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Semiologia Vascular
Edwaldo Edner Joviliano
Takachi Moriya
Carlos Eli Piccinato

Introdução
O sistema vascular periférico é constituído de três subsistemas: sistema arterial, sistema venoso e sistema linfático.
Conceitualmente nas artérias circula sangue oxigenado que transporta, além do oxigênio, nutrientes necessários para o
metabolismo celular tecidual. As veias recolhem e transportam o sangue com baixa concentração de oxigênio e produtos do
metabolismo celular tecidual e os vasos linfáticos complementam essa atividade de drenagem do restante de líquidos
intersticiais.
Obviamente poder-se-iam listar uma série de outras funções mais específicas do sistema vascular, como controle
pressórico, homeostase, autoimunidade, regulação térmica do organismo, mas não é o objetivo deste capítulo. Diante disso, as
doenças a serem abordadas, do ponto de vista semiológico, serão sempre as relacionadas às alterações de fluxo nos três
sistemas. O fluxo arterial pode ser alterado em razão de obstruções (estenoses ou estreitamento da luz), determinando sua
diminuição, ou outras situações em que há aumento do fluxo e em algumas em que o fluxo praticamente não se altera. As
doenças que diminuem o fluxo são: a obstrução arterial aguda (trombose aguda e embolia) e crônica (placas de ateroma etc.); as
que aumentam o fluxo, como as fístulas arteriovenosas (congênitas ou adquiridas) e as em que, a princípio, não alteram
significativamente o fluxo arterial distal, como os aneurismas ou algumas malformações vasculares.
Da mesma forma, no sistema venoso as condições que prejudicam o retorno do fluxo venoso de forma aguda, como na
trombose venosa profunda ou na tromboflebite superficial, e as que apresentam dificuldade de retorno por disfunção valvular
ou obstrução, como na doença varicosa ou varizes (primárias e secundárias). No sistema linfático o fluxo de drenagem pode ser
dificultado pelas obstruções ou disfunções (agenesias, hipoplasias) que são responsáveis pelo linfedema (congênitos e
adquiridos).
Uma história clínica clara e detalhada torna-se fundamental diante de quadro sugestivo de uma doença vascular. Devem
fazer parte da abordagem inicial toda informação referente ao tempo de início, duração, intensidade, estabilização, melhora ou
piora do quadro, assim como os efeitos na qualidade de vida. Na grande maioria das afecções vasculares pode se chegar ao
diagnóstico completo com base na anamnese e no exame físico sem a necessidade de exames subsidiários, restringindo-se estes
apenas àqueles casos mais graves em que haverá necessidade de intervenção cirúrgica ou endovascular.

Aspectos Anatômicos e Funcionais


Os vasos sanguíneos consistem num sistema fechado de tubos que transportam o sangue do coração para todas as partes
do corpo e o trazem de volta ao coração. O sangue, deixando o coração e a ele voltando, passa por dois circuitos diferentes: a
circulação pulmonar e a circulação sistêmica. Na primeira, o sangue passa através das artérias pulmonares aos pulmões e volta
pelas veias pulmonares ao coração. Na última, o sangue é conduzido pela aorta a todas as partes do corpo e regressa ao coração
através das veias cava superior e inferior e das veias cardíacas.
As artérias são amareladas ou cinzento-azuladas no indivíduo vivo e caracterizam-se pela pulsação. Quando seccionada, a
artéria sangra em jato com sangue rutilante e, se não forem de grande calibre, suas extremidades se retraem de modo a impedir
a hemorragia.
Sumariamente, o sangue oxigenado vindo pelas veias pulmonares chegam ao átrio esquerdo e em seguida ao ventrículo
esquerdo. Após a sístole cardíaca esse sangue é impulsionado ao arco aórtico (aorta ascendente, arco transverso e aorta
descendente) e aorta torácica. Os principais ramos do arco transverso são: tronco braquiocefálico, artérias carótida esquerda e
subclávia esquerda.
Os ramos originários do arco aórtico correspondem aos principais ramos da irrigação do membro superior, do pescoço e do
crânio. Assim, à direita o tronco braquiocefálico irriga o membro superior direito por meio das artérias suclávia direita, axilar e
braquial que na prega do cotovelo originam as artérias radial, interóssea e ulnar (Fig. 1.1). A artéria subclávia esquerda
origina-se diretamente do arco aórtico irriga o membro superior esquerdo com os mesmos ramos arteriais e de mesmo nome
que o membro contralateral.
O outro ramo importante do tronco braquicefálico é a carótida comum direita que se bifurca na região cervical dando
origem às carótidas externa direita, que irriga a face e o couro cabeludo, e a carótida interna direita, que irriga o encéfalo com a
carótida interna esquerda e as duas artérias vertebrais (direita e esquerda). A artéria carótida comum esquerda origina-se
diretamente do arco aórtico e na região cervical se bifurca de maneira semelhante à da direita. Lembre-se que a artéria
vertebral é o primeiro ramo da artéria subclávia de ambos os lados. As artérias vertebrais se unem na fossa posterior do crânio e
origina a artéria basilar que com as duas carótidas internas irrigam o encéfalo mediante o chamado polígono de Willis.
A aorta torácica em seu trajeto descendente no tórax em posição anterior à coluna vertebral troca de nome ao atravessar o
diafragma pelo hiato aórtico e passa a se chamar aorta abdominal, cujos principais ramos viscerais são: o tronco celíaco que
origina as artérias hepática comum, esplênica e gástrica esquerda; logo abaixo a aorta origina a artéria mesentérica superior que
irriga todo o intestino delgado e metade direita do intestino grosso; e ao nível das vértebras lombares L1/L2, lateralmente, a
aorta emite as artérias renais (em geral a direita é mais baixa que a esquerda) e, em seguida, a aorta abdominal origina a artéria
mesentérica inferior que irriga o restante do intestino grosso.
Ao nível de L4 a aorta abdominal se bifurca e origina as duas artérias ilíacas comuns (direita e esquerda) e após trajeto
curto emite dois ramos: a artéria ilíaca interna, que irriga os órgãos da pequena bacia, e a artéria ilíaca externa, que irriga o
membro inferior.
A artéria ilíaca externa muda de nome ao transpor o ligamento inguinal e passa a se chamar artéria femoral comum. Os
ramos arteriais de ambos os lados são simétricos e se distribuem da mesma forma. Assim, após trajeto de 1-2 cm a artéria
femoral comum libera a artéria femoral profunda, que irriga basicamente a coxa e o terço superior da perna, e a artéria femoral
continua como artéria femoral superficial (que irriga pernas e pés). Na porção distal da coxa (canal de Hunter ou dos adutores) a
artéria femoral troca de nome para artéria poplítea. Esta ultrapassa a linha interarticular do joelho e libera a artéria tibial
anterior (que no dorso do pé se chama pediosa) e em seguida o tronco tíbio-peroneiro cujos dois ramos são: a artéria peroneira
(ou fibular) e a artéria tibial posterior (Fig. 1.1).

