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RODOLFO SILVEIRA CARVALHO

A COMUNICAÇÃO DO EVANGELHO NA IGREJA


ATRAVÉS DA LITURGIA DA PALAVRA

São Paulo
2021
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................ 2
1 – A REVELAÇÃO SALVADORA DE DEUS ATRAVÉS DO CULTO ................................................................................ 4
1.1 A revelação de Deus............................................................................................................................................ 4
1.2 A revelação de Deus no culto ............................................................................................................................. 6
1.2.1. A revelação salvadora de Deus no culto veterotestamentário ...................................................................... 7
1.2.2. A revelação salvadora de Deus no culto neotestamentário......................................................................... 11
2 – CONTRIBUIÇÕES DA REFORMA PROTESTANTE PARA A COMUNICAÇÃO DO EVANGELHO ATRAVÉS DA
LITURGIA ................................................................................................................................................................. 15
2.1 O Culto e a comunicação do Evangelho na História da Igreja .......................................................................... 15
2.1.1. Período da Igreja Apostólica ......................................................................................................................... 15
2.1.2. Período da Igreja Perseguida ........................................................................................................................ 16
2.1.3. Período da Igreja Imperial............................................................................................................................. 17
2.1.4. Período da Igreja Medieval........................................................................................................................... 19
2.1.5. Período da Igreja Reformada ........................................................................................................................ 21
2.2 A Palavra de Deus na perspectiva Reformada.................................................................................................. 22
2.3 A perspectiva Reformada sobre a liturgia ........................................................................................................ 23
3 – A COMUNICAÇÃO DO EVANGELHO NO MUNDO CONTEMPORÂNEO.............................................................. 26
3.1 Os desafios da comunicação do Evangelho ...................................................................................................... 26
3.2 A proclamação do Evangelho na Liturgia da Palavra........................................................................................ 29
3.2.1. A primazia da Palavra.................................................................................................................................... 30
3.2.2. A Comunicação do Evangelho na Liturgia..................................................................................................... 31
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................................ 34
BIBLIOGRAFIA.......................................................................................................................................................... 35
2

INTRODUÇÃO

No contexto brasileiro, a maioria da população se identifica com o


cristianismo. A pesquisa do IBGE1 de 2010 mostra que cerca de 64% da população é
católica, o que corresponde a mais de 123 milhões de habitantes, e 22% são
evangélicos, ou seja, mais de 42 milhões de habitantes. Somando os dois
seguimentos, aproximadamente 88% da população brasileira possui uma base
cristã. Os outros 12% se dividem em todas as outras religiões.

Desse modo, dificilmente existirá alguma cidade que não possua uma igreja.
Ela está presente com várias formas, tamanhos, slogans2 e identidades. Mas muitos
confundem placas, prédios e edifícios com o verdadeiro significado do que é ser
igreja.

Para Charles C. Ryrie (2004) a primeira característica visível é o ajuntamento


de pessoas em torno de uma fé em comum, e ela deve ser centrada em Cristo
Jesus. “A palavra ‘igreja’ deriva do latim eclesia. Sua ideia original designava uma
‘assembleia de cidadãos’ (RYRIE 2004, pág. 455). Era uma reunião de pessoas que
visava resolver questões comuns. Somente posteriormente passou a designar a
“assembleia de fiéis”. Gustaf Aulén, outro teólogo diz o seguinte sobre a igreja:

A Igreja de Cristo e a fé Cristã têm sua origem na existência do


evento de Cristo e na mensagem apostólica a seu respeito. A
mensagem é dádiva. Fosse ela mudada ou transformada, a fé
cristã deixaria de ser o que é. Quaisquer que sejam as
alterações no tempo, a mensagem permanece imutável.
(AULÉN 2002 pág. 71)

Segundo o MANUAL DO CULTO (2011, p. 18-19) a igreja, sendo a esposa


de Cristo e guardando ansiosamente pelo seu retorno, deve tomar consciência nos
seguintes aspectos como uma comunidade: I) Batismal, II) Unida pelo Espírito
Santo, III) Diaconal e IV) Missionária. Portanto, a igreja não deve estar centrada em
si mesma, ela não é um clube religioso preocupado apenas com o bem estar dos
membros . Através do Espírito Santo, ela deve viver em união, batizar novos

1
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
2
Uma frase simples para identificar e conectar a empresa ou estabelecimento com os seus consumidores.
Neste caso, a igreja as pessoas.
3

convertidos, empenhar a sua missão no mundo, testemunhar a Cristo Jesus com a


Palavra e o serviço a Deus e a humanidade que ainda sofre pelas consequências do
pecado.
As últimas orientações de Jesus para seus discípulos nos revela a missão e
os pilares que a igreja deve possuir. Esta orientação se encontra no Evangelho de
Mateus, capítulo 28 versos 18 a 20, onde Ele fala de toda a sua autoridade,
prometendo que estaria junto de todo aquele que fosse fazer discípulos ao pregar e
ensinar o seu evangelho, e assim, batizar os novos convertidos. O teólogo Carl E.
Braaten afirma que “A Igreja é constituída pela atividade de proclamar e corporificar
as intenções redentoras do Deus Uno em todos os lugares e tempos, atingindo todas
as espécies e condições de pessoas” (BRATEN 2018, pág. 213).

Por isso, uma Igreja fiel a Deus não pode de forma alguma desviar de sua
mensagem central. O anúncio das Sagradas Escrituras para que todos tenham o
conhecimento da salvação em Jesus deve ser o pilar de todo ajuntamento cristão. O
reformador protestante João Calvino diz:

Eis então de que modo a face da Igreja se manifesta ante


nossos olhos: onde a Palavra de Deus é sinceramente pregada
e ouvida, e vemos que os sacramentos são administrados
segundo a instituição de Cristo, não podemos de modo algum
duvidar de que ali está uma igreja de Deus. (CALVIN 2019
pág.474)

É comum observarmos em ajuntamentos e movimentos que se dizem


cristãos uma certa valorização a ritos religiosos e experiências sobrenaturais que até
beiram ao miticismo. O sincretismo religioso tem influenciado muito as igrejas cristãs
brasileiras. Se torna importante enfatizar a Palavra de Deus e de como ela deve
guiar as formas das reuniões dos verdadeiros discípulos de Cristo.
Desse modo, este trabalho se propõe mostrar as bases bíblicas e históricas
sobre o culto e liturgia, com o intuito de ressaltar a importância da liturgia da Palavra
frente aos desafios da comunicação contemporânea.
4

1 – A REVELAÇÃO SALVADORA DE DEUS ATRAVÉS DO CULTO

O culto a Deus é uma das marcas do cristianismo. Ordinariamente, pelo


menos uma vez por semana, vários discípulos de Jesus Cristo se reúnem em local
apropriado para entoar cânticos de louvor, ler as Sagradas Escrituras e serem
desafiados pela mensagem do Evangelho.

A partir das considerações acima, faremos neste capítulo, uma análise


Bíblica sobre a Revelação de Deus e de como o culto é um momento importante
para transmitir a mensagem da Salvação.

1.1 A revelação de Deus

Para iniciarmos o assunto é importante entendermos como Deus se revela a


humanidade. Em perspectiva teológica, entende-se que existem duas formas de
revelação, a “geral” e a “especial/específica”. Nesse sentido, “a revelação geral inclui
tudo o que Deus revelou no mundo à nossa volta, inclusive o homem, ao passo que
a revelação especial inclui as várias maneiras que Ele usou para comunicar sua
mensagem, compilada na Bíblia” (RYRIE 2004, p. 33).

Para RYRIE (2004), a revelação geral se manifesta a humanidade de


diversas maneiras: I) Pela criação; II) Pela ordem do universo; III) Pela criação do
ser humano; e IV) Pelo seu próprio Ser. Com isso, pelo fato da humanidade perceber
a existência de todas as coisas, naturalmente os levaria a ideia de um ser superior.
“Se os homens não fazem esse reconhecimento mínimo, porém fundamental, e em
vez disso dão as costas e apresentam outra explicação, então Deus estará sendo
justo se rejeitá-los e não lhes oferecer mais verdade” (RYRIE 2004, p. 39). O
Reformador João Calvino desenvolve o assunto da seguinte forma:

A fim de que ninguém recorra ao pretexto da ignorância, Deus


incutiu em todos uma certa compreensão de sua deidade, da
qual, renovando com frequência a memória, instila de tempos
em tempos novas gotas, para que, quanto todos, sem exceção,
entenderem que há um Deus e são sua obra, sejam
5

condenados, por seu próprio testemunho, por não o cultuarem


e não consagrarem a própria vida à vontade d’Ele. (CALVIN
2008, pág. 43).

