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ALÉM DO AZUL
1ªEdição
Piercing no clitóris!
Piercing no clitóris!
Piercing no clitóris!
Clitóris!
“Lábios... não disse quais...”
Não, não e não! Eu preciso que a imaginação pare de fluir.
Preciso expulsar todas as imagens que estão brincando em minha
mente agora.
É Sophie! Minha, praticamente, prima! Venho tentando me
convencer disso desde que me entendo por gente. Não deveria
sentir por ela o que sinto, mas não consigo evitar. A cada vez que a
vejo, meu coração parece rasgar o peito e a dor que sinto é
sufocante. Sophie é a menina mais linda do mundo e o meu maior
sonho. Nós fomos muito unidos grande parte da vida, mas, desde os
18 anos, optei por um afastamento e me fechei em meu mundo.
Não é apenas por sermos praticamente primos. Nós somos
opostos completos. Eu tenho meu próprio universo, um montante de
limitações. Sophie é um espírito livre, cheia de vitalidade e
normalidade. Ela gosta de mergulhar em oceanos, enquanto eu
prefiro a segurança de um simples tanque de água.
Péssima hora em que ouvi meus pais e vim nessa viagem! A
ideia deles era que eu me "divertisse" um pouco e saísse do meu
quarto, onde passo meus dias. Possuo um monte de limitações,
coisas que não consigo vencer e que são extremamente difíceisde
lidar. Eles me entendem na maior parte do tempo, por isso, às
vezes, abro mão da minha zona de conforto e socializo para fazê-los
felizes.Mas, sempre que há Sophie no meio da situação, a saídada
zona de conforto torna-se radical o bastante.
Sophie estuda em outro país, então nos distanciamos o
bastante, embora a conexão não tenha sido quebrada nem mesmo
com a distância. Não sei o que existe entre nós, mas sei que existe
algo desde criança. Essa confusãode sentimentos me machuca. É
extremamente difícillidar com o que sinto por ela, e extremamente
difícilvê-la "viver" tão livremente, escutar histórias que despertam
sentimentos ruins e confusos em mim. Por isso, considero essa
distância tanto boa quanto ruim. Boa pelo fato de eu não ter que
acompanhar o desenvolvimento dela em relação a outros garotos,
ruim, porque, querendo ou não, eu gosto de ter meus olhos sobre
ela.
Nossa relação tornou-se muito complexa desde a puberdade.
A transição entre a infância e a adolescência foi bastante
complicada, principalmente quando percebi que tudo em mim reagia
a ela. A descoberta disso foi altamente assustadora e precisei
aprender a controlar o sentimento dentro de mim, buscando conter
as reações. Deixar de ver Sophie como uma criança foifodido. Mais
fodido ainda foi acompanhar ela tornando-se uma mulher. E que
mulher...
É como se não houvesse no mundo qualquer outra mulher
em potencial. Sempre foi, sempre é ela. Não há escapatória ou
chance de fuga dos sentimentos, mas eu fujo sempre que estamos
perto, porque... porque eu não consigo não querer algo que não
posso ter.
Há um grande problema em relação à distância. A cada vez
que nos encontramos, parece ter aumentado o nívelde intensidade
entre nós. É algo que dá para ser notado até mesmo pelos olhares.
Por ser fechado em meu próprio universo, tudo em mim é intenso
demais e, para complicar a minha vida, Sophie possui uma
intensidade natural, e eu apenas não consigo ocultar muito o quanto
isso me afeta. Quando éramos adolescentes, parecia mais fácil,
porém, quanto mais velhos vamos ficando,pior fica.Parece que há
uma tensão sendo construída entre nós há anos e que a qualquer
momento irá explodir. Há alguns poucos momentos em que parece
que ela sente o mesmo que eu, porém, na maior parte do tempo,
acho apenas que é um amor entre "irmãos", já que fomos criados
praticamente juntos e não a imagino tendo pensamentos pervertidos
comigo. Eu penso assim, mas Samuel também sempre foinosso fiel
escudeiro e há uma diferença gigante na maneira como ela o trata.
Minha inexperiência me deixa confusoquase sempre. Não entendo
absolutamente nada sobre esses assuntos do coração; eu
simplesmente sinto o amor, mas não o compreendo e tampouco sei
lidar com ele.
Conforme vamos nos aproximando do sítio, eu vou
relembrando a infância.Nunca fui o garoto de ficarcorrendo com a
turma, mas me recordo desse lugar. Eu era o que ficava quieto,
desenhando e observando os demais subirem em árvores, fazendo
saltos incríveis na piscina. Estar de volta é como obter uma
lembrança viva do passado.
— Chegamos! — Sophie diz, animada. — Se lembra de
quando você dizia que queria morar aqui?
— Sim. Bom, faz todo sentido, não acha? Olha o silêncio
desse lugar! Sons apenas dos pássaros, das quedas d’água, o
cheiro de mato, os animais. Talvez eu ainda tenha esse sonho. —
Sorrio. — Vamos ver se minha hospedagem aqui trará essa vontade
de volta.
— Venha! Pelo amor de Deus, retire esse casaco, está calor!
— Ela sai me puxando para entrar na casa e, assim que entro, retiro
meu casaco sob o olhar, no mínimo, estranho dela.
— A casa foi modificada.
— Sim, está mais moderna agora. Passou por obras,
principalmente antes de Théo vir pra cá — explica. — Você está
malhando?
— Um pouco. Nada excessivo. Por quê?
— Prefiro não responder — ela diz e se joga em meus
braços. — Eu senti tanto a sua falta! Estou tão feliz que esteja aqui.
— Também senti a sua falta. Faz alguns meses que não nos
vemos.
— Ainda estou magoada por ignorar minhas chamadas de
vídeo e ser contra os meios de comunicação.
— Não sou contra os meios de comunicação — afirmo,
sorrindo. — Só não gosto.
— Você está tão go... lindo. Puta merda! — diz, com as duas
mãos em meu rosto. — Você é e sempre será o menino mais lindo.
— A abraço mais forte e beijo seu ombro. — Vamos ficar muito
tempo juntos. — Vai começar a tortura! Ficar muito tempo junto com
ela é uma tortura, parecia fantástico quando criança...
Quando nos afastamos, eu fixo meus olhos em seus lábios.
Há um piercing no lábio inferior, há tatuagens novas, há um combo
destruição nessa menina. Lembrar de piercing me faz pensar em
clitóris, por isso me afasto ainda mais, dando dois passos para trás.
— Chegamos, meu povo! Alô, galera de cowboy!!! Aoooo,
trem que pula!!! — Samuel surge com o restante do pessoal. —
Trouxemos coisas para um churrasco selvagem!
— O que seria um churrasco selvagem? — pergunto.
— Uma festinha doida, para aloprar, com direito a sexo
selvagem no final... — explica e eu balanço a cabeça em negação.
— Passamos no bar do Tião e trouxemos pinga! — Eva
informa, radiante.
— O que eu estou fazendo aqui? Talvez Miguelito seja a
salvação, porque só há loucos.
— Eu não gosto de bebidas, mas quero experimentar a
pinga, com moderação, é claro. Detesto excessos. — Sophie vai até
Eva. A merda está formada e eu já vou logo em busca de um
refúgio.
— Théo, onde tem um quarto isolado nesse lugar? —
pergunto, o fazendo rir.
— Segue o corredor. Última porta à direita. Lá é o local mais
silencioso. Vou levá-lo! — Ele e Luiz Miguel me acompanham e eu
agradeço internamente por isso.
Preciso de um lugar para onde eu possa fugir quando tornar-
se difícildemais. Eu sei que isso vai acontecer por causa do barulho
excessivo e por Sophie... principalmente por Sophie.
A fuga faz parte de mim.
Piercing no clitóris!
A famíliado meu pai é extremamente unida. Se algo ruim
acontece com um membro, todos os demais se compadecem e se
unem para ajudar. Se algo bom acontece, se unem para festejar,
não importa o dia que seja.
Pesquisas feitas por psicólogos mostraram que o tempo de
duração de um luto é de oito meses a um ano, podendo se estender
a dois anos.
Um outro estudo diz que quando a perda é de um cônjuge, as
coisas pioram. Indivíduos que perderam seu cônjuge, têm níveis
mais altos de citocinas pró-inflamatórias (algo que indica inflamação
na corrente sanguínea), e passam a ter uma diminuição da
frequência cardíaca.Isso aumenta o risco de problemas cardíacos.
Nos primeiros seis meses, o risco de morte aumenta para 41%.
Essa diminuição da frequência cardíaca está associada
também à falta de atividade sexual. Sempre ouvi meu pai dizer que
sexo é vida, e talvez faça sentido mesmo. Pelos estudos, uma vez
que você deixa de praticar o ato, sua frequênciacardíacasofre uma
diminuição considerável. É um pouco absurdo para mim, mas há
muitas pesquisas sobre o assunto. Isso me fazpensar que talvez a
minha frequênciacardíacaesteja muito baixa, já que tenho 22 anos
de idade e não façosexo. Será que malhar ajuda? Eu preciso fazer
pesquisas sobre isso. Estou preocupado. Masturbação pode ser
comparada ao sexo?
De qualquer forma, meus problemas agora não importam,
apenas não quero que Luiz Miguel, meu primo de consideração,
morra. Já fazum ano desde que Clarinha nos deixou e ele não está
bem. Estou preocupado que ele vá desenvolver um processo
depressivo. Porém, ver a animação em todos e perceber que eles
são os únicos que podem levar um pouco de alegria para Luiz
Miguel, faz com que eu me sinta um pouco insuficiente. Samuel,
meu irmão, pode fazê-lo rir; Théo, também meu primo de
consideração... Ainda estou conhecendo Théo, mas ele também
parece ser divertido. Soso...
Soso é filha do meu tio Victor e irmã de Luiz Miguel. Na
verdade, ela é mais que isso...
Eu não quero olhar ou pensar nela agora, mas faço e me
arrependo no mesmo instante. Há um elástico em minha mão. Estou
girando-o em meus dedos e os movimentos aumentam
consideravelmente enquanto a observo.
Estamos fazendo um churrasco para o almoço. Eu tentei ficar
no quarto, porém, me lembrei das palavras da minha mãe. Ela pediu
por favor. Pediu que eu me esforçasseum pouco para socializar ao
menos com os meus primos, e eu prometi a ela que faria. Se eu
prometo algo, não consigo deixar de cumprir. Na minha primeira
tentativa de não cumprir a minha promessa, a cobrança mental
surge, repetindo infinitas vezes o juramento que fiz.Todas as vezes
que prometo algo, tento voltar atrás, porém minha mente não deixa.
Eu acho que ela está certa. O mais honesto é você sustentar suas
próprias palavras. Mas, em alguns casos, é apenas difícil.
Nesses casos difíceis sempre há Sophie envolvida.
Sinto uma enorme saudade de todos os momentos onde
ficávamos grudados um ao outro, mas já faz alguns anos que deixou
de ser o paraíso para tornar-se uma quase tormenta; é por isso que
a evito, por mais que doa. A proximidade excessiva ultimamente faz
com que eu tenha que ficarem uma batalha mental exaustiva. E, a
observando envolvida em um biquíni, com os olhos devidamente
fechados, enquanto a água forte da ducha cai sobre seu corpo,
percebo que insistir em ficar aqui, vendo as mais várias cenas
acontecendo bem diante dos meus olhos, apenas para cumprir a
minha promessa, será um erro.
Então por que não saio logo?
Você sabia que chamar uma mulher de gostosa pode ser
considerado um ato de violação? Bom, o que para muitos é visto
como um elogio, para outros é visto quase como um crime.
Esse lance de gostosa é algo que eu tento entender. Sempre
ouvi Samuel, filho do meu pai e meu irmão de consideração,
chamando as garotas de gostosas, mas como funciona isso?
Porque uma torta alemã é gostosa. Ela tem aquele creme que
derrete na boca, que deixa tudo incrível.Um sorvete de creme com
pedaços de doce de leite e caramelo é extremamente gostoso. Uma
lasanha de presunto e queijo é absurdamente gostosa. Qual a
comparação disso com uma mulher? Seios, bunda... eles possuem
um gosto? É meio absurdo, mas acho que se pudesse colocar a
minha boca em Sophie, talvez eu me transformaria em um desses
caras que chamam as mulheres de gostosas. Ela deve ter um gosto
delicioso, eu gostaria de lambê-la por completo.
Sophie é gostosa aos meus olhos. Ela é a mais gostosa, de
acordo com eles.
Quando ela sai da ducha, sua atenção se volta a mim e ela
abre o sorriso mais lindo do mundo. Todas as vezes que ela sorri
para mim, um sorriso cresce em meu rosto. Parece automático.
Sophie sorri, eu sorrio.
— Ei, Sophie, vamos dançar essa música? — Eva, a noiva de
Théo, a chama.
Há uma música baixa tocando, e isso me coloca em um misto
de confusão. Me sinto grato a eles por terem cuidado com coisas
que testam os meus limites, mas, ao mesmo tempo, sinto que
atrapalho um pouco da diversão de todos.
De qualquer forma,parece bom para eles e Sophie se junta à
Eva para dançar. Quando Sophie se vira de costas para mim, desvio
meu olhar. O corpo dela é algo que me causa reações. A única
coisa que me convence a observar a cena é a voz do amigo de Eva.
A diversão termina quando ele sai da piscina e toca a cintura
de Sophie. Os dois começam a dançar juntos e eu passo a engolir
em seco repetidas vezes. Sophie tem um gingado natural desde
criança. Ela é movida à música. A maneira como o corpo dela se
move de acordo com a melodia da canção é incrível. Ela parece
sentir o tom e se entrega a isso.
O amigo de Eva começa a ficar um pouco ousado nos
movimentos e sinto meus batimentos cardíacosatingirem um novo
nívelde frequência. Começo a girar o elástico em minha mão mais
rápido, até que ele se arrebenta, sinalizando que atingi o meu limite.
Não sei explicar como me sinto quando vejo alguém tocá-la. Me
lembro de alguns episódios violentos que tive durante a infância, e
eles parecem voltar com força a cada vez que vejo cenas como
essa.
Não sou um menino violento. Não sou um menino violento.
Não sou um menino violento.
Porém, mesmo que não seja, sinto vontade de me aproximar
e jogar esse garoto a alguns metros de distância. Sinto vontade de
pegar Sophie e escondê-la dos olhos de todos. Sentir todas essas
coisas dói. Dói tanto que, antes que eu não possa mais conter as
minhas emoções, decido me recolher.
Estou caminhando rumo ao quarto quando uma garota
molhada vem correndo e entra na minha frente.
Ela prende meu rosto entre suas mãos, eu prendo o dela
entre as minhas.
— Aonde vai? — pergunta.
— Dormir. Estou cansado da viagem. Pode se divertir. Eu vou
ficar bem.
— Por que não fica mais perto de mim? — ela questiona,
como se sentisse dor. — Você não gosta mais de mim? Não sou
mais a sua melhor amiga? Você tem outra amiga?
— Não tenho outra amiga, Sophie. E nunca terei. Você
sempre será a minha melhor amiga. Só você — afirmo. — Estou
cansado da viagem. Foi longa e passei a madrugada conversando
com Samuel, para mantê-lo desperto enquanto dirigia. Vou dormir e
acordarei mais disposto.
— Promete que vai ficar comigo hoje à noite? Eu não me
importo se não quiser sair, nós podemos assistir um filme, eu posso
fazer pipoca. Eu te amo — ela diz, soltando meu rosto e me
abraçando.
Meu Deus do céu! Sophie está de biquíni e grudada ao meu
corpo! Meu corpo simplesmente precisa não responder a isso,
mas...
Uma ereção começa quando o cérebro envia um sinal para a
medula espinhal através dos nervos que chegam à pelve. Alguns
dos nervos que provocam uma ereção se situam dos dois lados da
glândula prostática. Quando este sinal é recebido, o tecido
esponjoso no interior do pênis relaxa e expande os vasos
sanguíneos, que levam o sangue para o pênis. Com as expansões
das paredes, o sangue no interior pode circular até 50 vezes mais
rápido do que sua velocidade habitual. O sangue preenche dois
tubos esponjosos de tecido no interior do pênis. As veias, que
normalmente drenam o sangue do pênis, ficamfechadas,para que
mais sangue permaneça dentro. Isso faz com que se produza um
grande aumento da pressão dentro do pênis, o que provoca uma
ereção firme. E tudo isso significa que meu cérebro agora está
sendo um completo idiota irresponsável, por estar enviando todos os
sinais para que logo meu pênis fique com uma ereção firme que,
provavelmente, fará com que eu queira abrir um buraco no chão
para me enterrar dentro dele.
Começa a acontecer quando sou obrigado a tocá-la para
retribuir o abraço. Eu posso jurar que a sinto tremer quando minhas
mãos deslizam pela sua cintura. Todos os meus sentidos são
altamente aguçados, por isso, consigo sentir sua pele repleta de
bolinhas. Quanto mais deslizo as minhas mãos, mais reações
surgem no corpo dela. Essa é uma descoberta muito assustadora
para mim, mas que também não quer dizer nada. Eu só saberia que
Sophie está excitada se ela tivesse uma ereção firme, mas ela é
uma garota e possui uma vagina, o que contribui diretamente para
que minhas dúvidas sobre o tipo de reação que ela está sentindo
não sejam esclarecidas.
Me afasto quando a situação torna-se demais e a pego com
as bochechas ruborizadas, mordendo firmemente seu lábio inferior.
Faço uma anotação mental sobre isso e caminho rumo ao quarto,
fechando a porta com chave assim que entro.
Fico alguns minutos andando de um lado para o outro. Tenho
esse tipo de comportamento quando me sinto perdido ou nervoso
demais. Faço isso quando tenho dificuldadepara entender algumas
coisas. E ligo para o meu pai quando preciso de uma opinião menos
científica.
— Filho, está tudo bem? — É a minha mãe quem atende.
— Mãe, está tudo bem. Por que não estaria?
— Só estou perguntando, filho — ela responde, rindo. —
Descansou da viagem?
— Ainda não, mãe. Mas fugi de Sophie e vou tentar
descansar agora. Meu pai está aí?
— Por que fugiu de Sophie?
— Mãe, isso é assunto de meninos. Eu ficaria feliz em falar
com o meu pai — explico a ela.
— Sabe, filho, mamãe entende sobre muitos assuntos de
meninos. E ainda tem o agravante de eu ser menina. Então,
entendo também das atitudes de meninas. Eu posso ajudá-lo
enquanto seu pai está saindo do banho para falar com você.
— Mãe, você tem reações físicasquando papai te abraça?
Você sente arrepios? Sophie me abraçou e eu tive uma ereção
firme, ela teve arrepios quando eu toquei em sua cintura.
— Oh, merda! Digo... LUCCA!!! — ela chama o meu pai. —
Henrico teve uma ereção firme. Se existe alguém que pode falar
com ele sobre ereção firme, esse alguém é você. Eu não tenho
pênis! — diz ao meu pai.
Ok. Por que ele é homem? Ou por que ele tem ereção firme
quando minha mãe o abraça? Não quero imaginar isso, de forma
alguma!
— Graças a Deus, Paula! — ele a responde. — Oi, filho.
— Pai, não é apenas porque estou com uma ereção firme. —
Ele ficaem silêncio por um momento, até finalmente me responder
com uma pergunta. Eu odeio quando me respondem fazendo uma
pergunta, mas isso acontece constantemente. As pessoas me
respondem perguntas com perguntas, como se quisessem se
certificar de algo. Eu não entendo a necessidade disso, mas lidar
com pessoas é complexo demais. Eu sempre vou preferir os
animais. Eles são menos complexos e compreendê-los é
significativamente mais fácil.
— Anos atrás eu te ensinei como lidar com isso, não foi?
— Sim, mas não é sobre lidar com uma ereção. Eu toquei a
cintura nua de Sophie e ela se arrepiou.
— Ela teve uma reação ao seu toque. Talvez seu toque tenha
algum efeito sobre ela. Já imaginou isso? Seria legal, não? Você
gosta de Sophie.