Figura 1.1 – Artérias de membro superior e inferior.


As veias têm cor azul--escuro no indivíduo vivo e normalmente não pulsam; por isso quando lesada o sangue de cor
vermelho--escuro flui continuamente e não de forma pulsátil. As veias são mais numerosas que as artérias e têm as paredes
mais finas com diâmetro geralmente maior que o das artérias correspondentes. Com poucas exceções, as veias profundas
acompanham as artérias e têm os mesmos nomes. A maioria das que acompanham as artérias abaixo do cotovelo, abaixo do
joelho e em algumas outras localizações são duplas. Diferentemente das artérias, as veias apresentam um contingente
importante de válvulas tanto no sistema venoso superficial quanto no profundo. O número de válvulas aumenta à medida que a
veia se afasta do tronco.
A drenagem do sangue venoso dos membros superiores é feita pelos sistemas venoso superficial e profundo. As principais
veias superficiais são as veias cefálica e basílica, formadas no dorso da mão a partir da rede venosa dorsal. A veia cefálica é
subcutânea e ascende pela superfície lateral do antebraço e do braço, desde sua origem na face lateral do punho até sua
desembocadura na veia axilar. A veia basílica nasce na rede venosa dorsal e sobe em plano subcutâneo pela face medial do
antebraço até o terço inferior do braço. A partir deste ponto ela se torna profunda e caminha ao lado da artéria braquial. As
veias profundas do membro superior originam--se do arco palmar profundo e constituem as veias radiais e ulnares que se
aproximam na fossa cubital e no braço se unem formando a veia braquial; e depois de receber a veia cefálica forma a veia axilar.
Esta, quando ultrapassa a clavícula, forma a veia subclávia que se une com a veia jugular interna e origina o tronco inominado. A
união entre os dois troncos venosos inominados (direito e esquerdo) forma a veia cava superior que drena o sangue no átrio
direito. Basicamente as veias jugulares anteriores e externas drenam o couro cabeludo, a face e o pescoço, enquanto as veias
jugulares internas drenam o sangue intracraniano. A união das veias jugulares internas com as veias subclávias forma os troncos
venosos inominados.
A drenagem venosa dos membros inferiores se faz à custa dos sistemas venosos superficial e profundo. O sistema venoso
superficial é representado, principalmente, pelas veias safenas magna e parva. A veia safena magna se inicia pela veia marginal
do pé e, após um trajeto medial na panturrilha, atinge o joelho e segue obliquamente na coxa, drenando na veia femoral comum
(croça da safena). A veia safena parva inicia--se atrás do maléolo lateral, segue no subcutâneo em seu terço distal e, a seguir,
torna--se subaponeurótica, desembocando em geral na veia poplítea junto à linha articular do joelho.
O sistema venoso profundo drena aproximadamente 95% do sangue venoso do membro. É constituído, na perna, pelas
veias tibiais anteriores, tibiais posteriores e peroneiras (ou fibulares) que se reúnem pouco abaixo da linha articular do joelho
formando a veia poplítea. Nela drena ainda a veia safena parva. A veia poplítea em seu trajeto na coxa muda de nome e
constitui a veia femoral que recebe a drenagem da coxa através das veias profundas. A veia femoral recebe, na fossa oval, a veia
safena magna. Após o ligamento inguinal a veia femoral torna--se veia ilíaca externa que recebe a drenagem do sangue da
pequena bacia pela veia ilíaca interna formando a veia ilíaca comum. A união das duas ilíacas comuns direita e esquerda
constitui o início da cava inferior que se coloca à direita da aorta abdominal e segue em direção ao átrio direito depois de
receber o contingente de sangue das veias renais e veias supra--hepáticas (Fig. 1.2).

Figura 1.2 – Sistema venoso



O sistema vascular linfático é, morfologicamente e funcionalmente, um anexo do sistema sanguíneo. Ele se compõe de três
elementos principais: os capsulares que absorvem a linfa dos vários tecidos e órgãos; os vasos coletores que servem como
condutores de linfa e os nódulos ou gânglios que atuam na dupla função de filtração e atividade imunológica.
Os vasos linfáticos absorvem e carreiam grandes moléculas de substâncias intersticiais devolvendo-as à circulação
sanguínea. Estão presentes na maioria dos tecidos, exceto no sistema nervoso central (SNC), nos músculos esqueléticos (não no
tecido conectivo que os reveste), na medula óssea, na polpa do baço e nas estruturas avasculares, como a cartilagem hialina, as
unhas e os pelos.
A linfa formada nos tecidos é transportada pelo sistema linfático em sentido único, indo dos diferentes tecidos e órgãos até
a base do pescoço. Grande parte da linfa que provém da porção inferior do corpo atinge o ducto torácico, que desemboca no
sistema venoso, na confluência da veia subclávia esquerda com a veia jugular esquerda. A linfa que procede da parte lateral
direita da cabeça, do pescoço e do tronco e do membro superior direito atinge o sistema venoso através do ducto linfático
direito ou torácico acessório que termina na união da subclávia direita com a jugular interna direita (Fig. 1.3).

Figura 1.3 – Drenagem linfática do corpo humano

Semiologia do Sistema Arterial Periférico


A apresentação clínica das doenças do sistema arterial periférico correlaciona-se diretamente com a incompetência deste
em manter suas funções primordiais como estrutura fundamental para a manutenção do funcionamento dos órgãos e dos
tecidos por ele irrigados. As doenças arteriais obstrutivas, sejam ateroscleróticas ou não, e as dilatações aneurismáticas são as
principais afecções que acometem as artérias. Nesse contexto a anamnese e o exame clínico são os passos fundamentais para a
detecção diagnóstica. Independentemente da natureza e da localização de uma doença arterial, o exame clínico deve ser
sempre completo e, no caso das extremidades, simétrico e comparativo. Deve ainda ser sempre acompanhado pelo exame
cardíaco, não abordado neste capítulo.

