Você está na página 1de 6

ANESTESICOS LOCAIS

Os anestésicos locais possuem um mecanismo de ação simples, o anestésico vai de uma


maneira reversível bloquear a condução neural ao longo de uma fibra nervosa, bloquear a
formação de potencial de ação ao longo de um segmento neural a qual o anestésico está
entrando em contato.

O efeito principal do anestésico local é que ele gera abolição da dor. Se a pessoa produzir
muitos mediadores da inflamação, muitos mediadores multipotenciais que chegam na medula,
o anestésico local tem a única função de bloquear essa condução dos potenciais e não a sua
formação. então se a pessoa tiver um quadro de dor grave, se for uma cirurgia cruenta, o
anestésico local bloqueia a condução e depois que o efeito passar, depois que aquele neurônio
voltar a permitir a condução tudo que está sendo formado que envolve prostaglandinas,
citocinas etc. vai chegar até o córtex somatossensorial e o paciente vai perceber a dor.

O anestésico local aboli a dor, mas sozinho muitas vezes não é o bastante para conseguir de
maneira eficaz inibir a dor. Por exemplo, se uma pessoa tem uma ferida na mão em que é
preciso fazer uma sutura, em muitas situações o médico faz três, quatro pontos, faz a
anestesia local e isso é o suficiente. Em um corte mais profundo, o médico além de usar uma
anestesia local para fazer a sutura ele vai prescrever um anti-inflamatório, e assim ele
consegue trabalhar no controle melhor da dor. Então o anestésico local bloqueia a condução,
mas sozinho ele pode não ser eficaz para completamente tratar a dor, mas enquanto o
anestésico local estiver ali presente a pessoa não percebe a dor porque o neurônio vai estar
bloqueado.

Os anestésicos locais pertencem a duas grandes famílias: éster e amida. Essas famílias levam
em consideração a cadeia intermediária, a estrutura química do anestésico. Então ele pode ter
a cadeia intermediaria do tipo Éster e a cadeia intermediaria do tipo amida.
Cadeia intermediária = o meio da molécula, porque as extremidades é um anel aromático e um
grupo ionizado, então o que difere realmente é a parte do meio que é a cadeia intermediaria.

 Derivados dos ésteres – benzocaína, procaína e tetracaína


 Derivados da amida – lidocaína, prilocaína, bupivacaína e ropivacaína.

Na medicina é preciso saber o grupamento intermediário (éster ou amida) para a utilização dos
anestésicos. Na prática médica o éster mais usado é a tetracaína, e as amidas mais utilizadas
são as lidocaínas, bupivacaína e ropivacaína.

Os derivados ésteres são metabolizados no sangue por enzimas chamadas de esterases


plasmáticas, enquanto as amidas são metabolizadas no fígado, necessitam do sistema
microssomal hepático para serem metabolizadas. A medicina se preocupa muito com a meia
vida desses medicamentos porque quando você aplica um anestésico local você quer suturar,
tirar um corpo estranho, fazer uma pequena biópsia, entre outros procedimentos. Um
derivado de éster por ser metabolizado no próprio plasma tem a meia vida muito curta, na
prática médica fica inviável porque você tem um medicamento que a meia vida é de minutos,
então você aplica e o efeito passa muito rápido. Então os derivados ésteres são poucos usados
na medicina justamente por terem uma meia-vida plasmática muito curta, diferentemente dos
derivados amidas.
Quando um procedimento precisa ser feito o médico precisa analisar bem o local em que o
anestésico local vai ser aplicado. O médico precisa ter entendimento de que há uma relação
entre o pKa da substância do anestésico local e o PH do meio em que você está aplicando.

O pKa do anestésico é uma constante. A benzocaína é o único anestésico local que é um ácido
nesta tabela, todos os outros são bases fracas. Só que a benzocaína não é encontrada para ser
aplicada em pacientes porque a meia vida é muito curta.

Se você aplica um anestésico local em uma região que já está ferida, que já está inflamada, se
você aplicar no local da ferida você pode observar que o efeito do anestésico local não
acontece, ou quando acontece é muito baixo ou quase nulo.

A falta da dor ocorre pela desensibilização neural.


