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Versos in Si

Não quero
Não quero mais o silêncio da garganta fechada

Do coração que pulsa débil e descompassado por paixões vãs

Não quero mais o silêncio da palavra que não vibra

inundada de lágrimas que não se mostram ou que caem no mais absoluto

silêncio.

Não quero mais me envergonhar do que sinto, do meu passado e do que me

forma.

Não quero mais certezas nem verdades absolutas

A única verdade que existe é aquela que me faz feliz.

Não quero mais este mundo dualista de bonito ou feio, de bom e ruim, de amor

e ódio.

Também não quero o equilíbrio conquistado a custa de exercícios extremos.

Quero a mim!

Isenta de todos os possíveis e prováveis adequados ou sensatos.

Quero ser simplesmente o que sou e não me sentir culpada por isso.

SI

Só não SI sabe quando....

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Versos in Si

PALAVRA
Aberta a boca não cala, alas que abres.

Derrama do peito o que estava dentro, entre tramas de sementes

Fervilhando outras palavras, lavouras.

Incrusta no corpo a palavra dor-mente, latente, significados.

Que por vezes quentes esculpem pequenas crateras nos poros, rugas.

Ou molda-se como cera nos tímpanos, esquecimento.

Ou pelo menos fica atrás da orelha, pulgas-dúvidas.

De(Re)forma o escudo frágil dos sentidos, palavra-espada que fere ou vangloria a batalha.

Abençoada em tempos cantados em versos pelos poetas, poeises.

Em tempos sagrados das promessas entre os amantes, praxis.

Em tempos-documentos de revolta, palavras-revolução.

E em tempos eternizáveis de doação dos mestres, conhecimento.

A palavra que germina descende da vontade da fala, atitude.

E como um parto, rompe a terra e se conduz à vida, presente (em todos os sentidos).

Cria e fertiliza o vir a ser, futuro.

Fomenta talentos, valores, crenças e novas crias, ação.

Cabe a quem colhe o fruto da palavra

contemporizá-lo

contemplá-lo

contê-lo

E ser grato.

Parla-Si, 13/09/1999

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Versos in Si

PARTE
Sou a ponte que une alguns portos e alguns pontos em espaços de várias dimensões

várias...

Sou a porta que abre à alguma outra parte

Sou o porte de palavras, imagens, sentidos ,etecetaras e taras

Sou uma campina com porte de aras

Um prado branco de inverno

Sou o inverso avesso de um caderno

O perverso verso que tenta ser arte

Sou o que parte e continua presente em parte

O perfil de um percurso sem par

Sou a perda que ousa ganhar

Sou a perfídia e o perdão

Uma parca partitura gestual de percussão

Sou o que pergunta sem permissão

O perene e o que perece

O que é e o que parece

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Versos in Si

O que apodrece

Sou a porfia pela porfia que tece e fia prece em forma de poesia

Sou a rima pobre e diante disto, paro.

Sou o parto constante de mim mesma

O que parte só e o que se fragmenta

Sou a partilha partícipe do que sou

A parcela de um Partido partido

O perfume e a fumaça de quem fuma

Sou o que permeia os pentes deste meu cérebro insano

Um périplo de asfalto

Sou o pôr de um sol vermelho e poroso

Sou o porvir precoce que tem pressa

Sou o parcial e impreciso preço de mim

Esta partícula poética pretensiosamente perto

Sou uma Pietá que parla

Sou um parque, Juracy

Sou o que nem sei em Si

Sou esta poeta quase parnasiana que fica brincando com as palavras prá poder brincar

um pouco e parcamente com a vida, com os seus olhos, e com o seu e o meu

repertório...

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Versos in Si

Sou este parlatório que não cala e às vezes convence...Aparte disso, talvez eu seja um

todo.

Si-Aparte, 27/08/98, 5:35 h. e 08/09/98, 23:32 h.

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Versos in Si

A NÃO POESIA
dos versos que não escrevi

tenho a saudade que não senti

nem a dor

nem amor

nem cor

nem lágrima, nem sangue, nem porra de rima

nenhuma

vazio
nem indignação nem melancolia que me

impulsionasse palavras fora da garganta

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Versos in Si

as palavras que ainda não me vieram, que não criei,

as que não apropriei, as que não me apropriaram...

a árvore que ainda não plantei

o filho que nunca terei

a música que nunca compus

a arquitetura que não construi

em mim

a vida que não me coube

as experiências que não tive tempo nem espaço

nem merecimento de ter

e deter o poder de transformar

em poesia

ainda só canto o que me canta ou encanta ou

decanta

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Versos in Si

ainda não sou Pessoa, nem de Moraes muito

ferrenhas

nem Rimbaut, nem rain bow

só uma pessoa com uma moral com forma de arco-

íris

e cuja íris às vezes reflete cenas

que deixo ser comigo

metamorfose em poesia

ainda medíocre, mas poesia

ainda apenas mais uma rosa do povo que embora

feia fura o asfalto da minha falta de criatividade...

perdoem-me...

sem Si

18/10/98; 3:19 h.

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Versos in Si

a cópia da cópia da cópia da có

pia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da

cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia d

a cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia

da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cóp

ia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia da cópia..................

...........

do registro do visto à vista

hasta

arrasta

e castra

a haste da origem

a perda da definição, da nitidez, da minuciosidade ociosa dos nossos dias

o todo tão presente na parte

a confusão sutilmente organizada

e a descoberta ˆblouáptica˜

de outros desenhos

traçados pelo tempo

num espaço que já não estava em branco... nunca esteve...

feridas ainda abertas

cujas quase cicatrizes estão sempre ali

e não se faz necessário olhar para elas

para sabê−las...

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Versos in Si

já são imagens tatuadas em nossos neurônios...

são o presente que se mantém em qualquer futuro

feridas e cicatrizes em relevo da pele mal cuidada da cidade

rachaduras e fendas por onde escorre uma espécie de sangue que envelhece

uma espécie de ácido, de veneno, de tinta que flui em dizeres por todos os

lados

e que na maioria das vezes

não diz nada

ou diz tanto, que se torna ininteligível

ou diz apenas o que diz, mas se torna inaudível por sua presença

reduntante no compasso cotidiano da visão.

em qualquer forma, e seja lá o conteúdo que traga

o que importa é que eu também trago outras formas e conteúdos sobre eles.

numa não passividade declarada

numa situação pós política

numa condição pós−moderna

numa contemporaneidade tão efêmera e tão dialeticamente eternizável

quanto as imagens que explodem na cidade e implodem na nossa memória

e formam cultura.

Nosso zeitgeist diz do nosso genis loci a todo tempo e em todo espaço.

Todos os tipos falam de nossos arquétipos.

Basta fazer com que não falem sozinhos.

copia−Si

21−5 / 04 / 1999

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Versos in Si

Cá beco
Minha cabeça é um beco escuro e sonoro

De fogos de artifício e gemidos sussurrados

Minha cabeça é uma noite de lua cheia

Repleta e reflexa de vozes graves e objetos fálicos

Minha cabeça é um vaso imenso de flores miúdas

Um lago imerso

Um copo d’água turva e densa

Minha cabeça condensa aromas de percurso

De silhuetas petrificadas dependentes

De fluxos estrangeiros

Fecundos e imagéticos de utopias vãs

Minha cabeça cabe o que ainda não existe

O que pulsa e expulsa transbordante

em idéias e ideais incontidos, incontinentes,

consistentes, insistentes

insuperáveis

Que sem ciência se aloja maltrapilha e marginal

Na crença e no fascínio ao desconhecido

Valores de sementes passadas

Por essa sólida e hétera etérea massa telúrica

De minha cabeça inconcebível

Do entorno como externo e impertinente

A minha cabeça deságua em bordados fractais

Exala-se do cosmos como contas de colares multicoloridos

Factual acaso do presente

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Versos in Si

Paradoxal lente que meça quantias e valores e paradigmas e dores de

SI

Minha cabeça é um curso d’água que enxágua e enxuga

o que corre por entre minhas rugas

Minha cabeça é um palco navegante

Uma platéia escaldante de espanto

Minha cabeça é palma e silêncio

Que suporta rígida e exposta

A leveza da existência

Minha cabeça é um circuito aberto em curto que explode

e assim me ilumina e elimina de mim, misérias

e contamina-me de mim, quimeras

Uma tocha olímpica que não chega

Recepção e contração

Concepção

Minha cabeça flutua

flui de mim a tua

e atua como a arte

nas mãos de Deus.

Minha cabeça procura pela cura da saudade

de quem eu não vejo

em quem eu navego no tremor das vagas da vida a devagar

e inconscientemente

Na minha cabeça falta uma parte andarilha de caminhos convergentes

Que não chega nunca...

Si, 27/04/95, 2:54 h

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CONTRAPONTO

CANTA do ponto o que não é

sendo.

CONTA do conto o que ainda não foi escrito.

CONSTA da constância cotidiana

o inesperado, o insólito, o ensolarado

em dias cinzentos.

ENCANTA na costura

a trama da linha

e caminha sobre elas e fia

lúdico e lúcido

o equilibrista na síntese da agulha

na tinta.

IMPLANTA a semente pródiga

na terra dura

fagulha de silêncio

que grita
Versos in Si

paradoxal.

DECANTA na alma dos olhos

poeiras e purpurinas dos nossos ares

presentes e

pressentidos

na mão da arte

que agrada sem mistério

semi etéreos

e héteros

elos profanos

do sonho do chão

que chama

Si. 1997

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Flashes
Da janela de um ponto acima do chão

Além e entre nuvens de imagens e fumaça

A frente dos olhos

Um milhão de histórias se desenrolam

Um milhão de janelas e redes

Guardam redes de janelas

Num grande sistema existencial

contatos

tatos

atos

Impulsos

pulsos

Impactos

pactos

felicidade?

cidade

Emaranhado de areias aglomeradas, asfaltos, florestas de árvores mortas, cerâmicas,

sintéticos e tintas a pintar as fachadas

das casas e das caras, todo tipo de hipocrisia ou conveniência, ou rara sinceridade

Milhares de voltas que o relógio dá

Milhares de pulsos, as artérias


Versos in Si

Milhares de carros

p a s s a m

Milhares de posses

Milhares de passos

Milhares de elétrons dentro e fora das nossas cabeças iluminam

Milhares de fragmentos de lixo e de luxo esparramado pelas calçadas

Milhares de pecados que não existem mais

Milhares de notas a soar nos tímpanos... .panos.