Anamnese
Como se sabe, as doenças arteriais obstrutivas são mais incidentes nos membros inferiores. Também nesse segmento
anatômico a dor é o sintoma mais frequente, cuja manifestação inicial ocorre somente com o esforço muscular desencadeado
pela deambulação. A atividade muscular requer mais afluxo de sangue oxigenado, além de produzir maior quantidade de
metabólitos ácidos. Quando a demanda não é atendida, a produção insuficiente de ATP (adenosina trifosfato) e o acúmulo de
derivados ácidos do metabolismo anaeróbico passam a estimular terminações nervosas causando sensação de dor, cansaço e
até mesmo câimbra. Tais eventos cessam imediatamente com a interrupção da atividade muscular, o que determina alívio dos
sintomas em poucos minutos. Portanto, a dor atinge determinado grupo muscular, aumenta até o limite de tolerância,
obrigando a interrupção do esforço e, cessando este, desaparece em tempo rápido, podendo reaparecer com a realização de
igual exercício. A essa manifestação denomina-se claudicação intermitente.
A claudicação nos membros inferiores pode ocorrer nos pés, nas panturrilhas, nas coxas e nas nádegas conforme o nível de
obstrução na árvore arterial, bem como também depende da capacidade de formar colaterais desenvolvida pelo organismo.
Chama-se de distância útil aquela que o indivíduo consegue percorrer sem ter dor, geralmente caracterizada em terreno plano
(Fig. 1.4).

Figura 1.4 – Diagrama da claudicação intermitente. P0 = ponto zero – sem dor. PD = ponto dor – início da dor. PI = ponto
impotência – obriga a parar. PR = ponto recuperação – a dor desaparece.



Pode--se dizer que a claudicação intermitente aproxima-se de um sintoma patognomônico de afecção arterial do tipo
obstrutivo. Há algumas situações descritas como pseudoclaudicações intermitentes que não devem ser confundidas com a
verdadeira claudicação intermitente. Tais condições clínicas podem desencadear dor com o exercício, porém a cessação da dor
não ocorre instantaneamente com a cessação do esforço como ocorre na claudicação intermitente. Essas pseudoclaudicações
podem ser causadas por afecções ortopédicas, neurológicas ou reumáticas e um questionamento cuidadoso pode evitar
direcionamentos diagnósticos inadequados com retardo na implementação da terapêutica mais apropriada.
Se houver agravamento da doença arterial obstrutiva, a distância útil diminui e o paciente manifesta a claudicação aos
primeiros passos e culmina com dor em repouso com dificuldade em permanecer de pé. Assim a dor muda de intermitente a
contínua e representa ameaça à integridade dos tecidos.
Alguns pacientes podem procurar atendimento médico nessa fase avançada da doença obstrutiva caracterizada pela dor
no repouso e parestesias geralmente nas porções mais distais das extremidades associada à queixa de frialdade (ou
esfriamento) e alterações de cor variando entre palidez intensa, cianose e, eventualmente, rubor, conforme a posição
pendente. A dormência e o formigamento são as parestesias mais comuns tanto nas isquemias crônicas quanto nas agudas.
A dor em repouso, quando não tratada imediatamente por revascularização da extremidade, cursa com o aparecimento
espontâneo ou após pequeno trauma de lesões tipo úlcera isquêmica ou gangrena. Nessas lesões as dores são contínuas e de
forte intensidade, em geral não cedem com analgésicos comuns e os opiáceos, nesses casos, perdem rapidamente seu efeito,
sendo necessárias doses progressivamente maiores, o que aumenta o risco de dependência. Agravam--se à noite e em época de
frio. Devido à intensidade da dor, o paciente pode perder o apetite, desnutrindo--se rapidamente.
As úlceras isquêmicas e as gangrenas são quadros terminais da doença arterial obstrutiva crônica periférica
(DAOP).
As úlceras isquêmicas são extremamente dolorosas, exceto em diabéticos. Surgem espontaneamente ou após evento
desencadeante, como pequeno trauma ou infecção local nos artelhos, interdigitais, calcâneos, e menos frequentemente nas
panturrilhas. São de difícil cicatrização, a não ser depois da revascularização; tendem a ser rasas e de fundo pálido. É comum na
doença aterosclerótica periférica (Fig. 1.5).

Figura 1.5 – Úlcera isquêmica de calcâneo esquerdo.


A hipertensão arterial grave de longa duração pode desencadear úlceras isquêmicas chamadas úlceras hipertensivas.
Estas comumente são muito dolorosas e surgem na face anteroexterna da panturrilha bilateralmente. As artérias tronculares em
geral são normais nesses pacientes. A causa dessas úlceras é a arterioloesclerose.
As gangrenas nas isquemias crônicas podem se manifestar sob a forma mumificada dos tecidos, tendendo a ser
menos extensas que as gangrenas após isquemias agudas. Atingem a ponta ou os dedos inteiros ou o pé e menos
frequentemente a perna. Quando a necrose está estabelecida e há boa rede colateral, observa--se sulco de delimitação
bem preciso (Fig. 1.6). Em geral esse tipo de gangrena é seco e sem secreção. Por outro lado, a gangrena pode se infectar,
tornando o tecido necrótico macerado, com formação de secreção e, às vezes, lojas de pus. É a chamada gangrena
úmida ou infectada (Fig. 1.7). As gangrenas tendem a ser mais amplas nas oclusões arteriais agudas embólicas ou
trombóticas.

Figura 1.6 – Gangrena seca do hálux (delimitação precisa).

Figura 1.7 – Gangrena infectada em pé diabético (exposição de tendão).