— Pai, não tem como eu saber se a reação que ela sente é
ao menos parecida com a que eu sinto. A excitação em garotas é
diferente. Quando começa a excitação em garotas, a vagina fica
mais longa e mais larga. As células que revestem a vagina secretam
gotículas de líquido ou lubrificante, que fazem com que fique
escorregadia. Como eu poderei saber se isso está acontecendo com
Sophie? É assustador pensar em uma vagina longa e larga.
— Puta merda! Bom, sim, quando uma garota está excitada
nós dizemos que ela fica "molhada". Sua... vagina fica mesmo
úmida e só é possível descobrirmos quando tocamos ou caso ela
decida dizer. Porém, não leve de forma tão literal esse "longa e
larga". Você já viu aqueles filmes educativos, sabe que o órgão
sexual da mulher não modifica durante a excitação, ao menos não
exteriormente. Na verdade, se expande apenas para receber o
nosso... Isso é difícilde ser conversado. — Essa resposta me faz
sentar na cama.
— Nosso pênis.
— Sim, filho. Ela se abre um pouquinho apenas para receber
o nosso pênis.
— Sophie tem um piercing no clitóris. Eu não pude analisar
— confesso.
— Você quer analisar?
— Estou curioso, mas sei que não posso pedir que ela me
mostre. Isso é muito íntimo, e não sou inocente o bastante. Assisti
filmes.Eu fariacom ela tudo o que já vi. Tenho a consciência de que
pedir para ela me mostrar seria como um pré-ato para me sentir
confortável.
— Ah, sim, o confortável. Você não se sente confortável
ainda, então apenas relaxe, filho. Veja filmes educativos, você sabe
o que fazer. Acho que isso será o escape até se sentir confortávelo
bastante para investir pesado.
— Investir pesado? — pergunto.
— Dar um passo em sua relação com Sophie.
— Ela é a minha melhor amiga, pai. Não vai acontecer. Não
quero perdê-la como amiga e ela tem uma rotina mais dentro da
normalidade que eu. De qualquer forma, o arrepio significa que
talvez ela tenha reagido a mim da forma como reajo a ela?
— Tenho certeza que sim. Preste atenção nos mínimos
detalhes, ok?
— Ok. Só mais uma coisa, pai. Há um garoto em torno de
Sophie e eu não gosto dele. Ele disse que Sophie é gostosa. O que
eu devo fazer?
— Mantenha-se perto dela. Não dê chance dele se
aproximar. Quando queremos muito algo, devemos lutar, mesmo
que discretamente. — Ok, manter-se perto, eu posso fazer isso,
mesmo que seja necessário manter uma almofada entre nós.
— Tudo bem.
— Me ligue se precisar, filho. Eu amo você. Sua mãe quer
falar...
— Filho. — Minha mãe está chorando.
— Mãe?
— Eu só queria dizer que é a coisa mais fantásticado mundo
ver sua inocência em assuntos sexuais e assuntos sentimentais.
Você é tão maduro para outras questões, que ver que ainda possui
uma inocência e uma certa inexperiência torna-se algo singelo e
bonito — fala. — Sempre quando o vejo conversando com seu pai,
isso mexe muito comigo. Eu tive a sorte de conhecer o seu pai.
Sophie tem a sorte de ter um homem como você apaixonado por
ela. Estou sonhando com o momento em que ela descobrirá sobre
seus sentimentos. Eu sinto que vocês vão descobrir muitas coisas
juntos e, quando isso acontecer, será o momento mais incrível da
vida dos dois.
— Você acha que um dia ela será a minha namorada? Você
acha que eu sou capaz de namorar?
— Você é muito além de capaz. Só não fez, porque desde
que se entende por gente, só existe uma garota na vida para você.
E sabe o que é mais incrível?Essa garota é a sua melhor amiga.
Ela sabe tudo sobre você, sabe tudo sobre o seu universo, suas
limitações, sua inteligência... Há tanto para você descobrir sobre
tudo que ela sente e sabe.
— Obrigado, mãe.
— Eu quem o agradeço por ser o homem mais incrível do
mundo inteiro e o meu primeiro melhor presente da vida. Eu te amo,
filho. Fique com Deus.
— Você também, mãe.
Mantenha-se perto dela...
Ao invés de ir obter o mínimo de alívio e dormir, controlo o
ânimo, retiro minhas roupas, visto uma sunga boxer preta e volto
para a área externa da casa. Procuro Sophie com os olhos, porém,
assim que a encontro, ela fixa o olhar em mim, escorrega e leva um
tombo feio, o que me faz correr para socorrê-la.
A vida era muito mais fácil quando Henrico usava uma
bermuda para as atividades aquáticas. Ele usando uma sunga, que
mais se parece com uma cueca boxer, é impactante o bastante. Faz
um tempo desde que o vi sem camisa, então é compreensívelmeu
choque.
Henrico costumava ser magro, discreto. Esse homem que me
tem em seus braços agora, é tudo, menos magro e discreto. Eu não
sei dizer bem qual foi a transformaçãoque o corpo dele sofreu. O vi
há mais ou menos uns seis meses, num dia chuvoso e frio,onde ele
estava usando um conjunto largo de moletom. Fora de todas
aquelas roupas se esconde algo que eu sempre quis ver, mas não
me sentia preparada o bastante. Ainda estou em uma disputa
interna entre agradecer a Samuel por incentivá-lo a malhar ou
chutá-lo. É uma bênção e uma tortura.
Coxas grossas, um volume generoso em sua sunga, seis
gomos perfeitos na barriga, pelinhos delicados por todo peitoral e
pelo famoso "caminho da felicidade",e braços fortese com algumas
veias em evidência. Não ajuda que o rosto dele seja perfeito. Eu não
sei descrever o que são esses lábios, tão pouco a barba adornando
cada pedacinho e fazendo com que ele se pareça ainda mais
quente.
Mas...
O lado ruim da vida é quando surge o "MAS".
Henrico não é o garoto que vai me jogar contra a parede e
me consumir por completo. Não é o garoto que "do nada" vai tornar-
se um rompante de safadezae atitude. Eu sei disso e, ao contrário
do que parece, não é decepcionante que ele não seja como a
maioria garotos. É angustiante, principalmente conforme os dias,
meses e anos vão se passando.
Tão angustiante que larguei a faculdade e retornei ao Brasil
há poucos dias, contra a vontade dos meus pais, contra todos,
apenas para estar mais perto dele. O simples fato de estar perto já
consegue preencher alguns dos espaços vazios dentro do meu
coração. Talvez, com cuidado e delicadeza, eu consiga trabalhar e
realizar o maior sonho da minha vida: tê-lo.
Já fui questionada sobre esse sonho, até mesmo julgada.
Enquanto a maioria das mulheres sonha com a independência, com
viagens, com riqueza, poder, eu sonho em possuir o coração do
meu melhor amigo e viver o resto dos meus dias ao lado dele. Tão
poético quanto parece ser, apenas para destoar da imagem de
garota sem limites que todos têm de mim.
Sempre foi Henrico. Sempre será. E nunca houve um só dia
em que eu pensei em desistir ou tentar substituí-lo.Não há qualquer
garoto à altura de tudo que ele é e significa para mim.
Eu choro. Eu choro porque amar em silêncio é doloroso o
bastante. Eu choro porque tenho pressa quando tudo que preciso é
ser paciente. Eu choro porque todas as vezes que digo que o amo,
ele entende como se eu estivesse dizendo que o amo como meu
melhor amigo. Eu choro porque queria estar para sempre em seus
braços e esse "para sempre" nunca chega. Eu choro porque meu
corpo grita por algo que ninguém é capaz de me dar.
Eu rezo pelos mesmos motivos; para que eu possa gritar o
meu amor, para que eu possa mergulhar nele, para que ele entenda
que eu o amo como uma mulher é capaz de amar um homem, para
que ele abra seus braços e me deixe ficarpara sempre, e para que
ele me dê tudo.
Ele me coloca sobre a sua cama e eu consigo vê-lo por
completo, mais perto que nunca. Eu choro pelo desejo de tocá-lo.
— Sophie, eu vou cuidar de você — ele diz de um jeito muito
lindo.
— Ok. Você pode apenas fazerum favorantes de cuidar de
mim?
— Eu posso fazer — responde sério, esperando o meu
pedido.
— Você pode enrolar uma toalha em torno de si? Apenas
para eu não vê-lo de sunga?
— Oh! — exclama, envergonhado, cobrindo o volume em sua
cueca. Nunca quis tanto ser as mãos de alguém. — Me desculpe
por desrespeitá-la, Sophie.
— Não me desrespeitou. Na verdade, eu festejaria bastante
se me desse um "desrespeito" desse. Quer dizer, esqueça o que
estou falando. É apenas porque...
— Eu vou enrolar uma toalha — avisa, indo até ao banheiro,
e eu suspiro, transtornada. Ter o sangue quente é uma maldição às
vezes.
O abençoado surge na porta enrolado em uma toalha branca.
Poderia aliviar o que estou sentindo, mas não alivia nada. Agora ele
molhou os cabelos e há gotículas de água escorrendo pelo seu
peitoral.
— Pronto. Você está sentindo dor? — pergunta.
— Em lugares que você nem imagina. — Henrico se superou
na arte de se tornar gostoso. Eu queria arrancar essa toalha no
dente, abaixar essa sunga e... Santa Josefina,me perdoe por pecar!
— Podemos ir em busca de um hospital.
— Não vai resolver — afirmo.
— Sophie, o que eu posso fazer? Não gosto de te ver
chorando. Meu peito dói. — Ele derruba toda a minha safadeza,
sempre! Até fazcom que eu me sinta levemente culpada por querer
jogá-lo sobre essa cama e matar quem me mata um pouco a cada
dia.
— Desculpe. Estou tendo alucinações. — O observo franzira
testa e me encarar sério. Começo a rir, porque ele sempre leva tudo
para o sentido literal.
— Você me enganou? Minutos atrás estava chorando e agora
está rindo, Sophie. Eu não estou entendendo.
— Machuquei apenas o meu bumbum e torci um pouco meu
pé direito — informo,ficandode pé e caminhando mancando até um
espelho, onde confirominha bunda. Pelo reflexodo espelho, o vejo
com os olhos fixados em minha bunda. Samuel disse que eu deveria
observar mais algumas ações de Henrico, e eu façoisso. Ele desvia
o olhar da minha bunda assim que o encaro através do espelho. —
Não foi nada demais. Só há uma dorzinha no meu pé — aviso e
ando até ele. — Você pode me abraçar muito forte? — peço,
voltando a chorar, e ele faz. Ele me abraça forte e eu deito minha
cabeça em seu ombro direito.
— Não chora, Sophie, por favor.
— Eu te amo. — Ao infinito e além.
— Eu vou cuidar de você. Você quer brigadeiro?
— Quero — respondo, sorrindo entre lágrimas.
— Eu vou fazerpara você, tudo bem? Pode apenas ir tomar
banho e vestir uma roupa decente? É desrespeitoso.
O tema da vez é desrespeito. Acabo de perceber. Sorrindo,
me afasto dele e vou até meu quarto tomar banho e vestir uma
roupa "respeitosa".
— Ei, senhorita, você está bem? — Samuel surge, vestindo
um roupão bem esquisito, quando estou prestes a entrar no quarto.
— Sim, só torci um pouco o pé e meu bumbum está um
pouco dolorido — explico, o abraçando. — Eu te amo até o céu!
— Onde está Henrico?
— No quarto. Pediu que eu viesse tomar banho e vestisse
uma roupa decente para assistirmos filme — comento, sorrindo.
— Podemos conversar um pouco? Em particular.
— Claro que sim. Entre. — Ele entra e fecha a porta.
— Sente-se — pede, apontando para a cama, e eu me sento,
o analisando.
— Fiquei muito "tiporrei"[2] nesse roupão, né? — Reviro meus
olhos e sorrio.
— Extremamente.
— Tô me sentindo muito rei delas! Enfim, quero falar sobre
Henrico e você. — Franzo a testa. — Sophie, todos amam vocês e
sentem medo de vê-los sofrerem por conta dos sentimentos. Eu sou
um pouco protetor, você sabe.
— Perfeitamente.
— A questão agora é que Henrico está numa fase mais...
Como posso dizer? Ele tem estado mais curioso em relação a
algumas questões.
— Questões? — pergunto. — Quais os tipos de questões?
— Não vem ao caso. Eu só queria dizer que ele acordou para
algumas questões apenas agora e está meio perdido, com dúvidas
e curiosidades demais. Sei o que sente por ele, sei que deve estar
cada vez mais difícillidar com isso, mas tenha um pouco mais de
paciência, ok? Está sendo extremamente difícilpara ele também.
Ele se sente diferente, se sente atrasado, se sente insuficiente,
incapaz. Estamos tentando lidar com isso juntos, inseri-lo cada vez
mais em nossa rotina, para que ele perceba que não há nada a
temer. O tipo de abordagem dele é diferente, por exemplo, do meu
tipo de abordagem, e ele é literal demais. Você vai atingir o seu
propósito, posso quase apostar nisso, mas precisa ir com cuidado,
tudo bem?
— Eu sei. Tenho pressa, mas sei que preciso ir a passos
lentos.
— Henrico ainda não sabe que você voltou para o Brasil
definitivamente, não é mesmo?
— Ainda não falamos sobre isso. Mas vou comentar.
— Você é muito mais experiente que Henrico, mas não quero
que se machuque, Sophie. Quando ficardifícilou se sentir perdida,
venha até mim. Seja firme, aguente firme, continue sendo paciente.
— Me levanto e ele abre os braços para me receber. — Sei que
esse amor dói.
— Eu o amo com todas as minhas forças.
— Observe.
— Estou fazendo isso, mas não encontrei nada ainda —
confesso.
— Siga observando. Só se encontraram há poucas horas.
Talvez você ainda não seja capaz de perceber, mas Henrico está
sofrendo mudanças consideráveis. A zona de conforto está
começando a incomodá-lo e o óbvio já não está o satisfazendo
mais. Apenas seja paciente e observadora. O amor dele é puro pra
caralho.
— Eu te amo também.
— Eu também te amo, Sininho. Não quero que sofra. Você tá
na velocidade cinco do créu, Henrico está entrando na primeira.
— Isso significa que Henrico é virgem?
— Eu não disse isso — ele fala, me soltando. — Enfim, vá
tomar banho para assistir filme com ele. Não vá assediar meu irmão!
— Talvez eu dê uma deslizada de mão para saber o que o
futuro me reserva, se é que meu futuro é Henrico — brinco.
— Eu acho que é, hein!
A cada vez que alguém diz isso, me sinto capaz de
conquistá-lo.
Théo me mostra a despensa da casa e eu pego todos os
ingredientes para fazer brigadeiro para Sophie.
Brigadeiro é o doce preferido de Sophie, por isso, aprendi a
fazer aos 13 anos de idade, numa madrugada chuvosa, onde fiz
minha mãe acordar para me ensinar. Na manhã seguinte a fiz me
levar na casa do tio Victor para entregar os doces para Sophie e ela
foi sorridente, sem nem mesmo me repreender por ter perdido uma
noite de sono. Eu me lembro até hoje do sorriso que Sophie deu, foi
o mais bonito do mundo.
Ela é a menina mais bonita do mundo. É verdade.
Assim que termino o brigadeiro, o coloco na geladeira, para
esfriar mais rápido, e volto ao quarto. Ela já está sentada na cama,
me esperando.
— Eu já sei o filme que vamos assistir! — anuncia.
— Eu não gosto de filme de terror.
— Não é de terror. É um lançamento da Netflix.É de máfia —
explica. — Venha! Sei que o brigadeiro vai demorar um pouco...
— Ok. — Apago a luz e me junto a ela na cama, um pouco
distante. Ela parece mais animada que o normal para assistir ao
filme. Ela dá play e se aproxima de mim, puxando meu braço e o
fazendo de travesseiro.
— Você não parece confortável agora — diz.
— Você está confortável agora? — pergunto, apreensivo.
— Sim, muito confortável. Você não?
— Eu nunca fiquei confortável, mas... por que está
confortável?Você não parece confortávelagora — argumento e ela
levanta a cabeça para me observar.
— Estou deitada, relaxada, confortável. V
ocê também está.
— Eu estava pensando em outra coisa, me desculpe. — Ela
sorri e dá play no filme. Se chama 365 Dias e eu não entendo o
motivo de Sophie querer assisti-lo. Logo no início arregalo meus
olhos e a encaro. Ela rola pela cama e começa a gargalhar.
— Merda, Henrico! Você é extremamente engraçado.
— Isso se parece com filmes educativos!
— Filmes educativos? — questiona, rindo. — Está falandode
filme pornô? — Esfrego meu rosto, mortificado pela vergonha. A
mulher do filme começa a gemer, como as mulheres dos filmes
educativos. Sophie volta o olhar para a TV e agora é o homem
gemendo, enquanto parece que há uma mulher fazendo sexo oral
nele. Isso é absurdo! — Socorro, Deus!
— Esse filme é educativo? Não podemos assistir isso juntos.
— Não é filme pornográfico — ela responde, rindo.
— Você fazo que ela estava fazendo?— pergunto e Sophie
para de sorrir. Ela está me olhando de um jeito estranho, não
consigo compreender.
— Não faço. Você faz o que ele faz?
— Não — respondo timidamente.
— Nunca?
— Sophie, isso não é algo que devo conversar com você,
entende? Você é minha amiga — explico.
— Entendo. Mas você sabia que uma pesquisa feita pela
pesquisadora americana, Heidi Reeder, com 300 pessoas de ambos
os sexos, aponta que 20% dos entrevistados já haviam transado
com um amigo ou uma amiga pelo menos uma vez na vida? Destes,
76% disseram que a amizade melhorou depois do sexo. Dentre os
76%, metade começou um relacionamento amoroso com o amigo,
mesmo que essa não fosse sua intenção original. A outra metade
permaneceu apenas na amizade, muitas vezes, colorida — ela
explica. Eu amo muito que ela goste de pesquisas!
— Eu vi uma pesquisa onde 76% dos entrevistados
afirmaram que a amizade ficou ainda melhor após o sexo e essa
pesquisa não foi da mesma pesquisadora. Talvez faça mesmo
sentido. Elas atingiram a mesma porcentagem sobre o assunto.
Porém, há algo muito ruim sobre essa situação de amizade colorida.
Ela pode levar a algo muito mais profundo e íntimo, ou terminar
abruptamente pelo aparecimento de uma terceira pessoa que
determine o fim desse relacionamento. Se surge uma terceira
pessoa, acaba o vínculode amizade e o sexo. Meu Deus, Sophie,
eles estão nus!
— É normal, Henrico.
— Ele é bruto.
— É excitante — afirma.
— O quê? — pergunto, a encarando.
— Vamos assistir, você vai entender em algumas cenas. —
Faço o que ela sugere. — Ei, eu te amo muito. Você é o menino
mais lindo do mundo! — Sorrio e faço um carinho em seu rosto.
— Você é muito princesinha.
Mas não consigo entender o tipo de relação entre o casal do
filme.Eu não gosto do filmeou da situação entre eles. Grande parte
já se passou e o cara parece um viciado em sexo oral. Deve ser
realmente bom. A mulher, eu nem quero falar sobre ela. Eles estão
em um barco agora e está começando uma cena após ela ter caído
no mar. Sophie nem pisca, e eu entendo o motivo. Isso é sim um
filme educativo, mas não sei que tipo de educação ele quer passar.
Os filmes que eu assisto são muito mais leves. O cara cospe na
mulher e...
— Senhor da glória!!! — Sophie exclama.
Meus olhos ficamfixadosna tela, horrorizado o bastante com
a cena. Eu nem consigo respirar durante os próximos minutos.
Quando a cena termina, Sophie solta um gemido e eu dou um salto
da cama, rumo à fuga.
Calço meu chinelo e, assim que abro a porta do quarto para
desaparecer, Samuel cai diretamente no chão do quarto, juntamente
com Théo, Eva, Maicon e Luiz Miguel.
— Vocês estavam fazendo sexo? — eles perguntam juntos.
Henrico está perdido e eu estou rindo.
Samuel tem o dom de ultrapassar os limites da cara de pau.
— Vocês são malucos? — Henrico pergunta, encarando a
todos no chão. Aos poucos eles começam a se levantar. — Por que
estavam atrás da porta? Por que perguntaram se eu e Sophie...
