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Memorial Itinerante
Africanidades
Projeto premiado na 6ª edição
do Prêmio Ibero-Americano de
Educação e Museus do Programa
Ibermuseus.
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Memorial Itinerante
Africanidades
Itinerante:
passageiro caminhante caminheiro transeunte viajante viandante
passadouro provisório temporal temporário transitivo transitório
viador peregrino caixeiro peregrinador viandeiro peregrinante
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Sumário:
Introdução 12
Visões da África 18
Palmares 27
Sugestões de Práticas 38
Ficha técnica 46
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O Estado sem nome, destacado Atendendo à lógica da planta do projeto
na crônica A mobília de Carlos – com traçados simétricos, amplas ruas
Drummond de Andrade, pode nos e avenidas e uma divisão racional dos
Um museu,
revelar o projeto da construção de espaços –, a Praça da Liberdade foi
cidade de Belo Horizonte, que recebe, construída sobre uma colina aplainada
quando em sua inauguração, destaque – ponto mais alto da cidade naquela
nacional como a primeira cidade época –, e se torna núcleo do poder
projetada do país, e, sua notoriedade, político, buscando exercer a condição de
em uma Praça.
é reforçada por sua construção ter sido centro integrado do Estado.
tutelada pela então recém-instaurada
No dia 12 de dezembro
República do Brasil, em 18892.
de 1897, a nova capital e a Praça da
As construções do antigo Liberdade foram inauguradas,
Curral Del Rey3 foram demolidas no advento, havia apenas três
por não coincidirem com o cenário Secretarias, ainda inacabadas:
projetado para a nova capital do Estado. da Fazenda, Agricultura,
2 Referência retirada do texto Fantasmas de Comercio e Obras Públicas e a
Silvia Coelho1 Belo Horizonte, de Heloísa Maria Murgel Star- Secretaria do Interior. Desse modo, tal
Logo se construiu uma ampla cidade de ling. Pesquisa realizada para a concepção da
Em certo Estado do Brasil, entenderam evento representou o primeiro marco
peregrino horizonte, para onde se sala História de Belo Horizonte, em exposição
espíritos adiantados que a sede do
Governo não devia continuar onde estava: transportaram os servidores públicos da no Memorial Minas Gerais Vale. de ocupação da Praça: Praça do Poder
a capital era pequena, inconfortável, de antiga e mais os pertences de cada um, reins- 3 Visto como um local neutro onde as oligar-
talados em casinhas que cheiravam a tinta
e, posteriormente, se tornou, também,
acesso penoso, impossível sua expansão. quias regionais em disputa não poderiam
fresca e a idéia de progresso. assumir o poder político estadual, foi o local Ponto de Encontro dos belo-horizontinos
escolhido pela Comissão Construtora para e, principal espaço de Festividades.
Carlos Drummond de Andrade erguer a nova capital do estado. Esse vilare-
jo, durante o século XVIII, serviu como ponto A construção do prédio da
1 Bacharel em Estudos Literários pela Univer- para abastecimento, parada e troca de ani-
Secretaria da Fazenda insere-se nos
sidade Federal de Ouro Preto. Educadora no mais aos viajantes que seguiam o caminho
Memorial Minas Gerais Vale. da região das Minas ao Rio de Janeiro. projetos político, arquitetônico e
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paisagístico da Praça da Liberdade Drummond de Andrade: “Condensar aquilo que atravessa essa diversidade, e do Brasil”6.
e suas origens se misturam com as Minas Gerais numa antologia não será o possibilitando o diálogo entre elas;
Dessa forma, torna-se, assim,
próprias origens da cidade. mesmo que prender o mar na garrafa?”. e a Minas Visionaria, mostrando o
o Memorial num convite à
Ao longo dos anos, acompanhando o estado que se projeta para o futuro
Caracterizado como museu experimentação e à apropriação da
desenvolvimento da capital, seu traçado com suas vanguardas, modernismos e
de experiência, o Memorial Minas riqueza cultural do Estado de Minas
foi ganhando novos contornos claros contemporaneidades”5.