Em oclusões arteriais agudas de membros, os sintomas de dor de repouso surgem no início do quadro ou após
algumas horas. Além disso, os pacientes queixam--se de esfriamento, palidez e parestesia e, se não tratados, evoluem
para as necroses mais extensas do membro isquêmico e pouco delimitadas, pois em geral a rede colateral é escassa (Fig.
1.8).
Além das dores contínuas em repouso, úlceras isquêmicas e gangrenas, o paciente pode se queixar de dores em crises de
moderada à intensa como sequela neurológica de oclusão aguda ou crônica (conhecida como dor da neurite isquêmica),
quando houve retardo na desobstrução ou na reconstrução arterial. Necessita de analgésico potente e pode prolongar-se por
meses ou anos.
A impotência de erecção, seja pela dificuldade de obtê-la e principalmente pela impossibilidade de manter a erecção
peniana, pode ser um dos sintomas dos pacientes com doença arterial. Quando associada à claudicação dos membros inferiores
(região glútea, coxa ou panturrilha) e outros sintomas de isquemia, constitui a síndrome de Leriche.
Outras manifestações menos importantes, em isquemias crônicas prolongadas, podem fazer parte das alterações tróficas
referidas pelos pacientes como queda de pelos dos membros, alterações ungueais (crescimento lento e hipertrofia) e hipotrofia
muscular.

Figura 1.8 – Gangrena extensa de panturrilha pós--isquemia aguda.

Exame Físico
O exame vascular deve sempre ser precedido pelo exame geral, já que a maioria das afecções relacionadas ao sistema
arterial pode ter comprometimento sistêmico ou influenciar outros territórios vitais.
O exame geral e particularmente das extremidades deve ser feito em ambiente de boa iluminação, se possível à luz natural.
A avaliação do sistema arterial deve iniciar-se pelo exame clínico cardíaco seguindo-se para a região cervical com a
observação cuidadosa da pulsatilidade venosa, abaulamentos pulsáteis e posterior palpação. O exame dos pulsos deve ser feito
com pelo menos 2 dedos e sempre na extensão da artéria a ser examinada. O exame do pulso carotídeo deve ser feito na porção
medial do músculo esternoclidomastoideo com o pescoço do paciente ligeiramente rodado para o lado contralateral,
evitando-se manipulação vigorosa do local para não induzir reflexo vagal (Fig. 1.9).

Figura 1.9 – Palpação do pulso carotídeo.



Após a avaliação cardíaca e cervical deve-se prosseguir para o exame dos membros superiores.
Todo exame clínico, de qualquer segmento anatômico ou sistema, deve respeitar uma sequência lógica de avaliação e
interpretação. Assim o exame do sistema vascular dos membros compreende 4 tipos distintos de exploração física: a inspeção, a
palpação, a percussão e a ausculta.
A inspeção estática cuidadosa mediante observação da cor, do trofismo e da presença de abaulamentos pulsáteis ou não,
fornecem informações iniciais e subsídios para uma adequada avaliação de eventuais testes dinâmicos. Os termos relativos à
perfusão nomeados como corado, pálido, cianótico e ruborizado são percebidos nessa fase do exame.
Alterações no estado de nutrição da pele e da musculatura assim como dos fâneros e a presença ou não de edema,
ulcerações e gangrenas são detectadas ainda na inspeção estática.
Em seguida deve-se prosseguir com a inspeção dinâmica. A prova de Buerger (manobra da palidez de elevação) consiste
em elevar os membros, durante cerca de 1 minuto, com o paciente deitado e fazê-lo, em seguida, sentar-se com os membros
pendentes. Quando da elevação dos membros pode-se perceber o grau de palidez e a diferença de coloração entre as duas
extremidades simétricas. Pode-se cronometrar o tempo em que as veias superficiais se enchem com os membros pendentes
(Fig. 1.10A, B e C).

Figura 1.10 – (A) Palidez do pé esquerdo; (B) Veias superficiais vazias no pé isquêmico esquerdo; (C) Rubor pendente à
esquerda.



No membro normal as veias se enchem em até 10 segundos, porém no membro isquêmico esse tempo sempre excede 15
segundos, podendo levar até alguns minutos. O membro isquêmico fica pálido em grau variável e leva mais de 10 segundos para
recuperar a cor, quando pendente, adquirindo progressivamente cor ruborizada após alguns segundos (rubor pendente ou
hiperemia reativa). Essas três manobras posturais – palidez de elevação, enchimento venoso e rubor pendente – devem ser
executadas em continuidade com os membros elevados e a seguir pendentes.
Na palpação deve-se perceber diferenças de temperatura, estado trófico da musculatura e pele. Fundamentalmente, a
palpação dos pulsos dos membros e da aorta abdominal constituem-se manobras essenciais na confirmação e na localização de
alterações no sistema arterial, caracterizando-os como normais, aumentados, diminuídos ou ausentes.
No caso dos membros superiores os testes dinâmicos geralmente são feitos com a palpação dos pulsos. Os pulsos
subclávios devem ser examinados na fossa supraclavicular com o paciente deitado, para que o músculo platisma possa estar
relaxado e a pulsatilidade da artéria subclávia possa ser percebida mais facilmente. O pulso axilar é examinado na porção
anterior da axila com o membro superior flexionado e a mão espalmada na região axilar.
O pulso braquial deve ser palpado no terço distal do braço em sua porção medial entre os tendões dos músculos bíceps e
tríceps. O pulso radial (lateral) e ulnar (medial) devem ser examinados no punho, sendo a artéria radial mais superficial que a
artéria ulnar (Fig. 1.11 A, B, C e D).

Figura 1.11 – (A) Palpação do pulso carotídeo; (B) Braquial; (C) Radial; (D) Ulnar


Deve-se ressaltar a utilidade da palpação do trajeto das artérias para verificar se não há abaulamentos ou tumores
pulsáteis, frêmitos ou ainda endurecimentos segmentares das artérias.
A palpação do pulso aórtico deve ser feita na linha mediana abdominal, acima da cicatriz umbilical, palpando
profundamente contra a projeção anterior da coluna lombar. Quando da detecção de uma massa expansível e pulsátil deve-se
proceder à manipulação cuidadosa desta a fim de definir aproximadamente o diâmetro (Fig. 1.12). Mudança de decúbito pode
auxiliar na diferenciação da massa expansiva de um tumor pulsátil.

Figura 1.12 – Aneurisma da aorta abdominal (massa tumoral visível no abdome)


O pulso femoral é examinado na prega inguinal a meio caminho entre a sínfise púbica e a crista ilíaca anterossuperior. O
pulso poplíteo é percebido no cavo poplíteo através de manobra bimanual envolvendo o joelho do paciente e realizando
discreta flexão deste para facilitar a percepção do pulso na face posterior. Os pulsos pedioso e tibial posterior devem ser
examinados junto ao pé, sendo o primeiro palpado no dorso do pé, lateral ao tendão extensor longo do hálux e o segundo na
região retromaleolar medial (Fig. 1.13).

