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Digitalização
Capítulo 1

Londres, mansão dos marqueses de Brandenbourg.


Dezembro 1804
Lady Sophie York, única filha do marquês de Brandenbourg, tinha rejeitado o pedido de matrimônio de
um barão, dois cavalheiros, um punhado de senhores muito convenientes e de um visconde que tinha pedido
de forma muito adequada no escritório de seu pai o privilégio de obter sua mão. Inclusive descartou um
marquês em metade de uma caçada e ao simples senhor Kissler na Ascot. Outras garotas menos afortunadas
não podiam entender Sophie. Nas duas últimas temporadas havia feito perder as esperanças à maioria dos
homens mais procurados. Mas a partir de agora já não haveria mais pedidos de matrimônio tanto se eram
oficiais como se não. As más línguas iam estar de acordo: a jovem tinha entregado seu afeto a um homem da
nobreza. Lady Sophie seria condessa na seguinte temporada.
Olhou-se no espelho e fez uma careta ao pensar nas caras de curiosidade e as numerosas reverências
que teria que suportar no baile dos Dewland. Estremeceu interiormente com uma indecisão totalmente
desacostumada nela. Não sabia se estava corretamente vestida para o anúncio de seu compromisso. Usava
um vestido de seda prateada; era possível que a cor lhe permitisse desaparecer entre a multidão de mulheres
com roupas apertadas, grandes decotes e com vivas cores que abarrotavam o salão de baile. O cinza prata era
uma cor de monjas, pensou divertida, mas uma religiosa desmaiaria se tivesse que usar uma roupa como esta,
era de uso Império com o corte alto e umas fitas que rodeavam o sutiã.
A marquesa de Brandenbourg entrou na habitação.
― Esta pronta Sophie?
― Sim, mamãe ― Ela renunciando à ideia de trocar-se, pois já iam com atraso.
A marquesa a observou entrecerrando os olhos. Ela usava um vestido de cetim cinza bordado com
flores que se parecia muito aos que estavam de moda uns vinte anos antes quando se casou.
― O vestido que usa é indecente ― Declarou secamente.
― Sim mamãe.
Essa era a sistemática resposta de Sophie as ácidas recriminações de sua mãe. Pegou o xale e seu
ridículo e se dirigiu para a porta.
Heloise parecia um pouco indecisa e a olhou ressentida. A marquesa, de origem francesa, parecia pensar
que o mundo era um campo de batalha e ela o general chefe. Era muito raro vê-la tão insegura de si mesma.
― Esta noite vai anunciar que aceita o pedido de matrimônio do conde de Slaslow.
― Sim mamãe.
Houve um breve silêncio. Sophie se perguntou qual seria o problema. A sua mãe rara vezes faltavam às
palavras.
― Estou segura de que pedirá uma prova de seu afeto.
― Sim mamãe ― Disse Sophie baixando os olhos para dissimular sua diversão.
Educada em um convento, Heloise tinha chegado a sua noite de bodas terrivelmente mal preparada.
Casou-se com um inglês tão apaixonado de tudo quão francês não aceitava nenhum criado que não o fosse.
A babá de Sophie tinha sido francesa, as donzelas, os lacaios e naturalmente o cozinheiro eram franceses.
Heloise não podia imaginar reveladoras conversas que se desenvolviam no quarto dos meninos. Sua filha não
necessitava que ninguém a pusesse a par do que os homens esperavam das mulheres.
― Pode lhe conceder um beijo, dois como muito ― Continuou Heloise ― Estou segura de que entende
a importância desses limites Sophie. Sua reputação…
Sophie, com os olhos brilhantes, olhou a sua mãe que olhava obstinadamente a um ponto na parede
oposta.
― Empenhou-se em escolher vestidos que não são mais que finas partes de tecido. Todo mundo pode
dar-se conta de que não usa espartilho. Às vezes inclusive me pergunto se colocou combinação. Muitas vezes
me senti envergonhada por sua conduta, digamos coquete. Tem sorte de fazer um excelente casamento e te
exijo que não o danifique tudo animando o conde a que tome liberdades contigo.
Sophie notava que se zangava por momentos.
― Sugere que meu comportamento não foi correto até agora?
― Certamente! Quando eu tinha sua idade me parecia tão impossível me encontrar a sós com um
homem como partir para a América. Nenhum de meus pretendentes me beijou além de meu prometido. Eu
sabia estar em meu lugar, mas você não tem nenhum respeito por sua posição. A seu pai e a mim sempre
incomodou seu desavergonhado comportamento.
Sophie se compadeceu a seu pesar.
― Nunca fiz nada errado, mamãe o mundo se veste seguindo a moda francesa e os costumes são mais
livres agora que em seu tempo.
― Assumo minha parte de responsabilidade, fechei os olhos em suas extravagantes escapadas e na
maioria de suas faltas. Mas agora vai casar e o que é perdoável em uma impulsiva jovenzinha seria inaceitável
para uma condessa.
― De que falta? Nunca permiti a um homem que tomasse liberdades comigo.
― Sei que a palavra castidade está fora de moda, mas não concordo ― Respondeu amargamente a
marquesa ― Suas brincadeiras fora do lugar e sua paquera fazem que pareça mais acessível do que é em
realidade. De fato, Sophie, suas maneiras são as de uma cortesã.
Sophie permaneceu uns instantes assombrada e indignada, depois respirou profundamente.
― Nunca fiz nada errado, mamãe― Disse com firmeza.
― Como se atreve a me dizer isso quando lady Prestlefield encontrou Patrick Foakes e a você abraçados?
Comporta-se como uma rameira e deixa que te surpreenda a pior fofoqueira de toda Londres. Se ao menos
tivesse estado comprometida com ele… Mas beijos roubados no salão em uma noite de festa! Envergonhou-
me muito Sophie. De modo que insisto: proíbo você que dê ao conde de Slaslow algo mais que uma
demonstração de afeto. Um engano mais desse tipo e sua reputação ficará definitivamente arruinada. Além
disso, o conde de Slaslow teria todas as razões do mundo para anular sua proposta se suspeitasse de seu
dissipado caráter.
― Mamãe!
― Chega! ― Repetiu a marquesa ― É herdeira de seu pai e ele te animou a seguir esse caminho. Desde
dia em que te permitiu aprender todos esses idiomas te apoiou com uma atitude muito pouco digna. Não há
nada mais inconveniente para uma dama que estudar latim.
Interrompeu com um gesto o protesto de sua filha.
― Afortunadamente ― Continuou ― Tudo acabou bem. Quando for condessa estará bastante ocupada
por sua casa para se colocar nesses inúteis estudos.
Repentinamente voltou para sua preocupação do princípio.
― Evidentemente, se tivesse casado com Foakes, todos os rumores teriam desaparecido se por acaso
sozinhos, mas como negou sua proposta de matrimônio, sua reputação se ressentiu. Ninguém quer acreditar
que foi você quem o rejeitou.
― Não podia aceitar ― Objetou Sophie ― Me propôs isso somente porque lady Prestlefield entrou no
salão. É um libertino e seus beijos não significam nada.
― Não sei muito de beijos que não significam nada ― Declarou a marquesa com altivez ― Eu gostaria
que minha filha tivesse o mesmo sentido comum que eu. Que importância tem que Foakes seja um libertino?
Igual pode resultar um marido excelente. E, além disso, é imensamente rico que mais pode desejar?
Sophie olhava a ponta dos sapatos de cetim. Era difícil explicar seu ódio para os mulherengos sem fazer
referência a seu pai que perseguia a todas as jovens francesas exiladas. Em vista da crítica situação pela que
atravessava a França nesses dias, não tinha descansado nos últimos anos.
― Eu gostaria de me casar com um homem que me respeitasse ― disse.
― Te respeitar! Acredite-me, não escolheu a melhor maneira para consegui-lo filha. Garanto-te que nem
um só homem em Londres te considera uma mulher de conduta irreprovável. Quando eu me apresentei em
sociedade, escreviam-se poemas elogiando minha modéstia mais esses versos não poderiam aplicar a você.
Além disso ― Concluiu Heloise com amargura ― Acho que é digna filha de seu pai. Os dois puseram de
acordo para que toda a nobreza ria de mim.
Sophie voltou a respirar profundamente porque as lágrimas começavam a arder nas pálpebras.
Heloise suavizou um pouco.
― Não quero ser muito dura mais estou preocupada com você, Sophie. Com o conde de Slaslow terá
um bom marido. Não ponha seu compromisso em perigo, por favor.
O aborrecimento de Sophie se esfumou e foi substituído por uma onda de culpa; sua mãe tinha tido
que suportar muitas humilhações em público por culpa da atração que seu marido sentia pelos franceses. E
agora sua filha era o centro das falações.
― Não pretendia te envergonhar, mamãe ― Disse brandamente ― Me surpreendi quando lady
Prestlefield me encontrou com Patrick Foakes.
― Se não tivesse estado a sós com ele, não teria te surpreendido ― Contestou sua mãe com uma lógica
esmagante ― A reputação não é uma coisa para tomar a brincadeira, Sophie. Nunca me tivesse podido
imaginar que algum dia alguém pudesse pensar que minha filha era uma mulher fácil e, entretanto isso é o
que se diz de você.
Dizendo isto Heloise saiu da habitação fechando a porta atrás de si.
Desta vez as lágrimas estiveram a ponto de transbordar. Não era a primeira vez que a marquesa caía
sobre um membro da casa como se fosse um anjo vingador saído de uma tragédia grega, e normalmente
Sophie conseguia fazer caso omisso de suas amargas recriminações. Mas esta noite sua mãe havia tocado um
nervo sensível, já que ela mesma se dava conta de que estava roçando o limite das regras. Seus vestidos eram
os mais atrevidos de toda Londres e sua atitude claramente provocadora.
Tinha ouvido cem vezes os versos compostos em honra de sua mãe: Entre um milhar de jovens virgens
eis aqui à Diana cujo cabelo… Ela e sua mãe tinham o mesmo tom de cabelo loiro, mas enquanto que os
cabelos de Heloise emolduravam sabiamente sua cara recolhidos em um impecável coque, os cachos de
Sophie nunca se submetiam às forquilhas e as fitas. Se por acaso fosse pouco, os tinha cortado antes que o
resto das damas inglesas tivessem a coragem de seguir a moda francesa. Agora todas as debutantes tinham
adotado esse penteado, de modo que ela tinha decidido deixar que crescesse de novo.
Mas sua mãe não sabia quão doloroso foi para ela rejeitar o pedido de matrimônio de Patrick Foakes.
Deixou-se cair na cama. Recordava o baile dos Cumberland do mês anterior. A excitação que sentiu quando
ficou claro que Patrick a cortejava. O tombo que deu seu coração quando seus olhares se encontraram.
Ainda podia sentir essa estranha emoção ao recordar o convite de seus olhos e a maneira em que se
arqueou sua sobrancelha direita e a arrogância de sua expressão.
Passou a noite com o coração pulsando desenfreado e as pernas trementes. Ele exercia tal fascinação
sobre ela que ela esperava com impaciência os momentos nos quais ele aparecia a seu lado, e quando podia
ver seu cabelo escuro com mechas prateadas no outro extremo do salão. No jantar, rodeados de pessoas
sentadas ao redor de uma mesa redonda, estremecia cada vez que suas pernas se roçavam ou seus braços se
tocavam acidentalmente.
Dançaram juntos uma vez, e depois outra. Uma terceira vez teria equivalido a um anúncio de seu
compromisso.
Sophie não tinha pronunciado palavra durante seu segundo baile. Deu medo que Patrick adivinhasse a
debilidade que se apoderava dela cada vez que se juntavam seguindo os passados do baile.
Quando ele pegou seu braço para levá-la fora do salão de baile como se fossem procurar um copo de
refresco, e depois a conduziu a um salão deserto, ela não protestou. Patrick tinha se apoiado na parede para
olhá-la com expressão provocadora. As emoções das últimas horas deviam haver subido ao Sophie à cabeça,
já que lhe devolveu o sorriso comportando-se como a mulher fácil que diziam que era.
Patrick a tinha pego entre seus braços em um gesto que parecia inevitável. Entretanto a paixão de seu
beijo foi uma surpresa. A Sophie já a tinham beijado antes, tantas vezes que sua mãe desmaiaria se tivesse
sabido, mas este beijo não era como as que ela conhecia e estava acostumada.
Esse beijo foi como uma tormenta do verão; começou brandamente e se converteu em algo ardente
com uma paixão cheia de gemidos. Patrick tinha levantado a cabeça lançando um juramento surpreso e
procurou de novo de seus lábios ao tempo que suas mãos acariciavam as costas e as nádegas dela.
Era injusto dizer que estavam beijando quando lady Prestlefield entrou nas pontas dos pés na estadia.
Sim, beijaram-se uma e outra vez, mas nesse momento estava de pé frente a frente e Patrick acariciava com
um dedo seu lábio inferior. Ela o olhava desorientada, sem poder pronunciar uma só palavra e despojada de
seu sentido comum.
― Porretes! ― Murmurou voltando para presente.
Podia ouvir a voz de seu pai, e sem dúvida estava dizendo que se apressasse. Ela sabia exatamente
porque ele tinha tanta pressa, acabava de lançar-se à conquista de uma jovem viúva, a senhora Dalinda
Beaumaris, e devia haver-se chamado com ela no baile.
Esse pensamento reforçou sua decisão. Não importava que tivesse chorado todas as noites desde
rejeitou o pedido de matrimônio do Patrick um mês antes. Ela tinha tido razão. Só tinha que recordar o
alívio que viu em seu olhar quando, o dia posterior ao baile, na biblioteca, ela tinha soltado suas mãos das
dele e havia dito “não” muito educadamente. Não podia esquecê-lo nunca.
Não ia deixar que ele rompesse seu coração um libertino como tinha acontecido a sua mãe. Ela não se
converteria em uma anciã amargurada à força de ver seu marido dançando com as Dalindas e as Luciennes.
Possivelmente não poderia impedir que seu marido fornicasse com outras mulheres, mas ao menos poderia
permanecer indiferente diante suas aventuras.
“Não sou idiota”, pensou Sophie e não pela primeira vez.
Bateram na porta e se levantou.
― Entre!
― A Sua Senhoria gostaria que se reunisse com ele lá embaixo ― Anunciou Philippe, um dos lacaios.
Sophie não se fazia de iludida, a mensagem tinha sido outro “vá chamar a essa pesada”, isso o que
realmente deve dizer o marquês. Então o mordomo fazendo um sinal com a cabeça, devia ter mandado o
Philippe. A dignidade, muito francesa, deste último, e a alta opinião que tinha de seu trabalho, o impediam
de rebaixar-se a levar esse tipo de mensagem.
Ela sorriu.
― Diga a meu pai que descerei em seguida, por favor.
Quando Philippe saiu, ela agarrou seu leque e se deteve um momento diante o espelho de sua
penteadeira. A imagem que viu era a de uma mulher que tinha inflamado o coração de dúzias de cavalheiros,
que tinha provocado vinte e dois pedidos de mão e infinidade de cumpridos extravagantes.
Era miúda, chegava pelos cabelos aos ombros de Patrick, e o leve vestido prateado realçava suas formas,
especialmente seus seios que se viam mais volumosos sob o ajustado sutiã.
Estremeceu. Ultimamente não podia olhar-se a um espelho sem recordar o contato do musculoso peito
de Patrick.
Mas tinha que sair. Agarrou o xale e saiu da sala.
Capítulo 2

Pela tarde, o dia do baile dos Dewland, celebrou-se, no Ministério de Assuntos Exteriores, alguém
reuniu especial de jovens cavalheiros presidida pelo ministro em pessoa. Lorde Breksby estava ficando maior,
mas ao mesmo tempo cada vez se sentia mais a gosto tendo poder. Deste modo, embora recebesse a seus
visitantes mediu fundo no sofá e com a peruca branca que se empenhava em escorregar para um lado em vez
de ficar quieta em seu lugar, não tinha nada de gracioso.
Lorde Breksby estava em Assuntos Exteriores sete anos e via o mundo como se fosse um teatro de
marionetes de cujos fios ele puxava. Um de seus principais talentos, sob o ponto de vista de William Pitt e
do governo inglês, era seu dom para manipular a outros. Como disse uma noite a sua mulher quando
terminavam a sobremesa, as pessoas tinham que usar todos os meios a seu alcance. Lady Breksby tinha
assentido com cansaço enquanto pensava com uma casa de campo, perto de sua irmã, na qual pudesse
cultivar rosas.
― Inglaterra a infrautilizado a seus nobres ― Continuou ele ― Certamente, os aristocratas tendem a
levar uma vida desordenada. Não tem mais que recordar a quão degenerados rodeavam a Carlos II…
Lady Breksby, enquanto, pensava na nova variedade de rosas chamada Princesa Charlotte, perguntando
se poderiam subir pelas paredes. Podia imaginar a fachada sul coberta de roseiras.
Lorde Breksby por sua parte, pensava nos libertinos de antigamente. Rochester sem dúvida foi o pior de
todos com essas perversas poesias sobre as prostitutas. Era um degenerado, e tudo porque sua vida era um
aborrecimento.
― Mas isso forma parte do passado ― Concluiu ― Os jovens de hoje em dia são bastante mais úteis se
souber levar. Têm dinheiro e classe, querida. Isso é indispensável quando terá que tratar com estrangeiros.
Olhe o Selim III, por exemplo, dirige o Império Turco, querida.
Lady Breksby assentiu educadamente com a cabeça. Pensando-o bem, dizia a si mesma, as Princesas
Charlottes são muito pesadas para subir. As melhores tinham corolas pequenas, como esse encantado
exemplar que cobria a entrada da senhora Barnett. Qual era seu nome?
― Esse homem está deslumbrado pelo Napoleão embora invadisse o Egito faz apenas seis anos.
Acredita que é Deus pelo que dizem dele. Reconheceu o título de imperador, e agora, inclusive esta
pensando em trocar seu título de sultão pelo de imperador.
Breksby hesitou se tomava a sobremesa, mas depois decidiu não fazê-lo; os coletes já lhe estavam um
pouco estreitos. Voltou para tema que o preocupava.
― Nós temos que deslumbrar também o Selim, se não irá da mão do Napoleão e declarará guerra à
Inglaterra. Mas como poderíamos impressiona-lo? Vamos enviar à flor e nata de nossa nobreza, vamos
enviar a alguns de nossos cavalheiros mais representativos. Essa é a solução.
Lady Breksby assentiu docilmente.
― É uma maravilhosa ideia, querido.
Finalmente esta conversa teve um dobro resultado. Lorde Breksby fez que enviassem uma série de
mensagens através de Londres e lady Breksby escreveu uma carta a sua irmã, que vivia ainda em seu povoado
natal do Hogglesdon, para pedir que fosse, se não era uma moléstia, até a casa da senhora Barnett para
perguntar o nome de sua variedade de roseiras.
Lorde Breksby recolheu os frutos de sua ideia antes que sua esposa (por desgraça a senhora Barnett
tinha morrido e sua filha ignorava o tão desejado nome das flores).
O primeiro em chegar ao Ministério de Assuntos Exteriores foi Alexander Foakes, conde de Sheffield e
de Downes. Breksby se levantou para recebê-lo cordialmente. Tinha enviado uma vez Sheffield a Itália um
ano antes para uma missão muito delicada que havia realizado de forma impecável.
― Bom dia milorde Como se encontram suas filhas e sua encantadora esposa?
― Maravilhosas ― Contestou Alex tomando assento ― Para que me chamou?
Breksby sorriu; era muito maior para deixar-se impressionar por esses jovens impetuosos. Apoiou-se no
respaldo de sua poltrona juntando as mãos.
― Preferiria que todo mundo estivesse aqui antes de começar a falar ― disse ― Mas tenho que precisar
que não o convoquei para encomendar uma missão do Governo. Absolutamente. Nós não gostamos de
interferir na vida privada de um homem que tem filhos pequenos.
Alex levantou uma sobrancelha.
― Exceto quando terá que arrolar algum soldado.
Com isto estava fazendo alusão à prática consistente em sequestrar homem jovens para enviá-los à
frente pelas boas ou pelas más.
― Hum… Mas nunca pressionamos aos nobres, só contamos com sua generosidade e seu patriotismo.
Alex engoliu uma gargalhada cética. Breksby era uma espécie de Maquiavel ao que era melhor não
enfrentar.
― Entretanto sua presença aqui não é um capricho já que tenho que propor algo a seu irmão ―
Anunciou Breksby.
― É possível que o interesse ― Disse Alex sabendo que Patrick estaria encantado de aproveitar a
oportunidade de viajar.
Tinha voltado para a Inglaterra aproximadamente um ano antes e parecia estar morto de
aborrecimento. Se por acaso fosse pouco estava especialmente irascível desde que Sophie York se negou a
casar com ele.
― Isso é o que pensei também ― Murmurou Breksby.
― Onde tem pensado enviá-lo?
― Espero que aceite ir ao Império Turco no verão próximo. Ouvimos que Selim III queria ser coroado
imperador seguindo Napoleão, e nós gostaríamos que a Inglaterra esteja representada no simulacro de
cerimônia. Como é impensável enviar os filhos do rei Jorge…
Elevou os olhos ao céu ao pensar nos descerebrados príncipes que estavam mais tempo bêbados que
sóbrios.
Alex assentiu. Patrick voltaria da viagem com um navio cheio de mercadorias o qual parecia uma
compensação muito justa.
― Agora bem, quiser puxar você a esta pequena reunião é por um problema de título.
― De título? ― Estranhou Alex.
― Exatamente. Certamente seu irmão representar a Inglaterra adequadamente, já que tem meios para
vestir luxuosamente, e o governo, naturalmente, encarregará que entregue um extraordinário presente a
Selim. Tínhamos pensado em um cetro encravado de rubis parecido ao do rei Eduardo II. Acrescentaríamos
mais rubis já que Selim é muito vulgar e gosta especialmente dessa pedra. Mas a verdadeira questão é o que
pensará de Patrick Foakes. Dadas as delicadas relações entre nossos respectivos países, esse é um ponto
importante.
― Patrick ganhou a avaliação dos chefes da Albânia e Índia ― Fez notar Alex ― Acho inclusive que Ali
Pacha lhe suplicou que entrasse em sua moradia e sabe você que Albânia está cheia de turcos. Não acredito
que tenha o menor problema.
― Não entendeu meu amigo. A Selim fascinam os títulos daí o de Imperador Selim.
Alex, que olhava fixamente o tapete, levantou a cabeça para olhar a seu interlocutor diretamente aos
olhos.
― Pensou em outorgar um título ao Patrick.
Não era uma pergunta, e um grande sorriso iluminou seu rosto.
― É maravilhoso! ― Exclamou.
― Há algumas dificuldades mais se podem resolver facilmente ― Afirmou lorde Breksby.
― Pode ter a metade de minhas propriedades e a metade de meu título ― Declarou Alex.
Alexander Foakes, como conde de Sheffield e de Downes possuía dois domínios.
― Querido amigo! ― Indignou-se Breksby ― Nunca faríamos tal coisa! Não se trata de partir pela
metade um título hereditário. Mas se que poderíamos o liberar de algum de seus outros títulos.
Alex ficou pensativo. Não só era conde de Sheffield e de Downes, mas também visconde de Spencer.
― Estava pensando em seu título ardem Breksby.
Alex estava um pouco perdido.
― Um título escocês?
― Quando sua bisavó se casou com seu bisavô, o título de seu pai; duque de Gisle; extinguiu-se já que
era filha única.
― É obvio!
Alex tinha ouvido falar de sua bisavó escocesa, mas nunca lhe ocorreu que o título tinha desaparecido.
― Eu gostaria de pedir ao rei que concedesse esse título a seu irmão. Parece-me que o motivo está
justificado já que se trata de ganhar Selim para a causa inglesa. Se não se sentisse o bastante impressionado
por nosso embaixador seria capaz de nos declarar a guerra só para imitar a seu querido Napoleão. Suponho
que o fato de que Patrick e você sejam gêmeos jogará a seu favor. Depois de tudo é o mais novo só por uns
minutos de diferença.
Alex assentiu com a cabeça. Já que Breksby só falava de seus planos quando estava seguro de que iam
sair bem, dentro de uns meses Patrick seria duque de Gisle.
A porta se abriu dando passagem ao mordomo do ministro quem anunciou:
-O senhor Patrick Foakes, o conde de Slaslow, lorde Reginald Petersham, o senhor Peter Dewland.
Breksby não perdeu o tempo em formalidades.
― Senhores, os fiz vir porque cada um de vocês é dono de um excelente navio.
― Meu Deus! ― Exclamou Braddon Chatwin, conde de Slaslow ― Não acredito senhor, a menos que
meu administrador o tenha comprado sem me dizer nada.
Lorde Breksby o olhou com severidade. Aparentemente os informes que tinha recebido sobre a
capacidade intelectual de Slaslow não tinham sido exagerados.
― Ganhou um jogando às cartas com…
Levantou os óculos para consultar uma folha que havia sobre seu escritório.
― … Um tal Sheridan Jameson. Um comerciante acredito.
― Tem razão! ― Exclamou Braddon aliviado ― Foi uma noite que nos detivemos em uma estalagem no
caminho da Ascot. Recorda-o Petersham?
― Lembro que jogou ― Disse Petersham.
― E ganhei um navio! ― Acrescentou Braddon muito contente.
― O governo quer requisitá-los? ― Perguntou Patrick um pouco secamente.
Possuía três bons navios e não tinha nenhum desejo de desprender-se deles.
― Não, não ― Assegurou lorde Breksby ― Nos perguntávamos se algum de vocês estaria disposto a
fazer uma viagem ao longo da costa de Gales nos próximos meses. Ordenamos fazer algumas fortificações,
mas já sabem quão difícil é controlar a essa gente. Nunca obedecem.
Os outros cinco esperaram que continuasse.
― Isso é tudo senhores ― Continuou Breksby ― Achamos que há uma pequena possibilidade de que
Napoleão queira invadir a Inglaterra desde Gales.
Braddon franziu o cenho.
― Por que ia fazer isso? É muito mais simples cruzar o canal da Mancha. Eu mesmo cruzei em seis
horas.
Devia ter sido uma verdadeira dor de cabeça para sua mãe. Como podia não saber que o canal da
Manga estava bloqueado?
― Temo que Napoleão bloqueou o canal ― Explicou com a maior cortesia ― Por isso peço que um de
vocês nos ajude. Certamente, poderia fazer que nossa frota vigiasse a construção das fortificações, mas
necessitamos todos nossos navios. Por isso estaria muito agradecido ao que aceitasse a missão.
― Eu não posso sair antes que termine a temporada ― Replicou rapidamente Braddon ― Me
comprometi esta manhã e minha mãe me advertiu que seria obrigado a assistir a todas as recepções. E depois,
é obvio, tenho que me casar.
Breksby aguçou o ouvido. Gostava de inteirar-se de todas as alianças que se levavam a cabo entre a
aristocracia.
― Devo entender que Sophie York aceitou casar-se com você?
― Sim! ― Respondeu Braddon radiante.
Alex cruzou seu olhar com o de Patrick enquanto ambos os se levantavam para felicitar ao futuro
marido. Viu o brilho de brincadeira que iluminava os olhos de seu gêmeo e o sarcasmo em seu sorriso.
Patrick se voltou para o ministro.
― Eu aceito a missão ― Disse.
Lorde Breksby também se levantou apoiando-se na escrivaninha.
― Magnífico! ― Se me conceder um pouco de seu valioso tempo, mostrarei onde deveriam estar as
fortificações.
Havia ironia em sua voz. Os galeses eram cabeças duras e custavam aceitar o domínio inglês, de modo
que duvidava muito da existência das defesas.
Patrick assentiu e voltou a sentar-se enquanto outros se despediam. Alex não se moveu.
Quando estiveram os três a sós, Breksby explicou brevemente a situação do Império Turco.
― Não vou necessitar nenhum título ― Disse Patrick em um tom que não admitia réplica.
Alex sorriu. Ele já tinha estado a ponto de dizer a Breksby que seu irmão não aceitaria converter-se em
duque.
Mas lorde Breksby nunca fazia nada sem ter feito averiguações; sabia que Patrick tinha mais dinheiro
que a maioria dos cavalheiros; tanto ou mais que seu irmão. Também sabia que não tinha nenhum desejo de
possuir um título. Por isso sabia nunca tinha demonstrado a menor inveja da fila de seu irmão gêmeo.
Mas Foakes também era um muito bom estrategista que se encontrou em situações delicadas em suas
viagens pelo Oriente. Entendia melhor que ninguém a admiração sem limites que Selim III sentia pela forma
de vida ocidental e especialmente pelos títulos nobiliários.
― Não se verá obrigado a fazer uso dele ― Disse com deliberada indiferença ― Inclusive poderá
renunciar ao título quando voltar da Turquia, isso nos dá igual. Entretanto preferiríamos que não pusesse a
missão em perigo renunciando agora a ele.
Patrick, completamente relaxado, estava pensando.
Com as mãos unidas pelas pontas dos dedos, o ministro observava os dois irmãos. Era todo um
espetáculo ver esses atléticos gêmeos, com seus rostos idênticos e o rebelde cabelo com mechas prateadas.
Sentados em suas poltronas pareciam dois grandes gatos dormindo a sesta ao sol. Mas pensando bem,
mas bem semelhavam a dois tigres: perigosos e preparados para saltar em qualquer momento.
Quando Patrick por fim deu de ombros dando a entender que aceitava a ideia de ter um título, Breksby
sorriu.
― Necessitaremos uns seis meses para que seja oficial. Você deveria chegar a Constantinopla a tempo
para assistir à coroação. Os ourives terminaram o cetro em abril, de modo que não vejo nenhum problema
por essa parte.
― Não quero que se faça público ― Disse Patrick.
Entretanto os três sabiam que se transformasse em duque de Gisle, não se falaria de outra coisa em
Londres.
Prudentemente, o ministro não respondeu; levantou-se e rodeou a escrivaninha. Os dois irmãos se
levantaram também e Breksby lhe acompanhou à porta com um largo sorriso nos lábios.
― Posso ser o primeiro? “Sua Graça”…
Fez uma reverência enquanto sua absurda peruca caía de repente para a direita.
Patrick não explodiu até que estiveram fora.
― Pomposo imbecil! ― Estava-se divertindo como um louco ― Deveria deixar que enviasse os
príncipes reais a Turquia.
Alex sorriu.
― Isso não servirá comigo Patrick. Morre de vontade de assistir à coroação. Nunca rechaçaria uma
oportunidade para ir a Turquia.
Patrick lhe devolveu o sorriso.
― Tem razão, confesso. Quando estive em Lhasa ouvi falar muito de Selim.
Passou quatro anos viajando através do Tibet, a Índia e Pérsia.
― E bem? Como é?
― Terrivelmente esnobe. Naquela época estava visitando as capitais europeias e seu pai desesperava ao
lhe ver adotar os costumes ocidentais e levar toda classe de trajes modernos e mulheres a Constantinopla.
― Acredita realmente que é capaz de lançar seu exército seguindo Napoleão?
― É possível.
Estavam chegando às suas carruagens.
― Se dá conta, irmãozinho, que a partir de agora seu título é maior que o meu? ― Disse Alex.
Patrick pareceu desconcertado por um momento e depois seus olhos brilharam maliciosamente.
― É certo! Sou duque e você só é conde.
Alex se pôs a rir. Os dois irmãos sempre tinham considerado o título de conde como uma fonte de
problemas.
― Se tivesse sido duque faz um mês, ela teria aceitado casar comigo ― Continuou Patrick subitamente
sério.
Alex sabia de quem estava falando e negou com a cabeça.
― Lady Sophie York não é essa espécie de mulher Patrick.
Sophie era a melhor amiga de sua esposa e duvidava que se negasse a se comprometer com Patrick
porque este carecesse de título.
― Então como é que vai casar se com o Braddon? ― Perguntou Patrick irritado ― Braddon!
― Não pensei que te interessasse tanto o futuro de Sophie.
Patrick o ignorou.
― Braddon é gordo e estúpido e, além disso, tem muito menos dinheiro que eu. Mas é conde, um dos
membros respeitados da aristocracia.
― É injusto. Possivelmente o ama.
Patrick gargalhou.
― Amor! Nenhuma só mulher de nosso entorno acredita nessa tolice ― Exceto Charlotte
possivelmente.
Alex sorriu ao pensar em sua mulher, mas repetiu:
― Não acreditei que se preocupasse tanto do futuro de lady Sophie.
O outro elevou os ombros.
― Dá-me igual. Que faça o que dê vontade. Mas sou um mal perdedor e você sabe melhor que
ninguém. Enfurece-me pensar que fui derrotado porque Braddon tem um título e eu não.
Alex permaneceu em silêncio uns segundos. Que mais podia dizer? Depois de todo Sophie York
possivelmente tivesse realmente gana de ser condessa.
― Ira ao baile dos Dewland esta noite?
― Tinha esquecido ― Contestou Patrick ― Mas vou jantar com Braddon e certamente ele insistirá em ir
depois. Espero que não me peça que seja seu padrinho ― Acrescentou com uma careta.
― Tentarei ir ― Disse Alex dando uma palmada nas costas a seu irmão ― Espera a ver a cara das
casamenteiras quando souberem a notícia. Vai se transformar no partido mais desejado de Londres.
Patrick estremeceu.
― Razão para embarcar imediatamente para Gales!
Capítulo 3

