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Prática de Ensino –

Introdução à Docência
Autor: Prof. Wanderlei Sérgio da Silva
Professor conteudista: Wanderlei Sérgio da Silva

Possui graduação em Geografia pela Universidade de São Paulo (1993), mestrado em Geografia (Geografia
Humana) pela Universidade de São Paulo (2001) e doutorado em Geociências e Meio Ambiente pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2006). Atualmente, é professor titular da Universidade Paulista – UNIP. Tem
experiência na área de Geociências, atuando principalmente no tema: ambiente.

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Unip Interativa – EaD

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Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Aileen Nakamura
Sumário
Prática de Ensino – Introdução à Docência

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRÁTICA DE ENSINO NO CURSO................................................................7


1.1 Prática de Ensino: Introdução à Docência.....................................................................................8
1.2 Prática de Ensino: Observação e Projeto........................................................................................8
1.3 Prática de Ensino: Integração Escola – Comunidade................................................................8
1.4 Prática de Ensino: Vivência no Ambiente Educativo.................................................................9
1.5 Prática de Ensino: Trajetória da Práxis............................................................................................9
1.6 Prática de Ensino: Reflexões................................................................................................................9
2 ASPECTOS LEGAIS...............................................................................................................................................9
2.1 Base Legal................................................................................................................................................. 10
3 ASPECTOS CONCEITUAIS............................................................................................................................... 10
3.1 Conceitos Importantes........................................................................................................................ 10
3.1.1 Licenciatura................................................................................................................................................ 10
3.1.2 Prática de Ensino......................................................................................................................................11
3.1.3 Estágio Curricular Supervisionado....................................................................................................11
3.1.4 Competências.............................................................................................................................................11
3.1.5 Habilidades................................................................................................................................................. 12
4 COMENTÁRIOS.................................................................................................................................................. 12
5 A PRÁTICA NAS RESOLUÇÕES CNE/CP Nº 01/2002 E 02/2002...................................................... 13
6 ATIVIDADES PARA AVALIAÇÃO................................................................................................................... 18
7 TEXTOS PARA ATIVIDADES............................................................................................................................ 19
7.1 Educação? Educações: aprender com o índio........................................................................... 19
7.1.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 21
7.2 O fax do Nirso......................................................................................................................................... 23
7.2.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 24
7.3 A História de Chapeuzinho Vermelho (na versão do lobo)................................................... 24
7.3.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 25
7.4 Uma pescaria inesquecível................................................................................................................ 26
7.4.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 28
7.5 A Folha Amassada................................................................................................................................. 28
7.5.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 29
7.6 A Lição dos Gansos............................................................................................................................... 29
7.6.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 30
7.7 Assembleia na Carpintaria................................................................................................................. 30
7.7.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 31
7.8 Colheres de Cabo Comprido............................................................................................................. 31
7.8.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 32
7.9 Faça parte dos 5%................................................................................................................................ 32
7.9.1 Principais questões para reflexão...................................................................................................... 34
7.10 O Homem e o Mundo........................................................................................................................ 34
7.10.1 Principais questões para reflexão................................................................................................... 35
7.11 Professores Reflexivos....................................................................................................................... 35
7.11.1 Principais questões para reflexão.................................................................................................... 37
7.12 Um Sonho Impossível?..................................................................................................................... 37
7.12.1 Principais questões para reflexão................................................................................................... 38
7.13 Pipocas da Vida.................................................................................................................................... 38
7.13.1 Principais questões para reflexão................................................................................................... 39
8 RECOMENDAÇÕES DE LEITURAS E REFLEXÕES COMPLEMENTARES........................................... 39
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRÁTICA DE ENSINO NO CURSO

De início, é importante que você entenda como se dará a articulação entre as atividades relacionadas
à prática de ensino no curso.

A prática de ensino será desenvolvida em seis semestres, com atividades distribuídas por esse período.
Naturalmente haverá uma articulação entre elas, perpassando todo o curso.

As atividades relacionadas à prática de ensino são as seguintes:

Prática de ensino
1º sem. 2º sem. 3º sem. 4º sem. 5º sem. 6º sem.
Introdução à Observação e Integração Escola Vivência no Ambiente Trajetória da Reflexões
Docência Projeto – Comunidade Educativo Práxis

De modo geral, este conjunto de atividades visa levá‑lo a se perceber como indivíduo inserido em
uma sociedade que compreende, entre outros aspectos, uma educação, que se configura como seu
futuro ambiente de trabalho. Esta educação envolve vários elementos que serão aqui trabalhados.

Neste sentido, você deverá percorrer uma trajetória durante o curso que possibilite a compreensão do
papel que deverá exercer futuramente como professor, ajudando a formar ou transformar esta sociedade.

Vejamos, então, como estas atividades se relacionam.

Observação

O conjunto de atividades de prática de ensino visa levá‑lo a se perceber


como indivíduo inserido em uma sociedade que compreende, entre outros
aspectos, uma educação.

Introdução à
Docência

Observação
Reflexões e
Projeto
Prática
de
Ensino
Trajetória Integração
da Escola ‑
Práxis Comunidade
Vivência no
ambiente
educativo

Figura 1 – Articulação entre as ênfases da prática de ensino

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

1.1 Prática de Ensino: Introdução à Docência

Neste momento, quando, de modo ideal, inicia‑se a reflexão sobre a prática de ensino, pretende‑se
direcionar a sua atenção para perceber a educação (formal e informal) que acontece diariamente ao
seu redor e, principalmente, para refletir sobre aspectos inerentes a ela que são de suma importância
tanto para sua vida profissional, quanto para a prática da cidadania. Para isso, utiliza‑se de textos de
conhecimento popular e de autores renomados, e instiga‑se o seu pensamento reflexivo.

Observação

Esta atividade direciona a sua atenção para perceber a educação (formal


e informal) que acontece diariamente ao seu redor.

1.2 Prática de Ensino: Observação e Projeto

A seguir, você deverá observar diferentes ambientes educativos (escolares ou não) existentes em
locais que fazem parte do seu cotidiano e, a partir disso, fazer uma relação pedagógica entre um dos
ambientes não escolares e a sua área de atuação, culminando com a elaboração de um pequeno projeto
que vise possibilitar sua utilização e integração pedagógica.

Esta atividade leva você a observar diferentes ambientes educativos e relacionar um deles com a
sua formação, possibilitando uma integração pedagógica.

1.3 Prática de Ensino: Integração Escola – Comunidade

Na atividade Prática de Ensino: Integração Escola – Comunidade, você deverá identificar uma escola que
sirva de base para a sua pesquisa. É importante ressaltar desde já que a direção da escola precisa aceitar que
você desenvolva as atividades necessárias naquele ambiente, o que pode envolver algumas conversações.

Uma vez identificada a escola, você deverá dar início a uma caracterização, tanto dela quanto da
comunidade por ela servida, visando identificar necessidades e expectativas da comunidade que possam
ser supridas, no todo ou em parte, com a sua participação na unidade escolar ali localizada.

Com base nos dados de caracterização, você deverá propor um projeto de integração entre escola e
comunidade, no sentido de dar maior visibilidade para a escola, na comunidade onde se insere.

Observação

A caracterização, tanto da escola quanto da comunidade por ela


servida, visa a identificar necessidades e expectativas que possam ser
supridas, no todo ou em parte, por meio de um projeto de integração
entre ambas.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

1.4 Prática de Ensino: Vivência no Ambiente Educativo

Durante o curso desta atividade, apoiado pelas experiências vivenciadas nas práticas anteriores, você
estará apto a dar início ao seu estágio curricular supervisionado obrigatório, a ser realizado em escola
de educação básica, em conformidade com a legislação em vigor.

Trata‑se de um momento de orientação para a necessária articulação entre a teoria e a prática propriamente
dita, no qual você passará a vivenciar o ambiente escolar, ou seja, seu futuro ambiente de trabalho.

Lembrete

É neste momento em que se inicia o estágio curricular supervisionado


em escola de educação básica.

1.5 Prática de Ensino: Trajetória da Práxis

Prosseguindo o desenvolvimento das atividades, você deverá completar a carga horária de estágio,
iniciada no semestre anterior. Além disto, estão previstas atividades que enriqueçam sua formação e
contribuam com a sua qualificação para o exercício da docência.

Lembrete

É neste momento que se complementa a carga horária de estágio


curricular supervisionado.

1.6 Prática de Ensino: Reflexões

Finalmente, você deverá redigir um relatório‑síntese do estágio, que incorporará todas as atividades
vivenciadas no transcorrer da dimensão prática do curso. Você terá, também, a oportunidade de realizar
uma atividade de microensino muito interessante: uma avaliação crítica de aula que lhe permitirá avaliar
uma aula do ponto de vista do aluno e, deste modo, aprimorar a qualidade das suas aulas futuramente.

Lembrete

Durante a elaboração de relatório, você incorporará todas as atividades


vivenciadas no transcorrer de toda a prática do curso.

2 ASPECTOS LEGAIS

A Prática de Ensino: Introdução à Docência, bem como as demais atividades da dimensão prática
do curso, apoiam‑se em documentos normativos e legais, bem como em conceitos neles estabelecidos.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

2.1 Base Legal

Os principais diplomas legais que dão base à prática de ensino são os seguintes:

• Constituição da República Federativa do Brasil;

• Lei Federal 9394/96: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional;

• Lei nº 11.788/08: Lei dos Estágios;

• Resolução CNE/CP 001/02: Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de


Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena;

• Resolução CNE/CP 002/02: Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de
graduação plena, de formação de professores da Educação Básica em nível superior.

Observação

Base legal da Prática de Ensino: Constituição, LDBEN (Lei de Diretrizes


e Bases da Educação Nacional), Lei de Estágios, Res. CNE/CP 001/02, Res.
CNE/CP 002/02.

