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Fernando Atz

FUNDAMENTOS E GESTÃO
DE TESOURARIA

MBA em Controladoria e Finanças


SUMÁRIO

Parte I 4

Introdução 5

1. Conceitos Básicos 8

1.1. Liquidez Estática 8

1.2. Capital Circulante (CC) 10

1.3. Capital Circulante Líquido (CCL) 11

2. Caixa X Lucros 12

3. Ciclos Operacionais 14

4. Investimento em Capital de Giro não Monetário 17

5. Necessidade de Capital de Giro 18

6. Nível ótimo de Capital de Giro 23

7. Financiamento do Capital de Giro 27

7.1. Dilema entre Risco e Retorno do Financiamento 27

8. Efeito Tesoura 31

9. Indicadores Dinâmicos de Liquidez 36

Considerações finais 38

Referências 39

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PARTE II 41

Introdução 42

1. Modelos de Administração de caixa 43

1.1. Saldo mínimo de caixa 43

1.2. Modelo do Lote Econômico de Baumol 43

1.3. Modelo de Miller-Orr 45

2. Orçamento de Caixa 49

2.1. Análise da eficiência das projeções de caixa 50

3. Concentração de Caixa 52

4. Caixa, investimentos de liquidez imediata e investimentos em títulos de risco 53

5. Métricas de avaliação de tesouraria 57

Considerações finais 61

Referências 62

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PARTE I

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INTRODUÇÃO

A função principal do departamento de tesouraria é garantir que a empresa tenha sempre


recursos (caixa) suficientes para satisfazer as necessidades de suas operações usuais.
Suas responsabilidades, no entanto, são muito mais amplas, tendo importante papel nas
seguintes funções:

a. Projeções de Caixa: a tesouraria é responsável por compilar dados históricos e gerar


uma previsão de recebimentos e desembolsos de caixa, integrando muitas vezes filiais
localizadas em diferentes cidades, estados e países. Em função dessas projeções, será
possível balancear as durações dos instrumentos financeiros ativos (investimentos)
com as expectativas de desembolso. As projeções também são importantes para
apontar o momento em que a empresa necessitará de mais recursos, para que nesse
caso, possa avaliar a possibilidade de obtenção de aporte de recursos, através de
capital de terceiros (empréstimo bancário) ou de recursos dos sócios.

b. Gestão do capital de giro (CG): o capital de giro é um componente chave para a


elaboração de projeções de caixa, impactando diretamente a disponibilidade de caixa.
Mudanças nos níveis de vendas e de políticas internas na empresa podem afetar
diretamente os níveis de estoques, dos ativos circulantes e os níveis das obrigações
de curto prazo. Adquirir e manter mais estoques pode custar caro, pois o dinheiro
dispendido na aquisição pode prejudicar o ciclo operacional da empresa, devido
ao fato que o dinheiro tem que sair de algum lugar, podendo reduzir as aplicações
financeiras ou demandar a obtenção de empréstimos. O tesoureiro deve monitorar
os níveis de estoque e aconselhar a administração da empresa quanto aos impactos
de mudanças no CG.

c. Gestão de Caixa: Desde a salvaguarda do caixa e dos recursos depositados em bancos,


até a centralização do caixa de empresas que possuem diversas filiais, a tesouraria é
o primeiro responsável por manter a empresa com saldo bancário/financeiro positivo,
financiado ao menor custo possível.

d. Gestão de Investimentos: a gestão do excesso de caixa, de modo a garantir a


manutenção do poder aquisitivo do dinheiro, especialmente em ambientes inflacionários
é uma importante função desempenhada pela tesouraria. Obter retornos elevados
nesses investimentos não é o objetivo primário, pois retorno elevado está associado
à tomada de risco. É muito mais importante gerenciar os ciclos de entradas e saídas

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de caixa, garantindo que não falte dinheiro quando necessário. Assim, a gestão de
investimentos deve avaliar e garantir a devida correspondência entre o vencimento
das aplicações financeiras e as necessidades projetadas de caixa.

e. Gestão de Risco: os juros que uma empresa paga sobre seus empréstimos bancários
podem variar diretamente em função da mudança dos juros de mercado. Em momentos
em que a tendência é de aumento nas taxas de juros de mercado, essa sensibilidade
do custo de financiamento pode se tornar um problema sério, podendo inclusive
transformar um negócio viável em um negócio inviável. Da mesma forma, recursos
financeiros mantidos ou tomados em moeda estrangeira estão sujeitos à variação na
taxa de câmbio. Para ambos os riscos, a tesouraria deve estabelecer estratégias de
gestão de risco e de proteção da posição financeira da empresa.

f. Relação com bancos: uma relação aberta e de longo prazo com os bancos pode resultar
em um certo nível de preferência e cooperação deles com a empresa. Geralmente os
bancos estão mais dispostos a emprestar para aqueles clientes em quem confiam.
Essa confiança é móvel, depende das condições financeiras e operacionais do negócio,
mas pode ser fortemente influenciada pela relação entre as partes.

g. Obtenção de crédito: A tesouraria precisa monitorar constantemente as condições


de mercado. Conhecer profundamente as linhas de crédito disponíveis e ter acesso
a potenciais investidores agrega valor às suas funções. Para isso, o tesoureiro deve
manter excelentes relações com potenciais fornecedores de capital, incluindo bancos
comerciais, bancos de investimento, agências de fomento, investidores anjo, fundos
de private equity, venture capital, etc.

h. Concessão de crédito: A tesouraria tem boas condições de avaliar a situação financeira


de curto prazo de clientes a serem financiados. Nos casos em que o tesoureiro controla
a função de análise e concessão de crédito, ele tem maiores condições de controlar
o capital de giro trancado em contas a receber. Diz-se que o recurso é trancado pois
não se tem exata certeza quanto ao momento em que os recebíveis se transformarão
em caixa, ou mesmo se esses recebíveis efetivamente se transformarão em caixa em
algum momento.

i. Avaliação de desempenho: O tesoureiro tem condições de monitorar a efetividade de


seu departamento. Como exemplos, temos a comparação de projeções de caixa com
o caixa realizado, investigação crítica das variações inesperadas de caixa, comparação

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dos investimentos em instrumentos financeiros com benchmarks de mercado e teste
da aderência às políticas e controles estabelecidos pela alta administração da empresa.

As atividades da tesouraria estão em constante evolução, e devem responder à evolução


do ambiente interno e externo da organização que integram. O tesoureiro deve estar
atento às alterações na tributação de investimentos, aos incentivos fiscais à tomada de
dívida, às inovações tecnológicas, e às incertezas que se manifestam em momentos de
crise.

Como consequência, reforça-se que um planejamento de desenvolvimento profissional


contínuo é fundamental para que a tesouraria tenha condições de atender às múltiplas
demandas ora evidenciadas.

Para melhor compreensão dos desafios enfrentados pela tesouraria, passa-se a analisar
alguns importantes conceitos que permeiam as atividades cotidianas do tesoureiro.

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1. CONCEITOS BÁSICOS

1.1 Liquidez Estática

Ativos de alta liquidez são aqueles que podem ser convertidos em dinheiro com rapidez
e a um baixo custo. Esse é um conceito aplicável tanto para empresas, quanto para
indivíduos.

Suponha que você receba uma chamada extra em seu condomínio, no valor de 5 mil reais
e você tenha apenas 3 mil reais disponível na sua conta corrente. Você poderia facilmente
resgatar um investimento em caderneta de poupança, no valor de 2 mil reais. No entanto,
teria dificuldades para vender sua televisão de 55 polegadas, mesmo que essa tenha sido
adquirida há dois meses pelo valor de 2,5 mil reais. Esses ativos têm graus diferentes de
liquidez. A televisão usada não possui um mercado ativo fácil, demandando muitas vezes
uma venda por preço mais baixo que o esperado. Transformar a televisão em dinheiro
custa mais caro que o valor do próprio dinheiro aplicado, e, muitas vezes, essa operação
pode não se realizar ou demorar a se realizar, por isso não tem tanta liquidez.

Empresas possuem ativos (bens, direitos, caixa) com graus variados de liquidez. É comum
que recebíveis derivados de venda e estoques tenham razoável liquidez. Os estoques são
vendidos, os clientes pagam suas contas, e o dinheiro acaba nas mãos do tesoureiro.
Um ativo imobilizado, como um terreno ou uma sala comercial, pode apresentar pouca
liquidez. Pode ser difícil encontrar um comprador, negociar um preço justo e fechar um
negócio rapidamente.

Há variações no nível de liquidez em ativos de mesma classe. Por exemplo, apartamentos


de dois quartos em excelente localização são negociados com maior frequência que
apartamentos de 5 quatros em localização não tão boa.

Há outra diferença importante entre ativos mais e menos líquidos. Segundo Brealey,
Myers e Allen (2012), os bancos preferem confiar em empresas com ativos mais líquidos
pois os valores contábeis desses ativos são geralmente mais confiáveis que os valores
dos ativos menos líquidos. São comprados e vendidos em um intervalo de tempo menor,
resultando em um melhor nível de informação quanto aos preços de mercado.

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A característica de liquidez de determinados ativos não é fixa. Pelo contrário, momentos
de crise financeira oferecem ricos exemplos em que ativos até então líquidos perdem seu
mercado, tornando-se fundamentalmente ilíquidos. É o caso de um CDB em um Banco
que teve sua falência decretada.

Bancos e investidores preferem colocar seu dinheiro em empresas com alta liquidez. Esse
comportamento é compreensível, pois essas empresas apresentam melhores condições
de pagar suas dívidas, mesmo em circunstâncias negativas de mercado. Elas são menos
afetadas por variações de mercado e por isso tem mais chances de manter-se estáveis em
momentos de crise financeira.

No entanto, altos níveis de liquidez podem representar ineficiência da gestão. Empresas


eficientes não deixam recursos parados no banco, não deixam seus clientes atrasarem
impunemente o pagamento de suas contas, e não mantém estoques indefinidamente em
seus pátios. Altos níveis de liquidez podem indicar descuido no uso do capital à disposição
do gestor financeiro.

Apresenta-se a seguir os principais indicadores estáticos de liquidez considerados pelos


mercados financeiros ao avaliar a situação financeira de uma empresa. São indicadores
estáticos, pois decorrem da posição financeira da empresa em um determinado momento,
usualmente nas datas das demonstrações contábeis ou de informações trimestrais de
companhias abertas.

Liquidez Corrente: Apresenta quanto a empresa possui no Ativo Circulante para cada R$
1,00 de Passivo Circulante.

Fórmula:
𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒

Liquidez Seca: Indica quanto a empresa possui de ativos de alta liquidez para cada R$
1,00 de Passivo Circulante

Fórmula:
𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 − 𝐸𝑠𝑡𝑜𝑞𝑢𝑒𝑠
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒

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Liquidez Geral: Indica quanto a empresa possui no ativo circulante e realizável a longo
prazo para cada R$ 1,00 que possui de endividamento total.