A Revelação Natural mostra que Deus continuaria com todas as suas


características mesmo se Ele decidisse não mais se revelar a humanidade. Mas
mesmo diante desta rebelião do ser humano, Deus continua mostrando o seu amor,
graça e misericórdia para a sua criação continuando a comunicação com a
humanidade, pois “Sua graça contínua é revelada, porque Ele continua usando a
revelação [...] como um meio para que as pessoas conheçam algo a respeito do
Deus verdadeiro” (RYRIE 2004, p. 38).
Este conhecimento especial se encontra registrado na Bíblia, onde podemos
saber quem Deus é e como Ele age no mundo. “A Bíblia não concebe a revelação
como uma simples transmissão de informação, divinamente garantida, mas antes
como vinda pessoal de Deus aos indivíduos, para tornar-se conhecido deles”
(Dicionário Teológico NT 2012, p. 1162).

A Bíblia toma posição, do princípio ao fim, que Deus deve


primeiramente desvendar-se aos homens antes que estes
possam conhecê-lo. [...] Uma iniciativa revelatória é necessária,
[...] porque Deus é transcendente. Deus está tão longe do
homem, em seu modo de ser, que o homem não pode vê-lo (Jo
11.18; 1 Tm 6.16; Êx 33.20) nem encontrá-lo por mais que o
tente (Jó 11.7; 23.3-9) nem ler os seus pensamentos mediante
habilidosas teorias (Is 55.8) (Dicionário Teológico NT 2012,
pág. 1163).

O significado de Revelação usada na Bíblia possui uma característica muito


própria de acordo com o próprio modo de agir de Deus. A ideia é de mostrar um
conhecimento inacessível, se este não se tornar conhecido através de uma ação
exterior realizado por algo ou alguém. “A palavra portuguesa ‘revelar’, deriva do latim
revelo, e geralmente a tradução do termo hebraico galah e do termo grego apokalypt
[...] expressam todas a mesma ideia - a de desvendar alguma coisa oculta, para que
possa ser vista e conhecida conforme é” (Dicionário Teológico NT 2012, p. 1162).

O vocabulário da revelação, em ambos os Testamentos, é


bastante lato, conferindo as ideias de esclarecer coisas
obscuras, trazendo a luz as coisas ocultas, mostrando sinais,
proferindo palavras, e levando as pessoas endereçadas a
verem, ouvirem, perceberem, compreenderem e conhecerem.
[...] Quando a a Bíblia fala em revelação, o pensamento em
6

mente é o Deus Criador a desvendar ativamente aos homens o


seu poder e a glória, sua natureza e caráter, sua vontade,
caminhos e planos - em suma, a si mesmo - a fim de que os
homens possam conhecê-lo (Dicionário Teológico NT 2012,
pág. 1162).

Desse modo, entendendo que a Bíblia é a Palavra de Deus é preciso


ressaltar que esta revelação foi feita de modo gradativo, onde todo o conhecimento
nela contido não foi mostrado de uma vez, mas aos poucos, até ela estar
completamente documentada. “Á vista desta perspectiva, a história bíblica da
revelação se apresenta como uma série contínua dos atos de Deus, começando na
criação, continuando na escolha e no preparo de Israel, atingindo o seu ponto
culminante na encarnação de Cristo” (AULÉN 2002 p. 76). Donald Mckim ressalta a
revelação da seguinte maneira:

A revelação é um processo contínuo. [...] Este processo é


considerado como revelação porque Deus está ativo nele e
nele se encontra pessoalmente. Especificamente, como
cristãos, vemos Deus agindo para produzir a revelação como
Senhor e Salvador encarnado em Jesus e como Espírito Santo,
inspirando profetas, apóstolos e todas as gerações do povo de
Deus (MCKIM 1998, pág. 22).

A revelação é um processo contínuo alcançando todas as gerações, Deus é


imutável e seus atributos continuam os mesmos desde sempre, permanecendo
assim até a consumação dos séculos. A estrutura do culto revela a soberania, o
amor, a liberdade e misericórdia do Deus Criador.

1.2 A revelação de Deus no culto

De acordo com o Dicionário Almeida (2005), a palavra Culto na Bíblia tem o


mesmo significado de Adoração. Desse modo, no mesmo dicionário, encontramos a
seguinte definição para adoração e suas quatro etapas de desenvolvimento:

Culto, Honra, reverência e homenagem prestados a poderes


superiores, sejam seres humanos, anjos ou Deus (Sl 96.9). Na
Bíblia há quatro etapas de desenvolvimento da adoração a
Deus. 1) Os patriarcas adoravam construindo altares e
oferecendo sacrifícios (Gn 13.7-8; 13.4). 2) Em seguida veio a
7

adoração no Tabernáculo e no Templo, com um sistema


completo de Sacrifícios. 3) A adoração nas sinagogas começou
durante o cativeiro. 4) Da adoração cristã fazem parte pregação
(At 20.7), leitura das Escrituras (1 Tm 4.13), oração (1 tm 2.8),
louvor (Ef 5.19) e ofertas (1Co 16.1-2), além de batismos (At
2.37-41) e da ceia do Senhor (1Co 11.23-29) (Dicionário da
Bíblia de Almeida 2005, pág. 17).

Como Deus é um ser que se revela, que possui atributos exclusivos e que
todas as coisas devem funcionar de acordo com sua perfeita vontade, certamente,
Ele mesmo definiria a forma de como deve ser adorado por seu povo. Esta forma
ensinada, além de exaltar suas qualidades, serve também para revelar de forma
didática seu amor, misericórdia, justiça e o meio correto para a redenção dos
pecadores.

1.2.1. A revelação salvadora de Deus no culto veterotestamentário

Gênesis é o primeiro livro das Sagradas Escrituras, que descreve o começo


de todas as coisas: a criação, a queda e a maneira como Deus executa a salvação.
Sem o fundamento do Antigo Testamento, nossa compreensão do Novo Testamento
será limitada e prejudicada. O Antigo Testamento é de suma importância para
entendermos a importância da ação de Cristo na Cruz. Aullén reforça que:

O Antigo Testamento é parte daquele contexto de Revelação,


no meio do qual Cristo aparece. O Novo Testamento e sua
mensagem não podem ser entendidos a não ser em conexão
com o Antigo Testamento. Os escritores do Novo Testamento
[...] afirmam que os atos de Deus registrados no Antigo
Testamento cumprem-se no ato redentor de Deus em Cristo
(AULÉN 2002 pág. 48).

No livro de Gênesis ressalta que Deus criou os seres humanos a sua


imagem e semelhança (Gn 1.27). Por esta razão, o ser humano é tão especial,
sendo assim, parecidos com o próprio Criador, servindo como “espelhos” do
SENHOR diante de toda a criação. Este é um grande privilégio e demonstração do
amor de Deus a própria humanidade.
8

Porém, mesmo diante desta comunhão com o SENHOR, nossos


antepassados acabaram optando por desobedecer as ordens do Criador quando,
conforme narrativa da queda, comeram o fruto que lhes era proibido, fruto que
simboliza o desejo de autonomia humana. Logo após a queda, Deus sacrificou um
animal inocente, sem defeitos, para fazer novas vestes para o casal, expressando
por meio daquele ato que diante do pecado, uma vida teria que morrer para restaurar
a comunhão entre o ser humano e Deus (Gn 3.21). O teólogo Wayne Grudem faz a
seguinte associação:

[...] Mesmo no tempo de Adão e Eva algumas palavras de Deus


já apontavam uma salvação futura: em Gênesis 3.15, a
maldição da serpente inclui a promessa de que a semente da
mulher (um dos seus descendentes) feriria a cabeça da
serpente, mas também sairia ferido - promessa cumprida afinal
em Cristo. O fato de os dois primeiros filhos de Adão e Eva,
Caim e Abel, terem oferecido sacrifícios ao Senhor (Gn4.3-4)
indica a consciência da necessidade de fazer alguma espécie
de pagamento pela culpa do seu pecado e da promessa divina
de aceitação dos sacrifícios corretamente oferecidos
(GRUDEN, 1999 pág. 79).

Com esta base de sacrifício, o primeiro registro de um culto de adoração


realizado está ligado a história de Caim e Abel, onde os dois se apresentaram na
presença de Deus. Mas Deus se agradou apenas da oferta de Abel, pois estava de
acordo com o sacrifício de um inocente para expiar, temporariamente, os pecados
cometidos e reestabelecer uma comunhão. (Gn 4.2-5). O comentário Wiersbe do
Antigo Testamento explica sobre as ofertas de Caim e Abel:

Essa primeira família devia conhecer o local exato de adoração


a fim de que os dois filhos levassem oferendas para o Senhor.
[..] Hebreus 11:4 indica que Abel traz sua oferenda pela fé. e
Romanos 10:17 ensina que “a fé vem pela pregação”. Isso
significa que provavelmente Deus ensinou Adão e sua família
como adorá-lo, e [Gn] 3:21 indica que envolve sacrifício de
sangue. Hebreus 9:22 afirma que deve haver derramamento
de sangue antes de haver remissão de pecado, contudo Caim
traz oferenda sem sangue da terra amaldiçoada. Talvez a
oferenda dele fosse sincera, mas não foi aceita. Ele não tinha
fé na Palavra de Deus e nem confiava no sacrifício substitutivo.
Provavelmente, Deus respondeu com fogo (Lv. 9:24) e
consumiu a oferenda de Abel, mas a oferenda de Caim
permaneceu no altar (WIERSBE, 2009 pág.29).
9

O próximo relato de um culto de adoração ao SENHOR com um sacrifício se


encontra na história de Noé, quando ele se apresentou a Deus com ofertas para
agradecer o fim do dilúvio e a salvação/preservação da humanidade (Gn 8.20-22).
Com isso, “A oferta de Noé deve ser vista não meramente como uma oferta de ação
de graças pelo livramento recebido, mas igualmente como uma expiação” (Dicionário
Teológico NT 2012, p. 1193).