3 ASPECTOS CONCEITUAIS

3.1 Conceitos Importantes

3.1.1 Licenciatura

Trata‑se de uma licença, autorização, permissão ou concessão dada por uma autoridade pública
competente para o exercício de uma atividade profissional, em conformidade com a legislação. É um
título acadêmico, obtido em curso superior, que faculta ao seu portador o exercício do magistério na
educação básica dos sistemas de ensino.

A licenciatura visa a formar cidadãos preocupados em se qualificar para intervir de forma significativa
na formação de outros cidadãos. Seu diferencial em relação aos outros cursos de graduação reside na
duplicidade da formação pessoal e profissional do graduando e na simultânea instrumentalização deste
para a formação de seus futuros alunos.

Lembrete

Licenciatura: licença dada por uma autoridade pública competente


para o exercício de uma atividade profissional.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

3.1.2 Prática de Ensino

Momento pelo qual se busca fazer algo, produzir algo, e que a teoria procura conceituar, significar e
com isto administrar o campo e o sentido desta atuação. Contempla todas as atividades desenvolvidas
com alunos e professores na escola ou em outros ambientes educativos, sob o acompanhamento e
supervisão da instituição formadora. Em articulação intrínseca com o estágio curricular supervisionado
e com as atividades de trabalho acadêmico, ela concorre conjuntamente para a formação da identidade
do professor como educador.

3.1.3 Estágio Curricular Supervisionado

Tempo de aprendizagem que supõe uma relação pedagógica entre alguém que já é um profissional,
reconhecido em um ambiente institucional de trabalho, e um aluno – o estagiário.

O estágio oferece ao futuro professor um conhecimento da realidade em situação de trabalho,


ou seja, um modo especial de capacitação em serviço. Em contato com o mundo do trabalho,
proporciona a aquisição de habilidades e competências para o exercício da docência, estimulando
o futuro professor a pensar e propor soluções para problemas concretos, inerentes ao ambiente
escolar.

É o momento de efetivar, sob a supervisão de um profissional experiente, um processo de


ensino‑aprendizagem que se tornará concreto e autônomo quando da profissionalização deste
estagiário. Não é uma atividade facultativa, mas obrigatória, já que se trata de uma das condições para
a obtenção do diploma.

Lembrete

Estágio Curricular Supervisionado: tempo de aprendizagem que


supõe uma relação pedagógica entre alguém que já é um profissional
reconhecido em um ambiente institucional de trabalho e um aluno –
estagiário.

3.1.4 Competências

São associadas à conjugação dos diversos saberes mobilizados pelo indivíduo (saber, saber‑fazer e
saber‑ser) na realização de uma atividade. Não se referem apenas aos conhecimentos formais, mas a toda
a gama de aprendizagens interiorizadas nas experiências vividas, que constituem nossa subjetividade
(RAMOS, 2001).

De acordo com Cruz (2002), “é a prática de determinadas habilidades que constrói a competência”.
Uma pessoa é competente quando tem os recursos para realizar bem uma determinada tarefa, mesmo
que seja uma situação complexa. Este sujeito deverá ter disponíveis os recursos necessários para serem
mobilizados (conhecimentos).
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

3.1.5 Habilidades

Expressam competências. São representadas pelos componentes da competência expressos na


ação. Configuram‑se na dimensão mais explicita da competência e, assim, servem como indicadores
de desempenho com vistas à avaliação do desenvolvimento da competência prevista (RAMOS, 2001).
Identificar variáveis, compreender fenômenos, relacionar informações, analisar, sintetizar, julgar,
correlacionar ou manipular são exemplos de habilidades.

4 COMENTÁRIOS

A prática profissional do professor‑aluno se desenvolve com a Prática de Ensino, numa perspectiva de


gradativa problematização do trabalho educativo que leve em conta a sua complexidade. As atividades
previstas na dimensão prática do curso são planejadas com a intenção de desenvolver competências que
possibilitem reflexão e organização do trabalho em equipes, na tentativa de abranger e, eventualmente,
superar as condições do cotidiano das unidades escolares, muitas vezes caracterizadas por “mesmices”
de ações pragmáticas.

As atividades práticas devem criar oportunidades para que você se defronte com problemas concretos
do processo ensino‑aprendizagem e da dinâmica própria do espaço escolar, como resultado de estudos,
propostas pedagógicas e pesquisas desenvolvidas ao longo de cada semestre. Isso deve impulsioná‑lo a um
processo de reflexão sobre questões ligadas às políticas educacionais do país, ao projeto político‑pedagógico
da escola e às ações político‑pedagógicas desenvolvidas no cotidiano das salas de aula.

Lembrete

Atividades práticas devem criar oportunidade para que você se


defronte com problemas concretos do processo ensino‑aprendizagem e da
dinâmica própria do espaço escolar.

A Prática de Ensino deve articular a teoria e a prática (enquanto Estágio Curricular Supervisionado),
de maneira que, até o final do curso, você tenha aliado aos conhecimentos teóricos, práticas e saberes
que o auxiliarão no exercício profissional da docência, adquirindo subsídios para questionamentos e
reflexões sobre o objetivo, conteúdo e formas que envolvam o processo ensino‑aprendizagem, bem
como problematizações e reflexões sobre a organização administrativo‑pedagógica da escola.

O Estágio Curricular Supervisionado, por sua vez, inserido em momento adequado do curso,
constitui a fase de treinamento que permite a você, por meio da vivência prática das atividades
docentes, complementar sua formação acadêmica nos aspectos técnico, cultural, científico e humano.
É o espaço de consolidação dos conteúdos teóricos das disciplinas pedagógicas e de fundamentos da
educação. É um período de permanência em ambiente real de trabalho em escolas da comunidade e
em outros espaços educacionais, possibilitando a você vivências concretas como professor, de modo a
prepará‑lo a assumir, no futuro, a liderança de uma sala de aula, assim como trocar experiências com
outros profissionais da educação.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

O Estágio Curricular Supervisionado é realizado considerando‑se a formação pessoal, vivência


profissional e cidadania. É atividade de ensino‑aprendizagem e não deve ser confundido com simples
preparação para o mercado de trabalho.

Quanto às competências e habilidades, Bordoni (2010) afirma que “tanto o ensino


fundamental quanto o médio têm tradição conteudista. Na hora de falar de competência,
mais ampla, carrega no conteúdo”. Assim, a escola tende a trazer para os alunos respostas para
perguntas que eles não fizeram e o resultado é manifestado pelo desinteresse. A explicação é
simples: neste contexto, as perguntas são mais importantes do que as respostas. Em lugar de
continuar a decorar conteúdos, os alunos devem ser ensinados a exercitar habilidades e, por
meio delas, adquirir competências.

Você, futuro educador, deve ser formado para preparar as melhores condições para o
desenvolvimento de competências. Não deve se restringir apenas a transmitir informações
isoladas, mas deve apresentar conhecimentos contextualizados, usar estratégias para
desenvolver habilidades específicas em seus futuros alunos. O processo de ensinar deve
proporcionar a aquisição de recursos que possam ser mobilizados no momento em que os
problemas se apresentarem.

Deste modo, imprimindo significado e relevância para os conteúdos escolares, você estará
favorecendo uma ruptura com as práticas escolares tradicionais e proporcionando um avanço em
direção a práticas mais pluralistas e harmônicas para seus futuros alunos.

Habilidades expressam competências, as quais se constituem na prática.

5 A PRÁTICA NAS RESOLUÇÕES CNE/CP Nº 01/2002 E 02/2002

A Resolução CNE/CP 01/2002 afirma, em seus “considerandos”, que “os Pareceres CNE/
CP 09/2001 e 27/2001 são peças indispensáveis do conjunto das Diretrizes Curriculares
Nacionais”.

Deste modo, neste item, apresenta‑se uma visão do conceito de prática apresentado no conjunto
de documentos citados, elaborados no âmbito do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação
(Resoluções e Pareceres).

Compõe‑se basicamente de trechos extraídos direta e literalmente, acompanhados por uma adição
interpretativa sobre o seu significado.

Observação

O Conselho Nacional de Educação aprimorou de modo significativo a


concepção de prática e de estágio em documentos legais e normativos
recentes.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Concepção de prática em momento anterior aos pareceres e resoluções

A concepção dominante nos cursos de formação de professores apresentava dois pólos isolados:

a) Supervalorizava os conhecimentos teóricos, acadêmicos, desprezando as práticas como importante


fonte de conteúdos de formação – visão aplicacionista das teorias;

b) Supervalorizava o fazer pedagógico, desprezando a dimensão teórica dos conhecimentos como


instrumento de seleção e análise contextual das práticas – visão ativista da prática.

Evidenciava‑se, então, a necessidade de integração entre a teoria e a prática.

A visão aplicacionista das teorias, por um lado, ao desprezar a prática, diminuía o potencial de
aprendizagem dos temas estudados, menosprezava o fazer em detrimento do saber. Ora, o saber sem uma
aplicação necessária é praticamente inoperante. Não se pode imaginar a teoria sem a prática, pois ela (a
teoria) só foi desenvolvida por necessidade prática, ou seja, alguém, na prática, observou a necessidade
de desenvolvê‑la. Este extremismo aplicacionista das teorias, portanto, não oferecia resposta adequada
aos problemas da sociedade, pois se mostrava reducionista do potencial de aprendizagem dos temas
abordados.

Por outro lado, a visão ativista da prática também, ao desprezar a teoria, diminuía o potencial de
aprendizagem dos temas estudados, pois menosprezava o saber em detrimento do fazer. Se há o que
se fazer, que se faça direito, e fazer direito envolve a teoria necessariamente, o conhecimento em plena
integração com a ação. A prática sem a teoria não oferece respostas adequadas para a evolução da
sociedade. O fazer não pode prescindir do saber. Assim, o extremismo ativista da prática, do mesmo
modo, se mostrava reducionista do potencial de desenvolvimento da aprendizagem, que visa à melhoria
da sociedade.

Era necessária, portanto, uma mudança de paradigma, e isto foi objeto dos pareceres e resoluções do
Conselho Nacional de Educação ora em análise.