Figura 1.13 – Palpação dos pulsos (A) Femoral; (B) Poplíteo; (C) Pedioso; (D) Tibial posterior


Índice tornozelo braquial (ITB)

É o teste mais simples para avaliar a circulação do membro inferior. Consiste no registro de pressão de artérias distais
(pediosa ou tibial posterior) com auxílio de um aparelho ultrassônico Doppler. Insufla-se o manguito de pressão convencional
no terço distal da panturrilha até o desaparecimento do fluxo arterial caracterizado pelo Doppler e, em seguida, desinsufla-se o
manguito; o ressurgimento do som determina a pressão distal. Registra-se a pressão de ambas as artérias braquiais. Se houver
discrepância entre elas, usa-se a de maior valor. A razão entre a pressão maleolar (pediosa ou tibial posterior) e a pressão
braquial caracteriza o índice isquêmico (ITB) daquele membro. Há boa correlação entre os valores do índice isquêmico com os
sintomas funcionais. No indivíduo normal, em repouso, o índice varia de 0,9 a 1,3. Pacientes com claudicação têm, em geral, um
índice entre 0,4 a 0,9. Pacientes com dor de repouso apresentam índice abaixo de 0,4 e os com úlcera isquêmica ou necrose,
abaixo de 0,25 (Figura 1.14). Este índice é interessante para caracterizar pacientes claudicantes com pulsos distais palpáveis.
Nota-se a queda do índice registrado em repouso e naquele medido após exercício físico (caminhada). Se não houver variação
da pressão após o exercício, deve haver outra causa que justifique a manifestação de dor no membro. Além disso, o índice
isquêmico deve ser medido em toda visita pós-operatória de paciente que foi submetido à reconstrução arterial, comparando-se
os resultados. A queda do índice pode representar deterioração funcional do enxerto, sugerindo risco de oclusão do enxerto. Em
pacientes com artérias distais calcificadas, não compressíveis, principalmente diabéticos, a pressão do tornozelo pode ser
superestimada.

Figura 1.14 – Registro do índice tornozelo braquial (ITB).


A ausculta é um exame imprescindível no exame arterial. Ela é feita com um estetoscópio comum sobre os grandes troncos
arteriais: carótidas, subclávias (fossas supraclaviculares), aorta abdominal e artérias viscerais (flancos), femorais, poplíteas e
eventuais sopros em outras localizações. Em grandes artérias podem-se auscultar batimentos correspondendo à onda de pulso.
Quando há quebra do fluxo laminar do sangue, transformando-se em turbilhonar, surgem vibrações que têm origem nas
paredes arteriais e dão origem ao frêmito na palpação e sopro à ausculta. Essa situação aparece nas dilatações e nas estenoses
arteriais e nas comunicações arteriovenosas (fístulas). Assim, nos aneurismas arteriais pode-se auscultar sopro sistólico em geral
suave, o que também acontece com as estenoses arteriais. Nestas a intensidade do som é proporcional ao grau de estenose
existente e à velocidade de fluxo, isto é, quanto maior a estenose, mais intenso é o sopro. Nas fístulas arteriovenosas
comumente há sopro contínuo (sistólico e diastólico), com reforço sistólico, intenso e rude também conhecido como sopro em
maquinaria.

Sistema Venoso e Linfático


Anamnese
O paciente portador de doença venosa crônica e ou linfática em geral apresenta sintomas de longa duração. A doença
venosa crônica predominante são as varizes de membros inferiores, que podem ser divididas em dérmicas, reticulares e
tronculares de acordo com seu calibre.
A dor é um sintoma comum na doença varicosa, sendo em geral suportável. Predomina a dor em peso, em queimação ou
desconforto nas pernas que se agrava na época do calor, quando o indivíduo fica muito tempo de pé ou no período pré ou
menstrual na mulher.
A presença das varizes nos membros inferiores também corresponde a uma queixa da mulher, principalmente preocupada
com o aspecto estético das dilatações venosas. Outras manifestações podem estar presentes: prurido, cãimbras e edema
discreto de tornozelo.
O edema também é uma queixa comum tanto na doença venosa quanto na linfática. O edema, na doença varicosa, é
vespertino e discreto no início e, com o correr do tempo, se torna mais intenso e duradouro. O prurido sobre os trajetos venosos
e no terço distal da perna aparece nas varizes de longa duração e nos casos de insuficiência venosa crônica (IVC). Na IVC surgem
manifestações mais graves, como eczema de estase, hiperpigmentação (dermite ocre), lipodermatoesclerose, e culmina com
úlcera venosa ou flebopática. Nesses casos é importante a diferenciação entre as varizes primárias de longa duração e as varizes
secundárias (síndrome pós-trombótica, fístulas arteriovenosas etc.).
As varizes podem se complicar e uma das complicações é a tromboflebite superficial, caracterizada pela dor súbita e
intensa sobre um trajeto venoso associado a processo inflamatório localizado. Quando a dor aguda atinge grupos musculares da
panturrilha piorando nos movimentos de extensão, flexão e deambulação, acompanhado de empastamento (edema) muscular,
sugere a presença de trombose venosa profunda.
Classificam-se as varizes do ponto de vista clínico em 6 níveis conforme o Quadro 1.1.
O edema é a queixa mais comum nas doenças de origem linfática e ele é de longa duração. Está relacionado a doenças
congênitas caracterizadas por aplasia ou hipoplasia do sistema linfático e adquiridas do tipo linfangite ou infiltração tumoral. O
edema linfático é do tipo duro, pouco depressível e proteico. A dor súbita em trajetos linfáticos associado à febre e mal-estar
geral pode corresponder a linfangite aguda.


Quadro 1.1. Classificação clínica*
C0 Ausência de sinais de doença venosa
C1 Teleangectasias e veias reticulares
C2 Veias varicosas
C3 Edema
C4a Pigmentação, eczema
C4b Dermatoesclerose ou atrofia branca
C5 Ulcera venosa cicatrizada
C6 Ulcera venosa aberta

* Fonte: Eklof et al. J Vasc Surg 2004;40:1248-52.


