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Aula 7

EQUILÍBRIO QUÍMICO

META
Apresentar os principais conceitos envolvidos no equilíbrio eletroquímico, mostrando as
relações entre energia de Gibbs e potencial da pilha/célula. Compreender e ser capaz de
usar a equação de Nernst.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, o aluno deverá:
compreender o conceito de meia-reação e como usá-lo nas reações redox;
compreender a reação da célula e o potencial da célula, tanto quanto a relação entre
potencial da célula a corrente zero e a energia de Gibbs da reação;
compreender o desenvolvimento da equação de Nernst para a dependência do potencial da
célula a corrente zero sobre a composição da célula;
compreender e calcular as funções termodinâmicas a partir de medidas
de potencial da célula.

PRÉ-REQUISITOS
entendimento dos princípios que regem o equilíbrio químico;
conhecimentos básicos de eletroquímica, como reações de
oxidação-redução e equação de Nernst;
conhecimentos básicos do cálculo diferencial e integral.

Kleber Bergamaski
Físico-Química 2

INTRODUÇÃO

Agora nós investigaremos reações em solução em termos de medidas


elétricas. Veremos como calcular a constante de equilíbrio de uma determi-
nada reação a partir da medida do potencial de uma célula eletroquímica.
Esta consiste de dois eletrodos, os condutores metálicos, mergulhados em
um eletrólito, que é um condutor iônico (no qual pode ser uma solução,
um líquido ou um sólido).
Uma célula eletroquímica que produz eletricidade como o resultado
de uma reação espontânea é chamada célula galvânica. Uma célula eletro-
química na qual uma reação não espontânea é conduzida por uma fonte
externa de corrente é chamada de célula eletrolítica.

(Fonte: http://www.gettyimages.com)

UMA CÉLULA ELETROQUÍMICA PRODUZ


CORRENTE ELÉTRICA COMO RESULTADO DE
UMA REAÇÃO QUÍMICA

Nessa seção, mostraremos como uma reação química espontânea


pode produzir corrente elétrica. Considere a reação:

Zn(s) + Cu2+(aq) Ⱥ Cu(s) + Zn2+(aq) (7.1)

Se nós colocarmos um bastão de zinco em uma solução de CuSO4(aq),


por exemplo, eletros serão transferidos dos átomos de zinco para os íons

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
cobre (II), produzindo átomos de cobre e íons zinco em solução. Nenhuma
corrente elétrica é produzida por este sistema porque os reagentes estão em
contato direto. Se pudermos de alguma forma manter os reagentes sepa-
rados, podemos fazer os elétrons dos átomos de zinco percorrer através
de um condutor metálico para alcançar os íons cobre (II). O arranjo ex-
perimental que nos permite fazer isso é a célula eletroquímica. Uma célula
eletroquímica para a equação 7.1 é mostrada na Figura 1.

Figura 1: Desenho esquemático de uma célula eletroquímica usando uma ponte salina. [1]

A célula consiste de barras de zinco e cobre (os eletrodos), cada imersa


numa solução aquosa contendo seus respectivos íons, Zn2+(aq) e Cu2+(aq).
Quando a reação descrita pela equação 7.1 procede espontaneamente, um
átomo de zinco no eletrodo de zinco fornece dois elétrons ao do circuito
externo e entra na solução como íon Zn2+(aq). A espontaneidade da
reação conduz os elétrons através do circuito externo para o eletrodo de
cobre, onde eles são pegos pelo íon Cu2+(aq), o qual deposita-se sobre o
eletrodo como um átomo de cobre. As duas soluções devem ser conectadas
eletricamente por uma ponte salina, a qual consiste de uma solução de KCl
(aq) saturada misturada com ágar, uma substância que forma um gel semel-
hante a gelatina. O propósito do gel é evitar que as soluções se misturem;
a solução da própria ponte salina com a solução do compartimento do ele-
trodo (Figura 1), mas ainda permitindo a passagem de uma corrente elétrica
pelos íons K+(aq) e Cl-(aq). Portanto, a ponte salina fornece um caminho
de corrente iônica entre as soluções de ZnSO4 (aq) e CuSO4 (aq). Quando
um íon Zn2+(aq) entra na solução de ZnSO4 (aq) a partir do eletrodo de
Zn(s), dois íons cloreto (Cl-(aq)) passam da ponte salina para a solução. Ao
mesmo tempo, quando um íon Cu2+(aq) deixa a solução de CuSO4 (aq) e
deposita-se sobre o eletrodo de cobre, dois íons K+(aq) entram na solução,
provenientes da ponte salina.

