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Como citar este artigo: Pereira LR, Rodrigues GMM, Ferreira ES, Barros INM, Carneiro MS, Siqueira LS. Parto nor-
mal e intervenções ocorridas em uma maternidade pública. Rev baiana enferm. 2019;33:e-32631.
Objetivo: analisar a relação entre as intervenções realizadas durante o trabalho de parto e a duração da fase ativa
em parturientes internadas. Método: estudo documental, tipo levantamento de dados, com abordagem quantitati-
va, realizado em uma maternidade no Pará, Brasil. A análise dos dados ocorreu por meio de estatística descritiva.
Resultados: identificadas as intervenções: amniotomia (6,1%), ocitocina (64,2%) e episiotomia (16,7%). A relação das
intervenções com a duração da fase ativa do trabalho de parto ocorreu com maior frequência em mulheres com
menos de 5 horas na fase ativa. Conclusão: as intervenções realizadas em partos de risco habitual e no período de
fase ativa menor que 5 horas não encontraram sustentação teórica e remeteram ao modelo biomédico.
Objective: to analyze the relation between the interventions performed during labor and the duration of the active
phase in hospitalized parturients. Method: a documentary study, of the data collection type, with a quantitative
approach, performed in a maternity hospital in Pará, Brazil. Data analysis was performed using descriptive statistics.
Results: the following interventions were identified: amniotomy (6.1%), oxytocin (64.2%) and episiotomy (16.7%). The
relation between the interventions and the duration of the active phase of labor occurred most often in women with
less than 5 hours in the active phase. Conclusion: the interventions performed in habitual risk deliveries and in the
active phase period with less than 5 hours did not find any theoretical support and referred to the biomedical model.
Objetivo: analizar la relación entre las intervenciones realizadas durante el trabajo de parto y la duración de la
fase activa en parturientas internadas. Método: estudio documental, del tipo recolección de datos y con enfoque
cuantitativo, realizado en una maternidad de Pará, Brasil. Los datos se analizaron por medio de estadística
1
Enfermeira. Pesquisadora independente. Belém, Pará, Brasil.
2
Estudante de Enfermagem. Universidade Federal do Pará. Belém, Pará, Brasil. mouranaah05@gmail.com
3
Enfermeira. Mestre em Biologia dos Agentes Infecciosos e Parasitários. Professora da Universidade Federal do Pará. Belém, Pará, Brasil. licalipe8@yahoo.com.br.
https://orcid.org/0000-0002-7983-7799
4
Enfermeira. Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal do Pará. Belém, Pará, Brasil.
5
Enfermeira. Especialista em Residência em Enfermagem Obstétrica. Belém, Pará, Brasil. https://orcid.org/0000-0003-0870-0522
Introdução
O cuidado à mulher durante o trabalho de seu uso está associado a uma série de outras
parto e parto, além de pressupor interação, deve intervenções, nomeadas como “efeito cascata”,
adotar técnicas sustentadas por evidências cien- atualmente questionado e colocado em pauta
tíficas que contribuam para a autonomia e o em- nos debates sobre os direitos sexuais e reprodu-
poderamento da mulher no cenário do parto e tivos, assim como nas discussões sobre a auto-
nascimento, assim como para a diminuição da nomia da mulher sobre seu corpo, também no
(4)
morbidade e mortalidade materna e perinatal. momento do parto .
O modelo obstétrico brasileiro passa por um Quanto à realização da amniotomia, a Orga-
(5)
período de transição entre o modelo biomédico nização Mundial da Saúde (OMS) define que
e o humanizado. De acordo com o modelo bio- é o rompimento precoce das membranas am-
médico, o trabalho de parto e parto é visto como nióticas e esclarece que, embora possa encurtar
evento de risco para o binômio mãe-feto. Por a primeira fase do trabalho de parto, não está
isso, necessita do ambiente hospitalar com tec- demonstrada diferença significativa em outros
(1)
nologia para possíveis intervenções . resultados clínicos importantes.