Gerais Vale tem à sua disposição várias Gerais.
e a edificação passou por períodos de
linguagens a fim de alcançar as mais No Memorial Minas Gerais Vale Sejam bem-vindos!
reformas e intervenções diversificadas.
diversas formas de conhecimento convivem paisagens convencionais: o Referências:
A última delas, no início da primeira
e formas de expressão de indivíduos saber dos artesãos e artistas do Vale do
década do século XXI – momento em que ALMEIDA, Sandra Regina Goulart,
nos vários séculos. Sua aposta na Jequitinhonha transmitida pelos cantos
Praça do Poder se tornou, de fato, a Praça CARDIA, Gringo, STARLING, Heloisa
imaginação e na experimentação do de sua experiência; uma arte rupestre
do Encontro, com a implementação do Maria Murgel (org.), Minas Gerais. Belo
tempo e espaço é um exercício que não singular e milenar; evoca à memória
que hoje é Circuito Cultural Liberdade. Horizonte: Editora UFMG, 2011.
encerra seu acervo apenas em uma soma Miguilins e Riobaldos; a ancestralidade,
O prédio de “pintura externa em tons
de informações. a luta e a resistência de povos africanos ANDRADE, Carlos Drummond de. Fala,
de creme na moldura”, de singular
e indígenas; a arquitetura barroca Amendoeira. Rio de Janeiro: Record,
“beleza e elegância da fachada” e Seus 31 espaços expositivos,
única de suas cidades históricas; uma 1987.
com “belo escudo representando as que misturam exposições de longa
Minas encantada e uma Belo Horizonte
finanças do Estado” 4 – que coroa a duração, espaços de convivência INSTITUTO ESTADUAL DO PATRIMÔNIO
monótona de Carlos Drummond; e,
entrada principal –, volveu-se o Memorial e exposições de curta duração, foram HISTÓRICO E ARTÍSTICO DE MINAS
a vida de famílias que fazem parte da
Minas Gerais Vale, um “espaço-síntese” da pensadas a partir de três eixos GERAIS. Secretaria de Estado da Fazenda.
memória deste Estado, mostrando, que
história e cultura deste Estado. principais: “a Minas Imemorial com toda a Belo Horizonte, 2004.
“cada cidadão, por mais anônimo que
Todavia, nos pergunta Carlos riqueza do passado e o legado histórico STARLING, Heloisa Maria Murgel.
seja, faz parte da história de Minas Gerais
4 BARRETO, Abílio. Belo Horizonte. Memória mais impressionante do Brasil; a Minas Fantasmas de Belo Horizonte. Belo
histórica e descritiva. História Média . apud Polifônica, com todas as várias culturas, 5 Para além da Memória de Minas In: ALMEI-
INSTITUTO ESTADUAL DE PATRIMÔNIO HIS- DA, Sandra Regina Goulart, CARDIA, Gringo,
Horizonte: Memorial Minas Gerais Vale,
as várias linguagens, os vários tempos, 2016.
TÓRICO E ARTÍSTICO. Secretaria de Estado da STARLING, Heloisa Maria Murgel (org.), Minas
Fazenda. Belo Horizonte, 2004. os vários níveis de realidade e tudo Gerais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. 6 Idem
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tona algumas reflexões sobre o tema. Festas e Celebrações, Sebastião Salgado e
São escritos, ora embasados em estudos, Fazenda Mineira.
ora vivenciados na nossa prática diária
Destacamos esses espaços, pois
de educadores, que lidam com os mais
perpassam temas como a história de
diversos debates e que fazem da prática
uma África pré-colonial, a colonização
educativa um espaço de diálogos
brasileira e a utilização da mão-de-
enriquecedores.
obra de africanos escravizados – na
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passamos a reproduzi-los, em nosso é visto como um lugar onde a
imaginário, acerca daquele território. vida selvagem prevalece sobre a
A África, retratada pela presença humana. Há grandes vazios
grande mídia, geralmente oscila entre populacionais. Os poucos habitantes
Visões
o exotismo da natureza e dos povos apresentados estão dispersos pelo
e as tragédias humanas como, por território e se misturam com a paisagem
exemplo, a fome, as epidemias e as natural. A África mostrada é, por um lado,
uma região com povos que possuem
da África
guerras. É evidente que há paisagens
naturais que impressionam por sua costumes e tradições exóticas e, por
beleza, exuberância e magnitude, outro, uma região de natureza fantástica,
assim como há, também, os problemas um território inóspito, bravio, áspero.
sociais, os conflitos e a miséria. Outro aspecto largamente
Entretanto, é importante que essas visões abordado é o da tragédia humana.
sejam constantemente problematizadas, Guerras, epidemias, calamidades,
repensadas, questionadas, para que não pobreza são fatos exaustivamente
se tome o todo pela parte, ou seja, que apresentados por noticiários, filmes
Charles Junio Souza1 social, cultural, econômica e política.
