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Fisiologia Celular

1º semestre 2021/2022

Aula Prática 2

Cultura de células
Introdução

A fisiologia celular dedica-se a estudar o funcionamento das células, desde os processos sub-celulares
que as mantêm os seus processos à forma como interagem com outras células e com o seu ambiente.
Nesta aula iremos abordar conceitos fundamentais para a utilização de culturas celulares no estudo
da fisiologia das células. Esta é uma das técnicas laboratoriais mais usadas em áreas como a
investigação biomédica, indústria farmacêutica ou análise clínicas.

Bactérias e outros organismos simples podem ser cultivados em laboratório fora do seu ambiente
natural. O mesmo se aplica a células e tecidos de organismo mais complexos como o ser humano.
Culturas celulares são técnicas fundamentais para a investigação biomédica uma vez que
providenciam quantidades virtualmente ilimitadas de material para estudo, com recurso mínimo ao
organismo completo. Estas técnicas permitem também controlar as condições experimentais e
diminuir ao mínimo as variáveis fora de controlo do experimentador. As técnicas de cultura variam
com a complexidade do ambiente natural das células.

Culturas celulares podem ser feitas a partir de células retiradas diretamente de um organismo,
chamadas de culturas primárias, ou usar células provenientes de uma linha celular, como são
exemplo as linha celulares de células cancerígenas. No caso das culturas primárias a divisão celular
ocorre apenas um número limitado de vezes. As linha celulares podem dividir-se um número de vezes
virtualmente ilimitado.

Protocolo

Fig 1. Procedimento usados nas culturas celulares. Adaptado de:


https://www.healthcare.nikon.com/en/ss/cell-image-lab/knowledge/process.html

Para utilização de culturas celulares é essencial seguir regras laboratoriais apropriadas. Caso
contrário, as características das células poderão variar devido a fatores indesejados, comprometendo
totalmente a sua utilização.
Boas práticas de laboratório de culturas celulares

Células para cultura podem ser obtidas através de protocolos de isolamento, no caso das culturas
primárias obtidas a partir de tecido de organismos, ou a partir de bancos células, onde podem ser
armazenadas diversas linhas celulares.

Células em bancos de células encontram-se congeladas. Para serem utilizadas devem ser primeiro
descongeladas (“thawing”) e plaqueadas (“cell seeding”).

Para isolamento de células para culturas primárias a partir de tecidos, podem ser usados 2 tipos de
procedimentos para remover tecido indesejado. Um é o explante, em que parte do tecido é removido
do organismo e cultivado “em si” ou minimamente desfeito. Esta técnica é usada, por exemplo, para
cultivo de retinas e estudo do seu funcionamento mantendo a sua estrutura praticamente intacta
(1). Outra tipo de procedimento para isolamento é o método enzimático, em que são usadas enzimas
proteolíticas para eliminar tecido em excesso mantendo as células que darão origem à cultura.

Descongelamento

Células podem ser criopreservadas a baixas temperaturas. Bancos de células encontram-se em


tanques de nitrogénio líquido ou ultra-congeladores de baixas temperaturas (de -80 °C a -150 °C).

1. Remover stock de células do banco de células e colocar num recipiente de transporte


com nitrogénio líquido
2. Trazer para a bancada e descongelar num banho a 37 °C
3. Antes de gelo estar completamente derretido, adicionar meio de cultura por forma a
diluir solução de criopreservação (e.g. DMSO)
4. Precipitar células por centrifugação
5. Remover sobrenadante
6. Adicionar meio fresco, previamente aquecido a 37 °C
7. Re-suspender células com pipeta
8. Contar concentração de células usando microscópio e contador de células

Contagem de concentração de células

O método mais comum e acessível para realizar a contagem de células é a utilização de um


hemocitómetro. O hemocitómetro mais utilizado é a câmara de Neubauer (Fig. 2). Embora
originalmente utilizada para contar eritrócitos e leucócitos em sangue, pode ser usada para contar
virtualmente quaisquer partículas visíveis ao microscópio ótico.
Fig. 2. Câmara de Neubauer. Adaptado de: https://laboratoryinfo.com/manual-cell-counting-
neubauer-chamber/