Quando os patriarcas Abraão, Isaque e Jacó cultuavam a Deus, sempre


seguiam a mesma forma de adoração, levantando um altar e sacrificando um animal
como oferta ao SENHOR. Deus forma um povo de sua exclusividade, por meio da
promessa e aliança3 feito com Abraão e seus descendentes. Mais uma vez, é
revelado a misericórdia e amor para com a humanidade. O Novo Dicionário
Teológico do Novo Testamento confirma este pensamento da seguinte maneira:

Os altares patriarcais são frequentemente descritos [...]. Isaque


sabia que Abraão tinha o costume de oferecer ‘olah [sacrifício]
e que um cordeiro era geralmente a vítima (Gn 22.7). As
refeições sacrificiais, entretanto, selam as alianças[...]. Gn 15.9-
11 pode ser melhor compreendido como ritual purificador
(Dicionário Teológico NT 2012, pág. 1193).

Deus permaneceu presente com os descendentes de Abraão, quando o seu


povo se tornou numeroso no período em que estavam dominados pelo reino do
Egito, em todo o processo de libertação e nos anos em que vagaram no deserto.
Neste momento Deus apresenta a sua lei, tanto as morais quanto as cerimoniais,
que constituem uma parte importante de sua revelação a humanidade. Stanley
Ellisen complementa o assunto da seguinte forma:

[...] a lei de Moisés [...] foi dada para revelar os princípios


espirituais e morais de Deus ao seu povo como um modo de
vida apenas, e não como um meio de salvação. Esses
princípios fundamentais da Lei tinham por objetivo revelar a
santidade de Deus e a determinação de que o seu povo
também deveria ser santo (ELLISEN, 2004 pág. 32).

A vontade de Deus descrita em suas leis mostravam como todas as coisas


3
Uma aliança é uma relação definida de promessa e obrigação que liga duas partes interessadas. Esta aliança
foi uma imposição real mediante a qual Deus se comprometeu, perante o clã de Abraão, a ser Deus deles,
dessa maneira autorizando-os a invocá-lo como nosso Deus e como meu Deus (Dicionário Teológico NT 2012,
pág. 1164).
10

deveriam acontecer de acordo com sua santa e perfeita vontade. Aqueles que
pecavam precisavam seguir todos os procedimentos das leis cerimoniais e sacrificar
um animal para expiar seus pecados. Porém, aqueles que desobedeciam e se
afastavam de seus mandamentos, se não se arrependessem e voltassem para sua
vontade, certamente sofreriam por desrespeitar sua glória. e santidade.

A necessidade de Expiação se torna evidente por três coisas: a


universalidade do pecado, a seriedade do pecado, e a
incapacidade do homem resolver o problema do pecado.
[...]Nenhuma obra da lei será capaz de tornar o homem idôneo
para apresentar-se justificado perante Deus (Rm 3.20; Cl 2.16).
Se tiver de depender de si mesmo o homem nunca será salvo.
Talvez a mais importante evidência disso é o o próprio fato da
expiação. [...] A expiação era obtida não por qualquer valor
inerente a própria vítima oferecida, mas sim, porque o sacrifício
é o meio divinamente apontado para fazer a expiação. [...] a
vítima sempre tinha de ser sem defeito, o que indica a
necessidade de perfeição (Dicionário Teológico NT 2012, pág.
481).

A partir do decálogo e do código da Aliança, Deus comunicou como deveria


ser feito o culto de adoração, com muita precisão em relação as ofertas, o altar, as
roupas dos sacerdotes e sua consagração, além de todas os outros elementos
necessários para o funcionamento do culto (Êx 25-31, 37-39). No capítulo 40 do livro
de Êxodo, seguindo todas as especificações dadas por Deus, Moisés monta o
tabernáculo e organiza todos os elementos, realizando o primeiro culto após a
libertação do Egito. Deus se agrada e enche o tabernáculo com sua glória (Êx
40.34), mostrando que estaria com o seu povo ao longo de toda a sua jornada.
No livro de levítico se encontra uma forma estruturada do culto, através dos
sacrifícios e adorações que deveriam ser feitas ao SENHOR da forma que Ele
mesmo ordena de como tudo deve ser feito. Através dessa estrutura, é ensinado
mais uma vez o problema do pecado do ser humano, a santidade e também a
benevolência de Deus por proporcionar uma forma de reconciliação. Certamente,
toda esta mensagem são evidencias da salvação em Cristo Jesus. Dessa forma
“Levítico apresenta muitas imagens de Cristo e sua obra redentora na cruz. Os cinco
sacrifícios ilustram vários aspectos da pessoa e obra dele, e o Dia da Expiação é um
belo retrato de sua morte na cruz” (WIERSBE, 2009 p.151).
Através de seu povo, Deus comunicava as outras nações a sua existência,
11

santidade e qual era a forma certa de se viver, através da Lei, dos cultos e dos ritual
da expiação de pecados, mostrando como a humanidade é pecadora e de como ela
necessita de misericórdia e salvação. Michael Goheen escreve o seguinte sobre o
assunto:

A ideia, portanto, era que a nação de Israel fosse um povo em


exposição, encarnando em sua vida comunitária a intenção
original de Deus com a criação e seu propósito escatológico
para a humanidade. Ele viria e habitaria no meio deles e lhe
traria a Torá para dirigir a vida coletiva de seu povo de acordo
com o seu caminho. O povo de Deus seria um sinal atraente
diante todas as noções daquilo que Deus havia pretendido
desde o início e do propósito para qual ele se movia: a
restauração de toda a criação e vida humana da corrupção do
pecado. (GOHEEN 2014, pág. 43).

Este é o padrão na qual Deus estabeleceu para o seu povo que foi
estabelecido no tempo em que Moisés liderava, acompanhando toda a história de
Israel, passando pelo período dos juízes, dos reis, até os tempos em que Jesus veio
ao mundo e realizou o seu ministério. Sem dúvida, a existência de um povo
exclusivo de Deus e a forma como eles se relacionavam e o cultuavam, já
comunicava a verdadeira vida para tantos outros povos que eram dominados pelo
pecado e falsos deuses.

1.2.2. A revelação salvadora de Deus no culto neotestamentário

O NOVO DICIONÁRIO DA BÍBLIA (2012) relata duas grandes linhas


principais na qual o Novo Testamento continua aprofundando aquilo que foi
evidenciando no Antigo Testamento: I) A revelação de Deus em Cristo e II) A
revelação do plano de Deus por meio de Cristo. O próprio Deus Filho se torna um
ser humano, ensina os valores do Reino durante todo o seu ministério e se entrega
para morrer na cruz. Dessa forma, a vida e sacrifício de Cristo nos revela
perfeitamente o caráter de Deus e todo o seu amor.

No período do Novo Testamento, os cultos de sacrifícios eram feitos no


Templo de Jerusalém. Mas as sinagogas se tornaram importantes para a leitura das
Escrituras e para o ensino da vontade de Deus para o seu povo, lugar onde Jesus
12

frequentou e também teve oportunidades de ensinar (Mc 1.21). O dicionário da Bíblia


Almeida explica o início das sinagogas da seguinte maneira:

A Sinagoga [é a] casa de oração dos judeus, que começou a


existir provavelmente durante o cativeiro. As sinagogas se
espalharam pelo mundo bíblico. Nelas, adultos e crianças
adoravam a Deus, oravam e estudavam as Escrituras (Lc 4.16-
30). A doutrina cristã se espalhou entre os judeus por meio das
sinagogas (At 13.13-15), cuja organização e forma de culto
foram adotadas pelas igrejas cristãs (DICIONÁRIO DA BIBLIA
DE ALMEIDA 2005, pág. 146).

A partir de Cristo, todas as coisas se fazem novas e completas. Em sua


conversa com a mulher samaritana, Jesus ensinou que os verdadeiros adoradores
iriam adorar a Deus em espírito e em verdade. Por isso Wayne Grudem diz que:

A adoração genuína é a adoração “em espírito” (Jo 4.23-24; Fp


3.3), que provavelmente significa adoração que se dá na esfera
espiritual (não meramente o ato físico de participar do culto, ou
cantar hinos). Quando penetramos na esfera espiritual e
ministramos ao Senhor em oração, Deus também ministra em
nós (GRUDEM 1999, pág. 806).

