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Panfletos de Adyar – n° 199

SANKARACHARYA

O Filósofo e Místico

Kasinath Tryambak Telang

Com uma Nota de Annie Besant, Presidente da Sociedade Teosófica 1907-1933

Impresso em Julho de 1935 por The Theosophical Publishing House Adyar, Madras, Índia

Prefácio

KASINATH TRYAMBAK TELANG, o falecido Juiz da Corte Suprema de Bombaim, um profundo estudioso, um
verdadeiro patriota, e um filantropo de largo coração, era simpatizante do trabalho da Sociedade Teosófica e
amigo dos Fundadores, Madame H. Blavatsky e Cel. H.S.Olcott. Ele nasceu em 1850 de uma alta família da
casta Sarasvata Gauda Brãhmana, e foi educado em Bombaim na Elphinstone High School e no Elphinstone
College. Foi um arguto estudioso da literatura, filosofia e economia política inglesa e se tornou um consumado
orador e escritor. Foi um proficiente erudito do Sânscrito e um volume do Sacred Books of the East contendo
admiráveis traduções do Bhagavad-gitã, Sanat-sujãtya e Anugita, permanece em seu crédito e passará à
posteridade como um monumento ao seu profundo conhecimento. Suas eruditas contribuições ao Indian
Antiquary e seu Gleanings from Mahratta Chronicles são cheios de notas e sugestões instrutivas. Foi durante
algum tempo Presidente do Ramo de Bombaim da Royal Asiatic Society.

Em 1871 ele leu diante da Student’s Literary and Scientific Society um trabalho muito interessante sobre
Samkaracharya; tinha além disso outras notas e materiais valiosos sobre aquele obscuro personagem que,
com aquele trabalho, foram resgatados do esquecimento pelo Cel. Olcott e publicados em 1879 no The
Theosophist (vol. I, pps. 71, 89 e 203). O ensaio é admirável e contém valiosa informação, e sua publicação
nesta forma permanente será, espero, apreciada.

T.P.H.

Nota

Do ponto de vista oculto o primeiro Sri Samkaracharya foi um Ser muito acima de nossa raça, um dos Três
Kumaras imediatamente abaixo do Grande Iniciador, mencionados na Doutrina Secreta, e na mais estreita
relação com Ele. Ele pertence à humanidade de S’ukra, não à de nossa Terra. Ele encarnou cerca de oitenta
anos depois do passamento de Gautama, o Senhor Buddha – um fato que é historicamente registrado só nos
arquivos de Dvaraka Math. Algumas alusões sobre Ele podem ser encontradas no terceiro volume de The
Secret Doctrine (A Doutrina Secreta), mas estão muito confusas e talvez intencionalmente contraditórias;
serão encontradas na seção sobre "O Mistério de Buddha".

Annie Besant

Referências serão encontradas em:

The Age of Sri Sankaracharya, do Pandit N. Bhashyacharya

Sri Sankarachary's Date and Doctrine, no Esoteric Writings de T.Subba Row, e

The Mystery of Buddha, no terceiro volume de The Secret Doctrine de H.P.Blavatsky

*
Eu bem poderia apresentar os múltiplos compromissos de uma atarefada vida profissional e literária como
uma desculpa, por não atender ao pedido de relatar brevemente no The Theosophist os incidentes da ilustre
carreira de S’amkaracarya. Mas eu sou, primeiro e enfim, um Hindu, e minhas simpatias e humilde
cooperação são devotadas ao estímulo de todos os legítimos esforços de elucidar a história da Índia ou
melhorar a condição intelectual de meus concidadãos. Desde seus primeiros tempos, o estudo da filosofia e
da metafísica tem sido estimado e encorajado neste país, e, muito acima de todos os outros nomes em sua
história, estão escritos aqueles de nossos conterrâneos que desejaram auxiliar os homens a pensar mais
claramente sobre os assuntos abordados naquelas categorias, seja por seus escritos, discursos ou exemplo.
A vida que é abordada neste trabalho, é a vida de um dos maiores homens que já apareceram na Índia. Se
considerarmos sejam suas habilidades naturais, sua altruística devoção à causa da religião, seja a influência
de exerceu sobre seus concidadãos, este esplêndido asceta facilmente se sobressai.

Tão encantador, de fato, é todo o seu entorno, que não nos surpreendemos com a admiração que um povo
maravilhado que evemerizou-o como uma encarnação da Deidade. Nossa ignóbil natureza humana parece
estar sempre tão consciente de sua própria fraqueza e imperfeição quanto é inclinada a deificar quem quer
que personifique suas mais elevadas aspirações; embora mantendo-o no plano humano faz os outros homens
parecerem mais insignificantes e menores pelo contraste.

Os biógrafos de S’amkaracarya apoteosam seu herói, como o fazem os de Alexandre e Cícero, e os de


Apollonius, Jesus e Maomé. Fazem seu advento ser pressagiado por uma visão celestial – do Maha-Deva a
seu pai, S’iva-guru – e recheiam sua carreira de milagres, que nenhuma teoria de desenvolvimento interior ou
psíquico pode explicar. Uma posteridade complacente pode facilmente relevar estes embelezamentos
piedosos como um fruto de uma exuberante parcialidade, pois, depois de tudo isso ser eliminado, a
verdadeira grandeza do pandit, filósofo e místico só nos é ainda mais nitidamente revelada.

