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Corpos-em-arte:
O QUE PODEM OS CORPOS
NO PROCESSO DE VIVER O ?
BELEM PARÁ
2019
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Corpos-em-arte:
O QUE PODEM OS CORPOS
NO PROCESSO DE VIVER O ?
BELEM PARÁ
2019
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CDD 150
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4.3
O cuidado instaura um novo corpo
Sentir que algo está faltando, alguém, que o coração deseja, está longe. Mas
não basta a ausência. Há muitas coisas que se perderam e ficaram para trás,
das quais não sentimos saudade. É que a gente não amava. A saudade nasce
quando existe amor e ausência.
Quando as coisas despertam saudades e fazem brotar, no coração, a
memória do amor e o desejo da volta, dizemos que são sacramentos. Sacramento
é isto: sinal visível de uma ausência, símbolo que nos faz pensar em retorno .
Sacramento
Rubem Alves (1984)
Esse modo de viver proposto por Bondía (2002) tem sintonia com a
experiencia da artesania de cuidado no final da vida. O gesto de
interrupção se dá no espaço ritual e sagrado do encontro e o cuidado
acontece como uma experiência que nos toca e modifica algo em nós. É
um ato em defesa do silêncio, da lentidão e da espera, em favor do
cultivo da atenção e da delicadeza na arte do encontro.
A proximidade da morte foi uma mola propulsora para criação de
inúmeros gestos de interrupção na vida da mulher-passarinho e na vida
da menina-esperança. Diante da dor e do sofrimento elas encontraram
maneiras novas de mudar a rota da vida. novos caminhos, novos modos
de viver. Foi um encontro com a flexibilidade, a adaptabilidade, com
a delicadeza e com uma nova qualidade de atenção ao momento presente.
Nós pensávamos que a hora do passarinho havia chegado, mas eis
que ele respirou fundo e tomou uma decisão: voltar ao artesanato.
Pediu para ser levado para sua sala-ateliê. Ela quis sair de suas
paralisias. Eu propus que começássemos a pintar um manto juntas. Esse
manto era um tecido de cor branca, que era bem frágil e facilmente
desfiava, como era o seu corpo. Todo dia em que nos encontrávamos
surgia a ideia de algo novo para pintar. Começamos pintando uma pequena
flor. Aos poucos surgiam tantas outras flores, frutas, sorvete, pizza,
sol e chuva, até que um dia ela mesma se desenhou com sua cadeira de
rodas e começou a artesanar a trama da sua vida nos fios do invisível.
Não era um simples desenhar e pintar. Ela comunicava elementos do seu
cotidiano, seus desejos estavam impressos ali. Pintava as dores
escondidas no esquecimento. Mesmo que porventura os desenhos nada
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Nessa experiê
em relevo e o câncer torna-se apenas uma parte da existência.
de novos encontros, certas máscaras
tornam-
A nossa potência é alterada pelos encontros que experimentamos.
As experiências se diluem nesse modo de cuidar que potencializa o
corpo frágil. Sobre isso, Oliveira (2016) traz uma reflexão
interessante ao destacar que: