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ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO
Núcleo de Pós-Graduação em Administração – NPGA
CURSO DE DOUTORADO/MESTRADO ACADÊMICO EM ADMINISTRAÇÃO
FAGNER DANTAS
O AUTOR
Ha-Joon Chang nasceu em Seoul, Coréia do Sul, em 1963. Formou-se em Economia
pela Universidade Nacional de Seoul, na Coréia do Sul. Conseguiu seu mestrado e
doutorado em Economia na Universidade de Cambridge (Inglaterra). Desde então, tem
ensinado economia em Cambridge. Além das atividades acadêmicas, atuou como
consultor para várias agências internacionais (ONU, Banco Mundial) e para vários
países, como Canadá, Japão e Venezuela, sempre na área de Políticas de
Desenvolvimento. Vem também publicando e editando, individualmente ou em
conjunto, vários livros sobre a temática do desenvolvimento, tendo recebido em 2003 o
Prêmio Gunnar Myrdal pelo livro “Chutando a Escada”.
A ESTRUTURA DO LIVRO
O livro tem 266 páginas, divididas da seguinte forma: quatro capítulos, aos quais se
somam a bibliografia e um índice remissivo.
A RESENHA
Capítulo 1 – Como os Países Ricos Enriqueceram de Fato?
O capítulo exerce a função de apresentação do livro. Colocando a questão da pressão
que os países em desenvolvimento sofrem dos países desenvolvidos e das instituições
internacionais de financiamento para adotar as chamadas “boas práticas” resumidas no
Consenso de Washington, o autor afirma que esses mesmos países desenvolvidos não
alcançariam sua atual posição caso seguissem as práticas que hoje recomendam.
O autor cita o economista alemão Friedrich List como sendo o pai do argumento de que
a indústria nascente de um país só consegue se desenvolver a partir da intervenção
protetora do Estado. Seu livro “The National System of Political Economy” (1841) é o
principal libelo nesse sentido. É de List a ideia de que os países, após usarem uma série
de políticas protetoras da sua indústria a fim de alcançarem o desenvolvimento, “chutem
a escada” para que outros não a sigam pelo mesmo caminho e se tornem seus
concorrentes. Foi o que fez, primeiro, a Grã-Bretanha, no século XIX, e, depois, os
Estados Unidos, no século XX. Ou seja, após usarem intensamente políticas
protecionistas e intervenções estatais, passaram a condenar essa prática para outros
países.
O autor busca distinguir a metodologia usada por List, baseada na busca de modelos
históricos reais e sua aplicação a problemas contemporâneos reais, e a metodologia da
economia neoclássica, baseada em modelos abstratos e situações de equilíbrio ideal e
irreal. Aqui, Chang faz uma conexão interessante entre esse método mais realístico e o
Institucionalismo Original (que se distingue da Nova Economia Institucional, de nomes
como Coase, Williamson e North). Chang afirma que esse método era próprio da Escola
Histórica Alemã (que influenciou nomes como Karl Polanyi), que tinha entre seus
expoentes nomes como Werner Sombart e Karl Knies. Se Knies não conseguiu
catequizar para o método histórico alunos que se tornaram nomes consagrados da
Escola Neoclássica como Alfred Marshall e John Clark Bates (que, por sua vez, não
conseguiu catequizar ao neoclassicismo seu aluno, Thorstein Veblen, o maior nome do
Institucionalismo Original), teve também como aluno Richard Ely, que foi professor de
John Commoms, que, junto com Veblen e Wesley Mitchel, forma a santíssima trindade
do Institucionalismo Original.
Além da vinculação entre a Escola Histórica Alemã e o Institucionalismo Original,
Chang refere-se ainda a outras linhas importantes de pensamento. Após a Segunda
Guerra Mundial, a questão do desenvolvimento entrou na pauta, dando original à
chamada “Economia do Desenvolvimento”, capitaneada por Arthur Lewis, Walt
Rostow e Simon Kuznets, que desenvolveram teorias sobre os “estágios” do
desenvolvimento. O autor lembra ainda outra figura importante para a discussão, o
historiador russo-americano Alexander Gerschenkron e seu conceito de
“desenvolvimento tardio”, que implicava na necessária intervenção estatal para o
desenvolvimento daqueles países que começaram sua arrancada industrial após a
consolidação dos países desenvolvidos. Duas figuras importantes que foram
influenciadas pelo trabalho de Gerschenkron foram Albert Hirschman e Charles
Kindleberger. O auge da Economia do Desenvolvimento foram os anos 1950 e 1960.
