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IX

Fronteiras
da Farmacologia
52
Farmacogenômica
Liewei Wang e Richard M. Weinshilboum

Introdução Variação nos Alvos dos Fármacos: Farmacodinâmica


Caso Farmacogenética-Farmacogenômica Baseada na Via
Fisiologia Reações Idiossincrásicas aos Fármacos
Variação Genômica e Farmacogenômica Farmacogenética-Farmacogenômica Moderna
Farmacologia Conclusão e Perspectivas Futuras
Variação nas Enzimas de Metabolismo dos Fármacos: Leituras Sugeridas
Farmacocinética

INTRODUÇÃO n Caso
Robert H, 66 anos, está retirando a neve com uma pá em uma
Os capítulos anteriores descreveram os fármacos no contexto de manhã de inverno, em Minnesota, quando escorrega e cai sobre
seus alvos moleculares e de seu metabolismo. Embora os agen-
uma placa de gelo. Imediatamente, ele sente dor no quadril
tes farmacológicos modernos possam ser usados com sucesso
para tratar ou controlar doenças que variam da hipertensão à esquerdo e não consegue ficar de pé. É levado ao hospital, onde
infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), exis- as radiografias mostram uma fratura do quadril. No dia seguin-
tem grandes variações individuais em resposta à farmacotera- te, é realizada cirurgia e ele é transferido para um hospital de
pia. Essas variações vão desde reações adversas que podem reabilitação 3 dias depois. Menos de 24 horas após a admissão
colocar a vida em perigo até a ausência de eficácia terapêuti- do Sr. H no hospital de reabilitação, tem início uma súbita dor
ca, que é igualmente grave. Muitos fatores podem influenciar torácica pleurítica. Ele é levado ao pronto-socorro, onde uma
o fenótipo de resposta ao fármaco, inclusive a idade, o sexo TC com contraste intravenoso mostra um êmbolo pulmonar. É
e a doença subjacente, mas a variação genética também tem administrada heparina e iniciado o uso do anticoagulante varfa-
um papel importante. As diferenças genéticas individuais que rina em uma dose inicial de 5 mg/dia, tendo como meta uma
codificam os alvos dos fármacos, seus transportadores ou as razão normalizada internacional (RNI) de 2,0-3,0. O Sr. H retorna
enzimas que catalisam seu metabolismo podem afetar profun- ao hospital de reabilitação e é encaminhado ao médico local. A
damente o sucesso ou o fracasso da farmacoterapia. nova medida da RNI mostra um valor de 6,2, que está associado
A farmacogenética é o estudo do papel da herança na varia- ao aumento do risco de hemorragia. Ele não está usando outro
ção da resposta aos fármacos. A convergência dos recentes medicamento que pudesse interferir com os níveis plasmáticos
avanços na ciência da genômica e os progressos igualmente de varfarina. O médico recomenda que o Sr. H pare de tomar a
surpreendentes na farmacologia molecular resultaram na evo- varfarina durante 2 dias. Após várias tentativas de ajustar a dose
lução da farmacogenética para farmacogenômica — termos
de varfarina, o Sr. H chega, por fim, a uma RNI estável de 2,5
que muitas vezes são usados como sinônimos. A promessa da
com o uso diário de 1 mg de varfarina.
farmacogenética-farmacogenômica é a possibilidade de que o
conhecimento da seqüência de DNA de um paciente possa ser
usado para aprimorar a farmacoterapia, maximizando a eficácia QUESTÕES
do fármaco mediante seu uso apenas naqueles pacientes mais
propensos a serem beneficiados e, ao mesmo tempo, reduzin- n 1. Que outras informações laboratoriais poderiam ajudar na
do a incidência de reações adversas. Esse capítulo descreve administração de anticoagulante a esse paciente?
os princípios da farmacogenética e da farmacogenômica além n 2. Essas informações teriam ajudado na escolha da dose inicial
dos desenvolvimentos recentes nessa disciplina. São citados de varfarina para o Sr. H?
exemplos em que o conhecimento da farmacogenética-farma- n 3. Que mecanismos moleculares poderiam ser responsáveis
cogenômica pode ajudar a individualizar a farmacoterapia. pela aparente sensibilidade desse paciente à varfarina?
852 | Capítulo Cinqüenta e Dois

