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Boa tarde a todos que estão aqui ou que nos acom- nil. Para a minha grata surpresa nesse momento
panham pela transmissão. É uma oportunidade percebo que é possível escutar um grupo, princi-
única poder estar aqui no CRP, apresentando palmente sob o ponto de vista teórico. Voltei aos
esse nosso trabalho do Margens Clínicas, porque textos clássicos do Pichon Rivière, e consultei
me parece necessário transformar algumas das uma autora que pra mim foi bastante importante,
nossas ideias que acontecem internamente, coi- chamada Graciela Jasiner. Esta autora escreveu
sas que a gente escuta e nos mobiliza a pensar um livro chamado “Coordenando Grupos2”, que
em algo publico, em algo compartilhado, o que para mim cumpriu uma função importante tradu-
Como foi anunciado aqui, faço parte do Circulo radigma e, acima de tudo, de denuncia daquele
Palmarino, uma entidade nacional do Movimento processo. Então, também não é a toa que é nesse
Negro e que nos últimos oito anos vem tentando momento que a Rota é mais ativa, mas também é
construir um debate politico, uma leitura a partir nesse momento que o movimento hip hop surge
da conjuntura de quais são os desafios que estão com maior intensidade, e eu costumo dizer que
colocados para o enfrentamento do racismo e se alguém quer entender um pouco o que foi a
quais são as características desse racismo que, na década de 90 no nosso Brasil, ter um raio x do
nossa concepção, é estrutural da sociedade bra- Brasil na década de 90, basta ouvir “Raio X do
sileira e vem construindo varias engenharias. Se Brasil”, do Racionais MC’s. Mas temos uma infle-
por um lado, o debate do racismo não estava ne- xão também, que aconteceu nos últimos 12 anos,
cessariamente colocado no processo escravocra- e é inegável que houve mudanças mas que pro-
ta, foi justamente a acumulação de riqueza que se duziram uma dinâmica que também reflete e, de
construiu nesse período e o projeto de nação que certa maneira, mantem essa profunda desigual-
se construiu no pós-abolição é a engenharia que dade. É importante dizer que foi nesses últimos
produziu o verdadeiro abismo econômico, social 12 anos que mais se avançou na regulação e na
e cultural entre negros e não negros na sociedade ampliação de espaços institucionais para se de-
brasileira. Essa engenharia vai sendo moldada ao bater a questão das políticas ditas de promoção
longo dos tempos até chegar aos dias de hoje pro- da igualdade racial, fruto obviamente de toda
duzindo, mantendo, apesar de algumas inflexões uma pressão do movimento popular e daquilo
algumas mudanças no caminho, uma profunda que se acumulou nos últimos anos. A primeira lei
desigualdade entre negros e não negros na so- que o Lula assinou foi a Lei 10.639, que institui
ciedade brasileira e que se materializa na nossa a obrigatoriedade do ensino da historia e da cul-
concepção de diversas formas. tura africana, afro-brasileira em todas as esferas
Como já mencionado em mesa anterior nesse de ensino. Logo em seguida, a formação da CPIR,
processo de redemocratização do Brasil tivemos o próprio Estatuto de Igualdade Racial, as três
acesso a um documento da Escola Superior de conferencias da igualdade racial. Inclusive na ul-
Guerra Na década de 90, a Escola Superior de tima conferencia, a Presidente Dilma afirmou que
Guerra trouxe uma discussão sobre quais eram os reconhecia a existência do racismo, que o exter-
desafios para o desenvolvimento do país nos pró- mínio da juventude negra era um dos principais
ximos 20 anos e eles encontravam dois elemen- sintomas desse processo e a única coisa que ela
tos centrais que poderiam impedir o processo de apresentou de fato, de novidade foi os 20% de
desenvolvimento do Brasil, um eram os cinturões cotas no serviço publico. Mas vivemos uma con-
de miséria, frito daquele modelo neoliberal, de tradição. Acabou de sair uma preliminar do mapa
desemprego estrutural, de redução das políticas da violência que aponta que só em 2012, 56 mil
de estado e o outro elemento era, que também é pessoas foram assassinadas em nosso país sendo
fruto desse modelo, que é a questão dos meno- ampla maioria jovens entre 15 e 29 anos, e em
res abandonados e que esse contingente poderia torno de quase 70% jovens negros.
ser superior aos aparatos repressores e que era A contradição é que enquanto se avança do
necessário sistematicamente combater esse seg- ponto de vista da representação e de marcos re-
mento. E não é a toa que é justamente nesse pe- gulatórios institucionais, permanece um proces-
ríodo, que a Rota atuou de forma mais ativa no so de desigualdade e um processo sistemático de
estado de São Paulo, nesse período de transição extermínio, que, para nós, gera um genocídio.
entre o final da década de 80, inicio da década Isso não é algo factual, não é algo momentâneo,
de 90. E também é nesse momento que são cons- mas algo que vem se estruturando ao longo dos
truidas varias bases de resistência, inclusive da séculos e que se materializa numa política sis-
juventude periférica, através da cultura, princi- temática que coloca essa população numa con-
palmente da cultura hip hop , como um elemento dição de vulnerabilidade e de exclusão social.
de contestação e de construção de um novo pa- Para conseguirmos ter uma percepção do porque
dessa contradição, é preciso pensar a conjuntura neráveis, que produz um aumento sistemático da 29
em que estamos colocados, em que se tem uma violência. Por isso que na nossa leitura é algo es-
inflexão de um lado, do ponto de vista de garan- truturante e que por isso não é algo factual, não é