Então por que continua doendo? Porque o anestésico loca são bases fracas, e ao entrar em
contato com o meio que está ácido que é o meio inflamatório o anestésico local ioniza.
O fármaco para atravessar a membrana neuronal (epineuro) precisa estar em formas
lipossolúveis, que são as formas não ionizadas. se o local está super inflamado, ao aplicar o
anestésico ele vai ionizar, e ionizado o fármaco não atravessa o epineuro, por isso que o efeito
anestésico é muito baixo. então não se deve aplicar no local inflamado porque você não vai
conseguir o efeito desejado, e mesmo aumentando a dose do fármaco em excessos o efeito
não aumenta. Em um determinado momento quando esse anestésico chegar à circulação
sistêmica, esse excesso que foi aplicado - e que não fez efeito vai gerar efeitos colaterais
graves no paciente.

Então médico não deve aplicar no local que está inflamado, o que se pode fazer é aplicar em
um local mais distante.
Ex.: Vamos supor que a pessoa tem uma lesão no antebraço, um corpo estranho, a pessoa
demorou para procurar o atendimento e o local ficou inflamado. O médico vai chamar o
anestesista que pode optar em aplicar o anestésico por exemplo no plexo braquial, que é um
local mais distante que tem transmissão com aquele segmento.
Então o anestésico vai conseguir fazer efeito porque quanto mais próximo tiver o pKa do
anestesio local com o pH do tecido, (que é o pH fisiológico - 7,4 em média) quanto mais
próximo melhor vai ser essa relação entre as concentrações ionizadas e não ionizadas. A
concentração que não estiver ionizada, ou seja a forma lipossolúvel do fármaco atravessa o
epineuro e o anestésico vai fazer seu mecanismo de ação.
MECANISMO DE AÇÃO

O anestésico vai estabilizar o canal de sódio na sua forma inativa. Quando a comporta de
inativação estiver ativa, ou seja, fechando, o anestésico local ganha uma grande afinidade por
essa comporta e estabiliza o canal de sódio em sua forma inativa. O anestésico entra no
neurônio na sua forma não ionizada, só que dentro do neurônio ele encontra muitos íons e
ioniza, então o anestésico ionizado dentro do neurônio ganha afinidade pela face inativa do
canal de sódio e o estabiliza nessa forma.

Para ter um canal de sódio com comporta de inativação em funcionamento o potencial de


ação tem que estar sendo gerado para ter as fases de abertura, inativação e fechamento.

Os anestésicos locais seguem a regra do bloqueio dependente.


Por exemplo se eu cortei o meu dedo, o médico pode aplicar o anestésico local na base do
dedo onde passa o nervo, mesmo que a lesão esteja localizada mais acima. A perda de
sensibilidade é muito grande na área que houve a lesão, porque quanto mais canais de sódio
estiverem sendo usados maior vai ser o efeito do anestésico local. É por isso que na
transmissão da dor, quando você aplica o anestésico local ele por difusão vai chegar em vários
nervos, mas tende a ir para áreas onde o canal de sódio esteja sendo mais requisitado
justamente por ter mais formas inativas do canal de sódio, este processo se chama bloqueio
dependente. O efeito geral vai ser a perda de sensibilidade de todo o membro, mas a
concentração maior do anestésico vai ser nessa região, é o que nós chamamos de bloqueio de
uso dependente.

O canal estabilizado nessa forma inativa vai ficar fechado. Então o que o anestésico faz é deixar
o neurônio por um tempo grande na fase do potencial de ação do período refratário absoluto,
onde tem os canais de sódio na forma inativa. Mesmo que haja estímulos grandes surgindo, o
segmento neural oriundo daquela região não transmite isso para a medula, não transmite isso
para o córtex somatossensorial. Em cirurgias muito cruentas só uma anestesia local não é
suficiente, mas cirurgias menos invasivas é o bastante.

O bloqueio da anestesia local segue uma determinada ordem:

Você vai ter a perda da sensação dolorosa, térmica, tátil, pressão profunda e função motora.
Nessa sequência de bloqueios.

Essa sequência ocorre por conta da sensibilidade das fibras ao anestésico local. As fibras da dor
(fibras do tipo delta e C) apresentam uma sensibilidade muito grande ao bloqueio do que por
exemplo uma fibra motora beta, que a sensibilidade é relativamente menor ao bloqueio
anestésico. Isso tem a ver com o número de canais que precisam ser bloqueados para que o
potencial de ação não aconteça. Fibra alfa, beta, gama são fibras muito grossas, tem um
número de canais de sódio muito grandes. Então o anestésico local tem que bloquear muitos
canais para conseguir bloquear com sucesso a transmissão neural, coisa que mais facilmente
consegue-se fazer com fibras do tipo C. Então essa sequência ocorre com a por conta da
sensibilidade do bloqueio dessas fibras de acordo com esses canais correspondentes ao
diâmetro dessas fibras neurais.