Concepção de Prática como Componente Curricular

Dimensão do conhecimento que está presente tanto nos cursos de formação, nos momentos
em que se trabalha na reflexão sobre a atividade profissional, como durante o estágio, nos
momentos em que se exercita a atividade profissional. (grifo nosso)

Esta visão mostra uma importante evolução na concepção de prática. Aponta para o fato
de que toda teoria apresenta uma dimensão prática e que esta dimensão está presente durante
todo o processo de formação profissional do professor. A prática, portanto, não se restringe ao
estágio, embora este faça parte relevante do processo de formação e tenha uma característica
iminentemente prática. Esta prática, no entanto, não prescinde da teoria; pelo contrário,
articula‑se com ela.

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Articulação do estágio com as demais disciplinas

O planejamento e a execução das práticas no estágio devem estar apoiados nas reflexões
desenvolvidas nos cursos de formação. (grifo nosso)

Em outras palavras, as reflexões desenvolvidas nos cursos devem apoiar o planejamento e a execução
das atividades práticas do estágio. Deve haver, necessariamente, uma inserção dessas discussões nas
disciplinas teóricas que permeiam os cursos de formação e um melhor aproveitamento da atividade de
estágio no âmbito das disciplinas teóricas oferecidas pelos cursos de formação de professores.

A avaliação do estágio

A avaliação (...) constitui momento privilegiado para uma visão crítica da teoria e da estrutura
curricular do curso. Trata‑se, assim, de tarefa para toda a equipe de formadores, e não, apenas,
para o supervisor de estágio. (grifo nosso)

Nesta concepção, como o planejamento e a execução das atividades práticas passam a ser inseridas
nas discussões e reflexões desenvolvidas nas demais disciplinas do curso, toda a equipe docente, e não
apenas o supervisor de estágios, deveria participar do processo de avaliação dessas atividades.

Ideia a ser superada

O estágio é o espaço reservado à prática, enquanto que na sala de aula se dá conta da teoria. (grifo nosso)

O estágio não é uma atividade exclusivamente prática, uma vez que é alimentado pelas reflexões
teóricas desenvolvidas durante o curso de formação do professor. Do mesmo modo, ele (o estágio)
deve estar presente no ambiente da sala de aula e nas discussões teóricas a respeito da formação
docente. Deste modo, não há como fazer uma distinção tão exata entre teoria e prática no curso de
formação docente, tanto nas atividades envolvidas diretamente com o estágio quanto nas atividades
desenvolvidas em sala de aula, nas demais disciplinas.

Relação entre o saber e o fazer

Não basta ao profissional ter conhecimentos sobre o seu trabalho. É fundamental que saiba
mobilizar esses conhecimentos, transformando‑os em ação. (grifo nosso)

Particularmente no caso do professor profissional, esta discussão é muito interessante. São muito
comuns casos em que ótimos profissionais técnicos são contratados para lecionar e não obtêm o êxito
que deles se espera. Isto se explica de modo muito simples: o melhor engenheiro do país pode ser um
professor medíocre. Por outro lado, um engenheiro medíocre pode se tornar um bom professor.

Isso ocorre pois são profissões diferentes. Para ser professor não basta conhecer, é necessário aplicar
este conhecimento sobre o seu objeto de trabalho, que, no melhor sentido da palavra, é o aluno. Caso a
aprendizagem não ocorra, não houve êxito.
15
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Ser professor exige técnicas especiais de transmissão do conhecimento que são inerentes à profissão.
De nada adiantará o conhecimento profundo do tema a ser lecionado se isto não for acompanhado de
uma didática que permita ao professor explicar convincentemente o tema.

Definição de Competência

Capacidade de mobilizar múltiplos recursos numa mesma situação para responder às demandas
das situações de trabalho. (grifo nosso)

A competência, segundo este raciocínio, está intimamente ligada à teoria (ao saber), pois a
multiplicidade de conhecimentos deve ser estruturada de forma compreensível para os alunos. Não
basta o conhecimento do problema. O ideal é o conhecimento da situação problemática em que ele se
envolve. Isto dá maior segurança ao professor e é requisito fundamental para o êxito na profissão.

Mas a competência está, também, ligada à prática (ao fazer), pois a capacidade de mobilização dos
múltiplos recursos disponíveis se reflete numa prática profissional relevante, que não se resume em
“passar o conhecimento”, mas desperta no aluno o interesse necessário para que ele se interesse pelo
saber. Este estímulo é uma das tarefas básicas do bom professor.

Segundo Haidt (2002), na relação entre professor e aluno, o professor tem basicamente duas funções,
e uma delas é a chamada “Função Incentivadora”, ou seja, aproveitando a curiosidade natural do aluno,
o professor deve despertar seu interesse e mobilizar seus esquemas cognitivos para que a aprendizagem
ocorra do modo esperado.

A necessidade da reflexão sobre a atividade prática

O desenvolvimento das competências pede uma outra organização do percurso de aprendizagem,


na qual o exercício das práticas profissionais e de reflexão sistemática sobre elas ocupa um lugar
central. (grifo nosso)

O exercício das atividades e a reflexão sobre as práticas deixam de ser periféricos na formação de
professores e passam a ocupar um espaço maior e mais importante. Não se trata de desvalorizar a
teoria, mas de valorizar a prática e colocá‑la em seu devido lugar. O conhecimento deve ser aplicável
e aplicado, materializando‑se na realidade, elementos esses que eram negligenciados nos cursos de
formação a um segundo plano, o que deve ser corrigido.

A prática deve permear todo o processo de formação do professor

É necessário que o futuro professor experencie, como aluno, durante todo o processo de formação,
as atitudes, modelos didáticos, capacidades e modos de organização que se pretendem venham a ser
concretizados nas suas práticas pedagógicas. (grifo nosso)

A prática não se resume ao estágio. Desde o início do curso de formação ela deve estar presente
em todos os momentos para possibilitar ao professor em formação a experiência como aluno. A partir
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

de certo momento (metade do curso) ele deve observar os fatos diretamente numa escola, seu futuro
ambiente de trabalho, como estagiário para que, deste modo, ao se formar, tenha uma visão abrangente
sobre tudo o que de mais importante envolve o “ser professor” de uma escola de educação básica no
Brasil, estando apto, assim, a atuar profissionalmente.

Importância das atividades coletivas dos docentes em formação

É fundamental promover atividades constantes de aprendizagem colaborativa e de interação,


de comunicação entre os professores em formação e deles com os formadores, uma vez que tais
aprendizagens necessitam de práticas sistemáticas (...) a escola de formação deverá criar dispositivos de
organização curricular e institucional que favoreçam sua realização, empregando, inclusive, recursos de
tecnologia de informação que possibilitem a convivência interativa dentro da instituição e entre esta e
o ambiente educacional. (grifo nosso)

A promoção de atividades que propiciem comunicação entre os professores em formação e entre


estes e seus docentes é condição sine qua non para a qualificação do curso. A socialização deve ser
promovida e os alunos devem compartilhar suas experiências, visando somar conhecimentos e subtrair
dúvidas nesses contatos.

A aplicação do conhecimento teórico na profissão

A formação de professores demanda estudos disciplinares que possibilitem a sistematização e o


aprofundamento de conceitos e relações (...) no entanto é indispensável levar em conta que a atuação
do professor não é a atuação nem do físico, nem do biólogo, psicólogo ou sociólogo, é a atuação
de um profissional que usa os conhecimentos dessas disciplinas para (...) ensinar. (grifo nosso)

O professor é um profissional diferenciado que não deve ser confundido com o geógrafo, historiador,
matemático, biólogo etc. Este profissional fez sua opção pela carreira docente, que tem seus métodos
e objetos próprios de trabalho, os quais são diferenciados com relação aos profissionais formados em
cursos de bacharelado. Neste sentido, o conhecimento básico obtido na dimensão teórica do curso deve
ser aplicado na sua dimensão prática.

Articulação da prática com o restante do curso

A prática na matriz curricular dos cursos de formação de professores não pode ficar reduzida a
um espaço isolado, que a reduza ao estágio (...) desarticulado do restante do curso”. (grifo nosso)

Prática é um termo que possui um conceito mais amplo se comparado ao termo “estágio”. Neste
sentido, sua dimensão deve abranger todo o curso.

A dimensão prática

Todas as disciplinas que constituem o currículo de formação e não apenas as disciplinas pedagógicas
têm sua dimensão prática. É essa dimensão prática que deve estar sendo permanentemente
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

trabalhada tanto na perspectiva da sua aplicação no mundo social e natural quanto na perspectiva da
sua didática (...) em tempo e espaço curricular específico (...). As atividades deste espaço curricular
de atuação coletiva e integrada dos formadores transcendem o estágio e têm como finalidade
promover a articulação das diferentes práticas numa perspectiva interdisciplinar”. (grifo nosso)

Nesta perspectiva, não existe disciplina iminentemente teórica, completamente desarticulada da


prática. Todas as disciplinas do curso têm uma dimensão prática, até porque as teorias somente são
desenvolvidas quando, na prática, alguém descobre sua necessidade.

6 ATIVIDADES PARA AVALIAÇÃO

Esta disciplina será avaliada com base nas atividades propostas a seguir.

Importante: não haverá prova.

Atividade em grupo A

Leia os textos referentes aos itens 7.1 a 7.13 e reflita sobre as inúmeras verdades que cada um deles
encerra em suas entrelinhas, em relação à educação. Na sequência de cada texto, já são apresentadas
algumas questões para reflexão. Reflita sobre essas questões e procure apontar, para cada texto, novas
reflexões.

A atividade em si consiste em elaborar um relatório que contemple as principais reflexões que todos
estes textos induziram no grupo de alunos, ou seja, mencionar o título de cada um dos textos e as
principais reflexões que o grupo teve sobre cada um deles.

• O grupo deverá ser composto por alunos de um mesmo pólo e deverá ter, no máximo, 20 (vinte)
alunos;

• Caso haja somente um aluno do curso no pólo, este deverá elaborar o trabalho de modo individual;

• As orientações sobre procedimentos de envio e data de entrega serão disponibilizadas no seu AVA
oportunamente.