variação farmacogenética na resposta aos medicamentos. As


FISIOLOGIA enzimas associadas ao metabolismo dos fármacos são anali-
sadas no Cap. 4. Existem duas amplas categorias de enzimas
Três tipos de variação genética individual podem influenciar a associadas ao metabolismo dos fármacos: catalisadoras das
farmacoterapia: variação nas proteínas relacionadas ao metabolismo reações da fase I (reações de funcionalização que costumam
ou transporte do fármaco (variação farmacocinética); variação nos incluir oxidação ou redução) e catalisadoras das reações da fase
alvos ou vias associadas àqueles alvos (variação farmacodinâmica) II (em geral, reações de conjugação que acrescentam grupos,
e variação genética associada aos efeitos idiossincrásicos. como o ácido glucurônico, que aumentam a solubilidade e,
portanto, a excreção do fármaco). As reações das fases I e II
não ocorrem necessariamente nessa ordem, e os intermediários
VARIAÇÃO GENÔMICA E FARMACOGENÔMICA metabólicos resultantes de ambos os tipos de reações podem ser
O genoma humano contém cerca de três bilhões de nucleotídios. farmacologicamente ativos. Na verdade, alguns medicamentos
As estimativas atuais são de que o genoma contém entre 25.000 são administrados como pró-farmacos inativos que devem pas-
e 40.000 genes que, através da edição alternativa (alternative sar pelo metabolismo da fase I e/ou fase II antes que possam
splicing) e modificação pós-tradução, podem codificar 100.000 exercer seu efeito farmacológico.
proteínas ou mais. Duas pessoas quaisquer diferem, em média, Os polimorfismos genéticos são comuns em enzimas que
em cerca de um nucleotídio em cada 1.000 do seu genoma, catalisam o metabolismo dos fármacos, e foram encontrados
totalizando uma diferença média entre indivíduos de 3 milhões polimorfismos clinicamente significantes em quase todas
de pares de bases em todo o genoma. A maioria dessas diferen- as principais enzimas associadas às reações das fases I e II
(Quadro 52.1). Dois exemplos “clássicos” são as variações
ças é chamada de polimorfismos de nucleotídio único ou SNP
hereditárias na hidrólise enzimática da succinilcolina, um
(pronunciado como “snip”), nos quais um nucleotídio é trocado
relaxante muscular de ação curta, pela enzima butirilcolines-
por outro em determinada posição. Os SNP e outras diferen-
terase (BChE) e na acetilação enzimática de fármacos como
ças na seqüência de DNA podem ocorrer em qualquer parte do
a isoniazida, usada no tratamento da tuberculose (ver Cap.
genoma, tanto nas regiões codificadoras quanto não-codificado-
33). Os pacientes que têm variações na BChE apresentam
ras. Se um SNP troca o aminoácido codificado, é chamado de
diminuição da taxa de metabolismo da acetilcolina e seus
SNP codificador não-sinônimo (cSNP). As outras diferenças na
análogos, resultando em paralisia prolongada após exposi-
seqüência de DNA incluem inserções, deleções, duplicações e
ção ao fármaco. Uma enzima geneticamente polimórfica da
reorganizações, às vezes de apenas um ou alguns nucleotídios,
fase II, N-acetiltransferase 2 (NAT2), catalisa a acetilação da
mas outras vezes de genes inteiros ou de segmentos maiores de isoniazida. Os pacientes tratados com isoniazida podem ser
DNA que incluem muitos genes. As diferenças funcionalmente classificados como “acetiladores lentos”, que metabolizam a
significantes da seqüência de DNA tendem a ocorrer nos genes, isoniazida devagar e têm altos níveis sangüíneos do fármaco,
seja em suas seqüências codificadoras ou nos promotores, facili- ou “acetiladores rápidos”, cujo metabolismo da isoniazida é
tadores (enhancers), locais de edição ou outras seqüências que rápido e têm baixos níveis sangüíneos do fármaco. Estudos
controlam a transcrição do gene ou a estabilidade do RNAm. familiares demonstraram que a velocidade de biotransforma-
Juntas, essas diferenças formam a individualidade genética de ção da isoniazida é hereditária. O fenótipo de acetilador lento
cada pessoa. Parte dessa individualidade afeta o modo como cada está associado à toxicidade causada pelo acúmulo excessivo;
uma responderá à farmacoterapia. os exemplos incluem lúpus induzido pela hidralazina e pro-
cainamida e neurotoxicidade induzida pela isoniazida. Embo-
ra hoje a hidralazina, que é um anti-hipertensivo, raramente
FARMACOLOGIA seja usada no tratamento da hipertensão, esse fármaco res-
surgiu recentemente como um dos dois princípios ativos do
O conceito de que a herança genética pode ser um importante BiDil, um fármaco combinado aprovado para o tratamento de
determinante da variação individual na resposta ao fármaco pacientes com insuficiência cardíaca sintomática. É interes-
surgiu há meio século. Originou-se nas observações clíni- sante notar que a U.S. Food and Drug Administration (FDA)
cas de diferenças surpreendentes na resposta dos pacientes aprovou o BiDil apenas para uso em pacientes descendentes
a doses “padrões” de um fármaco. Essas observações, além de africanos, ao que tudo indica em razão de uma diferença
dos estudos com gêmeos e famílias que mostraram variações genética na resposta a esse fármaco associada à etnia.
hereditárias nas concentrações plasmáticas dos fármacos e em Os exemplos iniciais da farmacogenética, como aqueles
outros parâmetros farmacocinéticos, levaram ao nascimento da representados por BChE e NAT2, serviram como estímulo
farmacogenética. Muitos desses exemplos originais de variação para a busca de outros. A maioria dos exemplos da segunda
farmacogenética e muitos dos exemplos mais surpreendentes geração continua a ser associada à farmacocinética e ainda
ainda hoje estão associados à farmacocinética — fatores que é reconhecida por observações clínicas — muitas vezes por
influenciam a concentração do fármaco que alcança o(s) alvo(s). respostas adversas aos fármacos. Na maioria das vezes foram
No entanto, exemplos de variação farmacogenética no alvo do estudados pela administração de um “fármaco sonda” a um
fármaco, denominados fatores farmacodinâmicos, também são grupo de participantes seguida pela medida das concentrações
descritos com freqüência crescente. plasmáticas ou urinárias do fármaco e/ou metabólito, ou por
análise direta de uma enzima que metaboliza o fármaco em
um tecido de fácil acesso como a hemácia (por ex., uma série
VARIAÇÃO NAS ENZIMAS DE METABOLISMO DOS de enzimas metiltransferase). Dois exemplos prototípicos que
FÁRMACOS: FARMACOCINÉTICA se tornaram “ícones” farmacogenéticos são os polimorfismos
genéticos do citocromo P450 2D6 (CYP2D6) e tiopurina S-
A variação hereditária nas enzimas que catalisam o metabo- metiltransferase (TPMT). Em vista das implicações clínicas
lismo dos fármacos é o fator mais comum responsável pela desses polimorfismos, a FDA, no “Guidance on Pharmacoge-
Farmacogenômica | 853