Quando se anunciou a chegada de Sophie York no baile dos Dewland, um murmúrio percorreu o salão.
Em um canto as amarguradas solteironas diziam que Sophie era uma rebelde. Outras diziam que era a
mulher mais formosa da Inglaterra. Pequena mas voluptuosa. Coquete mas filha da aristocrata mais estirada
do país, a marquesa de Bradenbourg. Os ácidos comentários de Heloise tinham estragado a reputação de
mais de uma jovem; de modo que os comentários da marquesa faziam que a atitude de sua filha fosse motivo
de maior diversão.
Sophie se deteve no alto das escadas enquanto seu pai se internava entre as pessoas sem dúvida
procurando à encantada Dalinda. A marquesa o seguiu rígida com uma censura que não se atenuou com os
anos.
Percorreu o salão com o olhar convencendo a si mesma de que estava tentando ver o conde de Slaslow.
Mas no fundo sabia que se estava despertando nela sua debilidade e sua falta de moral como dizia sua mãe, já
que estava procurando um homem de costas tão largas que sempre parecia estar a desgosto vestido de forma
elegante, um homem com o cabelo negro e mechas prateadas. Não tinha visto Patrick desde que rejeitou sua
petição de matrimônio e não o via entre os numerosos convidados.
Sua mãe, ao pé das escadas, voltou-se irritada.
― Sophie! ― Grunhiu.
Sophie desceu docilmente e Heloise agarrou seu pulso.
― Deixa de dar espetáculo!
Os jovens cavalheiros já estavam se reunindo ao seu redor pedindo com olhadas implorantes que
concedesse uma dança. Heloise olhou ameaçadora antes de instalar-se no canto das matronas, onde só as
mulheres cujo título era equiparável a sua ferocidade, tinham direito a sentar.
Sophie, despreocupada, dividiu seu tempo entre todos seus admiradores, mas era uma estupidez porque
dentro de dois dias como muito, o Time ia publicar a seguinte notícia:
O conde de Slaslow anuncia suas próximas bodas com lady Sophie York, filha do marquês de Brandenbourg. A
cerimônia terá lugar na igreja de São Jorge e a apresentação oficial será na sala capitular da ordem da Liga, no palácio St
James.
Todo mundo se surpreenderia e se inteiraria de que a famosa herdeira já havia feito sua escolha. Em
fevereiro estaria casada com Braddon Chatwin “o conde amável” como o chamavam algumas vezes.
Braddon, em efeito, era amável, e seria um excelente companheiro. Sem dúvida amava mais a seus cavalos
que a qualquer ser humano, mas ao menos não apostava muito nas corridas. E parecia ser capaz de dar afeto,
o que era exatamente o que Sophie queria que tivesse sua união. Teriam formosos meninos, o que era
importante, e ele manteria a suas amantes de forma discreta. Sim, disse, dirigindo-se para a pista de dança
com seu primeiro par. Braddon era amável e não tinha defeitos importantes de modo que certamente seriam
felizes.
A noite avançava e nem seu prometido nem “alguém mais” tinham aparecido. Sophie dançava com sua
habitual graça e só os mais observadores entre os cavalheiros que a perseguiam notaram que não tinha sua
costumeira vivacidade. Um dandi foi secamente recusado quando declarou seu amor quando era famosa por
suas amáveis respostas. Dava a sensação de estaria andando sobre uma corda bamba. Deixou de procurar uns
cabelos escuros com fios prateados. Para que? Ia converter em condessa e não na esposa de Patrick Foakes.
No jantar esteve acompanhada pelo filho da anfitriã, Peter Dewland, um elegante e doce cavalheiro que
conhecia fazia anos. Era um alívio porque não tinha o aspecto de acreditar que a rainha de Londres ia cair
em seus braços se desejasse. De fato, nunca a tinha cortejado e isso estava bem.
― Como está seu irmão? ― Perguntou ela.
O irmão mais velho de Peter tinha sido gravemente ferido em um acidente de equitação e estava três
anos confinado no leito.
― Seu estado vai melhorando ― Falou Peter com um grande sorriso ― Agora está seguindo o
tratamento de um médico alemão que reside na Corte ouviu falar dele? Chama-se Trankelstein. Acreditei que
se tratava de um enganador mais suas massagens parecem estar dando resultado. Agora Quill pode sair do
quarto e sofre menos. Passa quase todo o dia no jardim porque não suporta estar encerrado.
Sophie sorriu de verdade pela primeira vez em toda a noite.
― Isso é maravilhoso Peter!
― Sim ― Continuou ele depois de uma ligeira dúvida― Posso apresentar lady Sophie. Está na biblioteca
e sei que gostaria de agradecer os foguetes que você contribuiu a organizar para ele.
― Eu não mereço nenhuma gratidão ― Exclamou ― Foi o conde de Sheffield que teve a ideia. Eu
simplesmente estava no Vauxhall essa noite.
O episódio se remontava a um ano atrás. Organizaram uns foguetes no jardim dos Dewland para o
Quill. Sophie, rodeada por seus admiradores havia se sentido feliz ao ver as brilhantes luzes iluminando o
céu.
Tinha olhado a sua queridíssima amiga Charlotte que estava ao lado do conde de Sheffield, o irmão
gêmeo de Patrick Foakes, e a tinha visto apoiar-se contra a protegida pela escuridão cúmplice da noite.
No dia seguinte Sophie tinha brincado por haver-se atrevido a estar tão perto de Alex, lhe deixando que
rodeasse a cintura com os braços e olhando com expressão apaixonada. Agora entendia melhor a atitude de
Charlotte.
Seu corpo se converteu em um estranho para ela, estava nervosa porque o outro gêmeo Foakes não
estava ali e sentia falta de uma intimidade logo que entrevista.
Sua mente a estava traindo.
Era algo humilhante e desalentador.
Deixou de castigar a si mesma e se levantou.
― Vamos ver seu irmão?
Peter afastou seu prato.
― Com muito prazer. Vou pedir a minha mãe que nos acompanhe.
Sophie assentiu, surpreendida por sua própria estupidez; certamente não era questão de que a vissem
afastar-se de novo acompanhada por um homem.
A viscondessa deixou um grupo de amigos para se dirigir com eles dois para a biblioteca. Nunca
poderia criticar a atitude de Sophie. A jovem tinha um bom coração, pensou.
Kitty Dewland tinha notado com um maternal sorriso, que seu querido Peter não parecia sentir-se
atraído por lady Sophie e que, salvo que estivesse equivocada, o qual ocorria poucas vezes; lady Sophie
parecia estar apaixonada por conde de Slaslow. Os rumores que tinha ouvido sobre um próximo enlace
confirmavam essa impressão. Suspirou extasiada ao recordar a maravilhosa noite que passou quando
anunciou seu próprio compromisso com Thurlow, reviveu o arrepio de prazer que percorreu seu corpo
quando passeou diante do resto das jovens cujo futuro não era tão seguro como o seu.
Afastou as lembranças e entrou na biblioteca para apresentar seu filho a lady Sophie.
Quill não era como Sophie tinha imaginado. Recordava vagamente ter visto a noite dos foguetes um
rosto muito pálido depois do cristal de uma janela, mas o que tinham diante estava bronzeado, muito mais
que o dos jovens cavalheiros que passavam as noites jogando e os dias passeando em carruagens fechadas.
Seus traços eram finos, um pouco marcados pela dor, mas era muito atraente e parecia muito inteligente.
Levantou com aparente facilidade para lhe beijar a mão, mas ela adivinhou, quando ele se deixou cair na
poltrona, que havia feito um grande esforço. Ela se sentou em seguida para não o incomodar, em um
pequeno tamborete ao lado da lareira.
Peter se aproximou da outra poltrona enquanto sua mãe se dirigia para o honorável Sylvester Bredbeck
quem estava ali procurando repouso para seu pé afligido de gota.
Quentin olhava Sophie sem a menor confusão.
― Você está passando bem lady Sophie? ― Perguntou arrastando um pouco a voz.
Ela ruborizou ligeiramente. Podia adivinhar uma sombra de sarcasmo em sua entonação e não se sentia
com humor para brincar. A realidade era que as respostas brilhantes que estavam de moda em seu ambiente,
pareciam de repente haver-se apagado de sua mente.
― Não especialmente ― Respondeu com franqueza.
― Hmm… Gostaria de descansar um pouco dessa necessária alegria e jogar uma partida de backgamon?
Sophie hesitou um momento. As damas não se dedicavam a jogar nos bailes, mas ela estava
acompanhada pela anfitriã em pessoa e precisava apaziguar um pouco seus nervos. Havia poucas
possibilidades de que Braddon e Patrick aparecessem na biblioteca, de modo que poderia desfrutar de um
breve descanso antes de voltar com outros convidados.
― Eu adoraria.
Peter ficou em pé de um salto para ir procurar uma mesinha de jogo. Sophie e Quill colocaram em
silêncio suas fichas enquanto as chamas da lareira formavam sombras dançantes sobre as paredes forradas de
madeira.
O jogo se desenvolveu depressa até que Sophie tirou pela segunda vez uma dupla nos jogo de dados.
Quill olhou a seu irmão com olhos brilhantes.
― Isto não foi uma boa ideia. Tem uma sorte incrível.
Sophie sorriu. Tirar duplas era uma de suas habilidades, o qual deixava louco antigamente ao seu avô
quando ela era pequena. Bebeu um gole de champanha. De repente se sentia melhor, a biblioteca era um
bom refúgio.
Voltou tirar duplas e riu enquanto Quill se queixava, depois riu a gargalhadas quando terminou a
partida com seis duplas.
Esse foi o momento que escolheram os dois homens que ela tinha estado procurando toda a noite para
entrar na biblioteca. Braddon acompanhado de seu amigo Patrick Foakes.
Braddon encantado foi ao seu encontro.
Mas Patrick se deteve na porta. O cabelo de Sophie brilhava em uma mistura de tons que iam do
vermelho até o dourado mais puro. Uns cachos escapavam de seu penteado parecia ser tão suaves como a
seda.
Esteve a ponto de virar sobre seus calcanhares. Sophie estava rindo e brilhavam seus olhos… Até que o
viu. Nesse momento seu sorriso desapareceu instantaneamente.
Braddon, depois de ter saudado o pequeno grupo, estava olhando com beatifica admiração a sua futura
esposa.
Patrick se dirigiu para a lareira; não ia perder o sangue-frio por culpa de uma coquete que se negou a
casar com ele para entregar-se a um homem que tinha um título. Tinha o que queria; estava comprometida
com o único conde solteiro que havia nessa temporada. E tendo em conta que só restava um duque solteiro;
o ancião Siskind que tinha oito filhos; Sophie tinha conseguido o prêmio gordo. A menos que Patrick se
convertesse em duque.
Seus olhares se encontraram e depois ela afastou os olhos tão vermelha como a taça de champanha que
tinha na mão. Braddon tinha ajoelhado no tapete e estava voltando a colocar as fichas em seu lugar contente
ao comprovar que sua prometida conhecia esse jogo. Sophie se esforçou para sorrir.
De sua poltrona de respaldo alto Quill tinha visto esticar-se à encantadora lady Sophie, voltou-se para
ver a causa dessa mudança.
Estendeu a mão dizendo um pouco sarcasticamente:
― Patrick, amigo, meu. Vêm me saudar.
― Quill!
Patrick esteve junto à poltrona com grande rapidez com seus olhos escuros brilhando de prazer.
― Acreditava que estava preso à cama.
― Assim era até faz uns meses.
― Tem um aspecto estupendo.
― Estou vivo ― Contestou simplesmente Quill.
Patrick se agachou diante dele.
― Lembrei-me de você quando estive na Índia e um marajá ameaçou decepar se não me ajoelhasse
diante seu ídolo. Recordou-me o tirano que foi no colégio.
Sophie não podia suportar mais. Agachado desse modo, Patrick estava a sua altura, justa ao seu lado.
Instintivamente admirou suas longas pernas cujos músculos se notavam através das estreitas calças, depois se
voltou, nervosa como um cervo e se afastou do tanto como permitia seu assento.
Patrick, que tinha descoberto que ela ainda tinha o poder de comovê-lo, estava começando a sentir-se
incômodo. Seu suave perfume excitava o olfato, uma fragrância inocente e ligeira como a da flor da cerejeira.
Seus sentidos estavam começando a arder. Tinha desejo de tomar Sophie nos ombros e levá-la a um
dormitório.
Levantou-se, sério, e baixou o olhar para ela.
― Ao seu serviço, lady Sophie ― Disse inclinando-se ― Me perdoe, não a tinha visto.
Ela avermelhou. É obvio que a tinha visto. Estava petrificada pelo olhar dele e se limitou a fazer um
gesto com a cabeça; era incapaz de emitir um só som.
Estava tão atraente como no mês anterior, salvo que a expressão de ternura tinha sido substituída por
uma cheia de ironia. Seus cabelos continuavam em desordem, como estava de moda em Londres, mas ele
devia ter cavalgado ao ar livre e não usava produtos cosméticos. Eram negros como o ébano e tinham umas
mechas prateadas como se a lua os tivesse acariciado.
Controlou-se dizendo que parecia uma mulher recém-saído do convento sob o olhar de um libertino. E
a viscondessa Dewland, embora continuasse falando com Sylvester Bredbeck, estava os olhando atentamente.
Sophie se levantou com graça e dirigiu um sincero sorriso a Quill. Este se levantou sua vez ajudando-se
com o braço da poltrona.
Fez uma reverência.
― Rogo que não se levante.
Era comovedor ver Quill com o rosto crispado pela dor.
― Eu adoraria voltar a vê-la, lady Sophie. Conceder-me-á você a revanche o dia que minha sorte
melhore?
― Com muito prazer.
― Voltou-se para Peter e deu de presente um brilhante sorriso. Depois olhou friamente a Patrick e logo
se dirigiu sossegadamente para Braddon.
― Milorde.
Braddon lhe ofereceu seu braço, ela o aceitou e atravessaram juntos a sala. Os delicados sapatos
prateados de Sophie pisaram nas flores escarlates do tapete persa. Ela era terrivelmente consciente dos
olhares dos dois homens que a seguiam. Quill, ainda de pé e Patrick, com um semi sorriso cínico que dava
desejo de atirar um vaso à sua cabeça.
Não olharei a esse infame sedutor, disse a si mesma. E conseguiu.
Patrick por sua parte a olhava afastar-se para anunciar seu compromisso com uma raiva que o
consumia. Teria gostado de atravessar a biblioteca, agarrá-la em seus braços e arrebata-la de Braddon.
Estava seguro de que só necessitaria um momento para que Sophie se transformasse na tremula mulher
que o tinha abraçado, essa mulher cuja emoção parecia ser tão real que, de não ter sabido era uma criatura
tão frívola tivesse podido… Tivesse podido o que?
Peter estava se desculpando para voltar para salão de baile, mas Patrick não fez gesto de segui-lo.
Deixou-se cair no tamborete abandonado por Sophie e brincou distraidamente com as fichas de backgamon.
Quando voltou a levantar os olhos, topou com o atento olhar de seu amigo.
Quentin sempre havia possuído um perfeito domínio de si mesmo, inclusive quando ambos estavam no
colégio. Nessa época Patrick se enfurecia frequentemente e se lançava sobre seu irmão para brigar, mas Quill
só expressava seu aborrecimento com algumas palavras bem dirigidas.
Apoiou-se no respaldo de sua poltrona de couro e fechou os olhos.
― Equivoco-me ou Braddon já te levantou uma de suas amantes, uma atriz ruiva? ― Perguntou sem a
menor malícia.
― Arabella Calhoun. O verão passado. Ainda é sua amante. Lady Sophie ― Acrescentou Patrick com
uma espécie de raiva ― Nunca foi uma de minhas amantes. Propus matrimônio a ela e me rejeitou.
Quill voltou a abrir os olhos.
― A você?
Sob o olhar divertido de seu amigo, Patrick relaxou um pouco e acabou por sorrir.
― Confesso que foi um duro golpe.
― Em efeito, com todas essas mulheres que o perseguem… Peter me mantém a par das fofocas. Das
bodas de seu irmão; faz já um ano? Parece ser que se transformaste no menino mimado da alta sociedade.
― Não.
― Foge com cuidado das jovens casadoiras. Na Índia ficou tão rico que é quase uma vulgaridade ―
Acrescentou maliciosamente Quill.
― Jogamos?
― Derrotado pela formosa Sophie York! Tenho que pedir a minha mãe que a convide para tomar chá.
― Vai estar muito ocupada em um futuro próximo ― Disse Patrick com indiferença ― Suponho que
neste momento devem estar recebendo as felicitações de todos.
― Tão longe chegou?
― Sim. Não é tola Quill; simplesmente procurava um título.
― Desgraçadamente Braddon é completamente estúpido. Cansará dele antes de um mês.
― Jogamos? ― Repetiu Patrick com impaciência.
― De acordo.
Depois das pesadas portas de carvalho a festa estava em seu apogeu, mas na biblioteca só se ouvia o
ruído do jogo de dados ao se chocar contra a madeira. Um busto de Shakespeare vigiava de acima as cabeças
inclinadas dos dois amigos.
Depois da terceira partida, Patrick rompeu o tranquilo ambiente. Dirigiu a seu amigo um cáustico
olhar.
― Devo ir dar parabéns ao feliz casal?
Quentin permaneceu imperturbável.
― Vou retirar-me, esgotou-me com seus problemas.
Levantou-se, apoiou-se um momento no alto respaldo de sua poltrona dizendo:
― Estou muito contente de que tenha retornado do Oriente, Patrick.
― E eu sinto muito o desse condenado cavalo.
Quill sorriu.
― Certamente não monto muito bem. Espero voltar a vê-lo logo.
Os dois homens abandonaram a biblioteca juntos, um cheio de força e agilidade e o outro com os
músculos duros que se negavam obedecer as suas ordens.
Quill atravessou o corredor para o refúgio de seu dormitório enquanto que Patrick ia em direção
contrária para uma mulher inalcançável.
Capítulo 4

Os lacaios estavam de pé a ambos os lados da entrada de mármore quando Patrick desceu da biblioteca.
A mansão estava ficando vazio de convidados quando uma hora antes tinha estado cheia com o rumor das
conversas, o ruído dos sapatos no parquet e o som dos instrumentos de música.
No salão de baile, as velas dos spots ainda ardiam, mas as do candelabro central estavam quase
apagadas. A imensa sala parecia uma caverna com alguns grupos aqui e lá que estavam esperando que
amanhecesse aqueles que consideravam que uma festa era um fracasso voltavam para suas casas antes das seis
da manhã.
Certamente, ela já se foi. Lady Sophie York nunca estava entre os noctâmbulos; não estava na moda. O
correto era ir antes que aparecessem os primeiros bocejos, antes que os mais atrasados estivessem muito
bêbados. Mas Braddon… Braddon nunca tinha sabido quando era apropriado despedir-se, o pobre estúpido.
Patrick não custou o encontrar, derrubado em uma poltrona gesticulando enquanto falava com alguém
a quem Patrick não podia ver. Certamente estariam falando de cavalos, pensou Patrick com uma onda de
simpatia para seu amigo. O querido Braddon. Era uma pena que a Inglaterra fosse tão pequena e que as
mulheres tivessem que escolher entre homens que se conheciam dos seis ou sete anos, nos corredores do
colégio.
Apressou o passo quando por fim pôde ver o interlocutor do Braddon.
― Alex!
O nome ressoou na quase deserta habitação.
Seu gêmeo o recebeu com um sorriso.
― Estava te esperando. Um chateio, Braddon se lançou a uma de seus divagações cujo segredo só ele
conhece.
Patrick sentou ao lado de seu irmão, subitamente tranquilizado. Inclinado para frente, Braddon
brilhavam os olhos e o queixo tremia de excitação.
― Não são invisíveis, Patrick, é a realidade. Por fim minha vida esta completa e cheia.
Sorriu e cruzou as mãos sobre seu colete bordado.
― Felicidades ― Disse brandamente Patrick.
Braddon não pareceu notar a ameaça que havia na voz de seu amigo e continuou entusiasmado:
― Deus, é magnífica! Os mais formosos quadris que jamais vi e seus seios… São como… Como…
Faltavam as palavras e certamente não era a primeira vez que acontecia.
― São formosos e enormes para alguém de sua estatura.
Patrick tinha suores frios e fechou os punhos. Estava a ponto de golpear a esse caipira.
― Encontrei-a no estábulo ― Continuava dizendo Braddon sem reparar em sua expressão assassina ―
Encurralei contra a porta, belisquei-a um pouco e… Deus! Nunca tinha experimentado…
Cortou o fôlego já que uma mão de ferro o tinha agarrado pela gravata e estava estrangulando. Calou-
se com a boca ainda aberta sem fazer um só movimento de defesa.
Patrick se deu conta de repente de que não tinha nenhum direito de castigar a um homem por tocar a
sua futura esposa. Soltou Braddon e as molas da poltrona protestaram ruidosamente sob os cem
quilogramas de peso deste.
Fez-se o silêncio na imensa sala. Os poucos convidados que ficavam foram alertados pelo ruído da
poltrona e estavam espectadores como cães cheirando uma presa. Suspeitavam que algo estivesse
acontecendo.
― Braddon estava falando de sua nova amante ― Disse Alex com voz alta e clara.
Braddon parecia estar completamente desorientado.
― Acreditava que não se importava com Arabella, Patrick disse em tom de queixa Devia ter me dito
antes que se preocupava com ela.
Patrick voltou a sentar e se obrigou a relaxar-se.
― Da próxima vez pergunta ― grunhiu.
O pequeno grupo do outro extremo do salão fez um círculo para comentar o que tinham visto. Todo
mundo conhecia a antiga amante de Patrick Foakes, a atriz Arabella Calhoun e sabiam que agora estava sob a
proteção do conde de Slaslow. Era interessante, mas ninguém pensava que isso pudesse incomodar Patrick
Foakes absolutamente.
Inclusive se dizia que Foakes tinha pago o alojamento de seis meses da mulher e enviado depois uma
cópia da fatura a Slaslow com umas palavras o felicitando. Mas como a disputa parecia ter terminado, os
últimos convidados começaram a dirigir-se para a porta para ir beber outra taça antes de deitar-se.
Braddon estava muito surpreso pelo insistente olhar de Patrick que não lhe tirava os olhos de cima.
― Bom amigo ― Se defendeu um pouco indignado ― Faz um ano que a mantenho, não pode ter
acreditado que ficaria com ela para sempre. Dava uma pensão para seis meses e enviei um colar de
esmeraldas. Que mais quer Patrick? O que me case com ela?
Patrick abriu a boca e a voltou a fechar. Foi Alex quem, tranquilamente, tomou a palavra.
― Eu gostaria que me falasse da tal Madeleine. Onde a conheceu?
O olhar desconfiado de Braddon ia de um gêmeo a outro.
― Não conhece Madeleine não é? É minha e somente minha Foakes!
Patrick sorriu ironicamente.
― Já compartilhamos mulheres, muitas mulheres Braddon não te parece?
― Arabella era uma coisa, mas Madeleine é algo diferente. É somente minha e para sempre.
― Curioso ― Fez notar Alex.
Braddon se voltou para ele, agressivo como um cão vigiando seu osso.
― Nada disso! Meu próprio pai manteve a sua amante durante trinta e seis anos, sei por que ainda pago
suas faturas. E não me importa já que ela é bastante amável. E, além disso, era formosa, ao contrário de
minha mãe. Às vezes vou tomar o chá com ela e falamos de meu pai.
― Mas sua mulher, sua futura esposa, é muito formosa ― Objetou Alex.
― Não é o mesmo.
Braddon falava completamente a sério. Estava tentando explicar o que tinha pensado desde que seu pai
lhe apresentou à senhora Burns. O anterior conde de Slaslow exigiu que tratasse com o maior respeito a essa
mulher e olhou enfurecido quando não saudou o bastante rápido a sua amante. Então Braddon havia feito
uma reverência como se estivesse em presença do rei Jorge.
Logo tinham sentado os três para tomar o chá e tinha admirado a luxuosa decoração e os jardins que se
viam através das portas janelas. Ao fim viu, em cima do piano, a foto de um menino pequeno… Seu meio-
irmão. O menino tinha morrido aos sete anos, disse a senhora Burns. Depois desta confissão, o conde se
aproximou dela e tinha posto as mãos sobre os ombros.
Braddon compreendeu, sem experimentar nenhum rancor, que seu pai tinha querido a esse filho, mas
que ele e a suas irmãs, e que amava à senhora Burns e não a sua esposa.
Tinha pensado muito; coisa que não estava acostumado a fazer; e tinha chegado à conclusão de que a
relação que seu pai tinha com a senhora Burns era exatamente o que queria para si mesmo.
De modo que quando seu pai estava agonizando, fez sair a todo mundo do quarto e fez passar em
segredo à senhora Burns. Antes de abandonar ele também o dormitório, olhou-a, sentada na cama, inclinada
sobre o moribundo e este, que desde por volta de dias não tinha pronunciado uma só palavra, murmurou:
“meu amor”. Morreu essa mesma noite sem dizer nada, mas Braddon tomou uma decisão.
Certamente se casaria como desejava a bruxa de sua mãe e teria filhos. Até esse momento tinha feito
três propostas de matrimônio e só a última dela tinha coalhado. De modo que esse aspecto de sua vida já
estava arrumado. Mas agora queria uma senhora Burns, uma senhora Burns para ele sozinho.
E milagrosamente acabava de encontrá-la.
― Chama-se Madeleine. Senhorita Madeleine Garnier ― Disse à defensiva se por acaso Patrick já tinha
tentado seduzi-la ― Conhece-a?
Patrick parecia estar divertido agora, e Braddon se tranquilizou.
― Nunca tinha ouvido falar dela. Não tenho nada haver com ela, palavra de honra.
Em qualquer caso, não com Madeleine, acrescentou para si, coisa que Alex adivinhou sem necessidade
que dissesse. O problema com os gêmeos era que não podiam esconder nada um do outro.
Patrick esclareceu garganta.
― Conhece essa Madeleine há muito tempo?
Braddon franziu os lábios
― Senhorita Garnier, por favor, ― Corrigiu ― Não, conheci-a recentemente. É justamente o que estava
comentando com Alex quando você chegou. Coisas do destino. Por fim encontrei uma esposa apropriada
com o qual minha mãe está no sétimo céu, e a minha Madeleine. Eu gosto da ideia de me casar com Sophie
York. Tem caráter. Possivelmente consiga afastar a minha mãe. Brigaram e minha mãe se negará a voltar a
pôr os pés em minha casa.
Estava feliz.
― Mas terá que se acostumar a sua mãe ― Ironizou Patrick.
Caía bastante bem a temível marquesa de Brandenbourg, mas ia aterrorizar ao pobre Braddon.
Este estremeceu.
― Não estarei ali muito frequentemente. Estou pensando em comprar uma casa para Madeleine em
Mayfair. O que você acha?
Patrick sentiu que de novo se apoderava dele a cólera.
― Não pode fazer algo assim! ― Ladrou ― Sua casa é em Mayfair. Melhor seria pôr à senhorita Garnier
no Shoreditch.
― Não! ― Respondeu Braddon apertando os dentes ― Não me envergonho dela.
― Não se trata disso ― Interveio Alex ― Não quererá ferir sua esposa. Quando lady Sophie for sua
mulher pode chegar a encontrar-se com Madeleine.
― Por isso escolhi Sophie York ― Declarou Braddon triunfante ― Ela sabe como são as coisas e não se
incomodará. A verdade é que quero apresentar as duas depois de um tempo.
Patrick não entendia nada. A única explicação possível é que seu amigo tinha perdido a cabeça. O que
outra razão havia para que quisesse uma amante tendo Sophie?
E que seria de Sophie quando o idiota de seu marido passeasse pela cidade com sua amante? Sentiu um
tombo no coração.
― Ultimamente cheguei a conhecer bem Sophie York ― Disse Alex ― É a melhor amiga de minha
mulher e eu não diria que é uma mulher que saiba nada disso, de fato é especialmente ingênua para ter sido
apresentada em sociedade faz dois anos.
― Ora! ― Disse Braddon impaciente ― Com certeza ouviu o que dizem dela. Maldição, se parecer que
a beijaram todos os homens de Londres! O certo é que dá no mesmo para mim. Mas embora fosse ingênua,
sabe muito bem como é o matrimônio; tem o exemplo de seu pai diante de seus narizes; e além não penso
me comportar como ele. Minha Madeleine não terá vontade de sair, não é seu estilo, de modo que não
dançarei com minha amante diante de minha mulher e de nossos amigos. Vejo mas bem uma tranquila vida
de família. Procurarei não ferir Sophie e não ser muito exigente. Eu farei minha vida assim que tenhamos um
herdeiro e seremos bons amigos. Depois de tudo às mulheres não gosta de muito que seu corpo se disforme
por sucessivas gravidezes. Com um pouco de sorte teremos gêmeos a primeira e depois já não teremos que
voltar a nos preocupar com o assunto. Não te parece que é um plano genial Patrick?
Este, assombrado, absteve-se de fazer comentários.
Braddon fez uma careta.
― É como o cão de hortelano Patrick. Como o cão de hortelano! Cansou-se da Arabella. Maldição! Foi
deixando-a em minha casa sem se despedir sequer. E voltou seis dias depois. Seis condenados dias! O que
queria? E, além disso, se então não se preocupava por que te incomoda agora que a eu deixe?
― Por que demônios teria que me importar? ― Fulminou-o Patrick ― Não tem nada haver com a
Arabella!
Braddon ficou em pé de um salto e deu uns passos nervosos.
― Então porque está zangado comigo? Que mais te dá se tomo uma amante posto que não conhece
Madeleine?
Patrick entrecerrou os olhos.
― Preocupo-me com o modo em que trata Sophie York ― Disse escolhendo cuidadosamente as
palavras.
― Verdadeiramente é o cão de hortelano! ― Explodiu Braddon ― Sei que não pediu sua mão. Ouvi
dizer que a tinha beijado e que depois não pareceu o bastante boa para você. Bem, pois eu não compartilho
seu ponto de vista, Patrick Foakes. Sophie é o bastante boa para mim.
Inclusive o rosto de Braddon podia expressar dignidade quando lhe provocava, pensou Alex divertido.
Patrick se levantou de repente.
― Estúpido idiota! ― Gritou ― Pedi sua mão! Pedi!
Fez-se um silêncio durante o qual Braddon mordeu o lábio inferior, incrementando assim seu parecido
com um buldogue.
― Ofereceu matrimônio? Você? E ela te rejeitou?
Patrick voltou a sentar-se com um suspiro. Como podia continuar zangado com um cretino como esse?
― Exatamente. Fui a sua casa no dia seguinte às dez da manhã depois de ter bebido uma taça de brandy
para que me desse coragem. Arrumei o assunto com seu pai, mas com ela não funcionou.
Sentiu uma onda de ternura ao recordar os enormes e indecisos olhos de Sophie. Ela não tinha
esperado sua visita, evidentemente; o qual dizia muito a favor do Patrick. Mas estava ali declarando suas
intenções, e o rechaçou. Realmente não queria saber por que razão o fez.
― Não posso acreditar! ― Murmurou Braddon ainda surpreendido ― Eu, Braddon Chatwin, roubei
uma mulher de um dos irmãos Foakes. Arabella não conta suponho ― Acrescentou antes de olhar ao Alex ―
Recorda quando voltou da Itália e te falei da mulher mais formosa de Londres com a qual queria me casar?
Duas semanas depois estava comprometido com ela.
Alex explodiu em gargalhadas.
― Minha esposa, efetivamente. Devo isso tudo Braddon ― Disse ironicamente.
― Sophie York recusa Patrick e aceita casar-se comigo? ― Repetia Braddon alucinado.
Um pouco mais e se pôs a dar saltos de alegria. Patrick levantou os olhos ao céu.
― Senhores ― Disse Alex ― Por mais apaixonante que seja esta conversa, já é hora de que eu volte para
minha casa.
― Para que não briguem? ― Zombou Patrick.
Alex lhe respondeu com um sorriso.
― Charlotte se preocupa se voltar tarde e Sarah às vezes ainda tem que mamar pelas noites.
― Puaj! ― Interveio Braddon ― Não entendo como consente que sua mulher ela mesma alimente a sua
filha Alex. É repugnante.
Franziu o cenho, sinal seguro de que estava pensando.
― Nunca permitirei que minha Madeleine faça algo assim, garanto isso. Não quero que se converta em
uma vaca leiteira.
― Prefiro não me dar por informado de que acaba de chamar a minha esposa de vaca leiteira ―
Murmurou Alex cruzando um olhar com o Patrick ― Verei-te no jantar de amanhã?
― É obvio! ― Cortou Braddon ― É meu padrinho de modo que tem que assistir ao jantar de
compromisso.
Patrick deu de ombros.
― Por que não? Tenho vontade de ver minha sobrinha criada aos seios de sua mãe.
― Puaj! ― Repetiu Braddon ― Espero que Sophie não queira alimentar a seus filhos. Não permitirei.
Não em minha casa. É asqueroso!
Alex lançou um olhar de advertência ao seu gêmeo.
Patrick estava fervendo de ira, mas seguiu o conselho silencioso de seu irmão. O modo em que
Braddon pensava tratar a sua mulher não era coisa dele.
― Bem ― Declarou este alegremente puxando para baixo seu colete ― Você gostaria de saudar a
Arabella um dia destes Patrick? Agora esta atuando em ao Duke´s Theater e estou seguro de que adoraria te
ver outra vez. Faz da Julieta. É um bom papel para ela não? Embora seja incapaz de morrer de amor. Sabe
que quando rompi com ela me enviou uma indiferente nota onde dizia que eu era sua vida e sua alegria ou
um pouco igualmente estúpido e que já que minha paixão por ela se apagou, ela tinha uma grande
necessidade de segurança? Conclusão: queria que comprasse uma casa para ela.
Patrick ia andando diante dele.
― Fará? ― Disse por cima do ombro.
Houve um silêncio e Patrick o olhou divertido.
― É uma boa presa não?
Caminhou mais devagar para que seu amigo o alcançasse.
― Me avise quando tiver encontrado uma casa que goste. Compartilharei o gasto contigo.
Seus passos ressonavam no silêncio. O visconde e a viscondessa se retiraram e só ficava um lacaio de
olhos cansados para lhes desejar boa noite.
― Posso pagá-la sozinho ― Contestou Braddon.
― Sei, mas eu gostaria de colaborar de todas as formas.
Braddon lhe olhou com curiosidade.
― De modo que é certo que voltou da Índia rico como um nabab.
Patrick afastou o cabelo da cara com um movimento da cabeça.
― Meu pai enviou ao Oriente sozinho, e sem meu irmão já não sentia vontade de fazê-lo de tolo, de
modo que aconteceu de forma natural.
Isso era certo. Agarrou o gosto ao tranquilo ritmo das negociações com os hindus.
Encontrar boas rotas, conseguir peças raras, vigiar o carregamento de jaulas de pássaros, de sedas tão
finas que se rasgavam ao menor arranhão, caixas de plumas de perus reais. Tudo isto lhe tinha gostado de
muito. Correu alguns riscos, mas foi amplamente recompensado. De fato sua fortuna só era comparável a de
alguns privilegiados entre os que se encontrava seu irmão. Os cavalheiros como Braddon cujos lucros
financeiros se limitavam a criar cavalos de corridas, eram uma raça em vias de extinção.
Alex subiu a sua carruagem. Patrick renunciou a sua ideia de dar uma volta até a entrada de atores do
Duke´s Theater e ao final se despediu de seu carro. Permaneceu na deserta rua vendo como este se afastava.
Começou a cair uma fina chuva, o ar cheirava a pó e a excremento de cavalo; fechou-se bem a capa e
caminhou dando passo longos pela calçada. Andar lhe relaxava e o nó que tinha no estômago desapareceu.
Patrick tinha passeado pelas cansativas ruelas de Cantão e sob as arcadas de Bagdá. Tinha descansado
em povos de montanha no Tibet. Um dia, em uma rua de Lhassa, ouviu um coro de bengalis, uns pequenos
pássaros que logo trouxe para a Inglaterra e que se converteram em moda em Londres.
Continuava sem precisar dormir muito e frequentemente as ideias ocorriam enquanto andava. Mas
agora, em vez de pensar, via-o todo negro. Só recordando a suave curva do seio de Sophie York sentia que
se esticava de desejo. Continuou andando tentando afasta-la de sua mente.
Maldição! Ele tinha uma amante na Arábia como se chamava? Perliss. Até que um pachá se enamorou
dela e ela dele. Em poucas horas se transformou em uma esposa respeitada; a vigésima quarta ou a vigésima
quinta. Isso não a incomodou, nem sequer quando em um primeiro momento sentiu falta dos talentos e as
longas pernas de Perliss.
Mas Sophie simplesmente a tinha beijado. E uma só vez antes a tinha abraçado, mas isso foi quando sua
cunhada se debatia entre a vida e a morte no quarto continuo. Essa noite, ele se emocionou embora ela não
se desse conta. Chorava com todas suas forças pela sorte de sua amiga, e Charlotte sobreviveu.
Patrick tomou com calma. Sophie voltou com sua família um dia depois do nascimento do filho de
Charlotte. Como sedutor convencido, não a seguiu preferindo esperar a que a nobreza começasse a voltar
para Londres no fim de novembro.
Mas então, quando ele transformou à Bela Adormecida em uma sensual criatura que se aconchegava em
seus braços, o tinha rejeitado. Não é que ele tivesse realmente gana de casar-se, é obvio, mas em vista das
circunstâncias…
Passaram as semanas e não tinha conhecido a nenhuma outra mulher depois de sua fracassada oferta de
matrimônio. Não deixava de pensar em Sophie York. disse que só se tratava de frustração sexual. Se tivesse
um pingo de sentido comum se dirigiria ao Duke´s Theater para ver se Arabella aceitava passar umas horas
em sua cama em lembrança dos bons velhos tempos.
Mas suas pernas não o obedeciam e o levavam diretamente para sua casa. Demônios se deixava que
Sophie se casasse com Braddon! Teve uma odiosa visão: Braddon tirava o colete bordado e se preparava para
cumprir com seu dever conjugal. Só até que tivesse um filho.
O que ia fazer Sophie depois? Se transformaria em uma dessas damas desiludidas que escolhia seus
amantes entre os maridos de suas amigas ou se deitavam com o jardineiro.
Ao fim chegou a sua casa, mas o passeio não tinha operado sua magia desta vez. Ainda tinha um nó na
garganta e os punhos apertados.
A noite do compromisso…
Subiu lentamente os degraus do alpendre, passou por diante do mordomo que se precipitou
imediatamente depois à zona dos criados para meter-se na cama. Patrick entrou em seu quarto e se despediu
de seu ajudante de câmara.
O jantar que celebrava Charlotte em honra de Sophie.
Falarei com ela ― Pensou.
Falar? Seria melhor dizer que tinha desejo de acariciar os botões rosados de seus voluptuosos seios e
apertá-la contra ele em um sensual contato de delicadas curvas e um musculoso corpo que estavam feitos um
para o outro.
Terei-a, disse-se. Terei-a e ponto.
Essa noite lorde Breksby foi se deitar muito contente consigo mesmo. Cruzou os braços por cima de
sua cabeça coberta com um gorro.
― Já vê querida ― Anunciou a sua adormecida mulher ― Às vezes acredito que sou um gênio.
Lady Breksby respondeu com um grunhido de modo que ele decidiu dormir. Ele sonhou com cetros
com rubis incrustados e ela com roseiras trepadoras.
Patrick sonhou que dançava com Sophie levando uma insígnia de duque.
Sophie sonhou que beijava seu futuro marido, Braddon Chatwin que de repente se transformava em
coelho e se afastava dando saltos. Ela se sentiu mais bem aliviada.
Alex não sonhou. Estavam saindo os dentes de Sarah e passou a metade da noite chorando.
― Temos que nos felicitar porque tenha bons pulmões ― Disse sua esposa às três da manhã.
Alex suspirou e voltou uma vez mais ao quarto da menina.
Se o conde de Sheffield sonhou acordado que embarcava em companhia de seu irmão com destino ao
Império Turco, afastando-se da empapada criatura que tinha nos braços, quem tivesse podido reprova-lo.
Capítulo 5

