Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CURSO DE PSICOLOGIA
Estágio Básico IV -
PSICOLOGIA NA SAÚDE
CAMPINAS
2021
SUMÁRIO
1 – ROTEIRO 3
2 – NARRATIVA 4
3 – ANÁLISE 6
4- REFERÊNCIAS 7
3
1 – ROTEIRO
1. Dentro do que se sente confortável, poderia descrever sua doença e como foi sua
trajetória e tratamento até esse momento?
2. Você se lembra como os profissionais te contaram a respeito de sua doença?
Como você gostaria que tivesse acontecido?
3. Qual é o impacto da doença na sua vida?
4. Como você acha que o seu quadro interfere em sua saúde mental? E como a sua
saúde mental influencia na piora ou melhora de seu quadro?
5. Para você, o que é saúde e o que é doença?
6. Como você acredita que a psicologia poderia te ajudar?
7. Em algum momento você precisou de apoio psicológico? Se sim, como foi essa
atuação para você?
8. De maneira geral, você se sente acolhida pelos profissionais da área da saúde?
Explique um pouco como.
9. Sobre os profissionais da área da saúde, você sente que eles te enxergam além
do quadro de sua doença ? Sente que é levado em conta o seu histórico de vida,
rotina e quem você é? Comente mais sobre isso.
10. Você acredita que a maneira que é tratada ao ser atendida por profissionais da
área da saúde interfere em como você responde ao tratamento? Conte como.
11. Em algum momento em seu tratamento, você achou necessária a mediação de
um psicólogo com os profissionais que realizaram seu tratamento?
12. Como é para você o suporte familiar? Como você acredita que teria sido com a
mediação de um psicólogo?
4
2 – NARRATIVA
2.1 DADOS DO ENTREVISTADO:
Iniciais de identificação dos entrevistados: L.
Formação acadêmica: Bacharel em Direito
Dados de atuação profissional: Advogada
Tempo de experiência profissional: 10 anos
Doença: Retocolite ulcerativa
2.2 NARRATIVA
O objetivo da entrevista foi buscar uma visão completa de saúde e doença
através da vivência de L.
Num primeiro momento, a estagiária se apresenta e explica que haverá um
roteiro pré estabelecido, mas que a entrevistada pode ficar à vontade para dizer o
que achar relevante, bem como interromper a entrevista caso necessário.
Foi proposto que L. contasse um pouco a respeito de sua trajetória como
também a de sua doença e foi relatado que os sintomas começaram aos 27 anos
em 2009, logo após um divórcio complicado e seu fim de faculdade/início de carreira
como advogada.
O primeiro sintoma veio através de uma diarreia permanente que evoluiu para
sangue, logo, essa perda de sangue ocasionou uma anemia. O que L. relata mais a
afligir na época, era o fato de nenhum médico ter conseguido diagnosticá-la; conta
também que todos diziam ser estresse e a mandavam para casa sem nenhum
encaminhamento para psicólogo ou psiquiatra para tratar o estresse citado.
L. ainda relata que chegou a ter diagnóstico apenas em 2010, um ano depois
do aparecimento dos sintomas, expõe também que a notícia foi dada no corredor da
emergência do SUS, apressadamente e ainda sem certeza do diagnóstico. Em outro
momento da entrevista L. informa que anos após saber de seu diagnóstico, houve
um psicólogo disposto a dar a notícia da doença, no entanto L. diz ter achado
desnecessário pois já havia descoberto anteriormente de uma forma inapropriada.
Ainda sem esse embasamento total no diagnóstico, foi iniciado tratamento
medicamentoso bem como foram solicitados mais exames de sangue e
colonoscopia; porém nesse momento além de ter que lidar com a inflamação
intestinal, a anemia se agravou, trouxe uma infecção no sangue e indício de falência
nos órgãos. Nesse momento, L. informa ter sido medicada com Mesalazina, contudo
parou de tomar o remédio por conta própria depois de 5 anos, pois chegou à
conclusão de que os efeitos colaterais eram maiores que os benefícios.
L. conta que outro fator agravante de sua doença é o risco de ter câncer, em
virtude disso resolveu realizar uma bateria de exames em 2016. Nesse caminho
descobriu que o seu próprio sistema imunológico causava Retocolite Ulcerativa, ou
seja, se tratava de uma doença auto imune. Todavia L. conta que ficou mais um ano
sem tratamento, até que no fim de 2017 houve uma crise grave e é relatado que
médicos disseram que L. iria morrer.
Nessa época houve um encaminhamento para um proctologista da rede
pública que realizou um encaminhamento para que em 2018 todos os exames
fossem realizados novamente no Hospital das Clínicas.
Quando recebeu os resultados e retornou ao médico, L. foi medicada com o
imunossupressor Infliximabe, quando relata que: “Estou tomando esses remédios
atualmente e os sintomas iniciais desapareceram. Consegui engordar os quilos que
perdi e hoje, depois de mais de dez anos, me sinto bem e satisfeita com o
tratamento” (sic).
5
passou. Hoje me sinto bem, porém ainda preciso de apoio, não nego, mas não sinto
vontade de morrer como antes.” (sic)
Nesse momento, a estagiária informa que no momento de ideação suicida,
existe o Centro de Valorização da Vida através do número 188 como também que
ajuda psicológica não existe apenas para pessoas com transtornos mentais, mas
também para indivíduos que queiram trabalhar autoconhecimento, entendimento de
questões da vida, sofrimento, entre outros.
Mudando um pouco o assunto, foi questionado como é o acolhimento que L.
tem pelos profissionais da área da saúde e se existe um sentimento dela como um
ser bio-psico-social. Os fatos dados foram que não existe sentimento de acolhimento
bem como L. nota que é apenas um diagnóstico, além disso, se sente excluída
quando diz que tem uma doença auto imune e intestinal, como se portasse uma
doença altamente contagiosa. Ainda nesse tema, foi perguntado se essa falta de
acolhimento e empatia implica na aceitação que L. tem ao tratamento, a resposta foi
de que ela entende que os profissionais da área da saúde estão apenas fazendo seu
trabalho, logo procura sempre fazer a parte dela para diminuir o tempo em que terá
que estar no hospital.
Ainda sobre o relacionamento paciente-hospital, a estagiária perguntou se em
algum momento L. entendeu que havia necessidade de mediação de um psicólogo
juntamente aos profissionais que realizaram seus atendimentos e foi exposto que
sim, pois não se sentia respeitada. Segundo ela, “Basta contar da doença pra iniciar
um longo e detalhado discurso de como tudo é minha culpa” (sic). Contudo, L. conta
que houve uma médica que a ajudou com sua saúde emocional quando numa
conversa, disse que se trata de uma doença como qualquer outra; é relatado que
essa fala trouxe uma tranquilidade para L. por naquele momento não se sentir
culpabilizada ou ter sido rotulada por um profissional da área da saúde.
Rumo ao final da entrevista, foi perguntado como é a relação de L. com sua
família e comunidade. L. conta que sua mãe se desesperou e, por outro lado, suas
irmãs julgavam sua enfermidade como uma maneira de chamar atenção.
Quanto aos amigos, relatou que o fato de não poder comer de tudo ou ir a
qualquer lugar é um agravante para o convívio social, logo, tem poucos; L. também
diz ser alvo de piadas preconceituosas e por vezes, vê seu quadro de saúde tratado
como frescura. Por outro lado, com o avanço das redes sociais, L. aponta ter
encontrado comunidades de outras pessoas na mesma situação e feito amizade, diz
ainda que esse ponto tem sido de grande apoio, pois ali consegue estar num
ambiente sem julgamentos.
L. afirma não saber como essa trajetória teria sido com intervenção
psicológica, mas que talvez fosse mais fácil pois afirma que “Ao que parece quem
luta contra uma doença que envolve intestino e fezes, não merece respeito. Parece
que sempre é motivo de piada, então acabo por evitar procurar ajuda fora das
amizades que tem o mesmo diagnóstico, pois realmente não me sinto acolhida e
respeitada.”
A estagiária se despede, reforça as indicações do Centro de Valorização da
Vida e plantões psicológicos em faculdades e terapia, depois disso agradece o relato
dado.