A câmara de Neubauer consiste numa lamela de vidro com 2 regiões quadradas de contagem
graduadas (Fig. 3). Estas regiões de contagem têm uma área de 3 mm2 e estão divididas em 9
quadrados grandes de 1 mm2 de área. O quadrado grande central está dividido em 25 quadrados
intermédio por linhas duplas e triplas, e pode ser observado por completo com uma magnificação de
10x. Cada um dos 25 quadrados está dividido em 16 quadrados pequenos por linhas simples, cada
um com uma área de 1/400 mm2. A câmara contém ainda uma lamela de cobertura quadrada com
22 mm de lado. Esta lamela cobre a região central da câmara e cria uma distância de 0.1 mm entre a
lamela e a região graduada da câmara (Fig. 3).

Fig. 3. Dimensões da câmara de Neubauer. Adaptado de: https://laboratoryinfo.com/manual-cell-


counting-neubauer-chamber/

Método de contagem de células com câmara de Neubauer

Contagem é feita com quadrado central ou quadrados nos cantos conforme o tamanho dos objetos
a contar. Os passos gerais para contagem são:
1. Amostra deverá ter uma concentração células dentro da gama compatível com a câmara,
geralmente entre 250000-2.5x106 células / ml. Diluir ou concentrar suspensão de forma
a obedecer a este intervalo
2. Limpar câmara e lamela com EtOH 70%
3. Colocar lamela na zona central da câmara e colocar câmara numa superfície plana
4. Com uma micropipeta, recolher 20 µL de suspensão, encostar pipeta à borda da lamela
e expelir suspensão lentamente até toda a câmara estar preenchida. Capilaridade leva
suspensão a preencher a câmara. Não encher câmara excessivamente!
5. Colocar câmara na platina do microscópio ótico. Usando magnificação apropriada, focar
linhas e células simultaneamente
6. Contar células na área de uma divisão da câmara apropriada ao seu tamanho. Contar
células que estão dentro da área e que tocam nas linhas limites da área à esquerda e
cima. Não contar as que tocam na linhas limites da área à direita e baixo (Fig. 4)

Fig. 4. Exemplo de área de contagem de células. Adaptado de: https://laboratoryinfo.com/manual-


cell-counting-neubauer-chamber/

Cálculo de concentração de células

Concentração de células na amostra é calculada pelo número de células contadas numa determinada
área da câmara, uma vez que as áreas graduadas correspondem a um volume exato de suspensão
(sabemos altura da câmara e dimensões das divisórias).

Eq. 1 – Fórmula para concentração de células dada número de células contadas, dimensões da
câmara e fator de diluição da suspensão

Fator de diluição (Dil.) é contabilizado se a suspensão foi diluída ou concentrada antes de aplicar na
câmara. Relembrar que 1 mm3=1 µL

Plaqueamento

Cultivo começa com uma concentração de células específica. Deve calcular-se a quantidade de meio
necessária para atingir concentração alvo. Para tal deve ter-se em conta concentração medida do
stock, volume do recipiente em que será feita a cultura, concentração alvo para iniciar cultura. Após
este cálculo, diluir suspensão de células stock e plaquear no recipiente de cultura.
Observar Células

Após células serem plaqueadas no recipiente, usar microscópio ótico para confirmar os seguintes
parâmetros das células:

1. Verificar viabilidade celular


2. Confirmar distribuição homogénea das células pelo recipiente
3. Confirmar a ausência de objetos indesejados
4. Verificar morfologia celular

Após esta confirmação, colocar recipiente de cultura numa incubador de CO 2 humidificada e a 37 °C,
por forma a manter condições de humidade, pH e temperatura ideais para a viabilidade e
crescimento da cultura. Dá-se início à cultura celular.