(Com os choques do petróleo em 1973 e 1979 e a eleição dos governos neoliberais de
Tatcher, em 1979, e Reagan, em 1980, baseada na crítica às intervenções estatais, a
Economia do Desenvolvimento perdeu espaço para o neoliberalismo e a metodologia
neoclássica, que ignorava a história).
Chang faz a seguinte distinção entre políticas e instituições: “instituições são
dispositivos mais permanentes, ao passo que as políticas são mais facilmente
cambiáveis.” (p. 23). Outra assertiva importante feita pelo autor é que são as diferenças
entre as políticas industriais, comerciais e tecnológicas que separam os países mais bem
sucedidos na geração de crescimento e mudança estrutural dos demais países. (p. 24).
Por fim, afirma que impedir os países em desenvolvimento de utilizar políticas de
fomento à indústria nascente constitui grave limitação à sua capacidade de gerar
desenvolvimento econômico (p. 26).
1. Grã-Bretanha
Ao sair do período feudal (séculos XIII e XIV), a Grã-Bretanha tinha uma
economia atrasada em relação a centros como as cidades de Bruges e Flandres,
na região que viria a ser conhecida como Países Baixos. O primeiro exemplo de
incentivo estatal para o desenvolvimento da indústria nacional veio no século
XIV, com o Rei Eduardo III (1327-77) que fomentou com diversas medidas a
indústria têxtil inglesa no sentido de alcançar o sucesso dos tecelões de Flandres.
O impulso oficial continuou com os Tudor (Henrique VII e Elizabeth I, nos
séculos XV e XVI). Já no século XVIII, a reforma da legislação mercantil pelo
premiê britânico Robert Walpole intensificou mais ainda o fomento a indústria
manufatureira. Mesmo após a Revolução Industrial, na segunda metade do
século XVIII, com a Inglaterra ampliando a sua liderança tecnológica sobre os
demais países, ela só começou a reduzir seu protecionismo um século depois,
com a revogação das Corn Laws, em 1846, processo que se consolidou com a
assinatura do acordo anglo-francês de livre comércio, em 1860. Cabe notar, no
entanto, que apenas 20 anos depois, em 1880, fabricantes ingleses já cobravam
do governo novas proteções. Movimento nesse sentido foi feito em 1903, com a
Liga pela Reforma Tributária, liderada por Joseph Chamberlain. Finalmente, as
tarifas protecionistas foram reinstituídas em 1932.
2. Estados Unidos
A questão do protecionismo nos Estados Unidos é tabu. Não obstante o
historiador econômico Paul Bairoch afirmar que os EUA são “a pátria-mãe e o
baluarte do protecionismo moderno”, Douglas North, nome consagrado da Nova
Economia Institucional afirma que, apesar das tarifas terem se tornado cada vez
mais protecionistas após a Guerra da Secessão (1861-1865), é questionável
afirmar que elas favoreceram significativamente a expansão da manufatura. O
autor, no entanto, não tem dúvida da importância das políticas protecionistas
para o desenvolvimento industrial dos EUA.
