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UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz

Data: Ilhéus, 26 de agosto de 2014.

Aluno: André Felipe Malta Santos

Disciplina: Economia Brasileira Contemporânea

Professor: Maria Bernadete Pereira Bezerra

SÍNTESE – HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL


TEXTO DE CAIO PRADO JUNIOR

O ajustamento do Brasil à nova ordem imperialista se processou sem


modificação da produção de gêneros destinados ao exterior, pelo contrário
apenas reforçou e consolidou este caráter fundamental da economia do país.
No entanto ascenderam as contradições inerentes deste sistema que vêm
desde o início do século passado e tiveram como consequências grandes
transformações obtendo o seu ápice na fase imperialista a que chegamos no
fim do século.

Desta forma, verifica-se a incompatibilidade substancial entre o novo progresso


material atingido e sua modesta categoria de mero produtor de matéria prima
destinada ao comercio internacional. Não era possível manter uma estrutura
econômica e social imposta pelas novas condições do mundo. Isso pode ser
observado analisando o problema que consistia em sustentar o ritmo do
desenvolvimento adquirido pelo país com a produção exclusiva de alguns
gêneros que se mostravam insuficientes para a função que se exigia deles.

Apesar de tentativas fracassadas de substituir essas produções decadentes o


resultado era sempre medíocre. Estes fatos comprovam que não era mais
possível manter a economia brasileira e sua vitalidade, dentro de seu antigo
sistema produtivo. Apresenta-se então a perspectiva de estagnação e
decadência, o que ocorreu na maior parte do país, mas em outros setores.
Graças a circunstancias especiais, irá se desenvolver novas formas
econômicas que conseguirão manter a vitalidade brasileira. O progresso desta
nova economia é condicionado pela constituição de um mercado interno.

Para isto, é necessário o crescimento da população e a elevação do seu


padrão de vida, exigências e necessidades, assim como o progresso
tecnológico dos transportes e comunicações, o progresso industrial em geral.
Essa expansão teve de ser atendida por importações crescentes, o que se
tornará cada vez mais difícil pelo desequilíbrio financeiro que provoca. Este
desequilíbrio determina situações e condiciona medidas que estimulam a
produção interna e sua diversificação. Aos poucos a produção interna fará
frente as solicitações de consumo.

A indústria nacional veio substituir com seus produtos a importação de


consumo corrente, os bens duráveis e os bens de produção. A produção
interna teve de suprir as falhas relacionadas as dificuldades de abastecimento
exterior do país e da perturbação sofrida pelo comércio internacional. Contudo
no decênio que se segue a guerra, este processo estimulará fortemente a
produção de gêneros exportáveis e ao mesmo tempo a situação financeira
favorece a importação em prejuízo da produção indígena. A indústria
manufatureira que trabalha só para o consumo interno, é particularmente
atingida e sofre forte crise em virtude da concorrência com manufaturas
importadas. Este breve retorno ao passado não representará mais que uma
conjuntura passageira, pois o setor nacional se fortalece e ganha cada vez
mais raízes na vida do país.

É depois de 1930 que este processo se acentua, pois a crise de 1929


repercutirá gravemente no Brasil com a queda do valor dos produtos
fundamentais que assentava sua vida econômica e gera como consequência
grande redução das exportações e a estagnação do afluxo regular dos capitais
estrangeiros que antes alimentavam a economia do país e havia se tornado
indispensável.

Tudo isto determinará naturalmente um brusco e profundo desequilíbrio das


contas externas do país e um déficit considerável. Como consequência, as
importações declinam fortemente. Contudo apesar da crise, veremos crescer a
produção brasileira de consumo interno tanto agrícola como industrial.
Destaca-se assim, o processo de nacionalização da economia do país que
resultava no progresso de sua nova economia voltada para necessidades
próprias.

Esse progresso, no entanto, terá momentâneos retornos ao passado e contra


sua transformação reagirão forças poderosas que tendem a manter o país em
sua primitiva situação. As perspectivas do Brasil como fornecedor do comercio
internacional tornam-se assim, mínimas. O café, por exemplo, que durante
muito tempo lhe garantiu uma posição notável pouco poderá lhe dar.
Entretanto, insistiu-se na expansão desmesurada das culturas.

No café se apoiava a maior parte da existência do país e para sustentar lhe o


peso era preciso estimulá-lo Como consequência em 1925 a produção de café
ultrapassa as exportações e este desequilíbrio teve de ser corrigida a custa de
pesados sacrifícios em particular a destruição de volumes imensos do produto.
É preciso levar em conta que a produção cafeeira hoje, diferente de mais de
meio século atrás, tem concorrentes são numerosos e respeitáveis. Além disso,
a lavoura cafeeira se encontra em decadência sua produtividade e rendimentos
declinam e os custos tendem a ultrapassar os preços o que torna, portanto,
impossível repetir o exemplo do passado.

