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CURSO DE DIREITO
ARACAJU
2021
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RESUMO
A constituição Federal de 1988 não instituiu em seu corpo a morte, o que hoje tem sido
motivo de uma vasta discussão acerca da possibilidade de realizar uma morte digna pois, de
um lado encontra-se o príncipio da autonomia, e do outro, o princípio fundamental da garantia
à vida. A divergência entre princípios em nosso ordenamento jurídico sempre foi debatida,
onde a aplicabilidade de um sobre o outro ou até mesmo a ponderação entre eles, ainda se faz
presente em questões do dia a dia, como no caso da eutanásia, distanásia e ortotanásia, esta
última a única permitida pelo ordenamento jurídico brasileiro. Neste sentido, este estudo
objetiva, de forma geral, ponderar sobre a morte digna e sua relação com o direito
fundamental à vida. Este estudo é uma revisão bibliográfica de caráter exploratório e de cunho
qualitativo, onde foram utilizados artigos indexados nas bases de dados do Google acadêmico
e Scielo, bem como de análises da Constituição brasileira, Resolução, Leis e Decretos.
Através deste trabalho, conclui-se que embora a vida esteja acima de todos os demais direitos,
existem situações que permitem a ponderação quanto a não haver necessidade de manter uma
vida em constante sofrimento.
1 INTRODUÇÃO
A morte digna pode ser definida como uma morte livre de dor e sofrimento, que
acontece no momento em que o paciente, titular de direitos, que se encontra em estado de
doença terminal, decide encerrar seu ciclo de vida. A decisão do paciente preserva seus
direitos de liberdade e consequentemente autonomia.
É de extrema importância que se respeite o direito de viver ou morrer do paciente em
estado terminal, uma vez que, somente o titular de direito é capaz de decidir sobre o que é
melhor para si, não devendo o Estado definir o futuro do titular. O fato é que a preservação da
vida apenas com o propósito da dimensão biológica negligenciando a qualidade de vida do
indivíduo não deve mais ser considerada atualmente.
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¹*Artigo apresentado à banca examidora do curso de Direito da Faculdade de Administração e Negócios de
Sergipe, em junho de 2021, como critério parcial e obrigatório para a obtenção do título de Bacharel em Direito.
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2 A MORTE DIGNA
a morte digna corresponde ao que o indivíduo, que se encontra em estágio terminal da doença,
compreende como digno para a sua própria vida (SOUSA, 2017).
Pouco se sabe sobre a morte; o fato é que ela é inevitável e seu acontecimento é visto
como algo terrível, pois está associada ao medo de morrer e ao sofrimento, e é exatamente por
isso que é preciso transformá-la em digna e humanizada. A tentativa de tornar a morte
confortável evitando o sofrimento é o argumento utilizado para se buscar a dignificação do
momento cheio de inseguranças e medos (TOSI; RIBEIRO, 2018).
Lima (2018) cita que todos têm o direito de ter sua dignidade respeitada durante toda a
vida, merecendo também o devido respeito quando for necessário optar, ao fim da vida, por
uma morte digna e menos dolorosa ou prolongada, com dores e sofrimento físico e
psicológico.
Ao redor do mundo, inúmeras pessoas em estado de sofrimento insuportável
decorrente de doença terminal imploram pelo direito de morrer por não tolerarem mais a
tortura decorrente de dores e limitações. Algumas delas já estão em processo de morte e
pedem pela sua antecipação; outras, a família pede permissão para pôr fim à vida do paciente,
por este se encontrar em quadro vegetativo irreversível (SOUSA, 2017).
Segundo Feroldi (2016), quando um paciente em estado terminal se recusa a realizar
um tratamento terapêutico não está, necessariamente, desistindo da vida. Nesse caso, o
indivíduo está fazendo uma escolha conforme sua visão de vida e arcando com as possíveis
consequências da sua decisão, devendo o terapeuta elaborar medidas que favoreçam o bem-
estar no caso. Se a consequência da escolha for o óbito, não deve haver questionamentos pois
a morte é inerente ao ciclo da vida.