..ânus..

Regras Fórmulas Notas Nomes Números Códigos Senhas Cenas Flashes

Si, 13/08/98, 21:38 h.

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Versos in Si

Há ar e risco
há risco na vida

que descreve sua face

a expressão de seu corpo

o que você é.

há risco na consciência

que te esconde

e há risco que te mostra

exposto e nu

feito meus olhos quando vê o risco

diante da incerteza cômoda e segura do “não”

e o “sim” ao risco

há risco no ar que risco!

o conhecimento só se mostra a quem não se esconde.

e se eu tivesse medo

não escreveria estes riscos

nego o medo e avanço

com medo

mas ousada, não me nego.

arrisco porque o risco traça

confirma, constitui, forja

porque expressa

arrisco porque o papel em branco

não faz história

porque a vida só se faz documento quando há-r-risca-Si.

22/08/1999, 22:36 h.

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Versos in Si

in vés tig ação


uma investigação sobre a relação entre o tempo e o espaço urbano, sob a óptica da

física dimensional e da filosofia dialética.

O tempo - senhor da morte.

Espaço - senhor da vida.

Enquanto um é um eterno efêmero

o outro é sempre o outro sobreposto

nos caminhos tortuosos ou retos do rosto.

E se entrelaçam atrelados aos olhos

que caçam cada tempo exposto em um espaço diferente

cada tempo encoberto por outro

no mesmo espaço

cada índice

cada viés da costura

cada veia da encosta

cada contraponto da trama.

Cada signo exclama a dialética

desta atração insuperável entre o tempo e o espaço

desta esgrima de folhas de cidreira

desta lágrima de água e açúcar

que faz o soro com o sal da idade - saudade da gente em outro tempo

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Versos in Si

saudade se dada de presente

cidade no presente inexistente

no lugar imaginário entre o passado e o futuro.

O duro paradoxo de vivenciar apenas a não existência

e ter acesso ao Real

somente por este processo de leitura dos olhos que caçam

somente pela Realidade que só mente

e sempre em graus diferentes.

O tempo faz isto com a gente.

E de tanto tentar chegar à Verdade

tem gente que cansa

tem gente que dança

tem gente que laça

(ou se lança

à dimensão entre espaço e tempo)

tem gente que abstrai-se

E neste caso o tempo se insulta

e o espaço, tão cúmplice

nos faz ausente

ao que sente

mas sempre paradoxal:

É neste caso que se prende o tempo

e o espaço consola

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Versos in Si

com seu braço sólido

e o cola a si, dado

cidade.

E aí assim,

nos faz presente.

Presente dado ao universo

Presente que é o Real

Presente que está e pressssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssente-

ssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssi

que abstrai-Si. 17.04.97, 15:17 h. e sempre que pode.

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Versos in Si

Quase 1 ou tudo
Já fiz quase tudo

E neste quase tudo existe um todo maior

Então às vezes tenho medo do quase.

Às vezes existo pouco e quero pouco o quase me falta

Às vezes quero tanto que me esqueço o que quero e que existo mais do que quero.

Quero uma coisa triste com final feliz.

Quero um dia anos 60.

Quero uma noite anos 70.

A madrugada anos 80...

Os anos 90 estão presentes demais

(Meu Deus! como sou hollywoodiana!)


Tão perto dos olhos, que quase não posso vê-los.

E fazer parte é sempre ser de alguma forma quase oprimida...

A liberdade se vê somente ao longe e só...ou quase

Ou nos braços da alma gêmea

Ou no orgasmo

Entre ver o que passou e o que virá

Seria preferível a segurança do passado

E não consigo

E não aceito não conseguir

Ser... simplesmente ... uma mulher... segura... daquelas que são discretas, sutis,

reservadas... como as mulheres de antigamente

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Versos in Si

(Mas incomodada ficava a sua avó!)


Não consigo deixar de não conseguir deixar de ver o que virá

E que com certeza não será bem assim...ou quase não...

Quero dançar no meio do salão.

Quero aplausos e lágrimas daqueles que me ouvem.

Quero o sorriso que meu Homem coloca na minha boca.

Mas as palavras não,

As minhas palavras veeeeeem^^^^^^^^^^^^^^^^ do que e o que sou.

E as fórmulas então,

As fórmulas nunca viverão em mim

Nunca pulsará dentre meus neurônios submissos à esta eterna ditadura coronária

A gota iluminista e gélida da racionalidade

(Meu Deus! como sou romântica!)


E isso me mata.

E me mantêm viva como sou, ou quase...”

O que seria do que sou sem amar e dar vexames?

O que terei? Amantes e vexames discretos, sutis e reservados? Calculados? Orgasmos

formulados?

Opressão que não se enxerga! Automatismo...

Não!

Quero descobrir o que existe em todos os quases possíveis e imagináveis

E depois de sabê-los e sacar que o quase é quase tudo

Quero me alegrar com o espanto de conhecê-los... me cansar deles...e

Recriá-los, ressemantizá-los, distorcê-los, digitalizá-los e multiplicá-los...

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Versos in Si

(Que ótimo... tudo elevado à ene – mais tudo... –

sempre fui exagerada!)


Quero então, depois buscar a origem, a raiz, o centro, a chave, o ponto, a porta... da qual surgiu...

tudo

E tentar entender como tudo aconteceu, e acontece...

(Sempre fui curiosa ☺)


Daí ver todas as coisas perderem a graça e enlouquecer

Ou fragmentar-me perdendo a existência por tê-la descoberto

Ou passar a existir de alguma outra maneira

Ou qualquer outra coisa inesperada

Ou quase.

Quase Si e amigo Ma, 01.07.97, 2:50 h.

e Si de novo ou quase, 29.12.99, 4:30 h.

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Versos in Si

QUASE 2

Invadiu-me o peito uma quase dor

Sensação de olhar o abismo

Calafrio que exala lágrima

Tomou-me nos braços da ansiedade

Uma quase tristeza

Expectativa do que não pode ser visto

Possuiu-me o corpo em ardores flutuantes

Uma quase paixão

E mais tudo o que sempre vem anexo

Grilos cantores do pecado

Atrás e dentro da orelha e entre as entranhas

Do que ainda não sei.

Cobriu-me os olhos de uma quase alegria

A boca de desejo incontrolável

O coração de palavra

A noite de insônia

O céu de concreto de estrelas sintéticas

E a alma de esperança

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Versos in Si

Nestes dias quase céticos... ou quase.

Quase Si, 10/08/98, 3:20 h.

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Versos in Si

reflexos (in)versos, reflexões e (in)versões


arquitetura negativa

janelas múltiplas e imaginárias

expandem−se numa espacialidade virtual

e os olhos que percorriam a opacidade do plano

escorrem no viés da vista e transcendem num

percurso tridimensional

inexistente

as janelas estão presentes em todos os buracos da parede

inclusive portas são janelas por onde passam os passos dos pés.

as janelas estão presentes nas faces de olhos abertos

e fechados ˘ escuridão.

e nas faces com boca que fala...

e a que cala ˘ silêncio.

as janelas estão presentes

nos quadros, nos micros, nos espelhos

e nos eteceteras todos do mundo

hiper−janelas

paisagens consecutivas do olhar e do pensar.

as janelas estão presentes nas imagens

qualquer imagem − todas as imagens

as janelas são os palimpsestos por excelência

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Versos in Si

imagem narcisa de si

reflete o inverso do verso e da versão da imagem

o percurso de quadros sussesivos si expandem para algum lugar

onde não existe realidade como si concebe

(a maior parte da realidade dos olhos, do que comunica,

do que sociabiliza a civilização)

faz parte da esfera de coisas

que ainda não si conhece as regras

e mesmo assim si fazem as comunicações todas, as palavras,

as imagens, as artes ˘ a linguagem, e portanto, o pensamento

algo como si fôssemos impulsionados por um instinto natural

de fazer realidade, para afirmar a nossa própria

mas, tomando como matéria prima,

o irreal, o imaginário, o virtual

o que é produzido reflete também −

a abstração

reflexão do espelho que somos

e do mundo que concebemos

a reflexão do espelho não pensa só

si pensa junto com outros espelhos

si1999

obs. palimpsesto: fotos ou imagens (re)produzidas a partir de imagens já (re)produzidas

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Versos in Si

Insinuando

Ando alinhando

Sinuosa aliança

Sino

De sina

Simão

Se não

Si

sempre

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Versos in Si

Desencanto SCinéfilo
O dia passou

E eu passei o dia como se ele não tivesse passado. Nem futuro.

Passei o dia me ignorando. E a ele também. E ainda tive a impressão de que a

recíproca era verdadeira.

Desencantei-me.

Debrucei-me sobre um horizonte inexistente

E passei por cima da realidade solenemente,

Como quem simplesmente não precisa dela

Como quem não a reconhece

Como quem não a alcança.

Demorei-me em um tempo que não passa.

Onde o tudo pode ser nada

O céu pode ser perto

As estrelas podem ser pêgas

E Deus pode ser visto.

Mas nada disso parece real ou importante

E viver um último tango em paris ou ir até o fim do mundo

Sempre acaba com as minhas grandes esperanças.

SCi.

em algum lugar do passado

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Versos in Si

Encanto SCinéfilo

Já tive um amigo americano que morava em Paris, Texas – não é tão longe,

tão perto também não é – No decorrer do tempo, o estado das coisas

entre eu e Hammett acabou além das nuvens do céu de Lisboa, mais para

Tokyo – Ga... Não sei... Um dia, a Alice nas cidades pelas quais passava, o

encontrou muito louco brilhando sobre as águas com o medo do goleiro

diante do pênalti. Achou estranhíssimo! Alice me disse que ele entrou numa

de querer achar o significado da letra escarlate no livro de anotações

sobre cidades e vestimentas que ela carregava. Disse também que ele

acreditava que até o fim do mundo ia rolar o fim da violência na cidade dos

anjos como um falso movimento das asas do desejo de rever o verão na

cidade. E mais, disse que ele vivia falando:” Wim Wenders e aprendenders”

– Que figura!

