seu Gabriel, era conhecido
como o Rei da Zona. Nicinha era, e ainda é, uma bela mulher. Era um dos
‗Brotos do Ano‘, na coluna do Mário Alberto. Até hoje se comenta em Lins
que o primeiro golpe que James deu na vida foi este: o do baú. (PRATA,
2003, p. 48).
reverência ou cortesia), Prosonímia (nome de guerra, alcunha, apelido e hipocorístico ou nome afetivo) e
Nome literário (apesar de diverso do real, não tem poder de ocultar). MELLO NOBREGA, Humberto.
Ocultação e disfarce de autoria: do anonimato ao nome literário. Fortaleza, Edições Universidade Federal
do Ceará, 1981. In: BATINI, Rafael Antonio.]
80
Porém, na leitura dos jornais dos textos com o pseudônimo de Franco Abbiati
(esta será a grafia usada para escrever o pseudônimo, uma vez que é a forma assinada na
maioria das crônicas localizadas), não é encontrada nenhuma referência a esta ―eleição‖
das beldades linenses na década de 1960. Os ―Brotos do Ano‖ aparecem em duas
colunas, de outros dois pseudônimos:
Primeiro a coluna ―Gente & Notícias‖, com o pseudônimo de Di Franco,
podemos observar a coluna no anexo 21, edição 01 de janeiro de 1963.
Depois, a famosa eleição dos ―Brotos do Ano‖, também aparece na coluna
―Observatório‖, de outro pseudônimo de Mario Prata, Newton (que posteriormente ele
assume ser Mario Alberto) a eleição aparece na edição de 28 de novembro de 1963
(anexo 88).
No primeiro texto publicado com o pseudônimo de Newton, no Jornal A Gazeta
de Lins, no dia 09 de julho de 1963 (Anexo 49), na coluna intitulada ―Observatório de
Newton‖ localizamos o seguinte texto:
Porém, no dia 04 de agosto de 1963 (Anexo 55), Mario Alberto assume a autoria
da coluna ―Observatório‖, incluindo este pseudônimo, agora como uma certeza de
comparação e análise para com os demais.
Não há mais motivo para esconder-me sob o pseudônimo de NEWTON.
Afinal todos já sabem e é mesmo desnecessário. A partir de hoje o
OBSERVATÓRIO será assinado por MARIO ALBERTO. (MARIO
ALBERTO, 1963, p. 2).
APRESENTAÇÃO:
Nesta apresentação devo explicar-lhes o motivo pelo qual escolhi
este pseudônimo ―Ricardo Amaral‖. Como vocês devem saber, um colunista
social é quase como um ―detetive‖ na sociedade. Diante disso, procurei os
diversos nomes dos detetives mais conhecidos, como Sherlock Holmes, O
81
Sombra, Nick Holmes, Shell Scott, Irving Le Roy e outros. Achei melhor
este que é Ricardo Amaral. Espero poder agradá-los.
Ao Di Franco
Corre por ai que você voltaria a escrever nas férias. Como êste meu
inicio coincidiu justamente com o das férias, peço-lhe que se comunique
comigo, trazendo bilhetes à esta redação, até as 12 horas e eu responderei
através de minha coluna. Muito apreciarei sua colaboração. (RICARDO
AMARAL, 1963, p. 2).
Outro pseudônimo que é dado como certo de autoria de Mario Prata é Di Franco,
como já foi apresentado, o pseudônimo Ricardo Amaral, em seu único texto, do dia 30
de junho de 1963 (Anexo 48) presta homenagem a Mario Alberto Prata, a quem se
refere intimamente como ―Pratinha‖, pelos serviços prestados a comunidade linense na
coluna social com o pseudônimo Di Franco. Aparentemente, Prata utilizou-se deste
pseudônimo uma única vez, entre Di Franco e Abbiati e Newton, talvez como forma de
despistar o público leitor da época. Ou estaria ele despistando novamente os leitores?