Jesus é a plenitude da revelação de Deus. Todas as coisas se convergem


nEle, os elementos do culto, as leis morais/cerimoniais e o verdadeiro significado do
sacrifício. Louis Berkhof diz que “A obra sacrificial de Cristo foi simbolizada e
tipificada pelos sacrifícios mosaicos” (BERKHOF, 2012 p. 333). Aullén reforça este
pensamento da seguinte maneira:

No Novo Testamento contudo Deus não é só aquele que, na


sua majestade soberana, recebe sacrifícios que lhe são
oferecidos. Antes, a sua majestade divina mesma oferece
sacrifício; mais do que isso, sacrifica-se a si mesma em amor.
Trata-se de algo radicalmente novo, a revelar-nos um novo
aspecto também no que diz respeito ao amor de Deus. “Nisto
conhecemos o “amor”, esse amor que não recua ante ao
supremo sacrifício. Eis aí “a revelação do mistério guardado em
silêncio nos tempos eternos” (Rm 16,25). Em Cristo revela-se
“a dispensação do mistério desde os séculos oculto em Deus,
que criou todas as coisas” (Ef 3,9) (AULÉN 2002 pág. 50).
13

As últimas palavras de Jesus antes de subir aos céus nos revela o grande
plano de Deus para os seus seguidores quando Ele diz: “Ide, portanto, fazei
discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do
Espírito Santo; ensinando os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado.”
(Mateus 28.19-20)4

Paulo declara que o “mistério” (segredo) do “beneplácito” de


Deus, visando a salvação da Igreja e a restauração do cosmos
por meio de Cristo foi agora revelado, depois de haver sido
mantido oculto até o tempo da encarnação (Rm 16.25; 1 Co
2.7-10; Ef 1.9; 3.3-11; Cl 1.19) Ele mostra que esta revelação
abole o o antigo muro de separação entre judeus e gentios (Rm
3.29; 9-11; Gl 2.15- 3.29; Ef 2.11-3.6); semelhantemente, o
escritor aos Hebreus mostra como isso aboliu o antigo culto
sacerdotal e sacrificial dos judeus (Hb 7-10) (Dicionário
Teológico NT 2012 , pág. 1165).

Portanto, toda a revelação de Deus, tanto no Antigo quanto no Novo


Testamento, visa comunicar a salvação de todos os povos mediante a fé no ato
sacrificial de Cristo Jesus na cruz. Esta revelação se torna consequentemente a
missão de todo aquele que foi salvo, onde o próprio culto a Deus deve revelar esta
mensagem, a fim de que mais pessoas possam desfrutar do amor de Deus. O
Teólogo Leandro Lima diz o seguinte a respeito do Culto cristão:

Uma das passagens que melhor expressa a meditação de


Jesus com respeito ao culto é Hebreus 13.15-21. O versículo
15 diz: “Por meio de Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre,
sacrifício de louvor, que é o fruto dos lábios que confessam o
seu nome”. E os versículos 20, 21 dizem: “Ora, o Deus da paz,
que tornou a trazer dentre os mortos Jesus, nosso Senhor, o
grande Pastor das ovelhas, pelo sangue da eterna aliança, vos
aperfeiçoe em todo o bem, para cumprirdes a sua vontade,
operando em vós o que é agradável diante dele, por Jesus
Cristo, a quem seja a glória para todo o sempre. Amém!” O
ensino implícito na passagem é bem perceptível: o verdadeiro
culto precisa ser oferecido a Deus por meio de Jesus Cristo,
pois é somente por meio de Cristo que algo pode ser agradável
a Deus (LIMA 2006, pág. 527).

Embora não seja possível encontrar no Novo Testamento uma ordem clara
4
GENEBRA 1999, pág. 1143 e 1144.
14

de como se deve funcionar o culto, o apóstolo Paulo deixa claro que tudo deve ser
deito com “decência e ordem” (1 Co 14.40), a fim de que os de fora sejam edificados
e compreendam a mensagem do evangelho. Para esta organização, WIERSBE
(2004) pontua os seguintes princípios de um culto:

Veja os princípios básicos para a adoração espiritual que Paulo


estabeleceu para a igreja: (1) O ensino e a pregação da
Palavra têm prioridade sobre tudo o mais. (2) A Igreja deve ser
edificada. (3) Nada deve comprometer o testemunho diante dos
descrentes. (4) Sempre deve haver autocontrole. (5) tudo deve
ser feito “com decência e ordem”, e de acordo com a Palavra
de Deus. [...] A compreensão [e necessária para que haja
benção; e também deve anteceder qualquer benção
(WIERSBE NT 2009, pág. 502).

Percebe-se que o culto na Igreja Primitiva manteve os elementos


encontrados nas sinagogas, mas com o ensino sobre o sacrifício perfeito de Jesus
na Cruz e a adoração feita a Deus em Espírito e em verdade.
Dessa forma, Revelação Salvadora de Deus está contida em Cristo, onde no
Antigo Testamento vários elementos do culto apontavam para o messias que viria, e
no Novo Testamento foi a consumação em Jesus e a compreensão das
transformações trazidas por este ato divino.
Toda a escritura é Cristocêntrica, consequentemente o culto também deve
ser, pois Jesus é o único caminho redentivo à Deus. Infelizmente, como será
descrito no próximo capítulo, esta concepção teológica nem sempre foi visível ao
longo da história da Igreja.
15

2 – CONTRIBUIÇÕES DA REFORMA PROTESTANTE PARA A


COMUNICAÇÃO DO EVANGELHO ATRAVÉS DA LITURGIA

A Reforma Protestante foi um marco importante não só na história da Igreja,


mas para todo o mundo. Através deste acontecimento, abriu-se a possibilidade da
leitura da Bíblia na língua vernácula, passando a existir um maior espaço para
liberdade de expressão e interpretação, além do que a as autoridades religiosas
permitiam na época.

Neste capítulo será apresentado um breve histórico do culto na igreja e as


contribuições que a Reforma Protestante trouxe para a comunicação do Evangelho
através da liturgia.

2.1 O Culto e a comunicação do Evangelho na História da Igreja

Analisar a história da Igreja é importante para a compreensão das influências


das formas do culto e liturgia que existem atualmente. O historiador HURLBUT
(2002) apresenta seis períodos gerais da Igreja cristã ao longo da história, são eles:
I) A Igreja apostólica; II) A Igreja Perseguida; III) A Igreja Imperial; VI) A Igreja
Medieval; V) A Igreja Reformada, e; VI) A Igreja Moderna. Com exceção da Igreja
Moderna, será feito uma análise mais detalhada de cada período até a Reforma
Protestante.

2.1.1. Período da Igreja Apostólica

O período da Igreja Apostólica geralmente é considerado por muitos


historiadores e teólogos durante o início do ministério de Jesus até a morte do
apóstolo João, portanto, entre os anos 30 D.C. até 100 D.C. Este foi um tempo
marcado por pobreza e início da perseguição, onde os discípulos de Jesus se
reuniam em casas para a realização os cultos. O historiador Robert Hastings Nichols
relata este período da seguinte maneira:
16

A pobreza e a perseguição impossibilitaram a igreja primitiva de


construir seus templos durante o século 1º, razão pela qual os
cristãos se reuniam para o culto em casas particulares. [...]
Faziam orações, davam testemunho, ministravam certos
ensinos, cantavam salmos. [...] As escrituras do Antigo
Testamento eram lidas e explicadas. Havia também citações,
de memória, dos atos e ensinos de Jesus [...] Nessas reuniões
o entusiasmo do Cristianismo primitivo encontrava livre
expressão. E esse entusiasmo era tão ardoroso que resultava
em certa desordem. Estranhos eram admitidos nessas reuniões
e nelas alguns deles se levantavam para confessar seus
pecados e declarar que aceitavam a Jesus. (NICHOLS 2013,
pág. 33).

Pode-se perceber que o culto realizado neste período era uma junção das
práticas de leitura dos textos sagrados nas sinagogas com o testemunho e ensino de
Jesus. Com esta estrutura, e a ação do Espírito Santo, pessoas se convertiam e se
inseriam na comunidade cristã. Dessa forma, os seguidores de Cristo aumentavam
consideravelmente.

2.1.2. Período da Igreja Perseguida

Nos séculos II e III, encontramos na didaqué que estas reuniões eram


realizadas no primeiro dia da semana, onde se diz “Reuni-vos aos domingos, reparti
o pão e agradecei, primeiro confessando seus pecados, para que seu sacrifício seja
puro”. (DIDAQUÉ 2021, p.43). Nota-se então, que o dia da reunião, o sacramento da
Santa Ceia e a adoração a Deus fazem parte do culto que permanecem presentes
em todos os períodos da história da Igreja.