SCi

06/98

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Versos in Si

Wenders à cidade
A cidade que Wenders filma, fala

sobre si mesma

sobre o cinema

suas Histórias

e as histórias que contam

A cidade que Wenders filma, fixa-se

como signo

que inunda de significado

cada cena

A cidade que Wenders filma, filtra do filme

suas entre-linhas

suas entre-cenas

suas entre-histórias

sua essencialidade

A cidade que Wenders filma, fermenta-se

de hipersentido

A cidade que Wenders filma, não se fecha

abre-se

vai além

fere as fronteiras

vislumbra as frestas dos ângulos

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Versos in Si

A cidade que Wenders filma, confabula sobre a vida

sobrevoa-se como numa viagem metafísica à suas

entranhas

estranhas

tramas

A cidade que Wenders filma, fascina-se

sem excesso

nem caos

apenas pensa-se

contempla-se

contemporiza-se

A cidade que Wenders filma, fomenta

seu tempo: zeitgeist

seu espaço: genius loci

seu sujeito: o Homem da Modernidade

seu objeto: representação

seu tema: a existência

A cidade que Wenders filma,

não é falsa

não é farsa

não é fantasia

não é fantoche

não é ficção

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Versos in Si

faquir de sua própria realidade

busca-se

questiona-se

A cidade que Wenders filma,

não é

fim

em si

é meio

A cidade que Wenders filma, finge

que é imagem mas é

História

A cidade que Wenders filma

Fica

Si

06/1998

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Versos in Si

. . . V Ê . . .

Verso diverso...Conversa versátil...Verbo volátil

V I D A

Vulva de vulcão... Trovão de vícios e ventos... Iansã nas asas do

tempo voando sob os véus celestes... Verão vermelho de paixão

V O C Ê

Vivaz canção fugaz...Viril forma de fazer amor e amar-Si...Vibração

dos céus... Viagem contínua e nua numa alma em vigília

V I R T U D E

Veia exaltada no ventre de Vênus... pulsa...Veleiro de veludo

S U A P E L E

Veneno de verdade sugada...Vândalo vampiresco... Verde vastidão do

sonho...Versus o vazio da ausência...Vazão de gota nos olhos... Óleos

e vinhos e orgasmos

D E V Í N C U L O S , V I R I L H A S E V I R G Í L I O S

Violento violino violeta... Que soa a voz vulgar e eterna do

inconsciente... E o som da consciência vil e vã

V O N T A D E

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Versos in Si

Vírus virtual a volver o corpo... Suor vindo das estrelas...Valsa santa

de vertigem... Passo vencido pela ventura...Venda na visão de ver-

te... Veemente valor de um vácuo... Fogo-fátuo do chacra das

vergonhas...Vapor de incenso insensato... Vias vísceras pela vagina

invisível da eternidade ...Virgem dos tempos... Vórtice voraz que

volta revolta e se volta

V O L Ú P I A

Involuntário desejo de devorá-lo pelas ventas... E levá-lo aos

ventrículos e vê-lo além das vistas... E velá-lo em velas ... E vertê-lo

em mim... In verso e música... D E N O T A

S I

1999

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Versos in Si

CENTROS
Terra Universalis

território de ninguém e de todos

Geléia Geral.

Locus intersection

dos que ficam, os que passam e os que estão ali por estar

sempre ou pouco

Tempo do contínuo efemerizado.

Zeitgeist inconstante, mutante, imprevisível.

Quando a ordem do caos determinístico deixa de fazer parte apenas da esfera física e química do

universo e abandona o “no fundo, no fundo...”

colocando-se explicitamente sobre a funcionalidade da existência sócio-cultural da vida e da cidade,

ou de algo que signifique as duas coisas

Funcionalidade cujo significado se impõe de forma tão estranha às suas origens...

Uma espécie de catarse de tragédias, comédias e dramas que se fundem

Sem teoria, nem pragmatismo

Sem eufemismos, nem metáforas exponenciais

E todas as metonímias possíveis.

Apenas mais uma forma diferente de buscar a sobrevivência em um ambiente hostil dos mais fortes

numa época entre Darwin e o neoliberalismo.

O lixo, poucas opções, impasses, materialidades que não combinam, o ar pesado, o fedor, a

velocidade, a fugacidade existencial dos carros que passam, ritual dos mitos e heróis sem nenhum

caráter, caminhos pisados, referências múltiplas, vaidades e veleidades.

Mal(Bem)Dita Dialética

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Versos in Si

Das mãos, gestos de várias intenções.

Dos rostos, feições de várias etnias e mestiçagens inomináveis, ou máscaras que colaram.

Desindentidade de uma identidade complexa.

Dos pés, passos e compassos coletivos de direções cotidianas pré-estabelecidas e determinadas; ou a

não-direção solitária e sem sentido.

Solidão que acompanha outra.

Do peito, “o pulso que ainda pulsa” na angústia deste fim de milênio.

Das entranhas, as estranhas estradas interiores, os extratos e substratos do que somos ou podemos

ser.

Dos ouvidos, os ruídos que juntos, incógnitos.

Sonoridade visual de um grito-Munch numa Guernica sublimada.

Da boca, um quase silêncio de palavras abafadas pelo stabilishment, pela pressa, pelo stress, pelo

cansaço e pelo cansaço de dizer e não ser ouvido, ou um quase silêncio de significado real de

palavras-publicidade.

Dos olhos, um vazio de horizonte e o cinza do céu refletido em olhares quase autômatos, friagem de

tempo em tempos que possuem um futuro duvidoso. Medo. Indignação controlada. Saudade.

Conformismo. Alienação.

Dos edifícios, o universo inverso e adverso da heterogeneidade mal organizada, da diversidade

desorientada, das arquiteturas ou vontades não projetadas ou projetadas como projéteis de pólvora

política.

Maquiagem excessiva que ficou com o tempo e que ninguém limpou.

Fragmentos, restos e resquícios que se acumularam no espaço e que ninguém tirou.

Reticências contínuas da tecla de ponto final que travou.

Fraturas e peças de quebra-cidade que ninguém juntou.

Cicatrizes de feridas que ainda não foram curadas.

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Versos in Si

Overdose que não mata. (às vezes mata)

Bad trip que não se acaba.

Droga que não dá barato e cobra caro a virtualidade de cada dia, ou a realidade de cada simulacro.

Espaço sem noção de nação.

Lugar?

Urbe X Civitas.

Civilidade que se perdeu na cidade.

História que se perdeu na historicidade.

Há que se fazer alguma por isso.

Voilà?!

26.03.99, 23:33 h.

Central Si

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Versos in Si

DO FUTEBOL
o gol

o orgasmo

a obra-prima

o conhecimento

instante ímpar que vira história

ponto de inflexão

a gota d’água

a catarse-síntese

“o medo do goleiro diante do pênalti”

a dança multi-étnica, multi-social, multi-crenças e multi-multi dos olhares

na dança universal dos corpos de todas as origens

a sintonia cultural

e toda a esperança concentrada na forma sagrada de uma esfera

num mundo onde

“a crise da cultura deu lugar à cultura da crise”(Roland Barthes),

estas formas de manifestação esportiva são mais nelas mesmas

são manifestações culturais

que têm sido os artifícios mais eficientes de engajamento

do cidadão à sua cidade,

do Homem à sua Pátria...

e a bola na rede

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Versos in Si

não é só o gol

é a integração sujeito-universo

num mundo onde estes prevalecem como objeto.

é o êxtase enlouquecedor coletivo que alimenta a sanidade social

é a prova da identidade - digitais com forma de mapa.

Si

06/1998

41
Versos in Si

e n t r e

p o s T e s ,

p o $$es
e
p o $es
Cadáveres de árvores.

Vozes de duendes.

Cercas que secam as folhas do caderno

onde se queria escrever coisas bonitas.

Postes postos lado a lado a lado a lado a lado a lado a....

Pontuam o infinito do firmamento

e a restrição imagética das cruzes de bárbaros

em veias abertas em vias fechadas.

Muralhas invisíveis de frios fios que esquentam o mundo

Ao olhar-me para elas vejo o que não são

Vejo a noção incerta de um horizonte demarcado, rotulado, denominado,

carimbado em alguma repartição pública onde alguma criatura esconde sua

intelectualidade sob papéis cheios de assinaturas.

Vejo os monumentos que seguram cabeças enforcadas.

Carrancas históricas sem nome ou cabeças pensantes a frente do tempo e

fora do corpo faminto ou faces abestalhadas de crianças à frente da TV.

Atiro-me contra a teia

insana

sinto saturar-me de consciência e como sempre deveria ser

42
Versos in Si

abatida pela dialética de saber que não é nada disso ou quase nada e que

a minha ciência vã se vai e vem com os fios e que minha insanidade é o

que existe em mim de mais lúcido.

Ao derrapar-me no precipício alheio deste vácuo entre as figuras de

concreto fálico dos meus sonhos surreais

e o que vejo. Divago devagar demorando-me e decanto-me onde estou e

quando. E só assim posso imaginar um mundo de amanhã onde poderão estar

interrogando-me indignação ou rogando-me honras ou desconhecendo-me.

E entre as foices firmes e as espadas vejo a grade

para fora e dentro de mim

alguma parte que se lembra do cárcere

e de todas as canções de liberdade.

Acho um simulacro de pássaro que nasceu na gaiola

acha que o céu é um mito inatingível

e que ao agitar-se em cativeiro

considera-se o máximo, tropeça em seus malabarismos

e devora-se em enigmas não decifrados

das cifras que vê ao longe

dos fardos que não carrega

não porque não possa carregá-los

mas porque não carrega a posse

de sua própria natureza

liberta

a falta da posse lhe resulta na pose falsa de alguma identidade,

ou segurança, ou predestinação, ou qualquer idiotice para encobrir a

vergonha de não poder ser aquilo que realmente é.