Sophie, banhada, maquiada e penteada, dirigia-se à festa de seu compromisso. Estava sozinha; a
carruagem a deixaria no Sheffield House uma hora antes que chegassem os convidados para que pudesse
conversar um momento com Charlotte. Afundou-se nas cômodas almofadas de veludo cor salmão.
Sua mãe, a marquesa, sempre se sentava na beira do assento com as costas retas como se tivesse
engolido uma vassoura e se agarrava ao cabo, em troca Sophie adorava apoiar as costas no respaldo.
Sentia-se deliciosamente sensual e tinha o coração leve e tudo pela absurda razão de que Patrick Foakes
estaria presente no jantar. Veria e possivelmente, mas tarde poderia dançar com ele. Desejava-o com toda sua
alma, desse modo ele poderia e quereria abraçá-la.
A carruagem cabeceava sobre o pavimento e virou bruscamente. Sophie se segurou no cabo pensando
que era uma desgraça ser tão baixa já que não podia alavancar-se em um canto como faziam os homens, e
André conduzia muito depressa.
Tinha posto um vestido de um tom bege dourado aproximando-o mais possível ao branco que sua mãe
insistia em que usasse. A cor branca era o que usavam quase todas as jovens casadoiras de Londres. Branco
como símbolo de inocência, compromisso e virgindade. Exasperada começou a dar leves golpes com o pé.
O ouro não era muito virginal. Como se titulava a obra que tinha visto na semana anterior? Eros
vencido? Não, não era isso. Cupido derrotado? Não, era Eros, não Cupido. Cupido era o deus do amor e
Eros o do desejo. Em qualquer caso, Eros usava uma toga curta de cor ouro pálido quando atravessou o
cenário apontando às pessoas com suas douradas flechas. A obra era muito mau, uma dessas tragédias nas
quais uma piedosa jovem se apaixona por um libertino por culpa de Eros. Ao final ela acabava atirando-se,
de maneira muito pouco convincente segundo Sophie, do alto de uma ponte.
Isso era o que necessitava, disse. Um pequeno deus vestido com uma túnica que fizesse jogo com seu
vestido colocando uma flecha no coração de Patrick Foakes. Embora… Agora que pensava, isso é o que o
deus havia feito com o libertino da obra. E, entretanto o homem abandonou à heroína e a seu filho.
Sophie sorriu; seu temor não era que Patrick não a desejasse isso ela podia vê-lo nos olhos dele que se
obscureciam assim que a via. De modo que não necessitava de Eros, a sim ao Cupido. Isso era Cupido
usando uma túnica de um branco virginal atravessando Patrick Foakes com uma de suas flechas. Porque uma
coisa era segura: os libertinos nunca se apaixonavam e quando o faziam era por pouco tempo.
Respirou profundamente. O sonho de que Patrick se apaixonasse por ela era inalcançável. Fosse o que
fosse que o esperava dela, não era o matrimônio. Veria essa noite, certo, mas seria com motivo de seu
compromisso com outro homem.
Apesar de tudo em seu interior cantava de alegria. Inclusive seus cabelos, que lhe caíam livremente
pelas costas em elaborados cachos, sonhava com as carícias de Patrick.
A limusine se deteve bruscamente diante da mansão dos Sheffield, os cavalos se encabritaram dando
coices no ar com os cascos antes de apoiá-los de novo no chão com um tinido de arnês.
― Será melhor que o senhor não te veja jogar desse modo com os cavalos André ― Advertiu o lacaio
que estava ao lado do chofer.
Saltou ao chão para abrir a porta do habitáculo. Todos sabiam que ela não se queixaria nunca por ter
tido uma viagem tão movimentada, mas a marquesa era muito severa quando queria.
Entretanto Sophie estava um pouco dolorida já que um de seus ombros tinham se chocado contra as
paredes do carro e tinha saído despedida contra o assento de em frente. Aceitou a ajuda do criado para sair
do veículo.
― Philippe ― Disse ― Quer por favor dizer ao André que tenho a sensação de ser uma jarra de creme
batida para transformá-la em manteiga?
Philippe dissimulou um sorriso.
― Certamente milady, transmitirei a mensagem.
Ela subiu rapidamente as escadas de mármore de Sheffield House e se deteve para sorrir ao mordomo
que lhe abriu a porta.
― Como está você McDougal?
― Lady Sophie, você está especialmente formosa esta noite.
Entregou seu casaco de veludo e o olhou interrogadoramente.
― Poderá encontrar à condessa em seus aposentos ― Informou ele.
Olhou-a enquanto desaparecia pela escada, era uma jovenzinha muito gentil, pensou; miúda e frágil
como uma fada, mas com um sorriso que podia dar calor à lua.
Quando Sophie irrompeu nos aposentos de Charlotte, esta estava sentada diante a penteadeira e se
voltou com um sorriso.
― Sophie! ― Foi muito amável vindo antes.
― Não se levante querida ― Disse Sophie depositando um beijo na bochecha de sua amiga ― Vejo que
Marie esta fazendo um penteado complicado.
A donzela estava fazendo um recolhido composto de tranças, fitas e flores.
― Boa noite Marie ― Disse amavelmente Sophie.
― Meu Deus! ― Exclamou a donzela ― Seu vestido!
O vestido do Sophie se enrugou na acidentada viagem. Marie foi chamar a criada.
― Agora mesmo nos ocuparemos disso lady Sophie ― Disse ― Tome ― Acrescentou entregando um
robe de seda ― Ponha isto por enquanto.
Ajudou-a tirar o vestido e depois Sophie colocou o robe subindo as mangas antes de sentar-se na beira
da cama.
― Como estão as meninas Charlotte?
― Muito bem, exceto Pippa decidiu que todo mundo tem que obedecê-la. É uma déspota em potência.
― Sempre foi ― Replicou Sophie rindo ― Lembra-se de como espantava a todas as babás uma atrás de
outra, e só tinha um ano. Quantos anos tem agora? Dois três? Espera até que tenha dezesseis!
― Não se engane Charlotte.
― Olhe Charlotte; é uma gigante comparada comigo.
As mangas do robe não queriam ficar subidas e tampavam as mãos de Sophie.
Charlotte fez uma careta.
― É certo, quando passeamos juntas me sinto gigantesca. Uma verdadeira girafa.
― Não! Você parece uma princesa e eu seu pajé ― Retificou Sophie com os olhos brilhando divertidos.
― Bravo! Já volta a ser você mesma! ― Exclamou Charlotte.
― A que se refere?
― Parece feliz de novo. Estas últimas semanas parecia muito triste, como quando alguém toma uma
difícil decisão e depois se pergunta se fez bem.
― Não anda com rodeios! ― Disse Sophie encontrando o olhar de sua amiga no espelho.
Charlotte deu a volta no tamborete sem preocupar-se por Marie que resmungou algo enquanto recolhia
as forquilhas que caíram sobre o tapete.
― Esta segura Sophie? Completamente segura?
Sophie assentiu enfrentando seu olhar sem vacilar. Charlotte continuou:
― Por que… Bom, Braddon é encantador certamente, mas não é muito…
― Bonito? Interessante? Inteligente? ― Sugeriu Sophie com uma pequena careta.
― Como pode se casar com ele? ― Explodiu sua amiga ― Não entende que é melhor casar-se com
alguém atraente ou inteligente?
― Não quero me casar com seu cunhado Charlotte ― Explicou pacientemente Sophie ― Reconhece
que eu sou a única que sei o que é melhor para mim. Me nego a me casar com um libertino.
― Mas Braddon é um libertino! Lembra que um dia me disse que tinha mais amantes que clientes um
advogado.
Os olhos de Sophie brilharam divertidos.
― Dá-me igual quantas amantes tenha. Eu gosto, é confiável, não é sentimental e será discreto em suas
aventuras extraconjugais. Ele mesmo me prometeu isso.
― Quer dizer que falou de suas amantes.
Charlotte estava fascinada e horrorizada de uma vez.
― Foi ele quem tirou o tema e confesso que me surpreendi um pouco. Mas nossa união será tranquila,
razoável e amistosa. Quero tranquilidade. Isso não é o que você queria por isso Alex e você são felizes
juntos. Eu desejo um matrimônio onde nenhum dos dois membros do casal esteja cego pela paixão. Recorda
como se comportou Alex contigo?
Hesitou um momento antes de acrescentar:
― Quando te viu obrigada a ir a “Escócia”.
― Não é necessário ser tão sutil ― Disse Charlotte com ironia ― De acordo, Alex se comportou como
um monstro. Mas isso já passou e agora…
Charlotte se olhou no espelho enquanto Marie trançava uma fita em seu cabelo. Pensar em seu marido
para que se ruborizasse.
― Sei ao que se refere ― Continuou Sophie com uma curiosa mistura de indiferença e desespero na voz
― Mas amor com letras maiúsculas não se fez para mim. Você gostaria que eu fosse tão feliz como você, mas
cada qual encontra a felicidade onde pode. Para mim, me casar com um homem sentindo pelo a mesma
paixão que você sente pelo Alex, não me parece indispensável. Seus pais são felizes, mas os meus não.
Impediu que Charlotte interviesse dizendo rapidamente:
― Não queria ser indiscreta ao me referir ao matrimônio de seus pais, mas todo mundo sabe o que
acontece entre os meus. Não há um só mês no que meu pai não apareça no Morning Post com um
pseudônimo ou outro. Minha mãe não contrata uma só francesa que tenha menos de setenta anos. Isso
significa que despedimos mais criadas das que sua mãe empregou em toda sua vida.
Charlotte suspirou. A lógica de sua amiga era incontestável, mas de todos os modos estava equivocada.
― Não sei que têm haver seus pais com que escolha entre Braddon ou Patrick.
― Eu gosto de Braddon ― Repetiu Sophie ― Nunca me apaixonarei por ele de modo que não me
transformarei em uma mulher amargurada como minha mãe embora se preocupe mais por suas amantes que
por mim. Com o Patrick… Seria diferente.
― Sabe que vai estar aqui esta noite?
Sophie levantou a cabeça com rapidez. Até esse momento tinha estado contemplando seus sapatos
dourados movendo nervosamente o pé.
― Sim.
No mais profundo de seus olhos Charlotte distinguiu uma dolorosa confusão que lhe arrancou um
sorriso. Possivelmente as formosas teorias de Sophie não tivessem importância. Se encontrasse a maneira de
lançá-los ao um nos braços do outro esta noite…
Bateram na porta e entrou uma criada sustentando entre seus braços o vestido dourado como se
estivesse fazendo uma oferenda a uma deusa pagã.
― Milady…
Fez uma torpe reverencia.
― Deus meu Bess! ― Interveio Marie com a autoridade de um membro respeitado do pessoal, justo por
debaixo do mordomo e do ajudante de câmara do conde ― Tem que aprender a fazer melhor as reverências
se quer se transformar em donzela. Vamos vá!
Bess não a fez repetir duas vezes.
― Venha lady Sophie.
A aludida se levantou e Marie começou umedecendo rapidamente sua fina regata para que pegasse às
pernas, depois passou o vestido pela cabeça com cuidado para não danificar o penteado.
A seda sussurrou enquanto caía brandamente ao redor de seu corpo. Cheirava a flor-de-laranja e ao
calor da prancha.
― Perfeito! ― Exclamou Marie satisfeita depois de abotoar os botões das costas ― Se me conceder um
minuto enquanto termino de pentear a minha senhora, me ocuparei de pôr em ordem seus cachos.
― Que vestido mais bonito! ― Comentou Charlotte.
― Obrigado, é de Antonin Careme.
Marie colocou as últimas forquilhas no penteado de Charlotte quem se levantou sentindo a cabeça um
pouco pesada. Aproximou-se da donzela que estava sentada em um tamborete para pôr seu vestido escarlate.
Esse era um dos inconvenientes de ser tão alta.
Bateram na porta, Marie foi abrir e depois fechou rapidamente a porta nos narizes da pessoa que tinha
chamado.
― Era Keating, milady; diz que os Heppleworth chegaram.
Charlotte estendeu o braço e Marie pôs no seu pulso um bracelete de rubis.
― É preciosa Charlotte! ― Exclamou Sophie.
A cor vermelha das pedras realçava o do vestido e ficava perfeito com seu cabelo moreno.
― É um presente de aniversário de meu amor ― Brincou Charlotte ― Para celebrar nossa tranquila
vida. Baixamos para pôr a prova nosso encanto com os homens que já estão aqui? E digo todos os homens.
Sophie se olhou rapidamente no espelho e puxou seu sutiã para que tampasse justo a rosada auréola de
seus seios.
Charlotte se pôs a rir.
― Não poderia estar mais atraente Sophie.
― Verdade ― Respondeu a outra com os olhos brilhantes de malicia ― É que não sei por que não ia ser
atraente aos homens, a final de contas só estou comprometida, não morta.
― Às vezes é muito francesa.
― Eu gosto de muito ser francesa de noite. O resto do dia posso ser muito inglesa, sobretudo para
montar a cavalo. E logo, a partir das seis da tarde me visto como uma francesa e penso como uma francesa.
Charlotte pensou enquanto desciam as escadas.
― Até que ponto se comportará como uma francesa quando estiver casada?
Sophie lhe dirigiu um olhar carregado de diversão.
― Tenta descobrir se serei fiel a meu marido?
― Sim.
― Serei porque é muito complicado enredar-se em relações ilícitas. Paquerarei, é obvio, e terei um
pretendente com título. Uma dama casada tem que ter admiradores; mas não abrirei as portas de meu
dormitório a ninguém. Para que?
Encolheu os ombros de forma encantadora.
O gesto era tipicamente francês, pensou Charlotte. Mas a ignorância de Sophie quanto aos prazeres da
carne era muito britânica. Sorriu; se Patrick se parecia nisso a seu gêmeo, faria Sophie compreender o que
estava perdendo levando o anel de Braddon no dedo.
Uma vez em baixo se dirigiram para o salão amarelo, onde as estavam esperando os convidados.
― Genial! ― Sussurrou Sophie ― Este salão faz jogo com meu vestido.
Tinha razão. O salão amarelo estava pintado em cor âmbar pálido, o tapete era de uma cor um pouco
mais escuro o qual para ressaltar mais sua roupa.
Patrick ainda não tinha chegado. Sophie tinha desenvolvido um sexto sentido no que se referia a ele, e
não precisava olhar para saber que não estava ali.
Braddon se apressou a ir para seu lado e fez uma reverência. Ele se inclinou; ao endireitar-se de novo se
esticou de maneira mecânica o colete que tinha tendência a subir por sua incipiente barriga. Sophie baixou
educadamente os olhos.
Braddon saudou Charlotte antes de oferecer o braço a sua prometida com ares de importância. Esta
noite ia apresentar oficialmente a sua futura esposa à família e tinha estudado cuidadosamente o protocolo
que devia seguir.
― Primeiro minha mãe ― Murmurou levando-a até o outro extremo do salão ― Depois minhas irmãs e
por último minha avó, porque embora tenha um caráter espantoso também é condessa de modo que…
A família de Braddon era muito conhecida e só os mais indulgentes diziam que sua avó era
simplesmente difícil. Outros diziam dela que a condessa de Slaslow era uma bruxa. Mas Sophie tinha
sobrevivido vinte anos com as severas reprimendas de sua própria mãe, de modo que não era fácil pô-la
nervosa.
Braddon se deteve diante sua mãe nas pontas dos pés como se estivesse preparado para fugir o mais
longe possível dela. A Sophie a condessa pareceu jovem para ter essa reputação; milagrosamente não tinha
rugas apesar de seus cinquenta anos cumpridos.
Sophie se inclinou com uma profunda reverência.
A condessa se levantou.
― Lady Sophie ― Disse com voz melosa, mas tão forte que se ouviu em todo o salão ― Agradecemos
muito que tire nosso pobre Braddon de seu celibato.
Deu uma olhada assassina a seu filho e este retrocedeu ligeiramente.
― Sábia que mais de três jovens o rejeitaram antes? Em que estavam pensando? Mas eram muito jovens.
Necessitava de uma mulher mais amadurecida para apreciar as maravilhosas qualidades de nosso Braddon.
Bem jogado! Pensou Sophie. Em tão só duas frases, a condessa tinha conseguido que Braddon parecesse
tolo e ela uma solteirona desesperada.
― Em efeito ― Murmurou.
Não tinha nenhum desejo de brigar com a mãe de seu prometido.
― E como está sua querida mãe? ― Perguntou a condessa com um sorriso carregado de veneno.
― Muito bem, obrigado. Estou segura de que não demorará a chegar.
― Pobre querida ― Continuou Prudence Chatwin ― Todos sabemos a cruz que leva em cima. Seu
pai… Mas bom ponto em boca.
Sophie mordeu o lábio.
― Tenho que te apresentar a minhas irmãs ― Disse rapidamente Braddon ― Perdoe mãe.
Sophie atravessou lentamente o salão, precisava recuperar-se antes de conhecer as irmãs de Braddon.
― Não pode evitar ― Explicou este envergonhado ― Disse tudo o que lhe passa pela cabeça e…
― E o que passa pela cabeça sempre é algo desagradável de ouvir.
― É certo. Mas isso não significa que desaprove minha escolha ― Precisou ele dando uns torpes
tapinhas no braço dela ― Na semana passada me disse umas cem vezes que nunca tivesse pensado que o faria
tão bem. O que acontece é que não é consciente do que diz ou que não se dá conta do efeito que produzem
suas palavras; algo assim. E não fui rejeitado por três mulheres ― Concluiu indignado ― Só foram duas.
Você aceitou se casar comigo.
Sophie sorriu diante desse embaralhado discurso.
― Minha mãe não é muito mais tolerante ― Disse.
Mas não chegava ao nível desse dragão, acrescentou para si.
Estava saudando a segunda das irmãs de Braddon quando notou a presença de Patrick. Três mulheres
que estavam ao lado da porta soltaram umas risadas e ela se esticou. Não daria a volta. Sorriu amavelmente a
mais jovem estava diante dela. Era evidente que Margaret tinha tentado domar seu cabelo recolhendo-o em
um coque, mas umas pequenas e lisas mechas lhe caíam ao redor do rosto.
― Lady Sophie ― Grunhiu ― Quantos filhos pensa dar ao chefe de nossa família?
Sophie deu um passo para trás nervosa.
― Ehh… Não sei. Os que Deus queira.
O olhar da Margaret se adoçou.
― Os meninos são o maior presente de Deus. Como chefe da família, o conde de Slaslow deve ter pelo
menos cinco ou seis. Nunca se sabe…
Entrecerrou os olhos olhando fixamente a cintura de sua futura cunhada.
― Evidentemente já te vi dançar, entretanto nunca tinha pensado em ti desse ângulo.
Sophie olhou interrogadoramente a seu prometido mais Braddon evitou olhá-la.
― Tem uns quadris largos ― Disse Margaret quando terminou seu exame ― Certamente terá que ter
filhos o antes possível. Sua mãe teve problemas para procriar? É filha única, acredito, a menos que seus
irmãos tenham morrido.
― Não que eu saiba.
Margaret apertou os lábios.
― Bom, não nos desesperemos. Quando seu pai mora seu título desaparecerá com ele, lady Sophie, de
modo que estou segura de que entende a importância dessa pergunta.
― A verdade é que o título passará a meu primo.
― Um primo não é um filho ― Arreganhou Margaret com severidade ― Estou segura de que seu pai
pensa que o título está perdido.
Por isso ela sabia, pensou Sophie, a seu pai dava completamente igual o título. Se tivesse querido um
filho, tivesse visitado sua esposa depois do segundo mês de matrimônio. Ao menos essa era a versão de sua
mãe.
― É muito importante ― Continuava dizendo Margaret ― Começar quanto antes. Não é muito jovem e
as gravidezes são mais difíceis a partir de uma determinada idade.
Sophie sentia calor subindo por sua coluna vertebral.
― Ainda não tenho vinte anos ― Fez notar um pouco friamente ― Poderei dar a Sua Senhoria oito ou
nove fontes de alegria.
Dirigiu a seu futuro marido um sorriso forçado.
― Uma atitude excelente ― Aprovou Margaret ― Eu mesma dava a meu marido um filho justo nove
meses depois das bodas e me orgulho de ter tido sete mais em outros tantos anos.
― Deus Santo! ― Murmurou Sophie.
Uma voz divertida se meteu na conversa.
― Lady Sophie não poderia escolher um exemplo melhor, senhora Windcastle. Estou seguro e que será
uma companheira muito… Fértil para nosso querido Braddon.
Este último lançou um olhar de recriminação a seu amigo.
― Perdão, perdão ― Disse Patrick com um brilho de malícia nos olhos. A palavra “fértil” faz pensar em
uma égua.
― Absolutamente! ― Exclamou Margaret ― Não vejo porque deveria ser indecente falar de meninos.
Muitas mulheres temem as gravidezes e o que acontece? Que a linhagem de seus maridos desaparece. O
título desaparece. Imagine que não houvesse um conde de Slaslow! ― Concluiu com tom melodramático.
― Em efeito ― Replicou Patrick com voz de veludo ― Lady Sophie poderia opor-se à ideia de ter filhos
e isso seria um desastre para os Slaslow.
Braddon estirou seu colete enquanto olhava a sua prometida que parecia estar contendo uma
gargalhada.
― Vamos saudar minha avó.
Margaret exibia um amplo sorriso.
― De fato, lady Sophie acaba de confessar que desejava ter oito ou nove filhos.
― Oito ou nove? ― Repetiu Patrick zombador ― Meu Deus! E eu que temia que lady Sophie só fosse
um pulso de salão!
A aludida não pôde evitar sorrir.
― Certamente que não ― Disse assinalando a Margaret ― Sempre desejei ter dez filhos, é uma cifra tão
redonda! Mas tendo em minha conta avançada idade deverei me conformar com nove.
― Bravo! ― Exclamou Patrick ― Eu gosto das mulheres que não temem assumir suas obrigações. Você
não Braddon?
Este olhava a Sophie horrorizado. Nove filhos? Havia dito realmente nove? Teria pedido a mão de uma
coelha como sua irmã?
― Eu gostaria de ser uma anciã ― Declarou Sophie brandamente ― Os cuidados masculinos são às
vezes tão aborrecidos! Não opina o mesmo Margaret? Suponho que posso te chamar por seu nome já que
vamos ser cunhadas.
Margaret sorriu.
― É obvio minha querida Sophie.
― Sim, os homens são exaustivos às vezes. Sua forma de suplicar e implorar…
― Suplicar e implorar? ― Perguntou Patrick com um sorriso diabólico.
― Exatamente. Suspirar e implorar.
Braddon agarrou a mão de Sophie e a pôs em seu cotovelo.
― Já é hora de vermos minha avó. Perdoem-nos, Margaret, Patrick…
Sophie não pôde conter-se mais. Dirigiu seu melhor sorriso a fértil senhora Windcastle e logo olhou ao
Patrick. Um olhar francamente provocador de relance.
O olhar que ele devolveu era mais uma ordem que uma petição e certamente não tinha nada de
suplicante nem de implorante. Todo o corpo de Sophie estremeceu quando ele deteve seus olhos em seus
seios e suas pernas.
Enquanto se afastava acompanhada de Braddon, olhou-se dissimuladamente o sutiã. Dava a sensação de
que tinha escorregado e que seus seios estavam nus.
Mas tudo estava em ordem.
Capítulo 6

