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Literaturas de Língua Portuguesa II - Rute de Souza Josgrilberg - UNIGRAN

Aula
04
O REALISMO EM
PORTUGAL

Caros(as) alunos(as),
Esta é a nossa quarta aula. Já sabemos como ocorreu o
Romantismo em Portugal e no Brasil. Portanto, agora é a hora de
persistirmos em nossa caminhada e irmos em direção ao período que
se segue: o Realismo. Mais uma vez, nosso percurso se dividirá entre
teórico e literário, possibilitando-nos uma visão de como o Realismo
era inserido na Literatura.
Prontos(as) para mais uma etapa?

Objetivos de aprendizagem

Ao término desta aula, vocês serão capazes de:

• compreender o Realismo em Portugal;


• conhecer os principais nomes da época;
• identificar textos literários que possibilitem uma ampla compreensão
do Realismo em Portugal;
• compreender as manifestações do Realismo em Portugal;
• reconhecer os elementos que levaram à culminação desta fase;

Seções de estudo

 Seção 1 - Contexto histórico


 Seção 2 - Realismo em Portugal: temáticas
 Seção 3 - Realismo em Portugal: Eça de Queirós

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Vamos iniciar então a nossa aula!

Seção 1 - Contexto histórico

Mais uma vez, os acontecimentos históricos são essenciais para


a culminação de um novo período. Como você já pôde perceber,
a literatura não é alheia aos problemas políƟcos e sociais de sua
época. Muito pelo contrário, pois os escritores são influenciados
por eles e, por sua vez, incitam a sociedade a clamar por
Para mudanças. Conhecer a literatura de seu tempo e lê-la com um
olhar críƟco é fundamental para perceber o quanto a literatura é
RefleƟr engajada com a sua época. Você costuma praƟcar isso?

Durante meados do século XIX, a Europa passava por inúmeras


transformações e as conquistas advindas da Revolução Industrial, como o
aço, petróleo e a eletricidade contribuíam para essas mudanças. No campo das
ciências, várias descobertas vão sendo feitas e os fatos precisam cada vez mais de
comprovação científica para ser aprovada.
O romantismo, portanto, perde cada vez mais seu espaço e inicia-se a
época da cientificidade e, na literatura, uma escrita objetiva.
As ideias propostas pela burguesia, como o liberalismo e a democracia,
começam a firmar-se cada vez mais. Aliado ao desenvolvimento científico e a
observação da realidade, busca-se novos modos de explicar o mundo por modos
distintos do que propunha o romantismo. Culmina então, em meados de 1865, o
Realismo em Portugal. O movimento, porém, tem vida curta e dura por volta de
vinte e cinco anos.
Assim como seu antecessor, Romantismo marcou presença em diversos
campos: na cultura, na política, nas ciências e no social.
Acompanhemos a reflexão de Moisés:

A época do realismo em Portugal inicia-se em 1865, com a


“Questão Coimbrã”, deflagrada pelo posfácio de Castilho ao
Poema da Mocidade, de Pinheiro Chagas, no qual proclamava
acerbas restrições aos estudantes de Coimbra adeptos da Idéia
Nova. E esmorece por volta de 1890, quando Eugênio de Castro,
publicando Oaristos, desencadeia o aparecimento da estética
simbolista. Numa visão mais profunda dos fatos, percebe-se que
a instalação do Simbolismo não obstou que o ideário realista
permanecesse atuante pelo menos até 1915. Durante o seu
fastígio, o Realismo em Portugal deu origem à única geração
literária que merece esse nome além-Atlântico. E afora única
notabilizou-se por reunir uma plêiade de homens superiores e
talentosos como jamais houve antes ou depois na história da
Literatura Portuguesa (MOISÉS, 1999).

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Dessa forma, percebemos que o realismo mesmo não tendo durado


muito tempo, foi uma época extremamente importante. Buscando opor-se ao
Romantismo, o Realismo logo permitiu que a cientificidade influenciasse o
intelectualismo e as artes. Para esse período, o Romantismo era desprovido de
ligação com a realidade, sendo apenas um desejo por um mundo inatingível, que
em nada contribuía para melhorias sociais.
Nesse sentido, a vida comum tinha grande valor para o escritor realista,
que a buscava representar literariamente do modo mais próximo possível da
realidade. A linguagem, deixando de ser hiperbólica, também se torna mais
próxima da realidade.
As falhas humanas e sua natureza má eram igualmente fundamentais para
essa época. Também o modo de representar a mulher deixou de ser idealizado. A
adúltera, a pobre, a pecadora, eram temas constantes para o escritor realista.
Com essas observações, Luft menciona ser o Realismo:

[...] a maneira de apresentar os fatos como são observados,


objetivamente, sem a interferência idealista de quem os vê, foi
penetrando nas artes em geral, de forma gradativa, impondo um
distanciamento dos moldes românticos (LUFT, 1990, p. 574).