— Porra, Sophie! Eu pensei que você havia concordado em ir
devagar — Samuel diz, se levantando.
— Infelizmente, estou indo devagar. Eu queria ir bem rápido e
forte!
— Onde? — Henrico pergunta e eu ficode pé para protegê-lo
de toda loucura. Sei que agora ele está perdido e assustado.
— Ok, pessoal! Nós só estávamos assistindo um filme, 365
Dias. É de máfia, mas parece pornô, porque tem muito sexo, o
tempo todo. Uma delícia! Digo, um absurdo! Uma falta de respeito
sem tamanho.
— Que tal assistirmos juntos na sala? — Théo convida. —
Será divertido. Topa, Henrico?
— Eu não sei... — Henrico diz, sem graça. — Não acho que
seja legal.
— Vamos lá, cara! Vamos dar algumas risadas juntos! —
Samuel convida, o abraçando. Henrico o acompanha nessa loucura
e eu pego o fonede ouvido dele por medida de segurança, levando-
o comigo até a sala.
Por algum motivo, estou percebendo que, dessa vez, todos
estão um pouco mais insistentes em manter Henrico incluso nas
atividades. Deve haver algum motivo e estou sentindo que perdi
algo, alguma informação. De repente, as palavras de Samuel
começam a fazer sentido. Ele disse que Henrico está se sentindo
desconfortável com a zona de conforto e está se esforçando por
alguma coisa. Eu realmente preciso usar mais do meu poder de
observação. Sinto-me em completa desvantagem agora.
Quando chego na sala, pego Henrico pela mão e o faço se
sentar ao meu lado.
— Você está bem com essa loucura?
— Não sei. Acho que sim. Eu prometi à minha mãe que me
esforçaria — responde, fixado em meu lábio inferior
. — Você beija?
— Você beija? — Devolvo a pergunta apenas por temer a
reação.
— Você já se sentiu confortável? — Eu preciso decifraro que
é esse confortável, porque parece que para ele essa palavra é
utilizada para se referir a algo que não é literal. Isso é bastante
estranho, visto que ele gosta de levar tudo ao pé da letra.
— Você poderia me explicar o que significa se sentir
confortável?Eu não estou compreendendo bem — peço, apertando
as bochechas dele. — Você é perfeito demais.
— Não posso explicar isso. Talvez um dia.
— Tudo bem, eu posso esperar. Sempre vou esperar por
você, ok?
— Ok. — Ele sorri e aperta minhas bochechas também. —
Sempre vou esperar por você.
— Estou aqui agora. Não precisa esperar por mim — digo,
observando seus olhos fixados aos meus.
— Aoooo! Quando eu crescer vou ser igual esse cara! —
Samuel diz, desviando nossa atenção, só então me dou conta de
que o filme já começou.
— Mafioso? — Luiz Miguel pergunta, rindo. Ele está no
mesmo sofá que eu e Henrico, e eu o puxo para um beijo na
bochecha. — Você me lambeu!
— Foi só um beijinho molhado, irmão! — explico, sorrindo.
— Misericórdia, esse filme! — Maicon exclama. — Esse
homem, certamente, jamais seria passivo em uma rodada de sexo
suado.
O que dizer desse ator que eu mal conheço e já considero o
bastante?
— Esse noivo dela é um idiota. A mulher chega pronta para o
ato, cheia de vontade, e o imbecil não dá nem uma atençãozinha?
— Théo comenta. — Evadia, você nunca vai passar necessidade.
Vem quente!
— Por que acha que vou me casar com você? — Eva diz,
sorridente. — Por sexo!
— Um casamento não deve acontecer por sexo — Henrico
comenta, sério. — Sabia que a proporção é de um divórcio a cada
três casamentos? É um número alto. Eu penso que talvez o sexo
não seja o suficientepara manter um relacionamento. Uma vez que
você se casa, você faz sexo. Se sexo fosse o componente
fundamental de uma relação, as pessoas não se divorciavam.
— Você está certo. Eu estava apenas brincando, porque
gosto de irritar o Théo — Eva explica, sorrindo. — Para um
casamento, ou até mesmo um relacionamento dar certo, é preciso
um mix de coisas, a começar por uma amizade, para ambos
desbravarem um ao outro e buscarem o maior número de coisas em
comum, além da compatibilidade e atração. A atração é um
ingrediente importante. O sexo acaba sendo um ingrediente
importante também, porque mantém o casal conectado. Na verdade,
eu considero o sexo o maior ato de conexão entre duas pessoas.
Não é o principal, mas é importante.
— Esse cara é bom, hein?! — Samuel diz. — Me identifico
com ele na pegada.
— Não me julgue, mas essa mulher está feliz da vida com
esse sequestro. É compreensível. Quem não estaria? No filme
parece perfeito — comento e Henrico me encara. — Mentira, acho
abusivo.
— Na vida real não é assim — Luiz Miguel divaga.
A cena do sexo da lancha começa e o povo vai à loucura. Eu
começo a rir quando Samuel fica de pé e simula sexo com o
aparador abaixo da TV.
— Vaiiii, safada! — ele diz de uma maneira engraçada,
fingindo que o móvel é a bunda de uma mulher e distribuindo tapas.
— Foi só a cabecinha! Vou colocar tudo agora! É isso aí... Me
receba, potranca!
A cara de Henrico é impagável, e piora quando Maicon
decide ser a "Laura" de Samuel. Eu quase faço xixi nas calças
quando Samuel agarra os cabelos de Maicon e dá um tapa forte na
bunda dele. O pobrezinho até se assusta, mas segue rindo.
— Me dê o seu MASSIMO — Maicon pede. — Me chama de
Laura e me dá uma cuspida.
— Com cuspe e com jeito, invado o seu estreito! — Samuel
fala. — Aoooo, Laura, Jacinta o orgasmo chegando!
— Que merda! — Luiz Miguel diz, rindo.
— Me desculpem, mas Théo é mais potente que esse
Massimo.
No momento que Laura e Massimo atingem o pico do prazer,
Samuel e Maicon gemem alto, como se estivessem, de fato,
atingindo o orgasmo juntos. Eu estou chorando, mas Henrico está
realmente sério, olhando para a cena. Isso torna tudo ainda mais
engraçado do que realmente é.
— Foi bom para você? — Samuel pergunta a Maicon.
— Essa foi sua melhor performance? — Maicon pergunta, o
que faz com que todos comecem a rir de Samuel.
Os dois se sentam e voltam a assistir ao filme. Olho para o
lado e só assisto um rosto muito lindo, que está bastante corado
agora.
— Ei, há muitos ruídos,eu vou para o meu quarto. Você quer
vir comigo? — Henrico diz baixinho, e eu nem respondo. Seguro a
mão dele e nos levantamos para sair.
Nos acomodamos na cama dele. Ele virado para mim, eu
virada para ele. Ficamos perdidos um no outro por um tempo, até eu
quebrar o silêncio.
— Você gosta de São Roque? — pergunto a ele enquanto
mexo em seus cabelos negros.
— Eu gosto. Quando todos não estão reunidos é bem
silencioso, o ar é mais puro, há muito sons da natureza, não há
muitos carros...
— Abandonei a faculdade— confessoe o vejo franzira testa
ao ouvir.
— Por que fez isso?
— Eu não estava felizmorando tão longe de todos, tão longe
de você. Voltei há poucos dias. Meu pai está um pouco magoado
comigo, mas compreendeu o motivo.
— Então você voltou para o Brasil definitivamente? —
pergunta.
— Sim.
— Eu quero me mudar para São Roque, então acho que
ficaremos um pouco longe. Estou arrependido por querer. Não
imaginei que tivesse voltado.
— Eu quero me mudar para São Roque também. Nós
podemos arrumar um sítiopor perto, podemos morar juntos e ter um
monte de animais — sugiro, sorrindo. — Eu tenho uma nova
cachorrinha, mas ela é dorminhoca. Ela está no quarto de Luiz
Miguel.
— Você quer morar junto comigo? — Henrico está no modo
"analítico" agora. Eu posso ver.
Eu disse que iria devagar, mas sei que posso dar sinais a ele
do que sinto. Posso dar algo que o faça juntar as peças e pensar.
Confesso que é um pouco difícilter que abrir mão de alguns
instintos naturais e ter que abordar todos os assuntos de uma forma
sutil. Se eu pudesse, simplesmente diria abertamente agora todas
as coisas que sinto.
Houve um período em que me revoltei por ninguém interferir
a meu favor. No auge dos meus 15 anos, quando tudo em mim
gritava por ele, eu queria me jogar, queria deixar meus instintos
conduzirem a situação. Foram diversas as vezes em que chorei nos
braços do meu pai, pedindo "pelo amor de Deus" para que ele me
ajudasse a ter o garoto da minha vida. Foram madrugadas em claro
chorando no colo da minha mãe. Houve revolta por eu achar que
ninguém estava me ajudando, mas, na verdade, todos estavam. Se
eu conduzisse a situação da minha maneira impulsiva, eu afastaria
Henrico de mim.
Foi difícilcompreender o motivo pelo qual todos agiam com
total cautela, mas quando tia Paula e tio Lucca sentaram-se comigo
e explicaram a situação, mostrando um ponto de vista sobre o
psicológico de Henrico, toda a minha visão mudou. Os estímulosem
relação a ele devem ser feitos pouco a pouco, da maneira que
demonstre mais naturalidade possível. Tudo que chega até ele de
formacontrária, o fazretroceder ao invés de fazê-loavançar. O mais
engraçado de tudo é que nunca qualquer membro da famíliachegou
até mim e pediu que eu desistisse. Eles sempre disseram "tenha
calma", sempre defenderam que Henrico em algum momento iria
despertar para os meus sentimentos. Meus pais me viam sofrer e
nunca pediram que eu desistisse, ou me incentivaram a ir em busca
de outro garoto. E, neste exato momento, todos esses pequenos
detalhes estão surgindo em minha mente. Talvez eles tenham visto
algo que eu jamais tenha sido capaz de enxergar.
"Observe".
Eu observo pela primeira vez a maneira como ele me olha,
tentando enxergar por um ponto de vista que sempre foi
considerado uma área sensível e perigosa para mim. Percebo que
ele passa muito tempo olhando para os meus lábios, talvez seja
indicativo de algo, ou não.
— Eu quero morar com você — afirmo, tocando em seu
rosto. — Você quer morar comigo?
— Eu preciso pensar sobre isso. Nunca pensei na
possibilidade de morar com você. Não sei como vou me sentir. —
Sempre sincero. — Nós vamos dormir no mesmo quarto?
— Não necessariamente. Só se você quiser e se sentir
confortável.— Só depois de alguns segundos percebo que usei a
palavra "confortável"e que isso será interpretado de uma maneira
que ainda não decifrei.
— Somos amigos, praticamente primos. É errado eu querer
me sentir confortável com você?
— Não somos primos, somos amigos. Nada é errado. Seja lá
o que esteja pensando e o que signifique o confortávelpara você,
não é errado. — Ele engole em seco e se vira, para ficarencarando
o teto. Certamente sua mente está trabalhando muito forte agora e
eu sei que é o momento de ficar em silêncio e deixar que ele
processe o que quer que esteja pensando.
De repente, minha pele está queimando, meu coração está
disparado. Talvez eu precise processar toda a situação também. Eu
sinto que agora estamos indo para um novo nível de amizade,
porém questiono se a minha linha de raciocínioestá me conduzindo
para o lugar certo. Sou aquela garota que se joga de um penhasco
muito facilmente, mas também posso ser a versão que lida com
Henrico portando toda a calmaria do mundo. Na maioria das vezes,
sinto como se existissem duas versões de mim mesma, e nem sei
se isso é possível e como pode ser interpretado.
Confusa, acomodo minha cabeça em seu braço, coloco
minha mão sobre sua barriga e me aconchego em seu corpo. Sou
capaz de sentir a tensão, mas aos poucos ela vai se dissipando, ao
ponto de eu conseguir contar até mesmo todas as suas respirações.
Já ouvi falarem muito sobre a sensação de "lar". Desde
pequena eu só sentia essa sensação quando estava perto dele. É
assim que me sinto agora. Estou em meu lar, no lugar que mais amo
estar.
— Não me sinto bem morando com os meus pais. Eu me
sentia muito bem até pouco tempo atrás, mas agora não mais. Sinto
que estou muito atrasado em relação aos meus primos, em relação
a você — Henrico confessa. — Quero me sentir como um homem
adulto, independente. Eu sei que você não é mais uma menina,
mesmo que eu sempre vá chamá-la de menina, e eu não sou mais
um menino. Eu sou homem, você é mulher. As coisas mudaram. —
Eu gostaria mesmo de compreender onde essas palavras se
encaixam. O raciocínio dele é bem mais rápido que o meu. Ele
estava falando sobre a necessidade de se sentir independente e
agora está dizendo que eu sou uma mulher e ele é um homem.
Deixo para tentar entender isso quando estiver sozinha.
— Você é o homem mais lindo do mundo.
— Eu tenho regras. — Não compreendo.
— Regras?
— Se formos dividir a mesma casa, precisaremos ter regras
— explica. Eu tento controlar a vontade de gritar de alegria pelo fato
dele estar ponderando isso, mas demonstro estar em completa
plenitude e nem um pouco insana pela ansiedade.
— Você pode me dizer?
— Preciso de mais tempo para pensar sobre as regras e
poder repassá-las a você, mas preciso que saiba que eu preciso tê-
las. É importante para mim. Você também pode ter suas regras,
tudo bem?
— Tudo bem. Você sabia que meus pais possuem um
caderninho de acordos? — pergunto, sorrindo com a lembrança.
— Um caderno de acordos?
— Sim, eles anotam tudo. Regras, contratos que inventam
sobre a relação deles, até mesmo assinam os acordos. Eles fazem
isso desde que se tornaram apenas amigos. Quer ter um caderninho
comigo?
— Eu tenho um caderno sobre você — confessa, o que faz
com que eu levante minha cabeça e o encare. — Esqueça isso —
pede, arrependido por ter falado. — Me desculpe, pode esquecer
isso?
— Temporariamente.
— Sophie, por favor.
— Temporariamente, Henrico. Eu vou esquecer sobre isso
temporariamente. — Ele parece contrariado, mas precisa aprender a
lidar com isso. Eu também me sinto contrariada agora,
principalmente porque sempre houve uma expectativa muito grande
em mim sobre ele. Saber que possui um caderno onde escreve
sobre mim desperta toda a curiosidade que possuo. — Bom, por
tudo que acabou de dizer, significa que já tem uma decisão?
— Posso pensar um pouco mais?
— Claro que pode. Só não demore muito, tudo bem? Assim
que tiver uma decisão, seja a hora que for, você pode me chamar e
dizer? — peço.
— Mesmo se for durante a madrugada?
— Mesmo se for. — Sorrio, fazendoum carinho em seu rosto.
— Eu te amo.
— Ao infinito e além.
— É. Promete que vai me chamar a qualquer momento?
— Eu prometo, Sophie.
(***)
Ele cumpre a promessa de me chamar a qualquer momento.
Estou dormindo em meu quarto quando desperto com a
sensação de ter alguém junto de mim na cama. Ele toca minha
bochecha delicadamente e eu sigo com os meus olhos fechados,
querendo descobrir quais serão as suas próximas ações.
— Sophie... você é a menina mais linda do mundo mesmo!
Pode acordar? Soso? — Sorrio e levo minha mão até a dele.
— Ei...
— Eu quero morar com você. — Meu coração dispara, como
se fosse capaz de pular para forado meu peito. Eu quero ficarde pé
e pular na cama, mas preciso me policiar.
— Quer? Tem certeza?
— Tenho. Eu precisava te contar.
— Eu sou a menina mais felizdo mundo agora! — confesso,
beijando sua mão. — Que tal comemorarmos comendo o que
sobrou do brigadeiro?
— São quase cinco da manhã.
— Quem se importa? Vamos ver o sol nascer? — convido e
vejo a sombra de um sorriso em seu rosto.
— Está frio lá fora. Vou vestir roupas quentes e te encontro
na cozinha.
— Também vou vestir roupas quentes — informo,sorrindo. —
Ei, você está feliz?
— Eu sou o menino mais felizdo mundo agora! — responde,
deixando o quarto.
A primeira vez que corri na vida eu estava de mãos dadas
com Sophie, na nossa casa de praia em Búzios. Enquanto o medo
brincava em meus olhos, minha mãe parecia receosa e meu pai
dizia: "se você nunca tentar
, então você nunca saberá se é capaz".
Sophie? Ela só dizia: "eu estou com você, você vai
conseguir". E eu fiz. Sophie nunca soltou a minha mão. Ela correu
ao meu lado e comemorou quando a tentativa foibem-sucedida. Ela
também disse que eu era o menino mais lindo do mundo. Era como
se ela pudesse contornar todos os meus medos, abraçar as minhas
inseguranças, transformar o meu medo em riscos que sempre
valiam a pena. Éramos novos demais, mas essa memória se
manterá eterna dentro de mim, assim como muitas outras.
Enquanto a maioria das crianças pareciam se mover na
velocidade da luz, eu era aquele que lutava internamente para
conseguir dar um passo e me manter firme. Enquanto eles subiam
em árvores, eu me mantinha sentado, para evitar tombos que
resultariam em me machucar fisicamente. De machucados,
bastavam as feridas emocionais, todas as dores que eu sentia. Não
é fácil para uma criança perceber que é diferente dos demais. É
doloroso e, muitas das vezes, eu não aceitava, não sabia como lidar
e me revoltava. Durante a maior parte da vida, eu me questionei:
"por que eu?", e acho que nunca serei capaz de aceitar
completamente. Por falta de opção foi necessário que eu
aprendesse a lidar, que eu me tornasse um especialista em mim
mesmo. Acredite, é extremamente difícilsaber tudo sobre si mesmo,
identificar fraquezas, testar seus próprios limites, descobrir se
possui pontos fortes.
Tive um atraso enorme na coordenação motora, mas, em
compensação, fui uma criança considerada superdotada em muitas
outras questões. Eu desafiava a compreensão até mesmo dos
terapeutas que lidavam comigo. Isso também não foi fácil. Na
escola, era estressante estudar com crianças da minha idade,
quando eu estava infinitamente à frente intelectualmente. Eu vivia
constantemente aborrecido, algumas vezes apresentava episódios
de agressividade; não batia nas pessoas, mas eu destruía objetos
em busca de descarregar todas as frustrações. Enquanto todos os
meus amigos da escola podiam correr, eu podia responder a
qualquer cálculo matemático com uma rapidez assustadora.
Inclusive, foram inúmeras as vezes em que corrigi professores, e até
mesmo minha psicóloga.
Bom, ao menos corrigir a minha psicóloga era engraçado.
Doutora Laura é a minha psicóloga até hoje. Ela é especialista em
autistas. Anos atrás, quando eu estava disposto a provar que
ninguém poderia lidar com a minha mente, ela se perdia em todas
as questões que eu levantava. Confesso, algumas vezes eu fazia
propositalmente, só para vê-la perdida em sua argumentação.
Quanto mais o tempo passava, mais difícil ficava. Era
extremamente difícillidar com olhares maldosos sobre mim, com as
piadinhas, pessoas me chamando pelos apelidos mais absurdos,
bullying gratuito apenas por eu ter um QI elevado e não gostar de
socializar com qualquer pessoa. Todos os dias eu chegava em casa
extremamente rebelde do colégio com tudo isso, mas insistia em
permanecer no colégio, porque eu teimava que precisava ser como
todos, mesmo carregando em mim a certeza de que eu nunca seria
capaz disso. Foi então que, após uma das maiores crises da minha
vida, meus pais decidiram, contra a minha vontade, que investir em
ensino à distância era a melhor opção. Felizmente, eles tinham
meios de pagar por isso, mas sei que a maioria das pessoas não
têm. Eles fizeramo melhor por mim. Não são todas as pessoas que
se dão bem com a inclusão e acessibilidade em todos os sentidos.
