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Licenciatura em Cinema
ESTC
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Cláudia Gerbman, na introdução do livro Melodies / Narrative
Film desenvolve uma problemática em torno da função da música
no filme. O porquê de existir música e o facto desta “não ser
ouvida” pelo espectador. Neste filme esse síndrome é desde logo
contrariado: a diegese da música torna-se num elemento
preponderante, aliás, a imagem serve a música já que enquadra os
auscultadores de Danny referindo assim a importância da música na
acção enquanto caracteriza a personagem. O genérico marca uma
ruptura com o carácter histórico do prólogo, a música evolui de
forma a que o ambiente se transforme, aproxima-se de uma
musicalidade reconhecível até culminar na música presente na
cena. É impossível que não seja dada uma importância ao que
estamos a ouvir quando entramos definitivamente na narrativa
principal, até porque o volume da música sobe e desce conforme a
distância a que, por exemplo, o professor está de Danny.
Somebody to love afirma-se na narrativa exactamente porque faz
parte dela, em vez de a pontuar adiciona-lhe significados
fundamentais. Ser esta ou outra música é uma questão de primeira
ordem, o facto de o álbum que está a ser ouvido ser o Surrealistic
Pillow relaciona-se com uma ideia de subversão e de “novo” que
tanto existe na banda com em Danny (repare-se que na série
Sopranos acontece alguma coisa de semelhante com esta banda:
localiza uma memória temporalmente, caracteriza a personagem e
uma época. É um marco principalmente para quem cresceu com
ela). Ao ser caracterizado o gosto musical da personagem é nos
caracterizado a sua personalidade, irreverente e relacionado com
esse tal novo, com um desprendimento de uma cultura demasiado
tradicional e uma relação com as novas formas de música que
estavam a aparecer . Ou seja, se a música fosse outra não era o
mood da cena que mudava, era a personagem.
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A montagem paralela tem muito peso ao longo de toda a
narrativa, sendo que os segmentos simultâneos podem ter uma
relação ou não: se têm normalmente marcam-se e significam o
acaso, a falta e impossibilidade de respostas que confiram um
sentido á vivência de Larry. A cena anteriormente referida é cortada
com Larry a fazer exames médicos, o barulho típico das máquinas
adquire uma força quase musical que reforça uma ideia de tensão
entre os dois segmentos que acaba por contrapor o comportamento
real de Danny e a ideia de daí a duas semanas este irá ser Bar
Mitzvahed, ou seja, irá passar para a idade adulta. Culmina nos
alunos a acordarem da aula, numa pequena revolta contra o
professor. A verdade é que por os exames de Larry estão filmados /
montados e sonorizados desta forma tensa o espectador duvida que
esteja realmente tudo bem, o que se confirma pelo telefonema do
médico no final do filme.
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acontecer: a revelação de Judith face a Sy e ao divórcio. A vida do
protagonista está definitivamente destabilizada. Durante esta
conversa ouvem-se os grilos bastante bem, quase como se
estivessem dentro de casa: a vida de todos os dias continua na
normalidade excepto para Larry. Começa-se a perceber a solidão do
protagonista pela música, que tem um carácter dramático e cíclico,
que isola o protagonista e confere um tom aos seus olhares.
Impede-nos de rir de certas situações sem que pensemos nelas.
Esta sensação de isolamento evolui com o crescente ambiente de
normalidade: os grilos, o bater á porta da casa de banho da filha do
casal assim como o grito habitual de Arthur “out in a minute”. Para
além de conferir uma espécie de representação do estado de
espírito / consciência de Larry, a música premedita quais vão ser os
elementos que o vão perturbar ou complicar a sua vida. Quando
Larry está a dormir em com a cabeça encostada á mesa, vemos
Arthur pela primeira vez, a beber com dificuldade alguma coisa que
tira do frigorífico. A música está presente nesta primeira
aproximação a uma personagem sem lugar, confusa, solitária e
doente e prolonga-se até á cena seguinte, de manhã quando Larry
chega á escola e recebe dois recados que significam dois
problemas.
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dê a entender o conflito interior da personagem. Ou seja, Larry
tenta ser sério quando tudo parece levantar mais um problema, até
o vizinho do lado. Conseguimos ler a estranheza do olhar e, com a
música, sentimo-lo como perdido e isolado naquele meio já que esta
lhe confere uma singularidade e uma humanidade que nos
aproxima da personagem. É importante pensar que este filme
expõe problemas quotidianos e comuns – é a partir da percepção da
dificuldade de Larry em se manter estável, ponderado e, repito,
sério, que se inicia o processo de empatia entre o espectador e o
filme. Exactamente porque essa dificuldade acaba por ter um
carácter comum e um tanto generalizante. Enquanto Larry está no
telhado a tentar arranjar a antena olha para fora de campo e inicia-
se uma música que dá a entender que o que chamou a sua atenção
é algo de bom / fascinante e, por isso, temos uma interpretação da
sua expressão em função da interpretação inconsciente da música.
Vemos a mulher ao longe, da perspectiva de Larry, mas ouvimos o
cigarro que esta está a fumar muito perto. A personagem torna-se
assim mais presente, envolve-nos como envolveu e fascinou Larry.