Infelizmente não dispomos dos dados que nos capacitem precisar a época na qual este grande instrutor
floresceu. Alguns colocam-no no segundo século antes, outros o trazem até o décimo século depois de Cristo.
A maioria dos estudiosos modernos concorda em localizá-lo no oitavo século da era Cristã: e, uma vez que
corrobora esta opinião a autoridade conjunta de Wilson, Colebrooke, Ram Mohan Roy, Yajnesvara Sastri, e
do Prof. Jayanarayana Tarkapancanana, o editor bengali do S’amkara-vijaya de Ananda-giri, e como se fosse
menos importante, depois de tudo, saber quando ele ensinou, do que o que ele ensinou e fez, podemos bem
aceitar esta decisão sem questionamento. Tampouco seu local de nascimento pode ser determinado com
certeza. Do mesmo modo que sete cidades competem pela honra de ter produzido um Homero, cinco
biógrafos assinalam sua natividade em cinco diferentes localidades. A cidade comumente favorecida é
S’rngeri (Vide as anotações do Pandit K.V. Rama-savami, pg. 4, e o mapa no final do livro), mas uma
passagem do S’iva-rahasya, citada no Kavi-caritra, indica uma cidade no distrito de Kerala, chamada Sasala-
grama; (Kavi-caritra, pg. 3, linha 17). A vida de S’amkaracarya por Ananda-giri nomeia Cidambara-pura (pp. 9
e 19. Pode ser acrescentado que eu tenho sérias dúvidas sobre se o Samkara-vijaya, publicado em Calcutá, é
realmente um trabalho de Ananda-giri, o discípulo de S’amkara); Madhava indica Kalati (Madhavacarya, II, 3);
e por fim, Yajvnesvara S’astri, em seu Arya-vidya-sudhakara, nos fala que S’amkaracarya viu a luz pela
primeira vez em Kalpi (pg. 226).

Mesmo se não acreditarmos nas histórias dos portentos e maravilhas que se diz terem ocorrido nos reinos
animal e vegetal ao seu nascimento – como o congraçamento de feras usualmente hostis entre si, a incomum
transparência dos rios, e a emanação sobrenatural de fragrâncias por árvores e plantas, nem na alegria dos
Upanishads, nem nos jubilosos peãs de toda a milícia celeste; mesmo assim temos por certo de que nosso
herói, em tenra idade, demonstrou a mais maravilhosa precocidade. Em seu primeiro ano aprendeu o alfabeto
e a linguagem Sânscrita; aos dois, aprendeu a ler; aos três, estudou os Kavyas e Puranas – e compreendeu
muitos trechos por intuição (Madhava, IV, 1-3). Ananda-giri, menos circunstancial, meramente assinala que
S’amkara se tornou fluente no Prákrito, Maghadi e Sânscrito já em sua Saisava, infância.

Tendo estudado o Itihasa, os Puranas, o Maha-bharata, os Smritis e os Sastras, Samkara, em seu sétimo
ano, deixou seu professor e voltou para casa. Madhava narra que a mãe de seu herói, sendo um dia vencida
pela debilidade resultante das austeridades que praticara antes de seu nascimento, para propiciar os deuses
e fazê-los atender sua súplica por um filho, e também pelo tórrido calor do Sol, desfaleceu: S’amkara, vendo-a
desmaiada, não só a trouxe de volta à consciência mas ainda fez com que o rio transbordasse, arrefecendo o
ar para ela, uma circunstância que obviamente espalhou até muito longe sua fama de taumaturgo. O Rei de
Kerala, em vão lhe oferecendo presentes de ouro e elefantes através de seu ministro, veio em pessoa prestar-
lhe reverência e, revelando-lhe seu desejo por um filho que fosse como ele próprio, foi tornado feliz pelo
sábio, que ensinou privadamente ao rei os ritos que deveriam ser executados em tais casos. Não devo perder
a oportunidade de apontar, de passagem, as duas coisas implicadas nesta peça biográfica, quais sejam, de
que era acreditado que a progênie poderia ser induzida pela recitação de mantras (Madhava, V, I. Compare
com Ananda-giri, pg. 11) e a execução de ritos cerimoniais, e que o segredo nunca é ensinado publicamente,
mas transmitido privadamente de adepto para discípulo (Madhava, V, 59). Não pretendo demorar sobre estes
fatos, mas deixo-os para serem trabalhados por nossos novos amigos, os Teosofistas, a quem o lado místico
da natureza oferece maior apelo.

Na mesma altura, o grande sábio Agastya, visitando S’amkara com outros sábios, profetizou à sua mãe que
ele morreria com a idade de 32 anos. Sentindo que este mundo é todo uma espetáculo passageiro, este
menino de oito anos determinou-se a abraçar a vida de um santo Samnyasin, mas sua mãe objetou, seu
orgulho materno indubitavelmente desejando que seu filho, por sua vez, gerasse um filho para herdar sua
própria grandeza de alma e mente. Entretanto, a determinação do jovem não seria abalada, e o
consentimento materno foi obtido, como nos dizem os biógrafos, com a produção de um milagre (Madhava, V,
87. Nenhum dos detalhes de Madhava são encontrados em Ananda-giri, onde só temos duas linhas sobre
este assunto, p. 17). Banhando-se num rio certo dia, seu pé foi abocanhado por um crocodilo. Ele gritou tão
alto que sua mãe correu até o local, e sendo-lhe dito que o crocodilo não livraria seu pé antes que ela
concordasse que seu filho se tornasse um asceta, sentiu-se coagida a dar o consentimento. S’amkaracarya
então saiu do rio e confiou-a aos cuidados de parentes e amigos, e prometendo-lhe que voltaria sempre que
ela tivesse necessidade de sua presença, tomou rumo e iniciou a carreira para a qual ele tinha tão
poderosamente uma inclinação natural.