Da cultura celular à passagem

1 ou 2 dias após o plaqueamento, as células são observados no microscópio ótico de modo a:


1. Confirmar a ausência de objetos indesejados
2. Determinar se a cultura está a crescer normalmente verificando a morfologia celular

Troca de Meio

Com o crescimento da cultura celular ocorre também o consumo dos nutriente e aumento de
metabolitos celulares no meio de cultura. Este meio terá de ser trocado com regularidade para
manter condições ótima de cultura. Para troca de meio:
1. Retirara cultura da incubadora
2. Verificar visualmente se cultura está normal
3. Pre-aquecer novo meio a 37 °C
4. Retirar meio velho do recipiente de cultura e deixar uma pequena quantidade para que
células continuem imersas
5. Adicionar novo meio
6. Novamente verificar visualmente se cultura está normal
7. Voltar a colocar cultura na incubadora

Passagem

Com a proliferação de células na cultura estas terão de ser divididas e colocadas num novo recipiente
antes que o recipiente original fique cheio. A este processo chama-se passagem. O grau de
preenchimento do recipiente de cultura chama-se grau de confluência (Fig. 5), de um recipiente
totalmente preenchido por uma cultura diz-se confluente. Deve realizar-se uma passagem quando o
grau de confluência chega aos 70-80%. Quando um cultura se torna confluente, o contacto entre
células pode levar a que parem de se dividir, processo chamado de inibição por contacto. Células
poderão até deixar de proliferar após a passagem. No caso de células cancerígenas a proliferação
continua após confluência mas nutrientes no meio começarão a escassear. Métodos de passagem
variam conforme a cultura seja de células suspensas no meio ou aderidas à superfície do recipiente
de cultura.
Fig. 5. Vários graus de confluência de uma cultura celular. Adaptado de:
https://www.mirusbio.com/transfectopedia/methods

Passagem de células em suspensão

1. Recolher suspensão para outro recipiente e centrifugar para separar células do meio
2. Remover sobrenadante, deixar pellet de células e re-suspender em meio fresco
3. Recolher parte desta suspensão, adicionar trypan blue e contar número de células
4. Calcular concentração de células e efetuar diluição para concentração desejada numa
nova suspensão
5. Colocar suspensão em novo recipiente de cultura

Passagem de células aderentes

Ver protocolo experimental a realizar nesta aula

Preparação de stocks de culturas celulares

Stocks de culturas celulares são amostras da cultura crio-preservadas, disponíveis para mais tarde
voltarem a produzir novas culturas. É importante manter stocks pois as características das células em
cultura poderão diferir das células originais ao longo do tempo e com a realização de várias passagens
sucessivas. Passos gerais do procedimento são:

1. Verificar células ao microscópio ótico:


a. Confirmar a ausência de objetos indesejados
b. Confirmar que cultura está sub-confluente
c. Verificar morfologia celular normal
2. Recolher células para stock usando procedimento de passagem acima descrito
3. Re-suspender células num volume abaixo do que seria utilizado para passagem
4. Contar número concentração de células com recurso ao microscópio ótico
5. Ajustar suspensão para concentração desejada e adicionar solução de criopreservação.
Re-suspender com pipeta
6. Enquanto se pipeta constantemente, distribuir suspensão por criotubos (volume de
acordo com dimensões do criotubo)
7. Criotubo é colocado numa ultra-congeladora (-80 °C) ou num tanque de armazenamento
com nitrogénio líquido
8. Confirmar que células stock proliferam e mantêm as mesmas características que células
originais. Descongelar 1 ou 2 tubos congelador e realizar cultura

Quando necessário começar experiências, descongelar stocks preparados e realizar culturas. Após
um certo período de cultura, as células devem ser descartadas e novo stock utilizado. A confluência
desejada varia com a experiência a realizar.
Dimensões dos recipientes de culturas mais comuns (Adaptado de:
https://www.corning.com/catalog/cls/documents/application-notes/CLS-AN-209.pdf)

Tabela 1. Corning Multiple Well Plates

Placa (n de Diâmetro do Área de Número de Volume Volume de


poços) poço (fundo) crescimento células total por trabalho
(mm) aprox. (cm2) médio poço (mL) (mL)

6 34.8 9.5 9.5 x 105 16.8 1.9-2.9

12 22.1 3.8 3.8 x 105 6.9 0.76-1.14

24 15.6 1.9 1.9 x 105 3.4 0.38-0.57

48 11.0 0.95 9.5 x 104 1.6 0.19-0.285

Tabela 2. Pratos Corning

Placas de Área de Número de Volume


Petri crescimento células médio recomendado por
aprox. (cm2) poço (mL)