Expert em milhares de coisas, inexperiente para outras. A
mania de me sentir sempre em desvantagem segue me
acompanhando, segue fazendoparte de quem sou. Mas há um lado
bom em sentir esse incômodo. Quanto mais incomodado eu me
sinto, mais aumenta a minha vontade de tentar vencer meus
bloqueios. É isso que estou pensando agora, enquanto Sophie corre
pelo gramado de braços abertos e fala pelos cotovelos.
Ela é a única pessoa no mundo que pode falar pelos
cotovelos sem que eu me incomode. A voz dela é como uma suave
melodia para os meus ouvidos (mesmo quando não está sendo
nada suave). Sophie costuma sempre ponderar suas ações perto de
mim, mas, ocasionalmente, quando está tomada pela adrenalina,
ela acaba perdendo o controle. Eu gosto quando ela mostra quem
de fatoé, e gosto de como ela acredita fortementeque eu a enxergo
da maneira que ela tenta passar para mim. Há duas versões de
Sophie. Eu sou apaixonado por qualquer uma delas, embora eu não
goste de assumir isso em voz alta em minha mente.
Parece que a cada vez que assumo isso internamente, torna-
se mais real. Somos tão diferentes em tantos aspectos, mas tão
parecidos em outros. Eu não foco nos prós, eu foco nos contras.
Talvez seja um erro, talvez não. A cada minuto em que o ponteiro do
relógio gira, mais medo eu tenho de perdê-la para outro garoto. Ela
nunca foi minha, eu não a possuo, mas sou egoísta o bastante para
não querer que nenhum outro a tenha. E eu costumava estar bem
com a possibilidade dela seguir a vida de maneira normal. Qualquer
coisa que a fizessefelizcostumava me confortar. Agora não consigo
mais e não sei como proceder. Sophie é uma mulher, ela deve
namorar, ela deve um monte de coisas. E eu? Eu sou limitado o
bastante para querer me manter dentro de casa. Barulhos me
irritam, não gosto muito das pessoas, odeio festas, tenho pânico de
lugares aglomerados, nunca beijei, nunca toquei em uma garota,
nunca... nunca me senti confortável.
Eu não sei dizer a ela, principalmente por achar que ela
merece muito mais do que posso dar. Não posso dizer, porque ela
pode ir embora e eu posso perdê-la para sempre.
Mas só de pensar em perdê-la, eu me pego a puxando para
os meus braços e a envolvendo em um abraço apertado.
Eu te amo ao infinito e além...
Ela está em meus braços agora, sendo esmagada de uma
maneira que certamente deve estar sendo quase dolorosa. Mas ela
parece não se importar, porque retribui o abraço tão forte quanto é
capaz de retribuir. Isso faz com que meu coração bata de forma
mais apressada e traz lágrimas para meus olhos.
Quando Sophie está em meus braços, eu sinto que tudo
dentro de mim se encaixa. Mas, quando ela se afasta,eu volto a me
sentir em pedaços.
— O que há de errado? — ela pergunta e traz suas mãos
para meu rosto.
— Você tem um namorado? — Eu não penso antes de
perguntar. Esse é um defeito. Tenho mania de dizer tudo que surge
em minha mente, principalmente quando estou nervoso.
— Não tenho um namorado.
— Mas você já teve um namorado. — É uma afirmação.
— Eu nunca tive um namorado. — Ela nunca teve um
namorado? Isso soa estranho e eu acabo deixando a curiosidade
vencer.
— Por quê? Você é uma garota normal.
— Eu não gosto quando fala assim — me repreende,
soltando meu rosto. Ela segura minha mão e me puxa, até nos
sentarmos embaixo de uma árvore. — Não gosto quando suas
palavras dão a entender que você segue se achando diferente, fora
da normalidade. Você é um garoto normal, Henrico. Todos os seres
humanos têm limitações, e você, como eu, como todos os demais,
tem as suas. Nossas limitações são apenas diferentes.
Ela não compreenderá o que quero dizer.
— Por que não tem um namorado?
— Porque... — Ela desvia o olhar do meu. A observo
balançar a cabeça negativamente, antes de dizer: — Porque eu
nunca quis ter um namorado. E você?
— Eu quero ter uma namorada. — Ela parece não gostar da
minha resposta. Vejo lágrimas escorrerem pelo seu rosto. — Sophie,
não chora. Você não está feliz?
— Eu sempre ficareifelizpor você, mesmo que isso custe a
minha própria felicidade — ela fala, dando um sorriso triste. — O
amor é paciente. O amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo
suporta. Se você estiver feliz, Henrico, eu também estarei, porque
eu te amo.
— Você quer ter um namorado?
— Sim — responde rapidamente, e eu não gosto disso. Não
gosto de pensar.
— Eu não vou ficar feliz se você tiver um namorado. — Ela
me encara e eu esfrego meu rosto. — Eu odeio o seu namorado.
— Não tenho um namorado.
— Mas eu o odeio antes mesmo dele existir. Eu não quero
que você tenha um namorado.
— Por quê? Não estou entendendo. — Fico de pé e tento
respirar, mas minha respiração agora está falhando, e Sophie
percebe. Eu odeio que ela me veja assim, odeio que ela veja que
eu... eu sou diferente, estranho e fraco... — Você está bem? Fale
comigo, Henrico — ela pede, trazendo suas mãos para meu rosto.
Meu pai e tio Lucca passam parte do dia no sítioe depois vão
embora. Eu noto um distanciamento de Henrico, como se estivesse
pensando em muitas coisas, por isso, decido que não irei sair com o
pessoal. Opto por ficar respeitando o espaço dele, obviamente.
Entediada, resolvo me arriscar na cozinha. Definitivamente,
cozinhar não é o meu forte, mas não há nada que o Google não
resolva. Seguindo receitas passo a passo, arrisco fazer espaguete
ao molho branco. Enquanto estou aqui, Henrico está perdido lá fora,
e decido invadir um pouquinho o espaço dele, antes de botar a mão
na massa.
Ele está sentado, perdido em pensamentos, observando o
céu estrelado. Por estarmos em um sítio isolado, parece até que se
esticarmos as mãos seremos capazes de tocar nas estrelas. É um
visual de tirar o fôlego.
Está frio, ele está vestindo calça de moletom preta e um
agasalho com touca.
— Ei, eu posso me sentar com você? — peço, atraindo o seu
olhar e, ao invés de permitir que eu me sente, ele fica de pé. Não
sou baixa, mas Henrico de pé fazcom que eu me pareça um pouco
pequena. Ele se torna meu próprio céu estrelado quando levanto
minha cabeça para observá-lo.
— Você se lembra de ontem?
— Eu bebi.
— Apenas isso?
— Eu perdi algo? — pergunto. Ele me analisa por alguns
segundos e traz suas mãos para meu rosto. A maneira como ele
está me encarando faz com que os meus olhos se encham de
lágrimas. Henrico nunca me olhou assim e eu não consigo decifraro
que se passa.
— Estou com medo — confessa, engolindo em seco.
— Não tenha medo. Eu estou aqui com você.
— Promete que será a minha melhor amiga para sempre? —
Entendo que ele precisa dessa promessa agora, para o que quer
que tenha a me dizer.
— Haja o que houver, eu sempre serei sua melhor amiga. Ao
infinito e além, para sempre!
— Você já beijou? — ele repete a pergunta que já me fez
anteriormente. Sentindo vergonha, tento abaixar a minha cabeça
para ocultar o choro, mas ele não permite. Lágrimas também estão
escorrendo de seus olhos agora. — Sophie, você já beijou? —
Lentamente, balanço a minha cabeça.
Eu a balanço negativamente e Henrico solta um soluço de
choro.
— Você nunca beijou?
— Nunca. — É vergonhoso? Eu tenho 21 anos e nunca
beijei.
— Por quê? Sophie, você é uma garota normal! — ele diz,
soltando meu rosto, e eu seguro seus braços. — Por que nunca
beijou?
— Pare de dizer que sou uma maldita garota normal, Henrico!
Pare de pensar que você é totalmente diferente, um alienígena.
Você não é. — Ele ignora as minhas palavras.
— Todos acham que você já beijou, eu já escutei. Acho que
nunca desmentiu isso. Por quê?
— Porque o que os outros pensam de mim nunca foi
importante. Eles podem pensar o que quiser, Henrico, eu não me
importo. Tudo que me importa é o que você pensa de mim, é a
maneira como você me vê.
— Eu te vejo como a menina mais bonita do mundo — fala,
fazendo com que meu coração quase salte para fora.
— Você é o menino mais bonito do mundo e eu sempre vou
esperar por você.
— Por que nunca beijou?
— Porque eu estava esperando por você e eu sempre irei
esperar. Não importa quanto tempo demore, eu seguirei te
esperando — confesso, desabando e o abraçando forte. — Eu
sempre vou esperar por você...
— Você... você esperou por mim? Para beijar? — pergunta,
voltando a segurar meu rosto. Balanço a cabeça positivamente,
ficando preocupada pela forma como ele está respirando com
dificuldade.
— É como se existisse um universo onde somente você e eu
habitamos. O nosso universo, desde pequenos, desde sempre. Eu
não me encaixo em qualquer outro garoto, não me encaixo em
qualquer outro universo que não seja o nosso. Nunca me encaixei.
Eu me encaixo em você, eu sonho com você, e eu rezo por você. Eu
imploro a Deus por você.
— Você me ama? Me ama como... como namorado?
— Eu te amo além da vida.
— Eu te amo muito também, Sophie. Eu te amo como a
minha garota — ele diz, tocando meus lábios com seus polegares.
— Você aceita ser a minha namorada?
O mundo inteiro parece girar diante dos meus olhos,
juntamente com um filmecompleto da minha vida. Eu quero levar as
duas mãos em minha boca e meu corpo parece prestes a
desmoronar no chão. Henrico percebe e sustenta meu corpo,
rodeando um de seus braços em torno da minha cintura. O choro
não permite que eu responda, mesmo querendo dizer que esse
pedido é a resposta de todas as minhas orações. Ele está sofrendo
a cada segundo em que me mantenho silenciosa.
— Sophie, por favor.
— Eu sempre fui a sua namorada, você só precisava
descobrir isso. Eu estive aqui o tempo todo. — Ele engole em seco,
toca meu rosto com sua mão livre e me olha uma última vez antes
de colar seus lábios aos meus.
Um beijo tão puro quanto o que eu imaginei que seria e,
ainda assim, o mais perfeito do Universo. Não existe nada na vida
que seja tão perfeito quanto a sensação de ter os lábios de Henrico
grudados aos meus. Nada. Nos perdemos num simples grudar de
lábios por longos minutos...
Quando ele se afasta, eu nem sei explicar o que acontece.
Ele simplesmente se afasta e sorri, antes de sair andando.
— Sophie, eu preciso só ligar para os meus pais e já volto —
avisa, entrando casa adentro, e eu saio correndo atrás dele.
— Não, senhor! Traz sua linguinha aqui! Foi o beijo mais
perfeito,mas certamente precisamos de mais alguns para podermos
selar a união! Quero a sua língua se envolvendo com a minha,
Henrico! Deus do céu, Henrico! Eu não esperei a vida inteira para te
beijar e você ir falarcom tio Lucca! — Ele bate a porta do quarto e a
fecha com chave. — Caralho, Henrico! 600 guindastes não serão
suficientes! Fique sabendo disso!
Merda, eu preciso ligar para a minha mãe e contar que beijei!
Eu beijei o menino mais bonito do mundo!!!
Quando poderei cantar a versão proibidona de já sei
namorar?
"Já sei namorar, já sei beijar de língua, agora só me resta
transar..."
Eu preciso muito expulsar essa notícia de dentro de mim,
espalhá-la pelo mundo. Mas, embora eu precise disso, estou
andando como uma barata tonta pela sala, tomada por uma
adrenalina que nunca senti antes e que está se misturando com a
incredulidade do último acontecimento. Cozinhar? Já era! Não tenho
a menor condição de cozinhar quando estou tremendo. É arriscado
que eu acabe colocando fogo na casa. Se calma eu já sou
desastrada, imagine nervosa?!
Ainda estou rodando quando Samuel surge e paralisa ao me
ver.
— O que há? — pergunta.
— O que está fazendo aqui? Seja o que for
, volte para a rua!
— Só vim buscar preservativos.
— O quê?! — questiono, embasbacada.
— Um bom soldado sempre anda prevenido. Esqueci os
preservativos na mochila. Agora me diga o que aconteceu, por favor
.
Parece desorientada.
— Henrico me beijou. — Samuel abre um sorriso enorme. —
Um selinho, mas me beijou.
— Esse é o meu garoto! — exclama, feliz. — E onde ele
está?
— Apenas me deixou e disse que iria ligar para os pais —
comento, rindo. — Não seria Henrico se não fizesse isso. Mas, já
que está aqui, posso perguntar algo?
— Claro.
— Por que todos sabiam e nunca me disseram nada? — Ele
para de sorrir e me puxa para a área externa. Nos acomodamos em
um banco próximo à piscina.
— Sophie, em relação aos sentimentos de Henrico, eu nunca
tive certeza. Havia especulações de todos, mas nenhuma certeza
definitiva. Os seus sentimentos sempre foram mais abertos, você
nunca fez muita questão de esconder isso. A questão é que você,
desde muito jovem, estava preparada para se envolver com
Henrico. Já ele... ele só se abriu há pouco tempo, apenas para mim,
tia Paula e meu pai, ninguém mais. Ah, sim, a psicóloga também,
inclusive ela deve estar louca já — brinca. — Eu poderia ter te dito
anos atrás sobre as minhas desconfianças,mas isso te afetaria de
uma maneira negativa. Você iria viver buscando respostas que ele
não estava pronto para te dar, fora que iria viver em constante
ansiedade. Sem contar que perderia a magia de tê-lo se declarando
e a surpreendendo. Acredite, não foi por maldade, foi pelo bem da
sua saúde mental e pelo bem de Henrico. Ele é autista, tem
algumas dificuldades, estamos constantemente o impulsionando a
novas descobertas. Ele ter descoberto sozinho o que sente, ter
tomado atitude, é um passo enorme. Espero que não fique triste
comigo ou com qualquer outra pessoa da nossa família,Sophie.
Precisava ser como foi, para poder ser perfeito e vocês dois
guardarem na memória.
— Eu sou virgem — confesso ao meu primo, que abre a
boca, em completo choque. — Eu nunca beijei.
— Você está falando sério? Sophie, puta que pariu!
— Eu o amo. Que espécie de amor seria esse se eu não o
esperasse? — questiono. — Não entendo muito sobre esse
sentimento, mas acho que ele é puro, é paciente, como aquele
versículo bíblico. Eu esperei.
— Sophie, todos acham que você é a rainha de experiência
sexual. Tem ideia disso?
— Não me importo que pensem isso. Porém, o que acabei de
te dizer, é segredo, ok? — Ele me abraça forte e eu me sinto
extremamente feliz por tê-lo como meu porto seguro.
— Isso é fantástico, Sophie! Vai muito além de como eu
imaginei que seria. É um momento único na vida dos dois e é muito
incrível saber que vão fazer centenas de descobertas juntos. Eu
tinha certeza de que você passava o rodo — brinca.
— Nunca passei o rodo. Era baladeira, mas é só isso.
— Dois virgens. Puta que pariu! Me desculpe, mas estou
muito chocado com essa notícia. Podia apostar que você ensinaria
tudo a ele, o guiaria quando fossem fazer sexo, e agora descubro
isso. — Me pego sorrindo novamente.
— Enfim, agora eu preciso que ele saia do quarto para eu
pegá-lo de jeito.
— Sophie, sabe que não pode atropelá-lo, não sabe?
— Sei, mas posso fazê-lo querer mais. — Samuel está
fazendo as caras mais engraçadas do mundo. — Não me olhe
assim. Sou virgem, mas não sou tapada, Samuel. Na verdade,
tenho o sangue quente e me encontro como se estivesse prestes a
entrar em erupção. Agora que sei que ele me deseja, que ele me
ama, eu vou jogar com isso. Não se preocupe, não vou ultrapassar
os limites, mas também não ficarei no papel de puritana cem por
cento do tempo. Ele vai entender o quanto quero, mesmo que eu
tenha que esperar. Só vou tirá-lo da zona de conforto
ocasionalmente, tipo hoje. Preciso de mais beijos. Entende o que
quero dizer?
— Eu entendo que Henrico está fodidode todas as maneiras.
Eu sei o que é acordar para o sexo. Haja mão... — Dou um soco no
braço dele enquanto rio. — Acho que nem vou sair mais. Henrico
corre riscos.
— Você tem dois minutos, Samuel. Estou mesmo te
expulsando do sítio. Na verdade, Eva precisa se mudar logo, para
que eu possa viver sob o mesmo teto que Henrico com total
privacidade para jogar. Senhor da glória! Aquela boca dele...
— Adeus! — Ele nem busca os preservativos, foge como se
tivesse sido assombrado, e eu ficorindo. Olho para a piscina e, de
repente, quero ficar nua e me jogar nela.
É muito louco sentir vontade de ficar nua, não é mesmo? É
só pensar em Henrico que já quero arrancar as minhas roupas. Não
que eu seja atirada, ousada. Sei que na hora H muito provavelmente
sentirei receio, mas, por ora, quero continuar agindo como a garota
corajosa e quente. Meu sangue está fervendoe estou prestes a tirar
Henrico de onde quer que ele esteja.
Entendo que não posso fazer nada do que gostaria. Está tudo
bem, de verdade. Sei que sou capaz de me controlar perto dele,
sempre fizisso. A questão é que me sinto como uma garota de 15
anos agora, entrando na fase de descobertas. Eu não tive essa
fase, a bloqueei por completo. Apenas escutava relatos das minhas
amigas e, mesmo que ficassecuriosa, eu dizia em minha mente "um
dia eu vou viver isso com Henrico". Escolhi esperar e não me
arrependo. Porém, quanto mais o tempo vai passando, mais curiosa
vou ficando. Sinto vontade de sentir todas as coisas que já ouvi
minhas amigas relatando, todas as reações que as mulheres
demonstram sentir nos filmes adultos. Sinto vontade de ter Henrico
tocando o meu corpo, descobrindo e fazendocom que eu descubra
meus pontos fracos. Sou sedenta por todas essas sensações, não
posso mentir, e sedenta para descobrir tudo o que posso fazê-lo
sentir, todas as reações que posso causar no menino mais bonito do
mundo.
Meu coração acelera significativamente quando ele surge na
porta, me procurando. Sinto até mesmo minhas bochechas
queimando agora. Talvez minhas reações sejam adolescentes
demais, mas não me importo se irei agir como uma garotinha
envergonhada. Na verdade, eu não sei como agir agora.
— Eu não liguei para os meus pais — ele confessa, se
aproximando.
— Não? Por quê?
— Porque eu tenho 22 anos de idade e... eu preciso enfrentar
as situações sozinho. — O compreendo, mesmo achando que a
ligação teria sido a coisa mais fofado mundo. Noto que ele está
mexendo constantemente nos dedos, isso é um sinal de
nervosismo. Percebo que preciso ocultar meu próprio nervosismo
agora, para poder lidar com o dele.
— Me dê suas mãos — peço e ele me dá. Eu as seguro
fortemente e encaro os olhos mais lindos que já vi. — Sei que está
nervoso, que não sabe como agir, mas posso te revelar um
segredo? — pergunto, o fazendo se sentar ao meu lado.
— Sim.
— Eu também estou nervosa e não sei como agir —
confesso. — Eu quero um monte de coisas, mas não faço ideia de
como fazê-las. Tudo que sei é que quero.
— Eu me sinto assim.
— Viu? Nós somos muito iguais. — Sorrio. — Acho que você
não esperava que eu fosse tão inexperiente.
— Eu queria que fosse,mas é um pouco confuso.Ao mesmo
tempo que queria que fosse inexperiente, eu esperava que você
soubesse conduzir a situação — argumenta. — Acho que seria mais
fácil.
— Provavelmente seria — concordo. — Mas, acredite, é
muito mais interessante que eu simplesmente não saiba o que fazer,
como você. Nós dois agora temos a missão de descobrirmos tudo
juntos. Isso será incrível, consegue imaginar?
— Mas você tem um piercing no clitóris — diz, soltando
minhas mãos, e eu tento não rir da cara que ele faz.— Como você
tem um piercing no clitóris?
