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DIREITOS HUMANOS

Unidade II
5 DAS LIBERDADES E DOS DIREITOS SUBJETIVOS

5.1 Liberdades subjetivas

A ideia de liberdade sempre inspirou os povos como forma de autonomia e de autodeterminação.


Entretanto, é na Idade Moderna que a vontade do indivíduo se concretiza como autonomia e plenitude
de consciência de si, como sujeito racional e com conhecimento de sua subjetividade.

A ideia de liberdade, na modernidade, passa a protagonizar a história da humanidade em bases


mais racionais.

Não é demais mencionar que, a história da humanidade está intrinsecamente ligada à ideia de
liberdade como atributo humano e como direito humano.

Vimos que na antiguidade, a liberdade consistia na esfera participativa do sujeito nas decisões da
cidade. Segundo a concepção de liberdade, no mundo grego, esta estaria conectada às razões e às
políticas da polis (cidades-estados), ou seja, a cidade comandava as vontades do indivíduo.

De fato, a história nos conta que em Esparta, para ser considerado cidadão, era preciso comparecer
à refeição pública. Da mesma forma em Roma, onde a cidadania dependia da presença do indivíduo à
cerimônia santa da lustração para usufruir de direitos políticos. Assim, percebe-se que, nos tempos
antigos, a cidadania estava intrinsicamente ligada à religião (COULANGES, 2003, p. 177).

Veja que, a aquisição de direitos conectava-se a participação do indivíduo nas atividades da cidade,
sendo o culto, parte dessas atividades.

A liberdade, portanto, era considerada um privilégio, pois escravos e estrangeiros não desfrutavam
da liberdade, pois que ela consistia na participação da vida pública da cidade.

Você sabia que na antiguidade, para ser considerado membro da polis, era necessário ter uma posição
social e política bem definida?

Pois então, a participação na polis era um dever de cidadania.

Questão interessante é que na antiguidade, embora houvesse um espaço privado, este girava em
torno da família, na qual se constituía como uma associação religiosa, onde se realizavam os cultos.
Segundo Fustel de Coulanges, a primeira instituição que a religião doméstica estabeleceu foi o casamento
(2003, p. 42-43).
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Por outro lado, a esfera pública, no mundo antigo, era a esfera comum, na qual os cidadãos
exerciam suas atividades políticas. A vida pública, portanto, era considerada mais importante que a
vida privada nesta época, pois era na vida pública que o indivíduo poderia exercer sua virtude política.
A liberdade estava condicionada ao agir participativo no âmbito coletivo, vinculando o ser humano a
uma vocação política.

Note-se que a subjetividade surge com a era moderna. Podemos citar Hegel, a designar a
subjetividade como o espírito absoluto de onde surgem todas as coisas. Assim, para Hegel (filósofo
germânico), a subjetividade residia na esfera do indivíduo consigo mesmo, mas não no “agir”, como
acontecia no mundo antigo, e sim no “querer”.

Por outro lado, em Kant (filósofo alemão), o querer está na vontade condicionada a um imperativo
de ordem moral, no livre arbítrio e na autonomia de seguir as regras da consciência individual e das leis
da natureza.

A liberdade moderna, portanto, fortemente influenciada por ideias filosóficas a exemplo de Hegel
e Kant, surge com toda força do iluminismo, tendo na representatividade, ou seja, na escolha dos
governantes, e, por óbvio, na República, o marco fundamental da sua universalidade.

A título ilustrativo, por liberdades subjetivas, pode-se entender os direitos de personalidade, a livre
manifestação de ideias e opiniões, a liberdade de ir e vir e a liberdade de crença.

Interpretando o parágrafo acima, pode-se dizer que por liberdade subjetiva entende-se decidir e
opinar sobre algo, acreditar ou não em alguma coisa, ir ou não ir a algum lugar, exercer esta ou aquela
profissão etc.

Saiba que, se essas liberdades forem violadas, em regra, caberá ao indivíduo, que teve o direito
violado, exercer a defesa dessas liberdades (direito de defesa).

Vejamos, portanto, as liberdades públicas previstas no art. 5º da Constituição Federal de 1988 que,
reconhecidamente, são asseguradas em toda sua abrangência a todos os seres humanos. São elas: a
vida, a liberdade, a igualdade, a segurança jurídica, a propriedade, a cidadania entre outras asseguradas
pela Constituição e pelos Tratados e Convenções Internacionais.

Veja que os direitos de defesa, em face da proteção dessas liberdades, legitimam o ideal democrático
e são decorrência de outros princípios.

Observação

O direito de defesa é constitucional e indisponível, e pressupõe garantias


para o seu exercício.

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Apenas para exemplificar, podemos listar alguns princípios que legitimam o direito de defesa:
princípio da ampla defesa e do contraditório; princípio do devido processo legal, princípio da presunção
de inocência, princípio da vedação das provas ilícitas, princípio da igualdade jurídica e o princípio do
direito de ação.

A Constituição Federal de 1988 dispõe sobre os direitos de defesa no art. 5º e seus incisos, consoante
a defesa desses direitos em Tratados e Convenções que versam sobre Direitos Humanos.

Para uma melhor fixação, postulou-se realizar uma análise comparativa entre a Constituição e a
Ordem Internacional em matéria de Direitos Humanos.

O quadro a seguir exemplifica quatro direitos de defesa selecionados em quatro documentos


internacionais em cotejo com a Constituição Federal de 1988.

Conforme você poderá verificar, aos direitos de defesa correspondem as garantias para o seu exercício.

Vejamos a seguir:

Quadro 9

Direitos de Defesa Garantias


Presunção de inocência Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1.789, art. 9º)
“Ninguém será considerado Declaração Universal de Direitos Humanos (art. 11)
culpado até o trânsito em julgado
de sentença penal condenatória” Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 14)
(art. 5º, LVII, CF/88) Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8º)
Declaração Universal de Direitos Humanos (art. 9º e 10)
Devido processo legal
Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (arts. 2º, § 3º, 9º e 14)
“Ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7º)
devido processo legal” (art. 5º, LIV,
CF/88) Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos e
Degradantes (art. 7º)
Ampla defesa e contraditório
Declaração Universal de Direitos Humanos (art. 11)
“Aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (arts. 9º, § 2º e 14, §§ 2º e 3º)
acusados em geral são assegurados
o contraditório e a ampla defesa, Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8º)
com os meios e recursos a ela Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura (art. 14)
inerentes” (art. 5º, LV, CF/88)
Defesa dos pobres Declaração Universal de Direitos Humanos (arts. 2º, 21, 22 e 25)
“O Estado prestará assistência Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (arts. 1º, 2º, § 1º e 26).
jurídica integral e gratuita aos
que comprovarem insuficiência de Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 23).
recursos” (art. 5º, LXXIV, CF/88) Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (art. 11)

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5.2 Primado do direito e do julgamento justo

Saiba que para a efetiva promoção dos Direitos Humanos faz-se necessário não apenas declarar
esses direitos nas Convenções e Tratados, mas implementar medidas de efetivação desses direitos.

Assim ocorre com o julgamento justo que não só protege sociedades inteiras, mas confere segurança
jurídica e confiança na Justiça e nas instituições governamentais.

A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, na Declaração de Viena (1993), reconhece o primado
do direito para vencer os obstáculos e enfrentar os desafios para a concretização plena desses direitos.

Selecionamos alguns aspectos do primado do direito e do julgamento justo para seu aprendizado:

• Preservar os direitos e garantias constitucionais.

• Promover o tratamento equitativo.

• Contribuir para a segurança e a confiança nas instituições.

• Garantir o devido processo legal.

• Garantir a igualdade processual.

• Auxiliar na redução das práticas criminosas.

• Fomentar o desenvolvimento econômico.

• Instrumentalizar a justiça por meio de garantias.

• Desestimular o abuso de direito.

• Legitimar as decisões democráticas.