Fórmula:
𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 + 𝑅𝑒𝑎𝑙𝑖𝑧á𝑣𝑒𝑙 𝐴 𝐿𝑜𝑛𝑔𝑜 𝑃𝑟𝑎𝑧𝑜
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 + 𝐸𝑥𝑖𝑔í𝑣𝑒𝑙 𝑎 𝐿𝑜𝑛𝑔𝑜 𝑃𝑟𝑎𝑧𝑜

Para todos estes indicadores de liquidez, a intuição principal é que quanto maior o
indicador, melhor a situação da empresa em função da existência de folga financeira.
Os indicadores estáticos de liquidez não refletem qualidade de desempenho da gestão,
pois são apurados em um determinado momento no tempo, mostrando uma fotografia
da situação financeira. Para avaliar desempenho, é necessário avaliar a evolução dos
indicadores ao longo do tempo, e a sua cuidadosa e ponderada comparação com os
indicadores de empresas comparáveis ou concorrentes.

Em sua tese de doutorado, Matias (1992) identificou que empresas que se tornaram
insolventes ou concordatárias em sua amostra de pesquisa possuíam índices de liquidez
(geral, corrente e seca) adequados ao padrão de mercado nos três anos que antecederam
o pedido de concordata. Essa constatação reforça o fato de que bons indicadores de
liquidez estática não necessariamente implicam em um baixo risco de insolvência.

Indicadores estáticos de liquidez ruins, no entanto, servem como alertas para os analistas,
e em conjunto com os indicadores dinâmicos de liquidez, tratados nos próximos capítulos,
e com uma análise da sensibilidade da empresa às condições de mercado, complementam
e melhoram a capacidade preditiva dos analistas quanto à situação financeira da empresa.

1.2 Capital Circulante (CC)

Também conhecido como Capital de Giro (CG), o Capital Circulante (CC) corresponde ao
ativo circulante de uma empresa, evidenciando o caixa e todos os bens e direitos que
a empresa espera transformar em caixa nos próximos doze meses. O CC expressa as
necessidades circulantes da empresa desde a aquisição de matérias primas até a venda
e o recebimento dos preços cobrados pelos produtos vendidos. Nesse ciclo, os lucros
auferidos nas vendas devem aumentar o ativo disponível, sendo reinvestidos no ciclo
produtivo, direcionados a investimentos de longo prazo ou distribuídos aos acionistas/
sócios.

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1.3 Capital Circulante Líquido (CCL)

Sinônimo de Capital de Giro Líquido (CGL), o Capital Circulante Líquido (CCL) indica a folga
de liquidez da empresa, sendo expresso pela seguinte fórmula:

CCL = Ativo Circulante (-) Passivo Circulante

Nos casos em que o CCL é positivo, a empresa dispõe de ativos líquidos em montante
suficiente para satisfazer suas obrigações de curto prazo. Caso seja negativo, há indicação
de que os passivos circulantes da empresa estão financiando não apenas o ciclo
operacional, representado pelo ativo circulante, mas também os ativos não correntes da
empresa. Em um cenário extremo, a empresa pode estar tomando empréstimos de curto
prazo para financiar ativos que gerarão retorno financeiro somente no longo prazo, o que
prejudica seu ciclo financeiro.

Para Assaf Neto (2010), essa posição de CCL negativo indica um aperto na liquidez da
empresa, principalmente ao observar-se que parte de suas dívidas vencerá em prazos
menores que o retorno das aplicações dos recursos. Exemplificando, adquirir uma máquina
que produzirá retorno positivo somente após cinco anos, e ter que pagá-la integralmente
em apenas um ano consumirá recursos reduzindo a liquidez da empresa.

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2. CAIXA X LUCROS

O lucro contábil, mensurado pelos contadores e divulgado pelas empresas, é uma


medida de desempenho contábil que pode apresentar um razoável grau de subjetividade.
Damodaran (2004) aponta que dois princípios básicos são adotados na formação do lucro
contábil, quais sejam, (a) o regime de competência, que estabelece que despesas e receitas
sejam reconhecidas no resultado quando efetivamente incorridas, independentemente
da sua realização financeira; e (b) a classificação de despesas em despesas operacionais,
de financiamento e de capital (ou de investimentos).

De acordo com o autor, despesas operacionais são aquelas que fornecem benefícios
e geram receitas apenas no período de reporte (matérias primas, custos de produção
vendida, despesas com vendas). Despesas de financiamento são aquelas que surgem
da utilização de capitais de terceiros como fonte de financiamento, sendo necessárias
para remunerar os provedores de capital. Já os desembolsos de capital, mesmo que
integralmente pagos em um determinado período, deverão gerar benefícios econômicos
ao longo de múltiplos períodos. A lógica de apropriação desses desembolsos ao resultado
é que se o bem estará em utilização por um período de X anos, gerará receitas em X anos.
O reconhecimento da despesa necessária para a geração dessas receitas também será
distribuído ao longo do tempo, para melhor refletir a utilização econômica do bem.

Ainda em função da adoção do regime de competência pela contabilidade, em detrimento


do regime de caixa, muito comumente os contadores e os administradores das empresas
utilizam-se de julgamento subjetivo para a elaboração de estimativas de desembolsos
futuros originados de fatos geradores já incorridos. É o caso de uma expectativa de
gasto futuro, ainda incerta, mas de razoável probabilidade, como na liquidação de uma
ação judicial trabalhista na qual a empresa figura como ré. A melhor estimativa possível
é reconhecida na contabilidade, mesmo que os desembolsos só venham a ocorrer no
futuro.

O lucro contábil de uma empresa depende da opinião dos agentes econômicos que o
reportam, e pode estar sujeito ao juízo crítico de auditores independentes e de órgãos
reguladores ou fiscalizadores. Consequentemente, o lucro pode ser considerado, do
ponto de vista financeiro, como uma medida menos confiável que a geração de caixa. Em
uma frase consagrada nos mercados financeiros, de autoria desconhecida, temos que o
lucro é uma questão de opinião, ao passo que o caixa gerado é um fato.

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Felizmente, em benefício da maior informação aos interessados (stakeholders), a geração
de caixa de uma empresa em um determinado período também é reportada obrigato-
riamente pelas empresas por meio da Demonstração dos Fluxos de Caixa. No mercado
de capitais brasileiro, tal obrigação surgiu com a harmonização das práticas contábeis
brasileiras aos princípios internacionais de reporte financeiro (IFRS), promovida pela Lei
nº 11.638 de 2007 e regulamentada pelos documentos emitidos pelo Comitê de Pronun-
ciamentos Contábeis (CPC) desde então.

Na Demonstração dos Fluxos de Caixa, inicialmente as variações nos fluxos de caixa são
segregadas em três categorias, (i) caixa gerado ou consumido nas atividades operacionais
da empresa, (ii) caixa gerado ou consumido nas atividades de financiamento (obtenção de
capitais) e (iii) caixa gerado ou consumido em atividades de investimento. Para maiores
detalhes, sugere-se a consulta ao Pronunciamento CPC 03 (R2) - Demonstração dos Fluxos
de Caixa.

O reporte das variações de caixa decorrentes de atividades operacionais pode ser


apresentado na forma direta, elencando-se todos os pagamentos e recebimentos
realizados pela empresa no curso de suas operações em um determinado período. Alter-
nativamente, há a possibilidade de adoção do método indireto, mais comumente adotada
pelas empresas brasileiras. No método indireto, parte-se do lucro das operações, que é
ajustado para refletir componentes que afetaram o lucro do período, mas não afetaram
a geração de caixa do período, como é o caso de depreciações e do reconhecimento de
provisões.

Damodaran (2004) argumenta que há uma razão bastante direta para que os fluxos de caixa
sejam considerados superiores como medida de desempenho das empresas e negócios.
Segundo o autor, nenhum fornecedor aceitará lucros contábeis como pagamento por
bens vendidos e serviços prestados; todos exigem dinheiro, que são obtidos através da
geração de caixa. Projetos ou empresas com lucros contábeis mas com geração negativa
de fluxo de caixa não são sustentáveis por muito tempo, sendo necessário o equilíbrio
entre os lucros e a geração de caixa. Projetos ou empresas com prejuízo contábil, mas com
geração de caixa positiva podem se sustentar por mais tempo, pois a sua capacidade de
pagamento é reforçada a cada período. No entanto, em algum momento será necessário
gerar lucros, sob pena de não ser possível remunerar os acionistas via dividendos.

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3. CICLOS OPERACIONAIS

As atividades de uma empresa típica comumente envolvem sequências repetitivas de


produção de bens e prestação de serviços, e consequentemente a realização de vendas
e o recebimento dos recursos financeiros correspondentes. A repetição sucessiva desse
ciclo, em uma empresa saudável, deve produzir lucros suficientes para o reinvestimento
nas atividades e para a remuneração dos credores (bancos, detentores de debentures,
etc.) e investidores (acionistas).

A Figura 1 ilustra de forma linear o ciclo operacional da empresa, destacando também


seus ciclos econômico e financeiro.

Figura 1: O Ciclo Operacional

Fonte: Adaptado pelo professor de Assaf Neto (2010, p 559)

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Conforme evidenciado na Figura 1, o ciclo operacional total médio de uma empresa
industrial inicia no momento em que ocorre o recebimento dos materiais que serão in-
dustrializados, engloba o prazo médio em que os materiais permanecem estocados à
espera do início da produção (PMEMP), o prazo médio de fabricação do produto final
(PMF), o prazo médio em que o produto pronto permanece estocado à espera de ser
vendido aos consumidores (PMV) e o prazo médio em que a empresa recebe as vendas
realizadas a prazo. O ciclo econômico desconsidera o recebimento das vendas, levando
em consideração apenas a base de produção da empresa até o momento em que a venda
é concretizada. Já o ciclo financeiro capta o fluxo de caixa das operações, iniciando-se
no momento em que as matérias primas adquiridas são pagas aos fornecedores e
encerrando-se quando os recursos das vendas são finalmente recebidos. Consequente-
mente, o ciclo financeiro é igual ao ciclo operacional total subtraído do prazo médio de
pagamento de fornecedores.

Aqui cabe uma importante ressalva à utilização de prazos médios para fins da determinação
do ciclo financeiro. O gestor financeiro deve conhecer de forma profunda a distribuição
estatística das operações de compras e pagamentos, vendas e recebimentos de suas
empresas. Em alguns casos, a média pode esconder informações importantes. Uma
empresa que apresenta prazo médio de pagamento de fornecedores de 60 dias pode
pagar todos seus fornecedores em 60 dias ou metade de seus fornecedores à vista e
metade em 120 dias. Obviamente, o espaçamento temporal da necessidade de disponibi-
lidade de caixa será bastante diferente nos dois casos.

A mediana, o desvio padrão e até momentos estatísticos superiores como a assimetria


(nível de concentração dos eventos à esquerda ou à direita da média) e a curtose (nível
de concentração dos eventos ao redor da média, determinando o achatamento da curva
de distribuição de probabilidades) podem fornecer informações muito úteis para o
planejamento financeiro.

No Quadro 1, apresenta-se as fórmulas para o cálculo dos índices operacionais necessários


para o mapeamento dos ciclos operacional, econômico e financeiro.