Quanto à realização dos partos em ambientes No que se refere à episiotomia, trata-se de
hospitalares, conforme as Diretrizes Nacionais procedimento cirúrgico que objetiva aumentar a
(2)
de Assistência ao Parto Normal , esse ambiente abertura vaginal por uma incisão no períneo du-
(6)
é propício para que a mulher sofra intervenções, rante o período expulsivo . Nos últimos anos, es-
de forma indiscriminada, a exemplo da episio- tudos publicados demonstraram que tanto as indi-
tomia, do uso de ocitocina, da realização de cações de episiotomia quanto as técnicas variam
(7)
amniotomia e indicação de cesárias desneces- conforme o contexto e a equipe profissional .
sárias. As Diretrizes evidenciam que, durante o Assim, observa-se que há necessidade que
processo parturitivo, o excesso de intervenções os profissionais de saúde utilizem práticas obs-
reforça a visão biomédica do parto e desconsi- tétricas humanizadas, pois, em muitos casos, a
dera os aspectos emocional, cultural e humano. maioria das intervenções são desnecessárias e
Desse modo, o cuidado profissional durante o acabam trazendo malefícios às parturientes de
(8)
parto e o nascimento deve considerar as singu- risco habitual .
laridades de cada mulher e família para além do Nessa perspectiva, este estudo tem como
(2)
processo de parir e nascer . objetivo analisar a relação entre as intervenções
É válido ressaltar que o modelo de atenção ao realizadas durante o trabalho de parto e a du-
parto com uso excessivo de intervenções, como ração da fase ativa em parturientes internadas.
a amniotomia, o uso de ocitocina no trabalho de
parto e a episiotomia, não encontra respaldo em Método
(3)
estudos internacionais .
A ocitocina é um hormônio com ação cen- Trata-se de um estudo documental, retrospec-
tral no trabalho de parto, por ser responsável tivo, do tipo levantamento de dados, com abor-
pelo estímulo das contrações uterinas. Por isso, dagem quantitativa, realizado em maternidade
no estado do Pará, Brasil. A amostragem foi pelos Comitês de Ética e Pesquisa (CEP), CAAE
probabilística, sendo o tamanho da amostra 72565317.0.0000.0018 e 72565317.0.3001.5171.
obtido pela fórmula para cálculo de proporções
em populações finitas, com base na média de Resultados
partos normais de risco habitual ocorridos entre
os anos de 2015 e 2016. A relação entre as intervenções realizadas du-
Foram incluídos 358 prontuários com base rante o trabalho de parto e a duração da fase ativa
nos critérios de inclusão: prontuários de par- em parturientes demonstra que, nos casos de ro-
turientes no período puerperal e que passaram tura das membranas, cerca de 93,3% ocorreu de
por parto de risco habitual. Foram critérios de forma espontânea. O uso de ocitocina durante o
exclusão: prontuários de parturientes fora do pe- trabalho de parto teve predominância de 64,2%
ríodo puerperal e que tiveram parto de alto risco. e a realização de episiotomia ocorreu em 13,7%
Os dados coletados foram analisados com o dos casos. A assistência sem quaisquer dessas in-
recurso da estatística descritiva, por meio de nú- tervenções durante o trabalho de parto ocorreu
mero absoluto e relativo. O estudo foi aprovado em 28,2% dos prontuários estudados. Esses
dados estão informados na Tabela 1.
Tabela 1 – Descrição das intervenções realizadas durante o trabalho de parto em parturientes internadas
em uma maternidade de Belém. Belém, Pará, Brasil – 2015-2016
Frequência
Variável Descrição n
(%)
Rotura das membranas Espontânea 334 93,3
Induzida 22 6,1
Sem Informação 2 0,5
Ocitocina Sim 230 64,2
Não 125 34,9
Sem informação 3 0,8
Para analisar a relação entre as intervenções submetidas à amniotomia; 44,6%, ao uso de oci-
realizadas durante o trabalho de parto e a du- tocina; e 11,1%, à episiotomia. Quanto às partu-
ração da fase ativa nas parturientes, delimitou-se rientes que permaneceram na fase ativa por mais
o tempo de duas formas: menor ou igual a 5 de 5 horas, 1,9% foram submetidas à realização
horas e maior que 5 horas. Entre as parturientes de amniotomia; 18,9%, à ocitocina; e 5,5%, à
que estavam em trabalho de parto ativo por um episiotomia. O Gráfico 1 permite a visualização
tempo menor ou igual a 5 horas, 6,9% foram desses resultados.
