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DOI 10.22478/ufpb.2317-6032.2020v24n1.30300
RESUMO ABSTRACT
Objetivo: Identificar a conduta de enfermeiros perante uma Objective: to identify the nurses’ actions towards the emergency
emergência no período puerperal. Metodologia: estudo qua- in the postpartum period. Methodology: qualitative and explor-
litativo do tipo exploratório. Os dados foram coletados de atory study. Data was carried out from October to November
outubro a novembro de 2013, por meio de entrevistas feitas 2013, through semi-structured interviews, which were done with
com enfermeiros de dois Centros Obstétricos e Ginecológicos nurses from two Obstetric Gynecologic centers in the south of
no Sul do Rio Grande do Sul. Resultados: a maioria dos enfer- Rio Grande do Sul. Results: most part of the interviewed nurses
meiros entrevistados possuía um tempo curto de trabalho nos have a short time of experience working in the Obstetric Gyne-
Centros Obstétricos e Ginecológicos e sua atuação não difere, cologic centers, and their reactions do not differ, being based on
tendo como base a verificação dos sinais vitais e a punção de the verification of vital signs and vein puncture access. Concern-
um acesso venoso. Quanto às intercorrências, a hemorragia ing the complications, the postpartum hemorrhage by uterine
puerperal por atonia uterina foi a mais citada. Conclusão: des- atony is the most cited. Conclusion: as positive factors, the
tacou-se como fator positivo, a boa interação e organização good intention and organization has been highlighted, which is
entre a equipe de enfermagem, sendo um aspecto fundamental a fundamental aspect for the performance of a good assistance
para a realização de um bom atendimento em intercorrências when having complications with mothers. On the other hand, as
com as puérperas. Por outro lado, como fator negativo obser- negative factors, time of experience of these professionals and
vou-se o tempo de experiência dessas profissionais e a falta lack of knowledge on this topic were observed.
de conhecimento sobre esse assunto.
DESCRITORES DESCRIPTORS
Enfermagem. Período Pós-Parto. Tratamento de Emergência. Nursing. Postpartum Period. Emergency Treatment.
1
Enfermeira. Graduada em Enfermagem pela UFPel. Residente em Saúde Coletiva na UFRGS. Porto Alegre/RS/Brasil.
² Enfermeira. Doutora em Enfermagem pela Universidade de Ribeirão Preto USP. Professora Adjunta da Faculdade de Enfermagem
UFpel. Membro do Núcleo de Condições Crônicas e Suas Interfaces (NUCCRIN). Coordenadora da Pesquisa. Pelotas/RS/Brasil.
3
Enfermeira. Doutora em Ciência da Saúde pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da UFPel. Docente no
curso de Enfermagem da UNIVATES. Lajeado/RS/Brasil.
4
Enfermeira. Doutoranda em Ciências da Saúde pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem/UFPel. Docente no curso de
enfermagem no Centro Universitário Cenecista de Osório. Membro da comissão técnica do Journal of Nursing and Health. Osório/
RS/Brasil.
5
Enfermeiro.Doutor em Ciência área de concentração enfermagem e saúde- UFPel. Bolsista Programa Nacional de Pós-Doutorado
- PNPD- CAPES. Membro do Núcleo de Condições Crônicas e Suas Interfaces (NUCCRIN). UFPel. Pelotas. Rio Grande do Sul.
Brasil.
6
Doutora em Enfermagem em Saúde Pública pelo Programa de Pós-Graduação Materno-Infantil e Saúde Pública da Escola de
Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Professora Adjunta da Faculdade de Enfermagem da Universidade
Federal de Pelotas. Brasil. Pelotas/RS/Brasil.
http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/rbcs
CAETANO et al.
A
enfermagem está inserida em vários haver maior dano perineal, evidenciando a ne-
meios de prestação de serviços, os cessidade de episiotomia. Tal procedimento,
quais começam na atenção básica e pode vir a desencadear efeitos a curto e em
seguem até o atendimento de alta complexida- longo prazo, como dor e infecção iniciada no
de tecnológica. Com base nesse pensamento, aparelho genital e endometrite, caracterizada
o enfermeiro precisa estar capacitado e prepa- por apresentar sinais flogísticos na área de
rado para gerenciar e liderar uma situação de implantação placentária, em curto prazo, e
emergência, como por exemplo emergência comprometimento do esfíncter anal, em longo
no período puerperal. prazo3.
