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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2021.0000361435

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1066213-06.2016.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante EDSON
GOMES CARDOSO SANTOS, são apelados BUILD BRASIL
EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. e ALL HERE FRANSHING
LTDA - EPP.

ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça


de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Após voto do relator negando provimento ao
recurso, o 2º e o 3º juízes votaram pelo parcial provimento. Tendo em vista o
julgamento não unânime e considerando o disposto no art. 942, “caput” e + 1º do
CPC/2015, prossegue-se o julgamento, nesta sessão, ficando convocados a integrarem a
Turma julgadora o Des. Coelho Mendes, como 4º juiz e o Des. João Carlos Saletti,
como 5º juiz. Ambos acompanharam a divergência. Portanto, por maioria de votos,
deram parcial provimento ao recurso, vencido o relator sorteado, que o negava e
declarará. Acórdão com o 2º juiz. Sustentou oralmente o Dr. Moacyr Montenegro Souto
Junior, OAB/BA 24.548.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este
acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores J.B.


PAULA LIMA, vencedor, JAIR DE SOUZA, vencido, JOÃO CARLOS SALETTI
(Presidente), ELCIO TRUJILLO E COELHO MENDES.

São Paulo, 11 de maio de 2021

J. B. PAULA LIMA
RELATOR DESIGNADO
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

APELAÇÃO CÍVEL nº 1066213-06.2016.8.26.0100

APELANTE: EDSON GOMES CARDOSO SANTOS


APELADOS: BUILD BRASIL EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA.
E ALL HERE FRANSHING LTDA - EPP

COMARCA: SÃO PAULO

Voto nº 19.863

DIREITO DA PERSONALIDADE. IMAGEM E DE


VOZ. CONTRATO DE CESSÃO ENCERRADO.
EXPLORAÇÃO IRREGULAR PELOS RÉUS.
OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. INDENIZAÇÕES
PELOS DANOS PATRIMONIAL E MORAL.
LUCROS CESSANTES. CABIMENTO.
LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. INDENIZAÇÃO
PELO DANO MORAL MANTIDA. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
Direito da personalidade. Atributo que confere à
pessoa o direito de reclamar pelo uso indevido de sua
imagem. Imagem e voz. Contrato de cessão encerrado.
Exploração irregular pelos réus. Imposição de
obrigação de não fazer. Indenizações patrimonial e
moral. Lucros cessantes. Cabimento. Precedente do
Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Apuração em
regular liquidação e sentença. Dano moral. Valor
fixado mantido.
Recurso parcialmente provido.

Trata-se de apelação interposta contra a sentença de


fls. 293/296, de relatório adotado, que julgou parcialmente procedente o
pedido para condenar os réus ao pagamento de multa contratual e também
ao pagamento de indenização pelo dano moral no valor arbitrado de R$
25.000,00.
Recorreu o autor alegando, em síntese, que deve ser
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reformada a sentença quanto ao pedido de obrigação de não fazer; que tem


direito de ser indenizado pelos lucros cessantes; que o valor da indenização
pelo dano moral deve ser majorado; e que deve ser julgado integralmente
procedente o pedido.
Sem contrarrazões.

É o relatório.

O autor celebrou contrato de cessão de direitos de


imagem e voz com os réus pelo período de doze meses e para exploração
em Angola. Afirmou na inicial, contudo, que os réus estavam
disponibilizando o material publicitário do qual participou no Brasil e
ainda no ano de 2016, quando promovida a demanda.

Pediu, assim, a condenação dos réus na obrigação de


não fazer, qual seja a paralisação imediata da utilização do material, bem
como a condenação das empresas no pagamento da multa contratual e em
indenizações pelos danos patrimonial e moral que experimentou.

A sentença acolheu apenas em parte o pedido e o D.


Relator sorteado nega provimento ao apelo, mas entendo que é de se
acolher em parte a pretensão recursal.

O pedido referente à cessação de utilização do material


publicitário contendo imagem e voz do autor procede. O contrato de cessão
dos referidos direitos da personalidade previa o prazo de um ano para
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divulgação do material e mais, apenas no referido país africano. Sucede


que o autor demonstrou que em maio 2016, quando aforada a demanda, os
réus ainda usavam o material no Brasil (fls. 34/39).