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Quadro 1: Índices Operacionais

𝑆𝑎𝑙𝑑𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑒𝑠𝑡𝑜𝑞𝑢𝑒𝑠 𝑑𝑒 𝑚𝑎𝑡é𝑟𝑖𝑎 𝑝𝑟𝑖𝑚𝑎 𝑒 𝑖𝑛𝑠𝑢𝑚𝑜𝑠


PME 𝑥 360
𝐶𝑜𝑛𝑠𝑢𝑚𝑜 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙

𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜𝑠 𝑒𝑚 𝑒𝑙𝑎𝑏𝑜𝑟𝑎çã𝑜


PMF 𝑥 360
𝐶𝑢𝑠𝑡𝑜 𝑑𝑒 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢çã𝑜 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙

𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜𝑠 𝑎𝑐𝑎𝑏𝑎𝑑𝑜𝑠


PMV 𝑥 360
𝐶𝑢𝑠𝑡𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜𝑠 𝑣𝑒𝑛𝑑𝑖𝑑𝑜𝑠

𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑎𝑠 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑎𝑠 𝑎 𝑟𝑒𝑐𝑒𝑏𝑒𝑟


PMC 𝑥 360
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑖𝑠 𝑎 𝑝𝑟𝑎𝑧𝑜

𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑎𝑠 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑎𝑠 𝑎 𝑝𝑎𝑔𝑎𝑟


PMPF 𝑥 360
𝐶𝑜𝑚𝑝𝑟𝑎𝑠 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑖𝑠 𝑎 𝑝𝑟𝑎𝑧𝑜

Fonte: Adaptado pelo professor de Assaf Neto (2010, p 561).

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4. INVESTIMENTO EM CAPITAL DE GIRO NÃO MONETÁRIO

A definição simples de capital de giro líquido, como a diferença entre ativos circulantes e
passivos circulantes é muito ampla para que seja possível medir a influência do capital de
giro nos fluxos de caixa das empresas.

Damodaran (2004) propõe dois ajustes para tornar essa medida mais útil. Inicialmente,
o autor entende como inapropriado considerar dinheiro como parte do capital de giro,
pois o dinheiro pode ser mantido por razões além da simples necessidade do dia a dia.
O dinheiro pode ser mantido por empresas que pretendem investir em projetos futuros
que possam ser identificados por sua administração ou como rede de segurança para o
caso de momentos difíceis. Também temos que considerar que o dinheiro geralmente
é aplicado, rendendo juros conforme as condições de mercado, não tendo custo de
oportunidade intrínseco. Recursos aplicados em estoques e contas a receber, por outro
lado, tem custo de oportunidade, pois poderiam estar aplicados em outras alternativas,
como em maquinário produtivo.

O segundo ajuste proposto por Damodaran (2004, p 328) é retirar do capital de giro todos
os passivos circulantes com incidência de juros. Assim retira-se do cálculo do capital de
giro o componente de curto prazo de dívidas tomadas em prazo longo, separando-se os
passivos assumidos na atividade operacional da empresa das suas fontes de financiamento
propriamente ditas.

O capital de giro modificado pelas proposições de Damodaran pode ser chamado de


Capital de giro não monetário (CGNM), sendo expresso pela seguinte fórmula:

CGNM=Ativos circulantes não monetários (–)(Passivos Circulantes(-)endividamento)

No contexto do estudo do capital de giro e da gestão de tesouraria, ativos circulantes não


monetários são sinônimos de ativo circulante operacional. Da mesma forma, passivos
circulantes, exceto endividamento, tem o mesmo significado de passivo circulante
operacional.

Os aumentos de CGNM representam saídas efetivas ou potenciais de caixa, como se pode


verificar quando a empresa adquire estoques para revenda ou quando vende a prazo. Em
ambos os casos, diz-se que a empresa tem caixa imobilizado ou preso. Por outro lado,
reduções no CGNM representam fluxos de entrada de caixa, pois liberam o dinheiro da
empresa.

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5. NECESSIDADE DE CAPITAL DE GIRO
A necessidade de capital de giro de uma empresa é derivada diretamente do número de
produtos fabricados e vendidos e do seu ciclo financeiro. Em momentos de crescimento de
vendas, espera-se que aumente a necessidade de manutenção de produtos em estoque.
Se a empresa vende a prazo, quanto maiores as vendas, maior o aumento esperado em
duplicatas a receber. O ciclo operacional da empresa resulta em uma necessidade de
investimento em capital de giro.

O capital de giro adequado deve incluir as necessidades mínimas de ativos circulantes


da empresa, sendo que as necessidades sazonais ou temporárias devem ser supridas
por passivos de prazo de maturidade semelhante ao prazo de realização dos ativos
financiados. No entanto, essa estratégia de utilização de passivos de curto prazo expõe a
empresa à necessidade de renovação constante desses passivos, resultando em um risco
financeiro mais elevado.

As necessidades de capital de giro podem ser observadas diretamente no balanço


patrimonial. De acordo com Matias (2014) a necessidade de capital de giro (NCG) representa
a diferença entre o ativo circulante operacional e o passivo circulante operacional, como
mostra a seguinte equação:

NCG = AC operacional – PC operacional.

Complementarmente, Matias (2014) define como Saldo de Tesouraria a diferença entre o


ativo circulante financeiro e o passivo circulante financeiro, conforme a equação a seguir
evidenciada:

Saldo de Tesouraria (ST) = AC financeiro – PC financeiro

A NCG aumenta quando ocorre aumento nos estoques e nos recebíveis de clientes ou
com a redução dos fornecedores e contas a pagar (salários, contribuições sociais, etc.). Ter
necessidade de capital de giro é algo usual, não representa uma situação negativa para a
empresa, desde que ela tenha acesso a fontes de financiamento a um custo adequado e
em tempo hábil para financiar sua necessidade.

Apresenta-se no Quadro 2 dados extraídos das Demonstrações Financeiras Consolidadas


da Petrobrás em 2013. Conforme evidenciado no Quadro 3, a companhia apresentou em
ambos os períodos um capital circulante líquido positivo, a partir da comparação simples
entre o ativo circulante e o passivo circulante.

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Quadro 2

Ativo Circulante 2013 2012 Passivo Circulante 2013 2012

Caixa e equiva-
37.172 27.628 Fornecedores 27.922 24.775
lentes de caixa

Títulos e valores
9.101 21.316 Financiamentos 18.744 15.283
mobiliários

Contas a receber, Arrendamentos


22.652 22.681 38 37
líquidas mercantis financeiros

Imposto de renda e
Estoques 33.324 29.736 659 704
contribuição social

Imposto de
Impostos e contribui-
renda e contri- 2.484 2.989 10.938 11.818
ções
buição social

Impostos e Dividendos
9.162 8.398 9.301 6.154
contribuições propostos

Salários, férias,
Adiantamento a
1.600 1.895 encargos e participa- 4.806 4.420
fornecedores
ções

Outros ativos Planos de pensão e


2.218 3.168 1.912 1.610
circulantes saúde

Outras contas e
5.691 4.820
despesas a pagar

Subtotal 117.713 117.811 Subtotal 80.011 69.621

Ativos classi- Passivos associados


ficados como a ativos classificados
5.638 290 2.514 0
mantidos para como mantidos para
venda venda

Total 123.351 118.101 Total 82.525 69.621

Fonte: Adaptado pelo professor a partir das demonstrações contábeis da Petrobrás em 2013,
disponíveis em: http://investidorpetrobras.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A-
78D68443E2C48901454D76963A272E.

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Quadro 3

Descrição 2013 2012

Ativo Circulante 123.351 118.101

(-) Passivo Circulante 82.525 69.621

Capital de Giro Líquido 40.826 48.480

Fonte: Elaborado pelo professor.

É possível verificar no Quadro 3 que a companhia apresenta razoável folga financeira


de curto prazo em ambos os períodos, com uma diminuição dessa folga entre 2012 e
2013. Considerando que passivos são origens de recursos e ativos são aplicações de
recursos, podemos concluir que parte dos ativos circulantes da companhia é financiada
por passivos de curto prazo, mas uma razoável parte desses ativos circulantes (cerca de
33%) é financiada por passivos não correntes ou por capitais próprios da companhia.

No Quadro 4, apresenta-se o cálculo da NCG da companhia conforme a definição dada


por Matias (2014), considerando-se o ativo circulante operacional e o passivo circulante
operacional como base para encontrarmos a NCG.

Quadro 4

Descrição 2013 2012

Ativo Circulante 123.351 118.101

(-) Caixa e equivalentes de dívida 37.172 27.628

(-) Títulos e valores mobiliários 9.101 21.316

Ativo Circulante Operacional 77.078 69.157

Passivo Circulante 82.525 69.621

20
MBA em Controladoria e Finanças
Descrição 2013 2012

(-) Financiamentos 18.744 15.283

(-) Arrendamentos mercantis financeiros 38 37

Passivo Circulante Operacional 63.743 54.301

Necessidade de Capital de Giro 13.335 14.856

Fonte: Elaborado pelo professor.

Verifica-se no Quadro 4 que os passivos operacionais financiam apenas parte dos ativos
operacionais. Como podemos presumir que esses ativos operacionais são fundamentais
para o ciclo operacional da companhia, é necessário que eles sejam financiados por
capitais de terceiros, sujeitos a custo financeiro, ou por capitais próprios, sujeitos ao custo
de oportunidade dos acionistas. A decisão de financiamento das operações terá impacto
direto nos fluxos de caixa projetados da companhia, pois resultará em despesas financeiras
ou na geração de expectativa de dividendos mais elevados por parte dos acionistas.

Destaca-se que a função da tesouraria vai muito além de mensurar a necessidade presente
de capital de giro. Conforme destacado nos parágrafos anteriores, a administração dos
componentes do capital de giro resulta em impactos diretos no caixa das empresas,
portanto deve ser considerada pela tesouraria na elaboração do orçamento de caixa da
empresa.

É usual que os componentes do capital de giro sejam projetados das seguintes formas:

a. especificar as exigências de capital de giro como um percentual da receita líquida de


vendas;

b. estimar a demanda por capital de giro como uma função do montante de custos e
despesas operacionais;

c. estimar a necessidade de capital de giro em função do número de unidades vendidas.

É usual que a receita de vendas tenha um maior impacto nos níveis de recebíveis. Os
níveis de estoques, no entanto, podem ter uma relação mais próxima com os níveis de

21
MBA em Controladoria e Finanças
despesas operacionais e custos. Consequentemente, as projeções de cada componente
do capital de giro podem ser associadas a diferentes formas de estimação, de modo a
aumentar o poder preditivo das projeções.

Em situações de expansão das receitas, reduções de custos, reorganização operacional


ou adoção de novos projetos, as projeções de caixa e consequentemente do capital
de giro devem levar em consideração as melhores informações disponíveis quanto às
transformações que a empresa promoverá no período projetado. Recomenda-se também
a análise comparativa com empresas concorrentes, quando possível.

22
MBA em Controladoria e Finanças
6. NÍVEL ÓTIMO DE CAPITAL DE GIRO

Reduzir o capital de giro, mantidos todos os demais fatores de um negócio, aumenta o


valor da empresa. Essa afirmação pode ser ilustrada pelo exemplo de duas empresas que
vendem a cada ano R$ 100 milhões cada uma, com lucro líquido de R$ 50 milhões nessas
vendas. Caso a primeira empresa consiga esse lucro mantendo um saldo de estoque
constante de R$ 50 milhões, e a segunda empresa obtenha o mesmo lucro trabalhando com
um nível de estoques menor, digamos R$ 20 milhões, a segunda empresa terá condições
de retornar uma parcela maior de caixa aos seus acionistas. Logicamente, quanto maior o
potencial de geração de caixa de um investimento, mantidos constantes todos os demais
fatores, maior o valor desse investimento.