O puerpério é o tempo de seis a oito Diante do exposto, a equipe de en-
semanas após o parto e é um episódio biológi- fermagem necessita estar atenta aos riscos
co natural, cronologicamente variável, em que evidenciados no período puerperal, enquanto
ocorrem alterações fisiopatológicas devido a a puérpera ainda se encontra na unidade de
vários fatores e pode ser classificado em três maternidade. Por isso, é necessário redobrar
períodos: imediato, tardio e remoto. Durante os cuidados, principalmente atentar para os
esses períodos se desenvolvem todas as ma- sinais vitais, para as queixas e ter como base
nifestações internas e externas e de recupera- a prevenção de complicações, bem como o
ção da genitália após a expulsão da placenta, conforto físico e emocional, aliados a ações
no qual os órgãos e sistemas envolvidos direta educativas que possam oferecer à mulher
ou indiretamente na gravidez e no parto so- ferramentas para cuidar de si e do recém-
frem um processo regenerativo na tentativa de -nascido4.
retornar às condições pré-gravídicas¹. Para atuar frente a essas situações
A fase puerperal pode acarretar riscos de emergência, o enfermeiro precisa manter
para a mulher, geralmente quando essa pas- seu conhecimento científico atualizado, além
sou por uma gestação de alto risco. Neste de conhecer o protocolo de emergência na
contexto, emergências como pré-eclâmpsia, unidade em que atua, bem como, necessita
eclampsia e hemorragias podem acometer realizar um atendimento de qualidade, des-
as puérperas e, dessa forma, elas passam tacando o acolhimento que é essencial para
a necessitar de mais atenção por parte da realizar uma boa escuta, a fim de direcionar
equipe de saúde². para as queixas das puérperas5.
Outro fator que pode desencadear Ainda nesse contexto, entende-se
problemas no pós-parto às puérperas é o que o profissional enfermeiro tem que estar
tipo de parto escolhido, cesariana ou normal. preparado para atuar frente às emergências,
No parto cesariana, por exemplo, pode-se sabendo identificar os problemas e situações
ter complicações como infecções na parede de risco, para que possa ser prestado um
abdominal ou no local da incisão cirúrgica e serviço de qualidade e atender as demandas
hemorragias, devido à hipotonia ou atonia que a unidade exige de forma eficiente6.
uterina. No parto vaginal, pode ser normal ou A atenção prestada a essa mulher pre-
por meio de fórcipe, para esse último pode cisa ser efetiva e com um olhar mais atento
Ginecológico e os outros seis enfermeiros têm ração e vínculo com a equipe e saber
de dois a cinco anos de trabalho no setor. Com que ela está preparada para ajudar é
relação ao tempo de formação na graduação, importante no caso de ter uma intercor-
dois enfermeiros possuem mais de vinte anos, rência. Ninguém fica sem fazer nada,
outros dois entre dez e quinze anos e três todos saem fazendo alguma coisa. (E
possuem menos de cinco anos de formação. 1 – 9 meses).
Após a transcrição das entrevistas e Quando chega uma emergência elas
releituras foi possível identificar três temas: (técnicas em enfermagem) trabalham
1) facilidades na atuação frente à emergência junto, não é aquilo ‘ah tô com tal pa-
puerperal; 2) dificuldades na atuação frente ciente’. Não, todo mundo pega junto.
à emergência puerperal e 3) emergências Então isso facilita bastante o serviço
puerperais vivenciadas. e pra uma enfermeira ter uma equipe
assim é uma benção (risos). (E 8 – 2
Facilidades na atuação frente à emergência anos)
puerperal
Quanto à organização da equipe, as
Neste tema evidenciam as facilidades enfermeiras relataram, em sua maioria, terem
de atendimento da equipe de trabalho durante equipes organizadas, as quais têm iniciativa
uma emergência puerperal. de assumir cada integrante da equipe um
O trabalho em equipe frente a uma papel dentro da situação de emergência. As-
emergência puerperal destacou-se nas en- sim sendo, ter-se-á um atendimento eficaz e
trevistas como uma questão relevante e po- seguro para a paciente.
sitiva frente ao atendimento dessa situação.