Si. 1996

43
Versos in Si

Ouro Preto

Por entre as frestas

que a vista surpreende

Por entre as festas imaginárias

que pairam sobre a cidade

e sob ela

os passos que já foram

e as auras que ficaram

flutuam

serpentinas

e confetes de pedras e de ares

que vão aos ventos e ficam

memoráveis

vãos

que se deformam

no espaço tortuoso

44
Versos in Si

virtualizado pelo tempo real

autenticado pela história

Por entre os olhares dos mais velhos

os mais novos

por entre as ruas

sempre o que ainda não foi visto

ou por tão vistos, desnudos

e da nudez

o deleite abuso de

demorar-se

apoderando-se de imagens que são

únicas

desvirginando-as num contemplar incansável

que se ilude em apropriar-se do patrimônio que se faz

propriamente

e não se deixa cessar nem macular por tantos olhos que

45
Versos in Si

passam

o que passa por aqui

deixa o encanto

em ecos silenciosos

de ofegantes vis-lumbres

e o passado

aqui se prova que não só

não passou

como está mais

presente

do que nunca.

Si

1996

46
Versos in Si

Sidade

cidade deveria ser com S

Solidez fragmentada de carbono, ora grafite, ora diamante ˘ ora arte!

Silêncio ausente e descrescente

Sons incógnitos

Sapateado descontínuo de dores e prazeres, clamores de rezas, fome de deuses e p

ão

Sabores do amargo vômito das entranhas que definham e do doce incalculável do bomb

om envolvido em roupagens reais

Sondas que nos enfiam pela garganta e as que nos conectam ao mundo inter relacionáv

el,

onde a cidade cresce num espaço pós−material

Solidão primitiva da carência e a sua ressemantização (para os otimistas ou engajad

os),

ou maquiagem automática feita por monitores televisivos

47
Versos in Si

Saudações de ritmos cotidianos, de articulações estratégicas, de retóricas dispensá

veis,

de hipocrisias, de hiper crises, de idiossincrasias

Solução de reagentes solúveis, mas passivos à dialética Saturada.

Sujeitos à beira de um ataque de nervos na ausência absoluta de unanimidade nesta f

alsa

democracia

Sistemas complexos de um caos incomensurável

Saciedade e Satisfação inexistente como condição do Sistema

Sombrio Soneto Sonegado

Sair Sem Segurança

Sucessiva Seriedade Sem Sentido

Solene indiferença e falta de Solidariedade.

Singular Saliência ou Sinuosidade na Superfície da Terra

Sinistra Sedimentação de materiais de todas as origens

Solo Só.

Sofismo.

48
Versos in Si

e mais algumas coisas de Sidade:

Sociedade, Saberes, Sacanagem, Sabonete, Sacola, Sabotagem, Sal, Sacrifício, Sala

da,

Saia, Salto, Salame, Salão, Salário, Samba, Sandália, Sandice, Sanduíche, Sardas, S

aque,

Sarcasmo, Sarro, Satélite, Sátira, Sauna, Sado−Mazoquismo, Sé, Secador de cabelo,

Sebo

Secretaria, Sedentarismo, Sedução, Segunda à Sexta−feira, Selo, Seleção, Semântic

a,

Senha, Sensacionalismo, Seqüestro, Separata, Serenata, Série, Seringa, Serpentina,

Serralheria, Serviço(?), Significado, Sifão, Siderurgia, Sífilis, Siglas, Signo, Símbolo

s,

Sinaleiro, Simpósio, Sindicato, Síndico, Sinopse, Sintaxe, Sintético, Sinusite, Situacioni

smo,

Soberbia, Sobrecarga, Sobremesa, Soda limonada, Soda cáustica, Sodomia, Sofá, Sof

tware

49
Versos in Si

Sola de Sapato, Soldado, Solda, Sorveteria, Sorteio, Subentendência, Subdivisão, Suc

esso,

Subúrbio, Subvenção, Subversão, Sucata, Sufoco, Sujeira, Supérfluo,Suplemento,

Super(Sub)produção, Superpopulação, Supressão, Suspensão, e Sobretudo Sobrevivê

ncia.

ˆque Situação!˜

cidade deveria ser com S... de Sapiens! (ou de Sadia?)

na ironia da meta−descrição da obra e da espécie da poeises que queria ser praxis.

acho que é o Suficiente.

Si da Sidade, 27.05.96 e 02.04.99

50
Versos in Si

tempos
Tenho vivido tempos privilegiados

Tenho lido certezas originais

Tenho visto imagens espetaculares

Mais que minha retina pudesse refletir

Tenho ouvido canções e palavras que emocionam

Mais que meus tímpanos trêmulos pudessem saber dançar

Tenho tido muita sorte num tempo arriscado

Tenho uma caneta que falha às vezes

Mas também tenho outras canetas...

Tenho conhecido mais do mundo que minha avó poderia supor que existisse.

Tenho vivenciado experiências ímpares na História de todas as avós.

Tenho viajado ao passado pela História e ao futuro pela Imaginação.

Tenho−me dado de presente, o presente sem culpa.

Tenho honrado meu tempo num tempo em que a Honra tem múltiplos significados.

Tenho visto a lua da minha janela enquanto estou em minha cama de casal, com lençóis

limpos e perfumados, meu travesseiro fofinho, com meus sonhos delirantes, meus filmes,

meus poetas mortos e vivos, bichinhos de pelúcia e arte contemporânea.

Entre a essencialidade e a futilidade acabo sempre me dando um tempo para conceber

51
Versos in Si

quase tudo, independentemente dos significados que foram dados a este quase antes que eu pudesse

vivenciá−lo. Tenho acreditado nas doutrinas mais diversas concomitantemente e sem seguir nenhuma,

respeito a tudo e levo−me por mim.

Tenho feito esportes cerebrais radicais.

Tenho posto postes a iluminar.

Tenho conhecido tantas pessoas de tantas maneiras em tantos lugares, por tantas razões...

às vezes lugar nenhum, às vezes nenhuma razão.

Tenho amado mais que os poetas românticos, com a vantagem de que não preciso escrever poemas

românticos. Nada como fazer alguma coisa sem precisar fazê−lo.

Tenho pensado mais que os filósofos do século passado, com a vantagem de que posso hoje lê−los e ler

os que os leram.

Tenho andado pelo mundo mais que Dom Quixote e seu fiel escudeiro, com a vantagem de que não preciso

resolver o mundo e estou só. Isolamento no qual estão todas as coisas.

Tenho sentido mais emoções que Roberto Carlos, com a vantagem de não ser decadente.

Tenho explorado de mim tudo o que quero, quase tudo o que posso e mais do que preciso.

E não posso reclamar.

Tenho vivido uma vida que posso chamar de minha, ou quase minha.

Tenho−me feito feliz e tenho feito feliz outras pessoas.

Felicidades de graus variáveis, que mudam com o tempo.

Felicidades relativas, flutuantes e cambiáveis. Felicidades temporais.

A Perfeição, o Poder e o Absoluto, eu deixo para os deuses e as idéias.

52
Versos in Si

Tenho mudado tanto que é sempre uma surpresa cada instante,

e é sempre um choque poder ter tido tanto

enquanto tantos não têm. Se é que realmente não têm... Acham que não têm... ˆtodos têm, todos têm..˜,

pelo menos, ˆsuas próprias razões˜.

Talvez seja uma questão de saber o tempo de ter. Ou talvez de conquistar o tempo. Ou aceitá−lo.

Agradecê−lo sem conformismo nem abnegação: respeitá−lo.

Talvez eu não tenha quase nada e se tanto tiver, ainda é muito pouco, mas é o suficiente,

com a vantagem de saber que sempre tudo está conforme seu próprio tempo.

Si e o seu próprio tempo, 10/02/98, 3:34 h e 25/08/98, 1:07 h

53
Versos in Si

(IM)PRECISÕES
Ele me deixou e disse que precisava ser solteiro.

E me disse mais outras muitas coisas, mas as coisas que ele não disse, eu

posso dizer por ele pela ficção que me permite a palavra precisar.

E posso dizer porque embora nunca tenha precisado, eu já havia vivido, mas

ele não, e eu sei que ele realmente:

Precisava mais de filosofias de botequim e de alcova que das minhas poesias.

Precisava ficar sozinho com sua própria vida para sabê-la.

Precisava ser apenas um “eu” e não “nós”.

Precisava não se importar tanto com os outros. Exportar-se.

Precisava do vazio e da solidão disfarçados de liberdade.

Precisava conceber um conceito melhor para liberdade. Conhecer-se e não

conhecer-Si.

Precisava sair à noite sem rumo a procura de qualquer coisa ou de alguém

não específico.

Precisava se permitir conhecer estas coisas e pessoas não específicas e

depois esquecê-las.

Precisava acordar de manhã ao lado de alguém do qual não se lembrava do

nome.

Precisava não ter compromissos nem comprometimentos sentimentais sérios.

Precisava ter um caderninho onde poderia anotar os nomes ou referências de

todas as mulheres conquistadas.

Precisava de novas experiências (tão impreciso!).

54
Versos in Si

Precisava fazer de tudo isso algo que pudesse reafirmar sua masculinidade

neste tempo de crise do patriarcalismo.

Precisava do caminho que não se traça a quatro mãos.

Precisava da ilusão, da promiscuidade e da indiferença.

Precisava do isolamento e da auto-suficiência.

Precisava sofrer depois de um “fora”.

Precisava sentir saudade.

Precisava de tempo e não de amor.

Precisava mais de “Ligações Perigosas”, que “Love Story”s.

Mais da inconseqüência, da “azaração”, da “malhação”, da brincadeira

Que da responsabilidade por ter cativado.

Ele não precisava mais ser príncipe de nem para ninguém,

Não precisava mais de rosas, nem de cobras, nem de Saint Exupéry.

Ele precisava de contos policiais eróticos sem nenhuma qualidade literária

nem engajamento contextual.

Ele precisava de todas estas coisas

Antes que todas as coisas que ele tanto precisava se tornassem muito

imprecisas e fossem corroídas pela realidade das coisas concretamente

necessárias.