Os realistas mais atuantes ficaram conhecidos como Geração 70. De


tão determinados na luta pelos ideais, sofreram perseguições e tiveram suas
publicações restritas. As novas ideias tinham por base o liberalismo e a construção
de um novo tipo de sociedade, na qual a democracia seria princípio básico.

“Na literatura portuguesa, o realismo se inicia com a Questão


Coimbra (1865), Conferência do Casino (1871) e o romance O crime
CURIOSIDADE
do Padre Amaro (1875), de Eça de Queiroz” (LITRENTO, 1978, p. 142).

Com o crescimento devido à Revolução Industrial, os trabalhadores


dessa nova fase acabavam sendo manobrados pelas lideranças políticas da época.
O pensamento Realista, dessa forma, foi fundamental para a construção de uma
consciência acerca das injustiças sociais.
“A historiografia acompanha de perto o florescimento
intelectual que se observa na época do Realismo. Um pouco na
esteira de Herculano, um pouco refletindo a evolução das modernas
corrente do pensamento historiográfico, a atividade neste terreno
é assinalada por uma série de obras escritas com precisão e rigor
científicos, não raro convocando para a interpretação o apoio da
Economia, da Política etc.” (MOISÉS, 1999, p. 382).

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Já vimos em que contexto ocorreu o realismo. Vamos ver agora quais as


principais características da Literatura desta época?
Figura 2 - pintura Realismo

Fonte: <http://letteraliteratus.blogspot.com.br/2011/06/perturbacoes-do-seculo-xix-realismo.html>.

Seção 2 - Realismo em Portugal: temáticas

Como vimos, a Geração 70 foi responsável por grande tomada de


consciência em relação à necessidade de construção de novos modelos políticos e
econômicos e, nesse período, graças às profundas transformações, o liberalismo
em Portugal foi difundido.
Dessa forma, devido às mudanças também no modo de se fazer literatura,
o novo modelo agora deixava de ter como base heróis e mulheres idealizadas. A
vida comum passa a ser o observatório que serve de material para o fazer literário.
Os escritores dessa fase observam, analisam psicologicamente os
personagens, muitas vezes influenciados por fatos e pessoas reais. A própria
experiência é um diferencial no momento de escrever uma obra nesse período:
“O romance realista de feição introspectiva, revelando preocupação analítica
pela vida psicológica dos personagens, começa a sondar os abismos do coração
humano” (LITRENTO, 1978, p. 143).
Eça de Queirós, importante escritor desta época, acreditava que somente
uma escrita com marcas profundas da realidade seria capaz de traçar um
diagnóstico do mundo externo, ou seja, seria possível de promover mudanças,
contribuindo para novas e melhores relações sociais.
A religião também era temática presente no Realismo. Eles propunham
uma religião ausente de dogmas, considerados “anticlericais”. Na verdade,
o objetivo dos realistas era atacar qualquer instituição que contribuísse para a

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permanência das injustiças sociais, fosse clero, a organização política, a literatura


romântica, a educação e a economia.
Para isso, à literatura foram sendo introduzidas características da
realidade devido à valorização das ciências. Eles acreditavam que somente uma
literatura com demonstrações da realidade pudesse ser levada a sério.
Algumas características do Realismo principais podem ser elencadas:

 veracidade: os fatos buscam se aproximar da realidade e não de uma


idealização dela;
 mulher: a mulher deixa de ser idealizada e passa a ser objeto.
 engajamento social: a preocupação com as relações de domínio
social são temas recorrentes;
 detalhamento na narrativa: esses detalhes eram fundamentais para
a visualização dos detalhes;
 contemporaneidade: as temáticas pertencem ao seu tempo e não
valorizam mais o passado.

Bom, são essas as principais características do Realismo Português, que


tem Eça de Queiros como principal representante. Vamos conhecê-lo melhor?

Seção 3 - Realismo em Portugal: Eça de Queirós

Figura 3 - Eça de Queirós

Imagem de domínio público disponível em: dominiospublicos.com

Seu nome completo é José Maria Eça de Queirós e viveu entre 1845-
1900. Sem dúvida, é o principal escritor realista em Portugal. Suas obras eram
marcadas por uma profunda preocupação com a política e a sociedade de sua
época. Não atuou somente na literatura. É autor também da obra crítica “As
Farpas”. Participava, ainda, de debates, conferências e palestras.

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Sua publicação literária, “O crime do Padre Amaro”, em 1875, inaugura


o realismo no país. Algumas das principais características do Realismo são
firmadas por meio dessa obra:

• crítica à injustiça social em Portugal;


• denúncia à corrupção por parte do clero;
• crítica à hipocrisia do ser humano.