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Físico-Química 2

Generalizando, um eletrodo é qualquer sólido onde ocorram


reações de oxidação-redução em sua superfície. O eletrodo no qual uma
reação de redução [Cu2+(aq) + 2 e- Ⱥ Cu(s)] é chamado catodo; o eletro no
qual a oxidação ocorre [Zn(s) Ⱥ Zn2+(aq) + 2 e-] é chamado anodo. Estas
definições são convenientemente lembradas com a ajuda do mnemônico
(lembra-se do ensino médio?):

Consoantes Catodo Vogais Anodo


Redução Oxidação

MEIAS-REAÇÕES E ELETRODOS

Uma reação redox é o resultado da perda de elétrons, e às vezes átomos,


de uma espécie e o ganho de elétrons por outra espécie. Lembre-se do curso
introdutório de química (Fundamentos de Química), que nós identificamos
a perda de elétrons (oxidação) notando se um elemento sofreu aumento
no número de oxidação. Nós identificamos o ganho de elétrons (redução)
se o elemento sofreu decréscimo no número de oxidação. A necessidade
de quebra e formação de ligação covalente em algumas reações redox,
como na conversão de PCl3 a PCl5 ou de NO-2 a NO-3, é uma das razões
pelas quais reações redox frequentemente alcançam o equilíbrio muito
lentamente, frequentemente muito mais lentamente que reações ácido-base
de transferência de próton.
Qualquer reação redox pode ser expressa com a diferença de duas
semi-reações de redução. Dois exemplos são:

Redução do Cu2+: Cu2+(aq) + 2 e- Ⱥ Cu(s)


Redução do Zn2+: Zn2+(aq) + 2 e- Ⱥ Zn(s)
Diferença: Cu2+(aq) + Zn(s) Ⱥ Cu(s) + Zn2+(aq)

Semi-reações são conceituais. Reações redox normalmente procedem


por um mecanismo muito mais complexo no qual o elétron nunca esta livre.
Os elétrons nessas reações conceituais são considerados como estando “em
trânsito” e não se atribui um estado a eles. As espécies oxidada e reduzida
em uma semi-reação formam um par redox, denotado por Ox/Red. Assim,
os pares redox mencionados acima são Cu2+/Cu e Zn2+/Zn. Em geral,
adota-se a notação:

Par redox: Ox/Red semi-reação: Ox + ƭ e- Ⱥ Red

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
REAÇÕES EM ELETRODOS
Em uma célula eletroquímica, o anodo é onde ocorre a oxidação
enquanto o catodo é onde ocorre a redução. Quando uma reação procede
em uma célula galvânica, os elétrons liberados no anodo viajam através do
circuito externo (Figura 2). Eles reentram na célula pelo catodo, onde eles
promovem a redução.

Figura 2: Desenho esquemático de uma célula eletroquímica mostrando o sentido do fluxo de


elétrons, nos condutores metálicos. A eletroneutralidade da solução eletrolítica é mantida pelo fluxo
de cátions e ânions, em direções opostas, através da ponte salina.

Como elétrons carregados negativamente tendem a viajar para regiões


de maior potencial (mais positivo), este fluxo de corrente no circuito externo,
do anodo ao catodo, corresponde ao catodo ter um potencial maior que
aquele do anodo. Em uma célula eletrolítica, o anodo é também onde o
local de oxidação (por definição). Agora, ainda que elétrons devam ser
retirados das espécies no compartimento do anodo, este deve ser conectado
ao terminal positivo de uma fonte externa. Similarmente, elétrons devem
passar do catodo para as espécies sofrendo redução, assim o catodo deve
ser conectado ao terminal negativo da fonte (Figura 3).

Figura 3: O fluxo de elétrons e íons em uma célula eletrolítica. Uma fonte externa força os elétrons
para o catodo, onde são usados para conduzir a redução, e os retira do anodo, levando a uma reação
de oxidação neste eletrodo.