Sophie passou o jantar conversando com Braddon que estava sentado a sua direita e com um amigo de
seu prometido, David Marlowe que estava a sua esquerda, ignorando com decisão Patrick Foakes. Estava
situado bastante longe dela na longa mesa, mas isso não impedia que o visse quando virava um pouco a
cabeça, o qual se permitiu fazer poucas vezes. David, um jovem vigário vindo do campo para o evento, era
um homem encantador.
― Você tem coragem se for casar com Braddon ― Disse.
― Por quê?
Sophie bebeu um gole de champanha; estava deixando deliberadamente que subisse à cabeça já que as
pequenas borbulhas proporcionavam uma alegria algo fictícia, mas muito agradável.
― Braddon no colégio era uma praga. Tinha que colocar à força as disciplinas na cabeça a véspera de
cada exame. O maior problema eram as coisas que inventava. Estiveram a ponto de expulsar várias vezes.
― Invenções? ― Repetiu ela escutando só pela metade.
No outro extremo da mesa essa insuportável francesinha, Daphne Blanc, estava flertando
descaradamente com Patrick. Sophie começou a dar leves golpes com o pé no chão ao ver Daphne inclinar-
se para ele e lhe roçar o braço com o ombro.
David seguia lhe falando.
― Por exemplo, um dia, Braddon decidiu fazer-se passar por seu tio diante de senhor Woolton, um dos
professores. O tio de Braddon é um famoso explorador e Woolton tinha comentado o muito que gostaria de
conhecê-lo; então Braddon teve a genial ideia de disfarçar-se para lhe fazer acreditar que era o explorador em
questão aproveitando para cantar os louvores de seu sobrinho para que Woolton se comportasse com maior
indulgência com ele.
― Isso é absurdo! ― Respondeu Sophie interessada a seu pesar ― Quantos anos tinha?
― Treze ou quatorze anos ― Disse David rindo ― Acredite, tentamos de tudo para dissuadi-lo, mas
Braddon não queria renunciar. Adorava o teatro, essa é por outra parte a razão pela qual E… ― Mordeu a
língua. Não podia dizer a uma dama que seu futuro marido escolhia geralmente suas amantes entre as atrizes.
― É a razão pela qual…? ― Insistiu Sophie curiosa.
― Por isso seus planos sempre são muito teatrais ― Retificou rapidamente David.
― O que aconteceu com o senhor Woolton?
― Bradon foi a High Street para comprar um inverossímil disfarce. Um casaco negro com uma grande
banda vermelha na parte inferior. Era absolutamente feio mais ele afirmava que era um casaco de explorador.
E colou uma barba e um bigode na cara.
― E?
― Foi um desastre. Woolton certamente o desmascarou assim que o viu, embora Braddon disse que lhe
tinha devotado café e que a farsa veio abaixo quando lhe perguntou onde tinha comprado o casaco. Braddon
respondeu que era um presente da tribo dos Triguelos que habitavam no topo dos Alpes.
Sophie se voltou para seu prometido quem estava conversando gesticulando muito com sua vizinha de
mesa, a senhorita Bárbara Lewnston.
― Custa-me acreditar ― Disse a David ― Nunca teria suspeitado que tinha tanta imaginação.
― A verdade é que não foi ele quem pôs a ponto todos os detalhes ― Tudo foi obra de Patrick.
Inventava um montão de aventuras que supostamente aconteciam na África ou nos Alpes, e Braddon devia
contar ao senhor Woolton. Desgraçadamente, a irmã do professor tinha uma loja no High Street e era ela
quem tinha vendido o casaco a Braddon. Certamente Woolton notou. Em qualquer caso tomou muito mal e
expulsaram Braddon durante três semanas.
― Senhor! ― Exclamou Sophie ― Seus anos de colégio me parecem muito mais divertidos que meus.
― O colégio era aborrecido, mas Braddon inventava sem cessar coisas novas e Patrick, o muito burro,
animava-o a fazê-lo. Entre os dois levavam a cabo coisas inconcebíveis.
Sophie arriscou um olhar para o outro extremo da mesa, mas notou horrorizada que Patrick a estava
olhando com expressão divertida. Ruborizou-se e voltou a olhar ao David.
― Posso imaginar muito bem Patrick Foakes inventando todas essas mentiras.
Por que sempre se esquecia de que era o pior dos libertinos, exatamente o tipo de pessoa com a que ela
não queria ter nada que ver?
― Não se tratava de mentiras ― Retificou David ― Em realidade a honestidade de Patrick esta fora de
toda suspeita. Ouvi-o discutir cem vezes com o Alex por isso. Odeia as mentiras. Ficava enfurecido se Alex
dizia alguma embora só fosse para escapar às lições de música.
Nesse instante Charlotte se levantou indicando que as damas deviam abandonar a sala de jantar. Sophie
se uniu a elas.
Uma vez que estiveram reunidas em um salãozinho, Charlotte deu umas palmadas.
― Dançamos? ― Propôs.
As mais jovens aplaudiram encantadas e inclusive a mãe de Sophie concedeu que fosse apropriado.
De modo que quando os homens se levantaram da mesa, levaram até o jardim de inverno. Rodeados de
um agradável aroma misto de charuto e conhaque, encontraram-se as mulheres dando ordens aos criados
quem estava enrolando os tapetes e afastando as poltronas e sofás contra a parede.
Charlotte tinha pensado que o salão de baile era muito grande, mas em ali os dez casais estariam
perfeitamente, e como o tempo era muito benigno para a estação em que se encontravam, fez que abrissem
as portas janelas e que se acendessem tochas no terraço.
O conde de Sheffield também se surpreendeu perguntando-se onde teria encontrado sua esposa umas
tochas desse tamanho e porque não havia dito anda dos doze músicos que estavam afinando seus
instrumentos em um canto.
― Estou segura de que você gosta de minha ideia querido Alexander ― Disse Charlotte fazendo uma
reverência.
Ele correspondeu à saudação, mas quando se endireitou, levantou-a em braços e a levou fora dali.
Algumas damas emitiram umas exclamações escandalizadas, mas Charlotte se limitou a rir. A mãe de
Sophie estremeceu de indignação antes de voltar a retomar a conversa que estava mantendo com seu futuro
genro.
No vestíbulo, Alex deixou que sua mulher deslizasse por seu corpo até que pôs os pés no chão.
― O que está tramando minha querida esposa?
Charlotte notava como as mãos de seu marido foram descendo por suas costas.
― Alex!
Os lacaios continuavam indo e vindo.
― Está tentando influir em nossa Sophie na escolha de seu par? ― Perguntou ele.
As mãos continuavam baixando e Charlotte notou que afrouxavam seus joelhos.
― Nada disso!
Alex lhe mordiscou a orelha.
― De acordo ― Retificou ― Gostaria que seu irmão tivesse uma oportunidade de…
― Eu adoro quando põe a voz rouca desta maneira. Por que não vamos ver como estão as meninas?
― Não!
― Sim.
― Não!
Ela se soltou.
― É malvado! ― Disse ela rindo ― Imagina o que deve estar pensado a mãe de Sophie; já sabe o muito
que lhe importam os convencionalismos.
― Deve estar pensando o que sempre pensa; que me perverteu. E se pudesse adivinhar que esta
tentando arruinar o formoso matrimônio de sua filha, a esfolaria viva querida.
― Bem, pois não diremos. Necessito sua ajuda Alex. Não quer ver seu irmão gêmeo feliz?
― Não estou seguro de que Sophie seja o que ele necessita. Além disso, não esta muito desejoso de
casar-se.
― Esse não é o problema. Estão a ponto de apaixonar-se um pelo outro, de modo que se Sophie se casa
com o Braddon e depois se apaixona pelo Patrick…
Alex se arranhou o queixo.
― Entendo.
― E se Patrick se casa com uma mulher que não lhe convém só como vingança?
Alex conhecia muito bem os perigos que conduzia equivocar-se em questões como essa.
― Que deseja que faça? ― Perguntou em tom de conspiração.
― Que se ocupe de Braddon.
Os condes entraram no salão de inverno como se não tivesse acontecido nada, como se fosse algo
normal ele sair levando nos braços a sua mulher em plena festa.
Patrick estava apoiado no piano enquanto Daphne Blanc tocava languidamente olhando para ele com
olhos apaixonados.
Charlotte beliscou a seu marido.
― Vê?
Os olhos de Alex se obscureceram com ternura.
― Seus desejos são ordens, condessa. Como sempre ― Acrescentou piscando um olho.
Enquanto Braddon se inclinava para Sophie, esta se deu conta de que Patrick convidava Daphne para
dançar. Braddon e Sophie se encaminharam à pista guardando uma respeitosa distância e ela surpreendeu a
expressão aprovadora de sua mãe.
De repente Braddon a fez tropeçar.
― Sinto lady Sophie ― Se desculpou sem fôlego ― Foakes é muito mau bailarino, sempre foi.
Sophie olhou por cima de seu ombro; Patrick não se preocupava com o resto dos casais, em efeito.
Sustentava muito alto a mão de Daphne e aos passos tradicionais do baile acrescentava uma série de giros
que os levaram até o outro extremo do salão. Uma vez ali olhou a seu acompanhante rindo.
― Dá-me voltas na cabeça, milorde ― Queixou Daphne com tom melindroso.
Braddon se deteve com um suspiro de alívio.
― Já está! ― Disse secando a testa ― aqui faz calor, você gostaria de sair fora? Estou seguro de que
ninguém porá nenhuma objeção dada nossa situação.
Sophie o olhou com incerteza.
― Nossa situação de compromisso ― Explicou ele pacientemente.
Estava acostumado a que não o entendessem e não se zangava por isso.
― De acordo.
Dirigiram-se para o terraço como a maioria dos casais, mas quando Sophie viu Patrick acompanhando
solicitamente à senhorita Blanc, deu meia volta.
― Vêm Braddon ― Disse rapidamente.
Ele a contemplou estranhando; ela já estava rodeando as jardineiras cheias de flores e se dirigia ao
jardim.
Ele se precipitou atrás dela.
Sophie se deteve na parte exterior do círculo iluminado pelas tochas.
― Tem razão querido ― Disse ela dando leves golpes no braço para animá-lo ― Ninguém se
preocupará conosco tendo em conta nosso compromisso.
― Esta mais escuro neste lugar ― Disse desorientado.
O que estavam fazendo no jardim? O que pensariam o resto dos convidados?
A jovem se apoiou em uma árvore. Seu vestido tinha reflexos dourados que pareciam responder à luz
chapeada da lua.
― Você gostaria de me beijar?
Braddon não parou para pensar.
― Não ― Disse de forma espontânea.
― Não?
― Quer dizer… Sim, acho ― Balbuciou ele ao dar-se conta de sua mancada.
Isso era um mau presságio para o futuro.
― Enfim, eu… Não penso em você desse modo ― Precisou afundando-se um pouco mais.
― Não pensa em mim desse modo? ― Repetiu ela.
Felizmente, pensou ele, Sophie não era do tipo histérico. Parecia ser mais sonhadora e, além disso, era
encantadora. Ele gostava mais das mulheres um pouco mais cheinhas, mas Sophie York seria uma formosa
condessa.
― É muito bela ― Disse ele.
― Obrigado Braddon ― Suspirou Sophie ― Acho que será melhor que voltemos com outros.
Sentia-se ao mesmo tempo humilhada e desarmada; o homem com quem ia casar não pensava nela
como em uma pessoa a que desejasse beijar, e aquele em quem ela pensava desse modo, ignorava-a
totalmente.
Alex apareceu no gonzo de uma porta janela e perguntou sorrindo:
― Posso roubar seu prometido uns minutos, Sophie?
Depois de puxar seu colete e fazer uma torpe reverencia, Braddon seguiu de boa vontade Alex
abandonando a sua prometida no terraço. Ela se dirigiu lentamente para a direita, cuidando de não desviar-se
para a esquerda já que “ele” estava nessa direção.
Lucien Blanc a recebeu amavelmente. Era um de seus admiradores preferidos, mas o olhou com
bastante frieza. Não era acaso sua irmã a que estava paquerando agarrada ao braço de Patrick?
― Pobre por mim! ― Exclamou o com seus olhos castanhos cheios de alegria ― Não sei por que tenho
caído em desgraça com minha inglesa preferida. Diga-me que não é por culpa de suas próximas bodas lady
Sophie! Meu coração sempre estará aos seus pés casada ou não.
Ela não pôde evitar sorrir diante dessa ridícula galanteria.
Lucien se aproximou mais ela e seu sotaque para que suas palavras tivessem maior encanto.
― Deveria você saber, lady Sophie, que um verdadeiro francês nunca deixaria que uma bobagem como
o matrimônio lhe impedisse de depositar seu coração aos pés do amor de sua vida.
― Estou segura ― Replicou ela rindo ― Mas por desgraça somos escravos de nossos costumes.
― Que chateio! Ao menos me prometa que me conservará como admirador incluso quando for
condessa. Eu o…
Foi interrompido por Charlotte que estava dando tapinhas nas mãos.
― Me escutem todos ― Disse animada ― Vamos a terminar esta festa com um jogo passado de moda o
que lhes parece? O que pareceria brincar de esconderijo a ou a cobra cega?
― O esconderijo, esconderijo! ― Exclamaram várias mulheres.
― De acordo.
Charlotte mostrou um comprido lenço de seda cor escarlate.
― Lady Sophie será quem se esconda já que é a convidada de honra desta festa. Quem a encontre
pegará o lenço e se esconderá a sua vez. A única regra é responder sinceramente quando alguém pergunte se
tiverem o lenço.
Fizeram-se várias perguntas e Charlotte teve que explicar as regras do jogo e as que ela tinha
acrescentado como, por exemplo, o lenço. Os olhos dos jovens brilhavam já que lhes ofereciam um montão
de possibilidades com esse tipo de distração.
Uns lacaios puseram tochas ao longo dos caminhos do jardim transformando-os em passeios de
estrelas.
Charlotte atou o lenço ao redor do pescoço de Sophie e murmurou ao seu ouvido:
― Se dirija ao pavilhão de verão.
Sem deter-se a pensar, Sophie se foi correndo por um dos caminhos.
Sentia-se desgraçada, realmente desgraçada. Possivelmente Charlotte tivesse razão quando dizia que
casar-se com o Braddon era uma estupidez.
Uma vez no pavilhão se deixou cair em um banco, encantada com esse momento de pausa. Ao longe
podia ouvir a voz de Charlotte contando até cem.
Não. Ela estava certa ao casar com Braddon. Para ser totalmente franca, não era a reação de seu
prometido diante um possível beijo o que a incomodava, e sim a atitude de Patrick com Daphne Blanc.
Entretanto ao casar-se com Braddon evitaria ter qualquer sentimento de ciúmes e isso era o que ela desejava.
Um pouco mais tranquila se apoiou na grade que recobria a parede. Expôs adiantar as bodas já que
uma vez casada com o Braddon estava segura de que deixaria de desejar o pior dos libertinos.
Abriu os olhos quando notou que alguém puxava o lenço brandamente.
― OH! Não o tinha ouvido!
― Hmm…
Patrick puxou um pouco mais forte e ela baixou docilmente a cabeça para deixar pegar o lenço.
Repentinamente intimidada olhou aos olhos.
― Estava pensando nas delícias do matrimônio? ― Perguntou ele.
Ela se levantou. Sabia muito bem aonde podia levar isto; deu um passo adiante, mas agora Patrick
estava na entrada com um pé no último degrau do alpendre e não se moveu.
Ela tremeu.
― As delícias do matrimônio… ― Repetiu ela pensativa com a sombra de um sorriso nos lábios ― Tão
maravilhoso é?
― Eu acho ― Respondeu Patrick firmemente.
Ela estava extremamente atraente com a cabeça inclinada, seus cabelos caindo sobre seus ombros e o
pescoço tão branco sob a luz da lua.
Ele se aproximou dela e acariciou seu cabelo.
― O que está fazendo?
Sophie não estava preocupada, a verdade é que tinha estado esperando este momento toda a noite.
Sentiu seu calor através da leve malha do vestido.
― Conhece um poema que diz: “Seus lábios são vermelhos, suaves e deliciosos”?
Ele continuava brincando com seu cabelo de seda.
― Conhece esse poema Sophie?
― Não ― Murmurou ela.
Ele jogou a cabeça ligeiramente para trás enquanto sua outra mão a atraía contra seu musculoso corpo.
Ela gemeu quando ele pousou os lábios na garganta que lhe oferecia.
― “Seus lábios são cerejas e delas têm o delicado sabor” ― Continuou Patrick pontuando cada palavra
com um beijo.
― É esta uma das “delícias do matrimônio”?
Sophie tentava em vão não deixar-se arrastar pelo torvelinho de sensações que a invadia.
― Uma delas.
Suas mãos estavam agora percorrendo todo seu corpo, suas nádegas, seus quadris, a curva generosa de
seus seios…
― Não acredito que…
Viu-se amordaçada por um beijo, um autoritário beijo carregado de promessas. Instintivamente se abriu
para ele e enterrou suas mãos no seu cabelo.
Quando Patrick se separou dela para escutar os sons que vinham de Sheffield House, ela se inclinou
para ele.
― É um tesouro ― Sussurrou ele com voz um pouco rouca ― Sophie…
Ela sorriu.
― Um tesouro do qual você tem a chave?
Ele voltou a atraí-la para seu corpo.
― É curioso ― Disse ― Parece que continuam jogando embora nós tenhamos o lenço.
Em efeito, Sophie podia ouvir ao longe os gritos de alegria dos participantes.
Voltou bruscamente para a realidade.
― Não! Podem nos ver.
Patrick deixou imediatamente de abraçá-la.
― Isso é o único que se preocupa não é? Se nos encontrassem juntos te veria obrigada a se casar
comigo.
Sophie não entendeu o significado de suas palavras. O rosto de Patrick estava sob um raio de lua que
acentuava seus traços e a sombra das pestanas nas bochechas. Não pôde evitar lhe acariciar.
― É bonito ― Murmurou.
Ele se soltou.
― Temo lady Sophie que seu prometido deve estar preocupado por você.
Seu tom era cortês mais estava apertando os dentes.
Ela esteve a ponto de protestar mais não o fez. Ele tinha razão.
A expressão de Patrick se endureceu e atou o lenço no braço.
― Desfrutei destes momentos com você condessa. Como de costume.
Com estas palavras se afastou.
Sophie estremeceu na suavidade da noite e duas lágrimas caíram por suas bochechas.
Senhor ela tinha feito! Acabava de danificar sua vida apaixonando-se por um libertino. Outras duas
lágrimas seguiram o caminho das primeiras.
Ao menos ele nunca saberia. Ninguém saberia jamais. A partir desse momento arrumaria para que todo
Londres se convencesse de que estava loucamente apaixonada por Braddon; porque se alguém chegasse a
descobrir o que sentia por Patrick morreria de vergonha.
Ao voltar do jardim, encontrou-se com duas mulheres que falavam excitadas de lenços e de beijos
roubados. Entraram as três juntas na casa, mas as gargalhadas de Sophie soavam falsas aos seus próprios
ouvidos.
Com a rapidez própria do clima inglês, uma tromba de água caiu sobre as tochas e os criados fecharam
rapidamente as portas.
Braddon, sentado ao lado de sua mãe, viu Sophie chegar com evidente alívio.
― Milorde ― Disse ela dedicando um deslumbrante sorriso.
― Lady Sophie ― Respondeu ― Esta começando outro baile. Quer que dancemos?
Ao dar os primeiros complicados passos, ela teve um instante de dúvida. Uma vida inteira com esse tipo
de diversões a esperava. Nada deixava supor que a barriga de Braddon desapareceria depois das bodas. Para
falar a verdade certamente chegaria a ter a corpulência de seu defunto pai.
Levantou os olhos para seu amistoso olhar.
― Divertiu no jardim Sophie? ― Perguntou ― Vá jogo diabólico nos preparou lady Sheffield. Consegui
o lenço um momento, mas Patrick Foakes chegou e tinha outro igual ao meu. Aparentemente zombou de
nós.
Efetivamente, pensou Sophie, dois lenços e… Como era possível que Patrick a encontrasse tão
rapidamente?
― E se nos sentássemos Braddon? ― Sugeriu ― Eu gostaria de muito que falássemos um pouco.
Braddon se preocupou; em geral essas palavras não auguravam nada bom.
Uns minutos depois estava em estado de choque.
― Mas… as… Sophie!
― Não posso esperar meus sentimentos por você são muito fortes.
Podia ver a angústia nos olhos de seu prometido; compreendeu que era inútil voltar a lhe dizer que
queria fugir com ele por amor. Baixou a voz.
― É por minha mãe ― Continuou ela lhe pondo uma mão no braço ― Veja acabar com meus nervos.
Somos pessoas adultas pelo amor de Deus!
― Certamente.
Braddon seguia sem estar convencido mais simpatizava com Sophie quando esta falava de sua mãe; ao
menos tinham esse ponto em comum.
― Sei o que quer dizer ― Confiou em voz baixa ― Minha mãe há… Bom já a conhece.
― Então fujamos.
Ele moveu a cabeça de um lado a outro.
― É impossível querida. Não seria adequado. Além disso, minha mãe nunca lhe perdoaria isso e eu teria
que ouvi-la o resto de minha vida. Ainda me recorda frequentemente o dia que a desobedeci e fui ver uma
briga de galos. E eu tinha doze anos!
Sophie tentou o enrolar. Uma encantadora careta se desenhou em seu rosto.
― Braddon não terá medo de sua mãe?
― Certamente que sim! ― Replicou ele ― Minha mãe é uma velha devota terrível, qualquer um pode
dizer isso.
Ela se dispunha a dizer seus argumentos quando uma voz muito séria interrompeu a conversa. A
marquesa de Brandenbourg se plantou diante deles com o peito palpitando de indignação.
― Esta festa é de péssimo gosto! ― Declarou.
Sophie se voltou instintivamente para seu pai, mas este estava tranquilamente sentado com o Sylvester
Bredbeck. Comportou-se de forma admirável toda a noite pelo que ela tinha podido observar.
Braddon se levantou rapidamente para ceder seu assento a sua futura sogra, esta se sentou apesar do
evidente desejo que tinha de voltar para sua casa.
― Ninguém pode encontrar à senhorita Daphne Blanc ― Disse com acidez ― E tampouco o irmão do
anfitrião, Patrick Foakes. A última vez que os viram foi no jardim ― Acrescentou lançando um avesso olhar
a sua filha ― Mas depois disso desapareceram.
Braddon, quem tinha ouvido falar da aventura entre Daphne e Patrick, apressou-se a responder:
― Estou seguro de que não demoraram em aparecer.
Sophie olhava fixamente suas mãos crispadas em cima dos joelhos.
― Em minha opinião essa jovem não será o bastante estúpida para negar-se a casar-se com Foakes ―
Continuou a marquesa agressivamente.
Estava fora de si só pensando que sua filha pode colocar-se em dúvida com um indivíduo cujo
passatempo favorito eram as mulheres.
Sophie notou contra ela o reconfortante ombro do Braddon que tinha aproximado uma cadeira.
― Patrick me disse que lady Sophie o tinha rejeitado, o qual me parece uma sorte para mim.
Agarrou as mãos cruzadas da jovem e as moveu para soltá-las, as beijando afetuosamente.
A marquesa lançou um olhar aprovador. Era um menino muito amável. De fato Heloise recordava os
que tinham cortejado a ela antes que se casasse.
O coração de Sophie estava enlouquecido, Patrick ia casar se com essa provocadora da Daphne.
― Mamãe está começando a doer minha cabeça. Permite que lorde Slaslow me acompanhe até em casa?
Heloise a olhou com severidade perguntando se sua filha iria estragar o compromisso fazendo algo que
incomodasse ao conde. Mas não, Sophie efetivamente estava pálida e parecia cansada, o qual a preocupou
como a qualquer mãe.
― É obvio. Vou procurar seu pai e nos despediremos o mais rapidamente possível. Eu me desculparei
por você e por lorde Slaslow. Se apresse em voltar para casa e peça a Simone que te faça uma infusão, não há
nada como as infusões da Simone para curar dor de cabeça.
Sophie sorriu, levantou-se e se agarrou com seus intumescidos dedos à manga do Braddon. Ele era
extremamente complacente, pensou agradecida enquanto atravessavam o salão onde os convidados não
faziam outra coisa que falar do desaparecimento de Daphne, de Patrick e de Lucien Blanc. Todo mundo
pensava que Lucien tinha desafiado em duelo a Patrick e que ambos estavam escolhendo seus padrinhos.
Sophie enquanto isso pensava em uma nova tática para convencer ao Braddon.
― Olhe Braddon ― Disse assim que estiveram em sua carruagem ― O que temos que pensar é uma
forma de evitar estas festas e as aborrecidas reuniões que vão voltar nos loucos nos próximos quatro meses a
menos que elaboremos um plano inteligente.
― Um plano ― Repetiu Braddon.
Podia ser que tivesse visto um brilho de interesse em seus olhos?
― Poderia comprar uma enorme capa negra ― Insistiu Sophie ― E se souber onde as encontrar,
também poderia alugar uma dessas barbas falsas como as que usam os atores.
― Maldição! ― Exclamou Braddon muito excitado ― conheço um lugar. Mas para que?
― Para nossa fuga! ― Replicou Sophie ― Naturalmente, depois das bodas levaremos uma vida
tranquila. Nada de animações. Esta será nossa última loucura. Só necessitamos um bom plano para levá-la a
cabo sem problemas.
Braddon suspirou; sua cabeça já estava cheia de imagens de perucas e de bigodes falsos.
― Porque ― Continuou Sophie ― Se deixarmos que nossas mães se façam cargo agora, seguirão
fazendo quando nos casarmos. A minha já anunciou sua intenção de passar todo o dia comigo assim que
esteja instalada.
― De verdade? ― Disse o com voz oca.
― Sim. E será pior quando houver filhos, as duas estarão continuamente em nossa casa. É
absolutamente necessário que vamos em busca da liberdade.
Braddon estava um pouco perdido, só entendia o que pintava a liberdade em tudo isto.
― Não entendo porque necessito uma enorme capa negra.
― Para que ninguém te reconheça quando me sequestrar. As pessoas se fixam na roupa, com uma capa e
uma barba falsa poderia ser qualquer um.
Fez-se um silêncio.
― Certamente é o certo ― Continuou ele ― Mas continuo sem entender por que…
― Se não fugirmos ― Disse Sophie ― É melhor que não nos casemos. A verdade é que se não te
apresentar em minha casa amanhã a meia noite não me casarei contigo Braddon Chatwin.
Molesto, Braddon pensou que ao fim e ao cabo sua prometida tinha uma veia histérica, e além disso ia
enrugar lhe o veludo da jaqueta de tanto apertar seu braço.
Entretanto temia a reação de sua mãe se soubesse que Sophie tinha quebrado o compromisso. E além já
imaginava a si mesmo disfarçando-se e colando uma barba falsa no rosto. Era algo muito divertido. Ninguém
o olharia com condescendência nem chamaria de estúpido enquanto estivesse disfarçado.
― Não fique nervosa ― Disse por fim ― De acordo, ali estarei.
Sophie pressentiu que tinha que terminar rapidamente antes que ele tivesse tempo de arrepender-se ou
de falar do assunto com algum de seus amigos.
― Esperarei amanhã ― Declarou ― Amanhã a meia-noite. Mas, sobretudo não diga nada a ninguém
porque poderia estragar tudo. Arrumarei tudo para pôr uma escada debaixo de minha janela. Quando
chegar, envolto em sua enorme capa negra, subirá para me buscar e me sequestrara.
Braddon estava fascinado diante da ideia de subir por uma escala com a capa voando ao vento e levar
uma mulher entre seus poderosos braços. E como de todas as formas ia se casar com Sophie para que ia
discutir?
― De acordo ― disse ― meia-noite.
A carruagem se deteve e um lacaio foi a abrir a portinhola. Braddon desceu sentindo-se mais homem
que nunca. Ofereceu a mão a Sophie quem a tomou com confiança. Na escada de mármore se deteve um
degrau por cima do para ficar a sua mesma altura.
― É meu herói ― Murmurou.
Orgulhoso, ele se inclinou para roçar respeitosamente seus lábios antes de voltar a subir ao veículo.
Sophie entrou em sua casa, cansada mais satisfeita. O que importava a ela se Patrick Foakes casava com
essa francesa que tinha arrojado a seus pés? Uma vez casada não voltaria a pensar nele, nem em seus
perturbadores olhos, nem em suas acariciadoras mãos.
Nunca mais!
Em Sheffield House, uma corrente de excitação percorreu o salão quando as pessoas viram entrar
Patrick Foakes acompanhado de seu irmão o conde. A senhorita Daphne Blanc continuava sem aparecer.
Barbara Lewnstown, que se vangloriava de ser a melhor amiga de Daphne, já estava imaginando casada
com o honorável Patrick Foakes.
― Patrick ― Exclamou ― Onde está minha querida Daphne?
Ele parecia ser especialmente indiferente quando respondeu:
― Mal tínhamos saído quando um inseto entrou no seu olho. Começou a inchar muito e Charlotte a
levou para lhe pôr um unguento.
Não parecia estar afetado pela horrível sorte de Daphne. A desventurada não poderia deixar-se ver
durante uma semana ou possivelmente mais.
Capítulo 7