— Eu quis ter. Isso independe de ser virgem ou não. E não foi
um garoto quem colocou. Foi a minha tatuadora, uma pessoa em
quem confio — explico, virando-me, sentando de maneira que o
banco fique entre minhas pernas. Henrico repete o meu feito e
ficamoscara a cara. Um pouco mais à frentee eu poderia montá-lo.
Ele está olhando para os meus lábios e eu olho para os dele. Nós
sabemos o que queremos, mas não sabemos como fazer. Agora
estou ainda mais nervosa, e ele percebe.
— Precisamos de regras — anuncia.
— Aham...
— Sophie, é muito difícil ser seu namorado.
— Mas... nós mal começamos — o respondo, subindo meu
olhar para os seus olhos. — Por que é difícil?
— Eu não posso dizer. Seria desrespeitoso. — Ele sempre
tem a capacidade de me fazer sorrir e me encantar com esse
jeitinho único. — Eu posso te beijar novamente?
— Eu mataria por isso! Digo, é claro que você pode, meu
amor. Só vem aqui e me beija. — Ele se aproxima e eu me preparo
para um selinho. Mas não acontece.
Me surpreendo quando ele abre os lábios e os gruda aos
meus. Acompanho suas ações e cada parte de mim se arrepia
quando ele enfia lentamente sua língua em minha boca. Um beijo
menos inocente que o primeiro, embora ele esteja fazendo isso
numa lentidão agoniante. O nosso primeiro beijo de língua é tímido,
como se estivéssemos testando nossa capacidade de beijar. O que
mais me surpreende é a intensidade. É algo novo, que nunca havia
experimentado. Quando Henrico tem seus lábios grudados aos
meus, eu não escuto nada, não vejo nada, nada mais existe,
somente nós e a atmosfera carregada de tensão. É inevitável e
mágico. Tudo agora parece carregado por uma energia sexual,
mesmo sendo um beijo tão puro. Ele é quente, e eu nem preciso ser
pega de um jeito alucinante para saber disso. Há uma onda de calor
emanando de seu corpo, assim como está emanando do meu. Eu
sinto que nós dois juntos seremos muito bons.
Quando se afasta, ele gruda a testa na minha. Sua
respiração ofegante me leva a um novo nível de excitação.
— Eu te amo muito — digo, levando minhas mãos em seu
rosto. — Muito.
— Eu te amo. Eu posso te beijar novamente? — Sorrio.
— Precisamos mesmo de regras, Henrico.
— Me desculpe por pedir mais.
— Não! Nada disso! Pelo amor de Deus! Você entendeu
errado... Eu falei sobre as regras porque elas são importantes —
argumento. — A primeira regra deve ser sobre beijos.
— Tudo bem.
— Somos namorados, você não precisa pedir para me beijar.
Basta vir e me beijar, eu vou amar todas as vezes. E eu também
tenho direito de te beijar quando quiser. De acordo? — Ele balança
a cabeça positivamente e me puxa para mais um beijo. Agora ele
me toca, trazendo suas mãos até meu pescoço. Deixo seu rosto e
me aproximo mais, quase ficando sobre suas pernas. O nosso
terceiro beijo atinge outro nível. Um que é mais torturante que todos
os outros, já não é tão lento, e eu fico perdida entre gostar da
lentidão e gostar desse novo modo mais ousado. Qualquer uma das
opções resulta em minha calcinha úmida e a vontade de arrancar as
roupas. Eu imaginava que beijar era incrível, mas não sabia que
poderia ser tanto. Bem que eu sempre ouvi as pessoas dizendo que
é como andar de bicicleta. Parecemos beijadores profissionais, com
anos de prática. Eu mal cheguei e já quero sentar na "bicicleta" e
sair pedalando muito forte.
— Eu quero beijar você para sempre — ele diz, enquanto
afasta nossos lábios.
— Também quero beijá-lo para sempre. Muito. Seu beijo é
extremamente delicioso.
— Uma pesquisa da Universidade de Oxford, realizada com
900 pessoas, mostrou que os indivíduos que relataram beijar seus
parceiros com maior frequência foram os que mais se mostraram
satisfeitos com o relacionamento. Eu estou satisfeito com você, você
está satisfeita comigo, então nosso relacionamento será satisfatório
— argumenta.
— Você sabia que a dopamina é um neurotransmissor que
tem sua liberação aumentada durante o beijo? Ela é responsável
por essa sensação forte de desejo que estamos sentindo agora —
digo, tocando seu pescoço.
— Sim. Ela estimula partes no cérebro que também são
estimuladas pelas drogas. Por isso, pode ser comparado a um vício.
Talvez eu tenha acabado de me tornar um viciado, porque eu quero
mais beijos e sei que não ficarei satisfeito.
— Nem mesmo eu ficarei satisfeita — sussurro em seu
ouvido, sentindo o corpo dele se retesar com o meu ato. — O beijo
eleva os batimentos cardíacos para aproximadamente 150
batimentos por minuto, e bagunça os hormônios todinhos. Sabia que
o beijo é o queridinho das pessoas nas preliminares?
— Preliminares sexuais?
— Sim — confirmo e ele me observa. — O que foi?
— Eu me sinto envergonhado.
— Regra número 2: não se sentir envergonhado com a sua
namorada, senhor Henrico. — Ele dá um sorriso tímido. — Vamos
combinar algo?
— Sim.
— Tudo o que fizermosserá segredo nosso. Todas as nossas
intimidades serão apenas nossas. Não há espaço para vergonha.
Você pode me dizer o que quiser e nós podemos descobrir tudo
juntos. Eu sou sua para o que quiser fazer.
— Isso é perigoso — afirma, para a minha surpresa.
— Eu confioem você. — Ele pega as minhas duas mãos e as
beija delicadamente.
— Ainda não acredito que você sente o mesmo que eu sinto.
Eu te amo desde que me entendo por gente, Sophie, mas antes...
antes era mais fácilocultar. Eu desejava você, mas de uma maneira
calma, suave, que conseguia controlar. Não tinha pensamentos
indecorosos, mesmo meu corpo reagindo a você. — Uma confissão
encantadora. — Há algum tempo a zona de confortoque criei para
me sentir seguro, de tudo e de todas as emoções, começou a me
incomodar o bastante para querer sair dela. Você ficarpreso em sua
mente, em todas as limitações, não é algo agradável, e demorou
muito para eu compreender isso. Eu não estava protegido como
acreditava, eu estava preso, vendo todas as pessoas viverem
enquanto eu me mantinha isolado, sofrendo em segredo e em
silêncio por querer viver determinadas situações.
"Sophie, eu me sinto diferente, mesmo que todos ao meu
redor tentem me mostrar diariamente que posso me encaixar. Eu
não me encaixo e, muitas das vezes, eu até acho que isso seja algo
bom. Mas, há apenas alguns momentos que não me encaixar
parece ruim o bastante. Por exemplo, agora. Sei do meu potencial
como homem em muitos sentidos, mas não no sentido amoroso e
sexual. Eu me sinto como um jovem de 13 anos, curioso e
inexperiente. Eu não entendo a maioria das coisas sobre isso, mas
eu quero vivê-las, quero descobri-las. Só não sei dizer se isso é o
suficiente para você, se namorar com um homem como eu será o
suficiente. Eu tenho limitações, não gosto de festas, não gosto de
luzes, não gosto de sons altos, tenho pânico de aglomerações,
muitas vezes eu preciso me isolar de tudo e de todos, tenho crises
que me fazem chorar e me encolher, não sei falar abertamente
sobre assuntos de intimidade, sou diferente, Sophie...
Provavelmente, nossa relação não será fácil, mas eu te amo e quero
estar com você. O que eu devo fazer? — pergunta. "
— Eu conheço cada um dos seus tons, menino mais bonito.
Você deve continuar sendo exatamente a pessoa que é, agindo do
modo como age, nada deve mudar. Eu o amo exatamente assim,
com todas as perfeitasimperfeições,com todas as limitações. Estou
entrando nessa relação te conhecendo melhor do que conheço a
mim mesma, Henrico. Portanto, eu respeito a maneira como você é,
respeito suas crises e sempre irei respeitar. Você é mais que
suficiente para mim, porque você é tudo o que eu sempre quis ter.
Não se envergonhe nunca por ser um homem autista. Você é o meu
menino mais bonito atípico e eu amo o seu mundo, amo o nosso
mundo azul, o mundo que criamos apenas para nós. Obrigada por
estar se abrindo comigo. Você nunca foi de se abrir tanto, estou
surpresa e feliz por isso.
— Eu precisava te dizer tudo isso e, para isso, precisei
vencer algumas barreiras. Sei que posso ser mais forte que elas.
— Henrico, é mais fácil quando nos entregamos a alguém
que conhecemos uma vida toda. Também estou com medo, mas
estou tão disposta a enfrentar e sinto que você também está.
— Eu quero ficar confortável com você.
— O que significaisso? — pergunto, fazendocarinho em seu
rosto.
— Tem etapas, Samuel me disse. Começa com beijos, então
eu preciso te beijar muito.
— Então você pode me beijar até se sentir preparado para a
próxima etapa. — Ele sorri e eu sorrio de volta. — Ficar confortável
é sexo? Se for, vamos agora!
— Oh, Sophie! Eu não posso te dizer isso, ok?
— Ok. Eu sempre irei esperar por você. Vamos beijar, mas
podemos continuar com esses beijos lá dentro? Está frio.
— Você pode ir na frente. Eu já vou. Só preciso de um
minuto. — O encaro, não compreendendo.
— Por quê?
— Estou com reações.
— Reações?
— Os beijos. Reações. Por favor, Sophie, não me façafalar.
— Abro a boca em choque quando compreendo.
— Que tesão! Digo, que compreensível! Eu não ligo... Eu
quero... Meu Deus do céu, Henrico! Foda-se a inexperiência! Todos
os guindastes do mundo jamais conseguirão... Ok, eu preciso
esperar. — Sorrio, atordoada, e fico de pé.
— Às vezes parece que você fala outra língua, eu apenas
não consigo compreender.
— Você só precisa saber que muito em breve eu vou
encantar a sua serpente!
Minha vida era bem menos complicada quando eu lidava
apenas com ereções involuntárias; aquelas que ocorrem à noite ou
pela manhã, popularmente chamadas de "tesão de mijo", o que é
um tanto quanto estranho. Sempre passava rápido e a vida seguia
normal. Aos 13 anos de idade, eu tive um tipo de ereção diferente.
Ocorreu na casa da Ilha, enquanto eu observava Sophie dançar
uma música, usando um biquíni. Minha primeira reação foi correr até
o meu pai, principalmente porque não era apenas uma ereção;meu
corpo naquele momento parecia estranho, eu estava sentindo
coisas novas, diferentes, uma necessidade de algo que eu não
sabia o que era. Meu pai também ficouperdido por não saber como
abordar o assunto. Me lembro que ele chamou a minha mãe, nos
trancamos em um quarto e, pacientemente, os dois conversaram
comigo sobre sexualidade, tesão, reações do corpo. Muita
informação para um garoto de 13 anos autista. Mas eles fizeram
isso bem, responderam muitas dúvidas, principalmente sobre
masturbação.
Depois do ocorrido, me lembro de como passei a evitar
Sophie. Havia muito medo em mim. Eu odiava pensar que ela
poderia se assustar se visse meu pau duro.
Pau. Eu ainda acho terrível se referir ao meu órgão genital
dessa maneira, mas meu pai e Samuel falaramque essa é a melhor
palavra, principalmente em momentos de intimidade com uma
garota. Samuel contou que dizer pênis é um pouco brochante, que
as garotas preferem pau. Ele até disse outros nomes, mas são
bizarros o bastante para eu não querer repeti-los.
Enfim. Lembro que passei dias pesquisando sobre tipos de
ereções, e descobri que existem 3 tipos: as ereções psicogênicas,
que acontecem quando vemos ou ouvimos algo que nos atrai, como
fotos de mulheres nuas ou uma linda menina dançando de biquíni;
as ereções noturnas, que ocorrem naturalmente à noite e também
podem ocorrer pela manhã (visto que eu acordo diariamente com
uma ereção assustadora); e as ereções reflexogênicas, que
acontecem quando surge um contato real com o pênis.
Naquela fase,fiqueicom o sexo infiltradona mente. O grande
susto foi quando acordei com um líquido viscoso marcando a minha
cueca, após um sonho com Sophie. Novamente, meu pai foi a
pessoa escolhida por mim. Quando acordei daquela maneira, entrei
em crise. Me sentia ainda mais estranho. Meu pai ficousentado em
minha cama enquanto eu andava de um lado para o outro, tentando
compreender porque aquilo havia acontecido. Eu achava que era
algo anormal, até ele dizer que passou pelo mesmo e que Samuel
também estava passando. Embora ele, minha mãe e minha
terapeuta tivessem me explicado sobre a masturbação, eu nunca
havia feito... Mas, após outra longa conversa esclarecedora, eu me
acalmei e, no final do dia, quando todos dormiram, eu fui em busca
de mais informaçõesna internet. Descobri os filmes educativos. As
cenas eram assustadoras, mas causavam uma reação em mim que
eu não estava capacitado para compreender. Passei a me
masturbar frequentemente, na verdade, eu queria me masturbar o
tempo inteiro, mesmo que guardasse esse segredo apenas para
mim. A sensação do orgasmo sempre foi intensa, reconfortante no
final, e foi suficiente até meses atrás, quando percebi que precisava
de algo mais.
Ocorreu na última vez que vi Sophie. Durante muitos anos
evitei qualquer assunto voltado ao sexo. Minha mente trabalhava em
torno de programações de computador, jogos, pesquisas. Eu me
masturbava ocasionalmente;posso dizer que bem menos do que eu
faziaquando passei pela fase de descobertas. Quando passei a me
masturbar imaginando Sophie, eu descobri que gostava dela de
uma maneira diferente, e perceber isso foi traumático. Sophie era a
garota livre, cheia de amigos, cheia de vontade de viver, que
socializava com todos; enquanto eu era o garoto quieto, silencioso,
que se mantinha isolado e que tinha crises frequentes. Fixei em
minha mente que ela nunca seria minha, primeiro por sermos
melhores amigos e quase primos, segundo por sermos opostos. Se
eu não podia tê-la, eu não queria ter mais qualquer garota, por isso,
tirei da mente o sexo e todas as coisas relacionadas a namoro.
Foram anos sem pensar nisso e parecia confortável para mim.
Há alguns meses, ela veio da Califórnia para comemorar o
aniversário de casamento do tio Victor, na Ilha. Minha mente já
estava devidamente projetada a ignorar qualquer pensamento
ousado relacionado à Sophie, mas falhou quando a peguei em um
biquíni minúsculo, repleta de tatuagens que atiçam a curiosidade,
dançando uma música latina de uma formaque atormentou a minha
mente. A cena podia ser considerada erótica. Eu não consegui
evitar a ereção, mas foi diferente de todas as outras vezes. Dessa
vez parecia ter um monstro dentro de mim, um ser estranhamente
furioso, que precisava pegá-la e fazer todas as cenas que via nos
filmes educativos.
Eu não soube lidar com as reações. Entrei no meu quarto e...
não foi bonito. Eu me peguei repetindo atos que só cometia quando
criança. Quebrando coisas, socando meu pai enquanto ele tentava
me acalmar, e foi necessário receber medicação intravenosa para
conter o meu desespero. Foi uma crise de ansiedade, talvez a pior.
Sophie não sabe disso. Ninguém, além dos meus pais, minha
terapeuta e Samuel, sabe.
Foi Samuel quem me disse que eu poderia namorar com
Sophie, que não era errado, pois não éramos primos. Isso aliviou
um pouco, porque eu me sentia culpado por ter reações tão fortes. E
eu fiquei meses tentando pensar em uma maneira de poder tê-la.
Era torturante. Eu passei a malhar com mais afinco apenas porque o
esporte parecia me ajudar a descarregar um pouco da adrenalina.
Estava dando certo, até eu chegar em São Roque e reencontrá-la.
Ela voltou de vez, nós vamos morar juntos e acabo de descobrir que
ela me ama e me deseja da mesma formaque a amo e a desejo. Há
muitas questões em minha mente agora. Eu me pergunto se lá no
passado, ela também teve essas reações físicase precisou se
masturbar. Me pergunto se ela também está excitada agora, como
eu estou. Como vou lidar com isso? Como vou controlar minhas
ações e reações? Como vou lidar com todas as dúvidas?
Sophie é virgem. Ela esperou por mim, eu esperei por ela.
Mas como faremos isso? Eu não quero pensar em sexo, mas não
consigo evitar as reações. A boca de Sophie na minha causa um
efeito que não consigo descrever. Ela é quente, e sinto que tudo
nela responde a mim. Não foram apenas beijos, houve uma
intensidade que estou tentando entender. Gosto de ter respostas
específicas para tudo e preciso delas agora, para entender o mínimo
de todas as sensações novas que acabo de descobrir.
Agora, talvez seja necessário deixar de ser a pessoa que se
esconde, que teme, que age como um garoto. Não sou apenas eu
enfrentando descobertas. Há Sophie também. Muito provavelmente,
ela encontra-se tão receosa e repleta de perguntas, como eu. Ela
lida mais fácilpor ser extremamente extrovertida e maluquinha, mas
a conheço. Sei que por trás de todas as maluquices, há uma garota
sonhadora e um pouco medrosa. Sei também que vamos precisar
um do outro agora, como nunca. É por isso que ao perceber que
minha ereção está devidamente controlada, me pego criando
coragem para entrar e lidar com mais alguns beijos, e qualquer
coisa que ela precise.
"Vou chupar seu pau todinho e sentar nele até gozar. Quero
que me foda forte... muito forte... ou
V te dar bem gostoso..."
Essas palavras não saem da minha mente, não saem.
Palavras sujas. Sophie me disse como exemplos ou disse porque...
porque quis dizê-las? Isso é inapropriado e desrespeitoso, mas será
que ela gosta? Samuel diz que as garotas gostam, mas Sophie não
é "as garotas". Sophie é minha garota, e eu não sei se ela gosta
disso.
Não sou um canibal para dizer que vou comê-la. Usar essa
expressão parece repugnante. Eu não sei namorar, é isso. Não sei
ser como Samuel. Eu não posso falar essas palavras.
— Henrico? — A voz da minha namorada surge, mas eu não
quero que ela entre agora. Ela não pode me ver assim, tão
desorientado. Sophie disse que vai chupar o meu pau!
— Sophie, você disse aquelas coisas porque quer fazê-lasou
apenas para dar os exemplos que pedi? — pergunto para ela do
outro lado da porta.
— As duas coisas. Você queria exemplos, eu dei exemplos
do que eu diria a você em um momento de intimidade. O que há
demais nisso? Faz parte da intimidade e acredito que também vá
acontecer naturalmente. Você vê vídeos educativos, não vê?
— Sim.
— Nunca viu nenhum vídeo onde o casal fala esse tipo de
coisa?
— Eu nunca prestei muita atenção nas palavras — confesso.
— Na verdade, eu nunca ouço o som, porque uma vez coloquei em
um vídeo com muitos ruídos e não gostei.
— Ok, ouça, abra a porta. Nós podemos conversar sobre
isso, posso procurar um vídeo que não tenha muitos ruídos e te
mostrar. Podemos descobrir isso juntos. Não se isole ou tenha uma
crise por conta de palavras e de todas as descobertas. Pense que é
tudo novo para mim também e que estamos juntos na fase de
descobertas. Sou eu, Henrico, a sua Sophie. Não precisa ficar
nervoso, envergonhado. Não é desrespeitoso nem nada do tipo.
— Sophie, você vai continuar me amando se eu não disser
essas palavras?
— Eu vou seguir te amando não importa o que aconteça,
Henrico. Mas, se quer mesmo saber, você já disse algumas palavras
sujas, como "quero te lamber".
— Mas você quer que eu diga outras palavras sujas?
— Não façoquestão. — Caminho até a porta e abro. Sophie
entra toda suja de iogurte e com um sorriso no rosto. Ela é
completamente louca, mas absurdamente linda. — Ei, namorado.