Não se pode, contudo, trabalhar com um objetivo imutável de reduzir os níveis de capital
de giro ao mínimo. Há circunstâncias nas quais o aumento de capital de giro é necessário
e justificável. É o caso dos ciclos de expansão de atividades. Segundo Damodaran (2004),
as empresas mantêm estoques e permitem que os clientes comprem a crédito para que
possam atender às necessidades dos clientes no tempo devido, diminuindo as chances de
que os clientes procurem obter os produtos que demandam em outros vendedores. No
mesmo sentido, a política de concessão de crédito comercial aos clientes é necessária para
que clientes sem condições financeiras para compra à vista possam comprar, evitando
que vendas sejam perdidas.

As decisões quanto ao nível de capital de giro, tais como o tamanho dos estoques e o
nível de exigência adotado no processo de concessão de crédito devem ser ponderadas.
Um capital de giro maior pode resultar em menos caixa de imediato, mas pode ser
consequência de uma expansão nas atividades com o objetivo de aumentar os lucros,
que serão transformados em fluxo de caixa em um momento futuro.

Ao avaliar os ganhos de caixa imediatos pela redução nos níveis de capital de giro, temos
que medir a extensão em que essa redução de capital de giro afetará as receitas e o
crescimento da empresa. Dada a dificuldade de estimar o tamanho dos efeitos que as
variações no capital de giro podem gerar nas operações, as empresas utilizam métodos
simplificados para estimar o capital de giro ótimo, tais como a padronização dos índices
de capital de giro a partir de empresas ou negócios comparáveis que operam na mesma
linha de negócios (DAMODARAN, 2004).

23
MBA em Controladoria e Finanças
A agregação de empresas comparáveis e a determinação de padrões setoriais oferece
alguns argumentos bastante razoáveis para a definição de um nível ótimo de capital de
giro. O primeiro argumento é que o processo de agregação diluirá erros que empresas
isoladas cometem na sua gestão de capital de giro, resultando em uma média que
fornece uma visão sem viés dos níveis ideais de capital de giro. O segundo argumento
é que investidores, agências de pesquisa e de classificação de investimentos realizam
comparações entre empresas e seus setores, podendo penalizar ou questionar empresas
que apresentem níveis de capital de giro muito diferentes dos do seu setor.

No Quadro 5, apresenta-se a comparação entre o nível de capital de giro operacional


(equivalente à NCG) da Petrobrás e o das indústrias que competem no mesmo setor nos
mercados emergentes e no mercado norte-americano, conforme pesquisa divulgada por
Damodaran(2014)1. Verifica-se que a Petrobrás tem uma NCG normalizada em função de
suas vendas maior do que a média de seus concorrentes. Como consequência, uma maior
parte do seu capital de giro operacional deve ser financiado por recursos tomados em
banco ou por seus acionistas, os quais cobram seu custo de oportunidade.

Quadro 5

Descrição 2013 2012

Vendas (em R$ mil) 304.890,00 281.379,00

Capital de Giro Operacional (NCG) 13.335,00 14.856,00

NCG / Vendas 4,37% 5,28%

Percentual Oil & Gas - Países Emergentes 2,68% 2,68%

Percentual Oil & Gas - Estados Unidos 2,53% 2,53%

Fonte: elaborado pelo professor.

1 http://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/data.html, acesso em 06 de novembro de


2014

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MBA em Controladoria e Finanças
Os índices de necessidade de capital de giro variam significativamente de setor para
setor. Da mesma forma, empresas em países diferentes, mesmo que em um mesmo
setor, tendem a apresentar significativa variabilidade nos níveis de capital de giro. É o
que se verifica nos dados divulgados por Damodaran (2014). No Quadro 6, apresenta-se a
comparação para fins ilustrativos de alguns importantes setores da economia.

Quadro 6

Capital de giro operacional / vendas

Nome do Setor Países Emergentes Estados Unidos

Software e serviços de internet -23,33% 11,34%

Telecomunicações sem fio -12,63% 7,60%

Transporte Aéreo -9,76% 3,46%

Seguros -9,68% -10,72%

Móveis para casa -8,64% 14,65%

Maquinário 30,48% 24,77%

Tabaco 31,31% 16,01%

Equipamentos de saúde 36,29% 23,40%

Aeroespacial/Defesa 36,99% 26,81%

Imobiliário (Operações e Serviços) 44,20% 6,95%

Construção de casas 108,98% 75,35%

Imobiliário (Geral/Diversificado) 147,34% 28,43%

Fonte: Preparado pelo professor a partir de dados divulgados por Damodaran (2014)

Apesar da maior simplicidade da utilização de índices setoriais de investimento em capital


de giro, sugere-se que a gestão de tesouraria adote um certo grau de ceticismo ao avaliar

25
MBA em Controladoria e Finanças
os níveis dos componentes do ativo operacional e do passivo operacional. Uma avaliação
criteriosa, criticando práticas históricas consolidadas na empresa e propondo a avaliação
técnica da efetividade dessas práticas e de alternativas pode resultar em melhores
resultados econômicos e financeiros, além de resultar em um aumento do conhecimento
acerca dos complexos componentes que afetam o ciclo operacional da empresa.

26
MBA em Controladoria e Finanças
7. FINANCIAMENTO DO CAPITAL DE GIRO

A teoria financeira propõe que o retorno requerido por investidores é diretamente


profissional ao risco assumido. Como consequência, instituições financeiras que emprestam
recursos a empresa cobrarão juros mais altos para financiar projetos mais arriscados.
Empréstimos mais longos apresentam maior risco, em função de uma menor capacidade
de previsão da capacidade de pagamento do devedor e das condições econômicas, tais
como as taxas de juros de mercado, que vigorarão no prazo do empréstimo. Em condições
normais de mercado, devemos encontrar uma relação direta entre prazo dos empréstimos
e taxas de juros. Empréstimo para aquisição de estoques com vencimento em três meses
deve ser mais barato que um empréstimo com vencimento em um ano.

A lógica anteriormente detalhada é aplicável ao financiamento de capital de giro, mas


não é regra no que se refere ao financiamento de longo prazo de investimentos em
ativo permanente no mercado financeiro Brasileiro, em função da atuação do BNDES. A
referida instituição financeira subsidia diversas linhas de crédito para investimentos de
longo prazo, fazendo com que as taxas de juros nessas operações sejam muito inferiores
às taxas de juros básicas de mercado, como é o caso da Taxa SELIC.

Por outro lado, há diversas linhas de crédito de curto prazo específicas para setores da
economia, muitas vezes também contando com subsídio governamental. Um exemplo
importante de linha de curto prazo para financiamento de capital de giro é o dos
Adiantamentos de Contratos de Câmbio (ACC) (FORTUNA, 2010). Essa linha de crédito conta
com taxas de juros muito atrativas e inferiores às taxas de mercado. Nessa modalidade, os
exportadores tomam recursos para financiar o capital de giro necessário para exportar.

7.1 Dilema entre Risco e Retorno do Financiamento

Nos casos em que as empresas apresentam necessidade de capital de giro positiva,


em decorrência de terem mais ativos operacionais do que passivos operacionais, o
financiamento mediante a captação de recursos de terceiros resulta em um importante
dilema, abordado por Assaf Neto (2010).

A preferência pela captação de recursos de curto prazo, quando esses são mais baratos
que os de longo prazo, para financiamento das necessidades de capital de giro das
empresas resulta em dois efeitos conflitantes. O primeiro deles é a possibilidade de

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MBA em Controladoria e Finanças
obtenção de lucros maiores, como consequência de juros menores associados à tomada
de crédito no curto prazo. O segundo é o aumento do risco geral da empresa para o
acionista e para os credores (inclusive as instituições financeiras que emprestam para a
empresa) em função da maior sensibilidade das taxas de juro de curto prazo às alterações
de conjuntura econômica e da necessidade de constante renovação dos empréstimos
de curto prazo. Assim, a empresa que financia sua NCG primariamente utilizando-se de
recursos de curto prazo terá maiores problemas quando ocorrerem aumentos nas taxas
de juros de mercado, e estará muito mais exposta a momentos de escassez de crédito no
mercado.

Em um mercado de capitais dinâmico, os preços das ações responderão rapidamente às


alterações no perfil de endividamento das empresas, punindo comportamentos julgados
inadequado pelos investidores e premiando a adoção das melhores práticas de mercado.
Alterações na política de financiamento de capital de giro não são exceção a essa regra
empírica.

Decisões financeiras de curto prazo diferem substancialmente das decisões de longo


prazo. A primeira diferença óbvia é a destinação dada aos recursos obtidos por meio
do financiamento. A boa técnica e a teoria financeira sugerem, conforme anteriormente
mencionado, que os ativos de longo prazo não devem ser financiados por passivos de
curto prazo, sob pena de comprometerem a capacidade de pagamento do tomador de
recursos.

Brealey, Myers e Allen (2012) afirmam que não há uma teoria convincente para responder
qual o nível ideal de distribuição de fontes de financiamento entre curto e longo prazo,
mas há evidências empíricas de que os gestores financeiros tentam manter correspon-
dência de prazos de maturidade (maturity) dos ativos e passivos, sendo essa maturidade
o principal fator que determina as decisões tomadas por esses gestores no que se refere
à distribuição temporal do endividamento.

Assaf Neto (2010) propõe duas abordagens para o financiamento do capital de giro, quais
sejam a abordagem pelo equilíbrio tradicional e abordagem de risco mínimo.

A abordagem de risco mínimo é teoricamente mais simples, mas de difícil execução prática
no caso de empresas que utilizam endividamento bancário como fonte de financiamento.
Sob essa abordagem, tanto o capital de giro permanente, que se repete periodicamente

28
MBA em Controladoria e Finanças
em função das atividades normais de uma empresa, quanto o capital de giro sazonal,
representado por variações temporárias nos negócios, são integralmente financiados por
recursos de longo prazo.

Nos casos de dificuldade de obtenção de recursos bancários para financiar o capital de


giro permanente, a empresa pode recorrer ao mercado de títulos de dívida, como é o caso
das Debêntures. Nesse mercado, a empresa toma recursos emprestados de diversos
investidores, respeitadas as normas de emissão e as condições de mercado. Trata-se de
um mercado em desenvolvimento no Brasil, mas apesar do crescimento considerável
apresentado na última década, o mercado de dívida brasileiro ainda é pequeno comparado
com países desenvolvidos, em função do próprio histórico do mercado (emissões de curto
prazo e altas taxas de inflação e juros), da falta de liquidez dos títulos de dívida em mercado
secundário, dos altos custos de captação e da concorrência com os financiamentos
concedidos pelo setor público, como os concedidos pelo BNDES (Pimentel et al, 2009).