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Físico-Química 2

Em um eletrodo de gás (Figura 4) um gás esta em equilíbrio com uma


solução de seus íons na presença de um metal inerte. O metal inerte, no qual
geralmente é a platina, age como uma fonte ou sumidouro de elétrons, não
participando diretamente da reação. Um exemplo importante é o eletrodo
de hidrogênio, no qual hidrogênio é borbulhado através de uma solução
aquosa de íons hidrogênio e o par redox é H+/H2. Este eletrodo é denotado
por Pt(s)|H2(g)| H+(aq). As linhas verticais denotam junções entre as fases.
Neste eletrodo, as junções são entre a placa de platina e o gás e entre o gás
e o líquido contendo seus íons.
q

Figura 4: Esquema de um eletrodo de hidrogênio, que é semelhante ao de outros eletrodos de gás.


O hidrogênio é borbulhado sobre uma placa de platina que está em contato com uma solução
que contém íons hidrogênio. (http://www.brasilescola.com/quimica/medicao-dos-potenciais-
eletroquimicos.htm)

Um eletrodo de metal-sal insolúvel consiste de um metal M coberto


por uma camada porosa do sal insolúvel, MX, sendo completamente
imerso numa solução contendo íons X- (Figura 5). O eletrodo é denotado
M|MX|X-, onde a linha vertical denota um limite através do qual a trans-
ferência de elétrons ocorre.

Figura 5: Esquema de um eletrodo de prata – cloreto de prata. O eletrodo é formado por prata metálica
revestida com uma camada de cloreto de prata em contato com uma solução que contém íons Cl-.

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
Um exemplo é o eletrodo de prata-cloreto de prata, Ag(s)|AgCl(s)|Cl-
(aq), para o qual a semi-reação de redução é:

AgCl(s) + e- Ⱥ Ag(s) + Cl-(aq) Q = aCl- § [Cl -]

A atividade de ambos os sólidos é 1. Note que o quociente da reação


(e portanto, como veremos adiante, o potencial do eletrodo) depende da
atividade dos íons cloreto na solução eletrolítica.
O termo eletrodo redox é normalmente reservado para um eletrodo
no qual o par consiste do mesmo elemento em dois estados de oxidação,
diferente de zero (Figura 6).

Figura 6: Esquema de um eletrodo redox. A platina metálica atua como fonte ou sumidouro de
elétrons, sendo necessária para a Interconversão (neste caso) dos íons Fe2+e Fe3+em solução.

Um exemplo é o eletrodo no qual o par é Fe3+/Fe2+. Em geral, o


equilíbrio é:
a
Ox + ƭ e- Ⱥ Red Q= aRed
Ox

Um eletrodo redox é denotado por M|Red, Ox, onde M é o metal inerte


(tipicamente platina) fazendo o contato elétrico com a solução. O eletrodo
correspondendo ao par redox Fe3+/Fe2+ é portanto denotado Pt(s)|Fe2+(aq),
Fe3+(aq) e a semi-reação de redução e o quociente de reação são:
a 2+
Fe3+(aq) + e- Ⱥ Fe2+(aq) Q= a Fe
Fe 3+

O POTENCIAL DA PILHA
Uma célula galvânica realiza trabalho elétrico quando a reação im-
pele elétrons através de um circuito externo. O trabalho feito por uma dada
transferência de elétrons depende da diferença de potencial entre os dois
eletrodos. Essa diferença de potencial é medida em volts (V, onde 1 V = 1

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Físico-Química 2

J C-1). Quando a diferença de potencial é grande (por exemplo, 2 V), um


dado número de elétrons que circulam entre os eletrodos pode fazer uma
grande quantidade de trabalho elétrico. Quando a diferença de potencial é
pequena (tal como 2 mV), o mesmo número de elétrons pode fazer uma
pequena quantidade de trabalho elétrico. Uma célula na qual a reação esta
no equilíbrio não pode realizar trabalho e a diferença de potencial entre
seus eletrodos é zero.
De acordo com a discussão precedente (energia de Gibbs e poten-
cial químico, Aula 8, apostila Termodinâmica química), nós sabemos que o
trabalho de não-expansão máximo, W' max , que um sistema (nesse contexto,
a célula) pode fazer é dado pelo valor de ¨G, e em particular que:

A temperatura e pressão constantes: W' max ¨G (7.2)