Como se guiado por alguma irresistível atração magnética para certo lugar, S’amkara viajou por diversos dias,
através de florestas, sobre montes, por entre cidades e atravessando rios, mas, todo o tempo inconsciente de
tudo e esquecido dos homens e feras que encontrava pelo caminho, e chegou à caverna em um monte nas
margens do Narmada, onde Govinda Yati havia estabelecido sua ermida. Depois das preliminares usuais, o
sábio aceitou o jovem como discípulo e lhe ensinou Brahman através das quatro grandes sentenças: O
conhecimento é Brahman; Esta alma é Brahman; Tu és Aquele; e Eu sou Brahman. É relatado por Madhava,
que imediatamente depois de ter entrado no discipulado, um dia quando seu guru estava absorto em
contemplação, ou, como diríamos, Dharana, ao pronunciar certos versos místicos, S’amkara operou o milagre
de acalmar uma furiosa tempestade de chuva acompanhada de terríveis relâmpagos e trovões. Ao retornar à
consciência das coisas externas, sabendo o que seu ilustre discípulo havia feito, Govinda Natha transbordou
de felicidade, pois este exato evento havia-lhe sido previsto por Vyasa em um sacrifício celebrado muito antes
pelo sábio Atri. Concedendo sua bênção sobre S’amkara, recomendou-lhe que fosse a Benares e recebesse
a bênção da Deidade.

Por teu feito glorioso


Então passa, e começa
A salvar a humanidade

Assim admoestado, S’amkara seguiu para Benares, onde, depois de uma residência de alguns meses, diz-se
que recebeu seu primeiro discípulo, Sanandana – o mesmo que depois foi celebrado como seu grande
favorito, sob o título de Padma-pada. Confesso uma dúvida sobre a precisão desta data, ainda que eu cite
esta circunstância do livro de Madhava (Madhava, V, 53-61), pois parece impossível que S’amkara tivesse
iniciado a tomar discípulos em uma idade tão precoce como a que ele, segundo o próprio Madhava, devia ter
atingido então. Entretanto, seja como for, Padma-pada foi devidamente aceito como discípulo em Benares e
lá muitos dos outros se juntaram a eles.

Em seu décimo segundo ano, S’amkara mudou-se para Badari, nas margens do Ganges, onde ele compôs
sua obra-prima, o comentário sobre os Brahma-sutras. Aqui também ele escreveu o comentário sobre os
Upanishads, sobre o Baghavad-gita, sobre o Nrsrmha-tapani (chamado assim por Madhava), e sobre o Sanat-
sujatiya, entre outros trabalhos. Então ele ensinou seu grande comentário a seus numerosos discípulos, mas
sempre reservando seus maravilhosos poderes de exposição para Padma-pada. Isto excitou a inveja no
coração dos outros discípulos, e para dissipá-la, S’amkara, estando certa vez na margem do rio que passava
por sua casa, chamou Padma-pada para vir diretamente da outra margem até ele. Este obedeceu e
destemidamente caminhou sobre a superfície das águas, que produziam um lótus a cada passo que ele dava.
Foi nesta ocasião que o nome de Padma-pada lhe foi dado por S’amkara, ao abraçá-lo em reconhecimento de
sua entusiástica devoção.

Ao ensinar seus discípulos, o jovem mestre não hesitava em fazer adversários entre os homens letrados que
tinham posições distintas da dele, mas ele sempre saía vitorioso. Segundo Madhava, ele retirava as armas
com que combatia seus poderosos oponentes de um vasto arsenal de conhecimento Védico. Ficamos
assombrados com uma descrição de uma querela de oito dias entre ele próprio e Vyasa, que lhe apareceu
sob o disfarce de um idoso Brahmana, mas cuja identidade foi intuitivamente reconhecida, ao menos por
Padma-pada. O biógrafo nos fala que o espírito de Vyasa, em seu disfarce como Brahamana, propôs-lhe um
milhar de objeções ao grande Bhasya sobre os Brahma-sutras, as quais foram todas triunfalmente refutadas,
e que ao final concedeu um prolongamento de dezesseis anos ao período de vida que ele deveria viver, e
após pedir-lhe que empreendesse uma refutação de todos os outros sistemas filosóficos em voga, abençoou-
o e desapareceu.

Depois disto, S’amkara partiu para Prayaga à porocura de Bhatta Kuramila, para pedir-lhe que escrevesse
varttikas sobre seu Bhasya, mas encontrou-o prestes a empreender a auto-cremação, em desgosto com o
mundo. Tentando inutilmente fazê-lo reconsiderar sua determinação, S’amkara foi não obstante autorizado a
apresentar seus comentários, os quais Kumarila elogiou vivamente; e depois deste ter completado seu ato de
auto-imolação, S’amkara passou a Mahismati, a cidade onde Kumarila lhe havia informado que encontraria
Mandana Mis’ra, que realizaria o trabalho que S’amkara lhe havia solicitado. Chegando ao lugar, foi conduzido
à casa do sábio por pardais, miraculosamente dotados de linguagem humana, e capazes de discutir as mais
intrincadas questões filosóficas. Encontrando a casa, achou-a fechada, de modo que para obter acesso teve
de elevar-se no ar e entrar, como um deus ex-machina, no salão de Mandana. Uma animada, e a princípio
mesmo áspera, discussão seguiu-se entre o hospedeiro e seu convidado inesperado e não bem-vindo, os dois
finalmente decidindo fazer a esposa de Mandava arbitrar entre eles. Mas ela, tendo outros afazeres, deu a
cada um uma guirlanda, estipulando que deveria ser considerado vencido aquele cuja guirlanda secasse. Não
quero tentar, no tempo e espaço que tenho à disposição, sequer a epitomizar este maravilhoso debate, mas
recomendo o leitor a Madhava (VIII, 58-130) para detalhes, acrescentando que eles merecem detido estudo.
S’amkara venceu, e vencendo, sob os termos do debate, chamou seu antagonista de discípulo e instou-o a
abandonar a vida doméstica e tornar-se um asceta. Ele consentiu, e a esposa, que era uma encarnação de
Sarasvati, como nos é dito, partiu para o outro mundo. Mas antes de partir, foi impedida por S’amkara, que
desejava debater também com ela. Então começou a segunda discussão, mas as prontas respostas dele a
todas as questões que lhe eram apresentadas venceram Sarasvati, como podemos agora chamá-la, até que
ela enveredou por uma via com a qual S’amkara era totalmente desfamiliarizado, Ela lhe propôs uma questão
sobre a Ciência do Amor. Obviamente ele foi incapaz de responder imediatamente, tendo sido um Samnyasin
e um celibatário por toda sua vida; então ele pediu um adiamento de um mês, e, tendo-lhe sido concedido,
deixou Mahismati.