Dessa forma, são muito limitadas as perspectivas do Brasil como fornecedor de


matérias primas e gêneros tropicais. As perspectivas do nosso intercambio
externo também não se mostram favoráveis. E com isto todo um velho sistema
econômico entra em decomposição, e esse processo vem de longa data. Isto
evidencia que a base oferecida pelo nosso antigo sistema, voltada para o
exterior, se torna mais estreita e incapaz de sustentar a vida no país, tal como
o imperialismo, paralelamente, também já se encontra em crise.

Essas circunstancias levarão a economia brasileira para novos rumos, como


refazer-se sobre outras bases, deixar de ser um simples fornecedor do
comercio e dos mercados internacionais e tornar-se efetivamente um sistema
organizado de produção e distribuição de recursos do país para satisfação das
necessidades de sua população.

No entanto, essa transformação ainda têm forças que contenham seu ritmo,
seja pelos interesses formados na ordem passada ou pela inercia de toda a
parte importante e substancial que se constituiu em função de uma finalidade e
agora é solicitada por outra. O essencial da organização econômica do país
nos mostra que sempre objetivou atender a produção de gêneros exportáveis.

Por outro lado, a transformação parcial que operou-se, fez-se defeituosa e


culminou num crescimento industrial desordenado, desconexo, mal estruturado
e fundamentado. Deste modo, por força das circunstancias peculiares em que
se realizou a evolução econômica brasileira, a transformação que nela se está
operando encontra pela frente grandes embaraços.

Sobre essa evolução é importante inferir que a II Guerra Mundial (1839-1945)


trouxe grandes modificações na evolução de todos os povos. Mas, apesar das
repercussões profundas com que se marcou na evolução econômica brasileira,
não alterou essencialmente o processo de transformação nela observado
decênios antes, e a crise do nosso sistema colonial se manteve. Por outro lado,
o país ingressa numa fase em que a par do crescimento (em particular o
progresso industrial), se verificarão acentuados e crescentes desequilíbrios e
desajustamentos que se prolongam na vida social e politica.

No curso da guerra, assistimos a um revigoramento do tradicional sistema do


passado (economia exportadora primaria voltada para o exterior). Ao mesmo
tempo em que assim se valoriza a exportação, declina importação. De um lado,
interrompiam-se quase completamente os fornecimentos dos países europeus
isolados de nós pela guerra, doutro, os Estados Unidos, ocupados como
também estavam na produção de guerra, não puderam suprir aquele desfalque
de nossos fornecedores europeus.
Em consequência do aumento da exportação e declínio das importações,
desparece momentaneamente, o desequilíbrio crônico da balança de
pagamentos exteriores e como efeito disso, a moeda brasileira adquire
estabilidade cambial. Por outro lado, o acumulo de saldos comerciais obrigou
fortes emissões destinadas a aquisição das divisas representativas daqueles
saldos e que não encontravam compradores no mercado ordinário, isto é, entre
importadores. Essas emissões constituíram o ponto de partida do processo
inflacionário que se prolongará até o momento presente.

As restrições do comercio importador ainda terão outra consequência


importante, privado do abastecimento externo, o mercado interno precisará
recorrer a produção nacional o que abrirá amplas perspectivas para as
atividades industriais do país. Além disso, a indústria brasileira não será
solicitada unicamente pelo mercado interno, alguns de seus setores mais
desenvolvidos encontrarão também alguns mercados externos.

A economia brasileira encontrava assim, graças as circunstancias excepcionais


da guerra, um novo equilíbrio provisório, e apesar dos grandes sacrifícios
suportados pelo país, os anos de duração do conflito representam uma fase de
nítido progresso. Este se fazia à custa da massa trabalhadora do país. A
pressão sobre o mercado por efeito de uma oferta insuficiente de mercadorias,
bem como a inflação do meio circulante provocam uma rápida ascensão de
preços, o que eu em boa parte, será devido ao vigente regime ditatorial e
consequente restrição a liberdade publicas que colocava os trabalhadores em
situação desfavorável na luta por melhores condições de vida.

No entanto, esse momentâneo equilíbrio e artificial prosperidade começam a


declinar na medida em que desaparecem as circunstancias extraordinárias que
os tinha provocado. O impulso dado as exportações já não contrabalança o
aumento das importações cujo progresso espetacular no imediato após-guerra
foi terminado, sobretudo por duas ordens de fatores: de um lado a necessidade
de repor o material desgastado e não substituído durante o período de
interrupção das importações; doutro, o grande poder aquisitivo acumulado em
alguns setores da população, reflexo do enriquecimento de classes
possuidoras.

Em 1947 o valor das importações ultrapassa o da exportação, deixando déficit


de US$ 55 milhões. Nos anos seguintes a situação do balanço comercial
melhora ligeiramente deixando em 1948 e 1949 saldos respectivamente de 88
e 17 milhões. Em consequência da posição pesadamente deficitária de nossas
contas externas, acumulam-se no pós-guerra os atrasados comerciais. Em
1947 esses atrasados cifram-se em US$ 82 milhões, com grande dano para o
nosso crédito comercial no exterior. Muitos fornecedores suspendem suas
remessas para o Brasil; e diferentes indústrias são obrigadas a reduzir o ritmo
de produção o que faz pairar certa ameaça até sobre o fornecimento de
combustíveis.