Atividade em grupo B

Seguindo o mesmo raciocínio da atividade mencionada, selecione um texto semelhante aos aqui
apresentados e aponte as principais reflexões sobre a educação que o texto sugere. A atividade em
si, portanto, consiste em elaborar um relatório que contenha um novo texto que guarde relações de
semelhança com os que foram apontados no livro‑texto. O grupo de alunos deve refletir e apresentar
tais reflexões em relatório.

• O grupo deverá ser composto por alunos de um mesmo pólo e deverá ter, no máximo, 20 (vinte)
alunos;
18
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

• Caso haja somente um aluno do curso no pólo, este deverá elaborar o trabalho de modo individual;

• As orientações sobre procedimentos de envio e data de entrega serão disponibilizadas no seu AVA
oportunamente.

Ressalta‑se que haverá dois chats sobre tais atividades, visando sanar eventuais dúvidas. A sua
presença (no pólo) será obrigatória em pelo menos um dos chats. As datas serão disponibilizadas
oportunamente em seu AVA.

Vários aspectos da educação serão apontados nos textos a seguir e em suas reflexões. Outras
certamente surgirão na sua mente, embora tenham fugido à nossa percepção, e isto deve nos instigar a
nos debruçar cada vez mais sobre textos deste tipo.

A proposta desta disciplina é, portanto, que você aproveite este momento para se deliciar com tão
sugestivas reflexões sobre a educação e se deixe apaixonar por ela. Os textos e as questões para reflexão
são apresentados na sequência.

Observação

Você não precisa realizar nenhuma tarefa específica relativa a estas


questões. Elas foram incluídas neste texto com o intuito exclusivo de
estimular a sua reflexão.

7 TEXTOS PARA ATIVIDADES

7.1 Educação? Educações: aprender com o índio

Pergunto coisas ao buriti; e o que ele responde é: a coragem minha.


Buriti quer todo o azul, e não se aparta de sua água – carece de espelho.
Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.
(ROSA, 1986, p. 270‑1)

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos


todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender‑e‑ensinar.
Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com
uma ou com várias: educação? Educações. E já que pelo menos por isso sempre achamos que temos
alguma coisa a dizer sobre a educação que nos invade a vida, por que não começar a pensar sobre ela
com o que uns índios uma vez escreveram?

Há muitos anos nos Estados Unidos, Virgínia e Maryland assinaram um tratado de paz com os Índios
das Seis Nações. Ora, como as promessas e os símbolos da educação sempre foram muito adequados
a momentos solenes como aquele, logo depois os seus governantes mandaram cartas aos índios para
que enviassem alguns de seus jovens às escolas dos brancos. Os chefes responderam agradecendo
19
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

e recusando. A carta acabou conhecida porque alguns anos mais tarde Benjamin Franklin adotou o
costume de divulgá‑la aqui e ali. Eis o trecho que nos interessa:

“... Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de
todo o coração.

Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas
e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa ideia de educação não é a mesma
que a nossa.

... Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a
vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da
floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e
construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não
serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros.

Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá‑la, para
mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores de Virgínia que nos enviem alguns dos seus
jovens, que lhes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens.”

De tudo o que se discute hoje sobre a educação, algumas das questões entre as mais
importantes estão escritas nesta carta de índios. Não há uma forma única nem um único
modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o
melhor; o ensino escolar não é a sua única prática e o professor profissional não é o seu único
praticante.

Em mundos diversos a educação existe diferente: em pequenas sociedades tribais de povos


caçadores, agricultores ou pastores nômades; em sociedades camponesas, em países desenvolvidos e
industrializados; em mundos sociais sem classes, de classes, com este ou aquele tipo de conflito entre
as suas classes; em tipos de sociedades e culturas sem Estado, com um Estado em formação ou com ele
consolidado entre e sobre as pessoas.

Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, ou entre povos
que se encontram. Existe entre povos que submetem e dominam outros povos, usando a educação
como um recurso a mais de sua dominância. Da família à comunidade, a educação existe difusa em
todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios do aprender; primeiro, sem classes
de alunos, sem livros e sem professores especialistas; mais adiante com escolas, salas, professores e
métodos pedagógicos.

A educação pode existir livre e, entre todos, pode ser uma das maneiras que as pessoas criam para
tornar comum, como saber, como ideia, como crença, aquilo que é comunitário como bem, como
trabalho ou como vida. Ela pode existir imposta por um sistema centralizado de poder, que usa o saber
e o controle sobre o saber como armas que reforçam a desigualdade entre os homens, na divisão dos
bens, do trabalho, dos direitos e dos símbolos.
20
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

A educação é, como outras, uma fração do modo de vida dos grupos sociais que a criam e recriam,
entre tantas outras invenções de sua cultura, em sua sociedade. Formas de educação que produzem e
praticam, para que elas reproduzam, entre todos os que ensinam‑e‑aprendem, o saber que atravessa as
palavras da tribo, os códigos sociais de conduta, as regras do trabalho, os segredos da arte ou da religião,
do artesanato ou da tecnologia que qualquer povo precisa para reinventar, todos os dias, a vida do grupo
e a de cada um de seus sujeitos, através de trocas sem fim com a natureza e entre os homens, trocas
que existem dentro do mundo social onde a própria educação habita, e desde onde ajuda a explicar – às
vezes a ocultar, às vezes a inculcar – de geração em geração, a necessidade da existência de sua ordem.

Por isso mesmo – e os índios sabiam – a educação do colonizador, que contém o saber de seu modo
de vida e ajuda a confirmar a aparente legalidade de seus atos de domínio, na verdade não serve para
ser a educação do colonizado. Não serve e existe contra uma educação que ele, não obstante dominado,
também possui como um dos seus recursos, em seu mundo, dentro de sua cultura.

Assim, quando são necessários guerreiros ou burocratas, a educação é um dos meios de que os
homens lançam mão para criar guerreiros ou burocratas. Ela ajuda a pensar tipos de homens. Mais
do que isso, ela ajuda a criá‑los, através de passar de uns para os outros o saber que os constitui e
legitima. Mais ainda, a educação participa do processo de produção e crenças e ideias, de qualificações
e especialidades que envolvem as trocas de símbolos, bens e poderes que, em conjunto, constroem tipos
de sociedades. E esta é a sua força.

No entanto, pensando às vezes que age por si próprio, livre e em nome de todos, o educador imagina
que serve ao saber e a quem ensina, mas, na verdade, ele pode estar servindo a quem o constituiu
professor, a fim de usá‑lo, e ao seu trabalho, para os usos escusos que ocultam também na educação –
nas suas agências, suas práticas e nas ideias que ela professa – interesses políticos impostos sobre ela e,
através de seu exercício, à sociedade que habita. E esta é a sua fraqueza.

Aqui e ali será preciso voltar a estas ideias, e elas podem ser como que um roteiro daqui para a
frente. A educação existe no imaginário das pessoas e na ideologia dos grupos sociais e, ali, sempre
se espera, de dentro, ou sempre se diz para fora, que a sua missão é transformar sujeitos e mundo
em alguma coisa melhor, de acordo com as imagens que se tem de uns e outros: “... e deles faremos
homens”. Mas, na prática, a mesma educação que ensina pode deseducar, e pode correr o risco de
fazer o contrário do que pensa que faz, ou do que inventa que pode fazer: “... eles eram, portanto,
totalmente inúteis”.

Fonte: BRANDÃO (1993)

7.1.1 Principais questões para reflexão

• Se é verdade que “ninguém escapa da educação”, como se explica a expressão “falta de educação”?

• Os índios das Seis Nações iniciam a sua carta com a expressão com “... Nós estamos convencidos,
portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de todo o coração”. Seria um
sinal de ingenuidade? Explique seu ponto de vista.
21
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

• “Diferentes nações têm concepções diferentes das coisas”. Que relação há entre as diferentes
nações e as diferentes educações de cada povo?

• A nação brasileira apresenta apenas uma educação?

• “... Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte (...). Mas, quando
eles voltavam para nós, eles eram (...) totalmente inúteis. Nos enviem alguns dos seus jovens, que
lhes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens”. Como se insere a educação no
processo de dominação de uma nação pela outra?

• “Não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde
ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a sua única prática e o professor
profissional não é o seu único praticante”. Considerando‑se esta afirmação, qual o papel da escola
no processo educacional de um povo?

• “Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, ou entre
povos que se encontram. Existe entre povos que submetem e dominam outros povos, usando a
educação como um recurso a mais de sua dominância”. Com base nesta afirmação, como seria
possível definir, em poucas palavras, a educação do Brasil?

• A educação “pode existir imposta por um sistema centralizado de poder, que usa o saber e o
controle sobre o saber como armas que reforçam a desigualdade entre os homens”. Se há um
controle sobre o saber, como ter certeza de que o que se aprende nas escolas é verdade?

• “A educação do colonizador, que contém o saber de seu modo de vida e ajuda a confirmar a aparente
legalidade de seus atos de domínio, na verdade não serve para ser a educação do colonizado. Não
serve e existe contra uma educação que ele, não obstante dominado, também possui como um dos
seus recursos, em seu mundo, dentro de sua cultura”. Diante desta afirmação, o que dizer sobre o
atual estágio da educação brasileira? Reflete a educação do vencedor ou do vencido? A educação
que nós recebemos, então, não é a única possível? Explique seu ponto de vista.

• “... quando são necessários guerreiros ou burocratas, a educação é um dos meios de que os homens lançam
mão para criar guerreiros ou burocratas. Ela ajuda a pensar tipos de homens. Mais do que isso, ela ajuda
a criá‑los, através de passar de uns para os outros o saber que os constitui e legitima”. Faça uma relação
entre esta afirmação e o processo de globalização, atualmente em curso em nosso planeta.

• “... pensando às vezes que age por si próprio, livre e em nome de todos, o educador imagina que
serve ao saber e a quem ensina, mas, na verdade, ele pode estar servindo a quem o constituiu
professor, a fim de usá‑lo, e ao seu trabalho, para os usos escusos que ocultam também na
educação”. Qual a importância do professor/educador na formação ou na transformação da
sociedade em que ele se insere?