Chang afirma que, após a independência americana (1776), havia o conflito
entre o sul agrário, que defendia o livre comércio para favorecer a venda dos
seus produtos agrícolas, e o norte manufatureiro, que defendia o protecionismo
para favorecer a indústria nascente. Esse argumento tinha como grande defensor
Alexander Hamilton, um dos pais fundadores dos EUA e secretário do tesouro
americano de 1789 a 1795. O autor lembra que, pelo Relatório do Tesouro sobre
as Manufaturas, de 1791, seria Hamilton e não List (cuja obra é de 1841) o
pioneiro na defesa da indústria nascente. Até 1812, as tarifas de importação
ainda não correspondiam àquelas pensadas por Hamilton para proteger a
indústria. Com a Guerra contra a Inglaterra, iniciada em 1812, as tarifas foram
aumentadas, inicialmente para cobrir os gastos de guerra. O aumento das tarifas
e a própria guerra diminuíram significativamente as importações, o que
favoreceu o fortalecimento da produção manufatureira nacional. Assim, em
1816, após o fim da guerra anglo-americana, sob pressão das novas forças
manufatureiras, foi sancionada a lei que mantinha o padrão tarifário elevado,
agora já não mais tendo os custos de guerra como motivador e sim o fomento à
indústria nacional. A tensão entre o sul livre-cambista e o norte protecionista
pressionava as tarifas para cima e para baixo, mas novas elevações ocorreram
em 1824, 1832 e 1846. A partir dai, houve uma redução nas tarifas, o que
caracterizou o período como de “protecionismo moderado” (Paul Bairoch). A
vitória de Lincoln, em 1860, foi a vitória do discurso protecionista de Henry
Clay e do “sistema americano” de fomento à indústria nacional, em oposição ao
“sistema britânico” de livre-comércio. Com a Guerra da Secessão (1861-1865),
novo aumento de tarifas reformou o protecionismo, desta vez sob justificativa
dos gastos de guerra do governo. Da mesma forma que no fim da guerra anglo-
americana, as tarifas foram mantidas no mesmo patamar, agora não mais com a
finalidade de financiar os esforços de guerra e sim com fins claramente
protecionistas. Em 1913, com a vitória dos democratas, começou-se um
movimento no sentido de reduzir as tarifas. Porém, a Primeira Guerra Mundial
reduziu o seu impacto real no sentido de aumentar o livre-comércio. Finalmente,
como resposta à Grande Depressão de 1929, promulga-se a tarifa Smoot-
Hawley, que manteve as tarifas altas. Só depois da Segunda Guerra Mundial e
com a supremacia econômica garantida, tal qual a Inglaterra, em 1846, é que os
Estados Unidos aderem mais fortemente ao livre-comércio.
O autor faz ainda três importantes observações a respeito dos Estados Unidos.
Primeiro, que entre os anos de 1830 e 1910, os períodos de maior crescimento
da economia americana foram justamente aqueles onde houve mais
protecionismo (1870 a 1910, período em que as altas tarifas cobradas durante a
Guerra da Secessão foram mantidas para fins protecionistas). Segundo, que
mesmo após a Segunda Guerra Mundial, quando o uso de tarifas protecionistas
foi abolido porque os EUA já tinham alcançado a supremacia econômica, essa
supremacia foi mantida também por intervenções governamentais mais indiretas,
como o financiamento de P&D através do complexo militar-industrial (que
levou a descobertas comerciais como computadores e internet) e nos setores
farmacêutico e biotecnológico, através dos Institutos Nacionais de Saúde.
Terceiro, que além das práticas protecionistas, os Estados Unidos também foram
berço de toda uma literatura acadêmica de apoio à proteção da indústria
nascente. Além dos já citados Alexander Hamilton e Henry Clay, o autor cita
nomes como Daniel Raymond (que influenciou o próprio List) e Henry Corey,
considerado por Marx e Engels o único economista americano relevante dos
anos 1850.
3. Alemanha
Diferentemente da imagem protecionista que tem, a Alemanha é apontada pelo
autor como tendo uma influência muito menor do protecionismo tarifário no seu
desenvolvimento econômico. A tarifa aduaneira foi moderada até 1834, quando
subiu por conta da criação da União Aduaneira. Em 1862, com o acordo de
livre-comércio com a França, e em 1870, com a redução da alíquota do aço, as
tarifas iniciaram um movimento de redução generalizada. Esse movimento foi
detido por Otto Bismarck, em 1879, que aumentou muito as tarifas, como
resultado da aliança entre a aristocracia rural e o empresariado da indústria
pesada. Porém, fora esse aumento, não houve proteção adicional, senão à
agricultura e alguns setores-chave da indústria pesada.
Porém, o uso pouco significativo da proteção tarifária não revela uma visão
laissez-faire do governo alemão. Outras medidas, principalmente intervenções
governamentais de concessão de monopólios, subsídio à exportação e
recrutamento de mão-de-obra especializada foram usadas para fomentar a
indústria nacional. Entre o fim do século XVIII e começo do século XIX,
empresários-burocratas dinâmicos como Graf von Reden e Peter Beuth
beneficiaram-se do apoio governamental, inclusive para fazer espionagem
industrial e copiar tecnologias estrangeiras, a fim de garantirem o avanço da
indústria alemã. Outras duas intervenções governamentais ajudaram
indiretamente a indústria nacional: o financiamento estatal das rodovias e a
reforma educacional, que direcionou o ensino para a ciência e a tecnologia. A
partir de 1840, com a indústria nacional mais consolidada, o governo alterou o
foco de seu apoio, deixando de ter um papel mais diretivo e assumindo um papel
mais orientador.