Em seguida, “O Primo Basílio” acentua ainda mais a revolta de Eça, que


denúncia agora a hipocrisia da burguesia, que, no romantismo, se dizia defensora
de melhorias sociais. Vamos ler uma parte?

“O Primo Basílio”
Eça de Queirós

Capítulo III
[...]
Havia doze dias que Jorge tinha partido e, apesar do calor e da
poeira, Luísa vestia-se para ir a casa de Leopoldina. Se Jorge
soubesse não havia de gostar não. Mas estava tão farta de estar
só! Aborrecia-se tanto! De manhã ainda tinha os arranjos a
costura, a toalete, algum romance... Mas de tarde!
A hora em que Jorge costumava voltar do ministério, a solidão
parecia alargar-se em torno dela. Fazia-lhe tanta falta o seu
toque de campainha, os seuspassos no corredor!...
Ao crepúsculo, ao ver cair o dia, entristecia-se sem razão, caía
numa vaga sentimentalidade; sentava-se ao piano, e os fados
tristes, as cavatinas apaixonadas gemiam instintivamente
no teclado, sob os seus dedos preguiçosos, no movimento
abandonado dos seus braços moles. O que pensava em tolices
então! E à noite, só, na larga cama francesa, sem poder dormir
com o calor, vinham-lhe de repente terrores, palpites de viuvez.
Não estava acostumada, não podia estar só. Até se lembrara de
chamar a tia Patrocínio, uma velha parenta pobre que vivia em
Belém; ao menos eraalguém; mas receou aborrecer-se mais ao
pé da sua longa figura de viúva taciturna, sempre a fazer meia,
com enormes óculos de tartaruga sobre um nariz de águia.
Naquela manhã pensara em Leopoldina, toda contente de ir
tagarelar, rir, segredar, passar as horas do calor. Penteava-se em
colete e saia branca; a camisinha decotada descobria os ombros
alvos de uma redondeza macia, o colo branco e tenro, azulado
de veiazinhas finas; e os seus braços redondinhos, um pouco
vermelhos no cotovelo, descobriam por baixo, quando se erguiam
prendendo as tranças, fiozinhos louros, frisando e fazendo ninho.
A sua pele conservava ainda o rosado úmido da água fria; havia
no quarto um cheiro agudo de vinagre de toalete; os transparentes
de linho branco descidos davam uma luz baça, com tons de leite.
Ah! Positivamente devia escrever a Jorge, que voltasse
depressa! Que o que tinha graça era ir surpreendê-lo a Évora,

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cair-lhe no Tabaquinho, um dia, às três horas! E quando ele


entrasse empoeirado e encalmado, de lunetas azuis, atirar-se-
lhe ao pescoço! E à tardinha, pelo braço dele, ainda quebrada
da jornada, coto um vestido fresco, ir ver a cidade. Pelas ruas
estreitas e tristes admiravam-na muito. Os homens vinham às
portas das lojas. Quem seria? É de Lisboa. É a do Engenheiro.
- E diante do toucador, apertando o corpete do vestido, sorria
àquelas imaginações, e ao seu rosto, no espelho.
(A obra na íntegra está disponível em: <http://www.biblio.
com.br/defaultz.asp?link=http://www.biblio.com.br/conteudo/
ecadequeiros/oprimobasilio.htm>).

Outros autores importantes: Guerra Junqueiro (1850-1923), cuja poesia


permeada de um tom revolucionário foi essencial para transformações em sua
época; Antero de Quental (1842-1891), que fez parte do importante movimento
Geração 70 e Cesário Verde (1855-1893), um dos precursores da poesia portuguesa
que seria formada no século XX.

Retomando a conversa inicial

Finda-se a nossa quarta aula. Retomemos os pontos principais do


conteúdo estudado:

 Seção I - Contexto histórico


Aqui aprendemos que o Realismo é um movimento objetivista que se
opõe ao Romantismo.

 Seção 2 - Realismo em Portugal: temáticas


Vimos que a Geração 70 foi fundamental para a composição desse período e
que a Literatura desta época é profundamente afetada pelos acontecimentos políticos.

 Seção 3 - Realismo em Portugal: Eça de Queirós


Conhecemos também Eça de Queiróz, um dos principais escritores da
época, cuja obra refletia exemplarmente as características do período realista.

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Sugestões de leituras, sites e filmes

Leituras
Que tal ler “O Primo Basílio”? é uma obra de domínio público, disponível no site
ao lado. SITES: http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.
do?select_action&co_obra=2745

Filmes
Que tal conhecer a minissérie “Os Maias”, da Rede Globo? Você pode procurar
em locadoras locais.

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