É preciso impor aos réus, assim, a ordem de imediata


paralisação de veiculação da imagem e da voz do autor, pena de multa
diária a ser estabelecida oportunamente pelo D. Juízo.

Quanto ao mais, o dano patrimonial experimentado


pelo autor também se consubstanciou, já que deixou de lucrar com a
exploração de sua imagem e voz, delas beneficiando-se indevidamente os
réus.

A imagem e a voz da pessoa constituem espécie de


direito da personalidade, expressamente previstos e protegidos pelo Código
Civil artigos 11 a 21. Sobre a personalidade Maria Helena Diniz lembra
a lição de Goffredo Telles Jr.: “consiste no conjunto de caracteres
próprios da pessoa. A personalidade não é um direito, de modo que
seria errôneo afirmar que o ser humano tem direito à personalidade.
Personalidade é que apoia os direitos e deveres que dela irradiam, é
objeto de direito, é o primeiro bem da pessoa, que lhe pertence como
primeira utilidade, para que ela possa ser o que é, para sobreviver e se
adaptar às condições do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de
critério para aferir, adquirir e ordenar outros bens”. Daí por que
explica a ilustre professora que “O direito da personalidade é o direito
da pessoa de defender o que lhe é próprio, como a vida, a identidade, a
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liberdade, a imagem, a privacidade, a honra etc” (“Curso de Direito


Civil Brasileiro”, vol. 1, Ed. Saraiva, São Paulo: 2007, p. 120).

Além disso, Carlos Roberto Gonçalves observa que


“A Carta Magna foi explícita em assegurar, ao lesado, direito à
indenização por dano material ou moral decorrente da violação da
intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. Nos
termos do art. 20 do Código Civil, a reprodução de imagem para fins
comerciais, sem autorização do lesado, enseja o direito à indenização,
ainda que não lhe tenha atingido a honra, a boa fama ou a
respeitabilidade” (Direito Civil Brasileiro, vol. 1, Ed, Saraiva, São Paulo:
2010, p. 201).

E sobre os danos patrimoniais experimentados pelo


autor, quais sejam os lucros cessantes que reclamou, o Egrégio Superior
Tribunal de Justiça deliberou precisamente em caso semelhante REsp
1.323.589/PB, rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 11.03.2015):

“(...)

Cinge-se a controvérsia a saber se o ora


recorrente, que teve sua imagem indevidamente
utilizada, para fins comerciais, nas embalagens
de um dos produtos fabricados pela ora recorrida
após o término do contrato que tinha com ela
entabulado para tal e outras finalidades, faz jus à
indenização pelos prejuízos materiais daí
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decorrentes - consubstanciados nos valores que


deixou de receber caso tivesse sido regularmente
renovada a avença - e se a indenização arbitrada
pela Corte local, a título de reparação pelos
danos morais por ele suportados em decorrência
desses mesmos fatos, revela-se ínfima a ponto de
demandar majoração por esta Corte Superior.

Extrai-se dos autos que, de fato, autor e ré


celebraram, em 6/2/2006 e com duração de dois
anos, contrato por meio do qual o primeiro,
nadador profissional, obrigou-se a conceder à
segunda, fabricante de alimentos, o direito a
utilização de sua voz e imagem 'em mídias
eletrônicas, impressas, externas, em todos os
veículos de comunicação sem restrição' (Cláusula
Primeira, §1º - e-STJ fl. 27) - bem como a
participar de eventos e compromissos
publicitários previamente agendados.

Na cláusula segunda do referido pacto ficou


estabelecido que, em retribuição pela cessão dos
direitos de uso de voz e imagem e pelas
obrigações publicitárias assumidas, o ora
recorrente receberia a quantia mensal de R$
3.000,00 (três mil reais) no primeiro ano de
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contrato e de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos


reais), também mensais, no segundo ano de
execução da referida avença.

Ambas as instâncias de cognição plena


reconheceram, ainda, restar comprovado que a
ora recorrida, mesmo após o término do contrato
e sem autorização para tanto, permaneceu
utilizando a imagem do recorrente para fins
comerciais, estampando-a nas caixas dos
produtos 'top crock', que foram
comprovadamente fabricados em 15/5/2008 e
30/1/2009 (e-STJ fl. 118), ou seja, por quase 12
meses após o termo final do acordo celebrado.