Bom, sabe o que percebi? Temos passado muito tempo em meio a
uma tensão sexual. Acho que estamos precisando descansar a
mente um pouco. Podemos deixar a tensão sexual para os
momentos antes de dormir, ao menos por enquanto. Quer dizer,
óbvio que é APENAS POR ENQUANTO mesmo. Enfim, vamos
tentar distrair a mente durante o dia, fazer alguns programas
diferenciados.
— Talvez.
— Vou tomar banho, vestir um biquíni e vamos nos aventurar
pela praia, ok?
— Você de biquíni me faz querer ficar confortável —
confesso,me jogando na cama e cobrindo meu rosto com as mãos.
— Sophie, não sei se posso deixar de pensar em sexo. Ser o seu
namorado é extremamente difícil.É a coisa mais difícilda minha
vida. Eu amo seus seios e sua bunda. Agora que vi os seus
mamilos, eu realmente quero vê-los o tempo todo. Você de biquíni...
vou ficar imaginando seus mamilos e ficarei excitado. Todos vão
notar. Eu acho melhor ficar aqui, quieto.
— E assim disse o garoto que tem pavor de palavras sujas!
— Sophie geme e se joga ao meu lado. — Nós estamos com
problemas, menino mais bonito.
— Quais problemas?
— Estamos com excesso de desejo sexual — responde e eu
viro meu rosto para encontrar o dela.
— O que vamos fazer? — pergunto, atento.
— Só consigo pensar em uma coisa — ela declara,
suspirando.
— O quê?
— Pularmos para a terceira base.
Hiperfoco em sexo. Não preciso da minha terapeuta para
identificar essa questão.
Pessoas como eu, com síndrome de Asperger, tendem a se
concentrar em determinados tópicos quando se tornam um interesse
específico.Isso acaba fazendocom que o tema central acabe sendo
discutido dia e noite (mesmo que internamente, como está
acontecendo comigo). Durante toda a vida tive vários momentos
onde apenas um determinado assunto obtinha toda a minha atenção
e o meu interesse, e sempre foi um pouco difícilpara as pessoas
que têm que conviver diretamente comigo. Acabo me tornando
irritante e, sem querer, comprometo minhas relações sociais por
sentir a extrema necessidade de debater sobre as questões.
O hiperfocoda vez é o sexo, e o que me impede de falar 24
horas desse assunto é a regra que Sophie criou sobre a nossa
intimidade. Eu não estou debatendo sobre sexo, mas estou
pensando. O tempo todo. Isso me deixa nervoso, porque eu gostaria
de debater um pouco mais e gostaria de poder expor todas as novas
sensações que estou conhecendo.
Antes mesmo de iniciar uma relação com Sophie, esse tema
já vinha tomando parte da minha mente e houve muitos debates
com a minha terapeuta, com os meus pais. Demorei um longo
períodopara nutrir um interesse por relações sexuais, porém, desde
quando comecei, não consigo parar. Muitas das vezes sei que os
deixei constrangidos. Quando algo domina o meu interesse,
costumo debater de forma aberta, muitas das vezes imprópria e
inadequada. Não sou como a maioria das pessoas, que conseguem
tratar os assuntos escolhendo as palavras certas e uma maneira
menos agressiva. Falo o que surge em minha mente, sem andar em
círculos (como costumam dizer sobre pessoas que encobrem
determinados assuntos). Pessoas como eu são consideradas
notórias pelo fato de serem extremamente verdadeiras, isso parece
ser o certo. Ser verdadeiro é considerado uma característica
admirável, porém a minha tendência a ser francodemais muitas das
vezes pode deixar as pessoas chocadas, principalmente quando
envolve temas que são considerados tabus e não podem ser
debatidos tão abertamente. É difícilmanter os limites adequados e
controlados.
Desde que comecei com essa curiosidade, já debati sobre os
métodos contraceptivos, gravidez, uso de preservativo, orgasmo,
ejaculação, ejaculação involuntária (conhecida como polução
noturna), já debati sobre doenças sexualmente transmissíveis,
violência sexual, estupro... Eu me tornei um estudioso sobre as
regras sexuais, sobre o que um homem pode ou não fazercom uma
mulher. Mas viver isso é completamente diferente da teoria.
O mais difíciltem sido lidar com os impulsos sexuais. Eles
têm surgido muito ao longo do dia, frequentemente e em momentos
inapropriados. Estou tendo que me esforçar pelo autocontrole
quando sou impulsivo e hipersensível.
Minha terapeuta me deu dicas de como eu poderia abordar o
assunto sexo com Sophie, quando eu criasse coragem para dizer a
ela que a amo e caso ela aceitasse ser a minha namorada. Nós já
fizemosisso. Nos amamos e já somos namorados. Porém, tudo tem
sido diferente da maneira como imaginei que seria. Sophie não é
autista, mas ela parece estar "hiperfocada" em sexo tanto quanto
eu. Ela é quente; em alguns momentos se envergonha, mas em
outros ela parece ousada o bastante. Meus pais conversaram muito
comigo sobre respeitar uma garota, sobre não trazer tanto o assunto
sexual para uma possível relação amorosa, conversaram sobre eu
precisar ser mais delicado em minhas palavras. Mas... minha
namorada, talvez, não seja o tipo de garota que eles estavam
pensando que ela era. Com Sophie, sinto que posso simplesmente
ser eu mesmo, posso falar muito abertamente sem precisar ser tão
delicado em minhas palavras.
E, nas conversas com a minha terapeuta, os debates
seguiam como se ela estivesse falando para qualquer garoto autista.
As dicas foram preciosas, mas não me encaixo em nada daquilo.
Ela falava muito sobre consentimento, sobre limites emocionais e
mais uma série de fatores que eu precisava saber para lidar com
uma garota. Mas Sophie é uma garota sem limites e ela está
consentindo em tudo, e não há limites emocionais para nós, porque
eu sou dela e ela é completamente minha, ela confiaem mim tanto
quanto eu confionela, somos cúmplices e melhores amigos. Isso é
tão confuso. Eu sinto a necessidade de ter um tipo de tratamento
diferenciado para lidar com isso, porque agora eu não sou um
garoto autista querendo perder a virgindade com uma garota que
acabei de conhecer. É Sophie, a minha garota, a menina que eu
conheço desde a infância. Então tudo deve ser tratado com uma
outra perspectiva.
Nós decidimos ir para a terceira base quando chegarmos em
São Roque. É o nosso último dia aqui na Ilha e queremos um tempo
para poder explorar as possibilidades com calma. Decidimos juntos.
Eu gostaria de não debater com ela, mas é um pouco difícilnão
debater e parece importante. Já descobri sobre possíveis palavras
sujas, e sinto a necessidade de descobrir mais coisas sobre os
pensamentos e expectativas da minha namorada. Algo como me
preparar para o futuro. Isso faz parte da minha necessidade de
regras e sequências, onde posso estar completamente infiltrado
dentro de uma zona de conforto que me passe segurança. Mas
deixa de fazer sentido quando coloquei em minha mente que
deveria me arriscar e fugir de tudo que me protege de viver
.
Eu não sei o que estou fazendo,não sei o que dizer, não sei
o que de fatofazer. Mas sei que vou aprender. Vou aprender porque
eu quero Sophie de uma maneira que eu também não consigo
entender. Complexo, como sempre fui. Talvez eu precise pela
primeira vez parar de buscar respostas, focarem sentir e em deixar
acontecer.
Há muitas confusões. Mas, quando vejo Sophie correndo na
areia da praia, a minha mente parece se acalmar. Apenas a mente.
O meu corpo inteiro começa a queimar com a visão, pareço febril
apenas por vê-la. As temidas reações involuntárias.
— Perdido em Sophie? — Minha mãe surge, sorrindo.
— Ela é... eu não posso dizer.
— Sei o que quer dizer. Bom, você é um garoto de muita
sorte, filho. Você tem uma das garotas mais lindas que já vi. Ela te
ama desde que se entende por gente, te entende melhor que você
mesmo se entende, esperou por você todos esses anos.
— Ela tem um corpo muito bonito — comento, analisando. —
Ela é...
— Gostosa — minha mãe conclui e meu rosto queima de
vergonha. — Sophie é linda e toda sua. Veja só que incrível!Como
vocês estão? Está sendo legal namorar com Sophie?
— Está sendo muito bom, porém, difícil. É muito difícil
namorar com Sophie, mãe. Às vezes acho que não posso fazer isso,
porque é muito difícil mesmo.
— Difícil?— Minha mãe não compreende. — Você sabe que
pode se abrir comigo. Sou sua mãe e temos todos os segredos do
mundo.
— Estou com hiperfoco.
— Hiperfoco em Sophie?
— Não, mãe... — Ela fica pensando e então compreende.
— Oh! Eita! Ok! — Sorrio por vê-la sem palavras. — Ok. É...
bom... mas estão se entendendo ou você precisa de ajuda?
— Estamos nos entendendo, mãe. Até o momento estamos
indo bem. Bom, eu preciso ir conversar com o meu pai sobre os
construtores, ok?
— Vá! Vou para a praia com Melinda. Vamos nos juntar à sua
garota.
Eu e Samuel estamos há um tempo conversando sobre
banalidades. Só então me dou conta de que ele disse que estava
com problemas. Como ele acabou zoando o plantão, logo após ter
dito isso, acabei deixando passar.
— Ei, você sabe que essa sua tatuagem fazparecer que tem
um mamilo gigante? — pergunto, referindo-me a uma tatuagem que
ele tem em volta do mamilo direito. É engraçado.
— Você já me falou isso ao menos 50 vezes desde que a viu
— responde, rindo.
— Me conte sobre sua briga com a tia Dandara. — O sorriso
dele desaparece no mesmo instante.
— Ela não quer que eu me mude para São Roque. Ela quer
que eu permaneça no Rio, cursando a faculdade de forma
presencial, disse que a qualidade de ensino cai quando optamos
pelo ensino à distancia e que vou absorver muito mais frequentando
as aulas presenciais. Mas não concordo com ela. Tenho maior
facilidade em aprender estudando sozinho do que com as aulas
dadas pelos professores. Sempre foi assim.
— Eu a entendo. Ela está com a razão, por mais que seja
difícilpara você. Digo razão no sentido de se importar, entende? É
sua mãe, ela quer o melhor para você. Tia Dandara é super
apegada a você. Foi difícillidar com o meu pai também, mas ele só
foi maleável por entender a minha situação com Henrico e por eu
prometer retomar os estudos em breve.
— Acontece que eu vou mudar para São Roque. Nunca fiquei
mais de duas semanas sem ver o meu irmão. Não vou morar longe
de Henrico. — Sorrio, porque Samuel é a coisa mais lindinha desse
mundo. — Não ria, Sophie. Fomos criados juntos, eu não vou ficar
no Rio sem vocês e eu sei que posso ser bem-sucedido estudando
à distância. Tenho comprometimento, tenho maturidade quando
preciso ter. Acabei de conversar com o meu pai e ele confia em
mim, ele confia em minhas promessas e em minha vontade de ser
um advogado bem-sucedido.
— Não acho justo comparar seu pai com a sua mãe. Fica
parecendo que ela é a bruxa má e ele o super-herói.
— Não é isso. Minha mãe é a mulher mais foda do mundo,
Sophie. Eu a amo incondicionalmente, tenho orgulho dela, me
inspiro nela, mas eu preciso voar. Preciso poder fazero que quero,
só que ela quer me manter presa sob o braço.
— Eu acho que todas as mães são assim e acho também
que deve ser imensamente difícilter que abrir as asas e deixar os
filhos voarem. Enfim, minha mãe me ensinou desde pequena um
jeito especial de lidar com o meu pai. Sua mãe é extremamente
parecida com o meu pai. Enquanto ele é o Harvey Specter, sua mãe
é a Jessica Pearson. A diferença é que ela é juíza e a Jéssica
advogada — comento, rindo. — O que quero dizer é que é
necessário ter tato e táticas para lidar com os dois. Eles são muito
imponentes, impenetráveis, rigorosos, acho que a profissão deles
exige isso e algumas vezes acabam não conseguindo separar as
coisas. Eles podem ser maleáveis quando nos abrimos e quando
dialogamos. Para lidar com o meu pai ou sua mãe, requer muito
diálogo. Você precisa chegar para ela e se abrir, como se abriu
comigo, expor seus pensamentos, expor como se sente quando ela
tenta estar no controle de sua vida, precisa passar segurança a ela
de que suas ações estão sendo bem calculadas. Se você chegar e
só dizer: "mãe, quero mudar para São Roque e vou estudar à
distância", não vai resolver, Samuel. Temos que pensar que essas
mudanças não são novas apenas para nós, mas para eles também,
entende? Requer adaptação de ambas as partes.
— Ok, Sophie, quando foi que resolveu ser tão madura e
tratar as situações quase como uma psicóloga de pais?
— Eu não sei. — Sorrio. — É que todas essas mudanças que
estou passando estão me fazendo analisar mais as pessoas,
comportamentos e tudo mais. Eu consigo ver a relutância do meu
pai e o esforço absurdo que ele está fazendo para aceitar que eu
cresci e que preciso caminhar mais sozinha agora. Eu sinto um
pouco de tristeza por vê-lo assim, mas sinto orgulho também, ele
está se esforçando. Minha mãe também está sentida, mas ela é
bem mais leve que o meu pai, então ela está conduzindo mais de
maneira "lúdica", entende? Para ela, eu estou vivendo o meu sonho,
um conto de fadas. Ela não é o tipo de mulher que planeja o futuro,
ela é o tipo de mulher que vive intensamente o presente. O meu pai
já é mais categórico, mais analítico,metódico, calculista. De alguma
forma,os dois se encaixam muito bem e dá certo. Tudo o que posso
te dizer é que acaba não sendo muito fácilpara eles lidarem com o
fato de que estamos indo voar. Precisamos ter paciência para
compreendermos eles e para argumentarmos sobre nossas
vontades. Converse com ela novamente, ao invés de bater os pés
como um garoto mimado, ok? Você quer a independência e quer
voar, então precisa mostrar a ela que está pronto para isso. Batendo
seus pés e teimando, só mostra que é um garoto despreparado, e
sabemos que não é. Passe segurança a ela, Samuca.
— Uau, Sophie! Que porra te deu? De qualquer forma,
obrigado. Eu precisava ouvir isso. Agora eu já sei como agir com a
minha meritíssimamaravilhosíssimamãe. Agora me falesobre você
e meu irmão. Estou curioso.
— O que quer saber? Não transamos ainda. Estamos nos
conhecendo melhor. — Pressiono meus lábios para não entregar
sobre os avanços do meu namorado. — Henrico está diferente.
— Diferente como?
— Ele parece disposto a arriscar, parece disposto a enfrentar
situações onde não há nada sob controle. É curioso, visto que ele
sempre foifechadodentro do próprio universo, onde todas as coisas
sempre foram devidamente calculadas e ele se mantinha seguro de
mudanças. Eu gosto dessa versão e ele tem me surpreendido
bastante quando se mostra muito mais preparado que eu. Nunca
imaginei que Henrico estaria preparado para um passo tão
grandioso, entende? Quando nos imaginávamos juntos, eu acabava
só pensando em como seria difícile em como todos os passos
teriam que ser lentos. Se eu te contar que é ele quem está tendo
que ser um pouco paciente agora, você acreditaria?
— Não.
— Pois é exatamente o que está acontecendo. — Samuel
está me olhando um pouco chocado. É chocante mesmo,
principalmente para nós, que sabemos exatamente como Henrico
sempre conduziu as coisas. Estou feliz que esteja sendo
exatamente dessa maneira. Meu bebecito é o meu maior orgulho da
vida.
Ele se junta a nós, acompanhado de toda a família.
Passamos um dia incrível!
ATUALMENTE
— Glória Deuxxxxx! Henrico Davi! Que diabo é isso na sua
mão? — minha namorada pergunta ao me ver com uma foto dela
em mãos. Foi tirada no dia do aniversário de 12 anos da minha irmã,
em meu quarto.
— Você tinha 16 anos — comento, observando a foto. Ela
estava com uma camisa vermelha, tinha os cabelos mais curtos,
usava uma maquiagem estranha e estava sorrindo. Eu a achava
muito linda, mesmo com as bochechas vermelhas de maquiagem.
— E você tem essa aberração? Credo! Olhe para mim... Os
anos fizeram um milagre e tanto! — fala, pegando outras fotos que
ela nem imaginava que eu tivesse. — Oh! Nessa eu estou muito
sexy sem ser vulgar — diz, rindo.
É uma das fotos que eu mais acho bonita. É preta e branca,
Sophie tinha 18 anos. Os cabelos dela estavam jogados para o lado,
sua mão estava próxima à boca e ela já tinha uma tatuagem
delicada de estrela no ombro. Me recordo que a blusa que ela está
usando na foto era bastante decotada e não tinha alças.
— Linda.
— Nessa aqui eu estou menos feia, menino mais bonito.
Porém, na primeira, definitivamente estou muito mais feia que a
noiva do Chucky.
— Não acho, mas tudo bem. Sempre ouvi meu pai dizer que
as mulheres são complexas, agora vejo que faz muito sentido —
comento, recebendo um olhar estranho da minha namorada.
— Está falando que sou complexa?
— É exatamente isso, Sophie! Você é linda, perfeita, é a
menina mais bonita do mundo e cisma que é feia. Não é possível
você se achar feia nessa foto preto e branco. Porém, não vou
obrigá-la a se achar bonita. — Ela sorri e me dá um beijinho na
bochecha. Sophie é muito linda.
— Estou cansada — confessa, fazendo um enorme bico.
Nossas coisas chegaram à tarde e passamos o resto do dia
tentando organizar tudo. Ainda sobrará serviço para amanhã, mas é
o momento de parar.
— Vamos descansar e continuamos amanhã.
— Sabe, eu também tenho fotos sua, só que estão em meu
celular — comenta, me puxando para o sofá. Fico a observando
enquanto busca as imagens no telefone. — Aqui!
Tudo o que vejo é uma foto da minha boca.
— Por que tem uma foto da minha boca? — pergunto a ela,
rindo.
— Oh, querido, você já viu a sua boca? Já! Você a vê todos
os dias. Mas... sua boca tem toda a minha admiração. Aumentou um
pouco depois dessa madrugada. — Fico envergonhado ao lembrar
da madrugada. — Enfim, sua boca é a boca mais perfeita que eu já
vi e precisei registrar isso. Foi no Natal do ano passado, enquanto
você estava distraído. Dei zoom e fizessa obra de arte. Essa outra
também. — Ela me mostra uma outra e eu sorrio da carinha que ela
faz.
— O que foi?
— Você é um absurdo de tão bonito, e tem covinhas
encantadoras — diz, pegando o celular da minha mão. — Todas as
coisas que me disse durante a madrugada mexeram comigo. No
momento não consegui dizer nada, apenas chorei. Mas, menino
mais bonito do mundo, eu nunca duvidei do seu potencial, sempre
soube que era capaz de tudo, até mais capaz que a maioria dos
meros mortais. Eu sempre esperei por você, sempre acreditei em
você, sempre vi muito além de todas as coisas que você era capaz
de ver em si mesmo. E eu sinto muito que sua juventude tenha sido
tão difícil,com tantas confusões internas. Sinto por não ter estado
perto todas as vezes em que passou por determinadas situações.
Sinto muito por ter lidado com pessoas ruins tentando te diminuir.
Saiba que o problema nunca esteve em você, e sim em cada um
deles. Você é incrível, garoto mais bonito. E, sobre sexo...
acabamos de começar, mas o que me fez sentir ontem... — fala
timidamente. — Eu quero sentir aquilo pelo resto da minha vida e eu
vou me lembrar dessa madrugada para sempre. Você é muito
melhor que o meu melhor sonho e é capaz de me dar prazer desde
um simples beijo até um magnífico sexo oral.
— Oh, Sophie! Não diga essas coisas! — peço,
envergonhado.
— Eu precisava dizer. E precisava deixar pontuado que você
é extremamente incrível e que eu quero sua boca em meu corpo
uma, duas, infinitas vezes. Eu não imaginava que poderia sentir
tanto prazer na vida, então sou eu quem devo agradecê-lo.
Obrigada por estar fazendo de mim a garota mais feliz do mundo!
— Paiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!!!!!!!!!!!!!!
Eu me sinto como se estivesse dando um passeio em plena
alameda dos sonhos despedaçados; exagero ou não. Ainda estou
tentando processar e digerir os acontecimentos da noite passada. É
difícil.Mas não por ser uma crise, que já era algo esperado, e sim
pela atitude de Henrico durante ela. O fato de eu estar presente,
vivenciando aquilo ao lado dele, não lhe caiu bem. Não sei dizer ao
certo como ele se sentiu;talvez um pouco envergonhado ou inferior.
Houve uma insistência para que eu me afastasse e não o
presenciasse tão quebrado, e, embora eu quisesse permanecer ao
seu lado com todo meu amor e compreensão, não tive opção a não
ser acatar seu pedido. A ideia de relutar e insistir até passou pela
minha cabeça, mas estava bastante evidente que a minha presença
estava contribuindo para deixá-lo ainda mais nervoso.
Agora estou na casa dos meus pais, curtindo a minha TPM e
um enorme aperto no peito, recebendo notícias de Henrico através
da tia Paula e tentando bravamente não surtar.
Até o momento, decidi me manter isolada, sem falar muito e
sem me sentir disposta o bastante para ouvir os conselhos dos
meus pais ou de quem quer que seja. Eu me fechei um pouco na
dor, nos acontecimentos e estou tentando lidar com a confusão
interna.
Torna-se impossívelnão pensar no futuro.Estaremos em São
Roque, distante da maior parte dos nossos familiares, e tenho me
perguntado se Henrico optará por um afastamento com frequência.
Agora é tudo diferente. Não somos mais apenas amigos. Somos
noivos, estamos caminhando para construir um relacionamento
sólido, e não consigo cogitar a hipótese de ter que me afastar
sempre que ele estiver com crises.
Quando combinamos de morar juntos, surgiram as regras e
ele me disse que precisava ter um lugar onde pudesse ficarrecluso
quando necessário. Isso foi super aceitável e compreensível para
mim. Mas a ideia de eu ter que sair de casa ou ele, não é tão
aceitável assim para mim. A questão é que nossa relação ainda está
no início e Henrico não está tão seguro ainda. Essa insegurança
pode vir a complicar as coisas, por mais que eu sempre tente
conduzir tudo pelo lado da compreensão.
É o mar diante dos meus olhos que está fazendocom que eu
não entre em paranoia. Ter o mar diante dos meus olhos, através da
parede de vidro do meu quarto, é uma das coisas que mais sinto
falta. É surreal como ficarobservando as ondas indo e vindo fazum
bem danado para a mente e para o coração.
Por fim,meu coração acaba ficandomais leve após um longo
tempo perdida na natureza magnífica.Eu consigo compreender que
é necessário aceitar que alguns ciclos são mais lentos, que nada
nessa vida é igual, nem mesmo os dias. Entendo que minha
frustração vem do fato de eu ter sido paciente uma vida toda e
esperado para viver esse amor. Agora que eu o tenho, é como se a
paciência tivesse sido extinta do meu vocabulário e da minha vida.
Mesmo sabendo que a lentidão é necessária, eu tenho a sede de
atropelar o mundo e a vontade louca de não perder uma única
batida do coração do meu menino mais bonito do mundo. Mas, esse
novo ciclo também é de aprendizado e a vida está me mostrando
que tudo acontece como deve acontecer, que não adianta sentir
qualquer frustração ou querer agir como um furacão.Sempre soube
que seria assim, vencendo uma batalha por dia, me preparei para
isso, então por que agora tudo parece tão difícil?Não gosto de ser
inconstante em meus pensamentos e sentimentos.
Sinto-me em uma confusa felicidade; radiante por ter
conseguido ir tão longe com Henrico, triste por ele me afastar em
um momento de vulnerabilidade. Acho que o amor é o sentimento
mais desafiador, e se não estivermos preparados para lidar com as
provações com paciência, respeito, resignação e confiança, é
porque não sabemos amar. Amar exige muito e nem todos estão
preparados para vivenciar essa experiência.
Agora eu só preciso acreditar que o fluxo do Universo é
perfeito e que o destino não falha. Não quero acreditar que Henrico
se afastará de mim por completo. Quero me apegar ao fato de que
ele só precisa de um pequeno intervalo para colocar a mente no
lugar e então retomar de onde paramos.
Em geral, sempre fui uma garota muito positivista, confiante,
não quero perder essa essência que me acompanha desde o meu
nascimento. Não é o momento para fraquejar. É o momento onde
devo encontrar toda a minha força e demonstrá-la. Talvez assim
Henrico seja capaz de compreender que sou fortepor mim, por nós,
e que seu jeito atípico de ser não me assusta, me encanta.
As teorias e a fé vacilam no quinto dia de afastamento. É
como se minha mente fosse capaz de contabilizar cada segundo do
dia e não desligasse nem por um momento. A ansiedade e o medo
me fazem comer mais do que suporto. E é exatamente quando
estou devorando uma caixa de bombom no meu quarto, que a porta
se abre e Henrico surge, tão misterioso e sério quanto é possível.
Eu devo ser uma espécie de devassa mesmo. Com todos os
problemas que temos a enfrentar, meu foco vai para as veias
saltadas no braço e no estilo despojado que mexe com todos os
meus chacras. Por um momento quero jogar os bombons longe e
atacá-lo como uma maníaca louca por sexo, mas, por ora, decido
aguardar as ações dele. Não sei como ele está após esses dias,
após a crise. Não sei o que esperar.
— Oi, Sophie — ele me cumprimenta, visivelmente sem
graça.
— Oi, Henrico Davi. Entre — o convido e ele dá alguns
passos até estar dentro do meu quarto. Tomada por um nervosismo
repentino, o observo fechar a porta e se virar de volta para mim.
— Eu não sei como fazer isso. Não sei por onde devo
começar. É tudo novo para mim, confuso.Nunca imaginei que faria
mal a você algum dia e acabei fazendo.Pensar nisso me deixa um
pouco nervoso, me tira da zona de conforto que sempre tive em
nossa relação de amigos. Agora temos outro tipo de vínculo, então é
diferente.
— Comece por onde quiser começar. Estou aqui para ouvir o
que quer que seja, Henrico. Não precisa ficar nervoso. Ainda que
sejamos noivos, a amizade de sempre prevalece. Sou sua amiga
antes de ser sua mulher — argumento, nervosa. — Por que não se
senta? — convido e ele se acomoda em um sofá próximo à minha
cama. De cabeça baixa, mexendo com um elástico nos dedos, ele
simplesmente começa a falar:
— Minha mente estava turbulenta, eu precisava processar
tudo. Porém, errei quando acreditei que era uma espécie de super-
homem capaz de enfrentar todas as situações de uma só vez. Na
tentativa de me encaixar, de querer mostrar que eu poderia ser
como os demais homens, falhei.
— Por que queria mostrar isso? — pergunto. — O seu maior
diferencial é não ser como os demais homens. Embora eu tenha
uma leve impressão do motivo, não consigo entender porque sente
essa necessidade de querer mostrar que pode ser igual quando
você possui um nível de superioridade. V
ocê nunca será como todos
os homens, Henrico, por dois motivos: primeiro, ninguém é igual a
ninguém;segundo, você está acima das expectativas e isso te torna
insuperável.
— Da mesma formaque ninguém é igual, nenhuma pessoa é
insuperável — responde. — Talvez pense que sou um idiota a partir
de agora, repetitivo, mas é difícilser seu namorado, Sophie. Não
apenas sexualmente falando. Eu venho tentando superar os meus
limites, venho forçando uma superação que não sou capaz, venho
tentando lidar com as questões de uma maneira que nunca lidei
antes, tudo para provar que eu sou capaz e para chegar um pouco
mais perto do homem que eu acho que você merece ter. Com isso,
tenho ignorado os alertas da minha mente e não suportei a pressão
de duelar com um passado doloroso. Eu tenho cometido erros
desde que resolvi me autoatropelar.
— Não percebe que nada disso é necessário? — pergunto.
— Não percebe que entrei nessa relação sabendo das suas
limitações, respeitando-o? Eu sei cada um dos seus pontos fracos,
Henrico. Conheço seu jeito, seus trejeitos, suas nuances. Me
preparei uma vida toda para lidar com isso e me encaixo em você
da formacomo é. Eu não quero que seja o homem que acha que eu
mereço. Quero que seja o homem que eu sei que mereço, do
jeitinho especial que é. Não quero que seja como todos os outros,
porque eles estão longe de ser o que e quem você é, estão longe de
possuir todas as qualidades que você possui.
— Estive pensando bastante nos últimos dias, tive ajuda da
minha terapeuta para conseguir entender alguns pontos,
principalmente sobre Pablo. Mas... Sophie... eu não posso trazê-la
para a minha confusão. — Ele segue de cabeça baixa, como se
fosse incapaz de conseguir me olhar nos olhos. — Você se preparou
para um relacionamento comigo, mas eu não me preparei para um
relacionamento com você. Embora seja tudo o que mais quero na
vida, ainda sinto-me incapacitado de...
— Não! — exclamo, cedendo ao choro, tentando evitar a todo
custo que ele diga o que penso que vai dizer. — Não termine de
dizer, ok? — peço, jogando a caixa de bombom longe e me
ajoelhando diante dele. — Não façaisso comigo. Não faça isso com
você. Eu fui paciente a vida toda, esperei por você desde criança,
mas agora eu não serei paciente — falo, tentando olhar em seus
olhos. — Não vou deixar você boicotar sua própria felicidade. Não
depois de vê-lo avançar tanto, dentro dos seus limites. Não vou
permitir. Você verá uma nova versão de mim se continuar insistindo
com isso. Podemos diminuir o ritmo, mas não colocar um ponto
final.Não existe tempo, Henrico. O nosso amor... — Solto um soluço
desesperado. — O nosso amor é a coisa mais fantástica do
Universo. Você é o garoto mais perfeito do Universo para mim. Não
quero que seja diferente...eu quero que seja quem é, quem sempre
foi. Se você me largar... tudo o que vivemos, tudo o que disse a
mim, deixará de fazer sentido.
— Eu nunca menti sobre tudo o que disse a você, o que
quero dizer é que...
— Então fique. Nunca me deixe. Eu sempre darei espaço
para lidar com as suas questões, respeitarei seus limites, serei a
mulher que precisa que eu seja. Mas, se você me deixar, Henrico,
serei miserável de todas as maneiras, porque desde que me
entendo por gente você é o garoto da minha vida e nunca imaginei...
nunca imaginei ser abandonada por você. Podemos ir devagar, não
importa a velocidade. Tudo o que importa é a direção.
— Sophie, ouça...
— Não quero ouvi-lo agora. Ouça você, Henrico. Como pode
parecer tão fácilassim? Como consegue fazerisso? Eu fiquei cinco
dias distante e foi devastador, como se a vida deixasse de fazer
sentido. Eu pensava em tudo, desde os olhares intensos aos toques
carinhosos. Não pode ser fácil abrir mão das coisas que vivemos.
Não é justo que seja. Eu não posso me imaginar sem os seus
beijos, sem o carinho, sem as conversas, sem acordar com você
enroscado em meu corpo, sem os encontros dentro de casa durante
a madrugada, sem o sexo que me dá. E nem sei que diabos estou
fazendo. Não implorar clemência a um homem fez parte da
educação que eu recebi... mas como não fazer isso quando o
homem é você? Ninguém no mundo entenderia...
— Sophie, pare de falar! Minha cabeça está latejando! —
pede, ficando de pé e me encarando. — Não sei o que entendeu,
mas definitivamente não estava falando sobre abandoná-la. —
Essas palavras me fazemficarde pé e limpar o rosto. — Por que é
tão difícil esperar que eu termine de falar?
— Não sei dizer. Acho que...
— O medo. O mesmo medo que me manteve em inércia por
anos — responde. — Como pode pensar que eu a abandonaria?
— Medo... — falo, voltando a chorar.
— Como pode a garota que sempre me encheu de coragem
se mostrar medrosa?
— Não sei dizer.
— Você me cortou três vezes, Sophie — pontua. — Eu iria
dizer que ainda me sinto incapacitado, ainda me sinto inferior. Iria
reafirmar que acho que merece muito mais do que um garoto fodido
como eu, mas que descobri nos últimos dias que estou muito além
do egoísmoquando trata-se de você. Iria dizer que os dias ruins vão
surgir, talvez não com muita frequência,mas, ainda assim, eles vão
acontecer. Porém, eu tentarei ao máximo não te afetar, porque não
quero mesmo trazê-la para a minha confusão. Prestarei mais
atenção aos avisos da minha mente, seguirei com a terapia na
frequênciacorreta, não me afastarei, como foi necessário fazernos
últimos dias. E, o mais importante, iria dizer que precisamos voltar
para São Roque, para a nossa casa, e que quero que sejamos só
nós por alguns dias. Eu senti a sua falta, Sophie. Senti falta da
nossa rotina, senti falta de fazer amor com você e não dormi bem
sem tê-la ao meu lado, grudada em meu corpo. Senti falta das
reações do meu corpo, porque ele pareceu morto durante os últimos
cinco dias e isso nunca aconteceu antes. Você faz tudo em mim
reagir.
— Vamos embora, menino mais bonito do mundo. Vamos
para a nossa casa — falo, me jogando em seus braços e sentindo
todas as peças voltarem a se encaixar. Um abraço e a vida volta a
fazer sentido. Um beijo e meu corpo se aquece, vibra com a
intensidade.
O medo...
Ele sempre será o grande vilão da vida de uma pessoa. Ele
nos paralisa, nos faz enxergar coisas que não existem,
compreender as situações de uma forma negativa, faz nossa fé
vacilar. O medo é, de fato, o maior inimigo do ser humano. E, cada
vez mais, mesmo que cometendo erros por permitir que o medo seja
maior que a minha fé,eu entendo Henrico e o motivo pelo qual esse
sentimento sempre esteve em sua vida.
O mais incrívelé vê-lo reviver junto comigo. Sentir seu corpo
voltando a reagir, seu beijo atingindo um nívelmaior de intensidade,
as sensações afloradas mostrando que precisamos um do outro
para fazer sentido. Que loucura é amar. Quem disse que o amor é
uma revolução está completamente coberto de razão.
— Me desculpe por fazê-lasofrer. Eu só não queria que visse
o pior de mim — sussurra de um jeito que faz meu ventre se
contorcer.
— Não existe o pior de você.
— Sophie, vamos embora? — pergunta, mostrando-se
devidamente afetado e prestes a perder o controle. — Por favor
.
— Vamos!
Quando Sophie surge na sala, completamente pronta para ir, minha
respiração vacila ao analisá-la ao meu modo. Já não sei distinguir quando
é apenas o estilo dela ou quando ela está tentando me provocar com
roupas. A provocação vence, mesmo se não for intencional.
Ela está com um vestidinho preto que possui um decote
extremamente generoso. Deixa visível a tatuagem entre os seios quase
que por completo e isso atrai a minha atenção muito mais do que a
prudência permite. De repente, meus olhos, tão sinceros quanto todo o
restante de mim, não conseguem olhar para nada além do contorno dos
seios de Sophie. É incrível e interessante como meu corpo reage a um
decote de Sophie.
Eu só desvio o olhar quando ouço tio Victor fazerum barulho com a
garganta, demonstrando que fui pego em flagrante e que deveria não
fazer isso diante de seus olhos.
— Me desculpe, tio Victor. Sophie é muito bonita. — Ouço uma
risadinha de meu pai enquanto tio Victor começa a dizer suas baboseiras
que não são tão baboseiras assim.
— Ele ainda tem a capacidade de assumir que estava olhando para
o decote da minha filha!
— Oh, fala sério, sugar daddy, nossa menina é a coisinha mais
perfeita do Universo e é óbvio que atrai olhares. Felizmente, estamos
lidando com o noivo, o que torna tudo compreensível— tia Melinda diz,
massageando os ombros dele.
— Sophie é mesmo a menina mais perfeita do Universo. É a
menina mais bonita do mundo — concordo com tia Melinda. — Estou
ansioso para ir embora, Sophie. Já está tudo certo? — pergunto à minha
noiva, que dá um sorriso que passei a conhecer bem nas últimas
semanas.
— Está tudo certo. Podemos ir. Também estou ansiosa — ela
responde e eu fico de pé.
Confesso estar um pouco envergonhado perante tio Victor;não por
ter sido flagrado admirando os seios da minha noiva, mas por tê-la feito
sofrer ao precisar de um distanciamento. Sophie até compreende, mesmo
se chateando, mas não sei dizer se tio Victor está feliz. Qual pai ficaria
feliz ao ver a filha sofrer? Por mais que ele e tia Melinda estejam me
tratando muito bem, sinto o peso das minhas ações.
É muito complicado ter necessidades de afastamento social em
determinadas crises. Porém, não tinha opção. Havia muitas questões em
minha mente e, após o encontro com Pablo, eu precisei preencher
algumas lacunas de dúvidas que carreguei comigo uma vida inteira. O
meu balanço final é que aquele encontro serviu para eu aprender que
precisamos estar preparados até mesmo para exigir a verdade das
pessoas. Lidar com verdades nem sempre é algo positivo, principalmente
quando não estamos de fato preparados para receber a carga que a
verdade traz consigo.
Minha terapeuta me aconselhou a parar de buscar por verdades.
Ela disse uma frase da Martha Medeiros que me fez passar dois dias
inteiros pensando:"Não quero ter a terrívellimitação de quem vive apenas
do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade
inventada". Por fim, eu compreendi o que ela quis dizer. O autismo fezde
mim um garoto que vive a vida lidando com todas as questões no sentido
literal; desde as mais simples até as mais complexas. Estou sempre
procurando o sentido de todas as coisas. E, a verdade, é que essa busca
em achar sentido, nem sempre faz sentido. É muito confuso, eu sei.
Imagine quão confuso foi para mim entender isso? Sou muito inteligente
para muitas questões, mas tenho dificuldadede compreender as pessoas
e alguns acontecimentos da minha vida. Chegar à conclusão que preciso
ser mais leve em minhas buscas e menos literal, foi desafiador e nem sei
se conseguirei fazer isso tão fácil.
Quero ser menos literal, especialmente com Sophie. Doutora Ana
disse que nem tudo tem que ter respostas específicas,que algumas
coisas devemos apenas nos entregar e viver, sem precisar fazersentido.
Ela me disse que o simples fatode eu sentir, já é a resposta para todas as
minhas dúvidas. E eu sinto. Eu sinto e quero seguir sentindo.
Eu quero sentir Sophie e mergulhar em nosso relacionamento sem
me achar inferior e meu autodepreciar. Também foi difíc
il chegar a essa
decisão, principalmente quando uma parte de mim insistia em apenas
deixá-la seguir sua vida sem toda a complexidade de se envolver com um
garoto como eu. Mas, como eu disse a ela minutos atrás, a cada dia que
passa me descubro mais egoísta e menos disposto a deixá-la livre. Sophie
desperta em mim uma imensa possessividade. Por todo histórico que
vivemos, não merecemos perder um ao outro após tanta espera.
Após despedirmo-nos dos meus sogros, entrelaço meus dedos aos
dela e caminhamos rumo ao aeroporto. Meu pai nos levará até o
aeroporto, onde pegaremos o jatinho. Estive receoso em relação a
magoar minha irmã por decidir fazer o que é melhor para mim, por isso,
horas antes de tomar a decisão de voltar a São Roque, precisei conversar
com ela. Felizmente, ela foi compreensiva e eu descobri o quão doce
Yaya pode ser. É quase vergonhoso perceber isso tão tarde.
— Estão entregues! — meu pai anuncia assim que descemos do
carro no aeroporto.
— Obrigado, pai. Não apenas por nos trazer, mas pelo apoio nos
últimos dias — falo baixo em seu ouvido assim que o abraço.
— O seu presente é lindo, filho. Foque nele e seja feliz.— Meu pai
sorri e vai abraçar Sophie.