QUADRO 52.1 Exemplos de Polimorfismos Genéticos e Metabolismo dos Fármacos


ENZIMA FÁRMACO, CLASSE OU COMPOSTO AFETADO
Enzima da Fase I (Oxidação/Redução)
CYP1A2 Paracetamol, cafeína, propranolol
CYP1B1 Estrógenos
CYP2A6 Halotano, nicotina
CYP2B6 Ciclofosfamida
CYP2C8 Paclitaxel, ácido retinóico
CYP2C9 Antiinflamatórios não-esteróides, fenitoína, varfarina
CYP2C19 Omeprazol, fenitoína, propranolol
CYP2D6 Antidepressivos, antagonistas ␤-adrenérgicos, codeína, debrisoquina,
dextrometorfano
CYP2E1 Paracetamol, etanol
CYP3A5 Bloqueadores dos canais de cálcio, ciclosporina, dapsona, etoposídio,
lidocaína, lovastatina, macrolídios, midazolam, quinidina, esteróides,
tacrolimo, tamoxifeno
Enzima da Fase II (Conjugação)
N-Acetiltransferase 1 Sulfametoxazol
N-Acetiltransferase 2 Dapsona, hidralazina, isoniazida, procainamida, sulfonamidas
Sulfotransferase (SULT) Paracetamol, dopamina, epinefrina, estrógenos
Catecol-O-metiltransferase Catecolaminas, levodopa, metildopa
Histamina N-metiltransferase Histamina
Tiopurina S-metiltransferase Azatioprina, mercaptopurina, tioguanina
UDP-glucuronosiltransferases Andrógenos, ibuprofeno, irinotecano, morfina, naproxeno

nomic Data”, publicado em 2003, citou o CYP2D6 e a TPMT na maioria das populações caucasianas, tem uma freqüência de
como exemplos de biomarcadores farmacogenômicos. 3% em espanhóis e de até 13% em etíopes. Essas diferenças
CYP2D6 é um membro da família do citocromo P450 (CYP) étnicas podem ter implicações médicas importantes, porque
de enzimas microssomais, metabolizadoras de fármacos na fase o CYP2D6 metaboliza muitos medicamentos prescritos com
I. CYP2D6 contribui para o metabolismo de um grande número freqüência, inclusive o bloqueador ␤-adrenérgico metopro-
de medicamentos, inclusive antidepressivos, antiarrítmicos e lol, o neuroléptico haloperidol, os opióides codeína e dex-
analgésicos. O polimorfismo do CYP2D6 foi descrito origi- trometorfano e os antidepressivos fluoxetina, imipramina e
nalmente por dois laboratórios diferentes que estudaram dois desipramina, entre muitos outros (Quadro 52.1). Portanto, os
tipos diferentes de sondas, o anti-hipertensivo debrisoquina e metabolizadores fracos do CYP2D6 podem sofrer um efeito
o ocitócico esparteína. A distribuição de freqüência da razão adverso quando tratados com doses padronizadas de agentes
metabólica urinária de debrisoquina, a razão entre o fármaco como o metoprolol, que são inativados pelo CYP2D6, enquanto
original e seu metabólito oxidado, é mostrada na Fig. 52.1A a codeína é relativamente ineficaz em metabolizadores fracos
em uma população do norte da Europa. Na extremidade direita porque depende do metabolismo, catalisado por CYP2D6, para
da figura é mostrado um grupo de “metabolizadores fracos” formar a morfina, um opióide mais potente. Por outro lado, os
da debrisoquina, indivíduos homozigotos para alelos (genes) metabolizadores ultra-rápidos podem exigir doses incomumen-
recessivos que codificam enzimas com atividade reduzida; no te altas de fármacos inativados pelo CYP2D6, mas essas mes-
meio da figura é mostrado o grande grupo de “metabolizado- mas pessoas podem ter uma “superdosagem” de codeína, com
res extensos”, indivíduos heterozigotos ou homozigotos para depressão respiratória ou mesmo parada respiratória em respos-
o alelo do “tipo selvagem”; e na extremidade esquerda há um ta às doses “padrões”. No passado, o genótipo de um indivíduo
pequeno grupo de “metabolizadores ultra-rápidos”, alguns dos para CYP2D6 e muitos outros genes que codificam as enzimas
quais têm múltiplas cópias do gene CYP2D6. que metabolizam o fármaco era inferido a partir do fenótipo,
Vários mecanismos genéticos moleculares são responsáveis por ex., a razão metabólica urinária que pode ser determinada
pela variação na atividade da enzima CYP2D6, inclusive cSNP por análise da excreção urinária de um metabólito específico
não-sinônimos, deleção de genes e duplicação de genes; alguns após a administração de um fármaco sonda (Fig. 52.1A). Como
metabolizadores ultra-rápidos podem ter até 13 cópias do gene. é exposto adiante, agora a determinação do genótipo depende
Estima-se que 5 a 10% dos caucasianos sejam metabolizado- cada vez mais de testes baseados em DNA realizados com dis-
res fracos do CYP2D6. Ao contrário, entre habitantes do leste positivos como o “chip” mostrado na Fig. 52.1B.
da Ásia a freqüência do fenótipo de metabolizador fraco é de A tiopurina S-metiltransferase (TPMT) é outro exemplo de
apenas 1 a 2%. O fenótipo do metabolizador ultra-rápido, raro um polimorfismo genético importante e clinicamente relevante
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A Farmacogenética de CYP2D6 TPMT*3A. O TPMT*3A é o principal responsável pela distri-