A questão de Sarasvati sobre a verdadeira natureza do Amor necessitava de resposta, mesmo que ele fosse
dez vezes um Yogin ou Samnyasin. Assim, S’amkara viajou para encontrar os meios de aprender a verdade.
Enquanto andava com seus discípulos, encontrou o cadáver de certo rei chamado Arnaruka (ou Arnta-pura),
ao oeste da cidade de Mandan Mis’ra, de acordo com Ananda-giri (Ananda-giri, pg. 224), jazendo ao pé de
uma árvore na floresta, e rodeado de homens e mulheres que lamentavam sua morte. Tirando partido desta
oportunidade, S’amkara confiou seu próprio corpo ao cuidado de seus discípulos e fez com que sua alma
entrasse no cadáver do rei. A suposta ressurreição que se seguiu deliciou o povo, e o Rei S’amkara foi levado
em triunfo da floresta da morte para o trono da realeza [Este incidente é muito importante para passar sem
comentários editoriais. O poder do Yogin de deixar seu próprio corpo e entrar no de outra pessoa e animá-lo,
mesmo que confirmado por Patanjali e incluído entre os Poderes de Krsna, é desacreditado por jovens
indianos europeizados. Bastante natural, pois já que os biólogos ocidentais negam uma alma ao homem, é
uma proposição impensável a eles que a alma do yogin possa entrar no corpo de outra pessoa. Que uma tal
descrença irracional deva prevalecer entre os discípulos das Escolas Européias é razão suficiente para que
um esforço seja feito para reviver na Índia aquelas escolas de Psicologia nas quais os jovens Arianos fossem
instruídos sobre as leis ocultas do homem e da natureza. Nós, que pelo menos temos alguma modesta
familiaridade com a ciência moderna, não hesitamos em afirmar nossa fé de que esta transmigração
temporária de almas seja possível. Podemos mesmo ir mais longe e dizer que este fenômeno foi
experimentalmente provado para nós em Nova York, entre outros lugares. E, uma vez que seríamos os
últimos a exigir que tão maravilhosa asserção fosse aceita sobre o testemunho não comprovado de quem
quer que seja, instamos nossos leitores para que primeiro estudem a Literatura Ariana, e então derivem de
uma experiência pessoal as evidências corroborantes. O resultado deve inevitavelmente satisfazer todo o
pesquisador honesto de que Patanjali e S’amkaracarya conheciam os segredos de nosso ser, e que Tyndall,
Carpenter e Huxley, não. – NE, The Theosophist (H.P.B)].

Lá, o Rei S’amkara, estando como estava dentro da pele de Arnakura e sendo de fato Arnakura até onde o
olho podia discernir, e passando como tal, aprendeu praticamente tudo sobre a ciência e a arte do Amor, e
aparelhou-se para responder à questão da astuta esposa de Mandana. Ele também estudou a teoria do
assunto no Vatsyayana, e fez progresso bastante para que ele próprio escrevesse um tratado original sobre o
tema. (Mandhava, X, 18). Enquanto isso, entretanto, os ministros de estado, considerando que seu
ressuscitado Rajá era um homem de longe mais sábio e melhor do que jamais fora, suspeitaram que deveria
ter ocorrido alguma transmigração de almas, e assim, para evitar o retorno deste intruso ao seu corpo de
origem, secretamente emitiram uma ordem para que todos os cadáveres da cidade fossem queimados, mas
tomaram o cuidado de que esta ordem não chegasse ao conhecimento do Rei (Pandit Rama-svami diz que a
ordem foi emitida pela própria Rainha, e nisto o Pandit concorda com Ananda-giri, que também faz a Rainha
suspeita do fato, p. 225., e não faz nenhuma alusão aos ministros).

Entrementes, os discípulos de S’amkara que se encarregaram de seu corpo, achando que o limite de tempo
fixado para o seu retorno já havia sido ultrapassado, ficaram muito apreensivos. Enquanto outros davam
vazão à sua tristeza, Padma-pada sugeriu um plano que foi adotado unanimemente, e passaram a tentar
descobrir o paradeiro de seu preceptor. As história de Madhava e Ananda-giri não concordam nesta busca
dos discípulos por seu mestre, o primeiro fazendo-os perambular de província em província, enquanto que o
segundo nos diz que o corpo de S’amkara havia sido depositado fora da própria cidade Real. De fato, o
próprio Madhava descreve em outro ponto a circunstância da alma de S’amkara não encontrando o corpo no
lugar combinado, então animando-o na pira funerária, e retornando com seus discípulos, como uma obra de
apenas curta duração; mas interrompemos a seqüência de nossa narrativa. O plano de Padma-pada era eles
primeiro encontrarem o paradeiro de seu mestre, e então, ganhando acesso a ele disfarçados de cantores,
expressar-lhe sua tristeza por sua ausência e chamá-lo novamente ao seu próprio corpo e à continuação de
seu trabalho. Chegando na cidade do Rei Amaruka, ouviram a história da ressurreição sobrenatural, e alegres
de estar na pista certa, levaram adiante seu plano afetuoso. Sua música não só emudeceu a audiência, mas
atingiu a consciência interna de S’amkara em seu corpo emprestado. Ele despediu os cantores, deixou o
veículo do Rajá vazio uma vez mais, desta vez definitivamente, retransferiu-se para seu próprio corpo que
encontrou já entre as chamas mas permanecera ileso, tendo sido tornado à prova de fogo pelos seus poderes
ocultos, e reuniu-se aos seus discípulos devotos cantando louvores a Nrsimha. Chegando à casa de Mandana
ele responde à pergunta de Sarasvati e eventualmente converte Mandana Mis’ra ao Vedantismo.