No período do Segundo Reich (1870-1914), o desenvolvimento do setor privado
e o fortalecimento da aristocracia rural na burocracia estatal levou à
desarticulação da capacidade interventora do Estado alemão. Por outro lado, o
proteção tarifária levou à formação de cartéis, o que permitiu um aumento na
capacidade de investimento privado, gerando uma indústria inovadora.
4. França
A França, segundo o autor, também é sempre apresentada como
intervencionista. Porém, essa conclusão aplica-se ao período pré-revolucionário
e ao pós-Segunda Guerra Mundial. Antes da Revolução (1789), a política
econômica francesa foi caracterizada pelo colbertismo (alusão a Jean-Baptiste
Colbert, ministro da fazenda de Luís XIV) altamente intervencionista. Somente
após a Revolução e com a queda de Napoleão, é que a França adota um regime
de laissez-faire que perdurou até a Segunda Guerra. Assim, se considerado um
período de 1821 a 1913, a Inglaterra teve tarifas protecionistas maiores do que a
França na maior parte do tempo (de 1821 a 1875), o que nega a ideia da França
como Estado caracteristicamente intervencionista em comparação com a
Inglaterra. A exceção dessa fase liberal da França, o período de Napoleão III
(1848-1870), foi marcado por várias medidas de incentivo à indústria e registrou
a única fase de crescimento do período. Já em 1860, com a assinatura do tratado
de livre-comércio com a Inglaterra, o liberalismo sentou raízes. Essas só seriam
revistas após a Segunda Guerra Mundial, quando o Estado francês adotou uma
política industrial e , com isso, conseguiu ultrapassar a Inglaterra em termos
produtivos.
5. Suécia.
Outro país que, como a Inglaterra, é considerado um exemplo de economia
liberal, a Suécia, segundo o autor, também não passou incólume à adoção de
práticas protecionistas e de apoio à indústria local. Em 1816, foi promulgada
uma lei tarifária fortemente protecionista. De 1830 a 1875, essas tarifas foram
sendo reduzidas. Porém, já em 1880, voltaram a crescer e em 1930 a Suécia era
o segundo país de maior proteção à indústria (perdendo apenas para a Rússia).
Segundo o autor, foi essa proteção proporcionou o crescimento da economia
sueca nas décadas seguintes. Além dos tradicionais subsídios e tarifas
protecionistas, o autor chama atenção para outro método característico do apoio
governamental à indústria nacional: as parcerias público-privadas, mais
significativas que as tradicionais práticas colaborativas alemãs. Chang afirma
que essas parcerias resultaram em gigantes como a ERICSON e a ASEA. Essa
política de parceria teve sua manifestação política na eleição do Partido
Socialista em 1932 e da celebração do pacto histórico entre sindicatos e
associações patronais. (Certamente próximo à ideia de corporatismo defendida
por Phillipe Schmiter e de autonomia enraizada, defendida por Peter Evans). Foi
essa associação entre patrões e empregados que levou ao sucesso da indústria
sueca após a Segunda Guerra Mundial.
6. Bélgica
A Bélgica também é apontada como um país caracterizado pelo livre-comércio,
graças à sua supremacia tecnológica em algumas indústrias já no início do
século XIX. De fato, o autor reconhece que, de 1860 até a Primeira Guerra
Mundial, a Bélgica exibiu um regime fortemente livre-cambista. Porém, a
supremacia tecnológica que permitiu isso deriva de forte protecionismo e apoio
à indústria local nos anos anteriores. Durante todo o século XVIII e até a década
de 1850, a Bélgica foi sede de várias medidas de proteção à industrial nacional.