buição de freqüência trimodal do nível de atividade da TPMT
na hemácia mostrada na Fig. 52.2. O TPMT*3A tem dois cSNP
Metabolizadores Metabolizadores Metabolizadores
ultra-rápidos extensos fracos não-sinônimos, um no éxon 7 e outro no éxon 10 (Fig. 52.2).
120 A presença de TPMT*3A causa diminuição surpreendente dos
níveis teciduais da proteína TPMT. Os mecanismos responsá-
Número de indivíduos

veis pela diminuição observada do nível da proteína TPMT*3A


incluem degradação acelerada de TPMT*3A e agregação de
80
TPMT*3A intracelular, provavelmente causada por dobramen-
to anômalo da proteína. Conseqüentemente, fármacos como a
6-MP são mal metabolizados e podem alcançar níveis tóxicos.
40 Indivíduos homozigotos para TPMT*3A correm maior risco
de mielossupressão com risco de vida quando tratados com
doses padrões de fármacos tiopurina. Esses pacientes devem
ser tratados com uma dose cerca de 10 a 15 vezes menor do
0 que a dose convencional. Há surpreendentes diferenças étnicas
0,01 0,10 1 10 100
na freqüência de alelos variantes para TPMT. Por exemplo, o
Razão metabólica debrisoquina: 4-hidroxidebrisoquina TPMT*3A raramente é observado em populações do leste da
Ásia, enquanto que o TPMT*3C, que tem apenas o éxon 10
SNP, é o alelo variante mais comum nessas populações.
Em vista do seu significado clínico, a TPMT foi o primeiro
B Arranjo AmpliChip CYP450
exemplo selecionado pela FDA para audiências públicas sobre
a inclusão de informações farmacogenéticas nas bulas dos fár-
macos. Pelo mesmo motivo, o teste clínico para polimorfismos
genéticos da TPMT está disponível em grande escala. O fenô-
% de indivíduos por 0,5 unidade de atividade

298 adultos sem parentesco


TPMTH/TPMTH
10

TPMTL/TPMTH
5
Fig. 52.1 Farmacogenética do CYP2D6. A. Distribuição de freqüência da razão
metabólica da debrisoquina, cujo metabolismo é catalisado pelo citocromo TPMTL/TPMTL
P450 2D6 (CYP2D6) para formar seu metabólito 4-hidroxi. Os dados de 1.011
suecos são representados como a razão urinária dos metabólitos. A maioria
das pessoas metaboliza extensamente a debrisoquina, ao passo que alguns
têm metabolismo ultra-rápido e outros, fraco. B. O arranjo AmpliChip CYP450 0
pode ser usado para determinar genótipos variantes de genes do citocromo 0 5 10 15 20
P450 que influenciam o metabolismo do fármaco. Atividade da TPMT (unidades/mL hemácias)