• A missão da educação “é transformar sujeitos e mundo em alguma coisa melhor, de acordo com as
imagens que se tem de uns e outros (...) e deles faremos homens”. Mas, na prática, a mesma educação
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

que ensina pode deseducar, e pode correr o risco de fazer o contrário do que pensa que faz, ou do
que inventa que pode fazer: “... eles eram, portanto, totalmente inúteis”. Comente esta frase.

7.2 O fax do Nirso

O gerente de vendas recebeu o seguinte fax de um dos seus novos vendedores:

Seo Gomis,
O criente de Beozonte pidiu mais cuatrucenta pessa. Faz favor toma as providenssa,
Abrasso,
Nirso

Aproximadamente uma hora depois recebeu outro:

Seo Gomis,
Os relatório di venda vai xega atrazado proque to fexando umas venda. Temo qui manda umas treis
mil pessa. Amanhã to xegando.
Abrasso,
Nirso

No dia seguinte:

Seo Gomis,
Num xeguei pucausa de que vendi maiz deis mil em Beraba.
To indu pra Brasilha.
Abrasso,
Nirso

No outro:

Seo Gomis,
Brasilha fexo 20 mil. Vo pra Froniloplis e de la pra Sum Paulo no vinhâo das cete hora.
Abrasso,
Nirso

23
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

E assim foi o mês inteiro. O gerente, muito preocupado com a imagem da empresa, levou ao presidente
as mensagens que recebeu do vendedor. O presidente escutou atentamente o gerente e disse: “Deixa
comigo, que eu tomarei as providências necessárias”.

E tomou. Redigiu de próprio punho um aviso e o afixou no mural da empresa, juntamente com as
mensagens de fax do vendedor:

A parti de oje, nois tudo vamo fazê feito o Nirso. Si priocupá menos em iscrevê serto, mod vendê
maiz.

Acinado, O Prizidenti.

(Autor Desconhecido)

7.2.1 Principais questões para reflexão

• A educação escolar está perdendo espaço no mercado de trabalho?

• Num mercado competitivo, todo profissional precisa de um diferencial para ocupar determinadas
posições e ascender na carreira. Por vezes, este diferencial é representado por um ou mais
diplomas. Com base no texto e nesta afirmação, analise o papel da educação formal no mercado
de trabalho.

• Alguns estudiosos afirmam que a educação evolui num ritmo muito lento em relação a
outros elementos da sociedade. Que aspectos devem, então, ser ressaltados na educação
para que ela acelere sua evolução e consiga acompanhar o ritmo dos outros elementos
sociais?

7.3 A História de Chapeuzinho Vermelho (na versão do lobo)

Esta história será contada de uma maneira não tradicional.

Certa manhã, estava eu passeando pela minha casa – sim, porque eu não sei se vocês sabem, mas a
floresta é a minha casa – e, de repente, deparei com uma visão terrível.

Vi uma menina vestida com uma roupa vermelha horrorosa, com um chapéu vermelho igualmente
horroroso, carregando uma cesta cheia de produtos embalados com material plástico, que leva milhares
de anos para se desintegrar na natureza.

Imaginei que ela fosse fazer um piquenique ou coisa parecida e pensei: não posso permitir que ela
deixe aquele material jogado pela mata. Ela vai sujar a minha casa e dos meus companheiros de floresta.
Vou tentar preveni‑la dos cuidados ecológicos fundamentais. Por outro lado, que descuidados são esses
humanos: deixar uma menina tão pequena passear pela floresta desse jeito, correndo o perigo de ser
apanhada por algum predador (dentre os quais eu me incluo).
24
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Como eu estava com o apetite devidamente saciado resolvi, sem segundas intenções, falar com
a menina e induzi‑la a sair da floresta pelo mesmo caminho por onde entrou. Isto seria melhor para
todos... e assim o fiz, mas, assim que me deparei com a menina, ela foi logo gritando feito uma louca e
me batendo com a cesta que tinha na mão; nem sequer me ouviu, não me deu oportunidade para falar
o que eu queria e explicar o motivo da nossa conversa. Só repetia várias vezes que eu não iria comer o
lanche que ela havia preparado para a sua vovozinha, que eu era horrível, que isso e aquilo. Logo vi que
não conseguiria atingir o meu intento. Mas... ela é só uma menina... e assim pensando, resolvi perdoá‑la.

Apesar de ter ficado furioso com ela num primeiro instante, resolvi procurar por uma velhinha
que, algum tempo antes, havia construído uma casinha de madeira perto do rio. Na época, todos nós
aqui da floresta havíamos ficado furiosos com ela, pois derrubou nossas árvores e, assim, destruiu a
casa de muitos de nossos companheiros animais para construir aquela casa horrenda, mas, devido à
avançada idade, resolvemos relevar e deixá‑la ficar. Só podia ser ela a vovozinha daquela menina tão
mal‑educada.

Segui por atalhos que só nós, moradores da floresta, conhecemos e, assim, cheguei na casa da
velhinha bem antes da sua neta. Segui um caminho muito longo para alertar a senhora dos males
que ela e a sua neta poderiam provocar no nosso ecossistema, mas ela também não me deu a menor
oportunidade de me pronunciar; foi logo me batendo e fazendo um escândalo tremendo, muito barulho,
muita gritaria, virou‑se e pegou uma velha espingarda, certamente com a intenção de matar‑me. Não
tive outra alternativa, senão comer a velha senhora.

Minutos depois, a menina acabou chegando na casa da sua avó. Sabendo que ela iria provocar novo
escândalo, resolvi me disfarçar e, assim, vesti algumas roupas da tal velhinha e tentei me fazer passar
por ela, deitado em seu leito.

Quando ela chegou, tentei dissuadi‑la a ir embora o quanto antes, mas a menina novamente
começou a me insultar dizendo: que nariz grande e horrível você tem... que orelhas estranhas você tem...
que olhos caídos e remelentos você tem... Eu procurei responder a todas as perguntas com ternura, mas
para tudo há um limite, e minha paciência já estava em ponto de se esgotar, quando tirei o disfarce.
Diante dos gritos da menina, e temendo a aproximação de caçadores que sempre afluíam ao local, não
tive alternativa senão comê‑la também.

Meu temor, no entanto, se concretizou: um caçador me encontrou e, antes mesmo que eu começasse a
me explicar, atirou impiedosamente e me acertou... agora, cá estou eu, com a barriga aberta, moribundo,
e vocês ainda estão vibrando com isto, ensinando suas crianças que o malvado dessa história sou eu...
isso é muito injusto, muito injusto.

Fonte: Adaptado de ANTUNES, 10 Histórias Exemplares (2004)

7.3.1 Principais questões para reflexão

Esta história possui uma peculiaridade: ela é relatada na versão do lobo. Isto nos leva a algumas
importantes reflexões sobre a educação que estamos oferecendo em nossas escolas:
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

• Ao apresentar aos alunos nossas opiniões sobre fatos como verdades absolutas, será que não
estamos negando aos nossos alunos o direito de optar?

• Será que é justo negar‑lhes o direito de optar, mesmo que esta opção represente a ideia da
minoria?

• Será que o que extraímos do conteúdo da geografia, da história, da literatura e mesmo da


matemática representa uma verdade ou uma opinião?

• Será que, quando falamos em exclusão, não estamos sendo excludentes ao tirarmos a oportunidade
do aluno de avaliar, fazer seu próprio julgamento e tirar suas conclusões?

• Com relação ao conteúdo ensinado e aprendido nas escolas, há apenas uma verdade?

• Com relação ao conteúdo ensinado e aprendido nas escolas, há apenas verdades?

• Problematizar uma dúvida não levaria à construção de outras verdades?

7.4 Uma pescaria inesquecível

Ele tinha 11 anos e, a cada oportunidade que surgia, ia pescar num cais próximo ao chalé da família,
numa ilha que ficava em meio a um lago.

A temporada de pesca só começaria no dia seguinte, mas pai e filho saíram no fim da tarde para
pegar apenas peixes, cuja captura estava liberada. O menino amarrou uma isca e começou a praticar
arremessos, provocando ondulações coloridas na água.

Logo, elas se tornaram prateadas, pelo efeito da lua, nascendo sobre o lago.

Quando o caniço vergou, ele soube que havia algo enorme do outro lado da linha.

O pai olhava com admiração, enquanto o garoto, habilmente, e com muito cuidado, erguia o peixe
exausto da água.

Era o maior que já tinha visto, porém sua pesca só era permitida na temporada.

O garoto e o pai olharam para o peixe, tão bonito, as guelras volvendo para trás e para frente.

O pai, então, acendeu um fósforo e olhou para o relógio.

Pouco mais de 10 horas da noite...

Ainda faltavam quase duas horas para a abertura da temporada.

26
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Em seguida, olhou para o peixe e depois para o menino, dizendo:

— Você tem que devolvê‑lo, filho!

— Mas, papai, reclamou o menino.

— Vai aparecer outro, insistiu o pai.

— Não tão grande quanto este, choramingou a criança.

O garoto olhou à volta do lago. Não havia outros pescadores ou embarcações à vista.

Voltou novamente a olhar para o pai.

Mesmo sem ninguém por perto, sabia, pela firmeza em sua voz, que a decisão era inegociável.

Devagar, tirou o anzol da boca do enorme peixe e o devolveu à água escura.

O peixe movimentou rapidamente o corpo e desapareceu.

Naquele momento, o menino teve certeza de que jamais pegaria um peixe tão grande quanto aquele.

Isso aconteceu há 34 anos. Hoje, o garoto é um arquiteto bem sucedido.

O chalé continua lá, na ilha, em meio ao lago, e ele leva seus filhos para pescar no mesmo cais.

Sua intuição estava correta.

Nunca mais conseguiu pescar um peixe tão maravilhoso como daquela noite.