Repetindo a citação já exposta:
Meu avô assinava o Lavoura, que chega depois do almoço, portanto já com
as notícias da manhã de Uberaba, Brasil, e do mundo. O vizinho do meu avô
era o Netinho, ou Ataliba Guaritá Neto, que fazia uma página inteira de
coluna social. A página se chamava Observatório de Galileu. E eu adorava,
ainda garoto, quando ele colocava meu nome lá. Pois o Netinho, falecido
recentemente, já velhinho, me influenciou tanto que eu comecei a escrever
uma coluna social n‘A Gazeta de Lins, aos 14 anos com o título Observatório
de Newton. É, foi assim que tudo começou. (PRATA, 2003).
Os únicos textos que serão descartados são os assinados por Vicente Amêndola
Neto, num total de dezenove (19) textos, por não ter sido encontrado na obra,
entrevistas e publicações do autor Mario Prata nenhuma referência ou indício sobre este
pseudônimo, e por que durante a pesquisa pudemos concluir que, Vicente Amêndola
Neto, foi uma figura pública real, que conviveu com Prata na época da adolescência e
juventude, não sendo portanto um dos pseudônimos utilizados.
Vicente Amêndola Neto nasceu na cidade de Guarda-Mór/Palestina no interior
de São Paulo e viveu em São José Rio Preto até sua morte. Foi advogado formado pela
INIRP no ano de 1970, poeta e escritor, e foi um dos nomes mais conhecidos da
advocacia em todo interior. Também foi vereador na cidade de São José do Rio Preto.
Colaborou em diversos jornais como o Diário da Região e Folha do Norte. Tem vários
83
Nota transcrita da coluna social de Bauru, no jornal ‗UH‘ - <Para Lins temos
a novidade do novo colunista do UH, por aquela cidade, trata-se do ex-
riopretense Vicente Amêndola, mais conhecido com Ki-Suco. Esse é o novo
fofoqueiro>.
Que é de Rio Preto, colunista da UH, fofoqueiro, nós já sabíamos. Mas o que
mais nos surpreendeu foi o ‗Ki-Suco‘... (MARIO ALBERTO, 1963, p. 5).
Em minha última coluna anunciei uma surpresa para o fim deste ano. Hoje
vou contar de que se trata. Observatório em dobradinha com Última Hora
elegerá os 10 brotos do ano. Isso deverá ocorrem em fins de novembro.
Adianto-lhes que 3 já tem sua posição garantida. Quem são elas?
Aguardem...
Nessa coligação estará representando o jornal UH o seu colunista Vicente
Amêndola que aliás deixará esta cargo nas férias, por motivo de viagem.
(MARIO ALBERTO, 1963, p.3).
Esta rivalidade é superada na idade adulta, quando Mario Prata lhe presta uma
homenagem escrevendo na contracapa de seu livro Liras & Leros de 1986:
Hoje, amadurecido, sua obra se torna mais notável, faz jús ao seu talento. Seu
trabalho é consciente. Não restringe e nem transgride. Poesia ágil, flexível,
abundante e rica. O jeito é todo seu. Estilo próprio, convincente, marcante e
forte. (PRATA, p.102, In: Amêndola Neto, 1986).
84
escritor quando ele afirma ―que as crônicas não tiveram importância literária‖, pois foi
através destes textos que ele se tornou o escritor atual.
Em entrevista concedida a Kathlen Nobrega no ano de 2012 quando
questionado sobre o porquê do uso do pseudônimo, Prata afirma:
Porque se eu fosse escrever com meu nome meu pai e minha mãe iam encher
o saco (rs). Eles não sabiam, ninguém sabia que era eu, ai com 16 anos não,
ai eu comecei a assinar Mario Alberto e tinha uma coluna na Última Hora‖
(PRATA, 2012, entrevista anexa DVD).
Com definição dos pseudônimos, é possível fixar as autorias das colunas sociais
localizadas, organizando a primeira parte da fortuna crítica do autor: as publicações no
periódico A Gazeta de Lins.
Diz-se de autor que assina suas obras com um nome que não é o seu, com a
intenção de ocultar o nome verdadeiro. (AULETE, 2011, p. 1125).