Antes que essa vontade passasse.

Antes que a idade avançasse.

Antes que os cabelos caíssem.

55
Versos in Si

Antes que o tempo passasse a sua frente sem que ele pudesse se dar o

direito de deixá-lo passar inutilmente ou que pudesse abraçá-lo ferozmente

numa rotina intensa e diversa do que ele próprio decidisse.

Antes que me culpasse por todas as coisas que ele não havia vivido, sem

saber se poderia ou não vivê-las.

Antes que eu deixasse de compreendê-lo e aceitá-lo.

Antes que eu deixasse de precisá-lo.

Antes que eu o deixasse.

Precisa-Si

13/07/1999. 0:52 h.

56
Versos in Si

MULHERES!,
ao stabilishment...
NÃO!
Minha mãe é semi-analfabeta.

Minha avó era analfabeta.

Minha bisavó era mais que analfabeta.

Minha tataravó vivia em silêncio.

E minha tatataravó não existia.

Minha mãe é cidadã, mas não sabe o que é cidadania.

Minha avó foi cidadã a partir dos 50 anos, o que lhe conferiu um salário mínimo

mensal por ter sido trabalhadora rural a vida inteira.

Minha bisavó não era cidadã.

Minha tataravó era escrava.

Minha tatataravó não existia.

Minha mãe teve mais de um parceiro sexual, e já leu alguma coisa sobre orgasmo,

embora não tenha entendido. A ela o Amor sempre fez sofrer.

Minha avó teve mais de um parceiro sexual, depois de viúva (é claro), mas do

orgasmo soube que era imoral. A ela o Amor sempre foi uma luta de

sobrevivência.

Minha bisavó teve apenas um parceiro sexual e provavelmente nunca soube o

que era um orgasmo. A ela o Amor sempre foi o casamento.

57
Versos in Si

Para minha tataravó sexo não existia. Existia ter filhos. A ela o Amor era coisa de se

ouvir falar.

E para minha tatataravó, o orgasmo não existia. A ela o Amor também não existia.

Estas mulheres não viviam em Atenas, não eram negras, e não foram perseguidas

por causas religiosas, nem políticas. Tinham a religião que lhe era imposta e eram

a-políticas. Eram pobres, extremamente pobres de uma miséria física que se alastra

a outros campos da consciência e do seu estado social, em miséria moral, miséria

espiritual, miséria mental, intelectual, cultural, cívica, e principalmente político-

econômica, miséria que não se controla e desvia seu caráter e dignidade, sua

essencialidade, transformando-as naquilo que convinha ser a fim de que

sobrevivessem. Eram mulheres simples e comuns. Mulheres que não souberam ao

certo o que vinha a ser mulher, nem mesmo em sua definição mais objetiva –

fêmea da espécie homo sapiens. Sua educação, sua cidadania e seu prazer

sempre foram tidos num descaso solene e cruel. Suas vidas foram guiadas, de uma

forma ou de outra, pela vontade do pai, da madrasta má, do marido, em função

dos filhos, seus afazeres domésticos e pequenas atividades que lhes conferiam

algum auxílio financeiro, bordados, tricô, crochê, culinária, lavagem de roupa – o

que cabia a uma mulher decente – e principalmente... pelo stabilishment de suas

épocas, que não variaram muito em seu teor patriarcal, machista, reacionário,

ditatorial e repressor.

AINDA HOJE EXISTEM MULHERES COMO ELAS!

58
Versos in Si

E ainda hoje existem mulheres que não sabem que as mulheres que as

antecederam eram assim também. Mas eu sei. E sei, entre outras coisas, pelo fato

de que alguns de seus genes formam o que eu sou e que ainda hoje sinto do

stabilishment , as mesmas cobranças. Hoje, posso dizer NÃO a ele, mas ele vai

continuar me cobrando altos preços – por não ser como elas e por ter adquirido o

direito de dizer NÃO. Ao stabilishment e a elas todas, hoje eu digo, a mim com

toda a honra que não lhes coube sentir, seja lá pelo que fosse, que sou mais que

alfabetizada; sou cidadã e tenho total ciência do que seja isso; sei perfeitamente

o que vem a ser o sexo, o orgasmo e o Amor, e já tive mais parceiros que qualquer

Don Juan tivera, mais do que qualquer homem de suas épocas (e da minha

também) poderiam imaginar concebível. Digo ao stabilishment e a elas todas, que

hoje sinto e sei (e vou continuar procurando sentir e saber) o que a elas não lhes

coube sentir e saber. Por mim, por elas e pelo prazer de dizer NÃO ao
stabilishment.

Si: MULHER.

26.03.1999, 20:45 h.

59
Versos in Si

NÃO ME QUEREM
“Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?

Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?

Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.

Assim, como sou, tenham paciência!

Vão para o diabo sem mim,

Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!

Para que havermos de ir juntos?”

Álvaro de Campos, Lisbon Revisited

Não me querem por perto

E de certo, nem de longe.

Não me querem o olhar inquisidor que se finge ignorante

Porque conhecem a culpa e não a admitem.

Não me querem ver a testa panfletária

Não me querem avisos nem clamores do futuro

Porque são do passado e já passaram sem legar boas lembranças e se perderam e

deixaram por isso mesmo, condizentes ao comodismo que lhes é tão

característico.

Não me querem as palavras nem o silêncio

Porque sou grito metafísico que esbofeteia sem toque, nem retoque à maquiagem

borrada destas máscaras ridículas.

60
Versos in Si

Não me querem o gesto tímido nem o arruaceiro.

Não me querem... simplesmente

Porque minha presença ou ausência incômoda transformaria até mesmo a ordem

dos detalhes mais irrelevantes de seus cerimoniais.

A Mudança assusta aos inertes e a minha dança balança os seus parâmetros.

Não me querem... inutilmente

Na inutilidade falsificada de suas vidinhas simuladas de quereres.

Queriam-me virgem, igrejeira, moralista e doutora

Se possível feia e rica

Mas acima de tudo, hipócrita.

Queriam-me a menininha adorável e meiga do século passado.

Submissa,

Subserviente

Subestimada

Subalterna

Subjugada

Subordinada

E outros subs para que pudessem se sentir acima.

Menos sublimada ou substancial

E principalmente subversiva

61
Versos in Si

Só que além de tudo, ainda faço versos, medíocres, mas ainda são versos,

inversos, avessos às vezes, mas versos diversos e adversos à culturazinha de merda

que impõem e procuram manter sob quaisquer circunstâncias.

E ainda sou capaz de empunhar a arma que for à revolucionar ou à evoluir

qualquer sistema que seja pad(t)rão.

Queriam-me sim, subterrânea

Queriam-me morta...

Mas eu que teimo, estou viva mais do que poderia.

Queriam-me controlada e equilibrada feito um monge budista

Mas não me deram meditações e sim tapas na cabeça.

Queriam-me dócil e serena feito uma bailarina

Mas não me deram aulas de balé e sim brigas de casal.

Queriam-me vulnerável e dependente feito um filhote de cão

Mas não me ensinaram a brincar com um.

Queriam-me vegetariana e antitabagista feito uma macrobiótica

Mas não me ensinaram nem a andar de bicicleta.

Queriam-me aquela que só diz sim

Mas não!

Não me querem pensante e dona de minhas próprias opiniões e conclusões

Princípios? Não me querem saber dos princípios

62
Versos in Si

Querem o meu fim e não os meus finalmentes

Querem-me embora para onde eu não possa contradizei-los

Querem-me as lágrimas

Porque sabem que rio deles e vou continuar rindo.

Queriam-me careta da sanidade dopada da droga produzida por eles.

Queriam-me

A boca fechada

Os olhos vendados

E as mãos amarradas

Porque faço jus aos meus sentidos

E falo o que eles não gostam de ouvir

Vejo o que eles não querem mostrar

E caminho com as mãos tocando os céus

Porque amo a mim e amo um homem que me ama

(mesmo que a duras penas e à revelia deles)

E tenho os pés nos infernos

Porque os reconheço.

Si, 17/02/1999, 4:14 h. e 23:17 h.

63
Versos in Si

a febre e o frio

O sorriso se apaga

A coluna se curva

E o ventre se fecha

Feito morte,

mas é só o embate entre o frio do amor que se vai e a febre do amor que fi

ca.

O rosto se avermelha feito vergonha

mas é só a angústia.

Os ossos tremem feito medo

mas é só o vício.

Os olhos se molham feito sono

mas é só a saudade.

A minha alma se oculta de mim como se tivesse sido vendida

mas é só a ausência.

64
Versos in Si

O peito arde por dentro feito o centro da terra e a pele exala suores gélido

s feito orvalhos de

inverno

mas é só a tristeza.

A cabeça dói feito doença,

mas é só a descrença.

A boca cala feito ignorância,

mas é só o silêncio.

Si do Amor que Silencia, 13/07/1999. 1:37 h.

65
Versos in Si

a sombra disforme das folhas mais altas

todas as coisas que não estão perto e parecem ser menores

o barulho dos carros ao longe, dissipando-se........................

meus sonhos.... ah! meus sonhos.... quando irão se realizar? se é que um dia vão......

tantos sacrifícios, tantas dores, suores, olheiras, cansaço.... tanto sangue que corre

pelas minhas veias

um dragão morto por dia para ganhar dinheiro e conhecimento....

a luta pela sobrevivência....

como é cruel ter que se esforçar tanto

e como é cruel ter crises existenciais periódicas....

mas diante de todas as minhas misérias, observo as misérias alheias

e às vezes chego a desconfiar seriamente da existência de deus

olho as pessoas pelas ruas

66
Versos in Si

reconhecendo minha irmandade com o mundo

e isso me causa uma dor tão grande

que de toda irmandade, resta-me apenas

uma solidão vazia e silenciosa

quisera perder esta irmandade

quisera perder e morrer logo, sem rodeios

de que me serve esta espera?

sim! quero morrer

ao menos tenho a coragem de assumir isto

assim como tenho assumido todos os sentimentos

mas.... pensando bem

não! não vou morrer! só de pirraça!

não vou sair à francesa do mundo

ainda nem fui à Paris

nem plantei uma árvore

nem livros escritos

nem filhos

mas são exatamente tantas obrigações que me consomem

ainda se o sentido da vida fosse algo objetivamente claro

se fosse ao menos reconhecido.....

mas tem demorado tanto para que alguém justifique tudo o que existe

com outras explicações que não as desta maldita dialética....

era tão mais fácil não saber de absolutamente nada...