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
TPMT*1
(tipo
para o metabolismo do fármaco. Esse exemplo também ser- selvagem) VNTR
viu como importante sistema de modelo farmacogenético. A
TPMT catalisa a S-metilação dos fármacos tiopurina, como TPMT*3A
a 6-mercaptopurina e a azatioprina (Cap. 37). Entre outras
indicações, esses agentes citotóxicos e imunossupressores são VNTR
G460A A719G
usados para tratar a leucemia linfoblástica aguda da infância Ala154Thr Tyr240Cys
e a doença intestinal inflamatória. Embora as tiopurinas sejam
Fig. 52.2 Farmacogenética da TPMT. A distribuição da freqüência da atividade
fármacos úteis, têm um índice terapêutico estreito, isto é, a da tiopurina S-metiltransferase (TPMT) nas hemácias de 298 caucasianos sem
diferença entre as doses tóxica e terapêutica é pequena, e alguns parentesco. TPMTL indica um alelo ou alelos para o traço de baixa atividade, ao
pacientes têm mielossupressão induzida por tiopurina que pode passo que TPMTH refere-se ao alelo do “tipo selvagem” (TPMT*1) para atividade
ser fatal. elevada. A distribuição de freqüência trimodal observada para atividade da
TPMT de hemácias é decorrente principalmente do efeito do TPMT*3A, o alelo
Em caucasianos, o alelo variante mais comum da TPMT variante mais comum para baixa atividade em uma população caucasiana.
é o TPMT*3A; a freqüência aproximada do gene é de 5%, TPMT*1 e TPMT*3A diferem em dois polimorfismos de nucleotídeo único (SNP)
e assim 1 em cada 300 indivíduos tem duas cópias do alelo não-sinônimos, um no éxon 7 e outro no éxon 10.
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meno de mudanças acentuadas no nível de uma proteína em O alelo ALOX5 mais comum contém cinco repetições e está
conseqüência da alteração de apenas um ou dois aminoácidos na presente em aproximadamente 77% dos genes ALOX5. Conse-
proteína foi observado repetidamente em muitos outros genes qüentemente, cerca de 94% da população tem pelo menos uma
de significado farmacogenético e é uma explicação comum para cópia do alelo com cinco repetições. As variantes de alelos mais
os efeitos funcionais de cSNP não-sinônimos. comuns contêm quatro e três repetições, e suas freqüências
Os polimorfismos genéticos da BChE, NAT2, CYP2D6 e aproximadas são de 17 e 4%, respectivamente. Em vista do
TPMT comportam-se como traços mendelianos monogênicos aumento da ligação de Sp1, as pessoas que têm o alelo com
(de um único gene), assim como muitos outros exemplos iniciais cinco repetições parecem expressar mais 5-lipoxigenase. É inte-
da farmacogenética. No entanto, agora a farmacogenética-far- ressante notar que parece não haver relação entre a presença ou
macogenômica ultrapassou as características farmacocinéticas ausência do alelo de cinco repetições e a gravidade da asma na
monogênicas, e o foco inclui cada vez mais a variação funcional população; isto é, este polimorfismo do promotor de ALOX5
e clinicamente significante em alvos do fármaco e também em não parece afetar o processo da doença propriamente dito. No
enzimas que o metabolizam. A variação também pode incluir entanto, em ensaios de um inibidor da 5-lipoxigenase relacio-
múltiplos genes que influenciam tanto a farmacocinética quanto nado à zileutona, só responderam ao fármaco os participantes
a farmacodinâmica. que tinham pelo menos uma cópia do alelo de cinco repetições.
O resultado sugere que é improvável que os compostos seme-
VARIAÇÃO NOS ALVOS DOS FÁRMACOS: lhante à zileutona sejam úteis para os 6% da população que não
têm o alelo com cinco repetições e que a identificação desse
FARMACODINÂMICA subgrupo permitiria o uso de outros medicamentos mais efi-
Os fármacos geralmente exercem seus efeitos interagindo com cazes. Esse exemplo também ilustra um princípio importante:
proteínas específicas do alvo. Portanto, variações genéticas nes- um polimorfismo não precisa causar doença para influenciar
sas proteínas do alvo, ou nas vias de sinalização subseqüentes o tratamento daquela doença.
às proteínas do alvo, podem influenciar o desfecho da farma- Um exemplo de variação genética em um alvo do fármaco
coterapia (Quadro 52.2). Além disso, a variação nos alvos do no DNA somático (tumor) inclui mutações com ganho de fun-
fármaco pode ser resultante de variação no DNA da linhagem ção no gene que codifica o receptor do fator de crescimen-
germinativa ou, no caso do câncer, de variação no DNA somáti- to epidérmico (EGFR) (também conhecido como HER1 ou
co presente no tumor. Um exemplo de variação genética do ErbB1) em pacientes com câncer pulmonar de não-pequenas
alvo de um fármaco no DNA da linhagem germinativa inclui células (CPNPC). Em 2004, dois grupos relataram que, em
uma classe de fármacos usados no tratamento da asma. Como pacientes com CPNPC, a resposta ao gefitinibe, um inibidor do
observado no Cap. 46, a zileutona, um antiasmático, diminui EGFR, era fortemente influenciada por essas mutações do DNA
a inflamação das vias aéreas mediante inibição da enzima 5- somático; isto é, indivíduos que tinham variação da seqüên-
lipoxigenase, uma enzima codificada pelo gene ALOX5. Varia- cia na parte do gene que codifica o sítio de ligação do ATP
ções na 5-lipoxigenase ilustram o ponto de que a variação em desse receptor da tirosina cinase apresentaram resposta mais
muitas áreas de um gene pode afetar a função das proteínas. favorável ao tratamento com gefitinibe do que os pacientes
O significado funcional dos cSNP não-sinônimos — e sua sem mutações. É freqüente a superexpressão do EGFR nesses
capacidade de alterar a quantidade de proteína expressa — foi tumores, e vários fármacos que têm esse receptor como alvo
destacado na seção anterior sobre farmacogenética da TPMT. foram testados clinicamente. Já se sabia que os pacientes com
Além disso, porém, os polimorfismos nas regiões reguladoras, CPNPC oriundos do leste da Ásia apresentavam resposta mais
como o promotor do gene, podem influenciar a transcrição e favorável ao tratamento com gefitinibe do que os pacientes
assim alterar a expressão das proteínas. O promotor do gene caucasianos, e um dos dois estudos originais constatou muta-
ALOX5 exibe variação no número de repetições seriadas da ções somáticas do EGFR em 15 dentre 58 tumores selecionados
seqüência GGGCGG. Essas seqüências repetidas ligam-se ao aleatoriamente em pacientes japoneses, mas em apenas 1 dentre
complexo do fator de transcrição Sp1, que supra-regula a trans- 61 nos Estados Unidos — ilustrando, mais uma vez, notáveis
crição de ALOX5. diferenças étnicas nos efeitos farmacogenéticos. O exemplo