Mario Prata, em sua adolescência, faz uso dos pseudônimos para despistar os
próprios colegas, amigos e pessoas de sua convivência, uma vez que precisava
continuar ―oculto‖ para ter acesso as informações, aos flertes, as paqueras, as fofocas
mais importantes, e se sua identidade fosse ―desvendada‖ as coisas não aconteceriam
mais ―debaixo de seus olhos‖ dificultando assim o trabalho de colunista social, crítico,
moralista, já ficcionista, critico dos costumes da década de 60 que vivenciou com tanta
intensidade.
Mario Prata afirma em conversa através da ferramenta Skype que contribui
antes para o jornal A Gazeta de Lins, possivelmente dentro da coluna de Alcyr
Fernandes, porém estes textos não foram localizados.
O colunismo, ou crônica social, pode ser definido como um gênero que faz parte
do jornalismo, pois trazem fatos, eventos de forma noticiosa, sendo assim, uma notícia.
90
A relevância da notícia será dada tanto pela pessoa que é noticiada, quanto pela pessoa
que lê e que dá importância ao fato lido. Atualmente, a coluna social não ocupa o
espaço só do jornal, mas também em revistas, televisão e internet.
Do ponto de vista da definição, parte-se do conceito comunicacional mais
simplificado oferecido pelo Dicionário de Comunicação (2001) onde têm-se
que coluna é a seção especializada de jornal ou revista, publicada com
regularidade, redigida em estilo mais livre e pessoal e geralmente assinada.
Já no livro de Luiz Amaral (2001), coluna seria, então, um espaço
institucional no qual a empresa utilizaria como serviço de relações públicas
para relacionar-se com seu público alvo e seus anunciantes. Unindo estas
duas acepções, pode-se dizer que coluna é um espaço diferenciado na
estrutura formativa dos periódicos que define um estilo e uma opinião, seja
ela de quem a assina ou do veículo (embora, na maioria das vezes, elas sejam
concomitantes). Tanto é verdade, que a definição mais usual de colunista
remete à questão do comentário fixo: por colunista, comentarista, cronista
ou crítico de jornal, revista, etc. entende-se aquele que mantém seção acerca
de política, arte, literatura, vida social e etc .Deste modo, a coluna tanto
pode ser entendida como um espaço de organização do que não é notícia,
pois se mantém por comentários e opiniões acerca de temas e assuntos
diversos como também por uma estrutura formativa de espaço definido no
periódico e no interior da página do mesmo periódico. Compreendida desta
forma, pode-se entender como coluna social, o espaço definido no periódico
nos quais tratam-se os assuntos que não são notícia, mas que se referem a
ações e repercussões de determinados acontecimentos na sociedade.Diante do
exposto, define-se por coluna social um gênero jornalístico, que se pauta por
notas curtas baseadas nos acontecimentos reais que podem apresentar
notícias, comentários e/ou relatos sobre fatos e pessoas de um mundo real.
(COSTA, 2011, p. 6-7).
De acordo com Isabel Travancas (2001), a coluna social de Ibrahim Sued pode
ser analisada como um gênero de texto jornalístico, pois tem todas as características de
texto que uma crônica deve ter, de acordo com a definição do Dicionário Aurélio (2008,
p. 277): ―Conjunto de notícias que circulam sobre pessoas: a crônica mundana. / Seção
de um jornal em que são comentados os fatos, as notícias do dia: crônica política,
teatral. / Gênero literário que consiste na apreciação pessoal dos fatos da vida
cotidiana.‖
―No Brasil, João do Rio é considerado o introdutor da crônica social, uma
simbiose entre o jornalismo e a literatura...registrava as pessoas que eram respeitadas e
admiradas por sua classe social, por suas realizações e influência.‖(2010, p. 34). É o que
afirma Paula Francineti da Silva em sua tese A Coluna Social Como Gênero de
Fofoca.