No quadro n. 9 estudamos os princípios que norteiam os direitos de defesa na Constituição Brasileira,


tais como a presunção da inocência, o devido processo legal e a ampla defesa e o contraditório. Além
desses, outros princípios ampliam a dimensão do primado do direito e do julgamento justo.

Vamos conferir mais alguns?

O dever de fundamentação, disposto no art. 93, IX da Constituição Federal de 1988, traz a


obrigatoriedade de justificação de toda e qualquer decisão jurídica. Este dever é decorrente do estado
democrático de direito que prevê a possibilidade de participação jurídico-política e o controle das
decisões por todo e qualquer cidadão que seja parte no processo decisório.

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Vincula-se este postulado ao dever de fundamentar as decisões, à publicidade dos atos processuais,
que por sua vez se conecta diretamente com a liberdade de informação (dever de informar versus direito
de ser informado).

Confira que o direito a uma justiça independente e imparcial está prevista no art. 10 da Declaração
Universal dos Direitos Humanos (1948), ao estabelecer o direito de todos os seres humanos obterem
uma audiência justa e pública por um tribunal independente e imparcial.

Veja que há previsão constitucional do princípio da razoável duração do processo, portanto, o


primado do direito e do julgamento justo liga-se ao direito de não ter um processo que se prolongue
indefinidamente, conforme se depreende da leitura do art. 5º, LXXVIII: “a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação”.

De outro lado, a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) prevê
no art. 7º.5 que toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um
juiz ou autoridade legitimada em lei para o exercício das funções judiciais.

Note-se que, a expressão “sem demora” denota o dever de se atentar para a razoabilidade da medida
de coação, ou seja, que o lapso temporal seja compatível com a medida adotada.

No mesmo artigo, consta que toda pessoa presa, detida ou retida, tem o direito de ser julgada em
prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo do prosseguimento do processo, tendo em vista
que a sua liberdade poderá ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

Observa-se que, tanto na esfera normativa nacional quanto no âmbito internacional, impõe-se
trazer princípios normativos capazes de assegurar o primado do direito e do julgamento justo, de forma
a reforçar os direitos e as garantias fundamentais e fortalecer o estado democrático de direito.

Entretanto, questiona-se como avaliar a “duração razoável do processo?”

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, de acordo com as lições de André de Carvalho Ramos
(2017, p. 749), se vale de critérios para avaliar caso a caso.

Assim, ao analisar se houve violação do devido processo legal em um prazo razoável, a Corte leva
em consideração:

• a complexidade da causa;

• a atividade das partes (se uma das partes contribuiu para a demora, com medidas procrastinatórias);

• a atividade do juiz.

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Exemplo de aplicação

Leia o texto a seguir:

Em 21 de março de 2013 foi submetido à Comissão Interamericana de Direitos Humanos o caso


Rochac Hernandez e outros contra a República de El Salvador. Tratou-se do desaparecimento forçado de
cinco crianças entre 1980 e 1982 em circunstâncias com características similares, ou seja, no marco do
conflito armado, após a execução de operações militares, a chamada “contra insurgência”. A submissão
à Corte Interamericana de Direitos Humanos alegou a não realização por parte do Estado de uma
investigação séria e diligente, em um prazo razoável, sobre o suposto desaparecimento forçado das
vítimas. Além disso, pleiteou-se perante a Corte o justo direito à verdade, à justiça e à reparação de seus
familiares, pois já transcorrera 30 anos sem que houvesse se estabelecido o destino ou o paradeiro de
nenhumas das supostas vítimas, imperando, portanto, segundo os familiares das vítimas, a impunidade.

A Corte julgou o caso Rochac Hernandez e outros, condenando o Estado de El Salvador por violações
aos Direitos Humanos tais como o direito à verdade, o direito à razoável duração do processo e o
direito às garantias judiciais e à proteção judicial, A decisão foi prolatada em 14 de outubro de 2014.
Ficou estabelecido o direito de reparação por dano material e imaterial aos familiares das vítimas
responsabilizando o Estado a efetuá-las.

Faça uma leitura do caso Rochac Hernandez e outros vs El Salvador. Leia sobre as medidas de
restituição, reabilitação, satisfação e garantias de não repetição estatuídas pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos ao Estado de El Salvador. Reflita a respeito do desfecho deste caso na contribuição
para a promoção dos Direitos Humanos.

CNJ. Jurisprudência. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/poder-judiciario/relacoes-internacionais


/jurisprudencia-corte-idh/sentencas-por-tema-2014/. Acesso em: 30 jan. 2020.

CASO ROCHAC HERNÁNDEZ E OUTROS VS. EL SALVADOR. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-


content/uploads/2016/04/30d02186dc69d5aa62de35623fab5933.pdf. Acesso em: 30 jan. 2020.

5.3 Das liberdades religiosas

Jorge Miranda ensina que os direitos por si representam certos bens, enquanto que as garantias
destinam-se a assegurar a fruição desses bens (2000, p. 95).

Assim, podemos dizer que a norma que fundamenta subjetivamente o direito à liberdade estará
consagrando os interesses do indivíduo, na razão direta de sua situação de vida, de suas escolhas, de sua
liberdade, do desenvolvimento de sua personalidade e dos seus ideais.

Verifique na figura a seguir, a liberdade do indivíduo com relação as suas escolhas:

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Ter Não ter

Fazer Ser

Liberdades
Não fazer Não ser

Figura 11 – Liberdades, escolhas

Veja que, ter ou não ter algo, fazer ou não fazer alguma coisa, ser ou não ser, enfim, são posições
subjetivas vinculadas a uma variedade de escolhas do indivíduo. Nesse aspecto, as liberdades (de expressão,
de informação, de consciência, de religião e culto, de criação cultural, de associação e de reunião) são
consideradas liberdades subjetivas porque envolvem o direito de defesa.

Note-se que a liberdade religiosa liga-se à liberdade de consciência e de pensamento e pauta-se no


princípio da dignidade da pessoa humana.

De todo modo, saiba que o fundamento moral e filosófico que inspirou todos os princípios nos
Tratados e Convenções que versam sobre Direitos Humanos é a dignidade da pessoa humana.

Por esta perspectiva, tem-se que a dignidade da pessoa humana serve de limitação à violação de
direitos; aliás, a dignidade da pessoa humana proíbe o retrocesso em matéria de Direitos Humanos.

O princípio da dignidade humana vetora a miríade de proteção dos Direitos Humanos quando ocorre
a colisão de direitos. Da mesma forma, no caso de colisão de normas, na qual este princípio funciona
como critério de aferição da norma mais benigna e mais razoável a ser aplicada.

O art. 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) assegura o direito de religião, no qual
se inclui o direito de professar qualquer credo por ensino, prática, culto, de forma isolada ou coletiva,
em público ou em particular.

Ao assegurar o direito de adotar qualquer religião, a Declaração abre a possibilidade, ainda, do


indivíduo mudar de religião.

Por outro lado, a ideia de defesa da liberdade religiosa remete a ideia de que o Estado não pode
proibir alguém de adotar uma religião, mas também não pode impor uma religião, a saber: ao Estado é
vedado impor ao indivíduo uma religião oficial. Este é o cerne das Constituições democráticas quando
adota a laicidade.

O Estado laico, portanto, não impõe religião alguma, não prevê nenhum credo ou crença, em resumo,
não impõe uma religião oficial. Até porque, o Estado laico é aquele que aceita todas as religiões, tendo

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em vista que não distingue o indivíduo por ele ter ou não uma religião, por ele ser ou não religioso, por
fazer parte ou não de qualquer culto.

Lembrete

A neutralidade do Estado, por ser laico, significa que ele não sofre
qualquer tipo de influência religiosa.

O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos reconhece a liberdade de religião (art. 18) nos
moldes da Declaração Universal de 1948, conquanto estabeleça que o direito de manifestar a própria
religião poderá sofrer limitações, sejam elas previstas em lei ou para proteger a segurança, a ordem, a
saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas (art. 18.3).