Viajando para o sul, S’amkara publicou suas obras em Maha-rastra, e estabeleceu residência em S’ri-S’aila,
quando lhe foi feita uma estranha proposta. Um Kapalika intimou-o e instou que lhe desse sua cabeça, que
ele disse querer oferecer em sacrifício, já que o Maha-deva lhe prometera uma residência em Kailasa em seu
corpo humano, se lhe oferecesse a cabeça de um rei ou a de uma pessoa onisciente. S’amkara concordou
sob a condição de que o Kapalika o fizesse sem o conhecimento de seus discípulos, que poderiam interferir.
Assim foi feito, mas antes que a decapitação pudesse se efetuar, Padma-pada soube do arranjo através de
sua consciência interna e, assumindo a forma de um homem-leão, caiu sobre o Kapalika, e dilacerou-o junta
por junta. Ele teve então de ser acalmado e trazido de volta a si mesmo.

O próximo milagre atribuído a S’amkara foi trazer de volta à vida em Gokarana uma criança muito amada de
seus pais (Madhava, XII, 24). Então foi a Srivali, onde fez um novo discípulo na pessoa de Hastamalaka, um
jovem tido como idiota, mas de fato muito diferente, e a então foi para Srnag-giri. Neste último local,
Manadana Mis’ra, que havia adotado o nome de Suresvara (vide p. 251 de Ananda-giri, cujo relato deixa
dúvidas sobre a identidade entre Madana e Sures’vara) escreveu sob ordens de S’amkara um tratado
independente sobre Brahman, que surpreendeu os outros discípulos e igualmente agradou o mestre.

Nesta altura S’amkara, sabendo de um modo sobrenatural [devemos tomar esta indicação junto com nosso
distinguido contribuidor neste ponto. "Não acreditamos em meios sobrenaturais", e acreditamos e sabemos
que para um iniciado como S’amkara não seria difícil conhecer o estado de sua mãe através de suas
faculdades internas – NE do The Theosophist, H.P.Blavatsky] que sua mãe estava à beira da morte, apressou-
se para encontrá-la e, diante de seu pedido de conforto espiritual, instruiu-a ou antes tentou instruí-la sobre o
Brahman sem forma. Ela não pôde compreender seu ensinamento, mas ele tranqüilizou sua mente até o
momento de seu trespasse. Seus parentes recusaram-se a ajudá-lo a realizar as cerimônias funerárias usuais
alegando que ele, sendo um asceta, não era competente para executar o ofício em questão. Assim, ele
produziu um fogo de sua mão direita, com o qual incinerou o corpo (Madhava, 29-56).

Nesta época, Padma-pada, que se havia ausentado em peregrinação, voltou e disse-lhe que um comentário
sobre o Bashya, que ele havia composto e depositado junto a seu tio quando saíra em peregrinação, fora
destruído por aquela pessoa, já que continha uma refutação das doutrinas que ela sustentava. Para grande
júbilo de Padma-pada, S’amkara ditou tudo de memória, já que ele mesmo o tinha lido uma vez, e com este
ditado Padma-pada reescreveu-o. Raja-s’ekhara, também, que havia perdido seus dramas, os teve ditados a
ele do mesmo modo.

E agora, acompanhado de seus discípulos e pelo Rei Sudhanvan, S’amkara partiu em seu périplo de
conquistas intelectuais. A redargutio philosophiarum, que Vyasa lhe havia sugerido, motivo pelo qual sua vida
havia sido estendida, agora começara. Primeiro ele dirigiu seus passos para Setu – a Ponte – então,
passando pelos países dos Pandyas, dos Colas e dos Dravidas, foi a Kanci, onde ergueu um templo e
estabeleceu um sistema de adoração da Devi. Tendo então agraciado com uma visita o povo chamado
Andhras, e tendo visto o assento de Venkatacalesa, seguiu para o país dos Vidarbhas. Ouvindo que S’amkara
desejava entrar no país Karnataka, o rei dos Vidarbhas advertiu-o sobre o caráter perverso do povo em geral,
e de sua inveja e ódio contra S’amkara particularmente. Não obstante S’amkara entrou naquele país, e a
primeira pessoa notável que encontrou foi um Kapalika chamado Krakaca, cuja exposição de sua própria
doutrina desgostou tanto a todos que a ouviram que Sudhanvan fez com que todos os seus seguidores
fossem afugentados ignominiosamente. Foram-se jurando vingança e retornaram armados às centenas.
Entretanto foram destruídos pelo rei Sudhanvan – todos exceto o primeiro Kapalika, que chegou-se a
S’amkara e dirigiu-se a ele dizendo: "Agora prova o fruto de teus atos". Então ele orou a Bhairava e, assim
que este apareceu, pediu-lhe que destruísse o destruidor de seus seguidores. Mas Bhairava matou o próprio
Krakaca, exclamando "Ofendes até a mim?"