Braddon Chatwin despertou no dia seguinte rodeado por um delicioso aroma de aventura. Bigodes e
capas negras tinham enchido seus sonhos.
Depois recordou. Lady Sophie queria que a raptasse e insistia em que devia disfarçar-se ameaçando não
casar com ele se não aparecia a meia-noite. Tentou com muito esforço entender todo o assunto.
À luz do dia parecia uma coisa de loucos. Se refugiassem na Gretna Green todo mundo pensaria que se
deitaram juntos. Felizmente, pensou Braddon satisfeito, ela não tinha pensado nisso. As mulheres de alta
linhagem não sabiam nada sobre sexo de modo que Sophie ignorava o que diriam as pessoas sobre sua fuga.
Mas dado que nada os impedia de casar tranquilamente em St. George quatro meses mais tarde, outros
tirariam desagradáveis conclusões. Não era como se fosse um matrimônio por amor.
Puxou o cordão para chamar o criado pedindo que levassem chocolate e cruzou os braços por cima da
cabeça. O que necessitava agora era urdir um plano genial para sortear a sua futura esposa. Em outras
palavras para desbaratar os planos dela já que por nada do mundo faria algo tão estúpido como casar na
Escócia quando não era obrigado a fazê-lo.
Além disso, a viagem levaria pelo menos dois ou três dias para ir e outros tantos para voltar. Ir a
Escócia no mês de dezembro! Certo que não tinha caído nem um só floco de neve este ano, mas não era
questão de que abandonasse “sua” Madeleine embora só fosse por uma semana. A simples lembrança da
jovem dava vontade de sair da cama.
Entristeceu-se. Madeleine não saltaria de alegria se ele fosse vê-la, era de uma castidade exasperante. A
verdade era que não parecia ceder nem com suas apaixonadas cartas, nem com os presentes que recusava
sistematicamente, nem a nenhum de seus esforços para convertê-la em sua amante por toda vida. Havia dito
que essa situação não a interessava e ponto. Tinha sido inútil que explicasse que uma jovem de sua posição
não podia esperar fazer um bom matrimônio já que isso não parecia preocupá-la.
Não deixava de dar voltas na mente enquanto tomava o chocolate.
Possivelmente Madeleine estivesse preocupada com seu futuro. O posto de cortesã não era dos mais
seguros e sem dúvida não acreditava que ele a fosse conservar para sempre. Possivelmente deveria chamar a
seu advogado para que redigisse um contrato que assegurasse a ela uma boa renda. Então ela entenderia que
se tratava de uma relação duradoura e não de um capricho.
De todas as formas o verdadeiro problema era conseguir que lady Sophie cedesse deixando acreditar
que era ela quem dirigia o jogo. Se enviasse uma mensagem ela romperia imediatamente o compromisso.
Braddon, que tinha três irmãs maiores, tinha conhecido muitas mulheres histéricas e tinha a sensação de que
sua prometida estava a ponto de ficar incontrolável. Não, era necessário que fosse a sua casa a meia-noite…
Mas não para ir a Gretna Green.
Ao fim se levantou. Não deveria ter pensado em Madeleine já que sabia que não poderia fazer nada
direito até que não a tivesse visto e tivesse roubado um beijo, caso que o pai dela não estivesse nos arredores
do estábulo, já que o homem estava muito atento. Qualquer pensaria que estava vigiando a uma verdadeira
dama pela maneira em que reprovava Braddon por tentar arruinar sua reputação e outras bobagens pelo
estilo. Braddon não conseguia fazê-lo entender que uma mulher que vivia na parte superior de um estábulo
não tinha uma reputação que preservar e que devia fazer-se com uma.
Quando Kesgrave foi vesti-lo, Braddon o fez partícipe de sua divertida reflexão, mas o mordomo, como
de costume, permaneceu impassível e se limitou a perguntar se desejava colocar a jaqueta azul.
Braddon suspirou. Felizmente era de caráter amável, com todos esses estúpidos que o rodeavam.
― Não Kesgrave― Respondeu ― A malva. Vou dar um passeio a cavalo.
― Antes de tomar o café da manhã? ― Perguntou o mordomo com expressão desaprovadora.
Era uma maldição que os criados o conhecessem desde que era um bebê, pensou Braddon.
― Vou sair ― Insistiu à defensiva.
Uma vez que esteve preparado, deslizou ao exterior como um menino saindo às escondidas e se dirigiu
a cavalo para os estábulos do pai de Madeleine.
O enorme edifício estava tranquilo a essa hora da manhã. Mas tarde os homens se reuniriam sob os
altos carvalhos do pátio para olhar os moços de estábulo quando tirassem os puros sangues de
impressionantes peitos.
Desceu pesadamente de seus arreios e lançou as rédeas a um guri que andava pelos arredores esperando
ganhar algum xelim.
Dirigiu-se ao vasto edifício. Madeleine quase nunca ia aos estábulos pela tarde por culpa de sua
“reputação”. Braddon estava bem contente por isso já que significava que não havia competição com o resto
dos homens que frequentavam o lugar.
Avançou com o passar do corredor que cheirava a linimento. Quando havia esse aroma, Madeleine não
estava longe já que era ela a que se ocupava das pequenas lesões dos animais.
Ela estava no último box ajoelhada com a pata de uma égua dobrada diante ela. Certamente o tinha
ouvido chegar, mas não deu a volta. Continuou falando brandamente ao animal enquanto aplicava o
unguento.
Braddon, nervoso, balançava-se primeiro em um pé e logo no outro.
― Milorde ― Disse ela sem o olhar ― Se não se incomoda poderia segurar a cabeça de Gracie enquanto
a curo?
― Como sabe que sou eu?
Ela olhou por cima do ombro.
― Você vem todos os dias a esta hora, milorde.
― Humm.
O tom não era muito amável, acaso Madeleine não desejava vê-lo? Foi agachar ao seu lado.
― O que aconteceu?
― Uma entorse na pata direita.
Braddon aproveitou para aproximar-se um pouco mais.
― Milorde!
Parecia contrariada. Hoje ia ficar sem beijo. Por que tinha que enamorar-se de uma francesa com um
gênio endiabrado e a moral de uma monja? Não era tão formosa como Arabella, a amante que tinha roubado
de Patrick no ano anterior. A verdade é que a olhando objetivamente, era mais bem baixa e vulgar.
Entretanto o coração acelerava assim que a via. Inclinado para ela podia ver seu amplo seio. Arriscou-se
pôr uma mão em cima do ombro.
― Não!
Surpreso, cruzou seu olhar com os olhos enfurecidos de sua amada.
― Por que não? ― Ele perguntou.
Ela ficou em pé de um salto puxando sua saia de lã. Seu sotaque francês era mais pronunciado do
habitual como sempre que estava zangada.
― Não tente “enliar-me”
― Enliar? Quer dizer: enredar.
― Isso é o que disse ― Se impacientou ela.
O que ia fazer com esse aristocrata tão bobo? Como podia trabalhar de um modo adequado quando ele
a seguia a todas as partes boquiaberto de admiração e se interpunha sem cessar em seu caminho?
Ele a agarrou em seus braços tão rapidamente que ela não teve tempo de pedir ajuda antes que os
lábios de Braddon se abatessem sobre os seus. Ao mesmo tempo a fez sair do box de Gracie, demonstrando
assim contrariamente o que diziam seus amigos, era capaz de fazer duas coisas de uma vez.
A seu pesar, Madeleine se deixou levar por um instante. A vida tinha sido muito dura nos últimos anos.
Era uma maravilha sentir-se segura entre os braços dele. Dava a sensação de que a protegeria de qualquer
desgraça.
Entretanto se revolveu e o afastou quando ele murmurava coisas ao ouvido. Certamente mais
promessas sem sentido. Entendeu o sentido geral de suas palavras. Seu admirador era o que sua mãe tivesse
chamado um libertino. Só queria comprometê-la, mas não casar-se com ela.
Ele voltou a prendê-la entre seus braços.
― Não esteja tão triste Madeleine. Odeio vê-la tão triste.
Confusa, olhou os azuis olhos dele.
― Não estou triste, só é que por um momento recordei a minha mãe.
― Parecia estar triste ― Insistiu Braddon.
― Sinto falta dela! ― Soltou Madeleine contra sua vontade.
Não queria compartilhar seus sentimentos com esse depravado.
Braddon beijou uma orelha.
― Algum dia você será mãe Madeleine, terá seus próprios filhos e esquecerá.
Ela respirou fundo.
― Não se você sai com a sua ― Contestou ― Quer me converter em uma cortesã e essas mulheres
nunca têm filhos; não podem permitir-se esse luxo levando essa vida.
Ele sorriu. Era o sentido comum francês o que estava falando.
― Teremos filhos ― Prometeu ― Soube assim que a vi. Nunca antes tinha desejado ter.
A jovem se tranquilizou. Esse nobre inglês era exatamente o tipo de homem que ela desejava. Um
pouco tolo, sem dúvida, mas com um coração de ouro. E, além disso, era tranquilizador e de uma estatura
imponente. Para ela um homem devia ser imponente. Ela saberia como evitar que ficasse em perigo. Mas
não! Ela não se transformaria na amante de ninguém nem sequer embora tivesse que permanecer virgem o
resto de sua vida.
Afastou
― Fora! Vá!
Braddon custava entendê-lo. Ela estava furiosa de novo.
― É possível que me veja obrigado a me ausentar uns dias.
Pareceu que ela se sentia decepcionada.
― Melhor. Desse modo poderei trabalhar.
Não. Não estava decepcionada. Fez o silêncio.
― Onde estará? ― Perguntou ela finalmente.
― Tenho que fugir. Bom, lady Sophie quer que a rapte mais eu não quero. De modo que subirei por
uma escada para ir procurá-la, mas não a levarei a Gretna Green. Além disso, ninguém foge no inverno.
O coração de Madeleine pulsava dolorosamente em seu peito.
― De verdade lady Sophie deseja que a rapte?
― Sim. Não estou seguro de que seja tão apropriada para mim como disse. Teve uma crise nervosa
ontem de noite e disse que se não ia raptar a meia-noite não casaria comigo.
Ela, apesar do peso que oprimia seu coração esteve a ponto de tornar a rir ao ver a expressão de causar
pena do Braddon.
― Não posso voltar a começar Madeleine… Maddie!
Tinha conseguido voltar a abraçá-la e lhe estava falando contra o cabelo.
― Teria que voltar a começar desde começo ― Continuou ele ― Teria que voltar a ir ao Almack´s par
tentar encontrar uma mulher mais ou menos razoável. Não, é melhor conservar Sophie. Simplesmente tenho
que encontrar o modo de raptá-la sem raptá-la.
Ao menos não parecia muito enrabichado de sua futura esposa, pensou Madeleine.
― Por que não quer fugir com ela?
Braddon se afastou um pouco, indignado.
― Não sentiria falta de mim? Necessitaria uma semana longa para ir a Gretna Green e voltar sempre
que não nos atrasássemos. Poderíamos estar fora quinze dias.
― Não jogarei de menos ― Decretou ela com firmeza ― E depois de suas bodas tampouco será bem-
vindo aqui.
― Bem, pois eu sim que a sentiria sua falta. Além disso, não acredito. Acredito que você também
sentiria minha falta. De todas as formas não tenho vontade de me casar tão rápido.
Deixou-se cair sobre um montão de palha e a atraiu para seus joelhos.
Ela emitiu um grito de indignação e depois relaxou. Braddon a apertou contra seu torso.
― Vai enrugar a roupa ― objetou.
― Inteligente pequena Maddie!
A inteligente pequena Maddie tinha a sensação de que alguém estava espremendo seu coração.
― Por que não finge que quebrou uma perna?
Mordeu a língua por que ela se metia nesse assunto?
― Que quebrei a perna? O que quer dizer?
― Com uma perna quebrada não poderia subir por uma escada ― Explicou ela secamente.
Braddon considerou a ideia.
― Sim! Tem razão querida Maddie. ― Vou mandar uma mensagem a lady Sophie para dizer que tive
um acidente.
― De verdade teve uma crise nervosa?
Ele franziu o cenho.
― Quase.
― Então não acreditará ainda que diga, eu em seu lugar tampouco o faria. Pensaria que é uma desculpa
para não fazê-lo e que é muito velho para fugir.
Assombrou a ela mesma por suas palavras. É possível que houvesse um pouco de rancor no que havia
dito? Ela não tinha nenhum direito a imaginar nem por um instante casada com um par do reino. Era
evidente que Braddon nem sequer tinha pensado em casar com ela.
― Você opina que não acreditará?
― Arrisca que rompa o compromisso.
― Que rompa o compromisso?
Ao Braddon aterrava a ideia, agarrou-se a Maddie imaginando a ira de sua mãe. Endireitou-se.
― Já sei! Tenho que quebrar a perna de verdade. Cairei do cavalo, depois pedirei a um amigo que vá
procurar Sophie subindo por essa condenada escada e a levará a minha casa onde ela poderá ver o
machucado. Não poderá negar a evidência.
Madeleine suspirou. Francamente, seu aristocrata inglês necessitava de alguém que se ocupasse dele.
― Não diga tolices! Não pode quebrar a perna tão facilmente.
― Eu sim. Aconteceu-me quando era pequeno e o médico me aconselhou que fosse com cuidado
porque poderia voltar a acontecer em qualquer momento. Basta com que caia do cavalo ao lado esquerdo,
sobre a perna que é mais frágil e já está.
Ela ficou dura.
― E se a fratura não se cura bem? E se coxear o resto de sua vida? Então de todos os modos lady
Sophie não quererá saber nada de você.
― Você acha?
― Todas as damas adoram dançar ― Declarou Madeleine com a convicção de uma pessoa que nunca
tinha frequentado a alta sociedade ― Nenhuma grande dama quereria um marido que é incapaz de dançar.
― OH…
Ela não pôde resistir a sua decepção.
― Poderia proporcionar um machucado falso.
― De que demônios está falando?
Braddon tinha renunciado seguir suportando essa tortura e estava acariciando com os lábios a deliciosa
orelha dela.
― Aqui temos todo o necessário para os cavalos. Porei uma tala e todos acreditarão que realmente
quebrou a perna.
Ele emitiu um grito de alegria.
― Bravo Maddie!
Madeleine se voltou para dizer que fosse mais discreto e ele aproveitou para apoderar-se de seus lábios.
Passou algum tempo antes que voltassem para problema que os ocupava.
Quarenta minutos depois, Braddon tinha a perna da calça esquerda rasgada de cima abaixo e pensava
vagamente na reação que teria Kesgrave.
Houve um momento tenso quando Braddon se negou a mostrar sua perna nua a Madeleine e insistiu
em colocar ele mesmo a primeira capa de ataduras. Ela se vingou do fazendo uma talagem digna de um
elefante.
A verdade é que quando saiu do estábulo apoiando-se no ombro dela, tinha a sensação de ter quebrado
a perna realmente.
― Não acredita que colocou muito? ― Perguntou preocupado.
― Não. Sua perna está muito quebrada. Se você fosse um cavalo teríamos imobilizado.
Braddon deu umas moedas ao guri que estava vigiando a seu cavalo.
― Ponha em um box e chame um faetón.
O pirralho o olhava com curiosidade.
― Se machucou milorde?
Braddon deu um xelim mais.
― O faetón ― Repetiu.
― Em seguida.
O menino se precipitou para a rua deixando o cavalo preso em uma estaca.
― Espero que não o deixe esquecido aqui ― Disse Braddon que estava segurando sua bota com a ponta
dos dedos.
Kesgrave o mataria se encontrava restos de graxa em uma bota, tivesse ou não a perna quebrada.
― Não se preocupe ― Contestou Madeleine ― O porei em lugar seguro.
Ele a olhou com ternura.
― Te amo sabe?
Ela ficou imóvel.
― Cale-se! Se meu pai ouve… Você fala muito alto!
Ele deu de ombros.
― Estou ferido de modo o que ele poderia me fazer? E, além disso, é verdade, Maddie, te amo.
― Você não é mais que um libertino ― Disse ela com dureza ― Diz me ama porque não cedo a seus
desejos.
Chegaram à rua onde estava esperando uma carruagem com a portinhola aberta.
Madeleine deu a volta para voltar para estábulo sem dizer nada mais. De repente ocorreu uma ideia e
voltou a dar a volta.
― Terá que voltar para ver-me quando quiser que tire a tala. A menos que confesse a seu ajudante de
câmara que é falsa.
― Isso não! Kesgrave não tem nenhum senso de humor. Não direi a ninguém. Madeleine…
Ela estava frente a ele, formosa e sensual, com seus cabelos castanhos aos que a luz poeirenta do pátio
punha reflexos dourados.
― Obrigado por sua ajuda.
Ela dedicou um deslumbrante sorriso.
― É normal que uma cortesã se assegure de que seu senhor não se case.
Rompeu a rir ao ver sua expressão de desgosto.
― Você não é uma simples cortesã ― Protestou.
― Não sou uma cortesã absolutamente! ― Declarou ela antes de desaparecer na sombra do edifício.
Dali observou Braddon que estava entrando no faetón praguejando contra a talagem muito pesada que
se chocava contra a portinhola. Felizmente não quebrado de verdade a perna porque isso teria provocado
uma dor de mil demônios.
Era muito difícil para ela não pena ao ver a longa figura dele subindo no carro. Certamente seria
maravilhoso ser sua amante.
Maddie sacudiu a cabeça e recordou a pobre Gracie a qual tinha abandonado sem terminar de curar.
Em efeito, pobre Gracie. A égua tinha devorado o resto do unguento preparado para sua perna e
quando o pai do Madeleine chegou encontrou a sua filha repreendendo à égua com uma inundação de
pragas em francês.
Capítulo 8

Patrick contemplou seu amigo com incredulidade antes de romper a rir sem nenhuma alegria.
― É sua noiva, vá você procurá-la.
Braddon o olhava com expressão suplicante. Patrick era o único amigo no qual podia confiar. Apontou
sua perna com um enorme gesso que estava repousando em cima de um tamborete.
― Não posso subir por uma escada neste estado, maldição!
Patrick deu de ombros.
― Então não a rapte.
― Esse é o problema ― Gemeu Braddon ― Não posso fugir. Se trouxer lady Sophie aqui ela
comprovará que estou ferido e que a escapada é impossível. Estou em uma condenada confusão Patrick, e
necessito que me ajude.
― Escreva uma nota.
― Me deixará plantado. É um pouco histérica sabe? Ontem de noite me disse que se não fosse procurá-
la não se casaria comigo nunca. Já sei! ― Exclamou de repente ― Já sei por que se comporta como um urso
resmungão, também seu vai se casar? Com Daphne Blanc não é certo?
Patrick lhe lançou um olhar assassino.
― Não seja mais tolo do que já é Braddon.
― Odeio quando fala com essa frieza. É mais casca grossa que seu irmão. Não compreendo o que te
incomoda tanto. Todo mundo estava falando de seu desaparecimento sob a lua com a senhorita Blanc ontem
de noite.
― Ontem de noite antes que fosse?
― Exatamente. Acredita que minha mãe não notou que tinham ido dar um passeio e que não voltaram?
― Caiu um inseto nos olhos dela e ficou inchado ― Respondeu distraidamente Patrick ― Quando
ouviu falar desse suposto matrimônio? Antes ou depois de que Sophie te propor uma conclusão tão rápida
de seu compromisso?
― Não vai se liberar assim tão fácil ― Protestou Braddon ― Sophie sugeriu a fuga muito antes que
provocasse esse escândalo. Já disse Patrick, possivelmente esta é a primeira vez que fui capaz de roubar uma
mulher dos irmãos Foakes, mas ela me adora realmente.
Interrompeu-se um momento, pensativo.
― No fundo ― Continuou ― Talvez não seja você quem deve ir procura-la, acredita que se zangará?
Patrick o olhou irritado. Às vezes se perguntava como era possível que seu amigo não tivesse matado
ao menos cem vezes.
― Certamente ― Disse ― De modo que seria melhor que enviasse um de seus criados. Em qualquer
caso me nego a ir.
Terminou a taça de conhaque.
― Impossível! Como poderia enviar a um lacaio ao dormitório de uma dama que vai transformar-se em
minha esposa? Não. Tem que ser você Patrick. Enviei uma mensagem a Alex mais não veio, suponho que não
recebeu.
― Foi ao campo.
― Já o vê! Preferiria que não fosse você quem se encarregasse desta missão, mas não tenho a ninguém
mais à mão. David não pode fazê-lo porque é vigário e além tampouco respondeu a minha mensagem.
Quentin esta pobre ainda em pior estado que eu.
― Pelo amor de Deus! ― Protestou Patrick.
― Sabe o que? ― Continuou Braddon esperançado ― Porá minha capa e meu bigode falso e ela nem
sequer saberá quem é.
Patrick se serviu outra taça.
― E porque deveria fazê-lo?
― Por quê? Pois em nome de nossa antiga amizade é obvio. Porque você é como um irmão para mim e
porque já conhece minha mãe: sabe do que seria capaz se lady Sophie se negasse a casar-se comigo.
Patrick suspirou. Braddon o olhava com os olhos de um cão que sabe que seu amo esconde um osso
atrás das costas.
Mas, depois de tudo, já que Sophie não queria saber nada dele por que não ia fazer de intermediário
para o homem com o que ela desejava casar-se?
Braddon não deixava de falar.
― Olhe! Olhe isto Patrick!
Tirou de um enorme saco um objeto que se parecia com um ouriço.
― O que é isso?
― Uma barba! Comprei-a na melhor loja de disfarces, Henslowe, a que sorte ao teatro do Drury Lane.
Também há uma capa. Toma.
Patrick fez uma careta. Se lady Sophie tinha vontade de manchar sua reputação fugindo o que mais lhe
dava? Trazia absolutamente sem cuidado, de modo que bem podia subir por essa condenada escada.
Braddon que não deixava de olhá-lo sentiu renascer suas esperanças.
― Vai fazê-lo! ― Exclamou ― Eu sabia, Patrick. Sabia que podia contar contigo. Maldição velho é
realmente um bom amigo. “Meu” amigo!
― Mas bem um louco, quer dizer. Quanto tempo tem que usar o gesso?
― Uns quinze dias.
― Acreditei que se necessitavam seis semanas para que o osso soldasse ― Disse Patrick.
― Pode ser que tenha razão. Mas agora seria melhor que fosse. Sophie espera a meia-noite e faltam
vinte minutos.
Patrick agarrou o ouriço negro que Braddon estendia. Dividia-se em duas partes: uma barba e um
bigode. Braddon entregou um frasquinho.
― Toma, esta é a cola. Pode usar o espelho da lareira.
Patrick desentupiu o frasco e franziu o nariz.
― Não! ― Disse.
― Ao menos ponha a capa ― Suplicou Braddon ― Tem capuz. Assim ela não verá quem é antes que
estejam fora. Não quero que comece a gritar e desperte toda a casa; provavelmente se sentirá contrariada ao
ver que é você quem vai procura-la e não eu.
Isso era ficar curto!
― Ademais ― Continuava ― Necessitará uma capa para envolvê-la uma vez que estejam no chão. Não
deve sujar a reputação de minha futura esposa se mostrando com ela na metade da noite.
Patrick esboçou um sorriso francamente divertido.
― Pede que entre no quarto de sua prometida e que leve ela em uma carruagem sem que saibam seus
pais e se preocupa por sua reputação?
Jogou a capa sobre os ombros e se olhou ao espelho.
― Meu Deus, pareço uma caricatura da Morte da Idade Média! Só me faltam o cinturão feito de corda e
uma foice!
Braddon mordeu o lábio inferior.
― A reputação de Sophie não sofrerá nenhum dano se ninguém os ver. Envolvera-a com a capa até que
estejam no carro para que ninguém possa ver seu rosto. Quer dizer, caso haja alguém na rua a estas horas.
Patrick suspirou de novo. A situação era das mais cômicas.
― Suponho que saberá o que fazer com ela uma vez que esteja aqui.
Braddon assentiu com a cabeça.
― Enviarei-a a casa de minha avó. Vive a poucas ruas daqui e agora esta passando uns dias no campo.
Já avisei à governanta quem amanhã pela manhã a levará de volta a sua casa sem que ninguém descubra nada.
A capa era imensa e Patrick se sentia extremamente ridículo. Mas só uma vez que se viu no jardim dos
Brandenbourg, diante a escada preparada, foi quando compreendeu o absurdo da situação. Tinha que bater
em retirada. Entretanto, quando já ia girar sobre seus calcanhares, ouviu uma voz apagada por cima dele.
― Lorde Slaslow!
Levantou os olhos para o pequeno rosto que aparecia pela janela.
― Bom, desça de verdade quer fugir ― Resmungou.
Era um estranho Romeu, pensou ele.
― Lorde Slaslow… Braddon, não posso ― Gemeu ela.
― Por quê?
A jovem considerou a escura sombra pensando que a voz de Braddon era estranhamente dura para ser
um homem tão doce. Devia estar zangado com ela por lhe obrigar a comportasse de uma maneira tão
escandalosa.
― Lorde Slaslow aceitaria subir para falar uns minutos? Por favor.
Sophie ouviu uma espécie de grunhido e o homem se aproximou da escada a qual ela se agarrou com
nervosismo. E se Braddon caísse no chão e despertasse os criados? A verdade é que não era especialmente
ágil.
Mas ele se movia com bastante segurança e ela se perguntou sorrindo se teria estado ensaiando todo o
dia. Quando ele estava chegando aos últimos degraus, ela recuou rapidamente e foi sentar se na beira da
cama. Tinha apagado as velas e só a luz da lua iluminava o quarto.
Nervosa viu seu prometido passar uma perna pela janela. Depois ele a viu sentada na cama e ficou um
momento imóvel. Ela tinha a sensação de que a estava olhando embora não podia ver seu rosto sob o capuz.
Por fim ele passou a outra perna e saltou ao interior do quarto. Não disse nada se limitando a apoiar-se
na janela.
― Suponho estará se perguntando por que não estou preparada para fugir com você ― Começou
Sophie ― A razão pela que pedi que subisse até aqui, lorde Slaslow, é que me comportei como uma tola. Vai
se zangar comigo, mas não posso descer por essa escada com você. Nem esta noite… Nem nunca.
Tentava distinguir o rosto de Braddon em vão. A capa era um chateio.
― Me senti muito desgraçada todo o dia, não parava de dar voltas na cabeça. Não queria lhe mandar
uma simples mensagem, mas não posso fugir. E tampouco quero me casar.
Ao ouvir estas palavras, seu prometido; cuja elevada estatura era quase preocupante; cruzou os braços.
― Por quê? ― Limitou-se a perguntar.
― Sei o importante que é para você casar-se por causa de sua mãe, e o sinto de verdade, mas… Não
estaria bem.
Ficou em silêncio muito incômoda. Entretanto o silêncio de seu companheiro a obrigou a continuar, e
todas as coisas que a tinham obcecado no transcurso do dia saíram desordenadas por sua boca.
― Olhe, acreditei que poderíamos nos levar bem casados por que… Porque não nos amamos. Isso não
é de tudo certo, já que tenho uma grande estima por você, Braddon… Ehh… Lorde Slaslow. Mas nós… Eu
não sinto por você o tipo de sentimentos que uma esposa deve sentir por seu marido.
Silêncio.
― Não? ― disse ele.
― Não.
― Ah.
Decididamente a voz de Braddon era estranha, mas grave do habitual e com um sotaque de veludo que
a punha nervosa. Possivelmente porque era a primeira vez que se encontravam a sós além do jardim. Essa
lembrança reforçou sua determinação.
― Recorda quando se negou a me beijar ontem de noite porque não pensava em mim “desse modo”?
Bem, pois um marido deveria pensar “desse modo” em sua esposa ― Concluiu com atrevimento.
Nenhuma resposta. Depois o homem com agilidade, franqueou os poucos passos que lhe separavam da
cama. Sophie, apesar de seus esforços não conseguia ver sua cara. Ele a agarrou pela nuca e se inclinou para
ela.
― Provemos ― Murmurou.
E seus lábios desceram sobre os de Sophie com firmeza.
― OH…
Braddon a estava empurrando para trás, ou possivelmente estivesse caindo ela sozinha. A boca de
Sophie se ofereceu de maneira espontânea e sentiu um repentino calor em seu interior. Ninguém a tinha
beijado assim além de Patrick. Então, disse Patrick Foakes não tinha nada de especial já que outro homem
podia despertar nela as mesmas sensações. Depois, simplesmente, deixou de pensar.
Patrick tampouco pensava, por fim a tinha onde tinha sonhado: em uma cama, e a tontura que
experimentava não deixava pensar em anda mais. Beijou-a até que ela começou a tremer de desejo, com os
dedos afundados em seus cachos escuros.
Deitado sobre ela cobriu-a de pequenos beijos, leves como asas de mariposa que lhe arrancaram uns
suaves gemidos. Ela tentou levá-lo para sua boca, mas ele seguia provocando-a beijando a face. Depois
voltou a tomar seus lábios enquanto acariciava seus seios por debaixo da camisola.
Um som estrangulado saiu do mais profundo dela e, entretanto… Entretanto ela não queria sentir isto
com Braddon. Inclusive embora o fosse capaz de despertar nela o desejo (o qual a assombrava) não queria
casar-se com ele.
Assim que se afastou murmurando:
― Não.
Os lábios dele a perseguiram e sua língua fez correr pelas veias dela fogo líquido.
― Não, não, não.
Finalmente encontrou forças para afastá-lo e se sentou olhando fixamente diante ela. Seu prometido
ficou deitado sobre um lado com o busto levantado.
― Isto não muda nada Braddon ― Disse ela ofegando ― Não sei por quê… Porque temos feito isto,
mas não desejo me casar contigo.
Ele estava acariciando os cachos que caíam como uma cascata pelas costas. Ao ver que ele não dizia
nada se voltou a lhe olhar.
E seu coração deixou de pulsar.
O capuz deslizou e a fraca luz da lua… Seu corpo já sabia que não era Braddon, mas agora ela podia
ver as largas pestanas, os cabelos negros e prateados, seu queixo caiu… Sua mente começou a assimilar o que
seu corpo tinha sabido desde o começo.
Emitiu um ligeiro suspiro como o de um menino dormindo.
Patrick sorriu languidamente sem deixar de acariciar seu cabelo. Depois a jogou brandamente para trás.
― Prometo ― Murmurou em seu ouvido ― Que eu penso em “desse modo” Sophie.
Sua língua brincava com o delicado lóbulo da orelha dela, provocando um incêndio em seu interior. Ela
relaxou quando ele tomou sua face entre as mãos para beijá-la de novo. Tudo estava bem, era algo
completamente natural. Ela já não pensava em disfarces, nem em fugas, nem em compromissos, nem em
matrimônios.
Quando passeou suas pequenas mãos pela face dele, Patrick também relaxou. Sophie estava oferecendo
com o encanto eterno da mulher seduzindo seu sedutor.
Com uma espécie de grunhido, ele rodou sobre ela e ela gemeu sob seu peso. Ele separou
imediatamente.
― Lamento querida, tinha esquecido quão frágil é.
Sophie não se tomou a moléstia de responder. Ela desejava sentir esse musculoso corpo em cima dela e
lhe agarrou pelos ombros oferecendo seus lábios.
Apoiado em um joelho, Ele se lançou ao descobrimento de seu corpo, despindo seus seios.
― Sophie É tão formosa... Tanto!
Sua boca seguiu o caminho de suas mãos. Agora ela se arqueava contra ele sussurrando incoerências
que atiçavam seu desejo. Ele levantou sua camisola e acariciou os sedosos cachos de seu sexo.
Ela se esticou e o segurou pelo pulso.
― O que esta fazendo?
Estava tremendo por efeito da paixão, mas também tremia de medo e ele ficou quieto sem retirar os
dedos. Ela permitiu que a deliciosa sensação se apoderasse dela e levantou para seu olhar carregado de
desejo.
― Não farei nada que você não goste carinho ― Disse ele depositando pequenos beijos em sua face
antes de apoderar-se de sua boca ao tempo que seus dedos se afundavam nela fazendo que perdesse a cabeça.
― Meu Deus! ― Murmurou ela de repente ― Está fazendo amor.
Patrick tentava pôr em ordem tudo que ia aprendendo sobre ela: suas inocentes carícias, o fato de que
saltasse cada vez que ele tocava um lugar novo de seu corpo, o assombro que podia ver em seus olhos
azuis… Tinha cometido o engano de acreditar que era tão perita nisto como deixavam transluzir suas
palavras e seus vestidos. Afastou-se e a beijou na ponta do nariz.
― Mal posso vê-la, preciosa minha. Posso acender uma vela?
Sophie o contemplou fascinada.
― Minha donzela disse que a lua era tão fina hoje como o bigode de um camundongo.
Patrick se inclinou para acender a palmatória que havia em cima da mesinha de noite e depois voltou a
sentar-se na cama.
― Esta me olhando! ― Disse ela entre tímida e zangada.
Colocou bem a camisola.
― Eu olhei como um homem olha à mulher que mais deseja no mundo ― Respondeu Patrick com
ligeireza.
Mas seu olhar era uma brasa ardente.
Tirou a capa sob a qual usava uma camisa com o pescoço aberto.
― Nunca tinha visto antes um homem sem gravata ― Disse ela um pouco estupidamente.
Um sorriso iluminou o rosto de Patrick e depois, com um rápido gesto, tirou a camisa por cima da
cabeça e a atirou ao chão. Sophie entrecerrou os olhos. A chama da vela dançou por um instante e umas
sombras alaranjadas brincaram com os músculos e sobre a bronzeada pele.
Ela abriu a boca e a voltou a fechar. Animada pelo olhar de seu companheiro se arriscou a pôr uma
mão no torso. Quando roçou seus mamilos igual ele fez antes com ela, ele agarrou ar com os olhos
brilhantes de desejo.
Ela esboçou um sorriso e voltou a fazê-lo, desta vez com as duas mãos. Podia notar o coração de
Patrick pulsando sob seus dedos.
Estava felicitando a se mesma por ter esse poder sobre ele, quando a agarrou em braços para depositá-
la sobre seus joelhos. Ele cheirava a noite do verão, uma loucura do verão que corria por suas veias como o
mais embriagador dos vinhos. Cheirava a homem. Ela conteve o fôlego e esperou.
Patrick fechou um instante os olhos para poder resistir a onda de paixão que ameaçava lhe arrastar.
Depois a beijou no nariz.
― Vai casar comigo.
Sua voz não deixava lugar a dúvidas.
Ela suspirou a modo de assentimento.
Ele lhe levantou o queixo.
― Sophie…
― Certo ― Murmurou ― Certo, casarei contigo.
Mas isso não lhe preocupava muito nesse momento; podia notar o calor nas bochechas e em todo seu
corpo.
― Patrick?
Ele se inclinou sobre sua boca.
― Não seria apropriado Sophie. Teremos que esperar.
Uma corrente de alegria se derramava por todo o corpo dela. Ia casar com um libertino, sim, mas um
libertino ao qual amava com toda sua alma. Passou a língua por seus lábios e deixou vagar suas mãos sobre o
peito de Patrick, descendo ao longo da flecha de cabelo que desaparecia sob o cinturão.
Levantou o olhar para ele. Sua expressão era sensual e uma promessa de desconhecidos prazeres
iluminava seus olhos. Ela sorriu.
― É uma criatura diabólica! ― Grunhiu ele.
― OH Senhor! ― Respondeu ela com uma encantadora careta ― E você é o arcebispo?
Ele voltou a acariciar seus seios e ela jogou a cabeça para trás.
Beijo a beijo se encontraram tombados na cama. E desta vez, quando ele lhe levantou a camisola, em
vez de protestar, estremeceu-se de antecipação.
Patrick se levantou um momento e voltou para seu lado tão nu como o dia que nasceu.
― Está nu! ― Exclamou ela.
Ele sorriu.
― Você também.
Ela se deu conta, confusa, de que efetivamente não tinha nada que a cobrisse, e seu corpo quase pareceu
o de uma estranha. Só podia sentir um torvelinho de sensações como nunca tivesse podido imaginar. Patrick
pousou uma cálida mão sobre seu seio e depois desceu para seu ventre. Ela não pôde seguir olhando.
Olhava a ele. De repente sua vozinha se elevou no silêncio:
― Isto não funcionará. Não parece que sejamos da mesma talha.
Patrick se incorporou sobre os cotovelos.
― Confia em mim, querida ― Disse antes de beijá-la uma vez mais, sedutor, convincente e com ternura.
― Me ocorre que acredito, sei julgar melhor minhas possibilidades…
― Tolices! ― Protestou ele ― Deus fez nossos corpos para que se acoplassem Sophie.
Ela morria de vontade de que ele continuasse com sua exploração.
― É certo ― Sussurrou ele contra sua boca ― Que não é muito agradável para uma mulher a primeira
vez.
Mas isso a ela tinha deixado de preocupá-la.
Jogou os braços ao pescoço e se içou para ele um silencioso rogo, o qual acabou por destruir as últimas
reservas de Patrick. Ele tomou sua boca e seu corpo ao mesmo tempo, afogando o grito dela. Depois ficou
imóvel.
― Lamento, lamento.
Não parecia senti-lo absolutamente, pensou Sophie esquecendo a dor e concentrando-se nas palavras de
amor que ele murmurava contra sua pele.
Depois ele começou a mover-se lentamente e, pouco a pouco, ela deixou de sentir dor. Outra sensação
ia impondo fazendo que lhe escapassem pequenos suspiros.
Quando ele se retirou e deslizou as mãos sob suas nádegas, foi ela a que se arqueou para lhe obrigar a
voltar para ela, concentrada completamente em um único objetivo que brotou em um molho de estrelas
dentro de seu ventre e percorreu todos seus membros como uma onda.
Patrick também se deixou ir afogando um enorme grito, dominado por um orgasmo como nunca tinha
conhecido antes.
― Sophie, Sophie, Sophie… ― Gemeu antes de desabar-se sobre ela.
Sobre a mesinha de noite, a vela oscilou sob a carícia da brisa que entrava pela janela.
Capítulo 9