Esta ponderação de direitos já vinha expressa no art. 4º da Declaração Francesa (1789) quando
dispôs que “o exercício dos direitos naturais do homem não tem outros limites senão os que asseguram
aos demais membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos”.

Veja você, esta prudência em matéria de direitos, pauta-se na interpretação de que existem liberdades
envolvidas e interesses em jogo que dependem de ponderação. Em outras palavras, há que se estabelecer
critérios para o exercício de direitos e de liberdades, pois, de outro modo, jamais haveria solução justa
para os conflitos.

O Pacto de San José da Costa Rica cuidou também da proteção das liberdades: a liberdade de
consciência e a liberdade de religião. Observe que este Pacto limita a liberdade de manifestar a própria
religião nos mesmos moldes que o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, senão vejamos:
“A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita apenas às limitações
previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral
públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas” (art. 12).

Na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, VI), que adotou a tendência internacional, trouxe a proteção
da liberdade religiosa como um direito fundamental e recepcionou a inviolabilidade da religião e de
crença. A Constituição assegura, portanto, o livre exercício dos cultos religiosos e garante, na forma da
lei, a proteção aos locais de culto, bem como às suas liturgias.

Note-se que, tanto a Constituição Brasileira quanto os Tratados e Convenções Internacionais


contemplam a pluralidade ou a neutralidade de crença.

Mas no que consiste a pluralidade de crenças?

A pluralidade de crenças promove a integração de todas as pessoas, com seus credos, etnias, culturas,
na função aglutinadora multicultural com vistas a convivência pacífica entre os povos.

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A proteção jurídica da liberdade de religião tem por objetivo apenas o respeito a crença de cada um?

Não, na busca da proteção da liberdade de religião promove-se a liberdade de escolha, do pluralismo


de ideias, da tolerância e da diversidade cultural.

Veja que em 1981, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Declaração sobre a Eliminação
de todas as formas de Intolerância e Discriminação com base na Religião ou Crença (Resolução
n. 36/55). Neste documento, no Preâmbulo, há o reconhecimento de que a liberdade de religião ou de
convicção deve também contribuir para a realização dos seguintes objetivos:

• paz mundial;

• justiça social;

• amizade entre os povos;

• eliminação de ideologias ou prática do colonialismo; e

• discriminação racial.

Ao dispor sobre a amplitude da liberdade de religião, de pensamento, de consciência e de convicção,


esta Declaração estabelece que se relacionam às liberdades, à prática de culto ou de reunião, à liberdade
de convicção, de escrever, de publicar e de divulgar publicações relevantes nestas áreas; de confeccionar,
de adquirir ou utilizar artigos necessários aos ritos e costumes de determinada religião ou convicção; e
à prática do ensino religioso entre outras hipóteses do art. 6º desta Declaração

Desse modo, vê-se a ampla proteção internacional em matéria do direito humano à liberdade de
religião e de crença, inclusive o direito de não ter uma crença, de ser ateu.

Assim, quando houver conflito entre o indivíduo e o Estado, com relação às convicções religiosas
de cada um, não há como o Estado anular ou suprimir essa liberdade, pois se trata de um direito
humano vinculado a uma liberdade subjetiva, no exercício de um direito inalienável, salvo as limitações
estatuídas em lei.

Para finalizar, a liberdade religiosa infere a liberdade de crença e a liberdade de prática religiosa, o
que inclui os cultos e as atividades decorrentes da religião professada.

5.4 Do direito à privacidade

Vimos que as liberdades públicas decorrem de um regime jurídico reconhecido institucionalmente


pelos Estados a assegurar essas liberdades, livre de interferências ou ataques.

Vejamos o que diz a Declaração Universal de Direitos Humanos, em seu art. 12:

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Ninguém será sujeito a interferências em sua vida privada, em sua


família, em seu lar ou em sua correspondência, nem ataques à sua honra
e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais
interferências ou ataques.

A privacidade detém um valor intrínseco com forte imbricação com a dignidade da pessoa humana,
haja vista seja essencial para o desenvolvimento da personalidade e para o desfrute de outros direitos,
tais como a liberdade de ir e vir, a intimidade, o direito de estar só.

Na era tecnológica e digital, o ser humano enfrenta o paradigma da falta de segurança e da falta
de privacidade.

No âmbito social, a esfera privada restringe-se a interação com membros da comunidade cujos
interesses são afins e de conhecimento geral da comunidade. No âmbito individual ocorre o contrário;
a esfera privada se descola da comunidade geral para a convivência particular em determinados setores
como no seio da família, com os amigos, no trabalho.

Sabe-se que a privacidade relaciona-se e interconecta-se com os direitos de personalidade. E ainda,


vincula-se ao direito de não sofrer interferências arbitrárias ou ilegais à tranquilidade, no ambiente
familiar, no reduto do lar ou na esfera íntima da correspondência, inclusive pelo Estado.

Veja que o exercício desse direito é fundamental para a execução de outros direitos fundamentais
como a liberdade de expressão e opinião, a liberdade de ir e vir, a liberdade de associação e reunião
entre outros.

Nesse sentido, consiste a privacidade, reitere-se, no direito de estar só consigo mesmo, ou seja, no
direito de o indivíduo de poder excluir do conhecimento de terceiros o que a ele se refere ou o seu modo
ou estilo de ser.

Além do artigo 12 da Declaração Universal que já foi mencionado, outros documentos internacionais
que versam sobre Direitos Humanos trataram do direito à privacidade em diversas passagens. Veja no
quadro a seguir:

Quadro 10 – Direito à privacidade em documentos internacionais

Pacto Internacional dos Direitos Proíbe ingerências arbitrárias ou ilegais na vida privada, na família, no domicílio ou
Civis e Políticos (art. 17) correspondência, além de ofensas à honra e reputação.
Convenção Americana de Proíbe ingerências arbitrárias ou abusivas na vida privada, na família, no domicílio ou
Direitos Humanos (art. 11) na correspondência, nem ofensas ilegais à honra ou à reputação.

Convenção Europeia para a Proíbe a ingerência na esfera privada, entretanto reconhece que a privacidade pode
Proteção de Direitos do Homem sofre limitação se esta ingerência tiver previsão em lei ou se for necessária para
e das Liberdades Fundamentais segurança nacional, segurança pública, para o bem-estar econômico do país, defesa
de 1950 (art. 8º) da ordem e a prevenção de infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou da
proteção de direitos e liberdades de terceiros (UE).

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A Carta de Direitos
Fundamentais da União Respeito pela vida privada e familiar, domicílio e comunicações. Proteção de dados
Europeia de 2009 (art. 7º e 8º) pessoais (PARLAMENTO EUROPEU).

Recomendação n. 509 da 19ª


Sessão Ordinária da Assembleia Preocupação sobre a proteção da vida privada em relação aos dispositivos eletrônicos
Consultiva do Conselho da modernos e os perigos da interceptação e captação de escuta telefônica clandestina.
Europa (1967) - Estocolmo

Recordemos o ocorrido com a Cambridge Analytica, com a utilização de um aplicativo que


possibilitou coletar informações privadas de mais de 50 milhões de pessoas sem o consentimento
delas (G1). O caso teve repercussão internacional e abalou a imagem do Facebook.

Outro caso de repercussão, diz respeito a uma atriz que teve seus arquivos pessoais digitais invadidos
na internet, e que culminou na edição da Lei 12.965/2014 sobre crimes informáticos.

Ou ainda, a grande repercussão que teve a espionagem revelada por Edward Snowden, ex-funcionário
da CIA que foi acusado de espionagem por vazar informações sigilosas de segurança dos Estados Unidos
revelando detalhes de programas de vigilância do país (G1).