Exame Físico
O exame dos membros, como já assinalado em relação ao exame arterial, deve ser feito em ambiente de boa iluminação, se
possível de luz natural. O exame físico geral deve seguir a sequência habitual para se obter o peso, a altura, o tipo constitucional,
a frequência do pulso, a frequência respiratória, a pressão arterial e a temperatura. O aspecto geral do doente, o
desenvolvimento do panícolo adiposo, dos ossos, do sistema ganglionar linfático e o decúbito preferencial devem ser anotados,
bem como o equilíbrio e a marcha, a umidade e a cor das mucosas. Verificar também a temperatura, a umidade, a coloração e
as cicatrizes da pele.
O exame físico deve ser feito com o paciente de pé, pois a ação da força gravitacional faz que a circulação venosa seja
dificultada, preenchendo o sistema venoso, e dessa forma as veias superficiais se tornam mais visíveis. Nesta posição se
caracterizam melhor os pacientes com varizes de membros inferiores. A paciente de pé deve estar vestida confortavelmente
com roupas folgadas (evitar calça jeans e moletons, pois interferem no resultado). Nos casos em que se procuram sinais de
trombose venosa profunda (TVP) dos membros inferiores, o decúbito dorsal é mais conveniente. Em TVP de membros
superiores e tromboflebites superficiais não há preferência de decúbito.
À inspecção estática deve-se solicitar ao paciente que gire em torno de si por 360° para pesquisar algum tipo de vício
ortopédico, como genuvalgo e genuvaro, pé chato, joanetes etc. Pesquisar a presença de dilatações varicosas sobre o trajeto da
veia safena magna ao nível das faces medial e anteromedial da coxa e da panturrilha com o membro em abdução, rotação
lateral e semiflexão. As varizes do território da veia safena parva devem ser feitas pela face dorsal com a panturrilha semifletida
sobre a ponta dos pés. É necessário igualmente pesquisar a existência de varizes perineares ou de colaterais da croça da safena
magna. O exame da região suprapubiana permitirá caracterizar circulação colateral abdominal, podendo testemunhar sequela
de trombose venosa profunda do segmento ilíaco-cava (síndrome pós--trombótico).
A inspecção estática caracteriza as varizes tronculares (veias com calibre acima de 3 mm) e as de menor calibre definidas
como reticulares (entre 1 e 3 mm) e as teleangectasias ou microvarizes ou varizes dérmicas (1 mm) comumente presentes nos
membros inferiores.
As varizes de longa duração e os pacientes vítima de sequelas de TVP de membros inferiores (síndrome pós-trombótico)
manifestam-se sob a forma de estase venosa mais grave (Insuficiência Venosa Crônica-IVC). Nas regiões peri e inframaleolares
surgem múltiplas veias subdérmicas dilatadas de cor roxo-azulada, conhecidas como coroa flebectásica.
Trajetos venosos sob a forma de vergão vermelho comumente em veias varicosas caracterizam a tromboflebite espontânea
ou podem existir placas de eczemas sobre veias varicosas. A administração de drogas endovenosas ou o cateterismo venoso
podem inflamar as veias manifestando-se na forma de cordão venoso avermelhado e outros sinais inflamatórios caracterizando
a tromboflebite (Fig. 1.15).

Figura 1.15 – Tromboflebite superficial (hiperemia de pele e cordão venoso palpável em coxa).


O surgimento de um trajeto longo, estreito e retilíneo vermelho associado à febre alta sugere linfangite aguda (Fig. 1.16).

Figura 1.16 – Linfangite aguda (hiperemia da pele em trajeto estreito).

Rubor mais intenso em placas ou o terço distal da perna podem ser observados nos casos de erisipelas, eczemas agudos e
lipodermatoesclerose.
A cianose pode ser vista em tromboses venosas maciças (flegmasia cerulea dolens) e em casos menos graves, quando o
membro é mantido pendente. Na IVC a cianose também pode aparecer quando o doente assume a posição de perna pendente.
Em certa fase da TVP ileofemoral não maciça (flegmasia alba dolens) pode surgir palidez por vasoespasmo.
A hiperpigmentação ou dermite ocre é a coloração púrpura ou acastanhada (cor ocre) da pele que geralmente ocorre
na região do tornozelo, mas que pode se estender para a perna e o pé (terço distal da perna), deve-se ao depósito de
hemossiderina, produto de degradação das hemácias extravasadas no interstício quando há IVC de maior duração (Fig. 1.17). No
início da formação dessas alterações, a área é de cor eritemato-purpúrica. Com o decorrer do tempo, a pigmentação torna-se
mais escura, por deposição de melanina devido à irritação local.

Figura 1.17 – Dermite ocre (varizes e hiperpigmentação do terço inferior da perna).


As manchas de cor vinhosa, planas ou ligeiramente cianóticas sugerem hemangiomas simples ou complexos que implicam
abordagens diagnósticas mais elaboradas. Essas angiodisplasias (más-formações venosas) podem ser acompanhadas de veias
varicosas frequentemente difusas, não sistematizadas, associadas às vezes a uma modificação do volume e do comprimento do
membro. As más-formações complexas mais comuns são as síndromes de Klippel-Trenaunay (Fig. 1.18) e Parkes-Weber.

Figura 1.18 – Síndrome de Klippel--Trenaunay (hemangioma, hipertrofia e alongamento do membro inferior direito)


O edema é muito comum nas doenças venosas e quando mais intenso torna-se facilmente perceptível. Nos casos iniciais,
pode-se verificar a formação de godê ou cacifo visível à compressão digital. O acompanhamento diário da medida da
circunferência da coxa ou da panturrilha pode ser útil para analisar sua presença ou regressão. Quando o edema se acompanha
de dilatação da rede venosa superficial comparativamente com o outro lado, sugere a presença de TVP e da rede venosa
colateral colaborando com o retorno venoso do membro.
O edema de origem venosa provoca o extravazamento de líquido para o interstício e este desencadeia o eczema definido
como dermatite eritematosa que pode progredir para vesículas, descamação ou rachaduras na pele da perna, também
conhecido como dermite de estase. Surge em geral em hipertensão venosa de longa duração. Pode ser acompanhada de sinais
de escarificação pelo prurido ou por sensibilizacão a medicamentos tópicos.
A hipertensão venosa grave e de longa duração desencadeia fibrose progressiva da pele e subcutâneo no terço distal da
perna, principalmente em sua face medial, caracterizando a lipodermatoesclerose ou dermatoesclerose ou dermatofibrose ou
celulite endurada (Fig. 1.19). Ela aparece sob duas formas: aguda e crônica.