Quando se aplica a anestesia local é importante saber que dependendo do local que você
administra o anestésico pode ser mais rapidamente absorvido pela circulação sistêmica ou
mais lentamente. Qualquer região que tem muito vaso sanguíneo vai aumentar muito a
absorção do anestésico, mas o efeito da anestesia precisa ser local, no segmento neural. Então
se você quer anestesiar um segmento você aplica próximo aquele local e por difusão o
anestésico vai chegar no local desejado. Tem regiões com muitos vasos sanguíneos e por isso o
anestésico não consegue ficar tanto tempo próximo do neurônio, ele vai para a circulação
sanguínea. Para evitar isso a medicina associa o anestésico local com uma substância
vasoconstritora, a principal substância vasoconstritora é a adrenalina.

A função da adrenalina nesse processo vai ser contrair os vasos do local retardando a absorção
e dessa forma aumenta o tempo de ação do anestésico local.

O médico não pode aplicar esses vasoconstritores em locais de circulação terminal, exemplo
ponta de dedo, orelha, etc, que são locais em que não há uma circulação sanguínea tão
pronunciada, ao aplicar adrenalina nesses locais pode causar necrose.
Então em locais periféricos não pode aplicar vasoconstritor. Locais que podem aplicar os
vasoconstritores aumentam muito o tempo de ação dos medicamentos, e dá um tempo maior
para o médico exercer a sua atividade.

Os fármacos do grupo amida são fármacos metabolizados no fígado, esses fármacos são
amplamente distribuídos no tecido adiposo inclusive, e passam facilmente pelas barreiras do
nosso organismo e alcançam facilmente o sistema nervoso central. a lidocaína por exemplo é
uma substância que tem uma alta sensibilidade a canais de sódio voltagem dependente, então
pode muito facilmente chegar no coração e no próprio sistema nervoso central mesmo que
você aplique o fármaco perifericamente. O excesso do medicamento pode culminar em
sintomas e efeitos colaterais justamente nesses sistemas.

O éster tem a meia vida plasmática muito curta, basicamente é um medicamento que não é
mais usado em medicina porque ao aplicar o fármaco já é metabolizado.

Os anestésicos do tipo éster no metabolismo são convertidos em um metabólico chamado


PABA, e o PABA é uma substância extremamente antigênica para o organismo humano. Muitas
pessoas podem ter alergia a anestesia local, principalmente quando usa um anestésico do tipo
éster.
Quando acontece uma alergia oriunda de um anestésico do tipo amida normalmente é pelo
veículo do medicamento e não pelo próprio medicamento.

Taxa de Metabolismo Hepático:

Prilocaína> Endocaína> Lidocaína> Mepivacaína> Ropivacaína> Bupivacaína e


Levobupivacaína.

EXCREÇÃO

A excreção do medicamento é urinaria. Isso é interessante porque quando a pessoa intoxica


com anestésico local, o médico pode como procedimento acidificar a urina desse paciente
aplicando a vitamina C. Os rins demoram para obter o controle do pH, e a vitamina C quando
aplicada muito facilmente consegue acidificar as vias urinarias. Como a maior parte dos
anestésicos locais são bases fracas, ao acidificar a urina vai ocorrer uma compartimentalização
desse anestésico. Quando o anestésico cai no tubo renal ele não consegue retornar para a
circulação sistema, processo chamado de sequestro iônico. Isso facilita muito a eliminação do
medicamento para tratar quadros tóxicos de anestesia local.
EFEITOS INDESEJADOS

As reações adversas não são incomuns no uso dos anestésicos locais. Se você aplica
perifericamente, antes de injetar tem que verificar se a agulha não foi colocada em algum leito
vascular. Se a lidocaína é aplicada na corrente sanguínea efeitos adversos graves podem
acontecer, porque a lidocaína é extremamente vaso dilatadora.