São alguns dos diversos casos de invasão de privacidade em tempos de era digital.

Você sabia que na 34ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas foi aprovada, por
consenso, uma resolução sobre o direito à privacidade digital?

Pois bem, o Brasil, em iniciativa com a Alemanha e em conjunto com a Áustria, México, Suíça,
Leichtenstein e Noruega, adotaram uma Resolução que cria o Direito à Privacidade Digital.

Este documento incita os países a respeitar e proteger o direito à privacidade, com vistas a eliminar
as violações à privacidade e prover medidas efetivas de reparação.

Saiba mais

A versão oficial deste documento poder ser encontrada no site oficial


do Ministério das Relações Exteriores.

Criação da Relatoria Especial sobre “O Direito à Privacidade na


Era Digital”. Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-
a-imprensa/8460-criacao-da-relatoria-especial-sobre-o-direito-a-
privacidade-na-era-digital. Acesso em: 22 jan. 2020.

Veja que os mesmos direitos que as pessoas têm off-line devem ser também protegidos na modalidade
on-line, incluindo o direito à privacidade.

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A preocupação desses países é sobre o impacto negativo que a vigilância e/ou a interceptação
de comunicações, inclusive fora do Estado nacional, assim como a coleta de dados pessoais, quando
conduzida em larga escala, podem ter sobre o gozo e exercício dos Direitos Humanos.

No Brasil, o Marco Civil da Internet (Lei n.12.965/2014) vem alinhado com a tendência internacional
de proteção à liberdade e à privacidade. O Marco Regulatório Civil da Internet evidencia esta proteção
no art. 7º, VII, ao determinar que é vedado “o fornecimento a terceiros de seus dados pessoais.

Vale ressaltar ainda a Lei n. 13.709/2018, conhecida como Lei de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)
que entrará em vigor em 2020, regulamentou o tratamento de dados pessoais de clientes e usuários por
parte de empresas públicas e privadas.

A Lei Brasileira, na esteira da Lei Europeia (GDPR), induz as empresas (públicas e privadas) a adotarem
uma política interna de compliance digital com relação ao tratamento dos dados de seus clientes.

Para finalizar este tópico, vale destacar que, conforme já estudamos, o direito à privacidade traz
restrições. Nesse sentido, desenvolveu-se uma teoria: direito ao esquecimento - segundo a qual
questiona-se se, com o decorrer do tempo, determinadas informações ainda apresentam interesse
público. E ainda, se, este argumento (de que não há mais interesse público) se compatibiliza com o
direito à privacidade.

De acordo com André de Carvalho Ramos, o direito ao esquecimento é tema relevante na atualidade,
senão vejamos:

O direito ao esquecimento, então, é um importante tema em um mundo no


qual a informação (inclusive pessoal) tem valor econômico (para fornecedores,
empregadores, meios de comunicação etc.), fazendo com que haja o choque
entre o direito à privacidade e a autodeterminação informativa de um lado,
e o direito de informação de outro, em um contexto diferente do que foi
visto acima (no qual a jurisprudência, nacional e internacional, inclina-se
a reconhecer a prevalência do direito à informação no caso de fatos de
interesse público), que é a passagem do tempo (RAMOS, 2017, p. 640).

Caso interessante, ocorreu no plano internacional, na Corte Europeia, com relação aos dados
pessoais de Costeja González envolvendo a proteção de dados pessoais e a livre circulação desses
dados. Em 1998, González teve um imóvel leiloado em hasta pública em razão de uma dívida com
o Ministério do Trabalho e dos Assuntos Sociais espanhol. O caso foi encerrado, mas as informações
constantes no site do Google, sobre a situação de devedor da seguridade social espanhola, permaneciam
neste site toda vez que alguém digitasse o nome Mario Costeja Gonzáles.

A decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (2014) julgou o caso na prevalência do direito à
privacidade, com base nos arts. 7º da Carta de Direitos Fundamentais da Europa e 8º que dispõe sobre
o direito de proteção aos dados pessoais, em detrimento da livre iniciativa do Google e eventual direito

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à informação de terceiros, entendendo haver ali, no caso, ausência de interesses de terceiros (RAMOS,
2017, p. 641).

Veja que as novas ferramentas digitais têm o condão de perpetuar as informações inseridas na
internet, acessíveis a todos e armazenadas em banco de dados.

Fato é que, na era tecnológica experimentamos situações que, por certo, demandam
regulação jurídica.

O atual Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia dispõe expressamente
no art. 17, o direito de ser esquecido, ou seja, a possibilidade do titular do direito de obter do
responsável pelo tratamento de dados, o apagamento de seus dados pessoais de acordo com os
motivos elencados na lei.

5.5 Liberdade de expressão e liberdade dos meios de informação

Vimos que os Direitos Humanos recepcionados na Declaração Universal constituem-se como núcleo
básico de todas os documentos jurídicos que versam sobre Direitos Humanos no plano internacional.

Estudamos que os Tratados ratificados pelos países e que versam sobre os Direitos Humanos vinculam
as normas internas dos Estados, notadamente, na edificação dos direitos fundamentais.

Pois bem, nesta esteira estudaremos agora a liberdade de expressão e de informação.

O que se entende por liberdade de expressão?

A liberdade de expressão se define pela livre manifestação de ideias e opiniões. Inclui-se na liberdade
de expressão a liberdade de informação, por meio da comunicação ou de qualquer manifestação de
expressividade artística, intelectual ou científica.

No âmbito internacional, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos dispõe no art. 19 que:
“Ninguém poderá ser molestado por suas opiniões” e que toda pessoa terá direito à liberdade de expressão
incluído o direito de procurar, de receber e de difundir informações e ideias de qualquer natureza.

Veja que a liberdade de expressão tem previsão na Constituição Brasileira de 1988 no art. 5º, IV
e possui relação com outras liberdades tais como: a liberdade religiosa (art. 5º, VI, CF), a liberdade
intelectual, artística ou científica e a liberdade de comunicação (art. 5º, IX, CF), sob qualquer forma ou
vínculo (art. 220, caput, CF).

A Declaração Universal de Direitos Humanos prevê, nos arts. 18 e 19, a liberdade de pensamento e
de consciência. Dessa forma, promove-se a proteção do direito de ter convicções próprias, bem como
o direito de receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de
fronteiras (ONU).

97
Unidade II

Note-se que, é por meio da expressividade e da manifestação de ideias e convicções que o indivíduo
potencializa suas capacidades e aptidões, já que, afinal, são esses atributos que lhe conferem autonomia
e autodeterminação. O direito à expressão e à informação emancipam o sujeito para o exercício de
outros direitos.

Entretanto, ao ler os dispositivos da Constituição, você vai verificar que a liberdade de expressão
encontra limitações explícitas na Carta Magna. Façamos uma análise do art. 5º, IV, que dispõe: é
assegurada a livre manifestação, vedado o anonimato”.

Qual é a razão desta restrição?

Vejamos: a informação pode ser veiculada em vários formatos: em jornal, em livro ou mesmo pela
internet, por exemplo. Pergunta-se: uma informação, que não corresponde à verdade, poderia causar
graves danos à moral e ao patrimônio material da pessoa a qual a informação se refere? Nos parece
que sim.

Por outro lado, temos o anonimato e a sua proibição por algumas constituições, inclusive a brasileira.
Pois bem, a proibição do anonimato tem por finalidade garantir um outro direito fundamental: o direito
de resposta proporcional ao agravo.

Note-se que, embora haja proteção à liberdade de expressão, aquele que emitiu a mensagem
deverá se identificar para que possa haver o direito de resposta à mensagem emitida, conforme
dispõe o art. 5º, V, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).

Nesse mesmo sentido, a Lei n.13.188/2015 tratou de disciplinar o exercício de direito de resposta.
Entretanto, a Lei foi além e disciplinou também o direito de retificação do ofendido em matéria divulgada,
publicada ou transmitida por veículo de comunicação social (art. 1º).

Portanto, a liberdade de expressão abriga o direito da livre manifestação, mas impõe limites, conforme
vimos. Assim como há o direito à informação, também existe o direito de resposta, e, ainda, o direito
de retificação.

O Pacto de San José da Costa Rica dispõe sobre o direito de retificação ou de resposta no art. 14.
Neste caso, exercerá o seu direito em razão de informações inexatas ou ofensivas.

Situação interessante é quando existe a informação, mas não se tem acesso a ela.

Bem, nesse caso, restaria prejudicado o direito à informação, correto? De fato, como vimos, tanto a
nossa Constituição de 1988 quanto os documentos internacionais sobre Direitos Humanos garantem o
direito de acesso à informação.

98
DIREITOS HUMANOS

Exemplo de aplicação

Imaginemos a seguinte situação: um indivíduo faz uma busca na internet, acessa um site de um
órgão público que contém informações que lhe dizem respeito. No site, consta a informação desejada;
entretanto, ao tentar consegui-la, o órgão lhe impõe exigências que dificultam o exercício de seu direito
ou, não lhe são respondidos os pedidos de acesso apresentados.

Na sua opinião houve desrespeito ao direito de acesso à informação?

Para que o acesso à informação se concretize pressupõe-se que haja a promoção desse direito; nesse
sentido, a publicidade e os procedimentos de viabilidade de acesso à informação são imprescindíveis,
além da divulgação ampla, imediata e eficiente.

Veja que o acesso à informação é um desmembramento do direito à informação.

A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, por meio do Decreto n. 5.687/2006, dispõe a
respeito do acesso à informação ao estabelecer no art. 10 sobre a informação pública, no combate
à corrupção (BRASIL, 2006).

Saiba que, os documentos internacionais que versam sobre Direitos Humanos, além de promoverem
o respeito e a promoção deles, buscam, no caso do direito à informação, proteger a liberdade de busca,
de recebimento, de publicação e de difusão da informação relativa à corrupção.

Como já afirmamos, o acesso à informação foi alçado a direito fundamental em nossa Constituição
(art. 5º, XIV, CF). Nesse sentido, a Constituição promoveu a vedação de censura, conforme estabelece
o art. 220, § 2º, cuja disposição proíbe expressamente qualquer tipo de censura, política, artística ou
ideológica (BRASIL, 1988).

Este artigo, em seu parágrafo 1º, determina que nenhuma lei poderá conter dispositivo que
possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social.

À vista disso, o Supremo Tribunal Federal, em 2009, declarou que a Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67)
é incompatível com a ordem constitucional.

Observação

A Lei de Imprensa foi editada no período de exceção institucional,


e, portanto, segundo o STF, não se harmoniza com a ordem
constitucional brasileira.

99
Unidade II

A ONU, por sua vez, destacou o acesso à informação como um direito fundamental, tanto que, para
que os cidadãos compreendam as obrigações dos Estados sobre o fornecimento de dados, o Programa
das Nações Unidas para o desenvolvimento (PNUD) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência
da República junto com a Controladoria Geral a União promoveram, em 2013, o Fórum Mundial de
Direitos Humanos, em Brasília (BRASIL, 2013).

Neste Fórum, discutiu-se sobre o direito à informação como um direito correlato ao direito de
expressão e autonomia, no sentido de promover o livre intercâmbio de ideias, para auxílio na tomada
de decisões. O PNUD reiterou que o livre fluxo de informações tem previsão internacional, conforme os
arts. 10 e 19 da Declaração Universal (1948).

Note-se, portanto, que os países que ratificam os Tratados Internacionais sobre o direito à informação
têm a obrigação de implementar na ordem interna, legislação pertinente versando sobre esse direito,
pois, como estudamos, trata-se de um direito humano, e, portanto, deve constar nas Constituições dos
países. Assim ocorreu com a Constituição Brasileira de 1988 e com as anteriores a esta, senão vejamos:

• Constituição de 1891: proíbe o anonimato da palavra escrita ou falada.

• Constituição de 1934: dispôs sobre o direito de resposta.

• Constituição de 1937: dispôs sobre o direito de manifestação de pensamento (oral ou escrito,


impresso ou por imagens) mediante os limites previstos em lei.

• Constituição de 1946: há previsão sobre o direito de expressão.

• Constituição de 1967: dispôs sobre a liberdade de expressão, de manifestação política ou filosófica,


a prestação de informação em sujeição à censura, salvo no caso de abusos em espetáculos e
diversões públicas, que serão punidos pela lei.

Você sabia que no Brasil existe uma lei que regula o acesso à informação?

Pois bem, a Lei Brasileira n.12.527/2011 (BRASIL, 2011) dispõe sobre o acesso à informação.

Veja que cabe aos órgãos e entidades do Poder Público, observadas as normas e procedimentos
específicos aplicáveis, assegurar:

• A gestão transparente a informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação.

• A proteção da informação, garantindo-se sua disponibilidade, autenticidade e integridade.

• A proteção da informação sigilosa e da informação pessoal, observada a sua disponibilidade,


autenticidade, integridade e eventual restrição de acesso.

100
DIREITOS HUMANOS

Por esta Lei, todos os cidadãos poderão acessar as informações públicas que se encontram sob a
tutela do Estado. A Lei recepciona a transparência e a publicidade das informações, e também permite
o sigilo, mas apenas em situações em que a publicidade das informações possa causar risco a segurança
do Estado ou da população, ou no caso de defesa do território nacional.

6 A PERSPECTIVA SOCIAL DOS DIREITOS HUMANOS

6.1 Direito à educação

A educação é a ponte segura para o exercício da cidadania. Sem educação não há que se falar em
Direitos Humanos. Tanto é assim que a universalização da educação é uma preocupação presente em
todos os países democráticos.

A Constituição Federal de 1988 instituiu a educação, no art. 205, como um direito de todos e dever
do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade com
vistas ao pleno desenvolvimento da pessoa, bem como ao seu preparo para o exercício da cidadania e a
qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).

A educação está entre os direitos sociais recepcionados na Constituição de 1988 (art. 6º), tendo sido
erigida a condição de direito fundamental. Portanto, cabe aos Estados promovê-la de forma a efetivar
sua universalização.

Desse modo, universalizar a educação significa viabilizar o direito de acesso á educação de qualidade
e com plenitude, a significar que é um direito de todos e para todos.

Quanto ao ensino, há tratamento constitucional que dispõe deva ser ministrado, segundo
determinados princípios (art. 206). Veja na figura a seguir as diretrizes principiológicas que
vinculam o ensino:

Liberdade de Liberdade de aprender,


pensamento, de ensinar, pesquisar
arte e de saber

Coexistência Igualdade de
de concepções acesso
públicas e privadas

Pluralismo de Permanência na
concepções escola
pedagógicas

Ensino Gratuidade
Pluralismo de do ensino em
ideias estabelecimentos
oficiais

Figura 12 – Princípios do Ensino (art. 206, CF)

101
Unidade II

Desde a promulgação da Constituição de 1988, 25% das receitas dos impostos e transferências dos
estados, Distrito Federal e municípios se encontram vinculados à educação, conforme o Fundeb.

A fim de efetivar os princípios do art. 205 da CF/88, a Emenda Constitucional n. 59 de 2009, deu
nova redação ao art. 208 da Constituição, quando promoveu substanciais modificações no tocante à
educação. Esta Emenda incluiu a obrigatoriedade do acesso à educação básica obrigatória e gratuita dos
4 aos 17 anos de idade, assegurando, inclusive, a sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria (art. 208, I).

Além disso, a Emenda instituiu o atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica,
por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência
à saúde (art. 208, VII) (BRASIL, 1988).