Porém, sempre vê o mesmo peixe todas as vezes que depara com uma questão ética.

Porque, como o pai lhe ensinou, a ética é simplesmente uma questão de CERTO e ERRADO.

Agir corretamente, quando se está sendo observado, é uma coisa.

A ética, porém, está em agir corretamente quando ninguém está nos observando.

Esta conduta reta só é possível quando, desde criança, aprendeu‑se a devolver o PEIXE À AGUA.

A boa educação é como uma moeda de ouro: TEM VALOR EM TODA PARTE.

Fonte: LENFESTEI (2008)

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

7.4.1 Principais questões para reflexão

• Complete a frase: “Ética é...”.

• Se a ética é algo tão importante, por que não faz parte da grade curricular da maior parte das
escolas de educação básica no Brasil?

• Comente a frase: “Gosto de levar vantagem em tudo, certo?” – a chamada Lei de Gerson – e faça
uma relação com o texto;

• Comente a frase: “O que é certo é certo, mesmo que ninguém o faça... e o que é errado é errado,
mesmo que todo mundo o faça” e relacione com o texto.

7.5 A Folha Amassada

Quando criança, por causa de meu caráter impulsivo, tinha raiva à menor provocação.

Na maioria das vezes, depois de um desses incidentes me sentia envergonhado e me esforçava por
consolar a quem tinha magoado.

Um dia, meu professor me viu pedindo desculpas, depois de uma explosão de raiva, e entregou‑me
uma folha de papel lisa e me disse: Amasse‑a!

Com medo, obedeci e fiz com ela uma bolinha.

— Agora, deixe‑a como estava antes, voltou a dizer‑me.

Óbvio que não pude deixá‑la como antes. Por mais que tentasse, o papel continuava cheio de pregas.

O professor disse então:

— O coração das pessoas é como esse papel. A impressão que nele deixamos será tão difícil de apagar
como esses amassados.

Assim, aprendi a ser mais compreensivo e mais paciente. Quando sinto vontade de estourar, lembro
daquele papel amassado. A impressão que deixamos nas pessoas é impossível apagar. Quando magoamos
alguém com nossas palavras, logo queremos consertar o erro, mas é tarde demais.

Alguém já disse, certa vez:

— Fale somente quando suas palavras possam ser tão suaves como o silêncio.

Mas não deixe de falar, por medo da reação do outro.

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Acredite, principalmente em seus sentimentos!

“Seremos sempre responsáveis pelos nossos atos – nunca se esqueça.”

(Autor Desconhecido)

7.5.1 Principais questões para reflexão

• Como educador, no futuro, você terá que desempenhar várias funções que extrapolam o “simples”
ensinar e que se inserem no contexto de educar. Você se considera preparado emocionalmente
para exercer tais funções?

• Como lidar com alunos explosivos como o do texto?

• Aluno explosivo representa necessariamente um aluno problema?

• Como desenvolver autocontrole de modo que, como professor, você não corra o risco de soltar
bombas com suas palavras com potencial de causar estragos irremediáveis na vida de seus futuros
alunos?

7.6 A Lição dos Gansos

No outono, quando se vê bandos de gansos voando ao sul, formando um grande “V” no céu,
indaga‑se o que a ciência já descobriu sobre o porquê de voarem desta forma. Sabe‑se que quando
cada ave bate as asas, move o ar para cima, ajudando a sustentar a ave imediatamente detrás. Ao
voar em forma de “V”, o bando se beneficia de pelo menos 71% a mais de força de voo do que uma
ave voando sozinha.

Sempre que um ganso sai do bando, sente subitamente o esforço e a resistência necessários
para continuar voando sozinho. Rapidamente, ele entra outra vez em formação para aproveitar o
deslocamento de ar provocado pela ave que voa imediatamente à sua frente.

Quando o ganso líder se cansa, ele muda de posição dentro da formação e outro ganso assume os
gansos que voam rumo ao sul.

Os gansos detrás gritam, encorajando os da frente para que mantenham a velocidade.

Finalmente, quando um ganso fica doente, ou ferido por um tiro e cai, dois gansos saem
da formação e o acompanham para ajudá‑lo e protegê‑lo. Ficam com ele até que consiga voar
novamente, ou até que morra. Só então levantam voo sozinhos, ou em outra formação, a fim de
alcançar seu bando.

(Autor desconhecido)

29
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

7.6.1 Principais questões para reflexão

• Pessoas que se deslocam numa mesma direção e que têm o sentido de comunidade podem
atingir seus objetivos de forma mais rápida e fácil, pois se beneficiam de impulso mútuo.
Numa equipe, quando um só elemento se esforça na direção contrária, o dispêndio de
energia é muito maior e o avanço da equipe, menor. Será que você já aprendeu a lição dos
gansos?

• Se tivéssemos o mesmo sentido dos gansos, nos manteríamos em formação com os que
lideram o caminho para onde também desejamos seguir. Na educação, o papel de liderança
é exercido pelos pais (na família), professores (na sala de aula), diretores (na unidade escolar)
e, gradativamente, os liderados vão aprendendo a ocupar posições de liderança em suas vidas
ou a aceitar as lideranças que se lhe apresentam. Você se sente preparado para exercer, por
exemplo, o papel de professor?

• Que mensagem passamos quando gritamos detrás? Estímulo aos nossos líderes ou desestímulos?
Será que nossa mensagem como liderados tem sido útil para promover a melhoria da qualidade
de vida do grupo? Se você descobrir que tem errado na sua atitude, não se preocupe, pois isso não
é o fim, mas o começo.

• Se tivéssemos o sentido dos gansos, também ficaríamos um ao lado do outro nos momentos de
dificuldade. Isto se aplica aos seus futuros alunos. Colar em suas testas o rótulo de indisciplinados
por este ou aquele motivo é uma tarefa muito fácil, que qualquer um pode fazer. Estimulá‑los a
mudar de atitude e crescer como cidadãos, isso é tarefa para pessoas especiais.

7.7 Assembleia na Carpintaria

Era uma vez uma carpintaria onde aconteceu uma estranha assembleia. Foi uma reunião de
ferramentas para acertar suas diferenças.

Um martelo presidiu a reunião, mas os participantes avisaram‑no que teria de renunciar, pois fazia
muito barulho e golpeava muito.

O martelo aceitou sua culpa, porém exigiu que fosse expulso o parafuso, alegando que dava muitas
voltas para conseguir algo.

Diante do ataque o parafuso concordou desde que expulsassem a lixa por ser muito áspera no
tratamento com os demais, atritando sempre.

A lixa acatou a decisão, mas exigiu a expulsão da trena por sempre medir os outros segundo a sua
medida, como se fosse perfeita.

No auge da discussão, entrou o carpinteiro, juntou o material e iniciou seu trabalho. Utilizou o
martelo, a lixa, a trena e o parafuso, convertendo uma rústica madeira em um fino móvel.
30
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Quando a carpintaria ficou novamente em silêncio com a saída do carpinteiro, a assembleia reiniciou.
Foi então que o serrote, até então calado, falou:

— Senhores, ficou demonstrado que temos defeitos, mas o carpinteiro trabalha somente com as
nossas qualidades, com nossos pontos valiosos. Vamos deixar nossos pontos fracos e concentremos em
nossos pontos fortes.

A assembleia entendeu então que o martelo era forte, o parafuso unia e dava força, a lixa
era especial para limar e afinar a aspereza e a trena era precisa e exata. Sentiram‑se como uma
verdadeira equipe capaz de produzir móveis de qualidade. Sentiram, então, uma grande alegria em
trabalhar juntos.

O mesmo ocorre com os seres humanos. Quando se busca defeito no outro, a situação fica tensa e
negativa. Ao contrário, quando se busca sinceramente o ponto forte, as qualidades dos outros, florescem
as melhores conquistas humanas.

É fácil encontrar defeitos, qualquer um pode fazê‑lo. Mas encontrar qualidades é para os sábios!

(Autor desconhecido)

7.7.1 Principais questões para reflexão

• Como você se sente quando as pessoas que o cercam dão destaque aos seus defeitos, em
detrimento das suas qualidades?

• Como professor, como você acha que os seus alunos se sentiriam caso você destacasse seus
defeitos, em detrimento das suas qualidades?

• Como você acha que um professor pode obter maior êxito na sua profissão: enfocando os defeitos
ou as qualidades de seus alunos?

• Você considera necessário enfocar tanto os defeitos quanto as qualidades das pessoas? Afinal,
quando apenas as qualidades são destacadas, a pessoa tende a entrar numa zona de conforto e
não avançar qualitativamente. Por outro lado, quando são destacados seus defeitos, a tendência
é que ela procure melhorar.

• Como tratar do assunto com sabedoria?

• Sozinho, você pode ser bom. Com outros, você tende a ser melhor. Discuta esta questão.

7.8 Colheres de Cabo Comprido

Um pastor foi convidado por Deus para conhecer o céu e o inferno. Ao abrir‑se a porta, viram uma
sala em cujo centro havia um caldeirão cheio de suculenta sopa.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

À sua volta estavam pessoas famintas e desesperadas. Cada uma delas segurava uma colher de cabo
tão comprido que era possível alcançar o caldeirão, mas não a própria boca.

O sofrimento era imenso.

Em seguida, Deus levou o pastor para conhecer o céu.

Entraram em uma sala idêntica à primeira.

Havia o mesmo caldeirão, pessoas em volta e o mesmo cabo comprido.

A diferença é que todos estavam saciados.

— Eu não compreendo, disse o pastor.

— Por que aqui as pessoas estão tão felizes, enquanto na outra sala morrem de aflição, se é tudo
igual?

Deus sorriu e respondeu:

— Você não percebeu? É porque aqui elas aprenderam a dar comida umas às outras.

(Autor Desconhecido)

7.8.1 Principais questões para reflexão

• O que significa, concretamente, um trabalho em equipe?

• Uma das competências que se exige de uma pessoa que se forma em nível superior é que tenha
capacidade de trabalhar em equipe. Portanto, prepare‑se.