Portanto, medindo-se a diferença de potencial e convertendo-se a trabalho


elétrico realizado pela reação, nós temos um meio de determinar uma quan-
tidade termodinâmica, a energia de Gibbs da reação. Contrariamente, se nós
conhecemos o ¨G para uma reação, então nós temos uma rota para estimar a
diferença de potencial entre os eletrodos de uma célula. Entretanto, para usar
a eq. 7.2 é preciso lembrar que trabalho máximo é alcançado somente quando
um processo ocorre reversivelmente. Vimos anteriormente (Aula 3, apostila
Termodinâmica química) que o critério de reversibilidade termodinâmica é
a reversão de um processo por uma mudança infinitesimal nas condições
externas. No presente contexto, reversibilidade significa que a célula deveria
ser conectada a uma fonte externa de diferença de potencial que se opõe e
iguala exatamente a diferença de potencial gerada pela célula. Então, uma
mudança infinitesimal da diferença de potencial externo permitirá a reação
proceder em sua direção espontânea e uma mudança infinitesimal oposta
conduzirá a reação em sua direção inversa. A diferença de potencial medida
quando uma célula está balanceada contra uma fonte externa de potencial é
chamada potencial da célula e denotada por Ecel (Figura 7).

Figura 7: O potencial de uma pilha é medido equilibrando a pilha contra um potencial externo que
se opõe à reação na pilha. Quando nenhuma corrente circula, a diferença de potencial externa é
igual ao potencial da pilha.

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
Um nome alternativo para esta quantidade, na qual formalmente foi
chamada de força eletromotriz (fem) da célula, é potencial da célula a
corrente-zero. Na prática, tudo que precisamos fazer é medir a diferença de
potencial com um voltímetro que deixa circular uma corrente negligenciável.
A relação entre o potencial da célula e a energia de Gibbs da reação
da célula é:
-ƭ FEcel = ¨rG (7.3)

Onde F é a constante de Faraday, a magnitude da carga elétrica por


mol de elétrons:

F = eNA = 96485 C mol-1

A equação 7.3 mostra que o sinal da potencial da célula é oposto aquele


da energia de Gibbs da reação, no qual se deve lembrar, é a inclinação de
um gráfico de G plotado contra a composição da mistura reacional (Aula
6). Quando a reação é espontânea na direção direta, ¨rG < 0 e Ecel > 0.
Quando ¨rG > 0, a reação inversa é espontânea e Ecel < 0. No equilíbrio
¨rG = 0 e portanto Ecel = 0 também.
A equação 7.3 fornece um método elétrico para medir a energia de
Gibbs da reação a qualquer composição da mistura reacional: simplesmente
medimos o potencial da célula e o convertemos para ¨rG. Contrariamente,
se sabemos o valor de ¨rG a uma composição particular, então podemos
predizer o potencial da célula.
Nossa próxima etapa é ver como Ecel varia com a composição
combinando a eq. 7.3 com a eq. 6.5 que mostra como a energia de Gibbs
da reação varia com a composição:

¨rG = ¨rG0 + RTlnQ (6.5)

Nessa expressão, ¨rG0 é a energia de Gibbs padrão da reação e Q é


o quociente da reação para a reação da célula. Quando substituímos essa
relação na equação 7.3, escrita como Ecel = -¨rG/ƭF, obtém-se a equação
de Nernst:

Ecel = E0cel - RT lnQ (7.4)


ƭF

E0cel é o potencial padrão da célula:


¨rG0
0
E =- (7.5)
cel
ƭF

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Físico-Química 2

O potencial padrão da célula frequentemente é interpretado como o


potencial da célula quando todos os reagentes e produtos estão em seus estados
padrão (atividade unitária para todos os solutos, gases puros e sólidos, a pressão
de 1 bar). Entretanto, como tal célula, em geral, não é alcançável, é melhor
considerar E0cel simplesmente como a energia de Gibbs padrão de uma reação
expressa como um potencial. Note que se todos os coeficientes estequiométricos
na equação para a reação na célula são multiplicados por um fator, então ¨rG
é aumentado pelo mesmo fator; e assim o é ¨, consequentemente o potencial
padrão da célula fica inalterado. Dessa maneira, Q é elevado a uma potência
igual ao fator (se o fator é 2, Q é substituído por Q2) e como lnQ2 = 2 lnQ, e
dessa forma para outros fatores, o segundo termo do lado direito da equação
de Nernst fica inalterado também. Ou seja, Ecel é independente de como nós
escrevemos a equação balanceada para a reação da célula.
A 25 ºC,
-1 -1
RT = (8,31447 JK mol ) x (298,15 K) = 2,5693 x 10-2 J C -1
F 96485 C mol -1
Como 1 J = 1 V C, 1 J C-1 = 1 V, e 10-3 V = 1 mV, podemos escrever
este resultado como
RT = 25,693 mV
F
Ou aproximadamente 25,7 mV. Segue da equação de Nernst que para
uma reação na qual ƭ = 1, se Q diminui por um fator de 10, então o potencial
da célula torna-se mais positivo por (25,7 mV) x ln 10 = 59,2 mV. A reação
tem uma maior tendência a formar produtos. Se Q aumenta por um fator
de 10, então o potencial da célula decresce por 59,2 mV e a reação tem uma
tendência menor a formar produtos.