Percebeu-se que a organização da equipe é Todos se ajudam, isso eu vejo bem.
fundamental na hora da assistência em uma Um assume o posto de enfermagem e
intercorrência com a puérpera. Inclusive, a os outros ficam se ajudando bastante
maior facilidade encontrada na hora de emer- durante intercorrência. Foram raros
gência foi o preparo da equipe para atuar em os casos de ficar dizendo ‘fulana tu
conjunto. No entanto, apesar de ter surgido faz isso, faz aquilo outro’, não, elas já
também como uma dificuldade quando não sabem como agir. Isso ajuda muito. É
preparada, os depoentes assumiram que uma equipe bem atinada. É uma equi-
uma boa interação entre a equipe na hora pe experiente que já estão há bastante
de uma emergência é fundamental. Na fala tempo (...) (E 1 – 9 meses)
do participante, destaca-se a importância do Geralmente já sabem o que tem que
vínculo da equipe de enfermagem diante de fazer. Se tiver faltando alguma coisa
uma emergência puerperal. elas (técnicas de enfermagem) já
falam, se tiver fazendo alguma coisa
(...) a interação com a equipe é rápida. para, eu nem preciso dizer faz isso,
Acho que como ponto positivo a inte- faz aquilo, elas já sabem. Já correm, já
uma conduta. Nesses casos, os entrevistados como dois disseram ter especialização em
demonstraram certa insegurança na hora de urgência e emergência. Fato evidenciado nas
agir diante de uma emergência e citaram a falas a seguir:
equipe como amparo necessário nas primeiras
condutas, como na fala a seguir: (...) com a minha experiência, umas
das coisas que eu acho que eu tenho
Como as situações acontecem muito facilidade é de saber o que é urgente e
primeiro assim na sala de exame, o que não é, sabe (...) (E 2 – 14 anos)
a gente já chama o médico e ele já (...) a gente que trabalha com urgência
examinou, ele já sabe dizer o que tem e emergência está acostumada a rece-
que ser feito. Se não a gente coloca a ber paciente em choque hipovolêmico,
paciente no leito e corre pra chamar o então a gente já sabe como atuar, o
médico pra ver o que precisa ser feito. que fazer. Só que tem que adequar as
(E 8 – 2 anos) situações ao ambiente. (E 7 – 1 ano e
6 meses)
Nesse depoimento, o enfermeiro refere
que o atendimento do enfermeiro depende da Essa análise está associada aos resul-
conduta médica quando questionados sobre a tados de um estudo realizado com profissio-
quem a iniciativa compete frente à emergên- nais de saúde, incluindo enfermeiros, técnicos
cia puerperal. Em tais casos, a experiência e auxiliares em enfermagem referente à qua-
e tempo de trabalho não foram os principais lidade assistencial prestada nos serviços de
fatores vistos, pois ambos possuem diferentes saúde. A pesquisa revelou que quanto mais
tempos de trabalho no setor. capacitados e experientes os enfermeiros são,
Contudo, cabe salientar que o conheci- melhor será o trabalho da sua equipe frente
mento científico deverá ser a base da atuação ao paciente. O estudo também mostra que a
do enfermeiro frente às intercorrências, bem maioria dos enfermeiros investe no próprio
como saber gerenciar e liderar a equipe, conhecimento científico e prático e isso têm
organizando a distribuição das tarefas e pro- auxiliado no momento da ação dentro do ser-
porcionando um atendimento eficaz. Sabe-se viço de saúde6.
que a atenção à puérpera em situação de O material disponível nas unidades
emergência deve ser prestada pelo enfermeiro também foi citado como uma facilidade na
e sua equipe. atuação dos enfermeiros diante de uma
Outra facilidade encontrada e bas- emergência. As duas instituições, onde foram
tante citada pelos enfermeiros foi o tempo realizadas as entrevistas, foram contempladas
de experiência e o conhecimento, os quais, neste ano com carros de parada cardiorrespi-
segundo eles, ajudam a detectar o risco de ratórios bem equipados. Isto é destacado na
uma emergência puerperal. Dos nove enfer- fala a seguir:
meiros entrevistados, dois referiram mais de
dez anos de formação na graduação, bem (...) temos o material todo, temos carri-
um ambiente no qual as mulheres vão ter seus então muita gente nova também é um
filhos e de onde deveriam sair sem nenhuma problema e isso acaba não facilitando.
intercorrência grave. Assim, os enfermeiros (E 9 – 6 meses)
relataram que quando as intercorrências acon-
tecem, geralmente são graves e marcantes. O participante destaca em sua fala a
A gente já teve alguns casos que chocaram questão da equipe de enfermagem não ter
bastante, de perder a paciente, de não con- experiência assim como o próprio enfermeiro,
seguir reverter. (E 2 – 14 anos). devido ao curto tempo de trabalho, e isso o
Os enfermeiros referiram que existem afeta nas atividades do setor.