Diante dessas considerações, resulta


patente o dever da ora recorrida de indenizar o
autor da demanda, tanto pelos prejuízos
materiais quanto pelos danos morais por ele
suportados, merecendo, portanto, parcial
reforma o aresto ora hostilizado.

(...)

Isso porque, contraditoriamente, a Corte


local - que reconheceu tanto a preexistência do
contrato quanto o posterior uso indevido da
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imagem do autor pela ora recorrida - concluiu


restarem configurados apenas os danos morais
decorrentes do comportamento ilícito da
demandada, rechaçando a pretensão reparatória
por danos materiais sob a frágil fundamentação
de que (i) não teria o autor da demanda se
desincumbido do ônus de comprovar 'que o
faturamento da empresa aumentou
consideravelmente no período em que houve a
exposição da sua imagem' e (ii) sem a renovação
formal do pacto não haveria falar em indenização
pelos valores da contraprestação outrora
avençada (e-STJ fl. 258).

Ao assim decidir, a Corte local, como bem


destacado pelo ora recorrente, afrontou as
normas insertas nos arts. 186, 402, 927 e 944 do
Código Civil.

Sobreleva anotar que, de fato, o dano


material, em situações como a presente,
diferentemente do que ocorre com o de natureza
moral, não pode ser tido como dano in re ipsa. É
imprescindível sua comprovação.

Na hipótese dos autos, a comprovação se


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faz presente pelo só fato de ter o autor


demonstrado que o uso indevido de sua imagem
teve destinação comercial, o que se soma, ainda,
à comprovação da existência de contrato
firmado com a demandada e que previa sua
remuneração para o uso autorizado em período
pretérito.

Importante frisar que as premissas que ora


são externadas não decorrem do revolvimento do
acervo-fático probatório, tratando-se, em
verdade, de assertivas incontroversas ou
prefixadas pelas instâncias de cognição plena, o
que afasta eventual aplicação do óbice da
Súmula nº 7/STJ nesse ponto específico.

Como consabido, o dano dito material é


aquele que atinge o patrimônio da vítima,
entendendo-se como tal, nas palavras de Sérgio
Cavalieri Filho, 'o conjunto de relações jurídicas
de uma pessoa apreciáveis em dinheiro'
(Programa de Responsabilidade Civil, 3ª ed., São
Paulo: Malheiros, 2002, pág. 80).

Além disso, convém destacar que o dano


material pode atingir não só o patrimônio
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presente da vítima, mas também o futuro, sendo


perfeitamente possível afirmar que a ação ilícita
de terceiro enseja reparação material tanto
quando reduz o acervo patrimonial da vítima
(dano emergente), quanto quando impede o
crescimento que lhe é razoavelmente esperado
(lucros cessantes).

O ora recorrente, que viu sua imagem ser


indevidamente utilizada pela ora recorrida, faz
jus, portanto, à indenização material pelos
lucros cessantes suportados, que devem
corresponder aos valores que proporcionalmente
receberia caso a autora do ilícito tivesse
promovido a regular renovação de seu contrato,
ainda que com a significativa redução do objeto
deste.

Afinal, se tinha a recorrida a intenção de


permanecer fazendo uso apenas da imagem do
ora recorrente, liberando-o da cessão do uso de
sua voz e do comparecimento a compromissos
comerciais, cumpria-lhe propor pacto nesse
sentido, o que não fez.

Isentá-la de reparar o autor pelo que ele


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deixou de auferir importaria em seu


enriquecimento sem causa, o que não se admite.

Por outro lado, estipular indenização em


prol do autor pelos mesmos valores do contrato
anteriormente firmado ensejaria o inverso, ou
seja, o indevido enriquecimento deste.

A adequada solução da controvérsia impõe,


pois, que seja a presente indenização material
fixada levando-se em consideração não só o
tempo pelo qual irregularmente perpetrada a
indevida utilização da imagem do autor
(aproximadamente 12 meses), mas também a
redução proporcional da contraprestação que lhe
seria devida, tendo em vista que o contrato
originalmente entabulado tinha objeto muito mais
amplo do que a simples utilização de sua imagem.