PILHAS NO EQUILÍBRIO
Um caso especial da equação de Nernst tem uma grande importância
em eletroquímica. Suponha que a reação tenha alcançado o equilíbrio; então
Q = K, onde K é a constante de equilíbrio da reação na célula. Porém,
uma reação química no equilíbrio não pode realizar trabalho, e então gera
diferença de potencial zero entre os eletrodos de uma célula galvânica.
Portanto, considerando E = 0 e Q = K na equação de Nernst dá:
ƭ FE0
ln K = RF (7.6)

Esta equação muito importante nos permite predizer constantes de


equilíbrio a partir dos potenciais de células. A equação 7.6, obviamente,
é simplesmente a eq. 6.8 (¨rG = - RTlnK) expressa eletroquimicamente.

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
Note que
Se Ecel > 0, então K > 1 e no equilíbrio a reação da célula favorece os
produtos.
Se Ecel < 0, então K < 1 e no equilíbrio a reação da célula favorece os
reagentes.
Por exemplo, como o potencial padrão da célula zinco/cobre é:

Zn(s) |ZnSO4(aq) || CuSO4(aq) | Cu(s) E0 = + 1,10 V


A constante de equilíbrio para a reação da célula (na qual ƭ = 2) é
a(Zn2+)
Zn(s) + Cu2+(aq) Ⱥ Cu(s) + Zn2+(aq) k= = 1,5 x 1037
a(Cu2+)
Como pode ser visto pelo valor de K, o deslocamento do cobre pelo
zinco é virtualmente completo.

POTENCIAIS DE REDUÇÃO

Uma célula galvânica consiste da combinação de dois eletrodos, cada


um fazendo uma contribuição característica ao potencial da célula. Embora
não seja possível medir a contribuição de um único eletrodo, define-se um
eletrodo como tendo um valor particular e então se atribui valores aos
outros com base nisso. O eletrodo especialmente selecionado é o eletrodo
padrão de hidrogênio (EPH), no qual é atribuído o valor zero:

Pt | H2(g)| H+(aq) E0 = 0 a todas as temperaturas

O potencial padrão de redução E0 do outro par é então atribuído


construindo-se uma célula na qual ele é o eletrodo do lado direito e o ele-
trodo padrão de hidrogênio é o eletrodo do lado esquerdo da célula (por
definição). Por exemplo, o potencial padrão de redução do par redox Ag+/
Ag é o potencial padrão da seguinte célula:

Pt | H2(g)| H+(aq) || Ag+(aq) | Ag(s)


E0 = (Ag+/Ag) = E0 = + 0,80 V

E o potencial padrão do par AgCl/Ag, Cl- é o potencial padrão da


célula a alguma temperatura especificada (tipicamente 25 ºC):
Pt | H2(g)| H+(aq) || Cl- (aq) | AgCl(s) | Ag(s)
E0 = (AgCl/Ag, Cl-) = E0 = + 0,22 V

Pode-se calcular o potencial padrão de uma célula formada por quais-


quer dois eletrodos tomando-se a diferença de seus potenciais padrão de
redução. Esta receita resulta do fato de que uma célula tal como:

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Físico-Química 2

Ag(s) | Ag+(aq) || Cl- (aq) | AgCl(s) | Ag(s)

É equivalente a duas células ligadas “costas com costas”:

Ag(s) | Ag+(aq) || H+(aq) | H2(g)| Pt


Pt | H2(g) | H+(aq) || Cl- (aq) | AgCl(s) | Ag(s)

O potencial global dessa célula composta, e portanto, da célula de


interesse, é:

E0 = E0 (AgCl/Ag, Cl-) - E0 = (Ag+/Ag) = - 0,58 V

Os potencias padrão de redução na Tabela 1 podem todos ser usados


da mesma maneira que a exemplificada acima, e o potencial padrão da cé-
lula é a diferença dos correspondentes potenciais padrão de redução (Ecel =
Edireita – Eesquerda). Como ¨rG0 = - ƭFE0cel , então segue que se o resultado dá
E0 > 0, então a correspondente reação da célula é espontânea na direção
em que foi escrita (no sentido que K > 1).

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
ELETRODO DE HIDROGÊNIO E PH
O potencial de um eletrodo de hidrogênio é:

E(H+/H2) = E0 (H+/H2) - RT ln Q
2F
+ 01/2
RT ln a (H )p
F f (H2) 1/2
Essa expressão faz sentido fisicamente. Aumentando a atividade dos
íons hidrogênio (decrescendo o pH) aumenta a tendência dos íons positivo a
descarregar no eletrodo, e assim podemos esperar que seu potencial torna-se
mais positivo. Como a atividade do íon encontra-se no numerador do termo
logarítmico, a equação prediz que E aumenta quando a (atividade) aumenta.
O potencial do eletrodo de hidrogênio é diretamente proporcional ao
pH da solução. Assim, se f = p0 (tanto que a fugacidade do hidrogênio é
1 bar), pode-se usar:

ln a(H+) = ln 10 x log a(H+) = - 2,303 pH

para obter:
E(H+/H2) = - 2,303RT pH
F

A 25 ºC, RT/F = 25,69 mV, tornando-se:

E(H+/H2) = - 59,16mV x pH

Então, a cada unidade de decréscimo de pH, aumenta o potencial do


eletrodo em 59 mV.
Finalmente, para um eletrodo redox, a equação 7.3 (- ƭFEcel = ¨rG) dá:
a(Fe 2+)
E(Fe3+/Fe2+) = E0(Fe3+/Fe2+) - RT ln
F a(Fe 3+)
Um aumento em Fe3+ tende a aumentar o potencial do eletrodo e um
aumento em Fe2+ tende a baixa-lo. Entretanto, a maior importância dessa
equação é que, ao invés de tratar a diferença de potencial proveniente do
equilíbrio, podemos controlar o equilíbrio modificando-se o potencial do
eletrodo. Se pudermos assegurar que o potencial da célula:

EPH || Fe3+(aq), Fe2+(aq) | Pt

é E(Fe3+/Fe2+), ou um valor apropriado se o eletrodo da esquerda é


algum outro diferente de EPH (eletrodo padrão de hidrogênio), então
as concentrações das espécies reduzida e oxidada se ajustarão tanto que

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Físico-Química 2

a(Fe2+)/a(Fe3+) tenha um valor que satisfaça a equação para E. Isto nos dá


um controle elétrico sobre a composição de soluções.

A SÉRIE ELETROQUÍMICA

Vimos que para dois pares redox Ox1/Red1 e Ox2/Red2 e a célula:

Red1, Ox1 || Red2, Ox2 E0 = E02 - E01

que a reação da célula:


Red1 + Ox2 Ⱥ Ox1 + Red2

É espontânea como escrita se E0 > 0 e portanto se E02 > E01 . Já que


na reação da célula Red1 está reduzindo Ox2, podemos concluir que:

Red1 tem tendência termodinâmica a reduzir Ox2 se E01 é menor que E02. .

Em outras palavras, um par redox com potencial padrão mais baixo


tem uma tendência termodinâmica a reduzir um par redox com um potencial
padrão mais alto. Por exemplo:

E0(Zn2+/Zn) = - 0,76 V < E0(Cu2+/Cu) = + 0,34 V

Zinco tem uma tendência termodinâmica a reduzir os íons Cu2+.


Então a reação:

Zn(s) + CuSO4(aq) Ⱥ ZnSO4(aq) + Cu(s)

Espera-se que tenha K > 1 (de fato, como vimos anteriormente, K =


1,5 x 1037 a 25 ºC).
A Tabela 1 (acima) mostra uma pequena parte da série eletroquímica dos
elementos, seus pares redox organizados em função de seu poder redutor.
O membro reduzido de um par mais baixo na tabela (com menor potencial
padrão de redução) reduz o membro oxidado do par mais acima na tabela.
Esta é uma conclusão qualitativa. O valor quantitativo de K é então obtido
fazendo os cálculos que temos introduzido anteriormente nesta aula.