Na abordagem de equilíbrio tradicional, apenas as necessidades permanentes de capital


de giro são financiadas por recursos de longo prazo. No caso de alterações sazonais, tais
como o aumento de vendas em um ano de resultados econômicos excepcionais e não
duradouros, a empresa financia o aumento temporário da NCG por meio da utilização de
recursos de curto prazo. O maior risco dessa estratégia decorre da incerteza quanto à dis-
ponibilidade dos recursos bancários de curto prazo e ao seu custo nos momentos em que
fatores sazonais exijam a tomada de recursos para fazer frente à NCG. Os problemas dessa
abordagem foram observados na prática na pesquisa de Graham e Harvey (2001) com
diretores financeiros de grandes empresas americanas, segundo os quais as companhias
tomam dívida de longo prazo para evitar a necessidade de refinanciamento em períodos
econômicos ruins.

Verifica-se também que para muitas empresas a manutenção de um CGL elevado é


um fator decisivo, pois diminui os custos associados à captação de recursos no curto
prazo e permite a essas empresas agilidade em decisões de investimento. Empresas que
investem pesadamente em oportunidades de pesquisa e desenvolvimento e tecnologias
inovadoras podem utilizar seus excessos de caixa para agir rapidamente e aproveitar
essas oportunidades. Essas empresas necessitam de maior financiamento de longo prazo
por meio de dívida ou de recursos dos sócios, obtidos com a emissão de ações.

29
MBA em Controladoria e Finanças
No entanto, destaca-se que a acumulação permanente de caixa pode ser prejudicial aos
acionistas da companhia, tendo em vista que esses acionistas desejam receber dividendos
em algum momento e que a existência de saldos elevados de caixa está associada a
conflitos de agência, decorrentes da separação entre a propriedade da empresa (sócios) e
a administração (diretores profissionais).

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MBA em Controladoria e Finanças
8. EFEITO TESOURA

Em casos extremos, mas não incomuns, aumentos constantes na necessidade de


capital de giro podem conduzir ao aumento do saldo negativo de tesouraria. O saldo
de tesouraria (ST) é definido pelos ativos circulantes financeiros deduzidos dos passivos
circulantes financeiros. A consequência imediata é a necessidade de captação de recursos
financeiros para bancar a NCG. O crescimento da necessidade de capital de giro (NCG)
superior ao aumento do capital de giro líquido (CGL) faz com que ocorra o efeito tesoura,
exemplificado na figura 2.

Figura 2: Efeito Tesoura

Fonte: Mathias (2014)

A Área 1 da Figura 2 representa o período em que o CGL é maior do que a NCG. Como
consequência, a NCG é financiada por origens de recurso de longo prazo. A partir do
ponto central da tesoura, a NCG e o CGL se cruzam e assumem tendências opostas. Na
Área 2 a NCG cresce muito mais que o CGL, tornando os saldos de tesouraria cada vez
mais negativos.

31
MBA em Controladoria e Finanças
O efeito tesoura foi proposto por Fleuriet, Kehdy e Blanc (1978). Os autores desenvolveram
um modelo para análise das dinâmicas do saldo de tesouraria para reconhecer e analisar
em profundidade os riscos decorrentes de fraquezas estruturais nas demonstrações
contábeis das empresas. De acordo com Fleuriet (2005), a NCG expande quando as vendas
aumentam e diminui quando as vendas diminuem, sendo crítica para a performance
financeira da empresa a forma adotada para satisfazer as necessidades crescentes de
capital de giro. Se o capital circulante líquido da empresa não cobre a NCG crescente, a
empresa comumente recorre a endividamento de curto prazo, resultando em um saldo
negativo de tesouraria e um ciclo negativo de aumento do custo de captação.

Para Matias (2014), há casos em que empresas podem utilizar o efeito tesoura em uma
situação de alavancagem financeira, captando a um custo financeiro menor do que o
retorno obtido pelo capital de giro. Se a empresa tomar empréstimos bancários a 2%
ao mês e 4% ao mês sobre vendas a prazo, estará obtendo um spread que resultará em
maior lucratividade. O efeito tesoura não é sempre prejudicial para a condição econômica
da empresa, que pode manter-se lucrativa. No entanto, considerando que o efeito
tesoura leva a uma espiral negativa em termos de liquidez e capacidade de pagamento,
espera-se que não seja possível manter-se lucrativo no longo prazo quando a NCG é cada
vez maior que o CGL e o saldo de tesouraria é negativo. Nesse caso, temos a ocorrência
de overtrading, nomenclatura dada ao ato de conduzir negócios além da capacidade de
financiamento da NCG decorrente desses negócios, impossibilitando o financiamento do
efeito tesoura.

Apresenta-se no Quadro 7 e na Figura 3, a análise da evolução da NCG da Bombril S.A. no


período de 2011 a 2013. Conforme evidenciado na Figura 3, a situação atual é bastante
semelhante à teoria representada na Figura 2. A NCG apresenta tendência de crescimento
e o CGL representa tendência de tornar-se cada vez mais negativo.

Quadro 7

Bombril S.A. 2013 2012 2011

Ativo Circulante (AC) 332.574 287.813 244.669

Ativos Financeiros (AF) 25.980 36.872 34.159

Caixa e Equivalentes 25.980 28.900 16.779

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MBA em Controladoria e Finanças
Aplicações Financeiras - 7.972 17.380

Ativos Operacionais (AO) 306.594 250.941 210.510

Contas a Receber 247.495 179.965 144.404

Estoques 33.721 55.811 61.368

Tributos a recuperar 17.626 12.527 3.940

Despesas Antecipadas 7.752 2.638 798

Passivo Circulante (PC) 372.440 290.146 274.441

Passivos Financeiros (PF) 114.656 75.273 71.436

Empréstimos e Financiamentos 114.656 75.273 71.436

Passivos Operacionais (PO) 257.784 214.873 203.005

Obrigações Sociais e Trabalhistas 15.908 15.316 13.563

Fornecedores 123.289 103.907 76.186

Obrigações Fiscais 91.131 71.614 64.161

Outras Obrigações 17.672 16.607 42.921

Provisões 9.784 7.429 6.174

     

2013 2012 2011

AC 332.574 287.813 244.669

(-) PC 372.440 290.146 274.441

(=) CGL -39.866 -2.333 -29.772

       

AO 306.594 250.941 210.510

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MBA em Controladoria e Finanças
(-) PO 257.784 214.873 203.005

(=) NCG 48.810 36.068 7.505

       

AF 25.980 36.872 34.159

(-) PF 114.656 75.273 71.436

(=) ST -88.676 -38.401 -37.277

Fonte: Elaborado pelo professor a partir das demonstrações contábeis da Bombril S.A 2.

Figura 3

Fonte: Elaborado pelo professor a partir dos dados apresentados


no quadro 7.

Quais atitudes dos gestores poderiam resolver o problema de uma empresa que se
encontra em situação semelhante à representada na Figura 3? A ação dos gestores pode
ser focada em duas áreas. A solução mais direta seria o aumento do CGL para fazer frente

2 http://www.mzweb.com.br/bombril/web/download_arquivos.asp?id_arquivo=43E956E7-69A1-407C-A-
6D0-095DB883B188, acesso em 06 de novembro de 2014

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MBA em Controladoria e Finanças
à crescente NCG. Para tanto, a empresa deveria captar recursos de longo prazo com seus
sócios ou no mercado financeiro. Não se trata, contudo, de solução simples. Empresas
altamente endividadas sofrem com os chamados custos de falência (Brealey, Myers e
Allen, 2011).

Para entender os custos de falência, você deve considerar as dificuldades de fazer


negócios que são enfrentadas por pessoas ou empresas altamente endividadas.
Desequilíbrios financeiros podem ou não levar à falência, mas os investidores e credores
tendem a penalizar empresas muito endividadas. Essa penalização ocorre, por exemplo,
quando o credor exige um retorno mais elevado por prover capital (taxas de juros mais
elevadas). Assim, uma empresa que apresenta endividamento elevado de curto prazo,
superior aos seus ativos circulantes, pode encontrar muitas dificuldades para obter novos
financiamentos de curto e longo prazos.

Outra alternativa para conter ou reverter o efeito tesoura é a redução da NCG mediante
revisão das políticas de administração dos seus componentes. Reduzir os saldos de
estoques por meio de uma administração mais eficiente, melhorar o ciclo financeiro
negociando melhores condições de pagamento de seus fornecedores, e reduzir o ciclo de
recebimento de vendas a prazo, são medidas que podem reverter a tendência negativa
do efeito tesoura. Essa alternativa nem sempre é viável, pois depende de condições
mercadológicas e da credibilidade da empresa perante seus clientes e fornecedores.

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MBA em Controladoria e Finanças
9. INDICADORES DINÂMICOS DE LIQUIDEZ

Em complemento aos indicadores estáticos de liquidez, com o objetivo de permitir


a análise e o monitoramento de aspectos mais complexos da gestão financeira, a
doutrina desenvolveu os chamados indicadores dinâmicos de liquidez. Esses indicadores
demonstram a evolução da capacidade de pagamento da empresa por meio da avaliação
da evolução do CGL, da NCG e do ST (Matias, 2014):

Termômetro Financeiro = Saldo de Tesouraria (ST) / NCG

Coeficiente Efeito Tesoura = ST / Receitas

Coeficiente de Equilíbrio Financeiro = CGL / Receitas

Apresenta-se no Quadro 8 a análise dos indicadores dinâmicos de liquidez da Petrobrás


S.A. e da Bombril S.A. Para os três indicadores dinâmicos de liquidez, a intuição é que
quanto maior o valor do indicador, maior a folga financeira da empresa. Como esperado,
os indicadores da Petrobrás são muito superiores aos da Bombril nos anos-calendário
2012 e 2013. A presença de indicadores negativos na Bombril indica a presença do efeito
tesoura.

Quadro 8

  Ano ST NCG CGL Receitas

2012 33.624 14.856 48.480 281.379


Petrobras
2013 27.491 13.335 40.826 304.890

2012 -38 36 -2 980


Bombril
2013 -89 49 -40 1.147

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  Ano TF CET CEF  

2012 2,26 0,12 0,17  


Petrobras
2013 2,06 0,09 0,13  

2012 -1,06 -0,04 0,00  


Bombril
2013 -1,82 -0,08 -0,03  

Fonte: Elaborado pelo professor.

É importante ressaltar também que a análise de liquidez não deve se resumir a indicadores
baseados em saldos contábeis. É fundamental conhecer a fundo os prazos de recebimento
e pagamento que afetarão o caixa da empresa de modo a garantir a existência de caixa
sempre que preciso, ao melhor custo possível. Trataremos desse tópico em uma seção
específica sobre orçamento de caixa.

37
MBA em Controladoria e Finanças
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os desafios enfrentados pela área de gestão de tesouraria são bastante complexos. Existe
uma evidente correlação entre o desempenho operacional da empresa e a necessidade de
garantir a existência de caixa nos momentos apropriados ao menor custo possível. Con-
sequentemente, a tesouraria e as demais áreas da gestão da empresa devem trabalhar
em harmonia, conhecendo os impactos que suas decisões acarretam no desempenho da
empresa e otimizando os fluxos financeiros, com o objetivo final de proteger e entregar
valor aos acionistas.

38
MBA em Controladoria e Finanças
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Empresarial Brasileiro no mercado de dívida de longo Prazo. VI International Finance
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SHARPE, William Forsyth. Capital asset prices: a theory of market equilibrium under
conditions of risk. Journal of Finance, [S.l.]: v. 19, p. 425-442, sep. 1964.