Além disso, a drástica restrição às importações estimulam a alta de preços e o


ritmo do processo inflacionário que vinha do período de guerra e a que já se fez
referência. Este fato será um dos principais fatores imediatos da inflação e
desvalorização da moeda brasileira até os dias atuais. A conjuntura melhorará
com a valorização do café que acompanha a alta geral de preços das matérias-
primas e dos gêneros alimentares.

O ano de 1950 trará para o Brasil um saldo comercial vultoso, reequilibrando-


se em consequência as contas externas do país. Coincide-se a isso, o inicio do
novo governo do presidente Getúlio Vargas, que se aproveitará dela para
lançar um programa de fomento da atividade industrial e na previsão de uma
nova guerra, acumularam-se grandes estoques.

Constituía tudo isso, um jogo muito perigoso, pois em vez de se aproveitar a


ocasião para marchar no sentido de uma remodelação profunda e de base da
economia brasileira, preferiu-se assentar o projetado desenvolvimento
industrial nos fundamentos precários de uma conjuntura apenas
momentaneamente favorável e prenhe de incertezas.

O desequilíbrio da balança comercial alcança em 1952 um déficit recorde de


541 milhões. Como consequência acumulam-se os atrasados comerciais que
atingem outro nível recorde: cerca de 550 milhões. Acrescenta-se a isso a
aceleração do processo inflacionário auto estimulante e de efeitos cumulativos
que se prolongará pelos tempos afora com todas as danosas consequências
que lhe são cabíveis. Pra fazer frente ao desequilíbrio, o governo volta aos
processos clássicos e aos expedientes de emergência destinados a
resguardarem os interesses da esfera do negocio: as restrições drásticas e
indiscriminadas das importações.

Ao mesmo tempo, libera-se o cambio criando o mercado livre que seria


alimentado pela venda que nele se autorizava das divisas provenientes da
exportação de alguns produtos, divisas essas destinadas a cobertura de
remessas financeiras para o exterior. Visava-se obter com o novo sistema dois
resultados: de um lado, valorizavam-se em moeda nacional as exportações
cujo produto em divisas se vendia no mercado livre; de outro lado,
estimulavam-se o afluxo de capitais, bem como ao retorno deles ao país de
origem. Essa generosa concessão aos interesses imperialistas é bem reflexo
da mentalidade colonialista das autoridades brasileiras.

O novo regime cambial foi parcialmente modificado pouco depois por força da
qual passaram a se realizar pela taxa oficial todas as exportações e
importações, ficando confinado o mercado de taxas livres às transações de
caráter meramente financeiro. Os favores, antes concedidos à exportação de
algumas mercadorias eram substituídos por “bonificações”. Quanto as
importações sujeitavam-se as licenças respectivas à obtenção prévia de
“promessas de venda de cambio” oferecidas a licitação da Bolsa.

Observa-se que o novo sistema introduzido pela Instrução n. 70 representava


mais um passo no sentido do retorno a plena liberdade comercial e cambial,
em substituição ao controle introduzido em 1948, pelo sistema de licença
previa para importações. Por esse novo sistema da Instrução n. 70, as licenças
previas ou PVC seriam vendidos em leilão, isto é, cedidas pelo maior preço
oferecido. Isso significava de fato a libertação do cambio e do comercio
exterior, ficando as importações sujeitas unicamente ao livre jogo de mercado.

É certo que o sistema preconizado na lei de 1948 nunca se aplicara


adequadamente e sempre faltou um plano geral e racional que presidisse à
concessão de licenças prévias e subordinasse assim a importação às reais e
essenciais necessidades do país. Mas em vez de se sanarem seus defeitos
dotando-o de critérios racionais para a concessão de licenças de importação,
ele é de fato abandonado e substituído pela liberdade comercial.

Trata-se aí na realidade do choque de duas concepções opostas: Uma que


reconhece a situação peculiar e toda especial da economia e das finanças do
Brasil que exigem uma regulamentação rigorosa da utilização dos parcos e de
todo insuficiente recursos em divisas com que o país conta, e outra, que em
oposição, encontra-se a concepção liberal, inspirada por um pensamento
econômico sem nenhuma justificação no Brasil e amparada pelos interesses
tanto nacionais como estrangeiros, ligados à tradicional ordem econômica
dominante no país e que julga preferível confiar na livre iniciativa privada,
deixando a seu cargo, na base do livre jogo do mercado e da oscilação de
preços daí derivada, a seleção das importações e a utilização das divisas
disponíveis. Diante de todo o exposto, pode-se observar que com a Instrução
n. 70, é esta ultima solução que se consagrará.

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