QUADRO 52.2 Exemplos de Polimorfismos Genéticos e Alvos dos Fármacos


PROTEÍNA CLASSE DE FÁRMACO AFETADO (EXEMPLO)
5-Lipoxigenase Zileutona
Enzima de conversão da angiotensina (ECA) Inibidores da ECA (lisinopril)
Apolipoproteína E Estatinas (pravastatina)
Receptor ␤2-adrenérgico Agonistas ␤-adrenérgicos (albuterol)
Receptor do fator de crescimento epidérmico Gefitinibe
Receptor da sulfoniluréia Tolbutamida
Subunidade 1 do complexo da vitamina K epóxido redutase Varfarina
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do gefitinibe pode representar o futuro da oncologia, no qual na-S é três a cinco vezes mais potente do que a varfarina-R, e
se poderá considerar mutações/polimorfismos somáticos e da a varfarina-S é metabolizada predominantemente pela isoforma
linhagem germinativa antes de iniciar um programa terapêutico. do citocromo P450 CYP2C9. CYP2C9 é um gene altamente
Esse exemplo e o exemplo do ALOX5 também mostram que polimórfico, e os alelos variantes CYP2C9*2 (Arg144Cys) e
a variação farmacodinâmica-farmacogenética (isto é, variação CYP2C9*3 (Ile358Leu) estão associados a apenas 12 e 5%,
dos genes que codificam alvos do fármaco) pode ter a mesma respectivamente, do nível de atividade enzimática observado
importância, se não for mais importante, do que a variação com o alelo do tipo selvagem (CYP2C9*1). Os pacientes que
farmacocinética-farmacogenética representada pelo CYP2D6 têm esses alelos variantes necessitam de doses reduzidas de
e TPMT. O Quadro 52.2 lista vários polimorfismos em genes varfarina para obter um efeito anticoagulante, e esses mesmos
codificadores das proteínas-alvo do fármaco que foram asso- indivíduos correm maior risco de hemorragia durante o tra-
ciados à variação na resposta ao fármaco. tamento com varfarina. No entanto, essa variação farmacoci-
nética-farmacogenética não explica a maior parte da variação
na dose terapêutica da varfarina em pacientes que usam esse
FARMACOGENÉTICA-FARMACOGENÔMICA anticoagulante poderoso, mas que pode ser perigoso.
BASEADA NA VIA O alvo molecular da varfarina só foi identificado em 2004.
O gene que codifica esse alvo, a subunidade 1 do complexo
Todos os exemplos anteriores, CYP2D6, TPMT, ALOX5 e
da vitamina K epóxido redutase, VKORC1, também foi clo-
EGFR, estão associados à variação farmacogenética clinica-
nado naquele ano. Quando o gene VKORC1 foi seqüenciado
mente significante em razão da variação de seqüência em um
em diversos pacientes, embora não tenham sido encontrados
único gene; isto é, herança monogênica. A Fig. 52.3 ilustra
cSNP não-sinônimos, foi observada uma série de haplótipos
essa dicotomia farmacocinética-farmacodinâmica da farmaco-
(combinações de SNP em um único cromossomo) associados
genômica, usando os quatro exemplos principais citados neste
à dose de varfarina necessária. Em um estudo, pacientes com
capítulo. No entanto, também é possível que múltiplos genes
haplótipos de VKOCR1 que estavam associados à necessidade
codificadores de proteínas que influenciam tanto a farmacoci-
de baixa dose receberam uma dose de manutenção média de
nética quanto a farmacodinâmica modifiquem o fenótipo de
varfarina correspondente a cerca de metade daquela necessá-
resposta ao fármaco.
ria em indivíduos com haplótipos associados à necessidade de
Um bom exemplo é o anticoagulante varfarina. A varfarina
uma alta dose. Vários estudos subseqüentes confirmaram que
(ver Cap. 22) é um dos anticoagulantes orais mais prescritos na
o haplótipo VKOCR1 está associado a cerca de 25 a 30% da
América do Norte e na Europa. No entanto, apesar da existência
variação na dose de manutenção de varfarina, enquanto 5 a 15%
de um exame laboratorial de uso universal para acompanhar o
podem ser explicados pelo genótipo CYP2C9. Os papéis do
efeito da varfarina sobre a coagulação (RNI), reações adversas
CYP2C9 e do VKORC1 na farmacocinética e farmacodinâmica
graves — incluindo hemorragia e trombose indesejada — ainda
da varfarina são mostrados no esquema da Fig. 52.4. Como os
complicam o tratamento com varfarina. Essas complicações são
genes codificadores dessas duas proteínas contribuem para a
ilustradas pelo caso do Sr. H no início deste capítulo: após uma
variação da resposta ao fármaco, a genotipagem de CYP2C9 e
dose “padrão” de varfarina, a RNI aumentou para 6,2, um nível
a haplotipagem de VKORC1 poderiam ser úteis como estratégia
associado ao aumento do risco de hemorragia.
para determinar a dose inicial de varfarina para o Sr. H.
Por que isso poderia ter ocorrido? Em primeiro lugar, é pre-
A varfarina é um exemplo notável de uma situação em que
ciso lembrar que a varfarina é uma mistura racêmica. A varfari-
os dados farmacocinéticos-farmacogenéticos mostraram-se ina-
dequados para tradução clínica, porque esses dados explicaram
muito pouco sobre a variação na dose terapêutica. No entanto,
Farmacogenômica quando foram determinados os polimorfismos de CYP2C9 e os
haplótipos de VKORC1, tornou-se possível avaliar a variação
genética no metabolismo e no alvo do fármaco e ultrapassar a
farmacogenética monogênica representada por NAT2, CYP2D6
Exemplos de Exemplos de e TPMT. Portanto, a varfarina representa, provavelmente de
farmacocinética farmacodinâmica forma simplificada, o tipo de modelo farmacogenético-farma-
Metabolismo do fármaco Alvos do fármaco
cogenômico poligênico, baseado na via, que pode tornar-se
cada vez mais comum no futuro.
P450 2D6 TPMT ALOX5 EGFR
(DNA da linhagem (DNA da linhagem (DNA da linhagem (DNA do tumor)
germinativa) germinativa) germinativa)
REAÇÕES IDIOSSINCRÁSICAS AOS FÁRMACOS
Outro modo pelo qual a variação genética poderia influenciar
a farmacoterapia está relacionado às reações idiossincrási-
Ausência de Mielossupressão Ausência Resposta cas. Esses efeitos são diferentes dos outros exemplos descri-
resposta em resposta de resposta de regressão
da codeína à 6-MP do inibidor da tumoral
tos neste capítulo porque não são causados por diferenças no
5-lipoxigenase metabolismo ou nos alvos do fármaco. Ao contrário, os efeitos
idiossincrásicos parecem resultar de interações entre a medica-
Fig. 52.3 Farmacocinética e farmacodinâmica da farmacogenômica. A figura ção e um aspecto único da fisiologia do paciente. Um exemplo
mostra os principais exemplos farmacocinéticos (metabolismo do fármaco) e “clássico” que ilustra esse efeito menos previsível da variação
farmacodinâmicos (alvo do fármaco) descritos neste capítulo. São mostrados o genética individual é representado pelas reações idiossincrási-
gene afetado (em itálico), se há envolvimento do DNA da linhagem germinativa cas associadas à deficiência funcional da enzima glicose 6-
ou somático (por ex., tumor) e a resposta clínica observada na presença do(s)
alelo(s) variante(s). P450 2D6, gene do citocromo P450 2D6; TPMT, gene da fosfato desidrogenase (G6PD; ver Cap. 35). A enzima protege
tiopurina S-metiltransferase; ALOX5, gene da 5-lipoxigenase; EGFR, gene do as hemácias contra danos oxidativos. Diversos polimorfismos
receptor do fator de crescimento epidérmico; 6-MP, 6-mercaptopurina. causam esse distúrbio. O mais comum está relacionado a um
Farmacogenômica | 857