Além dessas alterações, a Emenda Constitucional n. 59 trouxe mais duas modificações: (i) a
distribuição de recursos públicos que deverá assegurar prioridade ao atendimento das necessidades do
ensino obrigatório, no que se refere a universalização, garantia do padrão de qualidade e equidade, nos
termos do Plano Nacional de Educação (art. 208, VII, § 3º), e (ii) o estabelecimento de meta e aplicação
de recursos públicos em educação como proporção do PIB (art. 214, VI).

É de notar que a Constituição de 1988 veio na pauta da Declaração Universal de 1948 dos Direitos
Humanos, tendo em vista que o Brasil se submete aos compromissos que versam sobre educação nos
Tratados e Convenções ratificados perante a ONU.

Dessa forma, O Estado Brasileiro obriga-se a efetivar a implementação das medidas necessárias para
a realização desse e de outros direitos.

Sabe-se que é por meio da instrução que se promove a compreensão, a tolerância e a amizade.
Desse modo, a instrução deve propiciar o pleno desenvolvimento da personalidade humana, bem como
o fortalecimento do respeito aos Direitos Humanos e as liberdades fundamentais.

Você sabia que diversos outros documentos internacionais, insuflados pelos propósitos
principiológicos da Declaração Universal de Direitos Humanos, dispuseram sobre o direito à educação,
de modo a viabilizar a sua universalidade?

É exatamente aqui nesta fase de nosso estudo que iremos analisar alguns desses documentos
vocacionados a promover e proteger o direito à educação:

• Carta das Nações Unidas: no art. 55, “b”, dispõe sobre a cooperação internacional, de caráter
cultural e educacional.

• Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: reconhece o direito à educação
em todos os níveis de escolaridade, a obrigatoriedade e gratuidade da educação primária, bem
como a participação de todo indivíduo na vida cultural e o desfrute do progresso científico.

102
DIREITOS HUMANOS

• A Convenção Americana de Direitos Humanos: dispõe sobre o desenvolvimento progressivo, impõe


aos Estados Partes o compromisso de adotarem providências, internamente e em cooperação
com outros países, a efetividade dos direitos que decorram de normas econômicas, sociais e que
versem sobre educação, ciência e cultura.

Todos esses documentos internacionais preveem que a implementação do direito à educação deverá
ocorrer de forma progressiva, com a proibição do retrocesso com relação às conquistas já alcançadas.

Além disso, a Agenda 2030 traz, como uma das metas, garantir a educação inclusiva e equitativa
de qualidade, bem como a promoção de oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos
e para todas.

Veja que alguns instrumentos internacionais da Unesco, em matéria da educação, também têm
versado sobre a concretização desse direito humano. Assim ocorreu com o Fórum Mundial de Educação
de 2015. Este Fórum deu origem à Declaração de Incheon, cuja meta para 2030 é transformar vidas por
meio da educação, veja a meta:

“Assegurar educação inclusiva e equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem


ao longo da vida para todos” (UNESCO).

Lembrete

A Unesco trouxe também uma Recomendação sobre Aprendizagem


e Educação de Adultos (2015), segundo o compromisso assumido
pelos os países na Cúpula das Nações Unidas para o desenvolvimento
Sustentável (2015).

Por certo, devemos lembrar que é preciso haver o fomento para a educação em Direitos Humanos,
ou seja, o desenvolvimento de uma cultura para a promoção da cidadania e da tolerância entre os povos.

A falta de consciência e de educação colaboram para a piora dos índices de intolerância e de violações
aos Direitos Humanos. Dessa forma, se faz necessária a ampla divulgação, de maneira sistemática,
desses direitos.

A identificação de um parâmetro ético-cultural, a nortear as ações públicas e privadas, é condição


imprescindível para uma construção sólida na edificação dos Direitos Humanos.

À vista disso, a Unesco criou uma série de cadernos Por uma Cultura de Direitos Humanos que
apresentam informações e reflexões sobre Direitos Humanos (UNESCO), haja vista que no processo do
desenvolvimento humano, o elemento cultural viabiliza o ambiente propício a validar a convivência com
as diferenças.

103
Unidade II

Por fim, não podemos deixar de lembrar que a Constituição Federal de 1988 instituiu como diretrizes
básicas constitucionais a implementação de uma educação de qualidade com vistas à universalização
deste direito. Tanto que a Unesco em 2016 promoveu um debate sobre a utilização de tecnologias
móveis no processo da universalização da educação (UNESCO).

No Brasil, o Ministério da Educação regulamentou a Educação à Distância, com o Decreto n. 5.622/2005,


que normatizou o art. 80 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n. 9.394/96). Nesse Decreto, define-se
a EaD como modalidade educacional na qual está inserida a mediação didático-pedagógica nos processos
de ensino-aprendizagem. Para isso, são utilizadas ferramentas tecnológicas de informação e comunicação,
com estudantes e professores, para o desenvolvimento de atividades educativas em lugares e tempo
diversos (BRASIL, 1996).

6.2 Direito à saúde

O direito à saúde é o corolário do direito à vida, pois é por meio deste direito que outros poderão ser
exercitados. Nesse sentido, o direito à saúde insere um direito do cidadão e um dever do Estado.

A Declaração Universal Dos Direitos Humanos (1948) tratou da saúde no art. 25. Outros Tratados e
Convenções internacionais trataram da saúde como direito humano, com destaque para a Pacto dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no qual versa que os Estados Partes reconhecem o “direito de
toda pessoa desfrutar o mais elevado nível de saúde física e mental” (art. 12).

Dentre as medidas necessárias para assegurar o direito à saúde estão: a diminuição da mortalidade
infantil, a melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente e a prevenção e o
tratamento de doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais entre outras.

Vale acrescentar aqui o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos,
Protocolo de San Salvador, que no artigo 10 estabelece: “Toda pessoa tem direito à saúde, entendida
como o gozo do mais alto nível de bem-estar físico, mental e social”.

Este Protocolo obriga os Estados Partes a adotarem medidas que garantam o direito à saúde por
meio da assistência médica essencial ao alcance de todos, além da extensão dos benefícios a todos
aqueles que estiverem sob a jurisdição do Estado. Dispõe também sobre a total imunização contra as
principais doenças infecciosas, entre outras providências.

Veja que em diversos documentos internacionais reafirma-se o direito à saúde: a Convenção sobre
a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (art. 12), a Convenção sobre os
Direitos da Criança sobre a proteção de sua saúde física e mental (art. 25), a Convenção Internacional
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (art. 5º, “d”, IV) e a Declaração das Nações
Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (arts. 23 e 24). Todos eles incitam a participação ativa na
elaboração e na determinação dos programas de saúde e o direito de manter suas práticas de saúde, sem
prejuízo do acesso, sem discriminação, a todos os serviços sociais e de saúde.

104
DIREITOS HUMANOS

Uma iniciativa internacional muito importante para este nosso estudo, na promoção da saúde
em nível mundial, foi a criação da Organização Mundial da Saúde (OMS), cujo marco decisivo
institucionalizou o direito à saúde no panorama internacional. A OMS é uma agência especializada
das Nações Unidas que foi fundada em 7 de abril de 1948, e que tem por objetivo garantir a todos
os seres humanos o mais alto nível de saúde com relação ao bem-estar físico, mental e social (OMS).

Dentre as funções da OMS estão:

• Auxiliar os países no fortalecimento dos serviços de saúde.

• Fomentar trabalhos que promovam a erradicação de doenças.

• Estimular o avanço de grupos científicos no trato da saúde.

• Elaborar a classificação internacional de doenças.

• Fornecer informações sobre saúde em nível internacional.

• Promover a melhoria da nutrição, habitação, saneamento, recreação, condições econômicas e


de trabalho.