Se o efeito adverso acontecer o paciente vai manifestar sintomas que são muito clássicos de
conhecimento médico. Como os anestésicos locais atravessam facilmente as barreiras
celulares, inclusive a barreira hematoencefálica, o anestésico chega muito facilmente ao SNC e
lá vai bloquear os canais de sódio, vai estabilizar os canais em sua conformação inativa e os
sintomas disso são inquietação, tremores, convulsões, depressão e vai progredindo com a
concentração que vai chegando no cérebro. O paciente pode inclusive ter depressão bumbar e
entrar em insuficiência respiratória.
No músculo liso o anestésico vai deprimir e relaxar obviamente o segmento muscular, o canal
de sódio também não vai conseguir funcionar.
No miocárdio pode inclusive ter efeito no próprio coração, reduzindo a estabilidade elétrica, a
condução elétrica e isso vai reduzir a força de contração. A bupivacaína também pode causar
esse efeito, quando a bupivacaína surgiu ela foi chamada de cardiotóxica porque usava-se uma
dose muito alta que deprimia o sistema cardíaco.

As alergias são relativamente raras, mas quando é do tipo éster o PABA é o culpado como
metabolito do medicamento. No tipo amida o culpado é o veículo do medicamento, que
podem ser o metilparabeno ou o metabisulfito. O metilparabeno é um antimicrobiano e o
metabissulfito é uma substância que estabiliza a adrenalina na lidocaína. Essas duas
substâncias podem causar alergia.

A adrenalina é um aditivo da anestesia local. Ela faz vasoconstrição, aumenta a duração do


bloqueio e a intensidade do bloqueio anestésico, reduz a absorção sistêmica, entre outros,
mas não pode ser usada em locais periféricos que podem causar necrose e deve também ser
evitada em pacientes cardiopatas ou hipertensos, porque pode aumentar a pressão arterial.

A felipressina é uma substância vasoconstritora, ela atua em receptores alfa 1, mas ela é
seletiva para o alfa 1 presente nas vênulas e veias. A felipressina causa venoconstrição, então
de uma certa forma na microcirculação aumenta o tempo de ação, não gera efeito na arteríola
que vai aumentar a pressão do paciente. O problema da felipressina é que quimicamente ela
só é compatível com um anestésico local que é a prilocaína.

LIDOCAÍNA

A lidocaína a gente chama de padrão-ouro porque é o medicamento mais usado, é o


medicamento que apresenta maior uso ambulatorial em medicina dada a sua anestesia ser
rápida e intensa dependendo do procedimento. Ela não precisa de vasoconstritor, mas em
muitos procedimentos da medicina a sua associação é importante para aumentar o seu tempo
de ação, que de no máximo 30 minutos com vasoconstritor vai para 45 – 50 minutos de ação.
Se o médico for fazer uma cirurgia de 2h não é interessante fazer a reaplicação da lidocaína, se
é uma cirurgia maior o médico pode optar por um anestésico local que dure mais tempo, que
inative o canal por mais tempo.

Existem várias formulações de lidocaína (injetável, spray, etc). A estrutura química dessa
molécula permite essa versatilidade.

Doses altas podem ser extremamente toxicas, causa sonolência, zumbido no ouvido, tontura,
contrações musculares, convulsões, depressão respiratória e cardíaca. Baixas doses tem ação
antiarrítmica, é aplicada para este fim diretamente na circulação sistêmica pela via
intravenosa.

Bupivacaína

A bupivacaína é um anestésico muito usado na medicina principalmente por conta do seu


tempo de ação no local. A duração é muito prolongada, a anestésico dura bastante tempo até
2 horas. Apresenta um bloqueio sensorial maior do que o motor, ou seja, ela é mais seletiva
pro bloqueio sensorial, então se for necessário um bloqueio motor mais especifico a
bupivacaína talvez não seja uma boa opção.

A bupivacaína é mais cardiotóxica em doses que eram usadas antigamente. Em doses que hoje
são usadas é ela muito segura para o sistema, mas deve-se tomar cuidado com pacientes que
apresentem alguma disfunção no sistema cardíaco.

Endocaína

A Endocaína é uma outra opção menos usada na medicina. Tem uma longa duração, gera um
bloqueio motor preferencial, sendo mais seletiva para as fibras motoras. Se o médico quer
fazer um bloqueio mais motor do que sensorial a eudocaína é mais restrita para este fim.

Ropivacaína

Ropivacaína é um isômero da bupivacaína. Ela tem menor possibilidade de efeitos colaterais,


quando foi sintetizada foi muito comercializada por ser mais segura, porém é bem mais cara
do que bupivacaína.

Mepivacaína e Prilocaína

Você também pode gostar