funcionários que não conseguem exercer o A organização da equipe promove um
serviço corretamente por simplesmente não compromisso de qualidade na assistência,
quando na mesma existem condições de
saber o que fazer diante de uma intercorrên-
aprendizagem adequadas para um atendi-
cia. (...)eu estou tendo um pouco de dificul-
mento eficaz, como pode ser observado na
dade (...) elas ficam às vezes meio perdidas,
fala a seguir em que o enfermeiro referiu
assim sem saber o que priorizar. (E 2 – 14
tumulto na hora de atender a intercorrências:
anos). Nessa fala, o enfermeiro destaca que
a dificuldade está em alguns técnicos de en-
(...) é tumultuado porque assim, eu já
fermagem não saber lidar com a situação de
vi duas fazendo a mesma coisa, sai
emergência, colocando em risco sua atuação,
correndo pra fazer a mesma coisa (...)
podendo ocasionar até mesmo um conflito na
(E 9 – 6 meses).
equipe.
A falta de experiência profissional dos No entanto, ainda existem profissionais
enfermeiros também foi citada como dificul- técnicos em enfermagem que não aderem
dade. Um dos depoentes tem seis meses aos novos conceitos de assistência por falta
de trabalho no centro obstétrico e nunca vi- de tempo e falta de interesse. Com isso, os
venciou uma emergência puerperal, fato que enfermeiros referem que a qualidade de ser-
influenciará no momento em que o mesmo viço prestada não é adequada14.
precisar agir, e, ainda, referiu que quando se Quando questionados sobre a existên-
tem muitos trabalhadores com pouca expe- cia de capacitação nas unidades, a maioria
riência trabalhando junto, fica ainda mais difícil dos enfermeiros relatou que existe, porém
de lidar com a intercorrência. poderia melhorar. As capacitações existentes
são fornecidas pelas próprias instituições,
(...) eu até não encontro muitas facili- segundo os depoentes, e as mesmas são
dades. Nesse caso ás vezes eu acho para toda a equipe, contando técnicos em
que falta um pouco até pra equipe ser enfermagem e enfermeiros. Contudo, os
mais estruturada, ter um pouco mais enfermeiros referiram que capacitações re-
de conhecimento. O pessoal fica um ferentes às urgências e emergências fazem
pouco perdido, até porque eu sou nova falta e que no tempo de trabalho, ainda não
e tem muito pessoal técnico também, obtiveram no setor.
Para urgências eu nunca vi. Na unida- choque hipovolêmico pode evoluir para parada
de nunca vi. Só parada, para parada cardiorrespiratória (PCR), infecção por aborto
sim, eles fazem junto para o técnico inseguro, infecção em ferida operatória, hipo-
em enfermagem e os enfermeiros, tensão postural e crise convulsiva.
para toda a equipe. Só de parada. (E
1 – 9 meses) (...) a que dá mais trabalho, com re-
lação ao Centro Obstétrico, até por
Os depoentes revelaram o quanto uma começar por uma hemorragia é a
capacitação é importante. Nas suas falas, paciente progredir pra uma PCR, aí a
relataram que o atendimento melhora nos coisa complica um pouquinho mais. (E
mínimos detalhes quando se é capacitado 2 – 14 anos)
para atender tal situação. (...) nas peculiari-
dades que a gente nota que foram mudando Essa fala evidencia o quanto uma
na maneira de fazer, e como fazer através situação de emergência como uma PCR
destes cursos de capacitação. Isso é muito desestabiliza o andamento das rotinas de tra-
bom. (E 7 – 2 anos). Em outro momento E balho, visto que é uma situação não típica da
6 – 5 anos relata: Eu acho que seria muito maternidade, diferentemente de um setor de
importante uma capacitação. Muitos dizem emergência, em que a equipe já se organiza
‘ai eu sei como agir’ mas sempre tem uma cotidianamente, estando preparada para o
novidade, sempre é bom compartilhar alguma advento de uma situação de parada durante o
coisa. Bem como manter-se atualizado frente plantão. Entretanto, a equipe de uma unidade
às novas diretrizes de atendimento nas emer- de maternidade não espera, necessariamente,
gências, o que facilita o desenvolvimento de que tal acontecimento ocorra e, quando ele
técnicas de enfermagem. sobrevém, acaba acontecendo dentro de uma
A capacitação do profissional promove lógica diferenciada, haja vista a questão da
o desempenho do trabalhador na dimensão imprevisibilidade, podendo desestruturar todo
técnico-científica e passa a exigir algumas o planejamento, inclusive aquele pensado pela
características como: atitude proativa, inicia- equipe de enfermagem16.