O som da sintonização da antena volta um momento antes de Larry
cair, indicando tanto um semi estado de loucura como um êxtase
alucinatório. Esta ideia que marca o final da sequência rima com a
caracterização da personagem de Mrs. Samsky que exerce fascínio
em todos os homens (Arthur, mesmo estando escoltado pela polícia
cumprimenta-a atrapalhadamente). Quando Larry entra em casa de
Mrs Samsky todo o ambiente é sedutor, reinam as cores quentes e a
música diegética é convidativa, sedutora e intimista – “combina”
com o espaço e choca com o tipo de música que Larry costuma
ouvir. O facto de Mrs Samsky começar e oferecer erva não choca
minimamente – até se pode dizer que quase estamos á espera
dalguma coisa deste estilo.
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de ficção cientifica que está a dar numa televisão. De seguida
ouvimos Danny e a irmã aos gritos por causa de 20 dólares. A
câmara afasta e mostra-nos o quarto de Danny, os dois irmãos e,
uns momentos depois, a entrada de Larry. O facto de Danny estar a
estudar com a televisão ligada num filme deste cariz volta a
reforçar uma ideia de desconexão entre os interesses da
personagem e a religião. Os valores religiosos não aparecem a não
ser como uma máscara frágil, que lhe transmitem pouco significado
e que não interferem com a pessoa que ele é. Aliás a cena seguinte
comprova-o: vemo-lo com outro amigo da escola hebraica a
fumarem droga enquanto se ouve uma música de rock psicadélico:
algo muito típico da cultura dos anos 60.
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quando vê Clive na rua. O facto de os dois acidentes terem ocorrido
no mesmo espaço de tempo – outra aspecto dado pela música, que
ajuda a manter o espaço temporal coeso, reforça a ideia de acaso e
aleatoriedade dos acontecimentos e da nossa própria vida. É
escusado procurar respostas para tudo, as coisas acontecem isentas
de um sentido. O facto de lhe telefonarem da Columbia Record
Club a exigir um pagamento (que associamos imediatamente a
Danny) depois do acidente é mais um elemento que reforça a ideia
de exaustão de Larry, que continua a manter-se sério ao mesmo
tempo que é bombardeado com cada vez problemas.
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som reforça a imagem, acompanhando tardiamente mas
genialmente o que já estava explícito. O tratamento sonoro deste
final de segmento vai jogar com o real na medida em que, quando
Larry acorda, ouvimos a máquina completamente exaustiva e
cansativa de Arthur. O descontrolo de Larry aparece com um estado
absolutamente justificado; a insuportabilidade e o cansaço instalam-
se no próprio espectador numa espécie de osmose doentia.
Larry tenta ter uma entrevista com Marska, um Rabino que é
sempre mencionado quase como se fosse um mito. A tentativa não
dá em nada porque como explica a Secretária de Marska este está
muito ocupado a pensar. Quando ela entra para lhe perguntar se
atende ou não Larry vemos o seu escritório, que parece uma sala de
um mágico, o que combina com o seu aspecto. Ouve-se o relógio e
os passos reverberantes e pesados da Secretária – tudo combina
para a irrealidade do lugar, desde o silêncio pesado e místico do
escritório (onde o espectador não entra) até á voz masculina
daquela mulher. O que acontece é qualquer coisa como uma
ridicularização da inacessibilidade da tradição que, á primeira vista,
parece um forte fechado e não um lugar de apoio. Aliás o próprio
som que é construído no título que apresenta Marshak é em tudo
surreal e mágico.
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“mágica”, indica felicidade, quase como se estivéssemos prestes a
ver um final feliz típico dos filmes infantis. Larry dá dinheiro a Arthur
para que este inicie uma boa vida no Canadá, para onde vai num
barquinho a remos - algo que também só seria possível num filme
que estivesse desprendido do real, o que não é o caso. A música
continua a conferir um carácter maravilhoso ou encantado á cena
até que o vizinho de Larry atira sobre Arthur e o mata, apontando
de seguida para Larry que acorda com um berro.
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quotidiano, esta situação passa a bazer todo o sentido para o
espectador.
Conclusão
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telefone a tocar mas só quando Larry muda a nota de Clive (onde a
música fica pendente num só registo para criar tensão) é que
ouvimos o telefone mais alto sendo que a escala do plano muda e a
música termina. Este toque do telefone é como o culminar da
tensão e, por isso, o espectador consegue não estar á espera de
nada de bom. O espaço da acção muda novamente para a escola,
onde os alunos já estão no exterior. A música de Larry recomeça
aqui. No entanto, quando o espaço muda outra vez para o escritório
não existe música. Só depois do segundo toque do telefone é que
recomeça. Parece que Larry está em suspenso, sem pensar em
nada mas com medo de atender. Aqui sabemos que os exames que
este havia feito no início do filme revelam algo de mau, ao ponto de
o médico o querer ver imediatamente – a vida de Larry parece não
ter solução. O filme termina com o auscultador de Danny focado e a
somebody to love a tocar, tal como no início, enquanto um
furacão se aproxima. Não me arrisco a tentar encontrar uma
explicação mirabolante para este final, apenas posso corroborar a
minha ideia de que a tradição caiu e o sentido da vida não existe.
Para além disso, sentimos uma espécie de alívio por Larry.
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