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MBA em Controladoria e Finanças
PARTE II

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MBA em Controladoria e Finanças
INTRODUÇÃO

A gestão de tesouraria integra os demais componentes do capital de giro, pois todas as


movimentações financeiras decorrentes de alterações no capital de giro passam pelo caixa.
O fluxo financeiro que ocorre desde o pagamento dos fornecedores até o recebimento de
clientes transitará pelo caixa, demandando um controle de gestão de tesouraria para uma
administração precisa, evitando a falta de recursos. Da mesma forma, o excesso de caixa
deve ser administrado para que não perca valor em função da inflação e possa satisfazer
a demanda da empresa por caixa.

De acordo com Assaf Neto (2010), a falta de sincronização entre os recebimentos de clientes
e os pagamentos a fornecedores é que determina a demanda por caixa das empresas, ao
lado da precaução necessária para fazer frente a despesas ou gastos extraordinários.
Para ambos os casos, quanto maior a sobra de caixa, maior a margem de segurança
financeira ao dispor da empresa. E, quanto maior a facilidade de captação de recursos de
uma empresa para fazer frente às demandas inesperadas, menor a necessidade dessa
margem de segurança.

Em um mercado perfeito, sem fricções e custos de transação, manter recursos em caixa


ou utilizar esses recursos para diminuir o endividamento atual são alternativas que
conduzem ao mesmo resultado, uma maior capacidade futura de financiar oportunidades
de investimento que demandam por caixa. Reconhecendo as imperfeições e fricções
típicas dos mercados financeiros, Almeida, Campelo e Weisbach (2004) propuseram uma
forma alternativa de encarar essa questão, segundo a qual empresas que encontram
restrições financeiras, traduzidas numa maior dificuldade de acesso aos mercados de
capitais, tendem a acumular caixa guardando grande parte de seus fluxos de caixa. De
acordo com Archarya, Almeida e Campello (2007), essa preferência por acumulação de
caixa decorre de uma política de proteção (hedging) contra o risco de não conseguir obter
financiamento no futuro para os projetos de investimento da empresa.

Na sequência, passa-se a analisar modelos de gestão de caixa e investimentos e a


elaboração de orçamentos de caixa. Finalmente, trata-se de sugestão de métricas de
avaliação das funções de tesouraria.

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1. MODELOS DE ADMINISTRAÇÃO DE CAIXA

1.1 Saldo mínimo de caixa

Assaf Neto (2010) propõe uma métrica simples para aferir o saldo mínimo de caixa a ser
mantido pela empresa, que consiste na aplicação da seguinte fórmula:

𝐷𝑒𝑠𝑒𝑚𝑏𝑜𝑙𝑠𝑜𝑠 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑖𝑥𝑎


𝑒𝑠𝑝𝑒𝑟𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑒𝑚 𝑢𝑚 𝑝𝑒𝑟í𝑜𝑑𝑜
𝑆𝑎𝑙𝑑𝑜 𝑀í𝑛𝑖𝑚𝑜 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑖𝑥𝑎 =
𝐺𝑖𝑟𝑜 𝑑𝑒 𝐶𝑎𝑖𝑥𝑎 𝑛𝑜 𝑝𝑒𝑟í𝑜𝑑𝑜

Supondo que o ciclo financeiro de uma determinada empresa seja de 120 dias (quatro
meses), seu caixa girará três vezes em um determinado ano. Assumindo uma expectativa
de desembolsos totais de caixa em um determinado ano no montante de R$ 2,1 milhões,
temos que o saldo mínimo de caixa será equivalente a R$ 2,1 milhões dividido por 3. Como
consequência, se a empresa iniciar o ano com R$ 700 mil em caixa, deverá ter condições
de suportar seu ciclo financeiro integralmente sem a necessidade de novas captações de
recursos ao longo do período.

Destaca-se que este modelo apresenta limitações importantes, pois pressupõe fluxos de
caixa uniformes ao longo do período. Assim, caso a empresa tenha previsão de gastos
maiores no primeiro semestre em comparação ao segundo semestre, o saldo mínimo
pode mostrar-se insuficiente no primeiro semestre e excessivo no segundo. Da mesma
forma, efeitos inflacionários devem ser levados em consideração, e os ajustes apropriados
devem ser refletidos nas projeções de caixa mínimo. Finalmente, não há no modelo
simplificado qualquer consideração quanto à incerteza inerente às projeções de caixa.

1.2 Modelo do Lote Econômico de Baumol

O modelo de Baumol (1952) considera variações cíclicas e lineares no caixa da empresa,


utilizando-se de conceitos da teoria de gestão de estoques. Conforme evidenciado na
Figura 4, o modelo de Baumol parte da premissa que todo o caixa é recebido em um
primeiro momento, e seus desembolsos posteriores são estáveis ao longo do período.
Consequentemente, o modelo divide as entradas efetivas de caixa, possibilitando a
realização de aplicações financeiras.

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Figura 4

Fonte: Adaptado pelo professor a partir de Matias (2014) e Famá e Grava (2000).

A reposição de caixa é realizada de forma discreta, ou seja, em momentos específicos em


que o pagamento contínuo das despesas e custos operacionais consuma o caixa até o
nível mínimo. Como recursos em caixa não são remunerados, o modelo de Baumol tem
como objetivo manter o mínimo possível em caixa reduzindo o custo de oportunidade do
dinheiro parado.

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MBA em Controladoria e Finanças
A cada reposição de caixa, realizada pelo resgate de aplicações financeiras em valor Q,
a empresa repõe seu caixa. Deve existir um valor ótimo de reposição de caixa (C*) para
o qual a remuneração e os custos de transação das aplicações financeiras se igualam.
Baumol chegou à conclusão de que esse valor ótimo é igual a:

2𝑥 𝑑𝑒𝑠𝑒𝑚𝑏𝑜𝑙𝑠𝑜 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑖𝑥𝑎 𝑥 𝑐𝑢𝑠𝑡𝑜 𝑢𝑛𝑖𝑡á𝑟𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑎çã𝑜


𝐶∗ =
𝑡𝑎𝑥𝑎 𝑑𝑒 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠

Consequentemente, podemos deduzir o número de reposições de caixa necessários


dividindo o desembolso anual de caixa pelo resultado (C*) da equação acima.

Esse modelo apresenta limitações consideráveis. Assaf Neto (2010) destaca que o modelo
pressupõe a certeza quanto à distribuição temporal dos fluxos de caixa, não sendo uma
boa aproximação da realidade em empresas que estão sujeitas a incertezas de caixa e a
variações sazonais.

Famá e Grava (2000) afirmam que os problemas de imprecisão do modelo são maiores
em períodos de taxas de juros mais elevadas, exatamente quando a otimização do caixa
é mais necessária, em função da não uniformidade dos desembolsos ao longo do tempo.

1.3 Modelo de Miller-Orr

Miller e Orr (1966) desenvolveram um modelo probabilístico que leva em consideração as


incertezas e variabilidades associadas à demanda por caixa, trabalhando com um limite
superior e um limite inferior de caixa que determinará as transferências de caixa para
aplicações financeiras.

A lógica desse modelo é que acima do limite máximo de caixa, o custo de manter recursos
parados e não aplicados rendendo juros torna-se ilógico ou antieconômico. Abaixo do
limite mínimo, no entanto, manter tão pouco caixa é arriscado, podendo afetar o ciclo
operacional da empresa. Assim, decisões de aplicação e resgate de aplicações financeiras
somente são efetivadas quando o caixa atinge os limites ótimo superior e inferior, respec-
tivamente. Dentro desses limites, o caixa pode variar aleatoriamente.

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O primeiro passo para utilização do modelo de Miller e Orr é a determinação do saldo
de caixa mínimo, que pode assumir valor zero ou pode ser baseada na experiência do
tesoureiro quando às necessidades mínimas. O segundo passo é estimar a variância
diária do saldo de caixa, o que pode ser feito com o exame do comportamento histórico
do caixa da empresa.

O montante de recursos transferidos com o resgate ou com a realização de aplicação


financeira decorre do ponto de retorno z*, para o qual a empresa deve retornar sempre
que estiver abaixo ou acima dos limites mínimo e máximo, mediante a seguinte fórmula:


3 0,75𝑏𝛿 2
𝑧 =𝑚+
𝑖

A variável m corresponde ao valor do caixa mínimo determinado pela empresa, b é o


custo envolvido nas transações de aplicação ou resgate, δ2 é a variância diária do saldo
de caixa e i é a taxa de juros diária que se pode obter com a aplicação financeira. O limite
máximo (h) é dado por pela fórmula h = 3z.

Na Figura 5, evidencia-se o comportamento do caixa no modelo de Miller e Orr. Quando o


saldo de caixa atinge o limite máximo, a empresa realiza aplicação financeira do excesso
de caixa em relação ao nível alvo. Quando o caixa atinge o mínimo, a empresa restabelece
o nível alvo resgatando aplicações financeiras.

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Figura 5

Fonte: Famá e Grava (2000).

De acordo com Famá e Grava (2000), a adoção do modelo de Miller e Orr não apresentou
superioridade empírica aos resultados de uma gestão de caixa baseada em regras simples
derivadas da experiência dos gestores financeiros.

O desenvolvimento de capacidade computacional e o seu fácil acesso pelas empresas


permitiu a utilização de modelos de planejamento financeiro de curto prazo capazes de
otimizar o uso do caixa, conforme Brealey, Myers e Allen (2012). Esses modelos podem
ser adaptados às características específicas de cada empresa, sendo menos sujeitos às
principais limitações dos modelos de Baumol (1952) e Miller e Orr (1966).

No entanto, tais modelos de otimização de fluxo de caixa dependem de premissas de


desempenho financeiro e dos cenários de comportamento previsto pelos tesoureiros.
Consequentemente, pequenas variações efetivas nas premissas e nos cenários podem
alterar significativamente os resultados obtidos. Como consequência, a tesouraria deve
constantemente explorar as implicações de premissas alternativas sobre os fluxos de

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caixa futuros, taxas de juros e outros fatores que podem resultar em desafios à gestão de
caixa (Brealey, Myers e Allen, 2012).

É importante lembrar da clássica sentença proferida por Box e Draper (1987) que
afirmaram que essencialmente todos os modelos são errados, mas alguns são úteis. Nas
circunstâncias apropriadas, tanto o modelo de Baumol (1952) quanto o modelo de Miller
e Orr (1966) podem ser úteis.

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2. ORÇAMENTO DE CAIXA

A elaboração e o acompanhamento de orçamentos de caixa é uma das mais importantes


funções da tesouraria. Ela permite a avaliação do desempenho da tesouraria (Bragg, 2010;
Brealey, Myers e Allen, 2012) e alerta o gestor quanto às necessidades futuras de fluxo de
caixa, permitindo a elaboração de um plano de financiamento.

O primeiro passo para a preparação dos orçamentos de caixa, conforme a recomendação


de Brealey, Myers e Allen (2012), é a estimação dos fluxos de entradas de caixa. Essa
estimação parte do orçamento de vendas, a ser realizado com base no histórico de vendas,
capacidade instalada, expectativas de mercado e fatores sazonais. Essa estimação deve
agregar informações de departamentos como o de vendas e o de produção.