parto. Entretanto, nenhuma evidência constatou essas manifestem sua decisão de concordância
(3)
os riscos e os benefícios dessas condutas . ou negativa e autorizem ou não a realização dos
A episiotomia é realizada rotineiramente procedimentos.
pelos profissionais para acelerar o período ex- Essas considerações permitiram o entendi-
(12)
pulsivo . Neste estudo, apesar de a taxa de rea- mento de que as limitações deste estudo con-
lização de episiotomia estar abaixo do encon- sistem na escassez de evidências científicas re-
trado em outras pesquisas, ainda é considerada centes com esse enfoque, para que se pudesse
alta, pois, em alguns países onde se utilizam ampliar as discussões e apresentar comparações
boas práticas na assistência ao parto, esse pro- e proposições mais abrangentes.
cedimento é realizado em menos de 10% dos
partos normais .
(13)
Conclusão
Desse modo, a realização da amniotomia, a
administração de ocitocina endovenosa e a epi- A realização deste estudo possibilitou des-
siotomia, intervenções comuns nas maternidades crever a relação entre as intervenções realizadas
do Brasil para redução da duração do trabalho durante o trabalho de parto e parto com a du-
de parto e parto, precisam ser melhor avaliadas, ração da fase ativa. As intervenções obstétricas
de acordo com as evidências científicas mais avaliadas foram a amniotomia, a episiotomia e
(14)
recentes . o uso de ocitocina endovenosa. Assim, partu-
No que diz respeito ao período de internação rientes na fase ativa de trabalho de parto com
em sala de parto, a admissão precoce na fase menos de 5 horas tiveram mais intervenções do
latente do trabalho de parto (dilatação < 4 cm), que parturientes com mais de 5 horas.
deve ser evitada, por constituir um fator predis- Constatou-se que as intervenções realizadas
ponente para a realização de intervenções. En- não ocorreram na fase ativa do trabalho de parto
tende-se que, quanto mais tarde for realizada a prolongado ou por indicação que caracterizasse
admissão, menor a possibilidade de haver in- um parto de alto risco, à medida que, nos cri-
tervenções, devido ao período em que a partu- térios de inclusão, considerou-se a seleção de
(15)
riente encontra-se no ambiente hospitalar . prontuários de puérperas que tiveram parto de
Na pesquisa realizada, ficou evidente que as risco habitual.
parturientes em trabalho de parto ativo no pe- Nesse sentido, entendeu-se que as interven-
ríodo menor ou igual a 5 horas passaram por ções, de acordo com a amostra selecionada, não
mais intervenções do que as parturientes com se justificaram, pois, consoante as evidências
mais de 5 horas na fase ativa. A captação dessas científicas, quanto menor a duração da fase ativa
informações dos prontuários de parturientes do trabalho de parto, menor a proporção de par-
classificadas como gestantes de risco habitual, turientes passarem por intervenções.
possibilitou a compreensão de que essas inter- Essas considerações possibilitam recomen-
venções foram desnecessárias. dar-se que os profissionais orientem as gestantes
Nesse aspecto, destaca-se a importância de as e seus acompanhantes sobre os riscos a curto e
instituições pautarem seus protocolos nas Dire- longo prazo das intervenções realizadas sem a
trizes Nacionais de Assistência ao Parto Normal do devida indicação. Assim, espera-se que as par-
Ministério da Saúde, e os profissionais adotarem turientes sejam protagonistas do parto e tenham
o modelo obstétrico humanizado, que orienta a o poder de decisão informada, além de colabo-
redução das intervenções sem indicação. rarem no processo de redução das intervenções
Ressalta-se ainda a necessidade de os pro- em prol do cuidado obstétrico humanizado.
fissionais fornecerem orientações às parturientes Recomenda-se a implantação efetiva de pro-
desde o pré-natal até a hospitalização, sobre tocolos assistenciais com base nas Diretrizes
indicações, riscos e benefícios das intervenções Nacionais de Assistência ao Parto e Nascimento,
durante o trabalho de parto e parto, para que do Ministério da Saúde, além de educação
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2 – redação do artigo e revisão crítica
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3 – aprovação final da versão a ser publicada: 8. Vogt SE, Silva KS, Dias MAB. Comparação de
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esp.57393
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