Poucos minutos depois, estamos sobrevoando o Rio de Janeiro e
indo rumo a São Roque. Há em mim um certo frio na barriga e
definitivamente não é por estar voando. Há um pouco de medo de ter
quebrado parte da conexão que eu e Sophie construímos.É algo que não
sei explicar e que provavelmente está surgindo em minha mente por conta
da parcela de culpa que estou sentindo pelo afastamento, mesmo ciente
de que foi o melhor.
Meus pensamentos desviam-se por completo quando Sophie torna-
se inquieta. Fico parado, sentado em meu lugar, apenas a observando se
mexer. A encaro e ela me encara de volta. Um sorriso angelical surge em
seu rosto e logo em seguida ela suspira, mexendo em uma mecha de
cabelo. Do nada, ela se põe de pé e vai atrás de água. Porém, ela fazisso
quase esfregando a bunda em meu rosto, visivelmente querendo me
provocar.
Uma pesquisa feita pelo site de relacionamentos britânico, Saucy
Dates, ouviu 11.179 pessoas de todo o mundo, a maior parte no Reino
Unido e nos EUA, e chegou à conclusão que apenas 5% de todos os
entrevistados admitiu já ter feito sexo durante uma viagem de avião. Mas,
78% das pessoas ouvidas revelaram que gostariam de já ter tido esta
experiência. E os demais 17% disseram que não possuem interesse. A
maioria das pessoas escolheu o banheiro como lugar ideal para o sexo,
59% fizeram sexo sobre o lavatório. 31% dos entrevistados fizeram sexo
na própria poltrona e outros 9% fizeramsexo no corredor da aeronave, o
que é para mim muito bizarro. 37% dos entrevistados disseram que
escolheram o parceiro/parceira para fazer sexo no avião. Já 30%
sucumbiram à tentação na hora e transaram com estranhos.
Acho que deve ser interessante, até mesmo deve possuir um nível
de adrenalina diferente transar em uma aeronave, nas alturas. Porém,
após passar dias longe de Sophie, eu não quero que nossa reconexão
sexual seja feitaem um avião apertado e de formarápida, visto que o voo
possui uma curta duração e que estamos quase chegando. É por isso que
ignoro a tentação, mesmo achando extremamente difícillidar com a sua
bunda passando pelo meu rosto uma segunda vez. Opto pelo silêncio e
pelo autocontrole.
Em nossa casa, o autocontrole deixará de existir. Eu preciso comer
Sophie mais do que preciso de oxigênio para respirar. Cansei de reprimir
os meus instintos.
Quanto mais sério Henrico se mantém, mais louca eu fico. Ele não
faz ideia do quanto esse modo sério e fechado me afeta. Se fizesse,
nesse minuto ele estaria conversando e tentando me distrair. Ele não é
tolo, sabe exatamente o que quero e está achando que ignorar minhas
ações fará com que eu fique calma ou sei lá... Como entender o que se
passa na mente dele?
Eu posso não conseguir ler a mente do meu noivo, mas eu leio
muito bem o volume em sua calça, que deixa em evidência que ele está
ligado em tudo e quer o mesmo que eu quero.
— Precisa de ajuda? — pergunto e ele me encara sem entender.
Dou o meu melhor sorriso e aponto para o volume em sua calça. Seguro a
vontade de rir assim que ele solta um som de frustração, de quem foi pego
em flagrante.
— Estou bem, Sophie. Obrigado.
— Eu posso resolver isso ficandode joelhos, como você gosta. Eu
sempre quero ficarde joelhos para você — provoco, passando meu dedo
indicador em seu peitoral, por cima da camisa.
— Em dez minutos estaremos no aeroporto, em meia hora
estaremos em casa. — É a sua resposta.
— Pensei que entraríamos para o Miles High Club — brinco.
— Qual a graça de fazerisso em um voo onde só há nós dois? Não
há muita adrenalina. — Oh, ele entendeu sobre o sexo nas alturas! Isso
me faz sorrir. Bebecito... É incrível como algumas pessoas já pensaram
pouco desse garoto. Ele engana tão bem... ninguém sabe que ele é tão
safado comigo.
— Então, suponhamos que estivéssemos em um voo comercial,
você me levaria até o banheiro e me foderia? — Henrico solta um som
rouco no mesmo instante.
— Não diga essas coisas agora, Sophie... — pede em tom de
sofrimento.
— Mas você faria isso?
— Se você estivesse de acordo, sim. Seria uma nova experiência.
Mas teríamos que ser silenciosos, e isso é um pouco difícilpara nós —
argumenta.
— É extremamente difícil,porque quando você está dentro de mim
sinto uma vontade gigante de gemer e chamar seu nome. Não consigo me
controlar sentindo tanto prazer. Eu não vejo a hora de chegar em casa,
bebecito... — Ele engole em seco e balança a cabeça em concordância.
Sem respostas para mim agora... é engraçado.
Quando enfim aterrissamos na cidade vizinha, somos tomados por
uma mudança drástica de temperatura. Estou batendo o queixo de frio e
agradecida por Samuel estar nos aguardando, acompanhado de Hadassa.
Esses dois simplesmente se aproximaram e tornaram-se inseparáveis.
Enquanto Henrico carrega nossas malas, saio correndo e
interrompo o casal que parece em outro planeta.
— Ok, casal, apenas me levem para o carro com urgência! —
imploro, choramingando, e fico emocionada quando meu primo retira seu
casaco e deposita em minhas costas. — Eu te amooooo! Muito obrigada!
Ele vai cumprimentar Henrico e os dois ficamabraçados, como se
não se vissem há anos. Enquanto isso, cumprimento Hadassa.
— Você sempre está extremamente estilosa! — elogio.
— Samuel está tentando me tirar do salto, mas estou sendo
relutante — explica, sorrindo.
Dentro do carro, não consigo conter a curiosidade.
— Vocês estão namorando? — pergunto.
— Não — os dois respondem ao mesmo tempo.
— Não? Vocês já transaram ao menos?
— Não, graças a Samuel, que resolveu abolir o sexo da vida dele.
Eu não vou implorar mais. Ele já está avisado. Sou sexualmente ativa e
necessito de sexo. Samuel já está ciente disso e ciente de que não
esperarei por muito tempo. Estou atingindo o limite — Hadassa responde,
enquanto meu primo ri.
— Fala sério, Samuel! — exclamo. — É verdade isso? — Logo
Samuel? É surreal acreditar que meu primo, o galinha MOR, está negando
sexo a uma mulher. Samuel é pegador nato, às vezes sem critério.
Preciso de uma explicação lógica para compreender o motivo dele estar
fazendo isso. Nada contra, mas é incomum.
Henrico segue silencioso, apenas atento à conversa.
— Vocês não estão namorando e não fazem sexo, mas ficam
abraçados o dia todo e se beijando. O que significaisso que estão tendo?
— Faço mais uma pergunta e Samuel segue rindo. Estressada, dou um
tapa na cabeça dele.
— Ai, porra!
— Pare de rir, idiota! Eu só estou tentando entender, palhaço do
circo Vitória! — esbravejo e Hadassa é quem ri agora.
— Amei o palhaço! — ela diz.
— Vou começar a perguntar da sua vida sexual com Henrico —
Samuel retruca e eu reviro os olhos.
— Como se não perguntasse ou não soubesse — rebato. — Como
estão todos?
— Tudo parece bem. Eva e Théo estão organizando algo, estavam
apenas esperando vocês voltarem. Parece que eles querem comunicar
alguma coisa — Samuel explica. — Minha irmã se juntou com Maicon e
está aterrorizando São Roque. As mesmas loucuras que sempre
acontecem quando todos se juntam. Nenhuma novidade. Chegamos,
pessoal! — avisa e só então me dou conta de que estamos em frente à
casa. Agora tudo em mim se agita.
Descemos e Samuel pega as nossas malas. Na hora de se
despedir, Henrico me surpreende.
— Eu tive alguns problemas nos últimos dias e acabei ficando
afastado de Sophie. Eu e ela estamos precisando de um tempo. Você
pode dizer ao pessoal que ficaremos ausente por um tempo? — pede a
Samuel, que me olha, pedindo por respostas. Apenas balanço a cabeça
negativamente e ele entende que agora não é o momento para
conversarmos sobre o ocorrido.
— Está tudo bem. Tenham o tempo que precisarem. Se precisarem
de qualquer coisa, me liguem. — Retiro o casaco dele e entro correndo
em casa após me despedir.
É estranho estar de volta aqui, por algum motivo que não sei
explicar. Acho que os cinco dias fizeramseu efeito, há muita tensão entre
nós dois, e não apenas sexual.
— Estamos em casa, bebecito — digo, colocando minha mala na
sala e virando-me para ele.
— Senti falta daqui. Por um breve momento pensei em propor para
continuarmos no Rio, mas não seríamos felizes, Sophie. Eu seria
assombrado pelo passado pelo resto dos meus dias e não teria a
qualidade de vida que esse lugar oferece. Sinto muito por deixar meus
pais, Yaya, por saber que eles se sentem um pouco magoados por não
acompanharem de perto o desenvolver da nossa relação, mas tenho
certeza de que eles ficarão mais felizes sabendo que o lugar onde me
sinto realmente feliz é aqui, nessa cidade, com você; podendo fazer
coisas que me sinto incapacitado de fazer no Rio de Janeiro, como
passear, dirigir, conviver um pouco mais em sociedade. Não quero viver
olhando para trás ou para os lados, para ver se Pablo não vai surgir, como
de costume. Quero a liberdade e tranquilidade.
— Você merece ter tudo o que deseja, bebecito.
— Eu quero você — fala com toda a intensidade que possui.
— Sou sua. Amo você, respeito você e desde sempre estou
esperando por você. Sua para fazer o que quiser, desde que o resultado
das suas ações seja a felicidade mútua.
— Vou recompensar os nossos dias de afastamento — promete.
— Eu sei que vai e estou ansiosa por isso.
Henrico se aproxima para me beijar e, quando ele está a poucos
centímetros dos meus lábios, a maldita campainha toca... adiando um
pouco mais nossos desejos e contrariando por completo a nossa
necessidade de privacidade.
— Que PORRA!
Não fui eu quem disse isso...
Eu amo que Henrico esteja começando a ser rebelde!
— Me desculpe, Sophie. Não sou assim. — Enquanto Henrico se
desculpa pela forma como acabou de falar, eu vibro internamente,
pedindo "vai, continua". Sei que é errado desejar que o garoto tão perfeito
se torne um perdido, mas o que posso fazer? Eu gosto e acho muito
adulto!
Eu o quero insanamente, mas estou diabolicamente querendo adiar
a diversão só para ver como ele irá reagir. Em minha mente maquiavélica,
decido criar meu próprio jogo, mesmo que seja um jogo sujo.
Fazendo minha carinha mais inocente, me aproximo dele, enquanto
a campainha toca incansavelmente.
— Bebecito, parece que teremos que esperar um pouco mais para
dizermos "enfim, sós". — Faço um bico enorme e deixo um beijo delicado
em sua bochecha, sentindo todo seu corpo sob tensão.
Acho que meu bebecito, o menino mais bonito do mundo, resolveu
agir um pouco na maldade no dia de hoje. Ele parece mais que ansioso
para ficar devidamente confortável comigo. Mesmo com a minha quase
nula experiência, acho que posso dizer que não existe nada mais quente
e empolgante do que ter o meu parceiro ansiando por mim, demonstrando
o quanto me quer, desde o olhar às ações. É de um prazer imenso se
sentir desejada dessa maneira. Eu mal consigo descrever, sabendo que
sou o objeto de desejo de Henrico e que ele me quer tão loucamente
quanto eu o quero. Há muitas maneiras de uma mulher se sentir
poderosa, essa certamente é uma delas. Eu posso sentir o poder vibrando
dentro de mim e sou grata a Henrico por estar me proporcionando essa
sensação deliciosa. É algo que desejo a todas as mulheres,
independentemente da orientação sexual.
Me afasto dele para abrir a porta, porém, antes que eu possa
alcançar a maçaneta, ele me puxa pelo braço. Sua ação fazcom que eu
engula em seco e seja inundada por um mix de incredulidade, surpresa e
satisfação. Nada mais gostoso que ter um Henrico cheio de atitude e
regido de coragem.
Não há palavras, tampouco justificativas. Uma vez que nossos
olhos se conectam, encontro a resposta para a sua ação.
Delicadamente, ele traz uma mão em meu rosto e me toca, fazendo
um carinho gostoso com seu polegar em minha bochecha. Fecho meus
olhos e absorvo a mistura de suavidade com o forte calor que está
emanando de sua mão. Um toque em minha bochecha e eu estou
arrepiada da cabeça aos pés.
Seu polegar agora passeia pelos meus lábios, e é insano o frio na
barriga que esse gesto me causa. Eu quero abri-los e pedir por favor, mas
nem mesmo sei qual favoré esse. Quero tantas coisas e sei que nada vai
parecer o suficiente até que eu tenha tudo. A respiração ofegante de
Henrico decreta o fim precoce do meu jogo sujo. Não há uma única
parcela de resistência em mim e, sinceramente, seja o que for ou quem
for, tudo agora pode esperar. Temos necessidades um do outro e essas
necessidades merecem ser saciadas após dias de dor.
Como se soubesse cada um dos meus pensamentos, Henrico cola
seus lábios aos meus e não de uma forma delicada. Ele rouba a minha
sanidade e meu fôlego com um beijo repleto de vontade e desejo
reprimido, um beijo inesperado por mim. Nem mesmo noto a expertise de
Henrico em retirar meu vestido. Quando dou por mim, ele simplesmente
está caindo sobre meus pés e há mãos incríveis cobrindo meus seios.
— Sophie...
— Deus!
— Sophie, eu sou completamente apaixonado pelos seus mamilos.
— Sorrio e me distancio. — Você é a menina mais perfeita do mundo. — A
maneira como ele olha para os meus seios é diferente.
— Feitos para você, bebecito. — A campainha volta a tocar e
Henrico perde o restante da paciência. De uma só vez, ele me pega como
um saco de batatas e me carrega diretamente para o quarto, dando um
chute certeiro na porta assim que entramos. Não é Henrico Davi este
cidadão, mas de alguma maneira eu o amo da mesma forma. Alguma
coisa boa tinha que sair dos cinco dias de afastamento. O aumento de
desejo é visível, não que precisasse ser aumentado. Estávamos como
ninfomaníacosantes, então nada a reclamar. Mas agora está diferente...e
eu vou descobrir como...
Sou colocada ao chão, e movida pela adrenalina, avanço sobre ele
como uma desesperada, jogando seu boné longe e arrancando sua
camisa, enquanto o vejo chutar os tênis para longe. É insano, e eu
simplesmente me entrego à insanidade, caindo de joelhos aos pés dele.
— Você me queria de joelhos, bebecito... — sussurro, alcançando o
fecho de sua calça e abrindo, enquanto expressivos olhos castanhos me
observam. Deslizo a calça por suas pernas, as retiro e sigo para a cueca,
onde há um pacote rijo e uma mancha denunciando o nível elevado de
excitação do meu noivo. Não sei se é assim para todas as mulheres, mas
uma vez que abaixo a cueca de Henrico, toda minha boca se enche de
água, como se estivesse prestes a devorar o doce dos sonhos. É incrível
em todas as dimensões!
Jogo a cueca longe e dou um sorriso angelical antes de dar uma
lambida marota na glande inchada e molhada. Embora o gosto de
esperma não seja nada agradável, o chupo com necessidade e fome,
vendo Henrico devidamente afetado a cada movimento. Meu delicioso
noivo traz suas mãos em meus cabelos e deixa tudo ainda mais excitante
conforme os puxa.
Levo tudo o que consigo em minha boca. Em alguns momentos
simplesmente o masturbo com as minhas mãos, deliciando-me com os
sons roucos que saem de Henrico. Não tenho pressa, mesmo que meu
corpo esteja implorando por um alívio.Nada supera a imagem de Henrico
delirando de tesão.
Ele agarra mais forte os meus cabelos e começa a impulsionar para
a minha boca sem reservas. Palavras desconexas surgem e meus olhos
brilham em lágrimas quando torna-se quase mais do que sou capaz de
suportar. Eu sinto seu membro pulsando e crescendo, então ele me afasta
de uma só vez e começa a se tocar sozinho, sob meu olhar de idolatria.
Eu ficoboquiaberta, vendo a familiaridadedele com seu próprio pau, e é a
coisa mais perfeita do mundo vê-lo dando prazer a si mesmo, tocando
punheta. Jatos de esperma caem ao chão e eu sou incapaz de ficarde pé
diante da cena mais linda que meus olhos já presenciaram. Por algum
motivo, por estarmos na situação que estamos, isso ganha uma proporção
gigantesca dentro de mim. Eu vibro com cada movimento das mãos dele e
os acompanho como se fossem em câmera lenta.
Quando os movimentos diminuem, parece que Henrico volta ao
planeta Terra. Ele abre os olhos e nem mesmo parece capaz de acreditar
que fez isso diante dos meus olhos. É diferente mesmo, de toda a
intimidade que já tivemos. É tão lindo ver as bochechas dele corando em
vergonha e vê-lo tentando encontrar palavras para justificar o que não
precisa ser justificado. Eu quem preciso agir agora, deixando toda a
sujeira para ser limpa depois.
Fico de pé e o empurro para a cama. Ele cai deitado de costas e se
surpreende ao me ver montá-lo. Ainda estou de calcinha, mas agora eu só
preciso beijá-lo e dizer o quanto foi linda a cena que ele acabou de
protagonizar. E eu faço.
Desço até seus lábios e o beijo com ternura, admiração e amor, me
dando conta de que mesmo que tentemos levar tudo para o lado da
safadeza, o amor sempre vai sobressair de alguma maneira.
Aos poucos vou sentindo seu pau voltar à vida sob meu corpo. A
sensação é deliciosa, principalmente quando Henrico leva as mãos em
minha bunda e forçaainda mais o contato. Meu corpo passa a se mover
por conta própria e começamos uma pegação deliciosa, que nos fazrolar
na cama. É ainda mais gostoso ficarse pegando dessa forma, evitando o
inevitável por um tempo. Nossos corpos se impulsionam um para o outro,
conforme nossos lábios permanecem grudados. Somos mãos, corpos,
suor, ofegos...
Perco a sanidade por completo quando Henrico afasta minha
calcinha para o lado e minha intimidade entra em contato com o que mais
anseio. Eu deslizo sobre o membro duro e rolo até estar por cima do meu
noivo novamente. Com as mãos apoiadas em seu peitoral, deslizo e
provoco uma quase penetração.
— Por favor, Sophie! — ele implora, impulsionando sua pélvis para
cima enquanto o provoco. — Por favor... por favor...
— Você quer muito isso?
— Por favor, Sophie. Eu preciso muito. — Eu dou o que queremos.
Lentamente permito deslizá-lo para dentro de mim, sentindo cada parte da
minha intimidade se abrir para recebê-lo. A sensação de preenchimento
surge e só consigo pensar no quão agraciada sou por ter um alguém que
preenche cada parte de mim nos mais diversos sentidos.
Dessa vez somos mais ação e mais silêncio, ambos matando a
saudade um do outro. É perfeito, prazeroso e nos mostra que nossa
conexão é impossível de ser destruída, mesmo que às vezes os
problemas batam à porta.
Nos entregamos ao vai e vem, em alguns momentos com toda
calmaria, em outros com todo desespero e tesão. Henrico brinca de dar
prazer ao meu corpo algumas vezes e eu dou o prazer que ele busca em
mim. E assim passamos o resto do dia, namorando, esquecendo que
existe vida do lado de fora do quarto e esquecendo até mesmo de nos
alimentar. Perfeitos em nossas imperfeições. Perfeitos um para o outro.
Ele é mesmo diferente...
Tudo que ele se dispõe a fazer, faz com maestria, com a
sagacidade que só um gênio possui!
Eu amo meu menino mais bonito do mundo e idolatro o seu mundo
azul!
[1]
ligação, nexo ou harmonia entre fatos, ideias etc. numa obra literária, ainda que
os elementos imaginosos ou fantásticos sejam determinantes no texto;coerência.
[2]
Uma brincadeira com a frase TIPO REI.
[3]
Nebulosas são grandes nuvens encontradas no espaço interestelar, formadas,
majoritariamente, de poeira cósmica e gases, como hélio e hidrogênio.