67
Versos in Si

ou pensar o mundo dentro daquele bom, velho e pragmático dualismo....

quisera a pureza, a inocência e a energia concentrada nos olhos dos filhotinhos de

animais domésticos

toda a minha humanidade mal tem me servido para simplesmente mantê-la

e não ergo sequer uma bandeira mais

meus objetivos têm sido tão egoístas

que me culpo, mas não me penitencio

porque tenho eu que revolucionar?

justo eu? não poderia ser outra pessoa?

o duro é que provavelmente todos pensam assim

e ninguém nunca revoluciona

nem soluciona toda esta merda

mesmo assim... não vou morrer

e se tiver então que morrer pela minha própria vontade

que seja, como merece, um ato solene

e o cenário.... Grand Canyon!

caída nos braços do eco do meu grito

quisera então me fragmentar por todo aquele espaço

e ganhar irmandade com as pedras, com o ar

o vento levando para algum lugar longe da minha vista todas as minhas angústias

meu peito está tão inflamado como a cratera de algum vulcão

não posso morrer ainda

sou muito jovem

68
Versos in Si

preciso acreditar em deus

e nalgum motivo plausível prá tudo isso

mas tudo me soa tão medíocre...

não! não posso morrer...

existem pessoas que sofreriam com a minha morte

e eu estaria traindo a confiança delas se morresse

na verdade, não tenho vontade nem de morrer, nem de viver

acho que convém mesmo tomar um antidepressivo.

si

07/04/2000

69
Versos in Si

Para que o tempo passa


A veia saltou-me da mão

Senti seus pulsos

Como as plumas sopradas pela brisa neste amanhecer

tristonho

Que razão há para que o sol venha me cansar?

Acaricio-me a veia e deixo que a brisa ainda noturna

Enxágüe-me com ares de futuro

Mais um dia...

Sinto com que passa e pulsa meu peito

Descompasso-me

Os pássaros e outras entidades urbanas

Que quase nunca se mostram

Soam ruídos incógnitos

E suo a sua ausência

E não ouço meus pés sobre as calçadas

Vejo pela veia o ritmo da minha angústia

E sobre os pés o peso do passado

Mas a brisa e suas brumas entram pelos meus olhos

Como o azul-avermelado mesclado ao verde-alaranjado dos

céus

70
Versos in Si

Ou não sei que cores inomináveis do amanhecer

Entram pelos meus poros acinzentados como a cidade

E a veia que deveria esconder-se nas minhas entranhas

Estranha-se comigo e canta seus pulsos sem que me pedisse

Exalta-se num tom de blues e calma acentuada, grave,

sonora

A noite acabou e ainda um fio do consolo de seu frio fica

Para acalmar por um tempo minha árdua têmpora a Fer-ver

pelo que não vê

Você.

Mas para quê?

O tempo passa?

Por que passa tão carinhosa por mim a brisa?

Por quem meu peito pulsa?

A resposta está aquém das cores e dos sons

incompreensíveis

Está além da razão, entre o que fui e o que ainda hei de

ser

Além do tempo que foge com a brisa que passa

Entre o espaço real e o mundo do sonho

No qual ouvi não sei mais ao certo que este amor duraria

durante todos os dias

71
Versos in Si

Em que o sol nascesse

E mesmo que não aparecesse

Ainda seria eu e você

Enquanto houvesse dia

Para que você dissesse que me ama

E esta é a única razão que ainda me dá esperança

Além da razão dos dias subtraídos de Nós

Os dias que nos traem por não terem eu e você

Que não somos mais nem eu nem você

O dia de ontem já foi com o tempo que foi com a brisa que

foi

E o sangue que senti na mão que te procura pelos ventos já

não é mais o mesmo

A dor silencia para ouvir a cor que canta na língua do

horizonte

Por um instante penso que se calou em mim a vida que

passou

Mas não há o que leve sua imagem de traz dos meus olhos

Para que provar do dia então, que não me lança os seus?

Para que o futuro me prove

Como meu pulso prova de mim as notas de um som que sou

E soa seu nome que suo traduzido em lágrima

72
Versos in Si

Como provo deste sal

Como provo dia a dia sua ausência

Amarga, cinza e fria

Para que minha cálida face reconheça

E mereça seu pulsante e santo toque

E todas as noites quentes, doces e iluminadas com as cores

que tem nome:

O seu.

E enquanto vem a veia que vê a valsa vã e volátil

Desta dança de ir e vir de mim

Extremos de sentir prazer e dor

E do fazer o canto condensa-se o coração instrumental em

voz

Decanta-se em mim mensagens deste tempo atroz

E prenúncios imprescindíveis do que virá

E no toque do meu passo lembro do que sou e penso no tempo

que passa...

Para que a poesia pouse

E a crença cresça

Para que estas coisas aconteçam.

Se elas não existissem

73
Versos in Si

Não haveria pulsos que me atiçam o passo enquanto não

estou

No que existi

Nem no que ainda me fará existir

Agora eu não existiria embora ainda seja parte de nós

Nem poderia saber que existo e nem saber que mereceria

Sentir a veia saltar-me a isto

Que faz a poesia.

Si só

16.07.97

74
Versos in Si


Não quero mais cantar a qualidade das coisas

E se fazê−lo (inevitável)

Que meu alfabeto conjugue−as de forma esteticamente aprazível

Conformando−as confortavelmente

Na inserção das mesmas dentro da consciência

Que compreende a compreensão

E que está aberta sempre a novas concepções

Indistintamente

Boas, ruins, belas, horrendas, sensatas, infames, certas, erradas, adequadas ou inaceitáveis

Não importa!

Estou farta das metáforas, das entre−linhas, dos eufemismos, das regras, rédeas.

Quero importar apenas com o que eram antes que lhe dessem adjetivos

Quero cantar o substantivo

O substrato

A raiz

Dizer às coisas todas do mundo que eu as reconheço,

E agradeço que sejam como são

Sem o menor resquício de conformismo

Sem que ao menos paire em mim um fragmento de submissão

Sem que eu seja o que sou por natureza

Apenas mais um objeto do mundo como tudo e

Só.

Si, atrás do MASP, 11.08.98, 18:00 h.

75
Versos in Si

solidão

estar só é estado de não-estar

grão de areia em frente a um mar sem praia

semente infértil

pássaro sem asa

navio velho atracado no cais

não-existência funcional

negação da beleza

e impossibilidade construtiva

cobertura sem pilares

vazio

buraco negro - distante e dialeticamente concentrado e disperso

tendo tudo e nada ao mesmo tempo num não-espaço sem

temporalidade

sentimento de quem cai num abismo interminável

76
Versos in Si

e observa entre a gravidade, nenhuma luz a sua espera...

espera?

não.

abandono.

silêncio?

não.

eco contínuo de silêncio.

encolher-se até se virar ao avesso à procura de si mesmo e não

encontrar nada

nenhuma resposta

e um turbilhão de questionamentos a bombardear idéias

exponencialmente subjetivas

como mísseis que caem num hospital cheio de crianças doentes

a solidão não configura apenas a tristeza, a rejeição e a inferioridade

rompe com a mais preciosa e fundamental propriedade humana:

a de se sociabilizar e constituir laços.

77
Versos in Si

Só Si , 19/10/1999, 23:41 h.

78
Versos in Si

sonho
sonho um sonho santo

um sonho sem sombras

um sonho sóbrio e só

ou um sonho sobrenatural

um sonho sobrevivente, solícito, solteiro

sonho-socorro que soa a canção soberba do sofisma

sonho-soldado que sofre as sobras soltas do soluço

eu sonho um sonho solúvel na solidez sórdida do real

e o meu sonho que se quer soma e solidariedade

solavanca-se e soergue-se como o som do sol

ao se pôr sobre o céu em seu solstício

e no sono que sopra este sonho aos ares da ilusão

somente há o sorriso sorrateiro da sorte subconsciente

suave sossego sorvido pelo efêmero

soberano sal do sentir

suor

eu sonho com você ao meu lado

braço dado no caminho

passo firme que deixa semente de bons frutos em terra fértil

a caminho do centro da Terra

79
Versos in Si

sonho com o seu amor sendo o meu

sonho com o seu corpo no meu

sonho com o meu sonho sendo o seu

e nossas almas sendo uma

no compasso dos nossos passos sendo o som que se ouve quando se sonha

um sonho bom

sonho com você sendo o meu sonho.

si que sonha, 03/02/1997, 3:00 h.

80
Versos in Si

descontrole

paixão encalacrada

que quando liberta, exagera, desata, explode

e quando presa, mata

coisa indefinida, indefinível

sujeito indeterminado

indestrutível no meu peito irregular

fissão incontida

do meu grito sem perspectiva

estrangeiro no deserto

da minha ira possessiva e apaixonada pela paixão

da minha cria transparente, o que sou

poesia dormente

que transforma e deforma esse amor contente e ardente para torturante

e fugazmente corrompe o certo, o próprio, o correto

define o presente

desarruma o passado

e provoca medo do futuro

desorienta.

Si, 23/09/99, 3:15 h.

81
Versos in Si

azaração:

o azar da ação sem muita sorte

o verso que não ficou aquelas coisas

mas... um verso

mais um verso

e só.

como inteligência é indispensável ao movimento harmônico das palavras e das ancas

eu como inteligência temperada com poesia e sexo

mas nem sempre se pode querer tudo e vencer sempre

então... a receita é simples:

tapa-se a boca do animal com uma fruta carnuda

coloca-se o animal num recipiente fechado

cozinha-se rapidamente e deve serví-lo ainda quente

o animal frio pode causar alguns problemas de indigestão, como azia, além das dores de

cabeça.