7
3 – ANÁLISE
falar sobre como teve que lidar com a notícia de que podia morrer, como
também poderia explicar parte do processo de múltiplos abandonos ao
tratamento relatados ao longo da entrevista. Mais a frente é possível perceber
esse mesmo comportamento de negação apresentado pelas irmãs de L. que,
conforme relata, não dão a devida importância à doença e a tratam como se
fosse algo supérfluo.
Ao longo da escuta, L. trouxe a intenção de se suicidar, que ocorreu
perante o seu sentimento de frustração, impotência e de desânimo diante da
sua rotina de tratamento e dos relatos médicos, trazendo sofrimento pelo que
desconhece. De acordo com Botega (2010), cerca de 97% dos casos de
ideação suicida, trata-se de um marcador de sofrimento psíquico ou por
transtornos psiquiátricos.
Ainda assim, para Bertolote (2010), os comportamentos suicidas não
instituem especificamente como uma doença, embora em momentos este
comportamento esteja associado a diversos transtornos mentais, como por
exemplo os transtornos do humor, os transtornos por uso de substâncias, a
esquizofrenia, sendo os transtornos de personalidade como um dos mais
frequentes.
“No fim das contas, todos esses transtornos e essas doenças representam
um risco potencial de comportamentos suicidas” (BERTOLOTE, et al, 2010,
p.08)
Outro tema levantado foi que de acordo com o Associação Brasileira de
Colite Ulcerativa e Doença de Crohn (Machado & Viena, 2017) existe alto
risco de que pessoas com doenças intestinais inflamatórias desenvolvam
câncer de cólon; esse dado vem de encontro com outro fato citado de
maneira superficial por L., o de que poderia vir a desenvolver câncer. Partindo
desse ponto, é possível pressupor uma desesperança de L. apoiada no fato
de que em todo esse tempo não houve acompanhamento psicológico.
Apesar de se retrair no processo de questionamento relacionado à
incerteza que tinha sobre o futuro, L. aparentou estar mais aberta para falar
sobre o sofrimento emocional relacionado a exclusão social,
De acordo com relato dado, é possível partir do ponto de que houve um
sofrimento relacionado à socialização, pois L. relata que é alvo de piadas
preconceituosas, por vezes, seu quadro é tratado como frescura. Nota-se que
essa questão está começando a ser mais notada e ganha mais consciência,
uma vez que L. começou a se relacionar com mais pessoas que
compartilham de seu diagnóstico e declara estar se beneficiando de
relacionamentos sem julgamentos.
Outros relatos como esse são compartilhados no estudo “Jornada do
Paciente com doença inflamatória intestinal” (MACHADO, 2017), apontando
para 78% dos pacientes com doenças inflamatórias intestinais apresentando
interferências em suas relações sociais desde o aparecimento dos sintomas.
No estudo, uma das falas é citada:
“Alguns sonhos que eu tinha foram deixados pra trás (...). Você
volta e meia tá no hospital, não tem uma vida social tão livre, pra ter
muita coisa marcada. Se vou fazer um curso, vai que naquela semana
11
4- REFERÊNCIAS
Yano, Yuristella & Hunziker, Maria. (2010). Desamparo aprendido e imunização com
diferentes respostas de fuga. 8.
14
Peterson, C., Maier, SF, & Seligman, MEP (1993). Desamparo aprendido: uma teoria
para a era do controle pessoal. Nova York: Oxford University Press.
Susaki, Tatiana Thaller, Silva, Maria Júlia Paes da e Possari, João. Francisco.
Identificação das fases do processo de morrer pelos profissionais de Enfermagem.
Acta Paulista de Enfermagem [online]. 2006, v. 19, n. 2 [Acessado 5 Outubro 2021] ,
pp. 144-149. Disponível em: <. https://doi.org/10.1590/S0103-21002006000200004.>
Acessado em 05 out. 2021
Craske, Michelle G et al., Wolitzky-Taylor, KB, Labus, J., Wu, S., Frese, M., Mayer,
EA, & Naliboff, BD (2011). Um tratamento cognitivo-comportamental para a
15
BOTEGA, Neury José.; SILVEIRA, Isabel Ugarte da.; MAURO, Marisa Lúcia
Fabrício. Telefonemas na Crise: percursos e desafios na prevenção do suicídio. Rio
de Janeiro: ABP, 2010.