Assim, revela-se suficiente para a restitutio


in integrum que se imponha à recorrida o ônus de
indenizar o recorrente, tanto em R$ 8.000,00
(oito mil reais), pelos danos morais já
reconhecidos na origem, quanto em R$ 14.000,00
(quatorze mil reais), a título de danos materiais -
valor este correspondente a 1/3 do que lhe seria
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devido se o contrato originalmente firmado entre


as partes tivesse sido por mais um ano renovado”
(grifos nossos)

No caso, entretanto, e diferentemente do constante na


deliberação referida, o ajuste celebrado entre as partes litigantes era mais
restrito que o ato ilícito posteriormente perpetrado pelos réus, ou seja, o
uso indevido da imagem e da voz do autor em nível nacional, e por anos
depois do término do ajuste.

Por isso, com o fim de se apurar os efetivos valores


devidos ao autor pelos réus, necessária será a realização de liquidação,
tendo-se os fixados no contrato como um piso de indenização.

No mais, o valor da indenização estabelecida pela


ofensa moral sofrida pelo autor não comporta modificação, já que
adequada aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade a serem
aplicados na fixação da quantia, conforme jurisprudência do Egrégio
Superior Tribunal de Justiça: “recomendável que o arbitramento seja feito
com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico dos autores e, ainda, ao porte econômico dos réus,
orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela
jurisprudência com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom
senso e atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso”
(AgRg no Ag 884139/SC, rel. Min. João Otávio de Noronha, j.
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18.12.2007).

Portanto, e a meu aviso, o apelo é de ser acolhido em


parte.

Pelo exposto, meu voto é no sentido de DAR


PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, nos termos atrás alinhavados,
majorando a verba honorária advocatícia sucumbencial para o percentual
de 11% sobre o valor atualizado das condenações, à luz do quanto
determinado pelo art. 85, §11, do atual Código de Processo Civil.

J. B. PAULA LIMA
RELATOR DESIGNADO
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Voto nº 6.484
Apelação Cível nº 1066213-06.2016.8.26.0100
Comarca: São Paulo
Apelante: Edson Gomes Cardoso Santos
Apelados: Build Brasil Empreendimentos e Participações Ltda. e All Here
Franshing Ltda - Epp

DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO

Respeitadas as pertinentes considerações externadas pela Douta Maioria,


ousei divergir.

Considerei que, por não terem sido localizadas as rés e seus sócios, não
haveria como impor o cumprimento de uma obrigação, nem multa pelo
descumprimento, posto que não há comprovação de que elas tenham sido efetivamente
intimadas da decisão que deferiu a tutela de urgência, como, aliás, constou de decisão de
fls. 106, que restou irrecorrida.

Por outro lado, entendi cabível indenização, nos termos do art. 20, do
CC, c.c. art. 5º, inc. X, da CF, por ter a imagem do autor sido utilizada sem sua expressa
autorização.

Essa indenização é cabível mesmo que o uso indevido da imagem do


autor não tenha lhe atingido a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, como na espécie,
mas tenha se destinado a fins comerciais. O dano, nesse caso, é in re ipsa.
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Nesse sentido, aliás, a súmula 403, do C. STJ:

“Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação


não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou
comerciais”.

Note-se que o que independe de prova é o prejuízo e não o uso indevido


da imagem. Este necessita ser demonstrado.

Na espécie, porém, a despeito de o autor ter demonstrado que a franquia


possui diversas lojas no Brasil (fls. 30/33), ele não comprovou que sua imagem foi
indevidamente utilizada em todas elas, nem que esse uso tenha se prolongado por mais
de 06 anos, como ele alega na inicial. Aliás, a quantidade de lojas só tem relevância para
a definição da extensão do dano, quando da fixação do quantum indenizatório.

O que restou efetivamente demonstrado foi o uso indevido de sua


imagem em duas lojas franqueadas, restrito ao ano de 2016 (fls. 37, 39 e 103/105).

Pois bem. O contrato firmado pelas partes previa o uso da imagem do


autor em Angola, pelo período de 12 meses consecutivos, com início previsto para
novembro/2009. O uso da imagem fora dessas condições estabelecidas no contrato
implica em descumprimento contratual, sujeitando-se a parte infratora às penalidades
cabíveis.

Ocorre que o próprio contrato previu uma cláusula penal para a hipótese
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de infração a qualquer cláusula contratual (cláusula 14 fls. 24). Segundo ela, a parte
infratora estaria sujeita ao pagamento de multa de 30% do valor do contrato., além de
eventual ação de perdas e danos.