S’amkara prosseguiu até o oceano ocidental, e até Go-karla, onde venceu Nilakantha, um filósofo que se
imaginava perfeitamente invencível. S’amkara então foi para o país Saurastra e publicou seu Bhasya lá. Então
passou para Dvara-vata ou Dvaraka e depois para Ujjayini, onde desafiou e venceu Bhatta Bhaskara, Então
foi, "vencendo e para vencer", para os países dos Bahlikas, Bharatas, Sura-senas, Kurus, Daradas, Pancalas,
e assim por diante. No país dos Kama-rupas, S’amkara encontrou e derrotou Abhinava-gupta, um doutor da
escola S’akta. Tendo, entretanto, mais sabedoria mundana do que filosofia ou amor à verdade, e vendo que
não poderia competir com S’amkara, aquele personagem disse a seus discípulos para esconderem seus
trabalhos durante certo tempo, se passando como sendo da escola de S’amkara, amadurecendo todo o
tempo um plano cujas conseqüências serão logo narradas.

O Norte assim dispondo de, e aceitando, o respeito e admiração dos Videhas, dos Kosalas, dos Angas e dos
Vangas, S’amkara entrou no país dos Gandas. Foi então que os nefandos planos do derrotado doutor da
escola S’akta culminaram. S’amkara subitamente contraiu a doença chamada Bhagam-dara [uma terrível
forma de pústula ulcerada ou fístula - NE de The Theosophist] que havia sido lançada contra ele pelos feitiços
necromânticos de Abhinava-gupta, que havia executado um sacrifício especial para completar seu plano
maligno. Os maiores médicos atenderam S’amkara, mas em vão. Entrementes, o próprio paciente se
comportava estoicamente, ou antes vedanticamente. Mas enfim, quando a doença não pôde ser curada, ele
orou ao Maha-deva para que mandasse os As’vini-kumaras, que foram de acordo enviados disfarçados de
Brahmanas. Mas eles diagnosticaram que a doença estava além de seu poder de cura, já que ela havia sido
ocasionada pelos atos de um terceiro. Diante deste comunicado, a ira de Padma-pada acendeu-se uma vez
mais, a despeito do vedantismo de S’amkara. Pois, embora dissuadido pelo próprio S’amkara, ele pronunciou
alguns encantamentos místicos que transferiram a doença para o próprio Abhinava-gupta, que dela morreu
(Madhava, XVI, 22-23. Aqui é dado um ponto importante para o estudioso da ciência oculta, e não deve ser
negligenciado. A lei da física, de que a ação e reação tendem a se equilibrar mutuamente, tem paralelo no
mundo oculto. Isto foi completamente explicado em Isis sem Véu e em outros trabalhos semelhantes. Uma
corrente do Akasa, dirigida por um feiticeiro sobre um dado objeto com um intento maligno, pode ser projetada
com uma intensidade de vontade tal que rompe qualquer obstáculo e sobrepuja o poder de resistência da
vítima escolhida, ou retorna para o emitente, e o aflige do mesmo modo que foi planejado para afetar o outro.
Esta lei é tão bem entendida que foi preservada para nós em muitos provérbios populares, como os ingleses
‘as pragas voltam e se empoleiram’, ‘o que morde é mordido’, etc., o italiano ‘la bestemia gira, e gira, e gira, e
torna adosso a che la tira’, etc. Esta reversão de uma corrente maligna para o emitente pode ser grandemente
facilitada pelo auxílio amigável de outra pessoa que conheça os segredos do controle das correntes Akas’icas
– se nos é permissível cunhar uma nova palavra que logo será usada nas conversas ocidentais – H.P.
Blavatsky, editora de The Theosophist).

Por esta altura S’amkara ouviu falar de um templo em Kashmir, que ninguém senão uma pessoa onisciente
poderia abrir, e que já havia sido aberto nos seus lados norte, leste e oeste, mas que continuava fechado até
então em seu lado sul. Assim S’amkara foi até o templo, mas os debatedores lá não lhe permitiram entrar
antes de examiná-lo. Foi examinado convenientemente, e descobriu-se, como se pode dizer, que nada
faltava. Então ele entrou, mas ao dirigir-se para o assento sobre a cátedra do interior, a Deusa do templo –
Sarasvati – disse: "Sua onisciência já foi comprovada mais do que suficientemente. Mas a onisciência não é o
bastante para habilitá-lo a tomar assento nesta cátedra. Também é necessário continência. Medite sobre seus
atos, e diga se pode reivindicá-la nestas circunstâncias". S’amkara replicou: "Este corpo é perfeitamente puro.
Não posso ser culpado pelos pecados de um outro corpo". Isto, é claro, era um argumento irrefutável, e
S’amkara tomou assento na cátedra almejada! (Madhava, XVI, 86).

Ele então foi para o eremitério de Rsyasmga e, depois de ficar lá por algum tempo, para Badari. Lá ele
ensinou seu Bhasya para algumas pessoas que estavam estudando na Escola de Filosofia Patanjala. Daí
prosseguiu para Kedara – onde rogou ao Maha-deva para que enviasse água quente para seus discípulos
enregelados. Isto, é claro, foi feito; e Madhava diz que o rio ainda corre com água quente naquela parte do
país (Madhava, XVI, 101. De acordo com Ananada-giri a prece por água quente foi dirigida a Narayana, p.
235).