Escolher o momento da sua morte diz respeito à morte digna, devendo estar em um
local específico e ao lado de alguém com quem se tenha um vínculo afetivo. O fato é que a
preservar da vida apenas com o propósito da dimensão biológica negligenciando a qualidade
de vida do indivíduo, não deve mais ser considerada nos dias atuais. O prolongamento da vida
só deve ser justificado caso haja um prognóstico positivo descrito pelo profissional médico
responsável; caso contrário, deve ser respeitada a morte digna (SOUSA, 2017).
Por ser um direito humano, é necessário respeitar o direito do titular da vida de viver
ou morrer, analisando cada caso de maneira que possibilite ao paciente terminal definir o que
seria, para si, uma morte digna, com o propósito de colocá-la em prática, evitando a dor e
angústia. É notável que a dignidade da morte está atrelada ao altruísmo, facilitando a
ocorrência de uma morte tranquila quando da impossibilidade de manutenção da vida (LIMA,
2018).
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Não obstante exista relação entre eutanásia, distanásia e ortotanásia pois, todas
estarem relacionadas à morte, seja para retardá-la ou prolongá-la, há uma diferença conceitual
que influencia na prática e na vida de quem decidi sobre a própria vida (DINEL; GOMES,
2016).
É ciente que a morte é esperada e o fim da vida é inevitável, restando somente a
possibilidade de torná-la digna e livre de sofrimentos. Sendo assim, com o objetivo de
proporcionar dignidade individual no momento da morte, faz-se uso da eutanásia. O termo
eutanásia surgiu em meados do século XVII é sinônimo de “morte sem dor”; a eutanásia é a
morte sem sofrimento, sendo utilizada por pacientes com diagnóstico de doença terminal e
que não apresenta condições para viver com dignidade (DINEL; GOMES, 2016).
O objetivo do profissional médico responsável pela prática da eutanásia não é ferir ou
unicamente apoiar a morte antecipada, mas sim, proporcionar alívio e conforto ao enfermo
que não está mais suportando viver de maneira indigna. Os requisitos para que seja possível
solicitar a antecipação da morte por meio de um profissional médico são: o paciente ter
diagnóstico de doença incurável, impossível de reverter o quadro clínico e estar em
sofrimento decorrente da doença ou tratamentos (FREITAS; ZILIO, 2016).
A eutanásia é classificada como ativa ou passiva. A primeira, é definida como o ato de
promover a morte com o propósito de eliminar o sofrimento do doente. É uma ação do
profissional capacitado que age sobre o tempo de vida do paciente. A eutanásia ativa se
desdobra em direta, quando a ação praticada tem como finalidade, a morte do paciente, e
indireta, onde é feito o uso de medidas terapêuticas para minimizar o sofrimento e como
consequência leva à morte mais rápida do paciente (SOUZA; BULGARELLI, 2017).
A prática da eutanásia ativa indireta não configura crime no ordenamento jurídico
brasileiro, uma vez que sua prática não tem por finalidade o fim da vida do paciente, sendo
esta, tão somente, uma consequência indireta das ações propostas para aliviar as dores
(SOUZA; BULGARELLI, 2017).
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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade [...] (BRASIL, 1988).
Sobre a autonomia, a palavra, que tem sua origem grega, significa “ser seu próprio
dono”; é a capacidade de atuar com conhecimento da situação e sem interferências externas. É
a aptidão de decidir sobre a própria vida de maneira mais conveniente. A autonomia está na
capacidade de realizar escolhas para a vida quando as pessoas se encontram diante de um
estado de enfermidade, independentemente dos resultados, devendo, essas escolhas, serem
respeitadas por familiares e profissionais responsáveis pelos cuidados (SOUZA;
BULGARELLI, 2017).
O princípio da autonomia leva em consideração que as pessoas devem ser tratadas
como entes autônomos e as pessoas que se encontram com autonomia reduzida devem ser
objeto de proteção e, no caso de incapacidade de tomada de decisões, um responsável legal
assume esse papel. O fato é que a ideia de autonomia ainda apresenta lacunas no que diz
respeito ao direito (TOSI; RIBEIRO, 2018).
A liberdade, a autonomia e a dignidade humana apresentam conceitos que se
interligam, sendo a liberdade, fundamento da autonomia. A liberdade é entendida como a
liberdade individual de realizar escolhas relacionadas à esfera particular da sua vida desde que
não gere prejuízos às outras pessoas. Cada ser humano, quando em boas condições mentais, é
o responsável por decidir sobre sua própria saúde (FEROLDI, 2016).