7. Holanda
A Holanda teve ao longo do século XVII uma supremacia naval e comercial que
rivalizava com a britânica. Porém, não transformou isso em supremacia
industrial, como fez a Inglaterra. O autor enumera várias razões para isso,
inclusive a proposta por List de que a Holanda não foi capaz de criar as
instituições e políticas públicas necessárias ao desenvolvimento industrial. O
único momento de exceção a essa paralisia da indústria holandesa foi durante o
reinado de Guilherme I (1815-1840), que lançou mão de várias medidas de
apoio à indústria nacional. Em 1840, o país retornou à política laissez-faire, só a
abandonando após a Segunda Guerra Mundial, quando passou a praticar,
sobretudo após 1963, uma política industrial ativa.
8. Suíça
A Suíça é caracterizada por uma industrialização muito precoce, logo depois da
Revolução Industrial inglesa. Assim, passou a desenvolver tecnologias que a
colocaram na vanguarda de algumas indústrias, o que, entre outros fatores, como
a exiguidade territorial, teria desestimulado o uso de políticas protecionistas.
Apesar dessa característica livre-cambista, o autor chama atenção para o fato da
Suíça não ter adotado uma lei de patentes, medida que beneficiou a indústria
local, que roubava tecnologia da Alemanha para proporcionar vantagens
competitivas industriais.
Após falar desses países individualmente, o autor começa a tratar de grupos de países,
iniciando pelo Japão e os Novos Países Industrializados do Extremo Oriente. No caso
do Japão, destaca-se a abertura forçada do seu comércio pelos Estados Unidos em 1854.
Mesmo com a Revolução Meiji (1868) abrindo caminho para a modernização do país,
esse não pode usar a proteção tarifária, por conta dos acordos comerciais firmados em
1858 e que perduraram até 1911. Porém, o governo lançou mão de outras medidas de
proteção à indústria nacional. A primeira delas foi a criação de empresas estatais em
quase todos os setores industriais. Mesmo sendo posteriormente vendidas para o setor
privado, tais empresas continuaram recebendo apoio do governo. Apesar do fraco
desempenho dessas empresas estatais, pesquisadores como Thomas Smith afirmam que
elas foram importantes para criar uma cultura industrial e lançar as sementes das
indústrias-chave do futuro japonês. O Estado também investiu na construção de
infraestruturas para facilitar o desenvolvimento industrial. Além disso, investiu na
transferência de tecnologias e na contratação de consultores estrangeiros. Cabe destacar
também a incorporação de diversas instituições voltadas para o desenvolvimento
industrial que, apesar das diferentes origens nacionais, foram sendo adaptadas ao
modelo japonês de desenvolvimento.
Com o fim dos acordos comerciais, em 1911, o governo japonês promoveu uma ampla
reforma tarifária de cunho protecionista. O autor destaca que, a exemplo da Alemanha e
da Suécia do fim do século XIX e começo do século XX, o Japão optou por uma
proteção tarifária seletiva (mantendo uma tarifa média moderada e tarifas altas para
algumas indústrias-chave) ao invés de uma proteção tarifária genérica, como Estados
Unidos, Rússia e Espanha, no mesmo período. A partir de 1920, o governo passou a
incentivar as fusões e a formação de cartéis para evitar a concorrência predatória e
ganhar economias de escala. A partir da década seguinte, em função da crise econômica
de 1929 e dos esforços de guerra, o Estado passa a intervir ainda mais na economia,
criando as bases do que seria a sua política industrial no pós-guerra. Com essa política,
o Japão alcançará um crescimento extraordinário até a década de 1970.
Segundo o autor, há um forte debate sobre as causas do crescimento econômico japonês
e dos demais países asiáticos. Segundo ele, a conclusão desse debate é que, com
exceção de Hong Kong, todos os demais países se beneficiaram de políticas industriais
ativas. Outra conclusão é de que os países asiáticos não copiaram simplesmente as
políticas industriais usadas anteriormente pelos países desenvolvidos. Essas políticas
foram aprimoradas pelos países asiáticos, atuando o governo de forma muito mais
coordenada que os daqueles países. Por fim, uma última diferença foi a ênfase dada nos
países asiáticos à qualificação do capital humano, através da educação. Sem entrar em
maiores detalhes, o autor também rebate as críticas de que as crises econômicas que
atingiram a Ásia na década de 1990 foram resultados das políticas industriais ativas
utilizadas após a Segunda Guerra Mundial. O autor mostra diversas evidências que
negam qualquer relação de causa e efeito entre as políticas industriais e a crise asiática.