o continente africano não seja reduzido e documentários. A África retratada é
Contudo, as imagens e notícias
Refletir sobre o continente ao exótico, trágico ou catastrófico. o lugar onde proliferam guerras que
comumente veiculadas por
africano requer pensá-lo em sua Um dos aspectos explorados parecem ser intermináveis, travadas sem
grande parte dos meios de
pluralidade. Terceiro continente mais pela grande mídia é o geográfico. Desse nenhum sentido ou objetivos. África
comunicação – filmes, revistas,
extenso do planeta, a África apresenta ponto de vista, a África apresentada é onde quem não é vítima dos conflitos
jornais, documentários, entre outros –
uma grande diversidade natural, a dos grandes animais como o elefante, armados padece de fome, de sede, de
relativas àquela região, estão repletas
a girafa, o leão; é também a África dos AIDS, malária.
1 Licenciado em História pela de estereótipos, que nos impactam
Universidade Federal de Minas Gerais e grandes rios, das florestas, das savanas,
de forma contundente e frequentemente Epidemias e guerras são
Assistente Pedagógico do Educativo no dos grandes desertos. O continente
Memorial Minas Gerais Vale. realidades inegáveis no continente
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africano. Em Angola, por exemplo, após e há abundância de comida. Se em Compreender a história das Cesária Évora, o músico camaronês
a guerra de independência em 1975, determinado lugar há uma feroz luta nações e dos povos africanos é tarefa Richard Bona, o grupo de rap
seguiu-se uma guerra civil com centenas armada, noutros as crianças vão que acarreta não somente entender angolano Hemoglobina – que
regularmente à escola, de roupa limpa
de milhares de vítimas. A desnutrição o continente a partir da chegada dos gravou o belíssimo rap Sonho
e sapatos lustrados. E a vida familiar
e a mortalidade infantil são questões europeus, mas reconhecer o legado Africano – e a cantora sul-africana Miriam
transcorre normalmente, sem faltar
enfrentadas por muitos países os quais de seus antigos impérios – como Makeba.
alegria. (SILVA, 2012. p.11)
apresentam os mais baixos Índices de os impérios do Mali (XIII-XVII) e de
Refletir sobre a África e os
Desenvolvimento Humano (IDH) do É importante sublinhar que, Gana (VI-XIII) – com suas respectivas
africanos é apreender o outro em
planeta 2. Entretanto, a África não se qualquer reflexão sobre o continente estruturas socioeconômicas e
sua diversidade, sem reduzi-lo a
resume a esses flagelos. implica em um recorte analítico, seja culturais, seus mitos de fundação, lendas
estereótipos. É pensar o continente
social, cultural, político ou econômico. e crenças.
A África vista como um e seus habitantes por meio de
Todavia, é necessário abordagens que
continente com uma história rica e No que tange especificamente diferentes percepções, olhares, visões.
possibilitem outras visões da África
complexa, constituída por diversos ao aspecto cultural faz-se É possibilitar que o outro se apresente
e dos africanos. Abordagens que,
povos e países, com grandes centros necessário ter uma abordagem de diversas formas e não reduzi-los ao
além da tragédia humana, mostrem
urbanos, ainda não é a mais conhecida. ampla buscando fugir do senso autoritarismo de olhares estrangeiros.
as lutas dos africanos em busca de
Assim sendo, é importante ampliar o comum, do corriqueiro, como é, Referências:
melhores condições de vida, que
olhar sobre o continente salientando por exemplo, a questão da
apresentem as lutas de libertação,
que África são muitas. Como afirma musicalidade que quase sempre esbarra OLIVA, Anderson Ribeiro. Os africanos
de descolonização. Que deem voz
Alberto da Costa e Silva, no som dos tambores. É preciso entre representações: viagens reveladoras,
aqueles que lutaram e lutam
compreender que nas culturas olhares imprecisos e a invenção da África
se uma região da África foi contra todo tipo de discriminação,
atacada por nuvens de gafanhotos que africanas o tradicional dialoga e no imaginário Ocidental. Disponível em:
segregação. Visões que possibilitem
devoraram todas as plantações, e nela convive com o moderno. Urge dar http://periodicos.unb.br/index.php/
percebê-los como sujeitos de suas
há fome, nas outras a colheita se fez voz a músicos e cantores africanos emtempos/article/view/2646/2195.
histórias, que valorizem suas culturas,
normalmente, os celeiros estão repletos de diferentes vertentes, Acesso em 12/01/16.
costumes e tradições.