A partir da projeção de vendas, a tesouraria deve projetar o tempo de realização das


vendas em caixa. Nesse particular, fatores como a política de crédito, prazo de pagamento
e histórico de perdas devem ser considerados para que seja possível prever as entradas
efetivas de caixa decorrentes do recebimento das vendas. Entradas de caixa decorrentes
de venda de ativos ou da captação de recursos bancários ou de sócios também devem
ser consideradas. No entanto, o fluxo usual é estimar as captações de recursos bancários
em um segundo momento, a partir das necessidades verificadas no próprio orçamento
de caixa.

O segundo passo é a estimativa de desembolsos de caixa no período. Dada a maior


variedade de operações que resultam em desembolso, em comparação às projeções
de vendas, estimar saídas de caixa é um exercício substancialmente mais complexo. Os
principais componentes a serem considerados são os seguintes:

a. pagamentos de fornecedores: com base nas condições normais de pagamento


de matérias primas, insumos, materiais de consumo, etc. Essa variável depende do
orçamento de produção necessário para atingir as vendas projetadas.

b. aumentos de estoques: gastos com aquisição de estoque necessários para o aumento


das vendas

c. gastos com empregados, gastos administrativos e outras despesas: incluem todos


os gastos esperados para o desenvolvimento do nível de atividade projetado.

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d. gastos de capital: compra de maquinário, obras civis, aquisição de participações
societárias, terrenos, etc.

e. impostos, juros e dividendos: inclui impostos sobre o lucro e dividendos


demandados pelos acionistas. Com relação aos juros, considerar somente juros sobre
a dívida existente no início das projeções, pois as novas captações ainda não foram
determinadas.

O confronto das projeções de entradas de caixa com as projeções de saídas de caixa


resultará em um orçamento de caixa. Esse orçamento evidenciará o excesso de caixa
gerado ou a falta de capital, que deverá ser suprida de acordo com o plano de financiamento
da empresa. Quanto à periodicidade das projeções de caixa, sugere-se a realização
de no mínimo projeções mensais. A utilização de períodos maiores para as projeções,
como trimestres, semestres ou mesmo anos, somente é aceitável para empresas que
apresentam elevada previsibilidade dos fluxos de caixa.

Para situações nas quais a empresa trabalha com o mínimo necessário de caixa, projeções
diárias são recomendáveis, pois permitem à tesouraria assegurar a suficiência de fundos
no dia-a-dia das operações.

A tesouraria deve considerar o impacto das projeções nos indicadores de liquidez, pois
a deterioração desses índices afetará a capacidade de crédito da empresa. No mesmo
sentido, cenários de redução de estoques e alongamento do prazo de pagamento de
fornecedores podem ser avaliados de modo a otimizar a gestão de caixa.

2.1 Análise da eficiência das projeções de caixa

Estimativas de caixa somente são úteis quando podem descrever com razoável
confiabilidade o comportamento futuro dos fluxos de caixa. A principal ferramenta para
melhorar a confiabilidade dessa estimativa é a comparação contínua das projeções com
os resultados efetivos, corrigindo o sistema de elaboração de projeções para garantir a
melhora constante das projeções futuras.

A qualidade e precisão das estimativas de fluxo de caixa depende diretamente dos


processos em que os dados para as projeções são obtidos. Por exemplo, o departamento

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de vendas pode realizar estimativas conservadoras para não ser cobrado no caso do não
atingimento das projeções, o que prejudicaria a qualidade da estimativa.

As despesas operacionais e custos de fabricação podem variar devido à ocorrência da


Falácia de Planejamento, termo cunhado por Kahneman (2011) para descrever planos e
estimativas de gastos que são irrealmente próximos aos melhores cenários possíveis,
preparados sem o devido ceticismo e comparação com estatísticas de casos semelhantes.
A principal solução para esse problema, segundo Kahneman (2011) é a adoção do método
de Projeção com classe de referência (Flyvbjerg, 2006), que prevê os seguintes passos
para a elaboração de projeções relativas a um determinado projeto:

a. identificação de uma classe de referência relevante de projetos similares no


passado. Essa classe deve ser suficientemente ampla para ser estatisticamente
significante, mas não a ponto de incluir projetos não comparáveis com o atual;

b. o estabelecimento de uma distribuição de probabilidades para a classe de referência


selecionada, com base no acesso a dados confiáveis para uma quantidade de
projetos suficientes para a possibilidade de conclusões em base estatística;

c. comparar o projeto específico com a distribuição de probabilidades da classe de


referência para estimar o resultado mais esperado do projeto específico.

Trata-se de um trabalho complexo, que demanda conhecimentos estatísticos e de análise


de grande quantidade de dados. No entanto, por meio desse método, é possível diminuir o
impacto do otimismo na realização de projeção de orçamentos, utilizando-se do resultado
obtido em eventos comparáveis anteriores. Apesar de essa lógica ser desenvolvida para
projetos de grande porte, pode também ser aplicada à projeção de eventos cotidianos,
desde que observados os passos anteriormente listados.

Os orçamentos de caixa podem ter como base o desempenho dos fluxos de entradas e
saídas em períodos anteriores. Alternativamente, podem ser elaborados em base zero,
método pelo qual todos os elementos de entradas e saídas são avaliados cuidadosamente
pelos responsáveis operacionais a fim de se estabelecer a melhor estimativa possível. A
elaboração de um orçamento de caixa em base zero está diretamente ligada ao processo
de elaboração de orçamento de resultados também em base zero, a qual pode ser uma
importante ferramenta para a revisão da necessidade e importância de desembolsos com
o objetivo de obtenção de redução de custos.

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3. CONCENTRAÇÃO DE CAIXA

Empresas que possuem diversas filiais podem operar com múltiplas contas bancárias em
cidades e estados diferentes. A gestão dessas contas correntes pode ser um exercício
bastante complexo dificultando a otimização dos fluxos de caixa. O tesoureiro deve
direcionar recursos entre as contas para evitar dinheiro acumulado sem render juros ou a
tomada desnecessária de empréstimos bancários quando há recursos disponíveis dentro
da mesma empresa.

Para minimizar esses problemas e permitir uma gestão mais eficiente de caixa, Bragg
(2010) sugere a centralização do caixa, por meio da utilização de uma conta corrente
principal pela empresa para os principais recebimentos e pagamentos, deixando nas
unidades operacionais apenas o saldo mínimo para pequenos pagamentos.

A centralização de caixa pode resultar em benefícios significativos. Quando a empresa


acumula recursos de caixa, a realização de aplicações financeiras agregando recursos de
caixa originários de diversas filiais pode resultar em um melhor retorno financeiro em
decorrência da obtenção de melhores condições de negócio. Além disso, a burocracia
necessária para o controle de diversas contas correntes é eliminada, direcionando o tempo
da equipe de tesouraria para funções que gerem um maior valor agregado à empresa.

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4. CAIXA, INVESTIMENTOS DE LIQUIDEZ IMEDIATA E
INVESTIMENTOS EM TÍTULOS DE RISCO

A acumulação de saldos elevados de caixa sem uma destinação imediata oferece ao


tesoureiro o desafio de como gerir esses saldos em benefício dos acionistas da empresa.
A primeira providência que qualquer tesoureiro tomaria ao se deparar com um saldo
elevado de caixa é o investimento dos recursos em títulos de liquidez imediata. Esses
títulos, geralmente ofertados por bancos, apresentam risco muito pequeno de não
pagamento e consequentemente oferecem remuneração próxima à taxa básica de juros
do mercado.

Um exemplo bastante comum, dentre as diversas opções de investimentos com liquidez


imediata, é a aplicação em um CDB ofertado por um banco estatal, por exemplo o Banco
do Brasil, oferecendo remuneração equivalente a 98% do CDI. Caso a empresa necessite
recuperar os recursos rapidamente para fazer frente a necessidades de caixa, conseguirá
resgatar a aplicação facilmente e com pequenos custos de transação.

O investimento em títulos negociados tem como principal objetivo manter o poder de


compra do caixa, resguardando a posição financeira da empresa e de seus acionistas. No
entanto, a manutenção de saldos elevados de caixa e investimentos podem ter efeitos
distintos dependendo das peculiaridades da empresa.

Damodaran (2004) apresenta três situações nas quais um grande saldo de caixa e
equivalentes de caixa podem afetar negativamente o valor da empresa, prejudicando os
acionistas:

a. os recursos são investidos a taxas abaixo do mercado, fazendo com que o dinheiro
tenha um retorno menor que o mínimo exigido pelos acionistas para um investimento
com baixo ou nenhum risco;

b. quando não há confiança na qualidade da administração da empresa, ou há pouca


probabilidade de ocorrência de oportunidades futuras de investimento, o caixa
acumulado pode ser penalizado pelo mercado de ações na avaliação do valor da
empresa; e

c. a elevada disponibilidade de caixa pode levar as empresas a não utilizar ou subutilizar


o endividamento, abaixo dos níveis apropriados para seus negócios. Para ilustrar esse

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problema, uma empresa jamais deveria adquirir ativo imobilizado com pagamento
à vista quando é possível obter financiamento com taxas subsidiadas por meio do
BNDES.

Além dos motivos acima, na realidade do mercado de capitais brasileiro, há que se


destacar a diferença de tributação entre investimentos realizados por pessoas jurídicas
e por pessoas físicas. Uma aplicação financeira de renda fixa realizada por uma empresa
comercial ou industrial terá seus ganhos tributados às alíquotas oficiais de IRPJ e CSLL,
resultando em uma tributação de 34% dos ganhos. Se a empresa distribuir os recursos
aos sócios como dividendos, os sócios poderão realizar a mesma aplicação financeira por
conta própria. Nesse caso, a tributação é regressiva em função do tempo de manutenção
do investimento, variando de 22,5% para investimentos com prazo de até 180 dias até 15%
para investimentos com prazo superior a 720 dias.

Por outro lado, a acumulação de um grande saldo de caixa e equivalentes pode acrescentar
valor à empresa devido à segurança financeira que esse caixa representa. Investidores
naturalmente tendem a preferir empresas com menor risco de insolvência. Nos casos
em que as empresas têm a sua frente muitas oportunidades de investimento em novas
tecnologias e novos projetos, um saldo elevado de caixa dá ao mercado maior segurança
de que essas oportunidades serão aproveitadas. É o que se verifica no caso da Apple
Inc. (fabricante do iPhone, entre outros produtos), conforme evidenciado no quadro 9,
no qual é possível ver a evolução de alguns dados financeiros selecionados da empresa.
No período entre setembro de 2010 e setembro de 2014, o saldo de caixa à disposição
da empresa cresceu substancialmente. No mesmo período, as ações da empresa
apresentaram retorno cumulativo muito superior a índices de referência do mercado
de ações americano, sinalizando que os investidores não estão penalizando as ações da
empresa por conta da acumulação de caixa.

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Quadro 9

Valores em Bilhões de dólares norte-ame-


2010 2011 2012 2013 2014
ricanos

Vendas Líquidas 65 108 157 171 183

Lucro Líquido 14 26 42 37 40

Caixa, Equivalentes de Caixa e Investi-


51 82 121 147 155
mentos negociáveis

Ativos Totais 75 116 176 207 232

Retorno Cumulativo para 100 dólares


2010 2011 2012 2013 2014
investidos em 2009

Apple Inc. 160 222 367 272 407

S&P 500 Index 110 111 145 173 207

Dow Jones U.S. Technology Supersector


112 115 150 158 205
Index

S&P Information Technology Index 111 115 152 163 210

Fonte: Elaborado pelo professor a partir do formulário 10K da Apple Inc3.