Figura 1.19 – Lipodermatoesclerose crônica do terço inferior da perna e úlceras flebopáticas.


Na forma aguda, também chamada hipodermite, o paciente apresenta-se, à inspecção, com uma região bem delimitada,
eritematosa ou acastanhada, e discretamente saliente, às vezes com bordas nítidas, que tendem a aumentar de tamanho. À
palpação, apresenta-se endurecida, dolorosa e quente. Pode-se formar, agudamente, uma úlcera em seu centro.
Frequentemente é confundida com flebite ou celulite, distiguindo-se desta por não vir acompanhada de febre, adenomegalia ou
leucocitose.
Na forma crônica o tecido cicatricial determina fibrose progressiva da pele e tecido celular subcutâneo e nos casos de longa
duração o terço inferior da perna vai acinturando, contrastando com o membro edemaciado acima, o que determina uma forma
de bombacha ou garrafa de champanhe invertida (Fig. 1.20). A fibrose na região pode ser intensa, levando tardiamente à
anquilose da articulação tibiotársica. Sobre esta região comumente surgem as úlceras venosas.

Figura 1.20 – Dermatofibrose intensa (perna em forma de bombacha ou garrafa de champanhe invertida).



A visualização do sistema venoso superficial de aparecimento rápido, comparando-se com o outro membro e associada
com outras manifestações sugerem TVP e, quando crônica, pode-se tratar de síndrome pós-trombótica.
Atrofia branca são áreas esbranquiçadas, localizadas, frequentemente circulares de pele atrófica, rodeadas de capilares
dilatados e às vezes de hiperpigmentação.
A úlcera venosa é o grau máximo da alteração trófica da IVC, também chamada úlcera de estase ou flebopática (Fig.
1.21). As úlceras espontâneas surgem principalmente pouco acima dos maléolos internos. Elas são superficiais com bordas
cortadas abruptamente. Podem ser pequenas, tipo lenticular, ou maior numular, mas às vezes se estendem por grandes áreas,
chegando a ser em bota, atingindo toda a circunferência do terço distal da perna. O fundo é liso, avermelhado quando a úlcera
está limpa, mas quando infectada apresenta exsudato seropurulento. É pouco dolorosa, a não ser quando infectada. Podem
estar circundadas pela hiperpigmentação ou dermite ocre. Nas úlceras de longa duração, as bordas podem se tornar calosas e
irregulares e, se elevadas, devem levantar a suspeita de degeneração maligna. Tendem a cicatrizar quando se alivia a
hipertensão venosa com a elevação dos membros inferiores ou corrigindo--se os refluxos venosos da IVC pela cirurgia de varizes
ou pelo uso de meias elásticas.

Figura 1.21 – Úlceras flebopáticas (fundo avermelhado, dermite ocre ao redor no maléolo medial).


Gangrenas de origem venosa podem surgir raramente como complicação da trombose venosa maciça (flegmasia cerulea
dolens). Ela se instala logo de imediato ou alguns dias após a evolução de uma trombose venosa grave, podendo atingir porções
distais e mesmo proximais dos membros (Fig. 1.22).
A inspecção dinâmica associada à palpação podem complementar o estudo das insuficiências valvulares do sistema venoso
superficial (safenas magna e parva e perfurantes). Utilizando-se a manobra de Trendelenburg pode-se caracterizar a
incompetência da junção safeno femoral da veia safena magna e de veias perfurantes da coxa e da perna. Solicita-se que o
paciente assuma o decúbito dorsal e, depois de esvaziar o sistema venoso superficial com a elevação do membro a ser avaliado,
coloca-se um garrote na raiz da coxa e outro junto aos maléolos (dispensável se a prova for realizada rapidamente). A seguir o
paciente assume a posição supina e, mantendo-se os garrotes, se for observado o enchimento das varizes, este sugere
insuficiência de veia perfurante. A seguir retira-se o garrote da coxa: se os novelos varicosos tornarem-se mais túrgidos
caracteriza-se a insuficiência ostial da safena magna e de perfurantes. Outra situação: se, quando o paciente assumir a posição
supina, não houver enchimento inicial das varizes, mas estas se encherem de proximal para distal, após a retirada do garrote da
coxa, sugere-se insuficiência ostial pura de safena magna (Fig. 1.23).

Figura 1.22 –Gangrena venosa (edema importante do membro superior direito). Abaixo, detalhe mostrando a gangrena da
mão direita

Figura 1.23 – Manobra de Trendelenburg.