Precursores dos Fatores da codificadores de todas as enzimas metabolizadoras de fármacos


fatores da coagulação coagulação ativos e de transportadores que poderiam afetar a concentração final
O2
CO2 do fármaco no alvo — junto com as vias farmacodinâmicas,
que incluem o alvo do fármaco e as vias de sinalização após o
alvo, pode representar o futuro para esse aspecto da “medicina
individualizada”. Alcançar o objetivo da farmacoterapia real-
γ-Glutamil carboxilase mente personalizada e traduzir completamente o conhecimento
dependente de vitamina K
genômico para a prática clínica requer a aplicação clínica de tec-
nologias de genotipagem de alto desempenho. Muitas platafor-
mas para genotipagem foram criadas e aperfeiçoadas, e outras
Vitamina K reduzida Vitamina K epóxido
novas estão sendo desenvolvidas. O chip do gene CYP450,
mostrado como exemplo na Fig. 52.1B, já foi introduzido na
prática clínica. A aplicação de informações do genótipo para
Vitamina K epóxido selecionar pacientes responsivos, e depois tratar esses pacientes
redutase farmacologicamente com base no genótipo, requer um amplo
conhecimento das correlações entre genótipo e fenótipo.
No entanto, para que a farmacoterapia seja realmente indivi-
6-Hidroxivarfarina dualizada é preciso não apenas compreender a ciência da farma-
7-Hidroxivarfarina
cogenética e da farmacogenômica e desenvolver tecnologias de
S-Varfarina ponta para detectar e analisar os dados da seqüência de DNA,
mas também para traduzir o conhecimento para a clínica. Esse
Fig. 52.4 Farmacocinética e farmacodinâmica da varfarina. A vitamina processo de tradução exige a participação ativa da FDA e da
K é um cofator necessário para a ␥-carboxilação pós-tradução de resíduos indústria farmacêutica, que cria praticamente todos os novos
glutamato em alguns precursores do fator da coagulação (ver Cap. 22). A fármacos. Em 2003, a FDA publicou um Draft Guidance rela-
vitamina K é oxidada em epóxido inativo em conseqüência da reação de
carboxilação. A enzima vitamina K epóxido redutase (VKORC1) converte
tivo aos dados farmacogenômicos, e este projeto foi aprovado
o epóxido inativo na forma reduzida ativa da vitamina K. A varfarina atua em 2005. A FDA também iniciou uma série de audiências públi-
como anticoagulante inibindo a VKORC1 e assim impedindo a regeneração cas em relação à incorporação de dados farmacogenômicos às
da vitamina K reduzida. A S-varfarina é metabolizada em 6-hidroxivarfarina e bulas. Essas audiências começaram com os fármacos tiopurina
7-hidroxivarfarina pelo citocromo P450 2C9. e a TPMT e foram seguidas por audiências sobre o polimorfis-
mo genético no UGT1A1, um gene que codifica uma enzima
da fase II participante da biotransformação do antineoplásico
irinotecano. Recentemente, houve audiências públicas sobre
CYP2C9, VKORC1 e varfarina.
cSNP que causa substituição de um aminoácido, provocando a A atenção dada à farmacogenética-farmacogenômica pela
redução de 90 a 95% da função da enzima G6PD. Esse alelo, FDA vem causando impacto na indústria farmacêutica, sobre-
A–, está presente em 10 a 20% dos africanos e parece proteger tudo no contexto da infeliz sucessão de eventos que resultaram
contra a malária. Outro polimorfismo inativador de G6PD é na retirada do mercado do rofecoxib (Vioxx), um inibidor da
encontrado com menor freqüência em indivíduos oriundos da COX-2, por motivo de segurança. Não está claro se a farma-
região do Mediterrâneo, Oriente Médio, Índia e sudeste asiáti- cogenética teve um papel na doença cardiovascular induzida
co, e um terceiro polimorfismo também é encontrado no sudeste pelo Vioxx que levou à sua retirada do mercado. No entanto,
da Ásia. Vários medicamentos provocam estresse oxidativo nas é quase certo que a farmacogenética poderia contribuir para a
hemácias como efeito não relacionado aos alvos pretendidos supervisão pós-venda, não apenas para ajudar a evitar reações
ou à sua depuração metabólica. Esses fármacos incluem as adversas, mas também para ajudar fármacos de “resgate” que
sulfonamidas, os antimaláricos e os analgésicos paracetamol poderiam ser benéficos para grupos de pacientes selecionados
e ibuprofeno, entre outros. Os indivíduos com deficiência de com base na variação genética na resposta ao fármaco. A última
G6PD expostos a esses medicamentos podem apresentar ane- situação foi destacada recentemente quando se demonstrou que
mia hemolítica aguda e, às vezes, grave. um polimorfismo do ␤1-adrenoceptor influenciava a resposta
Por definição, é difícil ou impossível prever os efeitos ao bucindolol, um antagonista ␤1-adrenérgico — tanto in vitro
idiossincrásicos. No entanto, informações obtidas por pesqui- quanto em pacientes com insuficiência cardíaca. Inicialmente,
sas genômicas, proteômicas e metabolômicas podem ser úteis esse ␤-antagonista fracassou em um ensaio clínico que não
futuramente no desenvolvimento de ensaios farmacogenômicos incluía genotipagem, provavelmente porque apenas pacientes
de interações medicamentosas imprevistas. No momento, infe- com o genótipo do ␤1-adrenoceptor do tipo selvagem tiveram
lizmente, não é possível prever os efeitos idiossincrásicos. a resposta clínica desejada.