Através dos imperadores romanos a perseguição à igreja se intensificou e


fez com que ela experimentasse um novo período. Muitos cristãos foram presos,
torturados e mortos por serem seguidores de Cristo Jesus, estes mártires eram
vistos como heróis da fé. Consequentemente, por motivos de segurança, os cultos e
reuniões eram realizados de forma secreta. Jesse Lyman.Hulburt faz o seguinte
relato:
17

A perseguição — um perigo comum — aproximou as igrejas


umas das outras e exerceu influência para que elas se unissem
e se organizassem. Quando os poderes do Estado se
levantavam contra a igreja, sentia-se, então, a necessidade de
uma direção eficiente. [...] A parição de seitas e heresias na
igreja impôs, também, a necessidade de se estabelecerem
alguns artigos de fé, e, com eles, algumas autoridades para
executá-los. (HURLBUT 2002, pág. 70)

Esta situação de perseguição, juntamente com um ambiente que continha


várias religiões de outras culturas, contribuiu para a organização e estrutura da fé
cristã. Nichols diz que “nos séculos 2º e 3º começaram a aparecer certas fórmulas
para oração, liturgias ou ordens expressas de culto” (NICHOLS 2013, p. 45). As
dificuldades do período contribuíram para a clareza da mensagem do Evangelho,
afim de manter a sua integridade e destacar os elementos únicos ao se comparar
com as outras religiões da época.

2.1.3. Período da Igreja Imperial

Com o decreto do imperador Constantino no início do século IV, a fé cristã


se torna oficial em todo o Império Romano, pondo um fim a perseguição e iniciando
o período Imperial da Igreja. O historiador Andrew Miller diz o seguinte:

No mês de março de 313, os proclamas da aliança profana


entre a igreja e o Estado foram publicados em Milão. O
celebrado decreto daquela data conferiu aos cristãos completa
tolerância, e abriu o caminho para o estabelecimento legal do
cristianismo e para sua ascensão sobre todas as outras
religiões. [...] Assim, aquele que é chamado de grande
imperador cristão uniu publicamente o cristianismo e a idolatria.
Mas se temos entendido a mente de Constantino corretamente,
não podemos hesitar em dizer que, naquele tempo, ele era um
pagão de coração, e um cristão apenas por motivos militares.
[...] Não podemos ver qualquer traço de cristianismo, muito
menos qualquer traço de zelo de um novo convertido: mas
podemos facilmente identificar os traços da velha superstição
do paganismo na roupagem nova de cristianismo (MILLER
2017, pág. 259).
18

Conforme este relato, se por um lado os discípulos de Cristo desfrutavam


uma liberdade em proclamar a sua fé, por outro, esta oficialização iniciou um
processo de sincretismo religioso, o que prejudicou os princípios da mensagem do
Evangelho. Nichols faz a seguinte análise das influências das culturas pagãs na
comunicação do Evangelho e no culto a Deus:

O paganismo afetou o culto cristão nesses séculos, porque a


Igreja tinha vivido no meio desse paganismo até 400 d.C., e
também porque, depois de Constantino, muitos cristãos
entraram para a igreja, sem que tivessem se convertido. O
culto aos santos é um exemplo frisante dessa tendência. Era
natural que se tributasse veneração aos mártires e a outros
homens e mulheres famosos por sua santidade. (NICHOLS
2013, pág. 33).

A partir do decreto, muitos se tornaram cristãos sem ao menos saber das


bases da fé que a Igreja havia ensinado através das gerações. A população
começou a adorar os mártires da fé cristã ao invés de cultuar os vários deuses e
heróis de sua cultura. Estas questões começaram a deformar a mensagem do
Evangelho consideravelmente. Nichols continua com a sua análise:

Tanto a liberdade de que o Cristianismo desfrutava, como o


desenvolvimento de suas riquezas, deram origem a
importantes formas de culto que seguiam certas linhas já
preestabelecidas. Surgiram muitas liturgias e formas de oração.
O elemento musical do culto tornou-se mais notável. Nas
igrejas foram introduzidos coros, cânticos e antífonas [...] Os
templos tornaram-se maiores e cheios de decorações. [...] Os
cultos se tornaram mais solenes e impressionantes. [...]
A celebração da Eucaristia tornou-se uma cerimônia
imponente, com formas fixas, [...] tornando enfática a ideia de
que o sacramento era um sacrifício oferecido pelo sacerdote a
favor do povo, sacrifício eficaz para a salvação. Não obstante,
esse fato tornar a pregação menos importante, colocando-a em
plano secundário [...] (NICOHLS 2013, págs. 61-62)

Com esta oficialização, os cristãos podiam se reunir em locais próprios, sem


precisar se esconder. O investimento em questões religiosas se tornou comum, os
locais de encontro se tornaram grandiosos, os líderes da Igreja ganharam destaque
19

e os rituais litúrgicos passaram a ter outros significados. A pregação da Palavra


juntamente com a sua mensagem já não estavam mais em foco. Nichols conclui
dizendo:

Por volta do ano 400, a Igreja Católica já estava totalmente


desenvolvida, com sua organização hierárquica completa, seu
clero que exercia um excessivo domínio espiritual sobre o
povo, os concílios que criavam as leis eclesiásticas, o culto
impressionante e cheio de mistérios (NICOHLS 2013, pág. 63).

Todo este novo sistema se solidifica de tal forma que estabelece uma
religião que se distanciou dos primórdios da fé cristã. A ênfase não estava mais na
mensagem das Escrituras mas no poder e na hierarquia. Estes fatores contribuíram
para iniciar um novo período na história da igreja.

2.1.4. Período da Igreja Medieval

O sincretismo religioso modificou profundamente as marcas da Igreja. O final


do período Imperial preparou o cenário para o surgimento da Igreja Católica e vários
desvios doutrinários ao longo dos períodos seguintes.

A Igreja começou a ter um destaque cada vez maior e fazer parte de todas
estas transformações. O teólogo Franklin Ferreira diz que “Durante o período agitado
que remonta à queda do Império Romano [...], as questões teológicas mais
importantes passaram a receber cada vez menos atenção da parte dos líderes da
igreja” (FERREIRA 2013, p. 237). Hurlblut diz o seguinte sobre o poder da Igreja
neste período.

As rivalidades e as incertezas dos governos seculares estavam


em acentuado contraste com a firmeza e uniformidade do
governo da igreja [...] Uma vez conquistado poder que
pertencera do Estado, a igreja o mantinha firmemente.
Enquanto os governos dos Estados vacilavam e mudavam
sucessivamente, o império da igreja permanecia cada vez mais
forte. Durante esses séculos de instabilidade, a igreja era a
única instituição firme. [...] A igreja possuía fortes aliados em
20

toda parte, e jamais falhavam na defesa de seus


interesses.(HURLBUT 2002 pág. 126)

Com a queda do Império Romano várias transformações ocorreram como


consequências desse acontecimento no cenário da história mundial. A Igreja
Católica foi se estabelecendo cada vez mais de forma política. Estes desvios de
prioridade também afetaram a vida eclesiástica e a forma do culto. Nichohls escreve
o seguinte sore o culto na igreja medieval:

No culto que a igreja medieval ministrava ao seu povo, a


administração dos sacramentos ocupava a maior parte da
adoração, especialmente a missa. Os sacramentos eram em
número de sete: (1) Batismo, (2) Confirmação, (3) eucaristia,
(4) penitência, (5) extrema-unção, (6) ordem e (7) matrimônio.
Pensava-se que eles constituíam meio de salvação. [...] A
missa era o elemento central do culto, o maior dos
sacramentos. [...] Em virtude de os sacramentos terem tão
grande destaque, a pregação passou para lugar secundário e
de muito pouca importância. Raramente um pároco pregava,
[...] (NICOHLS 2013, págs. 118).

A Palavra de Deus não era compreensível para a população. A criação de


vários sacramentos retiraram a suficiência de Cristo para a salvação. A teologia do
culto não mais comunicavam claramente o Evangelho, pois estes assuntos não eram
mais prioridade para a liderança religiosa da igreja.

Outro ponto significativo deste período foi que a Estrutura do poder


consolidou o sistema papal, o líder máximo da Igreja. O Teólogo Franklin Ferreira
diz que “No vácuo de poder que se seguiu à destruição do Império Romano do
Ocidente, o papado surgiu como uma instituição que dominaria grande parte da
Europa na Idade Média, só sendo abalada no tempo da Reforma Protestante, no
século XVI” (FERREIRA 2013, p. 209).

Durante este período, as conversões se tornaram uma forma de controle,


aumentando a riqueza e o poder político da Igreja Católica, onde os ritos religiosos
contribuíam para a manutenção desse sistema. Embora existissem grandes
pensadores e teólogos que ainda buscavam preservar a essência da Igreja, estes
desvios doutrinários somente seriam confrontados no período da Reforma
Protestante.
21

2.1.5. Período da Igreja Reformada

O acesso a Palavra de Deus era restrito ao alto clero da Igreja Católica. A


população comum não tinha a possibilidade de qualquer contato. Mesmo nos cultos,
ela não era sequer lida no idioma comum do país, mas somente em Latim. Portanto,
toda teologia estava centrada na instituição e ninguém poderia contrariar o
posicionamento oficial.