Na outra ponta do corredor, a mãe de Sophie estava sentada muito reta em sua majestosa cama. Heloise
dormia sozinha desde que descobriu seu marido nos braços de uma das donzelas, dois meses depois de suas
bodas. Proibiu categoricamente seu acesso a seu dormitório e o marquês assentiu a contra gosto. Após os
únicos ruídos que turvavam seu sonho eram os de seu marido quando voltava na metade da noite.
Puxou o cordão de veludo situado na cabeceira. A marquesa odiava incomodar aos criados a horas
inoportunas mas normalmente dormia como um tronco, sinal de que tinha a consciência tranquila como
dizia seu marido em tom de recriminação. De modo que se tinha despertado ferrosamente tinha que ter sido
por uma boa razão. Tinha ouvido uma espécie de ofego e logo um grito; estava segura. Possivelmente
estivessem roubando a alguém sob a janela de sua casa e se sentia obrigada a ir em ajuda do desventurado.
Voltou a chamar.
Por fim apareceu sua donzela um pouco assustada e bastante despenteada. Fez uma reverência bastante
pouco convencional.
― Sim milady?
― Ouvi um ruído! ― Declarou Heloise friamente ― Diga a Caroll que vá ver imediatamente o que esta
acontecendo na rua.
A criada fez outra reverência antes de desaparecer. Heloise se manteve imóvel olhando fixamente o
dossel rosa da cama. Uma espantosa ideia passou por sua mente. E se seu marido tinha decidido trazer
mulheres a Brandenbourg House? Agora que pensava tinha parecido ouvir a voz de uma mulher. Sim, era
uma mulher. Isso lhe recordou o dia que a segunda donzela começou a trabalhar no vestíbulo sem avisar;
Heloise ainda se zangava ao pensar nisso. A duquesa de Beaumont acabava justamente de chegar para tomar
o chá e isso supôs uma humilhação que recordaria até o dia de sua morte.
Pensar na duquesa a levou a acordar-se de Braddon Chatwin quem segundo parecia recordar tinha
algum tipo de parentesco com ela. O homem era educado, um pouco tolo, de acordo, mas que homem não
era? E pertencia a uma boa família. Seria muito agradável ter uma relação próxima com a duquesa de
Beaumont.
Ouviu passos apressados no corredor.
― Milady miúda história! Caroll encontrou uma escada colada ao muro da casa no jardim.
Interrompeu-se pensando que era melhor que o mordomo fosse quem dissesse à marquesa que a escada
estava apoiada justo debaixo da janela de Sophie.
Heloise, depois de colocar a bata com decisão, dirigiu-se ao hall e depois aos aposentos de seu marido.
Estava segura de que a escada ia dar diretamente à janela de seu marido. Até aí tinham chegado as coisas: o
marquês levava mulheres a seu dormitório subindo por uma escada do mesmo modo que um vulgar
libertino teria se metido em um bordel.
Assim se viu totalmente desconcertada quando encontrou a seu marido dormindo placidamente e
completamente sozinho. Se por acaso fosse pouco, a janela de seu dormitório estava fechada e por sua
maneira de roncar devia ter bebido muito. Era evidente que não esperava visitas.
Aproximou-se para despertá-lo.
― Temos ladrões George. Ladrões.
O marquês se levantou de um salto com uma mecha de cabelo caindo sobre os olhos. Heloise se
sobressaltou George tinha envelhecido sem que ela se desse conta? Seu cabelo negro tinha agora mechas
brancas e recém-despertado tinha o aspecto de um ancião. Mas suas pernas ainda eram longas e musculosas,
constatou quando ele se levantou para colocar algo em cima. Aparentemente seguia dormindo sem camisola.
Dirigiu-se ao vestíbulo e se precipitou para a parte traseira da casa. Caroll a reteve segurando seu braço.
― Milorde…
Algo em seu tom congelou o sangue do marquês.
― A escada ― Continuou o mordomo ― A escada ficou debaixo da janela de lady Sophie.
― A escada ficou ― Repetiu o marquês perplexo ― ficou? Não pode falar inglês como todo mundo
Caroll?
O aludido se absteve de recorda-lo de suas origens francesas e se limitou a responder com firmeza:
― A parte alta da escada está apoiada contra o quarto de lady Sophie, milorde ― Acrescentou com certa
satisfação ― A janela está aberta.
George permaneceu um instante boquiaberto.
― Sua janela está aberta?
― Aberta ― Confirmou o mordomo ― Parece que lady Sophie fugiu milorde.
― Fugido…
Caroll assentiu energicamente com a cabeça. A marquesa estava seguindo os passos de seu marido, e o
mordomo não queria ter que ver-se com ela quando se inteirasse da notícia.
― Deveria ir ver se lady Sophie deixou alguma nota milorde ― Concluiu antes de desaparecer pela
porta de serviço.
Chegou à zona dos criados bem a tempo para reprimir uma gargalhada geral. A marquesa era tão severa
quanto às aparências que era hilariante imaginar a sua filha fugindo na metade da noite.
Ordenou a todos que não falassem do assunto, sem esperar realmente que lhe obedecessem, e enviou a
todos à cama comprovando que os dezessete lacaios estavam em seus dormitórios. Todos eles eram muito
atraentes e se lady Sophie fugiu com um deles, Caroll nunca tivesse podido superá-lo.
Durante esse tempo o marquês tinha permanecido como pregado no lugar em meio do vestíbulo.
Sua esposa se reuniu com ele levando uma vela na mão e coberta com uma bata de lã que a tampava da
cabeça aos pés.
― E bem? ― Perguntou de maneira agressiva ― De que se trata George.
Seu marido levantou a cabeça.
― Foi-se. Caroll diz que Sophie fugiu. Nossa pequena Sophie…
Sem dúvida pela primeira vez em sua vida, a marquesa abriu a boca de um modo muito pouco elegante.
― Não!
― Esta escada estava diante de sua janela e a janela está aberta ― Disse ele tristemente ― Suponho que
não haverá algum modo de tampar o assunto verdade?
Heloise voltou a fechar a boca.
― É impossível ― Murmurou ― Ela nunca nos teria feito algo assim. Que vergonha!
― Acredita que fomos muito indulgentes com ela? ― Perguntou George decomposto ― Às vezes
pensei em dizer algo sobre seus vestidos, mas logo pensava que estava ficando velho e que minhas ideias
estavam passadas de moda.
― Tolices! ― Replicou a marquesa sem muita convicção.
Dirigiu-se para a escada e se voltou.
― Vem George. Temos que olhar e ver se deixou alguma nota. Ao melhor não estão muito longe e
poderíamos os alcançar.
O marquês subiu docilmente os degraus atrás dela e percorreram juntos o corredor coisa que estavam
há vinte anos sem fazer.
Heloise se deteve um momento diante da porta antes de entrar no dormitório de sua filha. A janela, em
efeito, estava aberta e a brisa noturna movia as cortinas. O quarto estava sumido na escuridão.
― Vê alguma nota? ― Perguntou George.
Ela se dirigiu com a vela para a mesinha de noite. Nada. Nada tampouco em cima da lareira. Voltou-se
para continuar a busca, mas George estava muito calado e ela afogou um grito. O sopro apagando sem
querer a vela. A única luz provinha agora dos candelabros do corredor que Heloise tinha ido acendendo ao
passar.
― Temos que encontrá-la o mais rápido possível ― Declarou.
Agarrou a sua esposa pelos ombros e a empurrou para a porta. Ela teve a sensação de ser um montão
de roupa suja, sensação que se viu reforçada quando George, em sua pressa, fez-a se chocar contra a
ombreira da porta.
Uma vez no corredor se soltou de uma sacudida.
― Que demônios acontece milorde?
O marquês suspirou. Já se tinha terminado o “George”. A guerra havia tornado a começar.
― Temos que nos vestir e partir imediatamente Heloise. Se nos apressar temos uma oportunidade de
encontrá-los esta noite ou amanhã, antes que atravessem a fronteira. Sabe, fazem falta ao menos dois dias
para chegar a Escócia.
― Mas quem é ele? ― Gemeu Heloise ― Alguma vez proibi a Sophie que escolhesse marido se por
acaso mesma, de modo que por que ia fugir? Por que não deixou nenhuma nota? Seguro que me tem escrito
algo.
Estava dirigindo-se de novo ao quarto de sua filha, mas George a pegou pelo braço com firmeza.
― Não temos tempo Heloise. Vá se vestir. Se a encontrarmos a tempo, poderemos fingir que
simplesmente voltamos de uma festa que terminou muito tarde.
Arrastou-a ao seu dormitório.
― Toma, ponha isto.
Agarrou um vestido ao azar do armário de Heloise; esta olhou o vestido de baile de cor açafrão.
― Não posso.
Embora sua esposa fosse uma das mulheres mais estiradas de Londres, pensou George, qualquer podia
ver que estava à beira das lágrimas.
― Sim, que pode.
Soltou o cinturão da bata e a tirou. Heloise instintivamente se levou as mãos ao pescoço de sua
camisola.
― Tem cinco minutos ― Continuou ele em um tom que não admitia réplica ― Vou fazer que preparem
o carro e quando voltar quero te encontrar pronta para sair.
Ela assentiu em silêncio.
Quando ele voltou ela pôs um vestido de sarja azul com botões nas costas que não tinha podido fechar
sozinha.
― Não! ― Protestou ele. Tem que te pôr um vestido de baile. Só é uma e meia da madrugada Heloise.
Tem que parecer que voltamos de uma festa.
George fez que o vestido deslizasse por seus ombros deixando ao descoberto a branca pele de sua
garganta. Ela recuou.
― Saia e me vestirei ― Disse com voz um pouco velada.
Um irônico sorriso se desenhou nos lábios de George.
― Sabe Heloise que nunca havia tornado a pôr os pés nesta aposento desde que Sophie nasceu?
Convidou-me para ver a menina, só cinco minutos é obvio, e depois nunca mais.
Seus olhares se encontraram e depois ele se retirou aos seus aposentos.
Heloise colocou o vestido de baile e arrumou o cabelo como pôde, depois foi à salão do lado onde
George fechou os botões das costas sem dizer nada.
Caroll saiu de entre as sombras.
― A marquesa e eu vamos a uma reunião ― Explicou George ― Gostará de saber, Caroll, que se
preocupou por nada. Lady Sophie esta tranquilamente em sua cama.
O mordomo fez uma reverência murmurando que estava encantado com a notícia. Abriu a portinhola
da carruagem e os marqueses subiram ao rapidamente.
Ele tinha vontade de lhes perguntar onde iam a essas horas da noite e que queriam que fizesse com a
escada. Perguntava se realmente acreditavam que lady Sophie ia fazer soar a campainha às sete para que
subissem com seu chocolate quente.
Ao menos para uma dessas perguntas tinha resposta e Caroll ordenou ao Philippe que tirasse a escada
do jardim.
No quarto de Sophie, Patrick, apoiado em um cotovelo, olhava-a. Ela abriu seus olhos azuis escuros e
ele passou um dedo pelos lábios.
― Vamos ter que encontrar outra esposa para Braddon sabe? Não podemos o abandonar assim. É uma
pena que não tenha uma irmã querida.
― Ou que você a tenha ― Replicou ela travessa, ruborizando-se.
Estava na cama, nua, só coberta com um lençol e estava falando com o Patrick com o que ia se casar e
com o que acabava de…
― Seus pais estiveram aqui faz um momento ― Disse ele com um enorme sorriso― Você estava
dormindo como uma menina.
― O que?! ― Coaxou ela.
― Sua mãe não nos viu, mas seu pai sim. Rapidamente levou sua mãe para o corredor. Aparentemente
ela acredita que você fugiu porque estava procurando uma nota.
Ele deslizou a mão sob o lençol.
Ela estava concentrada em seu rosto.
― Quer dizer que meu pai nos viu e que não disse nada?
Patrick assentiu.
― Mas por quê? ― Exclamou Sophie abrindo muito os olhos ― Por que não te desafiou em duelo? Por
que não me chamou vagabunda?
― Vagabunda? De onde tirou uma palavra tão fora de moda, meu amor?
― Assim é como chama minha mãe a certas mulheres.
― Hum!
Passou uma perna por cima das de Sophie e esta avermelhou mais ainda.
― Acredito que estava dando uma oportunidade para sair daqui ― Disse ele.
Incorporou-se para beijá-la nos lábios, mas neste preciso instante a escada se separou da parede e
desapareceu em silêncio.
― Por desgraça ― Murmurou contra sua boca ― Parece que agora é iminente que me vejam.
Ela não respondeu. Seus dedos estavam explorando as musculosas costas de Patrick enquanto ele a
beijava apaixonadamente.
Com inapetência, ele se incorporou e se passou uma mão pelo cabelo.
― Devo ir, meu amor. É a mulher mais formosa que vi em minha vida.
― Entretanto quando me neguei a me casar contigo o mês passado, pareceu imensamente aliviado.
― Você acredita? Estava mais bem ofendido, se por acaso quer saber.
― Oh…
Isso explicava porque Patrick tinha subido pela escada em vez de Braddon. Não gostava de muito a
ideia de que seu futuro dependesse de uma rivalidade infantil entre dois homens, mas estava muito feliz para
preocupar-se de verdade.
― Além disso, por que me rejeitou?
Uma sombra nublou os olhos de Sophie.
― Não foi você. Eu estava… Enfim… Eu não via as coisas como são na realidade. Pensava… Não sei o
que pensava. Fui uma covarde ― Confessou.
Patrick, que estava pondo as calças, voltou-se a olhá-la, surpreso. Covarde? Estava a ponto de pedir que
explicasse quando lhe perguntou:
― Como vai sair? Tiraram a escala.
― Pelas escadas, naturalmente ― Respondeu Ele com uma altivez herdada de sua aristocrática família ―
Sentiria saudades que seu mordomo se atrevesse a me fazer perguntas sobre minha presença na casa.
― Onde acredita que foram meus pais?
― Acredito que passeassem um bom momento e depois voltarão aqui. Farão um montão de perguntas
quando se levantar amanhã, querida. E imagino que sua mãe estará zangada com seu pai.
― Isso é normal ― Fez notar Sophie.
Patrick a olhou com expressão inquisitiva.
― Ele se deita com muitas mulheres ― Explicou ela.
Ele se sentou na beira da cama, disfarçado com a enorme capa do Braddon.
Ela o olhou adormecida.
― Mamãe é muito sensível com o assunto das amantes. Mas não se preocupe, eu não direi nada.
― Espero que não seja muito duro para você― Zombou ele.
Ela estava quase adormecida.
― Tudo estará bem Patrick. Não sou o tipo de mulher que faz cenas. Agora que vou casar contigo não
vou começar a choramingar.
Patrick, com os olhos entrecerrados, olhou-a enquanto dormia. Acabava de dar-se conta de que ela não
tinha nenhuma confiança em sua fidelidade.
Acariciou a sedosa juba; certamente tinha doído quando ele tirou sua virgindade, mas não se queixou.
Nisso não tinha sido covarde. Entretanto não confiava nele por quê? O que é o que ela tinha ouvido contar
dele? Certamente alguma história sobre sua conduta antes que seu pai o enviasse ao estrangeiro. Entretanto
tinha aceitado casar-se com Braddon cuja reputação não era melhor que a sua. Mas estava esquecendo que
ela queria converter-se em condessa. Bem, pois agora seria duquesa.
Patrick apertou os dentes. Inclusive embora antes não tivesse querido casar-se com ele, agora não tinha
outra escola. Ela era dele.
Com a graça silenciosa de um felino se dirigiu para a penteadeira e agarrou o colar de pérolas que
Sophie tinha usado a outra noite metendo no bolso. Depois abandonou o dormitório fechando brandamente
a porta atrás dele. Desceu as escadas sem tentar dissimular o som de suas botas sobre o mármore.
Caroll tinha deixado Philippe de guarda no vestíbulo com a missão de receber aos marqueses quando
voltassem. O lacaio abriu os olhos de assombro ao ver um desconhecido com uma capa negra atravessando
tranquilamente o vestíbulo. Abriu a porta inconscientemente.
Patrick dirigiu a ele ao passar um olhar divertido.
― Eu não estive aqui.
Philippe assentiu com a cabeça. Não em vão tinha nascido na França.
― Entretanto é possível que um ladrão se introduzisse na casa ― Anunciou Patrick.
― Um ladrão milorde?
― Desgraçadamente. Há um ladrão em Londres que vem com uma escada, põe-na debaixo das janelas
abertas e rouba as joias que estão sobre as penteadeiras. É muito provável que tenha estado aqui esta noite.
Ao Philippe entraram suores frios. Que se supunha que devia fazer? O aristocrático olhar lhe punha um
arrepio.
― Possivelmente devêssemos chamar à polícia ― Sugeriu fracamente.
Viu-se recompensado com um frio sorriso.
― Essa seria uma boa ideia ― Disse Patrick descendo os degraus do alpendre.
Subiu em uma carruagem que o esperava não longe de ali e Philippe se atreveu por fim a olhar o
bilhete que lhe tinha deslizado na mão.
― Merda!
O desconhecido acabava de lhe dar mais dinheiro do que ganhava em um ano; o suficiente para tirar
sua irmã pequena da família em que estava servindo e pô-la como aprendiz em uma loja de peles.
Experimentou uma imensa gratidão.
Depois se dirigiu correndo à zona dos criados recordando a história do ladrão da escada.
Foi por isso que quando uma extremamente contrariada marquesa e seu marido voltaram para sua casa
uma hora mais tarde, encontraram com todas as luzes da mansão acesas e vários policiais diante de sua porta.
Heloise desceu do carro completamente desorientada. Sua filha estava ali, vestida apressadamente e com
o cabelo recolhido com uma singela fita. Era evidente que não fugiu. Seu marido a empurrou pondo uma
mão na sua cintura.
― O que está acontecendo aqui? ― Perguntou o com tom autoritário.
Os olhos do chefe de polícia brilharam ao ver que por fim aparecia o dono da casa.
― houve um roubo ― Declarou Grenable dando-se importância.
― Um roubo?
― Sim milorde. Roubaram a sua filha um colar de pérolas de grande valor.
― Pérolas?
A marquesa parecia chateada.
― Sim milady. Desapareceu um colar de pérolas ― Insistiu Grenable antes de voltar-se para o marquês
― Já houve antes roubos desse tipo. Encontramos as marcas de uma escada sob a janela de sua filha e
numerosos rastros de sapatos, de modo que acredito que se trata de uma banda de malfeitores. Um deles
subiu sem fazer ruído pela escada e se apoderou do colar que estava em cima da penteadeira pedindo a
gritos que o roubassem ― Anuiu dirigindo-se Sophie agachou a cabeça confusa.
Estava começando a entender o que acontecia, depois das sucessivas surpresas da última hora.
Encontrou-se sozinha na cama, despertada bruscamente por uma histérica Simone. A donzela
aparentemente tinha comprovado que tinham roubado na casa ou possivelmente tinha sido um lacaio; não
estava segura. Entretanto a surda dor que sentia entre as pernas a tinha distraído do desaparecimento do
colar. E Patrick tinha desaparecido sem nem sequer despedir-se pelo que ela podia recordar.
A voz de Grenable, um homem baixinho e gordinho com uma suja barba, tirou-a de seus devaneios.
― Terei que interrogar a sua filha. Não entendo porque estava aberta sua janela quando a donzela diz
que ela a fechou antes de retirar-se.
Sophie engoliu seco. Sua mãe a estava olhando com o cenho franzido e inclusive seu pai tinha uma
expressão severa. Parecia estar representando uma obra sem haver aprendido o papel.
― Necessitava um pouco de ar ― Disse com voz tremente.
Ao surpreender um olhar de admiração nos olhos de seu pai, desfez-se em lágrimas. Chorava porque
Patrick não se despediu dela e porque estava assombrada por haver-se deixado seduzir tão facilmente.
Grenable, incômodo por havê-la posto nesse estado derrubou seus nervos em seus subordinados.
O marquês ficou imediatamente ao lado de sua filha. Heloise foi um pouco mais lenta em reagir,
estranhava ao ver Sophie chorando, o qual não fazia que ela soubesse desde que tinha seis ou sete anos.
― É a impressão ― Disse George cruzando seu olhar com a de sua esposa ― É aterrador pensar que
um criminoso pôde penetrar em seu dormitório na metade da noite.
Heloise olhou Grenable com ferocidade e este retrocedeu um passo.
― Não vejo realmente como minha filha poderia lhe ajudar a deter o ladrão ― Declarou com tom
cortante ― Sugiro que melhor investigue pelos arredores.
A marquesa tinha razão, pensou o policial enquanto ela levava a sua filha. Essa janela aberta
simplesmente tinha parecido algo estranho. Seria melhor que voltasse para o Bow Street e enviasse uma
descrição do colar aos melhores peritos.
― Sei, que seja ― Disse ao marquês ― Não tenho nada mais que fazer aqui. Entretanto, milorde, devo
lhe advertir que as possibilidades de encontrar o colar são poucas.
O marquês, notavelmente tranquilo, apertou a mão de Grenable.
― Faça tudo o que possa. Não serei eu quem critica aos agentes da polícia. São vocês muito eficientes
quando se trata de deter os malfeitores.
― Sim. Esforçamo-nos milorde.
Grenable podia estar agradecido a sua boa estrela. Ao menos esse par do reino não formaria um
escândalo se não encontravam o colar, pensou aliviado.
O mordomo da família, Caroll, sentiu-se ainda mais aliviado quando se deu conta de que não lhe foram
despedir por haver-se atrevido a sugerir que lady Sophie fugiu.
― Não de mais voltas Caroll ― Disse amavelmente o marquês ― Era uma dedução lógica. Mas eu já
disse que lady Sophie estava segura em sua cama não é assim? É uma lástima que sua mãe e eu não nos
inteirássemos do roubo quando fomos ao baile. Enfim, o mais importante é que lady Sophie estivesse em seu
dormitório. Bem, boa noite Caroll.
O marquês se afastou esfregando as mãos.
Estranho comportamento para um homem que acabava de perder uma joia de tanto valor pensou o
mordomo. Mas possivelmente para ele só se tratasse de uma bagatela.
Capítulo 10

Na manhã seguinte, enquanto chegava a Brandenbourg House, Patrick Foakes estava um pouco cansado.
Tinha estado em pé quase toda a noite. Braddon tinha tomado muito mal a notícia da ruptura de seu
compromisso; sua veemente reação tinha surpreendido inclusive Patrick. Nunca esqueceria o momento em
que Braddon deu procuração de uma garrafa de porto para romper a engessa da perna. Tinha acreditado que
seu amigo ficou louco mais simplesmente estava muito zangado.
Sempre ficava nervoso quando se tratava de sua mãe, pensou Patrick enquanto esperava no vestíbulo, e
o matrimônio de Braddon era algo prioritário para Prudente Chatwin.
O mordomo dos Brandenbourg voltou e lhe fez uma majestosa reverência.
― O marquês o receberá na biblioteca.
A estadia não tinha mudado nada desde sua última visita no mês anterior. Excetuando possivelmente a
atitude do marquês de Brandenbourg. A vez anterior tinha sido recebido calorosamente; Patrick recordava
ter se surpreendido ver tão contente quando tinha posto a reputação de sua filha em dúvida na festa da noite
anterior.
Mas agora, o olhar de George era frio como o fio. Quando Patrick entrou na biblioteca, o marquês se
despediu de Caroll fazendo um gesto com a cabeça e os dois homens permaneceram em silêncio até que o
mordomo teve fechado as pesadas portas de carvalho.
Patrick sustentou o olhar zangado de seu futuro sogro enquanto este se dirigia para ele.
― Vim para pedir a mão de sua filha ― Anunciou com calma.
Então George fechou o punho e o golpeou. O murro alcançou em plena mandíbula e foi seguido
imediatamente por outro ao lado do olho. Patrick recuou, agarrou-se ao escritório e depois se endireitou.
O marquês ofegava.
― Não acreditei que me deixasse fazê-lo ― Disse simplesmente.
― Merecia isso.
George se sentia um pouco ridículo. Já tinha passado da idade das brigas. Dirigiu-se para um casal de
poltronas que havia ao lado da lareira e se deixou cair em um deles sem tão sequer voltar-se para olhar se
Patrick o seguia. O jovem se sentou na outra poltrona.
― Ontem subi por essa escada para ajudar a sua filha a fugir com o conde de Slalom ― Disse
tranquilamente.
O rosto do marquês avermelhou ainda mais se isto era possível.
― Pelo amor de Deus! O que está me contando agora?
― Fugia ― Prosseguiu Patrick fechando os olhos ― Foi ideia de lady Sophie e ela queria levar a cabo
seu plano. Entretanto Slaslow se opunha à ideia e quando ontem quebrou uma perna, pediu-me que levasse a
sua filha à casa de sua avó. Ali ele esperava convencê-la de que um rapto não era nem desejável nem
adequado em vista de seu estado.
O marquês continuava em silêncio.
― Quando cheguei ao dormitório de lady Sophie ela já tinha decidido romper seu compromisso com
Slaslow.
― Assumo que agora ― Interveio ironicamente George ― Ela terá mudado de opinião sobre sua oferta
de matrimônio.
― Isso acredito, em efeito.
― Isto vai provocar um bom escândalo.
― Menos que se sua filha fugisse com o conde de Slaslow ― Respondeu Patrick.
George, com o coração em um punho, contemplava as chamas da lareira. Não só Sophie tinha quebrado
o compromisso com um conde, mas sim, além disso, ia ver-se obrigada, se ele não se equivocava, a casar-se
rapidamente.
― Não durará muito ― Continuou Patrick ― Vou levar a minha esposa para fazer uma viagem de
noivos muito comprida. Quando voltarmos, a alta sociedade sem dúvida terá encontrado outro escândalo ao
que fincar o dente.
― Mas o que vou dizer a minha esposa? Vai fazer muitas perguntas sobre a precipitação destas bodas,
sobretudo depois do anúncio do compromisso de Sophie com outro homem.
― Por que não dizer a verdade?
― Céus não! Heloise parece uma mulher dura mais na realidade é bastante ingênua. Seria um duro
golpe para ela inteirar-se de que nossa filha foi seduzida antes do matrimônio.
Patrick experimentou um grande sentimento de culpa. À luz do dia ele mesmo se surpreendia por seu
comportamento. O que era que se aconteceu com ele? O que tinha Sophie para desencadear nele uma paixão
assim? Tinha quebrado todas as regras que o tinham ensinado da infância.
― Diga à marquesa que se trata de um matrimônio por amor.
― Um matrimônio por amor! ― Riu George ― Minha mulher nunca acreditou nessa estupidez!
― Então por que evitou que me visse na cama de lady Sophie na passada noite?
― Já disse isso; ela não teria podido suportar. Haveria dito que Sophie se parecia comigo.
― Cuidarei bem dela ― Prometeu Patrick.
― Esta bem, está bem ― Grunhiu o marquês ― Sempre pensei que ela seria feliz contigo, embora
esperava que se casasse com um moço mais tranquilo. Braddon e você se parecem muito não é certo? Os
dois são uns malditos libertinos.
Patrick conteve um sorriso. Era uma divertida acusação vinda do homem que mais rumores provocava
entre a alta sociedade. Nem sequer tentou convencê-lo de que não tinha intenção alguma de ter uma amante
depois de casar-se com Sophie. As aventuras extraconjugais de George demonstravam que no fundo os
libertinos nunca se reformavam.
― Minha esposa tem um gênio endemoninhado ― Continuou o marquês ― E algumas vezes Sophie viu
mais do que deveria.
Patrick se levantou sem que nada em sua atitude revelasse o interesse que despertavam as palavras do
marquês.
― É uma boa garota minha Sophie.
George se dirigiu para a campainha para ordenar que dissessem a Sophie que fosse à biblioteca.
― É uma boa garota ― Repetiu ― Me tirou de um montão de apuros quando sua mãe se transformava
em uma Fúria.
― Como conseguia Sophie ajudá-lo nessas circunstâncias? ― Perguntou Patrick.
― Punha um sorriso mais doce que o mel e dizia que eu a tinha levado às corridas ou algo pelo estilo.
Acredita que possa ter urdido a fuga por minhas indiscrições? Admitiu-o em sua cama ontem de noite
porque eu sou…
― Assumo toda a responsabilidade do acontecido. Lady Sophie é inocente. Não tinha nem ideia do que
podia acontecer quando entrei em seu dormitório.
― De verdade? Ela…
As portas se abriram deixando passar ao Caroll.
― Milorde?
― Diga a lady Sophie que se reúna conosco.
Caroll olhou ao visitante com curiosidade. Todo mundo sabia que tinha pedido a mão de lady Sophie e
que o tinha rejeitado. Também sabiam que tinha anunciado seu compromisso com o conde de Slaslow, de
modo que não entendia o que fazia Foakes na casa.
Sophie desceu lentamente as escadas embelezada com um vestido de manhã de pescoço alto e adornado
com flores de tecido. Era um traje que só tinha usado uma vez antes de esquecer-se dele já que era muito
conservador. Mas esta manhã, terrivelmente confusa, queria demonstrar a Patrick e a seu pai que não era
uma mulher leviana embora se comportou como tal a noite anterior.
Pela enésima vez desde que se despertou sentiu que ruborizava. Não sabia se atreveria a entrar na
biblioteca. O que devia estar pensando seu pai? Tinha um doloroso nó no estômago, mas não havia forma de
escapar: Caroll já estava abrindo as portas da biblioteca e seu pai estava dentro.
Levantou seus olhos para ele a contra gosto e o que leu em seu rosto lhe deu um pouco de coragem.
Não parecia estar a ponto de expulsá-la de casa.
― Sophie ― Disse zangado ― Parece que deve se casar com o Patrick Foakes em vez de fazê-lo com o
conde de Slaslow.
Ela agachou a cabeça.
― Sim papai.
― Vamos ter que encontrar a forma de dizer a sua mãe ― Suspirou o marques ― Como acabo de dizer
a Foakes, não quero que ela saiba a verdade porque morreria de vergonha.
― Sim papai.
― Bem. Vou deixá-los as sós ― Grunhiu George ― Mas não muito tempo ― Trovejou surpreendendo
o olhar divertido de seu futuro genro.
Será que nada perturbava a esse menino? Tinha um olho quase completamente fechado e estava
formando um hematoma na mandíbula, mas parecia estar tão as suas largas como sempre. Era muito
irritante. George saiu da biblioteca quase afogando de indignação.
Ela fez uma profunda inspiração mais estava muito envergonhada para levantar a cabeça. Ouviu que
Patrick se dirigia para ela.
― Esta preciosa esta manhã Sophie. Uma nova Sophie para falar a verdade, tímida, pudica…
Ela olhou por fim com um brilho perigoso nos olhos.
― Não zombe de mim!
Ele a agarrou pelo queixo.
― Por quê? Nosso matrimônio não funcionará se formos incapazes de rir um do outro, meu amor.
Ela vacilou ao ver as marcas no rosto dele.
― O que te aconteceu Patrick ― Perguntou acariciando sua têmpora.
― O que merecia nada grave.
Agarrou os dedos dela e os levou aos lábios beijando depois a palma de sua mão com ternura.
― Pedi de forma oficial sua mão a seu pai disse maliciosamente.
― De verdade?
Decididamente sua mente não funcionava bem esta manhã.
― Quer casar-se comigo lady Sophie?
Apenas o escutava. A boca de Patrick estava acariciando o centro da palma de sua mão e suas pernas se
converteram repentinamente em algodão.
― Sim ― Respondeu ela em voz muito baixa.
Ele franziu o cenho.
― Sinto muito que nossa atividade de ontem de noite tenha impedido de escolher a seu futuro marido
mais estou seguro de que nos daremos razoavelmente bem, tão bem como o haveria feito com o Braddon.
O que queria dizer com isso? Como ela ia ser “razoável” vivendo sob o mesmo teto que ele?
Compartilhando a mesma cama? Só de pensar estremecia de antecipação.
O que ela desejava era que a agarrasse de novo entre seus braços.
Como se ele tivesse adivinhado seus pensamentos, atraiu-a para si.
― Sophie ― Insistiu ― Quero me desculpar por te impedir que se case com o Braddon. Sei que tinha
muita vontade de ser uma condessa.
Sem lhe dar tempo a responder se apoderou de seus lábios apaixonadamente.
Ela não protestou. Enquanto ele brincava com seus cachos e as fitas de seu cabelo desfazendo todo o
trabalho de Simone, ela se fundiu com ele tremendo e jogou os braços ao pescoço. Quando sua língua tocou
timidamente a do Patrick, ele lançou um juramento e recuou um passo.
O pai de Sophie havia sentido divertido se houvesse visto nesse estado. Já não havia nada de civilizado
nele. Seus olhos estavam obscurecidos de desejo, custava respirar e em quão único podia pensar era em
tombá-la sobre o tapete para fazer amor.
― Meu Deus! ― Disse passando uma mão pelo cabelo.
Encontrou-se com o olhar um pouco perdido de Sophie e depois pousou seus olhos em sua boca e foi
incapaz de conter-se. Apertou-a contra a evidência de seu desejo.
― Tem que se casar comigo imediatamente ― Resmungou ― Morrerei se não puder te levar ao meu
dormitório.
Sophie sorriu e deslizou de novo um braço ao redor de seu pescoço.
― Não vejo porque não podemos esperar uns meses ― Disse com voz melosa acariciando seus lábios
com o dedo.
― Esquece isso meu amor ― Replicou Patrick ― Estamos obrigados a fazê-lo.
― Por culpa disto? ― Perguntou ela provocadora esfregando-se mais contra ele.
― Não! ― Gemeu ele.
― Então por quê?
Ele a afastou com suavidade.
― Mantenha a uma distância adequada, pequena provocadora. Pela passada noite evidentemente.
Poderia estar grávida Sophie.
Ela avermelhou.
― Um filho…
Certamente ela sabia, tinha ouvido sua mãe queixar-se muitas vezes da ausência de seu pai na habitação
de matrimônio e do fato de que ela não tivesse tido outro filho. Isso por não falar das conversas mais cruas
das donzelas que falavam sem descanso de distintos métodos anticoncepcionais.
― Teremos que ser mais prudentes no futuro. Espero que não seja como a irmã de Braddon que está
obcecada com a ideia de ter filhos.
Ela vacilou. Não estava obcecada, mas… O que é o que ele queria dizer? É obvio que ela queria ter
filhos! E todos os homens desejavam ter filhos varões não? Inclusive Braddon havia dito que precisava ter
um.
― Não te interessa ter filhos milorde?
― Pelo amor de Deus, me chame Patrick! Depois do que acontecido entre nós…
Sophie se ruborizou ao ver o brilho malicioso dos olhos dele.
― Não, os meninos não me interessam especialmente ― Continuou dizendo ― Me dá igual não ter
nenhum.
― Mas… Nem sequer um herdeiro?
Ele esboçou seu sedutor sorriso.
― Não tenho um título que conservar de modo que para que preocupar-se? Além disso, meu irmão tem
dois filhos e terá mais estou seguro. De modo que haverá muitos membros de minha família para herdar
minha fortuna.
Sophie estava desconcertada.
― Não quer ter filhos?
Patrick a agarrou da mão para levá-la até um sofá e se sentou a seu lado.
― Tem muito desejo de ser mãe? Se for assim sinto ainda mais o que passou ontem à noite. Acreditava
que compartilhava a atitude de Braddon nesse aspecto. Que eu saiba a poucas mulheres de sua condição
gostam dos meninos.
Sophie já não sabia que dizer. Possivelmente deveria confessar a pontada de inveja que sentia cada vez
que via Charlotte com sua filha.
― Sempre acreditei que teria filhos ― Disse com uma voz quase inaudível.
Patrick tentou ver seus olhos mais ela olhava com obstinação o desenho de sua saia.
― Possivelmente possamos ter um ― Admitiu ele ao fim ― Não quero ser um déspota Sophie. Se você
quer ter um filho, teremos.
Só um? Como filha única sempre tinha sonhado tendo uma família numerosa. Certamente não dez
filhos como tinha afirmado diante da irmã de Braddon, mais desejava ter mais de um. Ela tinha passado toda
sua infância na creche sem ninguém que brincasse com ela.
Mas o certo era que tinha arruinado todos seus planos em vinte e quatro horas. Tinha jurado a se
mesma não casar-se nunca com um vivedor e ia se casar com o pior dos libertinos. E, além disso, só teria um
filho.
Levantou a vista e seus olhos se encontraram com o sombrio olhar dele e se decidiu de tudo. Era
melhor casar-se com Patrick embora tivesse que o compartilhar com outras mulheres. E se só tinha que ter
um filho, que assim fosse. Amaria de tal modo que nunca se sentiria abandonado.
Patrick parecia estar esperando com ansiedade e dirigiu um sorriso tranquilizador.
― De acordo, um filho Patrick.
O soltou um enorme suspiro de alívio. A morte de sua mãe a consequência de um parto lhe afetou
profundamente ao contrário que a seu irmão Alex. Patrick estava apavorado diante a ideia de ver sua esposa
com os dores do parto. Alex em troca, inclusive depois de fazer visto Charlotte às portas da morte quando
nasceu Sarah, pensava ter mais filhos, ele por sua parte não ia arriscar a vida de sua mulher para ter filhos.
Sob seu ponto de vista não merecia a pena.
Apertou as mãos do Sophie entre as suas.
― Você gostaria de fazer um cruzeiro em meu veleiro como viagem de núpcias querida? Temo que
Napoleão não nos deixará ir ao continente.
De repente ela afastou as mãos.
― Não tinha que se casar com Daphne Blanc? ― Perguntou.
Ele levantou uma sobrancelha.
― A francesinha? Pode que a tenha comprometido mais te comprometi muito mais não?
Ela o olhou com surpresa.
― Pelo amor de Deus! ― Exclamou Patrick ― É obvio que não comprometi Daphne Blanc. Caiu um
inseto nos olhos e terá que curar-se. Se tivesse estado comprometido com Daphne não teria ficado em seu
quarto na noite passada Sophie.
Ela esboçou um sorriso cheio de incerteza. Sentia-se feliz de saber que Patrick não tinha tido intenção
de casar-se com Daphne, mas não acreditava a segunda parte do que havia dito. É obvio que teria ficado em
seu quarto. Depois de tudo ela tinha se jogado em seu pescoço. Os detalhes da noite anterior voltavam para a
mente com força. Em que estaria ela pensando para pedir a um homem que a fosse procurar a seu
dormitório? Certamente tinha perdido a cabeça.
Mas para falar a verdade a quem ela esperava era Braddon e este nem sequer tinha desejo de beijá-la.
Com ele não teria acontecido isto.
Patrick a olhava com um sentimento de frustração. Era evidente que lhe considerava um homem capaz
de comprometer a duas mulheres na mesma semana.
Ela sorria mais seus olhos mostravam uma total falta de confiança nele. Bem, pois teria que aprender a
confiar!
― O que te parece na quinta-feira dia quinze? ― Sugeriu ele.
― Tão cedo?
Patrick estava tão surpreso como ela por suas palavras. Não haveria nenhum perigo por esperar um mês
ou inclusive seis semanas, mas tinha muita vontade de ter Sophie para ele sozinho.
― De todos os modos será um escândalo. Por que não nos casar e sair de lua de mel antes que a alta
sociedade compreenda que quebrou seu compromisso com Braddon?
Sophie permaneceu pensativa.
― Terei que enviar uma mensagem ao conde de Slaslow.
Ele sorriu.
― Sim, em efeito é geralmente uma cortesia informar ao noivo de que vai se casar com outro. Mas não
esta obrigada a fazê-lo. Eu já disse ontem à noite.
― Ontem à noite! Contou tudo?
― Não. Simplesmente lhe expliquei que tinha decidido se casar comigo melhor que com ele ― Disse
cortante.
Ela teve frio de repente.
― Sinto muito ― se desculpou ele ― Não queria insinuar que se gabou… Como reagiu?
Patrick entrecerrou os olhos. Acaso lamentava Sophie não casar-se com Braddon? Possivelmente seu
amigo tinha tido razão ao dizer que estava louca por ele.
― Evidentemente estava contrariado. Mas maldição Sophie, nós não podemos fazer nada! ― Exclamou
levantando-a do sofá ― Você é minha, não posso te entregar ao Braddon. Não é possível voltar atrás.
Os olhos de Sophie se encheram de lágrimas. Estava esgotada pela falta de sono e pelo girou
incompreensível que estava dando a conversa. Quando Patrick a atraiu para sim, lhe ofereceu seus lábios para
que a consolasse.
― Me beije, por favor, ― Sussurrou ela.
Sem fazer-se de rogado ele a empurrou contra um assento de respaldo alto e sentiu como respondia
apaixonadamente a suas carícias. Ele desfrutou de seus suspiros de prazer e de seu abraço. Finalmente o
amor que ela sentia por Braddon carecia de importância.
Alguém deu um discreto golpe na porta e se separaram. Patrick contemplou o rosto ruborizado de
Sophie, seus lábios inchados e seus trêmulos dedos. As arrumaria de algum modo para que ela se
apaixonasse por ele e para que esquecesse Braddon, prometeu a si mesmo, atenuando desse modo a culpa
que sentia por havê-la despojado de sua virgindade.
Uns minutos depois, quando a jovem tinha subido a falar com sua mãe, ele se sentou ao lado do
marquês para falar dos termos do contrato de matrimônio. Deu algumas cifras que fizeram que os olhos do
marquês se abrissem incrédulos.
― Senhor! Acaso é um nabab?
― Um pouco parecido ― Respondeu Patrick lacônico.
George nunca tinha desejado de maneira especial que sua filha se casasse com uma fortuna; para ele era
mais importante que seu genro fosse de boa família e que a amasse. Entretanto nenhum pai poderia deixar
de estar feliz ao comprovar que sua filha ia viver na opulência.
― Vou pedir a meu notário que ponha tudo por escrito ― Concluiu George ― Lamento ter te batido ―
Falou constrangido.
― Eu mereci ― Repetiu Patrick com um sorriso ― Felizmente tenho um tio que é arcebispo e vou
pedir uma licença especial esta mesma tarde.
O marquês se surpreendeu.
― Uma licença?
― Decidi que a melhor maneira de evitar os inconvenientes de um escândalo era nos casar o mais
depressa possível e abandonar Londres para fazer uma comprida viagem de núpcias.
― Já vejo ― Disse George quem em realidade não via nada absolutamente.
― Todos consideraram um matrimônio por amor ― Explicou pacientemente Patrick.
― Já vejo.
Patrick vacilou um momento sem saber se devia falar com ou futuro sogro do título que sem dúvida ia
lhe conceder o Parlamento. Finalmente decidiu esperar ao anúncio oficial. Inclinou-se diante do marquês.
― Posso voltar a lhe visitar amanhã milorde?
― É obvio. Veem jantar para então já terei os contratos redigidos. Depois poderá se casar com minha
filha quando quiser.
― Obrigado milorde.
George o olhou enquanto ia embora, vagamente desorientado pelos acontecimentos da manhã.
Suspeitava que efetivamente fosse um matrimônio por amor; fixou-se na forma em que brilhavam os olhos
de Patrick quando declarou que queria casar-se com o Sophie sem tardança.
Estirou os lados de sua jaqueta pensativo. Recordava como se fosse ontem o ardente desejo que tinha
experimentado por Heloise, as horas que se passou tentando convencê-la de que fugisse com ele. Mas não,
ela se aferrava às conveniências.
Sorriu com nostalgia ao recordar que quase chorava pelo desejo insatisfeito naquela época.
Mas tudo mudava na vida.
Capítulo 11