Si

1999

82
Versos in Si

Da Consolação ao Paraíso
Eu corria naquela manhã ao ritmo da metrópole

Ainda embriagada pela alegria da noite passada

E cansada pelo trabalho da semana

Corria, sem que me desse tempo de contemplar as imagens nitidamente

Fazia barulho e calor, pressa e vontade de voltar para casa

Nesta mescla de fugacidade com gosto de independência e receptividade cósmica

Senti-me como um pássaro. Urbano, diurno e silencioso, mas um pássaro

Para o qual de repente o céu se abriu

E deixou cair sobre as minhas asas

Fagulhas luminosas de um olhar. Único e incondicionalmente preso ao meu. O qual

então fixou-se.

E ao pulsar do sangue agitado

Temi deixá-lo passar

E deixei uma mensagem.

Esperando-a correspondida como o olhar.

Vi-me dialética como Walter Benjamin e difusa como Baudelaire

Flanando num voyeurismo mais que contemporâneo

Em minha solidão, a esperança de deixá-la para trás como as imagens que passam

83
Versos in Si

Estava eu, a mulher que passa...

Questionando o privilégio da dúvida e indagando algum significado para o acaso

Procurando motivos ocultos à efemeridade dos fatos

Vi-me presente à eternidade por alguns poucos minutos

E acreditei piamente nela.

Si

sobre um encontro não marcado

ocorrido entre as estações da Consolação e do Paraíso em São Paulo

11.01.2000

84
Versos in Si

Da montanha à pérola
quero escrever o seu espírito que no meu inscreve-se

crava-se

sangra

e faz correr

impulsiona

minhas células sangüíneas pelas artérias desconhecidas deste corpo

como as pedras que rolam

não!

não criam limbo

mas de tanto se debaterem na corrida

desgastam-se

cansam

lapidam-se

lá despedem os cacos de outrora, fica o futuro que é agora

em faísca da fricção de roçar-se tanto

enquanto em mim amacia o âmago

e incendeia o ânimo

cada toque chama

seu corpo

ausente

um copo então de uísque ou aguardente

ou qualquer veneno que me faça ver

apenas o brilho que a pérola ganha e não o grão perdido da praia

seu espírito no meu me faz sentir em todos os sentidos

85
Versos in Si

tanto a dor na carne da ostra pelo intruso-semente, que de ampla praia, quer ser lua diminuta

grão que já foi montanha

e que se fez tanto lapidar por dores de erosão natural

tempestade de saudade salgada a romper a encosta

ondas, um milhão de vezes a sentir os pulsos-carícias

do-mar-de-amar-antomar

que mesmo em calmaria lhe salgava e que por vezes ao adentrar a firme rocha por entre suas

ondas

em um milhão de coitos passionais e espumantes na espuma-esperma de séculos

foi se tornando a montanha um milhão de pequenas montanhas-grãos

cada grão como uma célula-montanha tem ainda toda força dos séculos

no tempo em que estavam todos juntos e neste tempo ainda não havia

sentido nem a dor de esfacelar-se em grãos e ser milhões como o seu espírito transformado

em-mim-célula nem o prazer-espuma-onda de poder tornar-se pérola...

seu espírito no meu me espreita e eu espero que este veneno-antídoto também me faça valer a

morte da ostra-outra, e que a cada gota de sua lágrima-dor-carne-casa me cubra da força-brilho

mas que só existirá quando a porta do marisco-do-mar-is-ca-sa-do-co-mun-do

fora da ostra, se abrir e a pérola possa ser vista o grão que não consegue abrir a ostra

ostracismada’lma não vira pérola.

Sisolada, 10.07.97

86
Versos in Si

de-cantar-si
castelos de areia e tempo
e então jogar o rosto à brisa e o corpo ao mar e de um amar derramar-se por entre a água

que salga o lado avesso da inércia de não se espantar e adoça a alma em verso e então

se destituir das vestes contrapostas e abrir a vista perspectivada de um horizonte que

antes era imagético ou ainda apenas preso a uma lembrança distante na consciência ainda

à margem de um mar sem praia e então saltar marginal e liberta rumo à textura

desconhecida do fundo disperso pela refração de uma luz mística de momento e mergulhar

aos tempos nos quais tudo era conosco uma só criatura feita de amar pelo simples fato de

conhecer ou justamente por desconhecer espaços laços compassos da esfera efêmera do

reagir e do eterno reviver e então sentir aos pés os passos sobre algas acariciantes e

justapor as mãos sobre o quase plano pano de superfície calma do mar que abraça o

corpo a sentir-se nas mãos do mar em reverência de um quase amém profano de

deslumbre e então paradoxal deixar a maciez e a ternura da água escorrer pela pele e

secar como um beijo que se acaba e descamba por aventurar-se mesmo que seguramente

por entre o rarefeito ar do crepúsculo e a areia povoada de estrelas mortas deste tempo

estrela de calcário que já viveu estrela que nunca brilhou sobre nossas cabeças mas que

mesmo ao entregar-se à morte dança sob nossos pés em simulacros fantasiosos de

referência humana que nos reflete o desejo de entregar-se à vida e então desafiar os

crustáceos que ao desafiar as ondas chegaram à praia e manter relações lúdicas e

antropologicamente férteis de animalidade primitiva e desvencilhar-se de tantas culturas

heterogêneas e amar e temer o crustáceo ingenuamente vendo o raro direcionamento de

87
Versos in Si

sua fuga e temer também o medo e então desafinar as canções e os conceitos sobre a

existência concebendo-se como parte de uma natureza maior que o jardim da nossa casa

bem maior e melhor que o jardim e além e mais autenticamente a nossa casa. E então

retirar heroicamente o lixo da praia e jogá-lo ao lixo inverso da cidade cuja luxúria de

natureza ora artística ora metafísica ora política tantas vezes a nós mesmos já nos

lançamos sem remorso e então acreditar que dentro deste caos perfeito tudo está em

ordem e que não estamos sozinhos sobre a terra tão densamente crescente de ilhas que

se movem pelo mar de ruas e apartamentos camisas de força virtual da crise de um tempo

em crise porque além do desejar o mar existe um mar além que se pode compartilhar e

além deste existe um vivenciá-lo compartilhado que fez nascer um desejar amar um mar

além de uma praia feita de corpo onde as estrelas e crustáceos dançam e lutam na

coreografia regida pelo olhar ao som da poesia e então metalinguisticamente entregar-se

ao mar e aos ventos como uma criança de quatro anos e desprender-se das forças e dos

tempos e deixar-se flácida e cálida declarar-se como uma adolescente um amor de lúdico

desejo contundente e ser romântica e parnasiana e modernista e nada disso ou tudo e

então jogar a palavra ao brilho dos seus olhos e o corpo ao desejo do seu e então

derramar-me por entre as águas do teu espírito e destituir-me de hipocrisias impostas e

abrir o peito porto perplexo de amores vãos e saltar sobre o vão dos pensamentos e

aventura-me por entre os seus ainda que sobre a folha compartilhada que em palavra

cresce e então acreditar nas paisagens que existem além do mar que ainda se

desconhece si 16.09.1997 1:30 h

88
Versos in Si

desejo chamado João


entrei num torpor calmo

de vontade, saudade e perda

do que mal tenho – o seu sorriso

e tive vontade de não ter vontades

senti inveja dos ventos que acariciam os seus cabelos

e vi minhas mãos presas por algemas de fidelidades

meus lábios sedentos de beijos proibidos

e meus pensamentos subordinados a uma única obsessão: o seu corpo

João, que é nome de rua e de santo

agora é o nome do meu desejo

que grita rumores de traição e compõe sinfonias minimalistas

que acelera o pulso, desencadeia a produção de hormônios e move meus passos e olhos em sua

direção

desejo perverso aos valores do correto

desejo que por sua natureza própria de ser desejo

quer romper o limite do concebível, controlável, aceitável e admissível

e cair de asas abertas aos abismos imorais da sedução

destruindo os medos que escurecem os olhos, secam a garganta, enrugam a testa e deixam um

aperto insuportável no peito

desejo que desorganiza, desestabiliza e desestrutura princípios anteriores,

corrigindo a receita da vida racional

apagando os desígnios da constância

89
Versos in Si

catalisando reações aleatórias

e conduzindo a caminhos adversos

que me lançam à dimensão imprópria dos pecados estampados

neste meu torpor

que se chama desejo, que se chama João.

Si, 27/10/1999,19:00 h.

90
Versos in Si

em comum
minha cabeça no seu ombro

nosso colchão

o quarto de estudos

nosso sono e nossa fome

metade da minha parte do lanche

nosso x-salada

o quase 2

meu passo curto e sua pressa

nosso caminho

algum lugar

meu Caetano Veloso e seu Milton Nascimento

nossa música

do fundo do coração e da boca prá fora

meu ciúme e sua liberdade

91
Versos in Si

nossa angústia e nossa paixão

espaço sem intersecção

minhas pernas na sua cintura

nossa dança

palco

minhas mãos nas suas costas

massagens, cremes e consolos

nosso prazer

o meu beber e seu ponderar

nosso brinde

e nossa cerveja

minha arquitetura moderna e seu controle ambiental

nossa pesquisa e nossas ânsias

cinema e jornalismo

nossos sonhos

viagens

Rio, Ridícula, Cabo Frio, Broa, Bambina

92
Versos in Si

mar e piscina

Sesc e Academia

minha ginástica e seu judô

nossos corpos e nossa imagem

espelhos e fotos

sobras e faltas

sua fraternidade e minha saudade

minha dor e seus conflitos

minha mão na sua mão

nosso amor

Si para K.

05/02/99, 12:05 h.

93
Versos in Si

le-nine
le-nine-le

nine-me

nine-me

le

ão

le

do

ão

que

existe tanto na canção le

nave que me leva le

navegue-me e nine-me le

e me mime le

mimeticamente à melodia leonine

deixe que eu deite debaixo do cacho mais louro do seu corpo le

nine-me leninemente

e deixe que eu escorregue por sua nota Si

pela curva da sua boca quando sorri

le-ia-me-le

Si

para Le

15/09/98

12:24 h.

94
Versos in Si

95
Versos in Si

O Meu Homem
Meu Homem tem um brilho malicioso no olhar. Um sorriso amigo.