O marco inicial para a Reforma Protestante se originou quando o até então


monge agostiniano Martinho Lutero pregou suas 95 teses contra várias das atitudes
e pensamentos da Igreja Católica na porta da igreja de Wittenberg. Os mais famosos
dos Reformadores foram Martinho Lutero, Ulrico Zuínglio e João Calvino. Alister
McGrath destaca este acontecimento da seguinte maneira:

No século XVI, iniciou-se um novo período extremamente


importante da teologia cristã ocidental. Os métodos da teologia
cristã, associados ao período medieval, deram espaço a novos
paradigmas. O avanço mais significativo foi a Reforma, um
movimento que buscou a volta da igreja [...] a fundamentos
mais bíblicos, em relação a seu sistema de crenças, a sua
moralidade e suas estruturas. [...] cujo o centro foi em torno de
indivíduos como Martinho Lutero, Ulrico Zuínglio e João Calvino
(MCGRATH 2005, pág. 95).

Todos estes Reformadores viam a possibilidade do avanço do Evangelho


através da Educação e ensino das Sagradas Escrituras. A Palavra de Deus e a
pregação voltaram a ganhar importância nos cultos. O surgimento da imprensa está
intimamente ligado ao desejo dos Reformadores de que todas as pessoas tivessem
o acesso a Bíblia. Hurlbut diz o seguinte:

A imprensa possibilitou o uso comum das Escrituras, e


incentivou a tradução e a circulação da Bíblia em todos os
idiomas da Europa. As pessoas que liam a Bíblia, prontamente
22

se convenciam de que a igreja papal estava muito distanciada


do ideal do Novo Testamento. Os novos ensinos dos
Reformadores, logo que eram escritos, também eram logo
publicados em livros e folhetos, e circulavam aos milhões em
toda a Europa (HURLBUT 2002 pág. 175).

Ao trazer a Bíblia às mãos das pessoas, os reformadores possibilitaram a


leitura e reflexão e aprendizado individual, quebrando o poder centralizado da Igreja
Católica. Consequentemente, a mensagem do Evangelho se tornou mais acessível
no culto.

Com exceção do período Medieval onde a mensagem do Evangelho foi


consideravelmente prejudicada, ao longo da história da Igreja percebe-se que a
prática das Sagradas Escrituras contribui para que a verdadeira mensagem não se
torne completamente perdida.

2.2 A Palavra de Deus na perspectiva Reformada

Conforme já dito no primeiro capítulo, na Revelação Específica é conhecido


o ser de Deus, seus atributos e sua vontade. Devido a sua glória e majestade, seria
impossível o ser humano conhecer a este Deus. O contato com a Palavra revela a
Cristo, que consequentemente revela o próprio Deus. Por isso, o simples fato dEle
se revelar pessoalmente para sua criação já é um ato de amor e misericórdia. Ryrie
disserta o assunto da seguinte maneira:

Embora Deus tenha se revelado de várias maneiras, inclusive


por meio das maravilhas da natureza a nosso redor, apenas a
encarnação revelou a essência de Deus, mesmo que de
maneira velada (Jo 1:18; 14:7-11). O único modo de o homem
poder ver o Pai é conhecendo o Filho, e o único jeito de fazer
isso, hoje em dia, é estudando o registro de sua vida nas
Escrituras. Pelo fato de ele ter se tornado homem, a revelação
de Deus foi personalizada; porque ele é Deus, essa revelação
é completamente confiável. (RYRIE 2004, pág. 280-281)

Um dos pilares que norteiam a Igreja Reformada é a Sola Scriptura , palavra


em latim que significa “Somente as Escrituras”. Sem esta sólida verdade pessoas
23

podem ser enganadas e serem desviadas da verdadeira fé. Aulén diz o seguinte
sobre a Revelação de Jesus através da Palavra:

A Palavra ativa encarnada em Cristo estriba-se nas Escrituras.


[...] Seu fundamento positivo está em ser a fé cristã
cristocêntrica., em ser Cristo o conteúdo central das Escrituras,
em ser cada mensagem a respeito do ato de Deus em Cristo
derivada da mensagem das Escrituras e finalmente em ser
esse mesmo ato por ela determinado. Rejeitar a Palavra escrita
de Deus equivaleria a rejeitar o próprio Cristo e a Palavra nele
encarnada. (AULÉN 2002 pág. 297)

João Calvino contribuiu consideravelmente para o pensamento Reformado.


Ele foi o primeiro teólogo protestante a sistematizar a fé cristã através das Institutas
da Religião Cristã. Sinclair B. Ferguson diz o seguinte sobre o pensamento de
Calvino a respeito da Palavra de Deus:

Como teólogo, procurava, assim, atender a todo o conteúdo da


palavra escrita de Deus, Reconhecia, contudo, que as
Escrituras nos foram dadas por Deus não só e simplesmente
para nos presentear na atualidade com verdades e doutrinas,
mas também para nos introduzir na revelação viva, da qual a
palavra escrita dá testemunho. No âmago dessa revelação,
sobre a qual os apóstolos e profetas escreveram, ocorrera o
encontro pessoal deles com o próprio Verbo de Deus, a
segunda pessoa da Trindade. (FERGUSON 2009 pág. 171)

Este entendimento da importância da Palavra de Deus para a comunicação


do Evangelho se reflete no culto das Igrejas de tradição Reformada. Quando as
Sagradas Escrituras são devidamente proclamadas na igreja através do Culto, é feito
conhecido o próprio verbo encarnado, que é Cristo Jesus.

2.3 A perspectiva Reformada sobre a liturgia

Neste ponto, ao mesmo tempo em que a Palavra de Deus deve ser


transmitida de forma fiel, ela também precisa ser compreendida pelos seus ouvintes.
Por isso, quando ela é proclamada, principalmente de forma pública, deve ser feita
24

através do zelo e temor a Deus. O Manual do Culto da Igreja Presbiteriana


Independente do Brasil diz o seguinte:

A partir do culto público, nasce a missão da igreja em todos os


seus mais variados aspectos. Desvinculadas do culto, essas
atividades perdem o sentido cristão e se corrompem. E, quando
o culto entra em decadência, a história comprova que a própria
vida da igreja também entra em crise. (MANUAL DO CULTO
2011, pág.18)

O culto público é a melhor forma de uma pessoa ter o contato da Palavra de


Deus de forma completa e relevante. O teólogo Aulén diz que “A teologia não pode
desprezar a época em que desempenha sua tarefa. nem também, isolar-se dela.
Deve interpretar o conteúdo da mensagem cristã imutável, mas de forma que o povo
a compreenda” (AULÉN 2002, p. 72).

Um culto compreensível para o povo é a forma correta para a pregação do


Evangelho. Deus faz o seu plano de salvação conhecido através do culto em toda a
história. Embora muitos dos reformadores adotem alguma forma litúrgica durante os
seus cultos públicos, Calvino entendia que não existia um método correto, mas que
existia princípios norteadores para o mesmo.

Segundo John H. Leith (1996) os princípios são: I) Integridade bíblica e


teológica do culto. II) A Inteligibilidade, III) A edificação, IV) A Simplicidade. A Liturgia
se torna um importante componente para esta questão no culto. Mckim explica a
origem e significado da palavra liturgia:

Etimologicamente, a palavra leitourgia vem de duas palavras


gregas, leitos e ergon, que significam, respectivamente, “do
povo” e “ação”. [...] Mas a palavra leitourgia nunca quis dizer
ato do povo. Ela significa ato em benefício do povo. A Liturgia
era uma espécie de serviço público. (MCKIM 1998, pág. 234)

Dessa forma, a liturgia é o serviço que se preocupa com o conteúdo da


mensagem que é transmitida para o povo. Esse importante serviço deve ser
pensado pelos pregadores da Igreja. Donald K. Mckim ainda comenta a importância
dos Reformadores para o resgate deste pensamento:
25

[...] os reformadores recuperaram o componente Escritura-


sermão da liturgia. [...] recuperaram a leitura audível da
Escritura, na língua do povo, com uma explicação e uma
aplicação através de um sermão do texto lido. [...] as igrejas
reformadas eram inclinadas a ver a leitura e sua explicação e
sua aplicação através de um sermão como uma só unidade
litúrgica. [...] A voz de Deus ressoa através da boca e da língua
do pregador, de modo que ouvir o ministro pregar é como ouvir
Deus mesmo falando. (MCKIM 1998, pág. 250)

Portanto, a liturgia da Palavra é essencial no culto público, pois com a leitura


das Sagradas Escrituras a voz de Deus é proclamada e através dela é anunciada a
salvação em Cristo Jesus.
26

3 – A COMUNICAÇÃO DO EVANGELHO NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

No mundo contemporâneo, a diversidade de pensamentos apresenta novos


desafios para continuar a missão da igreja deixada por Jesus. Ao olhar para o
passado, deve-se buscar exemplos de como lidar com estas dificuldades, mantendo
a essência de que a igreja é formada pelo povo de Deus, discípulos de Jesus, que
devem permanecer unidos pela sã doutrina bíblica e pela mesma missão.