O investimento em títulos de risco apresenta muito mais desafios do que a aplicação de


recursos em títulos de liquidez imediata. Do saldo de 155 bilhões de dólares da Apple em
setembro de 2014 investidos em caixa, equivalentes de caixa e investimentos negociáveis,
cerca de 130 bilhões de dólares estão aplicados em investimentos de longo prazo.
Esses títulos estão sujeitos a maior variabilidade de valor em função de serem de longo

3 http://files.shareholder.com/downloads/AAPL/3616327410x0x789040/ED3853DA-2E3F-448D-ADB-
4-34816C375F5D/2014_Form_10_K_As_Filed.PDF

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prazo, sendo a sua liquidação imediata mais difícil e custosa do que o que ocorreria com
investimentos de liquidez imediata.

A realização de investimentos em títulos de risco pode ser utilizada como meio para
aumento no retorno sobre o investimento dos acionistas, tendo em vista a expectativa
de retornos mais elevados associados ao maior risco. Investir em títulos corporativos
(debentures, CRA, etc.) deve produzir uma taxa de juros mais elevada do que a aquisição
de títulos públicos. No caso da Apple Inc., mais de 60% das aplicações em títulos de longo
prazo são aplicações em títulos de dívida corporativa, característicos do mercado de
capitais norte-americanos.

De acordo com o divulgado em suas demonstrações financeiras, a Apple Inc. investe em


títulos com baixo risco (rating elevado), e sua política de investimentos limita a exposição
da companhia ao exigir a diversificação dos emissores de títulos em que investe. A Apple
Inc. declara, ainda, que o principal objetivo dessa política é minimizar o risco potencial de
perda do principal desses títulos.

A prática de realizar investimentos em ações de outras empresas com o objetivo de


negociá-las apresenta um risco bastante elevado de oscilação de valor. Para criar valor ao
acionista, a empresa deveria investir somente em ações com razoável probabilidade de
estarem subavaliadas. Essa possibilidade depende do grau de eficiência dos mercados de
capitais em que as ações são negociadas. O risco de perda parcial ou até total do principal
investido é real, e deve ser estimado com cuidado quando da avaliação do investimento.

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5. MÉTRICAS DE AVALIAÇÃO DE TESOURARIA

Dadas as particularidades das funções da tesouraria, não faz sentido medir a efetividade
desse departamento por métricas aplicáveis à indústria e aos serviços. O lucro líquido
ou o lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização (LAJIDA, ou em língua
inglesa, EBITDA) não captam a eficiência e eficácia dos resultados da função tesouraria.

Bragg (2010) apresenta sugestões de métricas mais adequadas para avaliação de


desempenho da função. A primeira delas é bastante intuitiva, consistindo na mensuração
da taxa de retorno nos fundos investidos, por meio da seguinte fórmula:

𝐽𝑢𝑟𝑜𝑠 𝑎𝑢𝑓𝑒𝑟𝑖𝑑𝑜𝑠 + 𝐴𝑢𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 𝑛𝑜 𝑣𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑑𝑒 𝑚𝑒𝑟𝑐𝑎𝑑𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑖𝑛𝑣𝑒𝑠𝑡𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜𝑠


𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑓𝑢𝑛𝑑𝑜𝑠 𝑖𝑛𝑣𝑒𝑠𝑡𝑖𝑑𝑜𝑠

Considerando-se a existência de inúmeras opções de investimento, com riscos e retornos


muito variados, sugere-se que essa fórmula seja aplicada de forma estratificada. Assim,
teremos uma evidenciação de todos os tipos de investimento realizados e os retornos
obtidos, por classe de investimento. Será possível, então, comparar o retorno em ativos
de baixo risco com um indicador de referência (CDI, SELIC, etc.); comparar o retorno de
fundos de investimento em ações com índices de mercado (IBOVESPA, IBR-x, etc.).

Com essa segregação, pode-se também calcular o retorno ajustado para o risco, ou retorno
anormal. Para tanto, é necessário que se defina o retorno esperado para cada classe de
ativo no qual a empresa investe. Essa definição depende de um modelo econômico de
expectativa de retornos, como é o caso do Modelo CAPM, proposto por Sharpe (1964).

A segunda métrica sugerida por Bragg (2010) chama-se percentual de uso da base de
empréstimos, e monitora o total de recursos que a empresa poderia potencialmente
tomar emprestado com base na porção de seus ativos que não é usada como garantia
para empréstimos existentes. Essa métrica permite ao tesoureiro controlar com bastante
rapidez a capacidade da empresa de tomar recursos emprestados. A fórmula dessa
métrica é a seguinte:

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MBA em Controladoria e Finanças
𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑜 𝑒𝑛𝑑𝑖𝑣𝑖𝑑𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 𝑏𝑎𝑛𝑐á𝑟𝑖𝑜 𝑎𝑡𝑢𝑎𝑙
𝐶𝑜𝑛𝑡𝑎𝑠 𝑎 𝑟𝑒𝑐𝑒𝑏𝑒𝑟 𝑥 𝑃𝑒𝑟𝑐𝑒𝑛𝑡𝑢𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑔𝑎𝑟𝑎𝑛𝑡𝑖𝑎 𝑑𝑜𝑠 𝑟𝑒𝑐𝑒𝑏í𝑣𝑒𝑖𝑠
+
(𝐸𝑠𝑡𝑜𝑞𝑢𝑒𝑠 𝑥 𝑃𝑒𝑟𝑐𝑒𝑡𝑢𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑔𝑎𝑟𝑎𝑛𝑡𝑖𝑎 𝑑𝑜𝑠 𝑒𝑠𝑡𝑜𝑞𝑢𝑒𝑠)

No entanto, o cálculo do percentual de uso da base de empréstimos depende de duas


variáveis que podem depender de contratos existentes com instituições financeiras ou de
estimativas por parte do tesoureiro.

O percentual de garantia dos recebíveis é equivalente ao percentual dos recebíveis da


empresa que será aceito por uma instituição financeira como garantia em empréstimos
de curto prazo, possibilitando juros mais baixos em função dos benefícios da garantia.

Da mesma forma, o percentual de garantia dos estoques é equivalente ao percentual


do valor dos estoques que seria aceito por uma instituição financeira como garantia nos
empréstimos de curto prazo. No caso dos estoques, há que se considerar também as
diferenças entre o valor contábil e o valor de mercado dos estoques. Em circunstâncias
específicas em que o valor de mercado dos estoques é muito superior ao valor contábil,
em decorrência de altas margens de lucro esperadas, as instituições financeiras podem
aceitar os estoques como fonte de garantia com base em seu valor de mercado.

Assim, a definição do cálculo do percentual de uso da base de empréstimos dependerá de


um trabalho criterioso de estimação das variáveis de percentual de garantia, considerando
contratos existentes, a experiência do tesoureiro com base em operações passadas e o
relacionamento com as instituições financeiras que emprestam para a empresa.

A terceira métrica proposta por Bragg (2010) é a qualidade das previsões de caixa
elaboradas pela tesouraria, comparando-se o fluxo de caixa orçado com o fluxo de caixa
realizado. No entanto, essa métrica pode penalizar a análise do desempenho da tesouraria
em função de aspectos que não estão sob seu controle, tais como o comportamento das
vendas e os níveis de despesas operacionais e custos. Nesse particular, uma alternativa
seria a utilização de um orçamento flexível de caixa paralelamente ao orçamento nominal
de caixa. A previsão da variação das expectativas de caixa em decorrência de variação em
níveis de atividade pode constituir uma importante ferramenta para a tesouraria.

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MBA em Controladoria e Finanças
Há ainda um conjunto de métricas para a determinação do valor gerado nas atividades de
tesouraria, descritas em detalhe por Matias (2014) em seu capítulo 6 - Gestão do Valor no
Capital de Giro. Essas métricas, de razoável complexidade, decorrem do objetivo básico
da função tesouraria, que é maximizar a geração de retorno no investimento de caixa e
minimizar os custos de captação de recursos, obtendo o maior spread financeiro possível.
O principal indicador de geração de valor da função tesouraria apresentado por Matias
(2014) pode ser expresso da seguinte forma:

Valor Gerado na Tesouraria (VGT) = ((RIF – CMPCT) × ACF) × (1 – IR)

Sendo:

RIF = Retorno ponderado do Investimento no Financeiro (Ativo Circulante Financeiro).

CMPCT = Custo Médio Ponderado do Capital de Tesouraria.

ACF = Ativo Circulante Financeiro.

IR = Alíquota Efetiva dos impostos sobre o lucro.

O cálculo acima demanda a análise detalhada dos retornos dos diversos componentes
dos ativos circulantes financeiros, que podem apresentar bastante variação em função
dos prazos e perfis de risco. Em um exemplo simples, considere uma empresa que investe
100% de seu ativo circulante financeiro, no montante de R$ 100 mil, em uma aplicação
que rende 20% ao ano. O custo de captação da tesouraria advém integralmente de
empréstimos de curto prazo, com custo de 18% a.a. A alíquota de impostos sobre lucro é
de 34%. Temos o seguinte resultado:

(VGT) = ((20% – 18%) × 100.000) × (1 – 34%) = 1.320

Um valor negativo do indicador VGT pode ser aceitável e até esperado tendo em vista as
condições financeiras da empresa. A necessidade de obtenção de recursos no mercado
financeiro pode impor um custo médio de captação muito superior ao rendimento que
seria possível obter em aplicações financeiras. Soma-se a isso o fato de que investimentos
de baixo risco são preferíveis aos de risco mais elevado sob a ótica da tesouraria, pois

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apresentam uma probabilidade maior de garantir que a empresa terá caixa para satisfazer
suas necessidades em momento futuro.

Em função das ponderações apresentadas, sugere-se a preparação de um orçamento ou


expectativa de VGT com base nas perspectivas e características da empresa. A posterior
comparação da expectativa de VGT com a VGT realizada na prática fornecerá uma melhor
visão quanto ao desempenho da tesouraria.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa unidade, tratamos de problemas reais enfrentados pelas empresas no que se refere
à gestão de caixa. A realidade empresarial muitas vezes impõe condições de restrição
financeira. Essas condições demandam criatividade e capacidade de adaptação por parte
da tesouraria, que deve atuar sempre com o objetivo de garantir a disponibilidade do
caixa necessário às necessidades da empresa, ao menor custo e no tempo certo.

Naturalmente, fazer com que esse caixa se comporte como esperado demanda uma
grande integração com todas as áreas da empresa. Por conta dessa demanda, é muito
salutar que exista uma compreensão mútua entre a tesouraria e as demais áreas da
empresa, pois todas as decisões operacionais em algum momento gerarão impactos de
caixa.

As referências bibliográficas apresentadas representam produção científica de altíssimo


nível que podem servir de fonte de referência para momentos em que você venha a se
deparar com problemas complexos.

Ao término dessa unidade, aproveitando também as atividades integradoras propostas,


espero que você tenha obtido maior familiarização e aprofundamento teórico e prático
acerca da função tesouraria.

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REFERÊNCIAS

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