A autonomia é a capacidade de decisão sobre si conforme suas vivências pessoais.
Sendo assim, o homem autônomo age com liberdade conforme o plano escolhido por ele. A
autonomia a que se refere, expressa a dignidade e deriva da liberdade; dessa forma, o respeito
à autonomia e liberdade contribuem com a dignidade. Diante disso, Feroldi (2016), cita que
não caberia ao Estado ou à sociedade definir os caminhos que os indivíduos deveriam seguir
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ou os valores que deveriam ter pois, os indivíduos têm a autonomia de decidir sobre a direção
que suas vidas devem seguir de maneira subjetiva.
Como princípio da Bioética, a autonomia foi consagrada por meio do Relatório de
Belmont, em 1978, nos Estados Unidos. Este Relatório surgiu com o propósito de proteger
ações voltadas para experimentos científicos, porém, elevou-se para um Relatório
principialista da reflexão Bioética, levando em consideração 3 princípios: a autonomia,
beneficência (não causar danos, elevar benefícios e reduzir riscos), e justiça (neutralidade na
distribuição dos riscos) (SOUSA, 2017).
Neste capitulo será discutido sobre a eutanásia, distanásia e ortotanásia e o que diz o
ordenamento jurídico brasileiro sobre a prática de cada uma delas, bem como será
mencionado quanto à lacuna que dificulta a interpretação de tais práticas.
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Art. 121 - Matar alguém: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. Caso de
diminuição de pena: §1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de
relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em
seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um
terço.
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Essa imputação criminal que faz com que o professional da saúde responda como se
atuante fosse, se deve ao fato de que este tem o dever de garantir a vida. Uma outra forma de
eutanásia, é a ativa direta, permitida no ordenamento jurídico brasileiro, e que consiste em
administrar fármacos que aliviem a dor do paciente, contudo, como consequência, catalisa a
morte. Nessa situação, nada pode ser feito, uma vez que prevalence o princípio da
beneficência e com isso, o profissional médico não pode ser responsabilizado criminalmente
pois, não há como se exigir uma conduta diversa da realizada (SILVA, 2019).
ortotanásia, quando não existem chances de cura do paciente, sendo sua morte certa e
determinada (RIDOLPHI; RANGEL, 2017).
O que é evidente é que optar pela morte digna é também optar pelo direito à vida. Há
indivíduos que lutam pela vida até o ultimo Segundo, ainda que isso cause dor e sofrimento,
entretanto, existem outros que preferem não prolongar a vida pois não suportam o sofrimento,
então escolhem morrer tranquilos ao lado dos familiares; isso é morrer dignamente. O direito
de morrer deve ser uma escolha do paciente, não devendo o Estado intervir (SANSON, 2018).
No ordenamento jurídico brasileiro não há menção a prática da ortotanásia, sendo ela
muitas vezes equiparada, no código penal, com a omissão de socorro (art. 135). Essa
interpretação errônea ocorre porque há omissão das normas de direito, ao não haver
tratamento específico para a ortotanásia (SANSON, 2018).
A primeira Lei no Direito Brasileiro a tartar da ortotanásia foi a Lei Estadual nº 10.241
de 1999 do Estado de São Paulo, conhecida como Lei Covas. Esta levava o nome de um ex-
governador que ao descobrir um câncer terminal, que sem chances de cura, optou por utilizer-
se da Lei para recusar os tratamentos inúteis que serviam apenas para prolongar sua vida
(RIDOLPHI; RANGEL, 2017). A Lei Estadual nº 10.241 de 1999, é objetiva em seu artigo 2º,
inciso XXIII:
Art. 2º - Entre os direitos dos usuários dos serviços de saúde no Estado de São
Paulo, dentre outros, estão os de: [...]
XXIII - recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para tentar prolongar a
vida e o de optar pelo local de sua morte.
permitido aos médicos oferecer uma morte digna e tranquila aos pacientes, proporcionando
somente os cuidados paliativos destinados ao alívio das dores (CARDOSO, 2017).
Todavia, nem todos concordaram com a Lei Covas e com a Resolução. A exemplo de
um Procurador Regional do Distrito Federal, que propôs uma ação civil pública nº
2007.34.00.014809, sob o argumento de que não consta, no ordenamento jurídico, a prática da
ortotanásia e que sua autorização estaria estimulando os médicos a praticarem o homicídio.