FARMACOGENÉTICA-FARMACOGENÔMICA n Conclusão e Perspectivas Futuras


MODERNA A farmacogenética e a farmacogenômica incluem o estudo das
formas como a variação da seqüência de genes afeta a res-
A conclusão do Projeto Genoma Humano e o aperfeiçoamento posta de pacientes individuais aos medicamentos. O objetivo da
permanente do projeto HapMap indicam o caminho para os farmacogenética e da farmacogenômica é maximizar a eficácia
desenvolvimentos futuros em farmacogenética e farmaco- e minimizar a toxicidade, com base no conhecimento da com-
genômica nessa era “pós-genômica”. A aplicação de técnicas posição genética individual. Embora muitos outros fatores além
modernas de ensaios genômicos, quando associada a um foco da herança influenciem diferenças na resposta dos pacientes
crescente nas vias farmacocinéticas — vias que incluem genes aos fármacos, os últimos 50 anos mostraram que a genética é
858 | Capítulo Cinqüenta e Dois

um fator importante responsável pela variação na ocorrência ma treatment. Nat Med 1999;22:168–171. (Estudo original que
de reações adversas ao fármaco ou na incapacidade de deter- mostrou as diferentes respostas farmacológicas em pessoas com
minados pacientes alcançarem a resposta terapêutica desejada. diferentes polimorfismos do gene ALOX5.)
A farmacogenética evoluiu durante esses 50 anos, partindo Evans WE, McLeod HL. Pharmacogenomics—drug disposition, drug
dos exemplos clássicos, como CYP2D6 e TPMT, para incluir
targets, and side effects. N Engl J Med 2003;348:538–549. (Revisão
situações mais complexas como as representadas pela farma-
cogenética da varfarina, associadas tanto à variação farmaco- que descreve a integração da genômica com a farmacogenética.)
cinética quanto farmacodinâmica. Essa área da ciência médica Rieder MJ, Reiner AP, Gage BF, et al. Effect of VKORC1 haplo-
genômica também apresenta desafios únicos em sua tradução types on transcriptional regulation and warfarin dose. N Engl J Med
para a clínica. No entanto, não pode mais haver dúvida de que 2005;352:2285–2293. (Descrição dos haplotipos de VKORC1,
a farmacogenética será aplicada à medicina clínica com ampli- genótipos de CYP2C9 e sua relação com a dose de varfarina.)
tude e profundidade crescentes e que, por fim, aumentará nossa Wang L, Weinshilboum R. Thiopurine S-methyltransferase pharma-
capacidade de individualizar a farmacoterapia. cogenetics: insights, challenges and future directions. Oncogene
2006;25:1629–1638. (Sumário dos avanços científicos de um tra-
n Leituras Sugeridas ço farmacogenômico “clássico”, com ênfase nos mecanismos que
Broder S, Venter JC. Sequencing the entire genomes of free-living ligam o genótipo ao fenótipo.)
organisms: the foundation of pharmacology in the new millen- Weinshilboum RM, Wang L. Pharmacogenetics and pharmacogeno-
nium. Ann Rev Pharmacol Toxicol 2000;40:97–132. (Sumário de mics: development, science and translation. Annu Rev Genomics
seqüenciamento de genoma e possíveis implicações da diversidade
Hum Genet 2006;7:223–245. (Revisão da variação farmacogenô-
genética para a farmacologia.)
Drazen JM, Yandava CN, Dube L, et al. Pharmacogenetic association mica, farmacodinâmica e farmacocinética, assim como os desafios
between ALOX5 promoter genotype and the response to anti-asth- na tradução desses dados científicos para a prática clínica.)

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