Sophie abriu a porta do quarto dos meninos para encontrar Charlotte, condessa de Sheffield, sentada em
um tamborete perto da lareira, enquanto que uma pequena lhe penteava os escuros cachos.
― Pippa! Ai, querida! Tem que ser mais suave se quer se transformar em donzela.
Sophie rompeu a rir.
― Não te parece que Pippa tem muita ambição Charlotte?
A jovem condessa se virou contente.
― Olhe quem veio a nos ver Pippa ― Exclamou.
A “futura donzela” soltou a escova e se lançou contra as pernas de Sophie.
― Lady Sophie! Lady Sophie!
Esta pegou à filha de Charlotte nos braços.
― Se continuar crescendo deste modo, Pippa, não poderei te levar nos braços.
A menina se agarrava a seu pescoço.
― Sabe que logo vou fazer três anos lady Sophie?
― De verdade? E eu que pensava que seu aniversário demoraria um tempo ainda. Até que o verão
viesse e se voltasse a ir.
― O verão chegará logo ― Respondeu a pequena muito séria ― Quase estamos no Natal e logo já é
verão.
Sophie voltou a sorrir.
― Como é que sabe tanto Pippa?
A pequena se pavoneou muito orgulhosa.
― Às vezes teria gostado de nascer pássaro, sobretudo uma andorinha, mas mamãe diz que gosta mais
assim.
Estava puxando a beira de seu vestido rosa.
Sophie beijou a ponta do seu nariz e a deixou no chão.
― De modo Charlotte que prefere que sua filha use um vestido a penas.
Pippa se deixou cair sobre o tapete aos pés de Charlotte.
― As mamães são assim, lady Sophie. Gostam que seus filhos tenham vestidos e que não se sujem. Já
verá quando você os tenha!
― E se for um menino?
― Um menino?
Pippa franziu o cenho desconcertada. No quarto dos meninos não se falava muito de meninos.
― Mamãe e Sarah são garotas ― Disse ― Katie também.
Sarah era o bebê e Katie a babá.
― Sei Pippa. Mas se tiver um menino possivelmente não goste de ter vestidos.
― Terá uma filha! ― decretou Pippa ― Acredita que será logo?
Charlotte afogou uma gargalhada.
― Não! ― Exclamou Sophie ― Não, não acredito que tenha nenhum filho em um futuro próximo, seja
menina ou menino.
― Por quê? Mamãe disse que tinha dado uma festa para celebrar seu compromisso, então poderá viver
em sua própria casa. Com quem vai se casar? É bom?
Sophie se sentou ao lado do Charlotte e da menina.
― Deveria me casar com um homem muito bom que se chama Braddon…
Com a extremidade do olho viu que sua amiga levantava a cabeça com interesse.
― E esse amável senhor Braddon não quer ter uma menina pequena?
― Quando a Pippa coloca uma ideia na cabeça ― Interveio Charlotte ― Não a solta facilmente. Você
disse “deveria”?
Sophie evitou seu olhar.
― A verdade é que mudei de opinião, não me vou casar com Braddon. De modo que é melhor que vá
procurar um menino em outra parte.
Charlotte pôs um sorriso triunfante enquanto Pippa ia dar um tapinhas na mão de Sophie.
― Olhe, já que não vai ter uma filhinha logo, poderia levar Sarah para sua casa. Mamãe tem duas filhas
de modo que pode te dar uma.
― Pippa, já te disse que deixe de dar de presente a sua irmã a todo mundo. Você não é primeira em se
beneficiar de sua generosidade Sophie. Já deu de presente a Sarah à irmã de Katie, à maioria dos criados e
várias vezes inclusive a minha mãe.
Sophie estava tentando manter-se séria.
― Se algum dia tiver uma filha ― Disse à menina ― Pedirei emprestada a sua mamãe. Poderia lhe
ensinar a manter-se limpa.
A pequena se levantou mostrando um vestido completamente enrugado.
― Boa ideia! ― Exclamou ― Quando disser que vai casar de verdade porei meu melhor vestido e serei
muito boa.
A porta da creche se abriu dando passagem a Katie com um bebê meio adormecido nos braços.
― Aqui esta o pequeno tesouro, milady ― Disse em voz baixa ― Acaba de despertar.
Charlotte se levantou para pegar à pequena.
― É a hora de comer carinho. Quanto a você Sophie York, acredito que temos que falar. E se fôssemos
tomar o chá em meu salãozinho?
― Sim! Sim! Eu também! ― Gritou Pippa.
― Acredito querida que Katie necessita que a penteiem.
A menina foi procurar seu pente dividida entre o desejo de descer com lady Sophie e o de praticar sua
afeição preferida: a barbearia.
― Olhe como esta seu vestido lady Pippa ― A repreendeu a babá.
Pippa alisou a saia.
― No princípio tive cuidado Katie, mas depois me esqueci.
― Ah Meu Deus! ― Exclamou a babá ― Estou completamente despenteada e não tinha me dado conta.
Felizmente aqui está lady Pippa para remediá-lo.
Sentou-se em um tamborete, tirou a touca e a menina começou a tirar as forquilhas de seu cabelo.
Sophie se agachou a seu lado.
― Você gostaria de vir comigo algum dia? Iríamos comer sorvetes.
― Sim lady Sophie. Papai diz que os sorvetes são meu vício. Você sabe o que quer dizer?
― Significa que você gosta de muito de sorvetes?
― E qual é seu vício lady Sophie?
Pippa a olhava com seus enormes olhos negros enquanto levantava as sobrancelhas tão parecidas com
as de seu pai e às de seu tio.
O desejo de ter uma filha como você, pensou.
― Sophie também adora os sorvetes ― Disse Charlotte da porta ― E já é suficiente vício!
Fazendo um gesto amistoso Sophie a seguiu pelas escadas.
Uma vez no salãozinho, Charlotte se instalou em uma cadeira de balanço para dar de mamar a Sarah
enquanto Sophie passeava nervosa. O lugar não tinha nada de convencional ao contrário que muitos outros.
Certamente não era ali onde Charlotte trabalhava; já que sua oficina de pintura estava no segundo andar; mas
era também uma sala cálida onde os livros nem sempre estavam bem colocados nas estantes e às vezes havia
papéis disseminados pelo chão perto da lareira. Um lugar que admitia a inconveniência de uma condessa
alimentando ela mesma a sua filha sem tomá-la moléstia de retirar-se ao seu dormitório.
Por fim Charlotte levantou o olhar para sua amiga com os olhos brilhantes de excitação.
― E?
Sophie olhava o bebê que estava comendo com seus dedinhos agarrados a renda do espartilho.
― E? ― Repetiu ela brincalhona ― Rompi com o Braddon.
― OH Sophie, é maravilhoso! Braddon não era o bastante inteligente para você. Nunca teria te
compreendido, tem uma ideia muito atrasada já sabe. Você o teria assustado e escandalizado. É amável, de
acordo, mas não é um homem para você.
― E quem seria segundo você? ― Perguntou Sophie maliciosamente.
Charlotte guardou silêncio prudentemente. Se sua amiga não queria casar com Patrick, era muito livre,
embora ela pensasse que eram feitos um para o outro.
― Oh meu Deus! ― Sophie fingiu que se lamentava ― Temo que você não goste de meu novo
prometido.
― Seu novo prometido?
― Não acreditará que a mulher mais famosa de Londres, depois que você se reformou e deixou de criar
escândalos, aceitaria permanecer sem um prometido nem um só segundo.
Sophie riu e realizou uns passos de baile.
― É obvio que não deixei Braddon até que não tive a alguém para o substituí-lo.
Charlotte fez uma careta.
― Deixa de ser tão cínica Sophie. Essa não é você e odeio quando finge ser tão superficial.
― Perdoe ― Disse Sophie sorrindo ― Não queria me comportar assim.
Interrompeu-se. Incomodava ter que confessar que ia casar com Patrick depois de ter dito tantas vezes
que não queria fazê-lo.
Aproximou-se rapidamente à cadeira de balanço e se inclinou sobre Sarah.
― Que orelhinha mais encantadora!
As duas admiraram um momento à menina em silêncio e depois Charlotte disse com severidade:
― Não mude de tema Sophie York. Diga-me a quem concedeu sua mão. Espero que não tenha sido a
Reginald Pettersham.
― Não, é encantado, mas um pouco raro. Alguma outra sugestão?
Charlotte apertou os lábios. Não ia pronunciar o nome de Patrick.
― O que te parece o duque de Siskind? ― Perguntou Sophie imprudente.
Sua amiga entrecerrou os olhos.
― Oh não! É velho e tem oito filhos.
Sophie acariciava a cabecinha de Sarah.
― A mais eu adoro os meninos ― Disse baixando os olhos para esconder seu regozijo.
― Não ― Gemeu Charlotte ― Tem ao menos sessenta e cinco anos.
― Não se trata dele ― Confessou Sophie ― Quero ter meus próprios filhos.
Ao menos um, pensou.
― Afinal aceitei me casar com Patrick ― Disse com ligeireza ― Insistiu muito.
Charlotte necessitou uns segundos para digerir a notícia e depois deu um grito de alegria. Sarah
assustada, começou a chorar e ela a pôs no outro seio antes de passar seu braço livre pelo ombro de sua
amiga.
― Agora seremos irmãs ― Disse radiante.
Sendo filha única, Sophie sempre tinha sonhado tendo uma irmã, e agora seu sonho ia ser realizado.
― Irmãs… ― Repetiu.
As perguntas se amontoavam nos lábios de Charlotte.
― Mas como foi? Quando? Aonde irão de viagem de núpcias? Você já lhe disse que gosta dos idiomas?
E que opina sua mãe?
― Minha mãe teve umas três crises nervosas ontem por culpa de minha ingratidão, mas hoje a vítima de
seu aborrecimento é meu prometido porque ele quer que a cerimônia se celebre dentro de duas semanas.
Mamãe se nega a considerar um tempo menor de três meses e ao final parece ser que se puseram de acordo
em que seja dentro de seis semanas. A cerimônia a celebrará seu tio o bispo de Winchester. Bom você já sabe
que seu tio é bispo.
Charlotte sorriu e Sophie conteve o fôlego esperando que sua amiga fizesse mais perguntas sobre o
precipitado das bodas.
Apressou-se a continuar.
― Mamãe insiste em umas bodas por todo o alto embora meu pai tentasse tirar essa ideia da cabeça.
Esta convencida de que é a única maneira de me liberar da vergonha social. As donzelas já estão costurando
cobertores rosa para os cavalos porque mamãe quer que os convites se enviem como Deus manda.
Charlotte, enquanto isso estava tirando suas próprias conclusões.
― Pelo amor de Deus Sophie ― Disse sorrindo ― Até Henrietta Hindermaster quando rompeu seu
compromisso com o duque de Siskind, esperou três meses antes de casar-se com o mordomo de seu pai.
Sophie notou que avermelhava. Tinha adotado uma atitude sofisticada desde muito tempo que era
surpreendente comprovar até que ponto tinha medo do escândalo. Ela cujos vestidos provocavam
comentários quase desde seu primeiro baile!
Charlotte sorriu com simpatia.
― Pobre Sophie! Só faltaria que Patrick tivesse subido até seu balcão para te raptar.
Sua amiga ficou ainda mais vermelha e Charlotte exclamou:
― Fez?
Sophie estava debatendo entre uma crise de risada e um embaraço cada vez maior. Levantou-se jogando
o cabelo para trás.
Ao ver que não dizia anda, Charlotte entrecerrou os olhos.
― Quero saber tudo, Sophie York!
Patrick evitava cuidadosamente o olhar de seu irmão enquanto tentava decidir o que lhe diria. Maldição!
Por que não tinha perguntado a Sophie o que pensava dizer a Charlotte? Tinha a impressão de que as
mulheres contavam tudo, mas isso significava que ela daria de presente os ouvidos de sua amiga com os
detalhes que tinha precipitado suas bodas.
Os gêmeos, sentados no vestuário da sala de boxe a qual iam de maneira regular, estavam descansando
depois de um assalto com seu treinador. Lavaram-se e um lacaio estava esperando para ajudá-los a se vestir,
já que por exemplo os homens que colocavam recheio na roupa necessitavam que alguém se assegurasse de
que os recheios ficavam bem.
O certo era, pensou Billy Lumley, que esses dois não necessitavam nenhum recheio, mas era possível
que de todos os modos lhe dessem uma gorjeta. De modo que esperava pacientemente com os casacos na
mão.
Patrick estirou suas largas pernas e fez um gesto ao criado para que se afastasse um pouco. Alex, que
estava pondo uma camisa limpa, lançou um olhar interrogativo.
― Caso-me dentro de seis semanas ― Disse por fim Patrick com a sombra de um sorriso ― Pensei que
você gostaria de estar presente.
Fez-se o silêncio.
― Daphne Blanc? ― Perguntou ao fim Alex com tom neutro.
― Não. A que você tinha elegido para mim, Sophie York.
Alex sorriu abertamente.
― Eu gosto muito, e a mamãe também teria gostado.
― Sim.
Permaneceram uns instantes em silêncio pensando em sua mãe, na maneira em que ela entrava rindo no
quarto dos meninos para pegá-los entre seus braços e encher de beijos. Até que morreu dando a luz a um
pequeno que nasceu morto. Então tinham encontrado com seu pai, um homem taciturno afligido pela gota
que não tinha demorado muito em lhes mandar a um pensionato e que durante as férias mandava a casa de
quem queria acolhê-los.
Alex foi o primeiro em levantar-se.
― Por que tão rápido?
― Um desejo.
― Um desejo?
Alex fez um gesto a Billy para que trouxesse o casaco e o pôs sem a menor dificuldade para grande
decepção do moço.
― Olhe quem fala! ― Respondeu Patrick dando ao lacaio uma generosa gorjeta.
― E depois? ― Perguntou Alex com os olhos brilhando divertidos.
― Iremos de cruzeiro ao longo da costa com Lark.
― Ao longo da costa?
― De lá poderei observar discretamente as fortificações de Breksby em Gales. O momento não me
parece tão mau.
Alex fez uma pequena careta.
― A ideia de que Napoleão pudesse invadir Gales é ridícula. Caso que Napoleão tenha suficientes
navios, se dirigirá mais bem para Kent ou Sussex. Só tem navios de fundo plano. Dirigir-se-á diretamente
desde Bolonha ao Kent.
Patrick deu de ombros.
― De todas as maneiras é uma excelente desculpa para fazer uma viagem de núpcias.
― Para isso não se necessita uma desculpa Patrick.
Alex tinha estragado sua viagem de núpcias por um estúpido ciúme.
― Não cometa o mesmo engano que eu ― Acrescentou.
Patrick sorriu.
― Não se preocupe. E além eu não farei um matrimônio como o seu Alex. Estou seguro de que sairá
bem mais, recorda que Sophie queria casar-se com Braddon Chatwin. Não acredito que entre nós se produza
uma tensão emocional similar à sua.
Alex levantou uma sobrancelha com surpresa.
― Ela desejava o título de Braddon ― Insistiu Patrick.
― E que opina de seu título de duque?
― Não contei.
― Como que não contou? Esta acaso esperando à noite de núpcias?
― Não especialmente. Simplesmente o assunto não veio. Irei sozinho a Turquia e não acredito que
Sophie esteja muito interessada por algo que ocorrerá dentro de perto de um ano.
Alex o olhou de esguelha.
― Está seguro de que quer se casar Patrick?
― Se tiver que pôr a corda no pescoço por que não com Sophie York? A avaliação e ela é…
― Incrivelmente formosa ― Terminou seu irmão.
― Certo ― Admitiu Patrick sorrindo ao pensar em sua prometida.
― E extremamente inteligente.
― Sim, a sua maneira um pouco ligeira e mundana. Será uma excelente companheira.
― Ligeira? ― Exclamou Patrick rindo ― Algum dia irmãozinho peça que te fale de suas aulas de
idiomas.
― Tenho que ir ― Disse Patrick nervoso.
Aproximava-se a hora do jantar com sua noiva e seus futuros sogros. Não estava especialmente
contente com a perspectiva do jantar, mas logo tomaria Sophie entre seus braços, com seus lábios com sabor
a morango e seus pequenos gemidos de prazer. Era necessário que recordasse a si mesmo porque estava
fazendo a tolice de colocar a corda no pescoço, precisamente ele que tinha jurado que nunca cairia nessa
armadilha.
― De modo que acredita que seu matrimônio será como um tranquilo lago durante uns sessenta anos
― Disse Alex piscando um olho enquanto saíam do salão de boxe ― De fato será tão tranquilo que Sophie
apenas se dará conta de que você vai estar vários meses na Turquia. E lhe dirá até mais tarde alegremente
como se fosses passar uma semana caçando?
― O coração e a beleza são duas coisas diferentes ― Replicou Patrick ― Me acredite, frequentei a
criaturas de sonho durante anos e meu coração nunca sofreu.
― De acordo, é um sábio ― Ironizou seu irmão ― Já veremos. Aceitaria uma aposta?
― Sobre que?
― Seu coração. Eu aposto quinhentas coroas que daqui a um ano, confessará estar louco por sua esposa.
― Jamais aceitaria dinheiro de um louco apaixonado como você ― Replicou Patrick com uma breve
gargalhada ― Que você tenha transformado em um homem de uma suscetibilidade exasperante, não quer
dizer que eu deva seguir o mesmo caminho.
― Então não corre nenhum risco aceitando a aposta.
― Entregarei as quinhentas coroas a uma obra de caridade em seu nome ― Disse Patrick suavemente ―
Porque não tem mais oportunidades de ganhar esta aposta que de me ver dormir em camisola ou pedindo
esmola.
Alex não podia esconder sua diversão.
― Se esquece, querido irmão, de que te vi em companhia de Sophie. A deseja de tal forma que baba
assim que a vê. Quando me entregar às quinhentas coroas, comprarei uma camisola com renda de Bruxas.
Capítulo 12

Seis semanas mais tarde, Sophie continuava tendo a impressão de que as bodas iam muito rápidas. Seu
vestido de noiva tinha sido ajustado pela décima vez. Cinco costureiras se ocupavam de uma vez dela como
se tratasse do vestido de uma rainha.
Suspirou. Se este tivesse sido um dia normal, teria estado trabalhando durante uma ou duas horas.
Dirigiu-se para seu escritório e jogou uma olhada a ao manual de gramática turca que estava no lugar onde
as demais damas punham os convites e as cartas.
Estava-o agarrando quando sua mãe entrou na sala.
― Sophie, acredito que…
Interrompeu-se
― Outro de seus livros estrangeiros?
― Sim mamãe.
― Como pude eu ter uma filha tão carente de cérebro? Não se dá conta de que uma mulher casada deve
renunciar a essas criancices? Os idiomas são bobagens infantis às quais deve renunciar, ao igual ao resto dos
estudos.
Sophie vacilou.
― Talvez Patrick não se importe que eu fale alguns idiomas. Parece-me que é um homem muito
pormenorizado.
― Não diga tolices Sophie. Os homens odeiam às sabichonas e com razão. As mulheres cultas são
mortalmente aborrecidas.
Sophie conteve a resposta que tinha na ponta da língua. Ela era sem dúvida uma das mulheres mais
eruditas de Londres e, entretanto a seus pretendentes nunca tinha parecido aborrecida.
― Senhor! ― Grunhiu a marquesa ― Lamento ter deixado você continuar com isso.
Sophie viu como se movia sua mãe nervosa pela estadia colocando as quinquilharias em seu lugar.
Nunca tinha estado contente com a inclinação de sua filha pelos idiomas, mas a tinha autorizado a aprender
francês, italiano, galés, depois alemão e por último turco, já que Sophie tinha tido a sorte de conhecer um
emigrado turco através de seu professor de alemão.
― Eu não sou completamente estúpida ― Continuou a marquesa abrindo o armário e franzindo o
cenho ao ver os vestidos de sua filha ― Seu pai tenta me enganar, mas entendo porque este matrimônio deve
celebrar-se a toda rapidez. De modo que evitaremos as explicações habituais que uma mãe dá a sua filha
sobre a noite de núpcias.
Sophie estava de uma vez envergonhada e coibida.
― De todas as formas ― Continuava Heloise com um suspiro ― Isso não é o importante. Eu gostaria
de te dar alguns conselhos para que seu matrimônio fosse diferente do meu, mas não sei que te dizer.
Sophie notou que as lágrimas lhe alagavam os olhos.
― Tudo está bem mamãe.
Heloise se deixou cair em um sofá de respaldo alto.
― Não, tudo não está bem Sophie. Eu estraguei meu casamento com seu pai. Depois de todos estes
anos nos que o fiz responsável por tudo, estou começando a me perguntar se eu tivesse podido reagir de
forma diferente. Possivelmente fui muito severa.
Sophie se sentou frente a sua mãe. Ela tinha chegado à mesma conclusão: se a marquesa tivesse fechado
os olhos com as infidelidades de seu marido, os dois teriam sido mais felizes, e ela provavelmente hoje teria
irmãos.
― Não podia ― Murmurou Heloise ― Não fui educada assim e me casei com apenas dezoito anos.
Você tem vinte e é ainda mais despreocupada que eu. Rogo isso Sophie, suplico isso, afaste a vista quando
seu marido paquere com outras mulheres. O acolha em sua cama sem pigarrear. Não faça nada que possa o
zangar como, por exemplo, delatar seu talento para os idiomas.
Sophie tentou tranquiliza-la.
― Tentarei mamãe. Nunca direi a Patrick que falo outra coisa que não seja inglês e nunca farei nenhuma
recriminação se deitar com outras mulheres. Sei positivamente que vou me casar com um libertino.
― Ignora suas infidelidades ― Insistiu a marquesa com um brilho de inquietação no olhar ― O
verdadeiro prazer no matrimônio são os filhos.
Sophie esboçou um sorriso.
― Teria gostado de te dar os irmãos que tanto precisava Sophie ― Exclamou sua mãe apaixonadamente
― Lembra-se? Pedia-me isso a gritos. Mas que podia eu fazer? Seu pai e eu já não nos falávamos e eu não
sabia como remediar a situação. Só tínhamos um ponto em comum: você, Sophie. Acredite, os meninos
podem representar um laço importante entre seu marido e você, se o orgulho não se interpuser.
― Patrick só quer ter um filho, mamãe ― Disse Sophie.
Heloise digeriu a informação.
― Lamento muito por você. Sei o muito que você gosta dos meninos. Então cuida muito bem dele.
Perguntou-se alguma vez porque era tão estrita escolhendo as suas amigas?
Sophie agachou a cabeça. Ela nunca tinha podido ir visitar outras crianças, e sua babá tinha a ordem de
afastar a tudo o que se aproximasse dela quando davam seus breves passeios.
― Tinha que te proteger Sophie. Você era minha única filha.
Heloise voltava controlar-se.
― Mas não é o número de filhos que importa, e sim o prazer que obtenha de seu matrimônio. Uma
união como a minha; com amargura por parte de um e com indiferença por parte do outro; é pior que um
matrimônio sem filhos.
A marquesa ruborizou ligeiramente antes de continuar:
― Para falar claramente, não negue nunca a seu marido o acesso a sua cama. Eu não deveria ter jogado a
seu pai de meu quarto. Fui uma tola caprichosa. Agora, quase aos quarenta anos, daria tudo por poder voltar
atrás. Não faça como eu Sophie. Seja qual seja sua amargura, não a demonstre nunca a Patrick e não o
expulse de seu leito. A menos que esteja esperando um filho.
― Prometo isso mamãe ― Disse docilmente Sophie.
Simone, a donzela, estava entrando no quarto seguida de um exército de criadas carregadas de papel de
seda. Fez uma reverência.
― Peço perdão milady, mas estamos prontas para fazer a bagagem de lady Sophie.
Heloise se levantou acariciando o cabelo de sua filha.
― Não poderá evitar apaixonar-se por você, querida. Estou segura de que meus conselhos serão inúteis.
Sophie sorriu, mas depois de que sua mãe saiu, permaneceu um momento quieta, apertando com força
o livrinho forrado de couro. Heloise como esposa, tinha cometido o engano de rejeitar uma situação sobre a
que não exercia nenhum controle. Em outras palavras; se Patrick se fixava em outras mulheres, ela, Sophie,
devia fingir que não se dava conta.
Lorde Breksby estava dando leves golpes com os dedos em cima de seu escritório, manifestando um
nervosismo pouco habitual nele.
― É uma vergonha!
Um homem baixinho vestido de forma vulgar o olhou divertido.
― Napoleão sempre foi um aporrinho ― Assentiu.
― Muito mais que isso! ― Grunhiu Breksby que estava se afogando de raiva ― Como espera sair desta?
― Foi uma sorte que tenhamos descoberto tudo ― Fez notar seu interlocutor.
Breksby suspirou.
― Será melhor que fale com o Patrick Foakes.
― Pelo que eu sei, Foakes está preparando sua viagem de núpcias… Ao longo da costa.
Era evidente que o homenzinho sabia por que Patrick tinha escolhido fazer essa viagem.
― Em efeito. Condenação!
― Para que o advertir?
O homenzinho baixou as pálpebras. Sabia mais das atuações secretas dos distintos governos que o
muito mesmo Breksby. Era exasperante mais certo.
― Como poderia permanecer calado? Vai correr um risco muito grande, e se o cetro chegar a
explodir…
― O cetro só explodirá se permitirmos que o substituam. O cetro é a chave e Foakes não o tem. Nós
sim.
Dirigiu-se para a porta.
― É melhor não correr o risco de que conte algo a sua esposa ― Disse antes de sair ― Os homens
apaixonados são perigosos.
Breksby contemplou a porta fechada. Voltou-se a sentar, tirou uma folha de papel e redigiu uma
mensagem dirigida ao honorável Patrick Foakes, rasgando-a um segundo depois.
O outro homem tinha razão. Era irritante, sempre tinha razão, mas… Pode que o melhor fosse enviar o
cetro tal qual. Se o entregassem ao Foakes só uma hora antes que este o desse de presente a Selim, o risco
seria grandemente menor. Um cetro armadilha! Que ideia tão absurda! Mas se Foakes levava uma coisa assim
à coroação de Selim, e explodia, o resultado seria catastrófico para a Inglaterra. Selim se sentiria gravemente
insultado, caso que conseguisse sobreviver à explosão. Ficaria imediatamente do lado de Napoleão e
declararia guerra à Inglaterra.
― Inferno e condenação! ― Resmungou Breksby.
Chamou o lacaio e colocou o chapéu. Tinha que pôr tanto ao Conselho de ministros do complô de
Napoleão.
Essa noite, os marqueses de Brandenbourg se reuniram no salão para esperar a sua filha. Tinha um
jantar de família. Seu último jantar familiar pensou Heloise com o coração em um punho. No dia seguinte
sua filhinha abandonaria a casa para dirigir-se à igreja do St. George e só voltaria de visita.
Aceitou a taça de xerez que Caroll oferecia e se dirigiu para a enorme janela que dava ao jardim. Estava
pensando na conversa que tinha mantido com Sophie. Nunca tinha ousado pronunciar essas palavras em voz
alta, e se sentia ligeiramente incômoda por estar na mesma sala que seu marido.
Mas se George notou sua tensão não demonstrou. Parecia estar completamente contente quando se
aproximou dela.
― Eu acredito que serão felizes juntos, querida. E você?
A respiração de Heloise se acelerou de maneira estranha. Desde que havia tornado a ver seu marido nu,
a imagem de seu torso e de suas pernas se sobrepunha a qualquer outra. Ele estava ali, ao seu lado,
completamente vestido, e, entretanto ela se estremecia ao voltar a sentir as sensações do princípio de seu
matrimônio.
Inoportunamente recordou algo. George tinha o costume de beijá-la na nuca. Voltou-se para ele. Ele
estava olhando o jardim.
― George ― Disse avermelhando.
Ele pousou seu olhar cinza sobre ela e lhe pôs a mão na nuca, no lugar exato no que ela estava
pensando. Ele não tinha tido um gesto tão íntimo com ela desde fazia anos.
Ela permaneceu imóvel como um animal assustado. Era o momento de demonstrar sua valentia. Mas
era muito difícil superar anos de indiferença. As palavras se entupiram em sua garganta e agachou a cabeça,
desesperada.
George abriu a mão e começou a lhe acariciar brandamente a base do pescoço. Só se deteve quando
Caroll entrou no salão acompanhando de Sophie.
Capítulo 13

Sophie despertou muito cedo, e saiu da cama para ir ver como amanhecia através da janela. Que se
supunha que devia fazer na manhã do dia de suas bodas? Dormir aconselharia sua mãe. Dormir para estar
em boa forma. Mas ela não podia dormir.
Seu coração pulsava com força. Apoiou-se na janela pela qual tinha entrado Patrick em seu quarto
repetindo-se uma vez, mas que não estava cometendo um equívoco. Se um se fixava ainda podia ver as
marcas da escada.
Uma grande carreta passou pela rua, levavam-na dois homens, sujos depois de uma noite de trabalho. A
cidade estava despertando. No Covent Garden os vendedores ambulantes deviam estar pondo seus postos, os
vendedores de pássaros estariam abrindo suas casas de jogo clandestino em Spitalfields. Quando era menina
adorava ver as fileiras de cotovias e vendedores. Agora em troca, o pensar nas pequenas jaulas cheias de
pássaros dava vontade de chorar.
― Não seja idiota! ― Disse em voz alta.
Por que estava fazendo um drama de seu casamento como se alguém a estivesse obrigando a casar-se?
Abraçou a si mesma. Desejava Patrick, queria-o como Julieta a Romeo. Mas, sem dúvida, já que ela
tinha vivido uma noite de amor maravilhosa antes de casar-se com ele.
Então porque se preocupava? Apoiou a testa no frio cristal. Duas carretas giraram na esquina da rua e
o primeiro faetón da manhã passou cabeceando pelo pavimento.
Qualquer outra manhã ela haveria feito soar a campainha para que trouxessem uma xícara de chocolate
quente e depois teria estudado durante duas horas antes de tomar um banho. Por um momento esteve a
ponto de deixar-se tentar pelo livro de gramática turca, mas recordou as palavras de sua mãe. Isso eram
distrações infantis.
No exterior a governanta estava escolhendo verduras em uma carreta ambulante que se deteve diante
da porta.
Apesar de tudo, a marquesa lhe tinha dado alguns bons conselhos, pensou Sophie. Patrick nunca se
inteiraria que ela estudava idiomas se isso tinha que o contrariar. Quanto ao de negar o acesso a sua cama…
Não tinha nenhum desejo de fazer tal coisa.
O importante era não deixar que adivinhasse que ela sentia um absurdo carinho por ele. Se o ignorava,
ela poderia desempenhar o papel de esposa conhecedora, que permite que seu marido pule a suas cercas. Mas
se congelava só de pensar na humilhação que sentiria se algum dia ele chegasse, a saber, até que ponto ela o
amava.
― Não direi nunca ― Murmurou.
Um pouco mais tranquila, deu-se conta de que tinha encolhidos de frio os dedos dos pés e correu a
refugiar-se debaixo das mantas.
Quando voltou a abrir os olhos, o sol entrava em torrentes no quarto. Virou-se sobre as costas. Tinha
estado sonhando em italiano, coisa que não acontecia desde que tinha começado a estudar esse idioma
quatro anos antes. Um curioso sonho cujos detalhes lhe escapavam. Tratava-se de um baile de máscaras e ela
estava disfarçada de cigana com um chapéu de palha preso sob o queixo.
Fez uma careta. O baile de máscaras ia começar. Puxou resolutamente do cordão e se levantou.