2 UN. Human Development Report 2015 – como a cabo-verdiana
Work for Human Development.
20 21
SILVA, Alberto da Costa e. A África
explicada aos meus filhos. Rio de Janeiro:
O Baobá
Agir, 2012.
UN. Human Development Report 2015
– Work for Human Development. Dis-
ponível em: http://report.hdr.undp.org/
Acesso em 14/01/2016.
como tradição oral
ARNAUT, Luiz Duarte. História de África
(Séculos XIX e XX): Textos e Documentos.
Disponível em: http://www.fafich.ufmg.
br/luarnaut/Afrika%20docs.html Acesso
em 12/02/2016.
Palmares
HAMPATÉ BÂ, Hamadou – A tradição
viva, em História Geral da África I. Meto-
dologia e pré-história da África. Organi-
zado por Joseph Ki-Zerbo. São Paulo, Ed.
Ática/UNESCO, 1980, pp.181-218.
Ilê Aiyê:
Palmares, ano V, número 5, agosto 2009. Vídeo “Povos Africanos” – Sala “O povo
mineiro” – Memorial Minas Gerais Vale
Memória das Palavras. Coleção A cor da
Sugestões de
atenção nas outras pessoas? Por quê? naturais, savanas, de diferentes países
Pranchas – Visões da África africanos para que os alunos percebam
Práticas
que existe esse estereótipo e possam
Materiais: fotografias atuais de
desconstruí-lo. Não se esqueça de
países da África.
colocar a legenda com o nome da cidade
Objetivos: Desconstruir e do país no verso da fotografia.
estereótipos existentes sobre a África, Palavras de origem africana
por exemplo, de que é um lugar
Materiais: fichas com as palavras
homogêneo onde há somente miséria
escritas ou imagens que as representem.
ou animais selvagens.
Objetivos: provocar a reflexão
Procedimentos: Mostrar as
Espelhos cada aluno um espelho e pedir que de que a cultura africana está bem
imagens para os alunos sem dizer de
formem duplas. Depois de formadas próxima de nós, está em nosso
Materiais: pequenos espelhos onde são e perguntar que lugares são
as duplas, um virará de costas para o cotidiano, como no caso de palavras que
de bolso. aqueles. Depois que eles disserem suas
outro. De costas eles deverão observar o fazem parte da língua portuguesa, e,
hipóteses trazer as reflexões.
Objetivos: o objetivo desta colega através do espelho. Diga para que com isso, promover o entendimento da
prática é estimular a percepção do Reflexões: por que ficamos importância dessa cultura.
eles observem os detalhes do rosto do
outro para que as diferenças entre surpresos ao descobrir que essas
colega, como o formato do nariz, a cor Procedimentos: Selecionar
os indivíduos sejam reconhecidas, imagens são de países da África? O que
dos olhos, o cabelo. Após o momento de palavras de origem africana ou imagens
valorizadas e respeitadas. estamos acostumados a ouvir sobre este
observação, trazer os questionamentos que as representem que fazem parte
continente? O que essas imagens nos
Procedimentos: Entregar para abaixo. do nosso vocabulário. As palavras e/
dizem sobre a África?
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ou imagens podem ser usadas de http://www.geledes.org.br/
diversas formas. Os alunos podem palavras-de-origem-africana-
pesquisar sobre a origem delas, criar no-vocabulario-brasileiro/
“Irin Ajo”*:
narrativas utilizando algumas palavras
ou até mesmo fazer um jogo de mímica. http://www.afreaka.com.br/notas/a-
Também com base nas palavras, pode- influencia-africana-na-formacao-da-
Resistência e Liberdade
se iniciar uma investigação sobre a lingua-portuguesa-no-brasil/
influência da cultura africana em outros
aspectos, como culinária, costumes,
músicas, por exemplo. *Irin Ajo significa jornada ou viagem no idioma Iorubá.
Coordenadora do Educativo
Mabel Faleiro
Educadores proponentes
Ana Luiza Neves
Henrique Bedetti
Silvia Coelho
Educadores colaboradores
Caroline Oliveira
Charles Souza
Lauren Rial
Marcela Apgaua
Nancy Mora Castro
Smally Rodrigues
Valdir Santos
Revisão de Textos
Ana Luiza Neves
Henrique Bedetti
Mabel Faleiro
Silvia Coelho
Agradecimentos
Anna Cláudia d´Andrea
Camila Abud
Carla Vimercate
Maria Alice Santos
Maristella Medeiros
Equipe Educativo MMGV
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