Neste capítulo, será mostrado os desafios da comunicação da mensagem do


evangelho e os princípios litúrgicos para um culto cristocêntrico.

3.1 Os desafios da comunicação do Evangelho

Embora muitos não tenham uma ideia clara a respeito da forma do culto e
da revelação de Deus, provavelmente já tiveram algum tipo de contato com a
cosmovisão cristã, seja na televisão ou através de algum parente e conhecido, até
podem ter visitado ou frequentado alguma igreja. Porém existe um grande
possibilidade desta pessoa não ter recebido a totalidade da mensagem da Palavra
de Deus, existindo assim um certo entendimento incompleto.

O relativismo, sincretismo religioso e a irrelevância tem influenciado


negativamente a comunicação do Evangelho nas Igrejas. Ao mesmo tempo em que
a Igreja precisa estar engajada com os problemas da sociedade e a realidade
histórica em que está, ela também precisa permanecer bíblica e focada na missão
em que Jesus entregou ao seu povo. Goheen (2019) diz o seguinte sobre estas
influências:

O relativismo [...] é a situação em que nenhuma expressão


cultural pode ser julgada boa ou ruim pela Escritura ou pela
igreja proveniente de outra cultura. [...] O sincretismo vem da
tentativa de tornar o evangelho relevante para a cultura. [...] O
outro lado do problema é a irrelevância. Isso resulta da
tentativa de ser fiel ao evangelho ao se apegar a formas
antigas ou estrangeiras do evangelho. [...] O sincretismo
compromete o evangelho, enquanto a irrelevância o torna
27

irreconhecível como sendo as boas-novas (GOHEEN 2019,


pág.217-218).

Para lidar com os problemas na comunicação, é preciso identificar tais


ameaças e refletir como o Evangelho combaterá essas questões. Na realidade
brasileira, o sincretismo religioso se destaca devido a pluralidade cultural do país,
que naturalmente influencia o culto e liturgia das igrejas cristãs.
A Antropóloga Missionária Bárbara Burns (2011) afirma que existe dois tipos
de sincretismo, o cultural e o religioso. Dessa forma, ela define estes sincretismos na
seguinte maneira:

[...] O sincretismo cultural envolve uma fusão de símbolos e


práticas religiosas cristãs e pagãs, evidentes para nós no
catolicismo sertanejo ou brasileiro em geral, ou no estilo de
vida materialista de muitos cristãos. Pode ser inconsciente,
como estes últimos, ou consciente, a exemplo da imposição de
liturgias estrangeiras dos missionários.
O sincretismo teológico deixa a Bíblia sem autoridade, é
culturalmente condicionada, e confunde o supracultural com o
cultural. Neste tipo, a Bíblia é tão verdadeira como os Vedas, e
a experiência religiosa de cada pessoa é igualmente válida.
Essa perspectiva cria uma universalização da fé, ou
reducionismo, em que não há a realidade concreta do "Jesus
histórico", mas apenas uma ideia ou um ideal (BURNS 2011,
pág. 103).

Com esta citação, entende-se que o sincretismo pode: I) descaracterizar o


culto de tal forma que ele nem sequer apresente o Evangelho, mas uma junção das
crenças e religiosidades da região, ou; II) deixar o culto tão complexo e isolado da
população que ele se torne mais uma expressão de fé em meio a tantas outras
dentro da mesma cultura
Numa leitura num contexto missionário, Burns (2011) ainda completa que
“Para tornar a Palavra viva e transformadora num contexto, o missionário precisa
identificar-se com as pessoas e sua cultura” (BURNS 2011, p.108).
Por isso, ao mesmo tempo em que a Palavra de Deus deve ser fiel, ela
também precisa ser compreendida pelas pessoas que as escutam. Este foi um dos
princípios que guiou o reformador Martinho Lutero ao traduzir a bíblia para a língua
Alemã. A necessidade de fazer o Evangelho compreensível mesmo frente as
dificuldades culturais deve ser uma preocupação constante para os teólogos,
28

pastores, missionários e membros da Igreja cristã. O pastor Goheen (2019) afirma


que:

Este tema é fundamental para todas as igrejas em cada cenário


cultural, assim como o é para a igreja global como um todo. [...]
O evangelho inevitavelmente assumirá uma forma cultural. A
questão não é saber se o evangelho é moldado pela cultura; a
única dúvida é se a contextualização do evangelho é fiel ou não
(GOHEEN 2019, pág.214).

Com estas reflexões, o culto público é a melhor forma das pessoas terem o
contato com a Palavra de Deus de forma completa e relevante, apresentando o
plano da salvação em Jesus de forma adequada e compreensível para a
comunidade local. A confissão de Fé de Westminster apresenta um caminho
adequado para a forma de culto.

A leitura das Escrituras, com santo temor, a sã pregação da


Palavra e a consciente atenção a ela, em obediência a Deus,
com entendimento, fé e reverência; o cântico de salmos, com
gratidão no coração, [...] são partes do culto comum oferecido a
Deus [...] (CONFISSÃO DE FÉ 1991, pág 113)

Tudo o que é dito, falado e cantado no culto público deve ser feito para a
glória de Deus, a fim de expressar o amor divino para com a humanidade através de
Cristo Jesus. A Igreja Presbiteriana Independente do Brasil possui um manual de
Culto e Liturgia, estruturando de forma bíblica o formato dos encontros públicos das
igrejas da denominação. Dessa forma, este manual diz o seguinte sobre a
importância do culto público:

A partir do culto público, nasce a missão da igreja em todos os


seus mais variados aspectos. Desvinculadas do culto, essas
atividades perdem o sentido cristão e se corrompem. E, quando
o culto entra em decadência, a história comprova que a própria
vida da igreja também entra em crise (MANUAL DO CULTO
2011, pág.18).
29

Por isso, o pensar no culto e a forma de se apresentar o Evangelho é tão


importante. Ao fazê-lo, a Igreja está engajada na grande comissão entregue por
Jesus registrado no Evangelho de Mateus 20:18-20. Quando o culto público não
mais ensina a Graça de Deus mediante a salvação em Jesus, a comunidade de
discípulos começa a se desviar da missão.

3.2 A proclamação do Evangelho na Liturgia da Palavra

A Liturgia da Palavra se refere a toda palavra lida e falada ao longo de todo


o processo do culto. O teólogo Mckim afirma que:

Não somente as palavras da pregação nas quais as Escrituras


são citadas ou parafraseadas que são consideradas como
Palavra de Deus. As palavras do pregador, interpretando
corretamente o que Deus está dizendo através das Escrituras e
aplicando a mensagem à condição e situação dos ouvintes nos
mundo, são incluídas na identificação da pregação da Palavra
de Deus como uma forma da Palavra de Deus (MCKIM 1998,
pág. 26).

Atualmente muitas igrejas tem se desviado deste princípio do culto, estando


voltadas mais para mensagens antropocêntricas do que o próprio ato de adorar a
Deus e fazê-lo conhecido de acordo com a Palavra. O pastor Leandro Lima explica
sobre esta dificuldade litúrgica ao apresentar o evangelho:

A verdade é que nossas liturgias estão cheias de


existencialismo, humanismo, pragmatismo, hedonismo,
racionalismo e diversas outras distorções advindas do
secularismo. A igreja tem imitado o mundo em quase tudo.
Copiamos as músicas, as vestes, o linguajar, as práticas, etc.
[...] O resultado de tudo isso é óbvio: não há adoração. [...]
Perdemos a [...] capacidade de nutrir, edificar, desafiar e
iluminar os membros da igreja no que diz respeito à
espiritualidade (LIMA 2006, pág. 522).

Muitas Igrejas mostram uma grande dificuldade em transmitir o Evangelho


nos cultos, principalmente ao ler os textos bíblicos durante a liturgia ou no próprio
sermão. Segundo Carl E. Braaten, “A liturgia é uma expressão lucida, [...] dentro da
30

comunidade da própria Igreja, da Fé que anima a Igreja, que lhe dá vida e que ela é
chamada a testemunhar no mundo” (BRAATEN 1987 p. 240). Quando as Sagradas
Escrituras são proclamadas, principalmente de forma pública, ela deve ser feita
através do zelo e temor a mensagem Deus.

3.2.1. A primazia da Palavra

Conforme citado no capítulo dois, a leitura da palavra e o sermão


readquiriram uma grande importância dentro da liturgia na Reforma Protestante.
Reforçando o que foi descrito, Leith afirma que “A centralidade do sermão não pode
ser contestada. [...] A reforma foi uma grande revitalizadora da pregação,
provavelmente a maior da história da Igreja Cristã” (LEITH 1996, p. 298)
A importância de Calvino para a teologia Reformada se destaca mais uma
vez neste assunto. O teólogo McKim (1998) diz que “João Calvino, entendeu a
Palavra como primária ao Culto a Deus. Ele acreditava que Cristo fez três exigências
para a comunidade que cultua: pregar a Palavra, orar publicamente e celebrar os
sacramentos (MCKIM 1998, p. 266).”