Veja a importância da OMS no cuidado da saúde global. A saúde é uma das metas da Agenda 2030,
ou seja, a meta n.3 que trata da saúde e do bem-estar da pessoa humana. A meta é assegurar uma
vida saudável e promover o bem-estar para todas e para todos, em qualquer idade. Nesse sentido, a
finalidade é acabar com as epidemias de Aids, tuberculose, malária e doenças tropicais negligenciadas,
além do combate à hepatite, às doenças transmitidas pela água, entre outras doenças transmissíveis,
até 2030 (AGENDA 2030).

Observação

O direito à saúde não compreende apenas a ausência de enfermidade


ou de doença, mas implica no bem-estar físico e mental.

Cabe aos países implementarem políticas sociais e econômicas com vistas a redução de doenças e
outros agravos, devendo fazê-lo por meio de campanhas educativas, medidas de saneamento, construção
de hospitais e ambulatórios de pronto atendimento, além do dever dos países em envidarem esforços
para o atendimento de qualidade.

Nesta trajetória, o Brasil, no art. 196 da Constituição de 1988, tratou da saúde como um direito
fundamental extensivo a todas as pessoas, mas também como dever do Estado, na medida em que as
ações e os serviços de saúde possuem relevância pública (art. 197, CF).

105
Unidade II

Note-se que a viabilização da saúde ocorre por meio de prestações positivas, ou seja, prestações que
visam a promoção da igualdade e do tratamento isonômico entre os cidadãos.

Por se tratar de um direito fundamental de todo cidadão e dever do Estado, a garantia da saúde deve
ser validada pelo Estado por meio de políticas públicas e iniciativas legislativas que o viabilizem.

No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) estabelece o acesso universal ao sistema público de saúde.
O gestor nacional do SUS é o Ministério da Saúde. É ele que normatiza, fiscaliza, monitora e avalia as
políticas e as ações públicas em articulação com o Conselho Nacional de Saúde.

Você sabia que além da saúde física, a saúde mental tem sido alvo de preocupação internacional?

Pois bem, o relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) destaca que os transtornos
mentais são responsáveis por mais de um terço do número total de incapacidades nas Américas. Neste
relatório, a OPAS pede aos países que aumentem os orçamentos relativos à saúde mental.

Geralmente, se identifica a saúde no âmbito individual, relacionada ao corpo isolado da esfera social,
mas devemos lembrar que a saúde também possui dimensão social, ou seja, a saúde social.

Países com problemas sérios de desnutrição, falta de saneamento, fome e pobreza padecem de um
problema de saúde social.

De todo modo, a importância dos organismos internacionais é que por meio deles são divulgados e
realizados programas e iniciativas que promovem a saúde e o bem-estar de todos.

6.2.1 Das políticas de saúde pública na CF/88

Conforme estudamos, a saúde por ser considerada um direito humano fundamental que está previsto
em diversos documentos internacionais, tem prioridade nas constituições dos países, notadamente, na
Constituição Brasileira de 1988.

Vimos que a saúde, como uma extensão do direito de cidadania, compreende todos aqueles fatores
que implicam numa boa qualidade de vida bem como a garantia de acesso a um bom sistema de saúde.

Quando estudamos o art. 197 da Carta Magna, vimos que a saúde tem relevância pública, e por
esta razão cabe ao Poder Público cuidar da regulamentação da saúde, bem como da fiscalização e do
controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros, podendo ser por pessoa
física ou jurídica de direito privado.

Já vimos que o Sistema Único de Saúde (SUS) estabelece o acesso universal e igualitário do direito
à saúde. Esse sistema permitiu o direcionamento das metas recepcionadas na Constituição Federal de
1988 por meio dos princípios e diretrizes estabelecidos na Lei n. 8.080/90 (BRASIL, 1990), conforme você
poderá verificar pela leitura dos princípios e diretrizes listados no quadro a seguir:

106
DIREITOS HUMANOS

Quadro 11 – Princípios e diretrizes da Lei n. 8.080/90

Universalização do direito à saúde e Garantia de todos, sem privilégios ou barreiras, liberdade de acesso, rede de
igualdade de tratamento serviços e tecnologia apropriada a cada nível

Assistência integral Ações articuladas e continuidade de serviços preventivos e curativos, individuais e


coletivos
Direito à informação e preservação
da autonomia das pessoas Defesa da integridade física e moral

Veja que a Constituição Federal autorizou a descentralização no tocante à prestação dos serviços de
saúde, por pessoa física ou jurídica de direito privado (art. 199, CF). Nesse sentido, a iniciativa privada
poderá participar das ações e políticas governamentais de forma a complementar o sistema único de
saúde no tocante à assistência à saúde.

Por fim, vale destacar que, embora seja permitido à livre iniciativa participar de forma complementar
na prestação de serviços de saúde, somente poderá fazê-lo segundo as diretrizes desse sistema e
mediante contrato ou convênio (art. 199, § 1º, CF).

6.3 Direito ao trabalho

O direito ao trabalho é parte da própria construção humana e, definitivamente, da edificação dos


Direitos Humanos. O reconhecimento internacional do direito ao trabalho remonta do século XX, após
a Segunda Grande Guerra, com alguns Tratados e Convenções que trouxeram medidas protetivas no
âmbito internacional.

Na modernidade, o trabalho deixa de ser algo menor ou de natureza inferior, como nos tempos
antigos, e ganha contornos de virtude pessoal, pois a atividade laboral é parte da própria sensação de
produtividade humana.

Apenas para esclarecimento, nos séculos V e IV, o trabalho escravo era algo natural da sociedade
da época; entretanto, a idade moderna condena qualquer tratamento degradante ou discriminatório,
notadamente a escravidão, pois tal prática viola os direitos mais essenciais e mais preciosos da pessoa
humana. A escravidão e a servidão são práticas abomináveis e incompreensíveis, consideradas crimes
contra a humanidade.

A Declaração de Direitos Humanos, no art. 23, assegura todas as prerrogativas que possuem
interlocução com o direito ao trabalho. Vejamos:

• Todos os seres humanos têm direito ao trabalho, à livre escolha de emprego.

• Todos os seres humanos têm direito a condições justas e favoráveis de trabalho.

• Todos os seres humanos têm direito a proteção contra o desemprego.

107
Unidade II

• Todos os seres humanos têm direito, sem qualquer distinção, a igual remuneração por igual trabalho.

• Todos os seres humanos que trabalhem têm direito a uma remuneração justa e satisfatória, que
lhes assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e
complementada, se necessário, por outros meios de proteção social.

• Todos os seres humanos têm direito de organizar sindicatos e neles ingressar para a proteção de
seus interesses.

Na condição protetiva do trabalho, a Declaração Universal (1948) dispõe que toda pessoa tem direito
à segurança em caso de desemprego (art. 25).

Veja que existe também uma preocupação internacional sobre o trabalho e as condições laborais;
por conta disso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência tripartite das Nações Unidas
(governo, empregadores e trabalhadores), fundada em 1919, aprovou em 1998 a Declaração dos Direitos
Fundamentais do Trabalho.

A OIT se estrutura em princípios, deveres e objetivos que estão previstos na Constituição de Weimar
(1919), na Declaração de Filadélfia de 1944 e na Declaração Sobre Princípios e Direitos Fundamentais
no Trabalho.

Saiba que os documentos internacionais que versam sobre o Direito do Trabalho universalizam
princípios voltados a conferir justiça social e dignidade à pessoa humana. A OIT tem por função melhorar
não apenas as condições de trabalho humano, mas a própria condição humana.

Veja, a seguir, os quatro princípios fundamentais que todos os membros da OIT se submetem (OIT):

• Liberdade sindical e negociação coletiva.

• Eliminação de todas as formas de trabalho forçado.

• Eliminação de todas as formas de discriminação de emprego ou ocupação.

• Abolição efetiva do trabalho infantil.

A par desses princípios, a OIT instituiu a condição do trabalho decente, a saber:

• a promoção de oportunidades para homens e mulheres com vistas à produtividade;

• a remuneração adequada;

• o trabalho a ser exercido em condições de liberdade; e

• a equidade e a segurança para a garantia de vida digna.