Ora, como é cediço, por meio da cláusula penal, as partes contratantes


estipulam, de antemão, uma pena pecuniária que será devida pela parte que infringir a
obrigação à parte inocente, para compensar os prejuízos sofridos por esta.

Como ensina Maria Helena Diniz, in Curso de Direito Civil Brasileiro, 2º


Vol., 18ª ed., Saraiva, 2.003, p. 392:

“A cláusula penal vem a ser um pacto acessório, pelo qual as


próprias partes contratantes estipulam, de antemão, pena
pecuniária ou não, contra a parte infringente da obrigação, como
consequência de sua inexecução completa culposa ou à de
alguma cláusula especial ou de seu retardamento, fixando,
assim, o valor das perdas e danos, e garantindo o exato
cumprimento da obrigação principal (CC, art. 409, 2ª parte).
Constitui uma estipulação acessória, pela qual uma pessoa, a fim
de reforçar o cumprimento da obrigação, se compromete a
satisfazer certa prestação indenizatória, seja ela uma prestação
em dinheiro ou de outra natureza, como a entrega de um objeto,
a realização de um serviço ou a abstenção de um fato (RT,
172:138; RF, 146:254, 102:18), se não cumprir o devido ou o
fizer tardia ou irregularmente, fixando o valor das perdas e
danos devidos à parte inocente em caso de inexecução
contratual”.
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E, adiante, continua a civilista (ob. cit., p. 396):

“(...) A cláusula penal representa uma preestimativa das perdas e


danos que deverão ser pagos pelo devedor no caso de
descumprimento do contrato principal. As partes contratantes
serão livres para estabelecê-la; (...)”.

Ora, se a cláusula penal constitui, na verdade, uma pré-fixação das perdas


e danos, afigura-se descabida sua cumulação com lucros cessantes, sob pena de bis in
idem.

Nesse sentido, é a jurisprudência do C. STJ:

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.


DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZATÓRIA.
ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. CORREÇÃO
MONETÁRIA DO SALDO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE
CLARA PREVISÃO CONTRATUAL. DEVER DE
INFORMAÇÃO. INOBSERVÂNCIA (SÚMULAS 5 E 7/STJ).
DANO MORAL. CABIMENTO (SÚMULA 83/STJ).
NATUREZA DA CLÁUSULA PENAL, MORATÓRIA OU
COMPENSATÓRIA. IRRELEVÂNCIA PARA EFEITO DE
CUMULAÇÃO COM INDENIZAÇÃO POR PERDAS E
DANOS, SEJA NA MODALIDADE LUCROS CESSANTES
OU DANOS EMERGENTES. DESCABIMENTO. AGRAVO
PROVIDO. (...)
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5. Independentemente do caráter da cláusula penal, se moratória


ou compensatória, não cabe a cumulação com indenização por
perdas e danos, seja na modalidade lucros cessantes ou danos
emergentes. Precedentes.
(STJ. AgInt no REsp. nº 1.699.271/SP. Min. Relator: Raul
Araújo. 4ª Turma. D.J.: 30/11/2020).

Se assim é, no caso em exame, aplicar-se-ia somente a cláusula penal


prevista no contrato.

Note-se que, diante do descabimento da cumulação de cláusula penal,


seja ela moratória ou compensatória, com perdas e danos (lucros cessantes ou danos
emergentes), afigura-se irrelevante o fato de constar do contrato a previsão de eventual
ação de perdas e danos, que ficaria, in casu, restrita apenas aos danos morais.

Por essas razões, não acolhi os pedidos de imposição de cumprimento de


obrigação de não fazer e de multa pelo descumprimento, nem de condenação ao
pagamento de lucros cessantes.

Diante do exposto, pelo meu voto, NEGAVA PROVIMENTO ao


recurso.

JAIR DE SOUZA
Relator sorteado, vencido
(assinatura eletrônica)
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Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:

Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação


1 13 Acórdãos JOAO BATISTA DE MELLO PAULA LIMA 1546BA40
Eletrônicos
14 18 Declarações de JAIR DE SOUZA 157ABD24
Votos

Para conferir o original acesse o site:


https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo
1066213-06.2016.8.26.0100 e o código de confirmação da tabela acima.

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