Assim, a leitura das colunas sociais passa a ser um hábito, não só daqueles que
se interessam pela ―vida alheia‖, ou pelas ―festas e eventos‖, uma vez que essas colunas
passam a ter um conteúdo bastante diverso, que interessa a todo tipo de público.
colunas opinadas, como já fazia o Diário Carioca, nas quais teriam liberdade
de opinar. (SOUZA, 2007, p. 3).
Nos anos 1960, um colunista que já havia se inspirado em Jacinto iria utilizar
sua coluna para satirizar o regime militar: Sérgio Porto, através de seu
pseudônimo Stanislaw Ponte Preta. Stanislaw usaria a coluna ‗Fofocalizando‘
para, ainda na Última Hora, ridicularizar, ao estilo das notas curtas da coluna
social, as frases de louvor à ―revolução‖ de 1964 e os discursos das
autoridades militares (rebatizadas de ‗otoridades‘ em seu discurso) do novo
regime. Seu estilo, irônico, mordaz, sem tomar partido do discurso ideológico
da esquerda ou direita, ressaltava o humor para ridicularizar os novos tempos,
e que culminaria nos livros intitulados Febeapá – festival de besteiras que
assolam o país. (SOUZA, 2007, p.4).
CAPÍTULO IV
A FORTUNA
97
Entretanto, não conhecia toda a obra de Mario Prata. Lia as crônicas, assisti a
trechos de algumas novelas, ouvi falar de peças de teatro, mas não conhecia toda a obra.
Com o intuito de fazer um trabalho de qualidade, comecei em primeiro lugar a
pesquisar um pouco sobre a vida e a obra, desde Linense não nativo (como eu), mas que
tem na cidade de Lins grande parte de sua vida.
Atualmente, além do acervo com os pseudônimos descobertos, levantados e
catalogados no jornal A Gazeta de Lins nos anos de 1963 e 1964, li praticamente toda a
obra de Mario Prata publicada em livros.
Não tive acesso a um livro publicado de todo o acervo listado Apêndice 2, na
categoria Literatura infantil, O Homem que Soltava Pum, publicado em 1983 pela
Editora Escrita, e em 1998 pela Editora Siciliano, esgotado. Não tive acesso também na
categoria Coletânea ao livro Preto no Branco (1978). Quanto aos demais, li todos, bem
como as crônicas disponíveis.
Localizei a coletânea Tulípio, Humor de Botequim, em meio as pesquisas e
levantamento de dados da fortuna crítica como já apresentado anteriormente.
A pesquisa da fortuna crítica na internet, arquivos digitalizados de jornais e
revistas, youtube, plataformas de pesquisa em geral, me renderam um conhecimento
sobre o autor e sua obra bastante amplo e diverso.
O acervo de crônicas que o próprio escritor possuia se perdeu, juntamente com
seu site pessoal www.marioprataonline.com.br, que foi desativado aproximadamente
em fevereiro de 2013.
Em contato com o autor (por email), questionamos os motivos do desativamento
do site, até porque, o mesmo sempre foi para a pesquisadora uma grande fonte de
consulta e pesquisa:
Como está? Espero que esteja bem. Você pode me dizer o que houve com seu
site? Saiu do ar há algum tempo, algumas semanas na verdade, e não aparece
mais (nem na pesquisa do google)...Tantas informações e leituras não podem
se perder assim...Abraços carinhosos. Da pesquisadora fã. Karina Gomes.
(GOMES, 05 de abril de 2013).
Em resposta ao email, Prata informou que dasativou o antigo site por estar
desatualizado, em palavras do próprio autor:
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Em seu lugar estava sendo elaborado pela jornalista Ana Paula Laux, em
parceria com Mario Prata e colaboradores, um novo site: http://marioprata.net.
A partir deste email, trocamos outros, uma vez que ele solicitou que eu ―desse
uma olhada‖, assim, mergulhei no novo site, conhecendo os links, os vídeos, as
fotografias, e enviei um email, sugerindo algumas coisas, afinal, senti que ele havia me
dado esta liberdade:
Mario
Estou lisonjeada pelo privilégio de ter acesso a um materia