tiva, criatividade, discernimento, capacidade Os relatos de emergências decorren-
de decisão, entre outras. Assim sendo, cria-se tes de abortos provocados marcaram muito
uma ampliação na atuação desse profissio- as entrevistas. Intercorrências graves como
nal, exigindo um melhor desempenho nas hemorragias, evoluindo para choque hipovolê-
demandas15. mico, ocasionadas por aborto inseguro, foram
relatadas pelos enfermeiros e marcantes na
Emergências puerperais vivenciadas carreira desses profissionais.
As principais intercorrências citadas (...) teve uma vez que chegou uma
durante as entrevistas foram atonia uterina, paciente pelo Pronto Socorro em cho-
que desencadeando hemorragia e posterior que hipovolêmico, chegou o residente
colocou na mesa e aquele sangue, a quando o aborto não ocorre do jeito esperado,
mulher numa palidez total (...) e dali elas demoram em procurar ajuda, agravando
já foi pro bloco. Foi aquilo assim, ela o caso, destacado na fala a seguir:
chegou na última hora que tinha que
chegar (...) ela chegou praticamente (...) na verdade não é o de provocar ou
morta, por um aborto provocado e não que complica a situação, é o tempo
demorou pra procurar ajuda (...) (E que elas levam pra procurar assistên-
2 – 14 anos) cia. Aí ficam com aquele aborto retido
alguns dias, infecciona, morre pela
O aborto é uma realidade presente e sepse, não é nem pela hemorragia,
um desafio complexo para os profissionais da elas provocam, mas não conseguem
saúde. Em um estudo a respeito da percepção expelir, e isso acontece muito (...) (E
das enfermeiras em relação ao cuidado em 2 – 14 anos)
situação de aborto provocado, foi destacado
o fato dos enfermeiros se dividirem na hora A hemorragia pós-parto também foi
do atendimento à mulher que provocou abor- citada como uma intercorrência grave. Essa é
to. Essas se dividem em quatro: concepções a principal causa de morte materna no mundo
religiosas, na qual o profissional fica indeciso e pode se dar de forma direta ou indireta18. De
quanto à imparcialidade ou a rejeição do cui- acordo com os enfermeiros, as causas diretas
dado; não imparcialidade com tentativas de são mais comuns de acontecer, as complica-
reverter o aborto; reconhece a situação da ções no parto e até mesmo, como já citado, o
mulher e a imparcialidade pela preocupação aborto provocado. Na fala a seguir, destaca-se
com o aborto social e respeita a decisão da esse ponto: (...) choque hipovolêmico quando
mulher 17. Nesta pesquisa, observaram-se tem hemorragia é o que mais a gente vê. No
depoimentos que se enquadram na categoria geral são essas, é a convulsão, o choque por
de manter a imparcialidade pela preocupação hemorragia (...) (E 2 – 14 anos)
com o aborto e respeito à decisão da mulher, A principal causa de hemorragia é ato-
conservando assim o atendimento relacionado nia uterina, que é a diminuição ou perda da
à saúde da mulher, independente, da crença capacidade contrátil uterina18. Essa causa é
do enfermeiro. destacada pelos enfermeiros como sendo uma
Os depoentes revelaram que os casos das intercorrências que acontecem com mais
de abortos provocados estão cada vez mais frequência no Centro Obstétrico Ginecológico,
frequentes e as mulheres estão recorrendo destacado na seguinte fala: Atonia uterina
a meios menos invasivos como medicações, foi a principal intercorrência (...) e a paciente
porém, igualmente prejudiciais à saúde. De apresentava grande sangramento vaginal (...).
acordo com os enfermeiros, as mulheres pos- (E 5 – 2 anos)18. Um estudo, cujo objetivo foi
suem um conhecimento maior em relação à identificar as mortes maternas por hemorragia
prática do aborto e utilizam métodos que não no Brasil, ressaltou que a principal causa de
venham a prejudicar sua saúde. Contudo, hemorragia é a atonia uterina e esta é de fato a
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