Agora chegava ao trigésimo segundo ano, e ao termo de sua vida, e todos os Deuses e todos os Siddhas e
todos os Sábios desceram em seus veículos divinos para escoltá-lo ao céu. Assim que S’amkara preparou-se,
seu veículo apareceu-lhe, e então "com louvores cantados pelas principais deidades, lideradas por Indra e
Upendra, e honrado com flores celestes, amparado pelo braço do Deus nascido do Lótus, montou em seu
Touro excelente, e exibindo sua cabeleira adornada com a lua, passou para sua própria residência, ouvindo a
palavra ‘vitória’ ser proferida pelos sábios" (Madhava, XVI, 107).

Isto realmente parece muito materialista e não-vedantino. Ananda-giri dá o seguinte relato: "Uma vez na
cidade de Kanci, o local de absolvição, enquanto estava sentado, absorveu seu corpo denso no sutil e se
tornou ‘existência’; então, absorvendo o sutil no corpo que é a origem (do mundo), tornou-se ‘pura
inteligência’; e então, (assumindo o) tamanho de um polegar e atingindo no mundo de Isvara a perfeita
felicidade, (íntegro) como um círculo perfeito, se tornou a inteligência que pervade todo o universo. E ele
ainda existe sob forma de inteligência onipresente. Os Brahmanas do lugar e seus discípulos, e os seus
próprios discípulos, recitando os Upanishads, o Gita e os Brahma-sutras, então escavaram uma vala em um
local muito limpo, e oferecendo ao seu corpo pigmento, arroz, etc., ergueram uma tumba sobre ele" (Ananda-
giri, p. 280).

E aqui termina a história da vida de S’amkaracarya. Olhando para a narrativa agora dada por mim a partir de
Madhava, penso que ouço o sussurro do gênio do ceticismo do século XIX em meus ouvidos: "Tudo isso é
absolutamente uma lenda do início ao fim; é o ‘tinido do ouropel da louvação’ para alguém circundado por um
halo de glória. Numa idade de dois anos é impossível ter-se aprendido o que se diz que S’amkara aprendeu;
aqueles milagres, que se diz que ele operou, são ‘meras e completas’ impossibilidades – em uma palavra,
toda a narrativa de Madhava é mais adequada para as páginas de um romance do que de um trabalho que
pretenda ser histórico". Embora eu confesse que realmente acredito que haja alguma força neste argumento,
igualmente devo afirmar que não estou preparado para dar-lhe um peso maior do que aquele que parece
merecer. Estou perfeitamente inclinado a conceder que haja uma considerável quantidade de poesia nesta
narrativa: mas não estou preparado para dizer que seja muito mais do que pode parecer à primeira vista.
Mesmo no cético século XIX, temos tido relatos de personagens históricos, passados como história, que em
alguns pontos guardam admirável semelhança com o relato de Madhava sobre S’amkaracarya. Poderia
apresentar dois bons exemplos a respeito que me ocorrem neste momento.

O Dr. Thomas Brown, um homem que floresceu neste século XIX, um homem cuja vida foi escrita por um
prosaico ocidental não culpado de hipérboles orientais, é dito ter iniciado em seu quarto ano de vida uma
comparação das narrativas do quatro evangelistas a fim de evidenciar quaisquer discrepâncias que pudessem
haver entre elas. Para apreciarmos a plena força deste exemplo, deve ser lembrado que este espírito crítico
dedicou-se a um trabalho que na opinião comum chegaria à heresia. Esta circunstância, posso dizer, é
registrada na memória do Dr. Brown anteposta às suas eloqüentes palestras sobre a Filosofia da Mente (vide
também The Contemporary Review, junho de 1872. Robert Leslie Ellis, Prof. Grote).

O Sr. Morley, o presente editor de The Fortnightly Review, contribuiu para as páginas daquela publicação com
uma valiosa vida de Turgot. Aqui está sua descrição da precocidade do protagonista de suas memórias: "Tem
sido dito com justiça sobre ele que passou de repente da infância à maturidade, e estava emparelhado aos
sábios antes de ter espanado o pó do jardim de infância" (The Fortnightly Review, agosto, 1869).

Se é preciso mais autoridade para recusarmos subscrever a teoria de que todas as asserções que parecem
maravilhosas, de imediato, e pela razão de serem maravilhosas, devem ser derrubadas como sendo
totalmente falsas, temos a autoridade daquele príncipe dos historiadores filosóficos, Sr. George Grote: "Ao
separarmos", diz aquela grande autoridade em todas as matérias de crítica histórica, "o maravilhoso do
ordinário, não há segurança de estarmos separando o fictício do real" (vide, ainda, o recente livro do Duque
de Somerset, Christianity and Scepticism, p. 46, eo do Duque de Argyll, Reign of Law, passim.). E para não
dependermos do ipse dixit mesmo de um Grote, eu remeteria o cético para os milagres da ciência, que são
"verdades mais estranhas que a ficção", que nós vemos acontecer diante de nossos olhos. Antes de ser um
fato, o que teríamos pensado do telégrafo? Antes de ser um fato, o que imaginaríamos sobre as estradas de
ferro? Eu pediria ao cético que parasse aqui, e considerasse estes assuntos completamente dentro deste
ponto de vista, antes de argüir: "estas circunstâncias são maravilhosas; ergo, são impossíveis". Não são
ocorrências usuais; concedo também que podem ser muito exageradas. Mas quando me dizem que nenhum
homem racional pode acreditar nelas, então eu me calo. Antes, prefiro manter-me em suspenso.