108
DIREITOS HUMANOS

Veja que a dignidade da pessoa humana é a pedra de toque do direito humano ao trabalho, daí a
condição de trabalho decente trazida pela OIT.

Em 2006, durante a XVI Reunião Regional Americana, em Brasília, o Brasil lançou oficialmente a
Agenda Nacional de Trabalho Decente (ANTD), cujas prioridades são:

• Gerar mais empregos, com igualdade de oportunidades e tratamento.

• Erradicar o trabalho escravo e eliminar o trabalho infantil.

• Fortalecer o diálogo social como instrumento de governabilidade democrática.

Interessante notar que, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966),
além dos direitos de liberdade e igualdade no âmbito laboral, dispõe que os Estados Partes deverão
implementar políticas públicas educacionais para preparar a pessoa para o mercado de trabalho
(arts. 6º e 7º).

A educação para o trabalho é parte da sustentabilidade do crescimento democrático. Tanto que a


Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável tem no objetivo n. 8, a busca pelo trabalho digno aliado
ao crescimento econômico. De fato, o crescimento da economia fomenta a atividade laborativa, que,
por sua vez, impulsiona o consumo que gera mais produtividade. É nesse círculo virtuoso que o trabalho
promove o crescimento econômico e a produtividade.

Ainda no âmbito de proteção dos Direitos Humanos, o Protocolo Adicional à Convenção Americana
sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais tratou da proteção do direito ao trabalho.

Este Protocolo dispõe que os Estados Partes se obrigam a garantir a plena efetividade para o exercício
do direito ao trabalho, notadamente com respeito à orientação vocacional e ao desenvolvimento de
projetos de treinamento técnico-profissional, particularmente destinados aos deficientes.

Além destas disposições, o Protocolo traz a previsão de condições de trabalho justas, equitativas e
satisfatórias, com vistas à segurança e higiene no trabalho, além da limitação de horas de trabalho, da
proibição de trabalho noturno ou em atividades insalubres ou perigosas para menores de 18 anos, do
direito ao repouso e ao lazer e dos direitos sindicais. O direito de greve e a previdência social também
foram recepcionados no Protocolo (arts. 8º e 9º respectivamente).

O trabalho é um direito contemplado entre os direitos sociais tendo em vista que insere valores de
natureza social. Perceba que os valores sociais do trabalho constam como fundamento da República na
Constituição Federal. Assim, a ideia de o direito ao trabalho ser reconhecido em nossa Constituição como
um valor, revela o postulado jurídico de que a livre escolha da atividade laboral é parte do exercício de
autonomia humana.

109
Unidade II

A autodeterminação, no exercício das escolhas humanas, demonstra a capacidade do ser humano


em discernir e promover suas opções e preferências na ordem das alternativas apresentadas, podendo
ser avaliadas e implementadas no âmbito da liberdade individual.

Note-se que a promoção do desenvolvimento sustentável envolve o crescimento econômico


jungido ao crescimento do emprego e de renda, além do crescimento em todas as áreas sociais. É nesse
sentido que a Constituição de 1988 traz os valores do trabalho humano ao lado da livre iniciativa como
fundamentos da Ordem Econômica (art. 170, CF).

Exemplo de aplicação

A proteção constitucional dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outras que visem
à melhoria de suas condições sociais, está contemplada no art. 7º da Constituição Federal.

Faça uma leitura deste artigo e verifique os vários direitos elencados na Constituição.

A título exemplificativo, listamos algumas hipóteses do art. 7º da Constituição de 1988 sobre as


normas de proteção de direitos relativas ao trabalho:

• Proteção contra dispensa arbitrária ou sem justa causa (I).

• Seguro-desemprego (II).

• Fundo de garantia por tempo de serviço (III).

• Salário mínimo (capaz de atender as necessidades básicas) (IV).

• Irredutibilidade de salário (VI).

• Décimo terceiro salário (VIII).

• Gozo de férias remuneradas (XVII).

• Licença à gestante (XVIII).

• Proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos


da lei (XX).

• Aposentadoria (XXIV).

• Proteção em face da automação (XXVII).

110
DIREITOS HUMANOS

• Proteção de diferença de salários (por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil) (XXX).

• Proibição de discriminação de salário ou critérios de admissão do trabalhador portador de


deficiência (XXXII).

A concepção universalista dos direitos sociais, instituída na Constituição de 1988, referenciou o


direito ao trabalho como a condição valorativa de produtividade individual e coletiva nos moldes dos
Tratados e Convenções internacionais dos quais o Brasil faz parte.

Resumo

Acabamos de fazer uma imersão a respeito das liberdades e dos direitos


subjetivos a fim de compreender que as liberdades públicas são asseguradas
não apenas nos Tratados e Convenções internacionais, mas também na
esfera das normas internas dos países, notadamente, em suas Constituições.

Tivemos a oportunidade de compreender as diferenças entre os direitos


de defesa e as garantias de forma que, a implementação de medidas
efetivadoras dos Direitos Humanos não prescindem de políticas públicas
promotoras desses direitos.

Para um melhor entendimento da matéria sobre liberdades e direitos


subjetivos, vimos que a privacidade detém um valor intrínseco com
forte imbricação com a dignidade da pessoa humana, haja vista a sua
essencialidade para o desenvolvimento da personalidade e para o desfrutar
de outros direitos.

Também estudamos que a liberdade religiosa fundamenta a liberdade


do indivíduo em crer ou não crer em algo, ou mesmo de abster-se de
inserir em sua vida qualquer conotação religiosa. Nesse sentido, vimos que
o Estado laico insere a não imposição de uma religião a um povo, não
adotando nenhum credo ou crença, e também não impondo nenhuma
religião oficial.

Quanto à liberdade de expressão, ao abrigar o direito da livre


manifestação, vimos que se impõe limites, pois da mesma forma que existe
o direito à informação e à livre expressão, existe também o direito de
resposta e do direito de retificação.

Nesse sentido, tivemos a oportunidade de estudar o Pacto de San José da


Costa Rica que dispõe sobre o direito de retificação ou de resposta no art. 14.

111
Unidade II

Tal é a relevância da liberdade de informação e de expressão que a ONU


afirma que o acesso à informação é um direito fundamental. A legislação
brasileira referendou esta afirmação. Para que os cidadãos compreendam
as obrigações dos Estados sobre o fornecimento de dados, o Programa das
Nações Unidas para o desenvolvimento (PNUD) e a Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República junto com a Controladoria Geral da
União promoveram, em 2013, o Fórum Mundial de Direitos Humanos, em
Brasília (BRASIL, 2013).

Sob uma perspectiva social de Direitos Humanos aprendemos que sem


educação não há que se falar em Direitos Humanos, pois o conhecimento,
ao propiciar o pleno desenvolvimento da personalidade humana, fortalece
o respeito aos Direitos Humanos e às liberdades fundamentais.

Nesse sentido, estudamos os documentos internacionais que versam


sobre esses direitos e os expedientes que promovem a educação inclusiva
e de qualidade.

No âmbito dos direitos sociais, incluímos em nossos estudos a saúde e


as políticas públicas de promoção de direitos. Também vimos as políticas
públicas de incentivo e de proteção ao trabalho. Neste entendimento,
verificamos que tanto a saúde quanto o trabalho permeiam a esfera de
evolução humana.

Na concepção universalista dos direitos sociais repousa a certeza de


que a história da humanidade demonstra que o ser humano é o titular dos
direitos a exigir a sua universalidade.

Por fim, encerra-se esta Unidade no entendimento de que esses direitos


são acionáveis tanto no âmbito individual quanto na esfera coletiva. Dessa
forma, as Constituições democráticas reconheceram que é de rigor que
esses direitos sejam considerados como vitais em sua essência.

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