Heloise tinha um nó no estômago enquanto contemplava os assistentes reunidos na igreja de St.
George, essa quarta-feira às três da tarde. Fez recontagem seus parentes e dos de Patrick, os quais se
limitavam a um irmão, Alex, e a uma tia. Embora não fossem muito numerosos se via muito bem. O tio de
Patrick celebraria a cerimônia e a tia, Henrietta Collumer, ocupava um lugar de honra ao lado da mãe da
noiva.
― Deixe de dar volta Heloise! ― Disse Henrietta com a autoridade que lhe conferiam seus oitenta anos
― Não se preocupe, todos estão aqui. Acreditam que este é o casamento por amor do século.
Heloise a olhou com uma profunda antipatia perguntando-se ao mesmo tempo se podia permitir-se
zangar com essa velha devota. Não. Limitou-se a voltar-se para o altar. Havia-se sentido feliz ao saber que o
conde de Slaslow seria o padrinho de Patrick, já que isso faria emudecer às más línguas. Slaslow parecia um
pouco mal-humorado, mas ele era assim. Em realidade estava convencida de que Sophie seria mais feliz com
Patrick Foakes.
Este último estava no alto da nave, com seu gêmeo, impertérrito. Ao contrário de Braddon Chatwin
que se balançava de um lado a outro sobre seus pés, os irmãos Foakes estavam quietos como estátuas.
Um murmúrio percorreu a igreja e apareceu Sophie com uma mão apoiada no braço de seu pai.
Heloise tinha convencido a sua filha de que o vestido fosse branco e, sob a difusa luz das vidraças,
parecia inocente, frágil e quase irreal. Ninguém teria podido imaginar que era uma mulher que atraía ao
escândalo como se fosse um ímã. Inclusive as línguas mais viperinas deviam estar perguntando-se porque
esse matrimônio se celebrava com tanta precipitação. O cabelo, com botões de rosas brancas entrelaçados,
caía em cascata pelas costas. Parecia uma princesa russa ou uma fada saída de um conto irlandês.
Seu vestido de cetim cor marfim de corte alto estava adornado com uma sobrecapa que terminava em
uma cauda. As mangas eram curtas, o decote pouco pronunciado e usava luvas longas de cetim. Quando
Antonin Careme lhe mostrou o vestido ela gemeu dizendo que pareceria uma matrona.
Certamente era sem dúvida o vestido mais discreto que tinha usado desde que foi apresentada em
sociedade. Mas as hábeis mãos de Careme tinham acrescentado uma nota encantadora e original: renda
dourada no sutiã e na borda da cauda.
Esse homem sabia como fazer formosa a uma mulher. Com a renda, da mesma cor que seu cabelo,
Sophie era como um maravilhoso ícone de ouro e marfim. Um ícone blasfemo, certamente, já que os homens
congregados não a olhavam com respeito precisamente, e sim com o desejo impresso nos olhos.
Ao Patrick cortou a respiração quando a viu ir para ele com as pálpebras entreabertas. Não os abriu até
que o marquês e ela chegaram ao altar.
Então, por um breve instante, seus olhares se encontraram e Sophie ruborizou. E nos lábios de Patrick
apareceu um sorriso e se apoderou dele um intenso calor.
Ao menos sabia por que se casava. Nunca havia sentido, nem sentiria jamais, um desejo como o que
Sophie despertava nele. Apesar da presença do sacerdote, agarrou-a da mão.
O bispo o olhou com reprovação baixou suas hirsutas sobrancelhas. Richard tinha aceitado celebrar as
bodas em lembrança de seu irmão, o pai de Patrick. Deus era testemunha do que haviam feito passar seus
filhos! Mas Sheffie haveria sentido feliz de assistir a esse matrimônio.
― Os casemos e se tranquilizaram ― Acostumava a dizer.
Ele não tinha seguido seu próprio conselho já que, em vez de consertar para eles um matrimônio de
conveniência, tinha mandado a um ao continente e ao outro ao oriente. Teve a sorte de lhes ver retornar sãos
e salvos. Entretanto Richard não tinha tido ocasião de lhes ver depois da morte de seu irmão.
Colocou bem o habito que tinha um fastidioso costume de deslizar-se para trás e mover-se como um
navio em meio de uma tempestade.
― Meus queridos amigos ― Disse ― Estamos aqui reunidos sob o olhar de Deus…
Sophie começou a tremer enquanto a voz do bispo enchia a nave. Patrick continuava segurando a mão e
ela sentia um desejo de querer fugir correndo. Sua nova vida se estendia diante dela, cinza e vazia, marcada
pela humilhação e a tristeza de ver seu marido divertindo-se com outras mulheres.
Richard prosseguiu com a cerimônia, dando-se conta de que Patrick conservava a mão de Sophie entre
as suas. Bom as pessoas pensariam que era um gesto muito romântico, e isso era fundamental para que
vissem com bons olhos um matrimônio tão pouco convencional.
Voltou para seu sobrinho. O muito patife tinha umas sobrancelhas que davam o aspecto de um
demônio incluso nesse sagrado lugar.
Por fim se dirigiu à mulher:
― Quer tomar a este homem como marido, viver com ele…
Mas Sophie tinha a cabeça cheia de imagens de sua mãe desfeita em lágrimas, recordava todas as
mentiras que seu pai havia dito, imaginava um matrimônio estragado pelas traições… Olhou a Patrick com
um olhar carregado de angústia.
A pressão em sua mão se fez mais forte, como se ele estivesse lendo seus pensamentos, e a olhou com a
risada dançando em seus olhos.
Então Sophie levantou os ombros e respondeu com voz clara:
― Quero.
Ao menos Patrick entrava em uma família normal, pensou o bispo. As mulheres tinham que ser
pequenas e frágeis. Sim, as miúdas e frágeis eram as melhores esposas. Richard fechou o livro de orações. A
cerimônia tinha terminado.
― Eu os declaro marido e mulher ― Concluiu endireitando o habito.
Os lábios de Sophie se moveram mais não saiu deles nenhum som.
Richard franziu o cenho, acaso a recém-casada tinha soltado uma praga em francês? Não, impossível,
era muito bem educada para praguejar no idioma que fosse.
― Pode beijar a noiva ― Ele disse jovialmente a seu sobrinho.
Patrick a olhou. Ela levantou os olhos para ele, uns olhos de uma cor azul tão escura que quase
pareciam negros. Por um momento se surpreendeu a reticência que leu neles, mas depois a atraiu para si. Ela
permaneceu passiva entre seus braços, com os lábios rígidos, e indiferentes.
Maldição, pensou, tinha que conseguir lhe arrancar um romântico beijo para reforçar a ideia de que a
razão da precipitada bodas se devia a que era um matrimônio por amor. Apertou-a mais se fazendo mais
exigente e repentinamente ela cedeu fundindo-se contra ele. A cabeça dele começou a dar voltas e uma onda
de desejo o invadiu.
Separaram-se ao fim e se olharam fixamente. Patrick, assombrado, respirava com dificuldade. Sophie
pensava na maneira desavergonhada que se apertou contra ele. Teria notado alguém que tremiam suas
pernas?
Ouviu-se um murmúrio entre os assistentes. Os membros da alta sociedade estavam acostumados a ver
os recém-casados atravessar a nave central ao som das trompetistas e não perdendo o tempo olhando-se.
― Céus, diria-se que é um verdadeiro matrimônio por amor ― Sussurrou Penélope Luster a sua melhor
amiga ― Ele a olha de uma maneira que me dá vertigem.
― Não diga tolices Penélope ― Respondeu sua amiga ― Assim é exatamente como o a olhava quando
os vi juntos em meu baile recentemente. Acredite-me, isso não tem nada que ver com o amor. Mas você não
pode sabê-lo já que nunca esteve casada.
Chateada, Penélope fez uma careta. Sarah Prestlefield era uma robusta matrona de mais de cinquenta
anos e Penélope estava disposta a apostar que lorde Prestlefield nunca a tinha olhado como Patrick acabava
de olhar a sua esposa.
― Não importa ― Declarou ― Para mim é o casal mais romântico do mundo.
Lady Prestlefield soprou com incredulidade.
― Direi, Sarah ― Insistiu Penélope ― Que terá que ser tola para pensar que uma mulher em posse de
todas suas faculdades mentais possa preferir Slaslow diante de Patrick Foakes.
Sarah pôs uma expressão de exasperação.
― Você que é tola, Penélope. Slaslow é conde. Nenhuma mulher em seu são julgamento trocaria por
um filho menor embora fosse tão rico como Foakes.
Os recém-casados estavam atravessando o corredor central da igreja e Patrick sustentava a sua esposa
contra ele reforçando a convicção de Penélope.
O conde de Slaslow ia justo atrás deles e seu parecido com um buldogue a fez estremecer. Para
Penélope, os ardentes olhos de Patrick eram muito mais interessantes que a gordinha imagem de Braddon.
Riqueza e título careciam de importância ao lado da sensualidade que Patrick transbordava.
― Olhe! ― Sussurrou lady Prestlefield ― Quill Dewland anda outra vez. Acreditava que os médicos
tinham condenado a permanecer na cama.
Penélope só jogou uma indiferente olhada a Quill, para voltar rapidamente para olhar ao jovem casal.
Pesavam as portas que acabavam de abrir e os Foakes estavam de pé no alto das escadas. Um raio de sol caía
sobre a noiva fazendo-a parecer uma fina chama dourada. Patrick se inclinou uma vez mais para beijá-la.
― Você pode pensar o que quiser ― Disse a sua amiga ― Mas é realmente um matrimônio por amor. E
me dá completamente igual o que pensem outros.
Penélope era normalmente mais tranquila, mas podia ser teimosa como uma mula.
― Muito bem Penélope, muito bem ― Murmurou lady Prestlefield ― Estou de acordo contigo. E já
sabe o que gostam a Maria dos romances. Olha-a, está chorando em seu lenço.
Lady Maria Sefton era uma das damas, mas influentes da alta sociedade.
Deste modo, Patrick Foakes pôde casar-se precipitadamente com a mulher mais formosa de Londres e
sair bem amparado. Em vez de lhes voltar às costas sussurrando desagradáveis comentários, a alta sociedade
estava radiante e felicitava a si mesma por sua própria generosidade. Eram um casal tão encantador!
Braddon também engoliu sua amargura.
― Foi como Romeu e Julieta ― Respondeu lorde Winkle que no baile que seguiu à cerimônia
perguntou se não odiava Patrick por ter roubado a noiva ― Não podia me interpor entre eles. Como Tristan
e…
Interrompeu-se sem saber o que dizer. Como raios se chamavam os amantes que tinha estudado no
colégio?
― Tristan e Isolda? ― Interveio amavelmente a senhorita Cecilia Commonweal, a quem chamavam
Sissy.
― Exatamente.
― Sem embargo ― Fez notar Sissy ― Tristan traiu seu tio pelo amor de Isolda, de modo que é menos
romântico que Romeu e Julieta. Abelardo e Eloisa são também uns casais famosos, mas acredito que
Abelardo teve um desgraçado acidente, de modo que tampouco é o exemplo perfeito.
Braddon a olhou com interesse. Ela não estava mal apesar de seus enormes dentes e da ofegante
maneira que tinha de falar. Uma semana antes teria podido pensar em pedir sua mão. Mas isso já tinha
terminado.
Como ele não dizia nada, Sissy continuou:
― A verdade é que a história de Romeu e Julieta é mais triste não acha lorde Slaslow? Ele se
envenenou…
Braddon sorriu enquanto percorria a estadia com o olhar. Se sua mãe zangava-se pelos arredores o
melhor que podia fazer era desaparecer.
Tomou muito mal a ruptura de seu compromisso, desmaiou em cima do sofá enquanto pedia os sais.
Mas quando Braddon tentou desparecer dali deixando que suas irmãs se ocupassem dela, ficou em pé de um
salto e soltou um sermão para lhe recordar que tinha a obrigação de casar-se e que devia fazê-lo sem perder
um segundo.
Bom, pois ele ia se casar, mas não com o tipo de mulher que sonhava sua mãe. Graças a Deus não tinha
apresentado a nenhum de seus amigos a Madeleine. Só tinha que falar com Sophie antes de poder retirar-se.
Fazia tudo o que estava em sua mão para convencer às pessoas mais importantes de Londres de que Patrick e
Sophie se casaram por amor.
Esticou-se de repente como um cão cheirando uma presa. Precaveu-se de algo alarmante.
― Senhorita Commonweal…
Inclinou-se diante ela. Tinha sido treinado por uma perita; sua mãe; e suas reverências eram tão
inclinadas que era preocupante. Sissy viu a incipiente calvície aproximar-se e depois voltar-se a afastar dela.
Ela pôs uma mão enluvada em cima do braço.
― Quereria me acompanhar de volta com minha mãe milorde?
Braddon se mordeu o lábio inferior.
― Não posso senhorita Commonweal. Sua mãe está falando com a minha e…
Ela sorriu com cumplicidade. Sabia tudo sobre mães suscetíveis.
― Não gostaria de conversar um momento com os recém-casados? ― Propôs ele ― Acabam de entrar.
― Eu adoraria milorde ― Respondeu Sissy aliviada também.
Abriram-se caminho entre as pessoas e, um minuto depois, Sissy se encontrou diante de Patrick Foakes,
ao qual mal conhecia.
― Nos perdoe um momento quer Patrick? ― Disse Braddon levando Sophie a um lado.
Sissy estava morta de vergonha. O que podia estar dizendo Braddon a Sophie? E que estaria pensando
o noivo?
Patrick Foakes tinha o dom de permanecer impassível; entretanto Sissy pensou que era melhor tê-lo
como amigo que como inimigo.
― Ouvi dizer que vão viajar em viagem de núpcias ― Disse um pouco nervosa ― Imagino que não irão
ao continente em vista da situação política.
Patrick lhe dedicou um sorriso, não recordava seu nome embora acreditava que era Sissy, mas se
perguntou por que levava essas ridículas plumas de peru na cabeça quando as mulheres mais elegantes já
tinham deixado usar a tempo.
― Só vamos fazer um cruzeiro ao redor da costa ― Disse ― Embarcamos esta mesma noite.
― Esta noite? Acreditava que os navios só podiam sair com a maré alta e…
Patrick já não a estava escutando. Que demônios estava fazendo Braddon com sua esposa?
Sua esposa. Gostava como soava isso. Podia ver seu magro braço atrás de uma coluna enquanto Sissy
Commonweal continuava falando das marés.
Patrick estava bastante contente consigo mesmo. Fazia o que tinha que fazer. Tirou a virgindade de uma
jovem antes do matrimônio, de modo que poderiam gozar esta noite sem preocupações. Primeiro tiraria o
vestido, depois beijaria um ombro, descendo com o passar do braço…
Sua imaginação se viu interrompida por duas coisas: para começar, a senhorita Commonweal tinha
deixado de falar e depois ele estava cada vez mais zangado. A conversa entre Sophie e Braddon não era a
melhor maneira de convencer às pessoas de que a este último dava igual a ela tivesse quebrado o
compromisso. Além de que estavam falando?
Sissy, terrivelmente molesta, olhava-se as pontas de seus sapatos rosas.
Todos puderam ouvir de repente a voz do conde Slaslow que dizia quase gritando:
― Além me deve isso!
Depois Sissy se deu conta de que Patrick tinha saído de seu mutismo e estava sorrindo amavelmente.
Certamente tinha ouvido Slaslow mais não parecia estar preocupado.
― Quer dançar? ― Perguntou ele agarrando-a pelo braço para levá-la para a pista de baile.
― Bom…
Olhou a Braddon e a Sophie que estava discutindo.
― Não preferiria dançar com sua esposa?
O sorriso de Patrick se fez um pouco mais longínqua.
― Certamente que não, já que quero dançar com você.
Dizendo isto levou a pesada mulher até a fileira de bailarinos.
Sissy, completamente vermelha, encontrou-se na pista com Patrick, completamente segura de que eram
o centro de todas os olhares.
― Meu Deus! Devo estar completamente vermelha ― Murmurou.
Patrick elevou uma sobrancelha com ironia.
― Não. Por quê? Deveria estar?
― Sim! Estou dançando com o noivo e sua reputação, e sua esposa…
― Senhorita Cecilia… Ou posso chamá-la Sissy?
Ao ver que ela assentia, ele continuou:
― Asseguro, Sissy, que dentro de um ano poderemos dançar nesta mesma sala sem que ninguém o note.
Ela franziu o cenho.
― Por que dentro de um ano?
― Dentro de um ano os dois levaremos já tempo casados, e Deus sabe que ninguém disposta atenção a
duas pessoas casadas que dançam juntas.
― Oh, eu…! ― Balbuciou Sissy ― De todas as formas, eu não estarei casada.
A triste expressão dela despertou a compaixão de Patrick.
― Já verá como sim.
― Não…
Ela estava tão desamparada que surpreendeu a se mesma lhe contando seus piores temores.
― Sempre me apaixono por homens que minha mãe não gosta e, como ela diz, eles não vão nunca bater
a minha porta.
Interrompeu-se bruscamente, confusa por ter falado de um modo tão vulgar, mas Patrick se limitou a
rir enquanto a olhava com tanta gentileza que lhe deu um tombo o coração.
― Vou lhe dar um conselho. Escolha o homem que você queira. Depois, cada vez que fale com ele, o
olhe diretamente nos olhos. Não importa o que ele diga inclusive se for completamente estúpido, diga que
acaba de dizer algo muito interessante. Os jovens são tímidos e terá que os animar.
Sissy o escutava fascinada.
― Você acha? Entretanto minha mãe sempre me diz que não tenho que deixar que se faça o silêncio em
uma conversa. De modo que muitas vezes me encontro falando sozinha.
― Deixe que sejam os homens quem fale. Adoram o som de sua própria voz. E não lhes demonstre
nunca o que sabe. Quando estiver casada poderá falar tanto como queira sobre as correntes marinhas se isso
é o que deseja.
Tinham chegado ao final da fila e estavam voltando dando voltas até que Patrick a deixou diante de sua
mãe.
Ele se inclinou solenemente.
― Foi um prazer dançar com você, senhorita Commomweal.
Ela fez uma reverência.
― Obrigado, senhor.
Ele se inclinou para lhe dizer ao ouvido.
― E livre-se dessas plumas, Sissy.
Piscando um olho desapareceu enquanto a jovem repetia suas palavras em sua mente. Depois se deu
conta de que sua mãe estava sorrindo.
― Querida ― Disse ― Gostaria de te apresentar a Fergus Morgan. O senhor Morgan acaba de voltar de
uma comprida viajem pelo estrangeiro.
O homem que a saudou, com seus olhos azuis e sua ligeira calvície, era bastante simpático.
― Me disseram que é você uma grande leitora ― Disse um pouco nervoso.
― Certamente! ― Interveio sua mãe ― Não há quem ganha a Cecilia lendo.
― Minha mãe exagera, temo ― Protestou brandamente Sissy olhando diretamente nos olhos do Fergus.
― É uma pena ― Replicou este franzindo o cenho ― Porque tinha intenções de criar um grupo de
poesia. Acabo de voltar da Alemanha onde os clubes de poesia fazem furor entre as pessoas jovem.
― É uma ideia muito interessante! ― Exclamou Sissy com os olhos brilhantes.
E era sincera.
O homem se pavoneou.
― Permite-me que seja seu acompanhante no jantar, senhorita Commonweal? Depois deste baile é
obvio…
Sissy sorriu e esteve a ponto de responder que era um “projeto extremamente interessante”.
― Com muito prazer. Assim poderá me falar um pouco mais sobre esses clubes de poesia.
No outro extremo, ao lado de uma coluna, Braddon e Sophie discutiam acaloradamente.
Ele tinha iniciado a conversa com tom autoritário.
― Sophie― Havia dito ― Tem que escutar atentamente o que te vou dizer…
Ela olhou surpreendida.
― Necessito sua ajuda ― Continuou ele com um pouco menos de segurança em se mesmo.
Ela sorriu. Era tão feliz que tivesse ajudado a qualquer.
― Eu adoraria te ajudar.
Ele relaxou um pouco.
― Olhe Sophie, já sabe que tenho que me casar rapidamente.
Ela assentiu com simpatia.
― Bem, pois encontrei à mulher com a que quero me casar.
Engoliu seco; estava chegando à parte mais difícil.
― O problema ― Continuou ― É que Maddie; Madeleine; não é uma dama.
Sophie o pensou um momento e depois abriu os olhos assombrada.
― É um homem?
― Não! ― Exclamou Braddon ― É uma cortesã.
Ela esteve a ponto de rir ao ver sua expressão de assombro.
― No fundo é uma dama ― Assegurou ele ― E não quero me casar com ninguém mais. Teria podido
chegar até o final contigo, Sophie, mas não vou voltar a começar. A quem preciso é Madeleine.
Ela entrecerrou os olhos para lhe ouvir falar com tanta ligeireza de seu compromisso. Embora assim ao
menos ela não tinha que arrepender-se por lhe haver quebrado o coração.
― Quem é?
― Seu pai se chama Vincent Garnier. Vigia a reputação de sua filha como se tratasse de uma duquesa.
Em Londres ninguém a conhece, quer dizer, além de mim. Fugiram da França por culpa da situação política
e nem sequer fala o inglês corretamente.
Tomou uma baforada de ar.
― Seu pai é treinador de cavalos.
Sophie estremeceu.
― Não pode se casar com a filha de um treinador de cavalos, Braddon!
Este último sorriu.
― Não vou fazê-lo, me casarei com a filha de um aristocrata francês morto na guilhotina em 1793.
Ela ficou boquiaberta.
― OH não, Braddon! Isso é impossível!
― Nada disso! ― Replicou inflexível ― E você vai ajudar-me.
Ela negou com a cabeça.
― Deve-me ao menos isso. Rompeu nosso compromisso sem me avisar, no dia seguinte de me ter
convencido de que te raptasse. Imagine o que pareço agora!
Sophie avermelhou de vergonha.
― Lamento Braddon ― Disse humildemente ― Mas não posso… O que eu poderia fazer para te ajudar
para que se casasse com essa mulher?
― Será sua professora. Ensinará a se comportar, você conhece todas as regras de etiqueta; as ensinará e
depois ela irá a um baile simulando ser uma aristocrata francesa. Então eu a conhecerei e me casarei com ela
o mais rapidamente possível antes que as pessoas comecem a fazer perguntas sobre ela.
― Está louco ― Murmurou ela fascinada por sua determinação ― Não vai funcionar. As pessoas não
podem transformar-se em membro da aristocracia francesa da noite para o dia.
― Não vejo porque não ― Insistiu Braddon pondo a expressão de teimosia de um buldogue que sua
família tanto temia ― Não é nada difícil ser uma dama. E, além disso, Madeleine é francesa, ninguém pode
esperar que se comporte exatamente igual às damas inglesas. Há muitos nobres franceses em Londres e
apostaria a que a metade deles são uns impostores.
Sophie, em efeito, tinha ouvido seu pai dizer o mesmo.
― Isso não resolve o problema de transformar a sua amiga em uma dama.
― Ela o é por natureza! ― Afirmou Braddon ― Não será muito difícil Sophie. Ensine-a vestir-se, a
agitar um leque, esse tipo de coisas. Pode fazê-lo e além me deve isso. Você me abandonou e não quero
voltar a pedir a mão de uma mulher que me não me importa nada.
― Não fui eu quem quebrou a perna ― Objetou ela olhando especificamente a perna dele.
― Vou começar com sua educação, Sophie. Ensinarei tudo o que sei, mas não poderei dizer o que
minha mãe repetiu a minhas irmãs durante anos. Tem que me ajudar. A amo!
Patrick estava dando voltas pelo salão de baile enquanto ia em direção a sua esposa e Chatwin, mas o
detinham sem cessar os convidados para felicitar. Quase tinha chegado a seu objetivo quando lorde Breksby
apareceu diante dele como uma serpente de uma caixa.
― Parabéns, milorde ― Disse ― E meu agradecimento. Ouvi dizer que ia fazer um pequeno cruzeiro ao
longo da costa e suponho que de vez em quando olhará para terra não?
Patrick o saudou.
― Certamente.
― Estou impaciente por ouvir o que tiver que me dizer sobre as fortificações quando voltar. E espero
que seu casamento não seja um obstáculo para sua viagem ao estrangeiro no ano que vem.
Patrick deu de ombros.
― Certamente que não ― Disse com altivez.
O ministro baixou o tom.
― Então quando voltar de sua lua de mel terei que lhe falar do presente de que falamos.
Patrick demorou uns segundos em compreender que estava falando do cetro.
― Estou ao seu dispor.
Breksby esfregou as mãos.
― Perfeito, perfeito. Temos um pequeno problema com isso. Nada de importância, mas prefiro lhe pôr à
corrente.
Em nome de Deus! A que estava se referindo agora? Se não lhe tinham encravado muitos rubis ao
condenado cetro ele não podia fazer nada. Inclinou-se de novo.
― Irei vê-lo assim que volte de minha viajem ― Prometeu.
Quando por fim chegou à coluna, Sophie e Braddon tinham desaparecido. Observou a multidão
tentando evitar as olhadas curiosas. Não viu Sophie por nenhuma parte, mas sua cunhada apareceu a seu
lado.
― Sophie foi se retocar um pouco ― Anunciou Charlotte travessa.
Ele se sentiu irritado por ser tão transparente.
― Acreditava que fugiu com meu padrinho ― Disse sarcasticamente.
Ela se pôs a rir.
― Ah os recém-casados! Eu poderia desaparecer do salão de baile durante uma hora inteira sem que
Alex notasse minha ausência.
― Eu não apostaria nisso em seu lugar ― Interveio uma voz atrás dela.
Seu marido a agarrou pela cintura.
― Meu Deus! ― Gemeu Patrick ― Chegou o tio Richard!
Efetivamente, seu tio, livre do traje de bispo, estava entrando com todo seu esplendor. No exercício de
suas funções, estava muito digno, mas com traje de festa parecia por completo um ancião dandi, vestido de
branco e ouro, com um colete e ornamentos vermelho e ouro.
― Só lhe falta uma espada para parecer recém-saído do século passado ― Soltou Alex.
Patrick se dirigiu para seu tio seguido de Alex e de Charlotte. Mas antes que chegassem à porta do salão
de baile, apareceu Sophie. Patrick a viu receber o ancião com um encantador sorriso. Quando ele se reuniu
com eles, o bispo ronronava como um gato diante de um prato de leite.
― Em efeito, querida ― Estava dizendo ― É obvio que como terceiro filho estava destinado à Igreja.
Mas muitas vezes me confundiram com um membro do Parlamento e inclusive uma vez tomaram por um
conde veneziano.
Deu um tapinha na mão de Sophie com mais calidez da que tinha mostrado durante a cerimônia.
― É você uma mulher encantadora, querida. Realmente encantadora. Estou seguro de que Patrick e
você serão muito felizes.
Os poucos curiosos que estavam perto, não perderam nem um ápice da cena. Se tivesse havido algo
raro nesse matrimônio, o bispo não se mostrou tão entusiasmado.
― Não sentará nada bem ao bispo se nascer um menino dentro de sete meses verdade? ― Zombou lady
Skiffing.
Esta se alimentava de fofocas e o que mais feliz a fazia era destruir a reputação de alguém.
Sarah Prestleffield finalmente tinha decidido apoiar a teoria de sua amiga Penélope, quer dizer que a
urgência desse matrimônio se devia ao amor e não por uma conduta escandalosa.
― Só alguém mal intencionado poderia sugerir algo assim ― Decretou ― lady Sophie realmente se
casou por amor, e embora isto não seja frequente entre a nobreza, nenhum de nós se atreveria a insinuar que
esses queridos meninos se casam por outra razão que não seja essa.
Lady Skiffing não estava convencida, mas lady Prestlefield tinha uma fila superior a dela, de modo que
mudou de assunto.
― Sabe que a senhora Yarlblossom, a vida que vive no Chiswick, orgulha-se de ter a um príncipe índio
entre seus pretendentes?
Sarah Prestlefield ficou fascinada.
― Refere-se à louca que tem dezesseis cachorros mulherengos?
Durante esse tempo, Sophie se voltou sossegada seu marido, cujo olhar desprendia tais promessas que
não pôde evitar olhar ao bispo para ver se tinha interceptado a mensagem.
― Não se preocupe por tio Richard ― Sussurrou Patrick ao ouvido.
Agarrou-a pela cintura e ela se perguntou se sempre lhe produziria o mesmo efeito. O simples contato
de sua mão para ela tremer.
― Já é hora de que nos retiremos querida ― Disse com voz rouca.
Ela deu um pulo.
― Nos retirar?
É obvio sabia que ela e Patrick abandonariam juntos o baile. Levaram suas malas essa mesma manhã e,
se Simone tinha podido controlar seu medo à água, já devia estar a bordo do Lara.
Mas realmente não tinha pensado como seria sua partida. Só em uma carruagem com o Patrick e depois
com ele na cama.
― Não podemos ir agora ― Disse ― Mal tive tempo de falar com seu tio.
Soltou-se para ir reunir se com o bispo, quem estava falando com Charlotte.
― Desde que faço esse regime me encontro perfeitamente bem e devo admitir que tenho muito bom
aspecto. O doutor Read me permite uma só taça de chocolate ao dia, papa de aveia três vezes ao dia e uma
maçã antes do jantar.
A Sophie dava voltas a cabeça diante a ideia de sua lua de mel.
O bispo lhe sorriu amavelmente.
― Não vacile em me fazer perguntas sobre meu regime, querida. O doutor Read é famoso por seus
remédios.
― Ehhh.
Não lhe ocorria nenhuma pergunta muito consciente da presença de seu marido atrás dela.
― Que espécie de maçãs gosta mais?
Patrick brincava com os cachos de sua nuca.
― Excelente pergunta querida. Eu gosto de muito as reais. Meu criado as assa em cima de um tijolo
lavado com