Uma aura que mistura sua natureza animal e sua natureza cultural.

Tem nos olhos a experiência e a juventude de quem vê uma paisagem infinita.

E sabe que pode chegar até lá e continuar vislumbrando horizontes sempre mais

bonitos.

O Meu Homem é a resposta arquetípica dos meus sonhos.

É a peça do meu quebra-coração.

Meu Homem me dá seu peito prá minha cabeça descansar, onde eu me sinto segura

na mais absoluta liberdade.

O Meu Homem é meu complementar genético em locus psicológicos.

É o evento perfeito dentro da probabilidade incomensurável das criações divinas.

Meu Homem fala a minha língua e é o meu sócio na descoberta de uma linguagem

única e Nossa.

Meu Homem canta as músicas que eu quero ouvir.

Meu Homem é a fonte sagrada de onde meu espírito de Mulher bebe para que sua

sede de existir não cesse.

Meu Homem é artista e sabe ver o universo com liberdade e humildade.

É o porto-seguro, a ponte, o porta-aviões,

A estrada e o farol.

96
Versos in Si

Meu Homem tem o cheiro cúmplice do meu corpo.

Companheiro, tem a mão na minha mão. E o olhar que contempla o presente.

E na boca, nem o não, nem o sim, nem o talvez, mas o diálogo que leva ao consenso,

ao respeito e à consciência.

Meu Homem me beija com o espírito, sem receios, com verdade e convicção.

Meu Homem parte dizendo que volta e volta dizendo que fica.

Corre ao meu encontro e segurando-me pela cintura, ergue-me como um filho.

Joga os cabelos ao vento e grita que me ama.

Corre perigo, ousa, experimenta, insiste, teima, tenta e treme com meu toque.

Meu Homem é a soma de todos os homens que eu já pude seduzir e que me

seduziram e se complementa com o que somos.

É sensível, boa pinta, conta piadas inteligentes e está sorrindo quase sempre.

Sofre, se desilude, se indigna, cai e se ergue para dizer alguma coisa que possa

resolver ou acalmar seu pranto.

Urbanamente noturno, é elegante e dança todos os ritmos.

Bucolicamente contemplativo, é poeta e compõe em todas as linguagens.

Acorda sempre em outro sonho comigo e faz amor no café da manhã, no final da

tarde e antes de dormir, e fica sempre dizendo que me ama.

O Meu Homem me dá hiper-orgasmos múltiplos, exponenciais e consecutivos.

Conhece meu corpo, sabe o que eu penso e sente o que eu sinto.

Sinderela, 25/08/98, 0:07 h.

97
Versos in Si

coisas que impressionam

As flores cor-de-rosa caem por entre a luz

difusa e os ares frescos

Caem sobre as folhas secas, miméticas ao piso

e as sombras das arvóres

Sombras orgânicas que compõem com os

pássaros uma ímpar sinfonia ambiental

mesclada à conversa das pessoas sentadas nos

bancos-corpos-de-prova de concreto, apoiados

98
Versos in Si

nas mesas também de concreto e discretas, as

flores cor-de-rosa caem...

Caem poéticas

Caem quase etéreas

E a luz desta praça jamais cairá da minha

retina.

Simpressionante, 22/06/98, 11:15 h.

99
Versos in Si

ESTUPIDEZ
estupidamente resplandecido na minha

mente, em cada impulso sináptico que

me arrepia os neurônios, lá está vc,

aderente, inerente, esculpido,

escarrado, grudado deliciosamente

em cada gene.

Você foi feito prá mim, sob medida

para o meu exercício de ser gente e ser

feliz

Sistúpida, sempre

100
Versos in Si

inaudivelmente sonoro

a voz do surdo

rompe a barreira do silêncio

ouve mudo atento

e no mundo desatento

não houve

quem não ouviu

ou viu

a surdez

das barreiras gritantes

do que falta

o que se faz mais presente

si e tó

07.05.96

101
Versos in Si

NOVOS ARES
ares de mar em tempestade

ares de vulcão

ares de céu as seis da tarde repleto de

relâmpagos

ares de nossos hálitos amantes

ares de arautos sagrados que anunciam

revolucionariamente uma nova onda, uma nova

massa de pensamentos, a carregar a nossa

existência, a encher os nossos pulmões de

oxigênios cantores de ópera; nosso sangue de

hemáceas guitarristas, e nosso cérebro de

substâncias alienígenas que viajam pelas nossas

sinapses em forma de estrelas ascendentes.

Si. 1998/9

102
Versos in Si

Sem tidos
O ronco do motor do trator

O miado dos pássaros

O piado dos gatos

As piadas das loiras

O cheiro das entranhas da terra

E o perfume do desinfetante do banheiro

Das cores restam a sensação de que não

querem interferir

103
Versos in Si

Menos a cor das flores cor de rosa dos ipês

Menos também as roupas de algumas

pessoas que interferem

Há também as pombas e suas pulgas

Ninguém gosta das pombas.

Eu gosto.

Si, 22/06/98, 13:30 h.

104
Versos in Si

eu e isso
PREFÁCIO:

“Sem título”

Primeira voz: Vi Marijuana,

fumei Rimbaut e

Li Hollywood depois de um dia ruim.

Escrevi alguma coisa sobre alguma coisa,

Segunda voz: isso e aquilo outro

Terceira voz: e eu. eis.

105
Versos in Si

ATO I OU INTRODUÇÃO:

“ESTAMOS AQUI... E AGORA?”

Segunda voz: Há algo que pulsa alem do quantum

E possui códigos específicos para cada freqüência sua

E da combinação destes códigos

resulta o que somos ou o que estamos

Sua pulsação varia constantemente em resposta a outras pulsações

a s m a i s p r ó x i m a s

Este estado de estar perto


Esta velocidade do pensamento no percurso das viagens

São a senha que acessa essa percepção do outro e desta comunicação surgiu

o fato de existirmos
Primeira voz: Fazer o quê?

106
Versos in Si

ATO II ou DESENVOLVIMENTO:

“ Qual é o segredo???”

Segunda voz: Canta abaixo da ágora dos mitos uma melodia

de sentidos com configurações caóticas num compasso específico:o da normalidade,o s

enso comum,o stabilishment,o status quo

Primeira voz: ... ou identidade???


Terceira voz: Há verdades para todos os gostos, tipos, crenças e todos os

etecéteras - verdades metamorfoseantes e metalingüísticas. Ainda sobrevive - a

verdade de que a verdade que sobrevive é a mais forte. ... ou é mais forte

porque sobrevive???

Segunda voz: Darwin ou Tostines???

Primeira voz: Quem se importa???


Terceira voz: Para que saber as razões de tudo? De onde vem essa ânsia

pela verdade? Para que nos segue esta gana pela conquista de novos horizontes

para vislumbrar???

Segunda voz: Tanta coisa...

Terceira voz: E como “coisa” pode ser tudo: Por tudo. Ou por nada.

Primeira voz: O que dá no mesmo. Que tédio!!!

107
Versos in Si

ATO III ou CONCLUSÃO:

“X”

Segunda voz: Estar solto no ar como a fumaça do cigarro plasmando-se a

ele numa cópula química. Estar absorto numa paisagem que lhe seduz. Ouvir

seus galanteios. Deixar-se tocar por sua luz. SENTIR o SABOR do SABER.

Primeira voz: E soar-lhe a resposta indizível de

gratidão:

amar... ah! mar.... Cujas ondas de orgasmos

esculpem a areia dos meus olhos e me faz derramar

o que sou e estampar-me na cara o que tenho: eu

Tirar as máscaras e deitar a cabeça em suas

entranhas. Buscar-lhe

ante o mar... antonio ...antomar ...marcantonio

...antenor... Sinfonia de amores assonantes,

108
Versos in Si

distintos exemplares do mundo que me cabe ou do

mundo que não contenho, do mundo que liberto

para que venha sempre me libertar do que não

decifro na entrega íntegra e irreversível de mim a

isso que pulsa alem do quantum e canta abaixo da

ágora dos mitos: O que fica e me constrói.

Transforma meu passado em história, meu

presente em presente, meu futuro em verdade

possível e eu no que sou .................seja lá quem

seja... eu....... ou..... isso....... eu e isso somos mais

fortes que o limite e que qualquer dos etecetaras

que tece taras e que não são eu nem isso. Por isso:

109
Versos in Si

Terceira voz: RECONHEÇO-ME. (pausa)

E eu que sou alegre

Primeira voz: que sou triste

Segunda voz:e que sou poeta, olho nos olhos da vida com a expressão

que existe entre o sorriso e a lágrima:

Terceira voz: Olho com a expressão que me cabe de Respeito-Resposta ao

que SINTO ou SEI que existe

Primeira voz: E... nesta fusão de lucidez e

loucura em que vivo embriagada de vida

ACEITO-ME

110
Versos in Si

ACEITO ISSO.
Si.17.07.1998, 2:05 h.

111
Versos in Si

Índice.
Não quero 02
Palavra 03
A parte 04
A não poesia 06
A cópia da cópia da 08
Cá beco 10
Contraponto 13
Há ar e risco 15
Investigação 16
Quase1 ou Tudo 18
Quase 2 20
Reflexos (in)versos, reflexões e (in)versões 21
Insinuando 23
Desencanto Scinéfilo 24
Encanto Scinéfilo 25
Wenders à cidade 26
...Vê... 28
Centros 29
Do futebol 31
Entre postes, posses e poses 32
Ouro Preto 34
Sidade 36
Tempos 38
(im)precisões 40
Mulheres!, ao stabilishment...não! 42
Não me querem 45
A febre e o frio 48
Limiar 49
Para que o tempo passa 52
Só 55
Solidão 56
Sonho 57
Descontrole 58
Azaração 59
Da Consolação ao Paraíso 60
Da Montanha à perola 61
De-Cantar-Si 63
Desejo chamado João 65

112
Versos in Si

Em comum 66
Le-nine 68
O Meu Homem 69
Coisas que impressionam 71
Estupidez 72
Inaudivelmente sonoro 73
Novos Ares 74
Sem tidos 75
Eu e Isso 76

113

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