• Espera‑se que você, no exercício futuro da sua profissão como professor, ajude a formar cidadãos,
o que envolve desenvolver no aluno o senso de sociabilidade. Partindo‑se da premissa de que
“ninguém pode dar o que não tem”, você se sente preparado para este desafio?

7.9 Faça parte dos 5%

Certa vez, tivemos uma aula de Fisiologia na escola de Medicina, logo após a Semana da Pátria.
Como a maioria dos alunos havia viajado aproveitando o feriado prolongado, todos estavam ansiosos
para contar as novidades aos colegas e a excitação era geral. Nosso velho professor entrou na sala e
imediatamente percebeu que iria ter trabalho para conseguir silêncio.

Com grande dose de paciência tentou começar a aula, mas você acha que minha turma correspondeu?
Que nada. Com um certo constrangimento, o professor tornou a pedir silêncio educadamente.
32
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Não adiantou. Ignoramos a solicitação e continuamos firmes na conversa.

Foi aí que o velho professor perdeu a paciência e deu a maior bronca que eu já presenciei.

— Prestem atenção porque eu vou falar isso uma única vez, disse, levantando a voz, e um silêncio
carregado de culpa se instalou em toda a sala. E o professor continuou:

— Desde que comecei a lecionar, isso já faz muitos anos, descobri que nós, professores, trabalhamos
apenas 5% dos alunos de uma turma. Em todos esses anos observei que de cada 100 alunos, apenas 5 são
realmente aqueles que fazem alguma diferença no futuro; apenas 5 se tornam profissionais brilhantes e
contribuem de forma significativa para melhorar a qualidade de vida das pessoas. Os outros 95 servem
apenas para fazer volume; são medíocres e passam pela vida sem deixar nada de útil.

O interessante é que esta porcentagem vale para quase tudo no mundo. Se vocês prestarem
atenção, notarão que, de 100 professores, apenas 5 são aqueles que fazem a diferença; de 100
garçons, apenas 5 são excelentes; de 100 motoristas de táxi, apenas 5 são verdadeiros profissionais.
E podemos generalizar ainda mais: de 100 pessoas, apenas 5 são verdadeiramente especiais. É uma
pena muito grande não termos como separar esses 5% do resto, pois, se isso fosse possível, eu
deixaria apenas esses alunos especiais nesta sala e colocaria os 95% restantes para fora, e então
teria o silêncio necessário para dar uma boa aula e dormiria tranquilo à noite, sabendo ter investido
nos melhores.

Mas, infelizmente, não há como saber quais de vocês são esses 5% de alunos especiais. Só o
tempo é capaz de mostrar isso. Portanto, terei de me conformar e tentar dar uma aula para esses
alunos especiais, apesar da confusão que estará sendo feita pelos 95% restantes. Claro que cada
um de vocês sempre pode escolher a qual grupo pertencerá. Obrigado pela atenção e vamos à
aula de hoje.

Nem preciso dizer o silêncio que ficou na sala e o nível de atenção que o professor conseguiu
após esse discurso. Aliás, a bronca tocou fundo em todos nós, pois, depois desse dia minha turma teve
um comportamento exemplar em todas as aulas de Fisiologia, durante todo o semestre; afinal, quem
gostaria de espontaneamente ser classificado como fazendo parte dos 95% que o professor gostaria de
ver longe dali?

Hoje não me lembro de muita coisa das aulas de Fisiologia, mas a bronca do professor eu nunca
mais esqueci. Para mim, aquele professor foi um dos 5% que fizeram a diferença em minha vida. De
fato, percebi que ele tinha razão, e desde então tenho feito de tudo para ficar sempre no grupo dos
5%, mas, como ele disse, não há como saber se estamos indo bem ou não; só o tempo dirá a que grupo
pertencemos.

Contudo, uma coisa é certa: se não tentarmos ser especiais em tudo o que fazemos, se não tentarmos
fazer tudo o melhor possível, seguramente faremos parte da turma do resto.

(Autor Desconhecido)

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

7.9.1 Principais questões para reflexão

• Será mesmo que 5% das pessoas que existem fazem a diferença? Isto não é pouco?

• Será mesmo que 5% das pessoas que existem fazem a diferença? Isto não é muito?

• Será possível “trocar de grupo” com o passar do tempo?

• O que fazer para “trocar de grupo”?

• Este texto estimula você a continuar ou age no sentido contrário?

• O raciocínio do velho professor, de trabalhar para os 5%, está correto?

7.10 O Homem e o Mundo

Um cientista vivia preocupado com os problemas do mundo e estava resolvido a encontrar meios
de respostas para suas dúvidas.

Certo dia, seu filho de sete anos invadiu o seu santuário decidido a ajudá‑lo a trabalhar. O cientista,
nervoso pela interrupção, pediu que o filho fosse brincar em outro lugar. Vendo que seria impossível
removê‑lo, o pai procurou algo que pudesse ser oferecido ao filho com o objetivo de distrair sua atenção:
deparou‑se com o mapa do mundo, o que procurava.

Com o auxílio de uma tesoura, recortou o mapa em vários pedaços e, junto com um rolo de fita
adesiva, entregou ao filho dizendo:

— Filho, você gosta de quebra‑cabeças? Então vou lhe dar o mundo para consertar. Aqui está o
mundo todo quebrado. Veja se consegue consertá‑lo bem direitinho! E faça tudo sozinho.

Então, calculou que a criança levaria dias para recompor o mapa.

Passadas algumas horas, ouviu a voz do filho que o chamava calmamente.

— Pai, pai, já fiz tudo! Consegui terminar tudinho.

A princípio o pai não deu crédito às palavras do filho. Seria impossível na sua idade ter conseguido
recompor um mapa que jamais havia visto. Relutante, o cientista levantou os olhos de suas anotações,
certo de que veria um trabalho digno de uma criança. Para sua surpresa, o mapa estava completo. Todos
os pedaços haviam sido colocados nos devidos lugares. Como seria possível?

Como o menino havia sido capaz?

— Você não sabia como era o mundo meu filho, como conseguiu?
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

— Pai, eu não sabia como era o mundo, mas quando você tirou o papel da revista para recortar, eu
vi que do outro lado havia a figura de um homem.

Tentei, mas não consegui. Foi aí que me lembrei do homem, virei os recortes e comecei a consertar
o homem que eu sabia como era. Quando consegui consertar o homem, virei a folha e vi que havia
consertado o mundo.

(Autor desconhecido)

7.10.1 Principais questões para reflexão

• Comente a frase: “Quando o homem resolver o problema entre homens e homens, aí estará pronto
para resolver os problemas entre homens e mundo”.

• Você está preparado para aprender com uma criança? Afinal, isto é o inverso do que a educação
pensa que faz, ou seja, é a geração mais nova ensinando a geração mais velha.

• Você pretende dedicar tempo para que seus futuros alunos se manifestem e, assim, você aprenda
com eles? Ou não acha isto prudente?

7.11 Professores Reflexivos

... a narrativa de como a experiência concreta de turista me fez pensar em como pode se sentir o
aluno, o estagiário ou o professor que chega, pela primeira vez, a uma escola que não conhece...

Cheguei ao hotel, vinda do aeroporto. Eram duas e meia da tarde. Situado no característico nordeste
brasileiro, o hotel era o exemplo bem acabado da globalização. Pela ausência, quase total, de marcas da
civilização local, poderia situar‑se em qualquer parte do mundo.

A primeira informação que me foi dada dizia‑me que, apesar de serem duas e meia da tarde, eu não
podia ocupar o apartamento. Não estava arrumado ainda.

Podia preencher a ficha de entrada, deixar as bagagens no hall e ir almoçar.

“Logo, logo” comunicariam, quando estivesse pronto.

E assim tentei dirigir‑me ao primeiro piso onde deveria encontrar o restaurante para satisfazer o meu
apetite motivado pelo atraso de um voo que, de curto, não deu direito a refeição nem sequer o refrigerante.

À míngua de informação da recepcionista, e desconhecendo que o piso da entrada era o terceiro,


não me foi fácil encontrar o restaurante no primeiro piso.

Culpa minha, sem dúvida. O meu constructo de que, normalmente, as recepções se encontram no
piso zero, cegou‑me para a hipótese de que, para ir para o primeiro, em vez de subir, era preciso descer.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Mas não tinha ficado mal à recepcionista uma informação menos exígua, ainda por cima expectável
num país e numa região onde os autóctones são comunicativos por natureza.

Nestes momentos iniciais, eu ainda não tinha percebido que já não me encontrava no país da
comunicação, mas sim num hotel standard, igual a tantos outros por esse mundo além, incrustado
numa cultura que não acolheu e da qual se alheou.

Alheamento que não me permitiu usufruir dos sabores típicos, da arte indígena, do calor humano
característico das gentes nordestinas. Nem deixou que me tratassem pelo meu nome, que me colocassem
logo na mão um mapa da cidade, que me informassem sobre o que poderia visitar.

Vinda de outros hotéis no mesmo país, onde eu era “a senhora Isabel”, onde, sem que eu tivesse
pedido ou sequer insinuado, o restaurante abriu mais cedo para que eu pudesse tomar o café da manhã
antes de partir para o aeroporto, onde a espontaneidade do empregado o leva a dizer‑me, na sua
atenção à pessoa do hóspede: “pode levar alguma coisa para comer, pois quando se vai viajar às vezes
até dá fome”. Ou, num outro, em que, num dia de calor, me entra pelo quarto adentro, logo após
a chegada, uma grande jarra de suco e um magnífico prato de frutos tropicais. E onde as refeições
cheiravam e sabiam ao Brasil.

Vinha mal habituada, habituada a ser pessoa e a ter a informação de que necessitava para me sentir
“em casa”. Tinha passado a ser um número, descaracterizada, com tratamento indiferenciado, dentro de
um edifício e numa organização onde tudo estava estandardizado, em contraste com a originalidade da
natureza e a pessoalidade das gentes e das culturas.