A seguir, o autor avalia a relação da Grã-Bretanha com as suas colônias e as medidas
tomadas para impedir o avanço destas. Primeiro, estimulava-se a produção primária nas
colônias a fim de que a manufatura fosse desestimulada do ponto de vista econômico.
Além disso, algumas atividades manufatureiras eram proibidas de serem exercidas nas
colônias. Naquelas atividades de manufatura que não eram proibidas, proibia-se a
exportação para a Grã-Bretanha, se essas representassem concorrência para as indústrias
inglesas. Por fim, as colônias eram proibidas de usarem tarifas protecionistas.
Para além das colônias britânicas, o autor dedica-se a estudar como os PADs impediram
o avanço industrial de outros países. A principal estratégia era a imposição, aos países
menos desenvolvidos, de acordos de livre-comércio desfavoráveis. O autor chama a
atenção para semelhança entre a imposição de baixas tarifas no passado e a “sugestão”
atual das agências de desenvolvimento de que os países endividados baixem suas tarifas
para, estimulando o livre-comércio, melhorarem o seu desempenho.
O autor dedica-se também ao estudo das tentativas inglesas de impedir o avanço dos
próprios concorrentes europeus. Essas tentativas não lançavam mão de medidas tão
abusivas quanto a imposição de acordos comerciais desfavoráveis, mas sim de medidas
mais internas, como o controle à emigração de profissionais especializados (que
levavam para outros países os segredos tecnológicos ingleses) e a exportação de
maquinaria (com o mesmo fim de impedir o conhecimento da tecnologia). A resposta
das nações menos desenvolvidas foi incentivar a espionagem industrial e todo o tipo de
subterfúgio para conseguir acesso ás tecnologias britânicas. Na metade do século XIX,
com o avanço das tecnologias inglesas, essa não poderia mais ser transferida mediante
trabalhadores especializados ou mesmo através da importação de maquinaria, o que
levou a Grã-Bretanha a abolir as restrições a esta movimentação. A única forma de
transferência passou então a ser diretamente através do dono da tecnologia, mediante as
regras de patente. Isso levou à formação do primeiro regime de patentes, com as
convenções de Paris (1883) e de Berna (1886) sobre a propriedade dos direitos
internacionais, já sobre pressão não só da Grã-Bretanha, mas de outros países
tecnologicamente avançados, como Estados Unidos e França. A instauração desse
regime não impediu, no entanto, que patentes fossem quebradas, mesmo em países
desenvolvidos, ainda no século XX.
Após esses exames das estratégias de desenvolvimento industrial de países ou grupo de
países, o autor passa a enumerar os mitos e fatos acerca dessas estratégias:
1. Fato – quase todos os países bem-sucedidos valeram-se de políticas industriais
ativas quando estavam em processo de desenvolvimento;
2. Fato - Suíça e Holanda desenvolveram-se com políticas francamente liberais;
3. Mito – Grã-Bretanha, Suécia e Estados Unidos como exemplos de livre-
cambismo;
4. Mito – França e Alemanha como exemplos de intervencionismo estatal;
5. Fato - O Japão teve o seu intervencionismo estatal limitado por restrições
externas (acordos de livre-comércio que proibiam a proteção tarifária);
6. Fato – apesar de usarem políticas industriais ativistas para alcançarem o
desenvolvimento, os PADs advogam políticas exatamente contrárias (livre-
comércio) para que os países em desenvolvimento.
O autor inicia a conclusão do capítulo afirmando que apesar da influência da proteção
tarifária à indústria nascente para o desenvolvimento industrial dos PADs, o uso de
diferentes arranjos de medidas variadas (subsídios, parcerias, investimento em
educação, etc) faz com que não se possa falar em uma “receita universal” de
desenvolvimento industrial. Outra conclusão interessante é que, por um lado, ao mesmo
tempo em que as políticas industriais ativas de outrora eram muito primitivas se
comparadas com aquelas que são possíveis hoje, esse conjunto mais sofisticado de
políticas industriais ativas contemporâneas são justamente as que estão sendo proibidas
pelos organismos internacionais, como a OMC. Mas, por outro lado, como a distância
entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento é muito mais agora do
que no início da utilização de políticas industriais ativas, essas precisariam ser muito
mais intensas hoje do que antigamente.
Salvador, 28/12/2011.