Também foi argumentado que o CFM não pode decidir sobre o direito à vida pois, trata-se de
matéria de competência exclusiva do Congresso Nacional (CARDOSO, 2017).
A partir de todo esse debate e discordâncias sobre a temática, a ortotanásia passou a ter
uma atenção maior no Congresso Nacional e desde então surgiram inúmeros projetos de Lei
que versam sobre a prática e que ainda tramitam, há anos, no Congresso Nacional (SOUSA,
2017).
O Projeto de Lei nº 3.002 de 2008, fala sobre a regulamentação da ortotanásia no país.
Um outro que dispões sobre o tema é o Projeto de Lei nº 6.544 de 2009, que trata dos
pacientes em estado de doença terminal e seus devidos cuidados. Há também o Projeto de Lei
nº 6.715 de 2009, onde é proposta uma alteração do Código Penal para excluir a ilicitude da
ortotanásia do ordenamento jurídico (CARDOSO, 2017).
Em 2010 passou a entrar em vigor o novo código de Ética Médica, que permite ao
médico ter a liberdade de realizar a ortotanásia em paciente que se encontre em estado
terminal, desde que exista uma prévia autorização deste, ou em caso de impossibilidade, da
família (CFM) (SOUSA, 2017).
pela distanásia, ela vem sendo um padrão definido pelos médicos, dispensando os pacientes
de fazer escolhas (LIMA, 2018).
Segundo Lima (2018), a distanásia atua em oposição a ortotanásia pois, enquanto essa
busca uma morte digna, esta fere a dignidade do indivíduo. Com isso, o CFM por meio da
Resolução nº 1.931, de 17 de setembro de 2009, aprovou o Código de Ética Médica que
contém em seu capítulo I:
Art. 41. Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu
representante legal.
Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer
todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou
terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade
expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.
No Brasil, realizar a eutanásia bem como a distanásia é crime, respondendo que lhes
der causa pelo crime de Homicídio Privilegiado, ainda que não exista jurisprudência pacífica
sobre o tema. A pena para quem o pratica é de 12 (doze) até 30 (trinta) anos de reclusão
(SANSON, 2018).
Analisar a distanásia é versar sobre a possibilidade de suspensão de tratamentos
ineficazes, devendo respeitar a manifestação de vontade do próprio paciente ou, no caso de
estar impossibilitado de tomar as decisões, respeitar a decisão dos familiares, amigos ou em
determinados casos, até do Estado, de optar por não realizar um tratamento que não resulta em
cura. Dessa forma, o médico responsável não deve ser responsabilizado, caso por
consentimento prévio, suspenda ou não dê início ao tratamento (JÚNIOR; ALVES, 2015).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Por meio do presente estudo é perceptível que a Constituição Federal Brasileira fala
sobre o direito à vida e dignidade da pessoa humana como bens invioláveis pois, estão
intimamente relacionados com a segurança. Contudo, não aborda sobre a morte, tema bastante
debatido atualmente.
O estudo também destacou a importância de se respeitar a autonomia do paciente que
se encontra em estado terminal, uma vez que todos têm direito de viver, desde que seja de
maneira digna.
Na jurisdição brasileira somente é admitida a morte como ciclo natural e, apenas a
ortotanásia reúne os requisitos que o direito brasileiro e a medicina admitem. Todavia, o
estudo mostra que existem debates envolvendo a ortotanásia por haver conflito de ideias entre
quem concorda com a prática e quem alega que a ortotanásia se trata de omissão de socorro,
além de alegar sua ilegalidade por não constar no ordenamento jurídico brasileiro.
O fato é que através deste trabalho, conclui-se que embora a vida esteja acima de todos
os demais direitos, existem situações que permitem a ponderação quanto a não haver
necessidade de manter uma vida em constante sofrimento, desde que a atuação não seja
destinada a antecipar ou a morte ou mesmo adiá-la sem que o paciente tenha interesse.
Por fim, é válido ressaltar que o direito à vida deve ser analisado sob o prima
individual e não coletivo. E, por haverem lacunas no direito brasileiro acerca da temática, esta
deve ser discutida sem que haja tabus para que ocorra uma uniformização da jurisdição de
maneira que permita respeitar a autonomia do paciente ao escolher morrer de forma digna.
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