Mas... se já estive em tantos hotéis deste tipo, por que estranhar agora? O que me fez sentir um
número, um no meio de tantos outros?

Creio que duas ordens de razões podem explicar o meu sentimento desta vez. Ambas têm a ver com
as experiências sofridas nos dias anteriores. Este episódio tem, pois, um valor experiencial sobre o qual
“me deitei a refletir”, tentando, a partir dele, aprofundar o meu conhecimento sobre a vida.

Em primeiro lugar, eu vinha de proferir duas palestras sobre educação em que tinha abordado o
tema da refletividade, da contextualização, da pessoalidade, da cidadania, da comunicação. Numa delas
tinha situado o tratamento destes temas no contexto da sociedade da informação globalizante em que
vivemos.

Em segundo lugar, vinha de contextos em que se valorizava o local, o único, o expressivo, o pessoal
culturalmente socializado. Contextos que me socializaram na cultura autóctone e me trouxeram o
encanto de aprender com aquilo que para mim era novo. Trazia expectativas de continuidade. Encontrei
o dejà vu.

A reflexão sobre esta minha experiência concreta não me pode levar a generalizar a partir do que foi
episódico. Eu sei. Mas suscitou em mim algumas inquietações enquanto cidadã do mundo e enquanto
educadora.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Questiono‑me se será necessário aniquilar o autêntico e o local para se viver o conforto ditado por
critérios globalizantes. Mesmo pensando em termos econômicos – pois são esses evidentemente os
termos em que os empresários devem pensar – não será possível encontrar formas de harmonizar o
socialmente genuíno com o tecnologicamente moderno? Como será possível conciliar a eficiência de
gerir grandes hotéis com a atenção pessoalizada a dispensar ao cliente?

O pensamento, que se torna bem mais alado nos momentos de férias como o que eu estava a viver,
levou‑me para outras esferas e dei comigo a pensar nos alunos quando transitam de uma escola para
outra e, sobretudo, de um ciclo de estudo para o subsequente (por exemplo, do 1º para o 2º grau). Foi
sobre eles que passei a refletir.

Como se sentirão esses alunos no primeiro dia de aulas? Quebrada a continuidade da familiaridade
e dos afetos que os entrelaçavam na escola já familiar, como os receberá a nova escola: como pessoas
ou como números?

Fornecer‑lhe‑ão a informação necessária e correta para que eles possam se contextualizar?


Aparecer‑lhe‑á como uma escola “com cara” ou terá dela a ideia de uma escola indistinta e estandardizada?
Quem se preocupará com o que eles sentem? Quem criará o contexto que os leve a integrarem‑se e a
viverem a escola em vez de se isolarem e quererem apenas “passar pela escola o mais depressa possível”?

Fonte: ALARCÃO (2003)

7.11.1 Principais questões para reflexão

• Entende‑se que as principais questões para reflexão já foram suscitadas pela autora, porém, isto
não impede que outras reflexões surjam em sua mente a partir da leitura, principalmente baseadas
em sua experiência pessoal.

7.12 Um Sonho Impossível?

Todos os pais querem ver seus filhos formados e bem sucedidos. Esperando isso, matriculam a criança
na escola e sonham: ela aprenderá tudo muito bem, terá ótimas notas, avançará sempre e depois...
Depois, o diploma, o sucesso...

Esse interesse dos pais, a ajuda e o apoio que dão aos filhos para que eles possam fazer suas tarefas,
é muito importante para a boa realização da criança. A participação dos pais pode ser direta, com
explicações detalhadas e repetidas, orientação para cada tarefa. Ou então pode ser indireta, com
o estímulo para a realização dos trabalhos e lições, o elogio, o cuidado com o material escolar e a
preocupação com a frequência às aulas.

As famílias de classe média e alta, em geral, dão esse tipo de apoio às crianças.

Mas o mesmo não acontece nas famílias mais pobres.

37
PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Nesse último caso, é difícil para os pais darem tal apoio aos filhos. Mesmo que estejam interessados
e queiram participar ativamente, muitas vezes não sabem como fazer isso, não se sentem em condições
de colaborar.

Frequentemente, não conhecem o conteúdo das matérias, estranham os métodos de ensino e as


atitudes da escola. É comum ficarem inibidos, desarmados e até humilhados em seus contatos com a
escola.

De modo geral podemos dizer que esses pais não se sentem em condições de avaliar o que
está sendo ensinado e só julgam o desempenho dos filhos através das notas baixas. Além de
assistirem, desarmados, à insatisfação e fracasso das crianças, não ficam à vontade no ambiente
da escola.

Diante de tudo isso é bem possível que esses pais passem a achar mais proveitoso e lucrativo preparar
“de fato” seus filhos para a vida.

Acabam tirando a criança da escola, para que comece logo a trabalhar.

Esta não é, certamente, a melhor solução.

O importante mesmo é fazer com que a escola se torne mais adequada às necessidades reais das
crianças, atendendo às esperanças dos pais.

Fonte: Revista “Pensamento e linguagem” – Fundação Carlos Chagas

7.12.1 Principais questões para reflexão

• Reflita sobra a desigualdade social no Brasil. Na sequência, reflita sobre o papel a ser desempenhado
pela educação, neste contexto.

• Imagine‑se lecionando, no período da manhã, para alunos que pertencem a famílias de classe alta
e, à tarde, para alunos que pertencem a famílias de baixa renda. Sua atuação profissional como
professor deve ser diferente em cada contexto?

• Qual seria uma boa estratégia para combater a evasão escolar?

7.13 Pipocas da Vida

Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre.

Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo.
Quem não passa pelo fogo fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e uma
dureza assombrosa. Só que elas não percebem e acham que seu jeito de ser é o melhor jeito de ser. Mas,
de repente, vem o fogo.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: a dor. Pode ser fogo de
fora: perder um amor, perder um filho, o pai, a mãe, perder o emprego ou ficar pobre. Pode ser fogo de
dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas causas ignoramos.

Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! Sem fogo, o sofrimento diminui. Com isso, a
possibilidade da grande transformação também.

Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro cada vez mais quente, pensa que
sua hora chegou: vai morrer. Dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar
um destino diferente para si. Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada para ela. A
pipoca não imagina do que ela é capaz. Aí sem aviso prévio, pelo poder do fogo, a grande transformação
acontece: BUM! E ela aparece como outra coisa completamente diferente, algo que ela mesma nunca
havia sonhado.

Bom, mas ainda temos o piruá, que é o milho de pipoca que se recusa a estourar. São aquelas
pessoas que, por mais que o fogo esquente, se recusam a mudar. Elas acham que não pode existir coisa
mais maravilhosa do que o jeito delas serem. A presunção e o medo são a dura casca do milho que não
estoura. No entanto, o destino delas é triste, já que ficarão duras a vida inteira.

Não vão se transformar na flor branca, macia e nutritiva. Não vão dar alegria para ninguém.

Fonte: ALVES (1999)

7.13.1 Principais questões para reflexão

• Um grande dilema do ser humano é mudar. E isso se explica pelo simples fato de que, mudar,
pode ser para melhor ou para pior. Assim é o ser humano. Neste contexto, como zelar para que a
mudança pretendida seja para melhor?

• Há quem goste de piruá... ele não é, necessariamente, ruim.

• Cada milho de pipoca tem seu tempo certo para estourar... precisa de mais ou menos tempo, mais
ou menos calor. Como este raciocínio pode ajudar no lidar com alunos? E consigo mesmo?

8 RECOMENDAÇÕES DE LEITURAS E REFLEXÕES COMPLEMENTARES

Seguindo a mesma linha de raciocínio do item anterior do livro‑texto, recomendamos que você
prossiga constantemente com a leitura de textos de alguns autores especialmente importantes, os quais
permitem, também, uma reflexão profunda sobre esta educação que permeia nossa vida e nos atinge.

É recomendável que você busque se aprofundar em leituras deste tipo, que podem ser obtidas
facilmente por via secundária na internet e em bibliotecas. Neste contexto, autores como Rubem Alves,
Paulo Freire e Celso Antunes (que, dentre outros, estão aqui destacados) têm muito a contribuir com a
sua formação acadêmica e profissional.
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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

Recomenda‑se, portanto, a leitura constante dos artigos e textos desses autores que se enquadram
perfeitamente ao raciocínio proposto nesta disciplina. Dessa forma, você certamente só tem a ganhar e,
assim, se aprimorar continuamente para o exercício da sua profissão, proporcionando que o reflexo dos
seus ganhos se reflita na sociedade e, em especial, na vida dos seus futuros alunos.

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PRÁTICA DE ENSINO – INTRODUÇÃO À DOCÊNCIA

FIGURAS E ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Articulação entre as ênfases da prática de ensino – Autoria própria

REFERÊNCIAS

Audiovisuais

ANTUNES, C. 10 Histórias Exemplares. In: Coleção Grandes Autores. São Paulo: Atta Mídia e Educação,
2004. 1 vídeo‑disco.

Textuais

ALARCÃO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. São Paulo: Cortez, 2003. p. 7‑10.

ALVES, R. A pipoca. In: O amor que acende a lua. Campinas: Papirus, 1999. p. 54‑57.

BRANDÃO, C. R. O que é educação. In: Coleção Primeiros Passos. 28ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1993.

CRUZ, C. H. C. Competências e Habilidades: da proposta à prática. Coleção Fazer e Transformar. 2ª ed.


São Paulo: Loyola, 2002.

HAIDT, R. C. C. Curso de Didática Geral. 7ª ed. São Paulo: Ática, 2002.

LENFESTEI, J. Histórias para aquecer o coração dos pais. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.

RAMOS, M. N. Da Qualificação à Competência: deslocamento conceitual na relação trabalho‑educação.


Niterói: UFF, 2001.

ROSA, G. Grande Sertão: Veredas. 33ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

Sites

<www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/saberefazer.htm>. Acesso em: 19. jan 2012.

<www.rubemalves.com.br>. Acesso em: 19. jan 2012.

<www.celsoantunes.com.br>. Acesso em: 19. jan 2012.

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Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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