Todos estes elementos fazem parte do culto público devem servir, de uma
maneira bem didática, para a proclamação da salvação em Jesus. A Palavra de
Deus lida e dita revela o salvador, a oração mostra a acessibilidade a Deus ao se
confessar os pecados e agradecer a salvação em Cristo, por fim, os sacramentos
são os símbolos que testificam os discípulos no pacto da graça e na união da igreja,
que é o corpo de Jesus. O Teólogo Braaten diz o seguinte sobre a liturgia e
sacramentos:

A liturgia e os sacramentos constituem-se de ações simbólicas


e de palavras, e a participação neles capacita as pessoas a
receber a revelação de Deus e a responder a ela em louvor e
gratidão. [...] Por isso, a liturgia centra-se completamente em
Jesus Cristo. Ela traz a presença de Cristo ao crente e convida
para a participação plena em Cristo (BRAATEN 1987 p. 240).

Ainda que toda a estrutura e ação litúrgica esteja apontada para Cristo
Jesus, a Palavra anunciada ainda é o melhor meio de explicar a revelação salvífica.
31

Esta clara comunicação só será obtida através da proclamação de audível da


Palavra. Paul David Trip (2019) reforça esta afirmação da seguinte maneira:

Palavras são poderosas, importantes e significantes. Era para


ser assim. Quando falamos, deve ser com a percepção de que
Deus deu significância a nossas palavras. Ele determinou que
elas sejam importantes. Palavras foram importantes na criação
e na queda. Foram significativas na redenção. Deus deu valor
às palavras. Ele tem um projeto para a nossa comunicação, um
plano e propósito específicos para a fala do corpo de Cristo.
(TRIP 2019, pág.16)

Por meio da palavra Deus criou todas as coisas e por ela tudo será
consumado na segunda vinda de Cristo. Este é o maior meio de comunicação
utilizado por Deus para apresentar o seu plano de Redenção.

3.2.2. A Comunicação do Evangelho na Liturgia

A forma como o culto é planejado e tudo o que é feito e dito durante a


liturgia, contribui na formação espiritual na vida dos membros da igreja. A vida
espiritual, as devocionais e também as crenças são construídas tanto de forma
explícita quanto implícita por meio da liderança que conduz a liturgia.

Para Mike Cosper (2019), as palavras ouvidas, cantadas e faladas no culto


ajudam a formar: I) A imagem de Deus; II) O entendimento do que a Igreja faz; III) O
Entendimento da corrupção do ser humano; IV) O senso de propósito como
indivíduos e como Igreja; V) as afeições de reverência, humildade, deleite, contrição
e esperança; VI) A visão de plenitude para nós mesmos e para toda a criação; e VII)
As práticas de comprometimento com Deus, uns com os outros e com o mundo.
Cosper ainda conclui que “O objetivo de nossas reuniões deveria ser de cultivar
práticas que formam nossa igreja para viver nas boas novas do evangelho”
(COSPER 2019, p.).

O pastor Ronaldo Lidório destaca os seguintes pontos para a comunicação


do Evangelho:
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O conteúdo do evangelho [...] deve incluir: a) Deus como


criador e soberano (Ef 1.3-6); b) o pecado como fonte de
separação entre o homem e Deus (Ef 2.5); c) Jesus, sua cruz e
ressurreição como plano histórico de Deus para redenção do
homem (Hb 1.1-4); d) O Espírito Santo como cumprimento da
Promessa e o encarregado de conduzir a igreja até o fim
(LIDÓRIO 2014, pág.25).

Estes são os pontos centrais do plano redentivo de Deus e da cosmovisão


cristã. O Deus Santo, criador de todas as coisas, redime o ser humano desobediente
e pecador por meio da morte de Jesus, o filho perfeito, que envia o Espírito Santo
para testificar esta verdade, edificar a Igreja e proclamar as boas novas.
O culto público deve ser esta adoração a Deus, proclamando esta verdade a
fim de estabelecer uma espiritualidade saudável e bíblica. Toda vez que a igreja se
reuni e se repete estas verdades, o povo de Deus permanece firme na sã doutrina e
obedece o chamado de proclamar o evangelho.
Este formato se assemelha a uma espécie de diálogo entre Deus, o seu
povo e as outras nações. O teólogo Bratten afirma que:

Assim, como cada rito do evangelho é uma conversação, o


falar de Deus e a nossa resposta, da mesma forma cada rito
apropriado do evangelho é, como qualquer conversação
apropriada, um intercâmbio complexo. [...] a complexidade final
dos ritos cristãos é que a maioria dos pronunciamentos feitos
dentro deles são dirigidos, [...]ao mesmo tempo a Deus e aos
outros crentes presente [...] (BRATTEN 1987 pág. 319).

Este apontamento destaca ainda mais a importância da centralidade do


Evangelho, a proclamação fiel da palavra para que a fé cristã continue a ser
ensinada de forma bíblica e cristocêntrica.
Para uma forma didática de visualização entre a exposição do Evangelho,
ligando com os pontos históricos principais da cosmovisão cristã com as ações
litúrgicas no culto público, o teólogo Cosper (2019) criou uma tabela contendo estes
elementos.
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Figura 1
Experimentando o Lembrando a Ações Litúrgicas
Evangelho história
Deus é Santo Criação Adoração
O ser humano é Queda Confissão
pecador
Jesus é o salvador Redenção Declaração de paz
Oração de ação de
graças
Louvor
Sermão
Jesus envia Consumação Comunhão
Compromisso e envio
Benção final
Fonte: COSPER 2019, p. 121 adaptado

Esta ordem de ações litúrgicas apresentado por Cosper (2019) segue as


visões dos reformadores protestantes. São elas: I) O anúncio de um Deus Santo e
criador de todas as coisas no momento de Adoração; II) O Anúncio do pecado da
raça humana na queda no momento da Confissão de pecados; III) O anúncio da
salvação em Jesus e redenção humana nos momentos de declaração de paz,
oração de graças, louvor e sermão; e IV) O anúncio do Envio dos discípulos ao
mundo até a consumação dos séculos nos momentos de comunhão, oração de
envio e benção final.
A melhor maneira de comunicar o Evangelho genuíno, sem as influências
negativas dos pensamentos contemporâneos, é por meio da leitura da Palavra de
Deus. Na liturgia é possível proclamar o Deus verdadeiro, o pecado da humanidade
e a salvação em Cristo Jesus.
Ao ler as Sagradas Escrituras, o falar e orar sobre estes pontos específicos
nas ações litúrgicas, certamente a comunicação do Evangelho será fiel e clara a
todos os ouvintes.
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CONCLUSÃO

Este trabalho teve o intuito de apresentar as dificuldades da comunicação do


Evangelho no culto e direcionar as ações litúrgicas para apresentar o plano redentivo
de Deus.

A primeira parte foi dedicada para mostrar biblicamente que Deus revela
seus atributos de santidade, justiça e misericórdia por meio do culto público,
ensinando todos os elementos do plano de salvação para a humanidade pecadora
desde Adão e Eva até aos membros da igreja Primitiva. É importante destacar que
os elementos que comunicavam a expiação de pecados no Antigo Testamento
apontavam para aquilo que Cristo Jesus faria no período neotestamentário.

Após esta etapa, foi descrito um breve histórico da igreja e a forma do culto,
apresentando os desvios da mensagem do Evangelho no decorrer do tempo até o
período da Reforma Protestante, que resgatou a importância do anúncio da Palavra
de Deus e a verdadeira comunicação do Evangelho, que é a salvação em Jesus
mediante a fé ao ouvir claramente esta mensagem. Lutero e Calvino se destacam
por este retorno a essência bíblica do culto.

Por fim, os problemas e desafios contemporâneos são relatados para a


reflexão da igreja. É apresentado a importância do pensar na Liturgia da Palavra
para apresentação de todos os elementos comunicativos do plano da salvação de
Deus nas ações litúrgicas, sendo eles a criação, queda, redenção e consumação.

Concluo este trabalho com a certeza de que todos os cultos cristãos


precisam apresentar o Evangelho de forma clara ao longo do culto a Deus. Dessa
forma, todos os ouvintes, sejam eles já fazendo parte do corpo de cristo ou não,
saberão o motivo da reunião, do Deus criador dos céus e da terra, da situação
pecaminosa da humanidade, da Graça salvífica de forma exclusiva por meio da
morte e ressurreição de Jesus Cristo e do fim de todas as coisas no dia do juízo
final.

Esta é a missão de Deus dada por Cristo Jesus aos seus discípulos e
testificado pelo Espírito Santo que deve ser claramente comunicada através do culto
e da Liturgia da Palavra.
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