Pretendi neste documento dizer algo a respeito das obras de S’amkaracarya, e sobre alguns outros assuntos
ligados a ele. Mas a falta de tempo e a extensão que este documento já atingia impediram-me de incorporar
aquelas partes necessárias de uma biografia neste presente documento. Espero, contudo, em outro
documento, tratar daqueles assuntos, na medida que o tempo e o material me permitirem.
NOTA DO AUTOR A

De acordo com Ananda-giri, S’amkara não parece ter deixado seu local de nascimento antes de tomar o
Samnyasa, e quando ele deixou o lugar, já tinha muitos discípulos. Primeiro ele foi de Cidambara-putra para o
sul em direção a Madhyarjuna (p.19), onde ele converteu o povo ao advaitismo com um milagre (p.20). Então
prosseguiu para Ramesvara, perto de Setu, onde ele ficou por dois meses, derrotando os representantes de
várias seitas que estabeleciam controvérsias com ele (p.21). Então foi para Ananta-Sayana, onde
permaneceu por um mês (p.51). Viajando para o oeste, atingiu a cidade de Subrahmanya em quinze dias
(p.81). Prosseguindo então para a direção noroeste, chegou à cidade de Ganavara, e lá ficou por um mês
(p.102), então foi para Bhavani-nagara, e manteve discussões com os sectários das cidades vizinhas de
Kuvalaya-pura e outras (p.127). Desta cidade ele passou para o norte, até Ujjayini, onde permaneceu por dois
meses (p.138), então dirigiu-se em direção noroeste até a cidade de Anumalla (p.160), onde passou vinte e
um dias. Indo para o oeste chegou à cidade de Arundh (p. 164), e para o norte, dela até Magadha-putra
(p.170), indo depois primeiro para Indra-prastha (p. 174), e então para Yama-prastha, de onde, depois de ficar
um mês (p. 178), prosseguiu para Prayaga "na confluência do Ganges, do Jumna e do Sarasvati" (p. 184).
Daí, indo para o leste, em "metade de uma noite", atingiu Kasi (p.205) e depois "de ficar lá algum tempo, foi
para o norte até Badari pela rota de Kuru-ksetra (p.235). tendo visto Dvaraka e outros lugares belíssimos, foi
para Ayodhya, depois para Gaya, e daí para Parvata pela rota de Jagan-nath (p.235). Após um mês
prosseguiu para Ruddha-pura, onde viu Kumarila (p. 236) e então para o norte para uma famoso local de
ensino – Vijaya-bindu – situado ao sudoeste de Hastina-pura (p. 238). Tendo derrotado lá Mandana Mis’ra, e
estabelecido um colégio perto de Srnga-pura nas margens do Tunga-bhadra (p. 251), foi após para Ahobala,
daí para Venkata-giri, e então para Venkata-giri, e depois para Kanci, onde, depois de um mês de sua
chegada, encontrou Siva-kanci e Vishnu-kanci (p. 251). Aqui sua alma deixou seu invólucro mortal. Mas antes
deste final, diz-se que ele autorizou cinco de seus discípulos fundarem os sistemas de culto Saiva, Vaisnava,
Sakta, Saura e Gana-patya (p. 264 et sqq.).

NOTA DO AUTOR B

Devo confessar que mesmo depois de muito tempo e trabalho gastos neste trabalho, estou mais longe do que
nunca de compreender a geografia do itinerário de Samkaracarya como relatado por Ananda-giri e resumido
na nota anterior. Muitos dos nomes não podem ser encontrados em nossos mapas modernos. O único ponto
digno de nota, talvez, seja que Cid-ambara, que é mencionada por Ananda-giri como sendo o local de
nascimento de S’amkara, pode ser Chillumbrum (assim chamada no mapa), um lugar ao sul de Porto Novo. A
narrativa de Madhava é um pouco melhor, mas há dificuldades. Assim, apesar de que seu progresso através
dos países dos Pandyas, dos Colas e dos Dravidas até Kanci, e então para o país dos Andhras, pode ser
entendido, por que ele iria tão longe quanto o país dos Vidarbhas – identificado com Berar e então voltar aos
distritos Karnáticos? O que segue, entretanto, não é muito difícil de entender. Podem, talvez, ser dignos de
menção alguns dos nomes que foram identificados. Este conhecimento pode não ser novo aos que estudaram
o assunto, mas pode sê-lo para os que não mergulharam nele como eu. Mahismati é mencionada em Raghu-
vamsa (VI, 43) como situada em Narmada. Também é mencionada em Magha (II, 64) como sendo a cidade
de Sisu-pala, e foi identificada no recente dicionário do Sr. Garret como Chuli Maheshwar. O país Pandya
abrange os distritos de Tinnevelly e Madura; o país Cola é a costa de Coromandel, ao sul de Godavari e ao
leste das colinas de Nandidurg (Elphinstone, India, 5ª ed., p. 239); o país Dravida fica nas cercanias de
Madras até Bangalore, ao oeste (Elphinstone, p. 231). O país Andhra fica perto de Warangal e faz parte de
Telingana. O país dos Vidarbhas é Berar; o dos S’ura-senas é Mathura; o dos Karma-rupas é o leste do
Hindustão; o dos Videhas é Mithila; dos Kosalas, Oudh; dos Angas, o nordeste de Bebgala. Indra-prastha é
perto de Delhi. A situação provável de Cid-ambara já foi citada, e a de Shrngeri é bem conhecida. Não pude
encontrar Sasala-grama, mencionada acima. Não pode ser "Salla-grama" na província de Mysore; ou, talvez,
a que chamamos "Sosilly", no Atlas de Cassel, também situada na mesma província? Quanto à Kalati
mencionada por Madhava, não posso dizer nada. Posso acrescentar aqui que me parece muito provável que
Madhava não considere Shrngeri como o local de nascimento de S’amkara, pois em XIV, 29, ele faz S’amkara
deixar Shrngeri a fim de ver sua mãe em seus últimos momentos, e então é descrito como que voando pelo
espaço, enquanto que ela mesma, pois nada indica o contrário, continuava permanecendo na cidade de seu
nascimento, onde ele a havia entregue aos cuidados de parentes.

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