Quando as varizes são do território da safena parva (face lateroposterior da panturrilha), pode-se lançar mão da manobra
dos três garrotes. Após o decúbito dorsal do paciente e o esvaziamento das varizes colocam-se os dois garrotes em posição
conforme a manobra de Trendelemburg e um terceiro garrote na fossa poplítea. O paciente estando de pé observa-se o
enchimento das varizes, após a retirada do terceiro garrote, no território da safena parva com os mesmos significados que a
manobra anterior, em relação à safena parva.
Por se tratar de manobras qualitativas, seus resultados não são absolutos e servem como indicativos para a melhor
avaliação. Utilizam-se, atualmente, exames de imagens como o eco-Doppler por serem mais fidedignos na caracterização dos
pontos de refluxo ou de incompetência.
À palpação pode-se notar aumento da temperatura da pele sobre os novelos varicosos comparando-se com a pele do
tecido vizinho. Em celulites e erisipelas notam--se em geral aumento local da temperatura, além de outras manifestações
sistêmicas.
Na TVP observam-se aumento discreto da temperatura da pele em virtude da congestão dos tecidos e desvio do sangue do
sistema venoso profundo para o sistema superficial. Entretanto, a sensibilidade tátil para se notar a diferença depende da
temperatura, uma vez que a diferenciação só é possível quando a temperatura for acima de 1 ºC.
O edema quando caracterizado pela depressão da pele (godê ou cacifo) pode sugerir a TVP, principalmente quando
unilateral. Algumas vezes o edema é pouco perceptível à palpação, mas nota-se empastamento muscular (edema muscular),
pela perda do balonamento da panturrilha quando o paciente se coloca em decúbito dorsal e a semiflexão do joelho.
Testam-se nestes casos os sinais de Homans, Babcok e Lowemberg. No primeiro solicita-se ao paciente fazer a
dorsoflexão do pé ativa ou passivamente; se o paciente referir dor na panturrilha, o resultado será positivo. Por meio da
palpação manual (Babcok) ou com o emprego de esfignomanômetro (Lowemberg) junto à panturrilha comprime-se esta; o
resultado será positivo se o paciente referir dor. Os resultados positivos desses sinais sugerem a TVP, mas não são
patognomônicos. Devem ser afastadas reações inflamatórias locais de outras etiologias.
O edema duro, pouco depressivo, sugere o edema linfático conhecido como linfedema. No entanto, nas fases iniciais o
linfedema não apresenta essas características e deve ser feito o diagnóstico diferencial do edema de outras etiologias. A pele no
paciente com linfedema é pálida, podendo apresentar--se avermelhada nos quadros inflamatórios ou infecciosos que surgem no
desenvolvimento da doença. O edema de origem venosa comumente apresenta regressão com o repouso noturno, enquanto o
linfedema pode necessitar de 3 a 4 dias para apresentar efeito similar. Deve-se fazer também o diagnóstico diferencial do
linfedema com o lipedema (denominação imprópria para a lipodistrofia). Esta condição caracteriza a deposição excessiva de
gordura nos membros inferiores e não edema. Não há redução do aumento de volume com o repouso mesmo prolongado.
Nesses casos a pele é elástica e não há sinal de godê. É bilateral e um coxim gorduroso é observado anteriormente ao maléolo
lateral. Os pés são preservados. Um sinal clínico importante para a caracterização do linfedema em sua fase inicial é o de
Stemmer. Este sinal consiste no espessamento cutâneo da base do segundo artelho e é obtido pelo examinador quando se
tenta fazer a preensão da pele dessa região. Em pacientes com linfedema, consegue-se perceber que há uma infiltração dos
tecidos, impedindo uma preensão adequada da pele. Sendo positivo, esse sinal permite diferenciar dos edemas de outras
etiologias.
Os linfedemas de longa duração provocam aumento e deformidade da extremidade pela alteração fibrótica e pelo
aparecimento de verrucosidades, hiperqueratoses e fistulização (Fig. 1.24).

Figura 1.24 – Linfedema crônico gigante



Frêmitos sobre varizes, principalmente aquelas de localizações anômalas, podem ser sentidos nos casos de fístulas
arteriovenosas.
A percussão pode ser feita sobre o sistema venoso superficial e é útil para determinar a continuidade da veia ou a
comunicação entre uma veia e o botão varicoso. A veia dilatada e cheia de sangue conduz um impulso de percussão na mesma
direção do fluxo sanguíneo normal, mas em direção inversa se as válvulas estiverem insuficientes. Assim, a percussão suave de
uma veia e a palpação distal devem ser realizadas como método para detectar o trajeto e as conexões de uma veia dilatada,
enquanto a percussão e a palpação suave e a palpação proximal são usadas como forma de testar válvulas insuficientes no
segmento venoso situado entre as duas mãos (Teste de Schwartz).
A ausculta tem importância na semiologia do sistema venoso, principalmente quando ramos venosos calibrosos estiverem
em posição anormal. Em casos raros pode ser detectada a existência de uma fístula arteriovenosa, pela presença de sopro
contínuo ou em maquinaria sobre as dilatações venosas.
A ausculta também poderá ser usada para o diagnóstico de insuficiência valvular, pela detecção de sopro da safena magna
junto à virilha com o indivíduo de pé ou mesmo deitado, quando se solicita que ele faça esforço abdominal, como tossir.
A semiologia arterial, venosa e linfática evidentemente devem ser executadas de forma concomitante, quando do exame
físico dos membros.

Combinando os Achados: Apresentação das Principais Síndromes Clínicas


Vasculares Periféricas
O diagnóstico completo das principais síndromes clínicas vasculares periféricas, na maioria das vezes, pode ser
caracterizado mediante a anamnese e o exame físico bem executado, sem necessidade de exames subsidiários. Estes serão
recomendados para a completa avaliação do paciente com o objetivo de sua terapêutica e menos frequentemente para se
conseguir o diagnóstico (Quadro 1.2).


Quadro 1.2. Principais síndromes vasculares periféricas

Principais síndromes arteriais


Não alteram o fluxo distal: Aneurismas arteriais
Aumentam o fluxo: Fístulas arteriovenosas (congênitas e adquiridas)
Diminuem o fluxo: Insuficiência arterial periférica:

Aguda Embolia arterial


Trombose arterial
Trauma arterial
Dissecção aguda
Crônica Aterosclerose
Doença de Takayasu
Tromboangeíte obliterante
Doença fibromuscular
Principais síndromes venosas e linfáticas (diminuem o retorno venoso e/ou linfático)
Insuficiência venosa periférica
Aguda Trombose venosa profunda
Tromboflebite superficial
Crônica Primária (varizes de membros inferiores)
Secundária (síndrome pós--trombótico)
Insuficiência linfática periférica
Aguda Linfangite aguda
Crônica Linfedema (congênito e adquirido)


Roteiro de Exame do Sistema Vascular (Quadro 1.3)
Quadro 1.3. Roteiro do exame clínico do sistema vascular
SISTEMA ARTERIAL
Anamnese
Exame Estática (coloração e trofismo da pele, tecido celular subcutâneo
físico e musculatura)
Dinâmica (manobras posturais: palidez de elevação, enchimento
venoso e rubor pendente)
Palpação (pulsos)
Ausculta (grandes artérias)
Percussão
Índice tornozelo braquial (ITB)
SISTEMA VENOSO
Anamnese

Exame Inspecção Estática (ortostática e em decúbito)


físico Dinâmica (manobra de Trendelenburg etc.)
Palpação
Ausculta
Percussão
SISTEMA LINFÁTICO
Anamnese
Exame Inspecção: Deformidades
físico
Palpação: Sinal de Stemmer

Referências Recomendadas
1. Aun R, Puech Leão P. Fundamentos da cirurgia vascular e angiologia. 2ª ed. São Paulo: Casa Leitura Médica, 2009.
2. Joviliano EE, Moriya T, Piccinato CE. Exame do sistema vascular periférico. In: Martinez JB, Dantas M, Voltarelli JC.
Semiologia Geral e Especializada. Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan, 2013, p.166-79.
3. Maffei FHA, et al. Doenças Vasculares Periféricas. 5ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.

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