FUNÇÕES TERMODINÂMICAS A PARTIR DE


MEDIDAS DE POTENCIAL DA CÉLULA

Nós vimos que o potencial padrão de uma célula está relacionado à


energia de Gibbs padrão da reação da célula pela equação 7.3 ( - ƭ FEcel =
¨ r G). Portanto, medindo-se o potencial padrão de uma célula conduzida

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
por uma reação de interesse, podemos obter a energia de Gibbs padrão da
reação. Se estivermos interessados no estado padrão biológico, devemos
usar a mesma expressão mas com o potencial padrão da célula no pH = 7
- -
( ¨rG = - ƭFEcel ).

A relação entre o potencial padrão da célula e a energia de Gibbs padrão


da reação é uma rota conveniente para o calculo do potencial padrão de
um par redox a partir de outros dois pares. Podemos fazer uso do fato de
que G é uma função de estado, e que a energia de Gibbs de uma reação
global é a soma das energias de Gibbs das reações nas quais ela pode ser
dividida. Em geral, não combinamos os valores de E diretamente porque
eles dependem do valor de ƭ (lembre-se, ƭ é o número de elétrons envolvidos
na reação eletroquímica balanceada), o qual pode ser diferente para os dois
pares redox.
Uma vez que temos medido ¨ r G, podemos usar as relações
termodinâmicas para determinar outras propriedades. Por exemplo, a
entropia da reação da célula pode ser obtida da mudança do potencial da
célula em função da temperatura:

ƭE(Ecel - E'cel )
¨rS = (7-7)
T-T '
Pode-se ver a partir da eq. 7.7 que o potencial padrão da célula aumenta
com a temperatura se a entropia padrão da reação é positiva, e que a
inclinação de um gráfico de potencial contra temperatura é proporcional à
entropia da reação (Figura 8). Uma implicação é que se a reação da célula
produz muito gás, então seu potencial aumentará com a temperatura. O
contrario é verdadeiro par uma reação que consome gás.

Figura 8: A variação do potencial padrão de uma pilha com a temperatura depende da entropia
padrão da reação da pilha.

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Físico-Química 2

Finalmente, podemos combinar os resultados obtidos até aqui usando G


= H – TS na forma de H = G + TS para obter a entalpia padrão da reação:

¨rH = ¨rG + T¨rS (7.8)

com ¨rG determinado a partir do potencial da célula e ¨rS de sua


variação de temperatura. Assim, tem-se um método não calorimétrico para
medir entalpia de reação.

CONCLUSÃO
Nesta aula podemos verificar os principais conceitos envolvidos no
estudo do equilíbrio eletroquímico. Aprendemos como relacionar, quanti-
tativamente, a concentração dos íons em solução com o potencial da célula.
E ainda, que podemos usar medidas eletroquímicas para calcular grandezas
termodinâmicas, como energia de Gibbs e entalpia da reação em questão.

RESUMO
Nesta aula você viu que a aplicação da termodinâmica nos sistemas
eletroquímicos nos ajuda a entender potenciais em condições não padrão
e nos dá sua relação com a constante de equilíbrio e o quociente de reação.
Aprendemos também a calcular as propriedades termodinâmicas (G, S e
H) a partir de medidas do potencial da célula.

PRÓXIMA AULA
Na próxima aula você irá aprender sobre físico-química de superfí-
cies. Você verá que as interfaces e superfícies apresentam propriedades
diferentes daquela do volume do material e a compõe, com por exemplo,
tensão superficial.

REFERÊNCIAS
ATKINS, P. W.; Físico-Química - Fundamentos, 3 ed., Editora LTC, São
Paulo, 2003.
BALL, D. W.; Físico-Química, Vol. 1, Editora Cengage Learning, São Paulo,
2011.

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Equilíbrio eletroquímico Aula 7
CASTELLAN, G.; Fundamentos de físico-química, Editora LTC, São
Paulo, 1972.
MCQUARRIE, D. A., SIMON, J. D., Molecular Thermodynamics, Univer-
sity Science Books, California, 1999.

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