35 mm 9 9 x 105 1.8-2.7

60 mm 21 2.1 x 106 4.2-6.3

100 mm 55 5.5 x 106 11-16.5

150 mm 152 1.52 x 107 30.4-45.6

245 mm 500 5.0 x 107 100-150


Tabela 3. Frascos Corning

Frasco Área de Número de Volume Volume total do


crescimento células recomendado frasco aprox.
aprox. (cm2) médio por poço (mL) (mL)

25 cm2 25 2.5 x 106 5 - 7.5 70 retangular

75 cm2 75 7.5 x 106 15 - 22.5 265 forma de U

150 cm2 150 1.5 x 107 30 - 45 377 forma de U

175 cm2 175 2.25 x 107 35 - 52.5 513 forma de U

225 cm2 225 1.72 x 107 45 - 67.5 1006 tradicional


Protocolo experimental

Nesta aula iremos realizar uma passagem de células que permite preparar culturas celulares com
confluência menor a partir de culturas com confluência já relativamente maior. As culturas
preparadas podem ser usadas para qualquer outro procedimento experimental.

Equipamentos e soluções

Câmara de fluxo laminar estéril


Banho de aquecimento
Pipetas e aspirador de meio estéril
Pipetas de Pasteur estéreis
Micropipetas e pontas estéreis
Incubadora de células a 37ºC
Frascoc T-25 com células HEK293
Centrífuga de Falcons de 15 mL
Hemocitómetro – Câmara de Neubauer
Microscópio de luz visível

Meio de cultura com e sem FBS


Meio de dissociação com tripsina
Trypan Blue

Passagem de células aderentes

Antes de passar este tipo de cultura, as células têm de ser destacadas da superfície. Para tal aplicam-
se protéases como colagenase, dispase ou tripsina. No caso da tripsina, esta enzima é inibida por iões
de cálcio e magnésio. É portanto necessário substituir o meio de cultura que contenha estes iões.

Passos gerais do procedimento são:

1. Aquecer meio de dissociação e cultura num banho a 37ºC


2. Remover meio de cultura velho do frasco
3. Adicionar rapidamente 1 mL de meio de dissociação sem deixar que cultura seque
4. Estabilizar cultura à temperatura de atividade da enzima, por um período de tempo
necessário à reação enzimática. Neste caso colocar frasco de volta na incubadora durante 4
minutos.
5. Adicionar 2 mL de meio de cultura novo
6. Auxiliar o destacamento de células do recipiente com pancadas leves
7. Pipetar meio várias vezes para dissociar células e obter suspensão de células
individualizadas
8. Verificar destacamento ao microscópio ótico
9. Recolher suspensão para tubo, precipitar com recurso a centrifugação, remover
sobrenadante (que contem enzimas e solução stop)
10. Aplicar leves pancadas no tubo para destacar pellet
11. Adicionar meio fresco ao tubo
12. Recolher amostra da suspensão e contar número de células. Neste passo poderá ser usada
marcação por Trypan Blue para verificar a número de células viáveis.
13. Calcular concentração de células e efetuar diluição para concentração desejada numa nova
suspensão
14. Colocar suspensão em novo recipiente de cultura (no caso deste trabalho experimental será
no mesmo recipiente)
15. Verificar características da cultura ao microscópio ótico
16. Transferir novo recipiente de volta para incubadora

Protocolo para marcação com Trypan Blue

1. Uma vez obtida suspensão de células adicionar 10 µL de Trypan Blue (previamente


preparado) a 10 µL de suspensão de células
2. Colocar 10 µL desta mistura na câmara de Neubauer
3. Contar células não azuis (células mortas serão marcadas e ficarão azuis)
4. Calcular número de células vivas (lembrar usar fator de diluição da contagem 1:2)

Bibliografia

1. Caffé AR, Ahuja P, Holmqvist B, Azadi S, Forsell J, Holmqvist I, Söderpalm AK, van Veen T.
Mouse retina explants after long-term culture in serum free medium. J Chem Neuroanat.
2001 Nov;22(4):263-73. doi: 10.1016/s0891-0618(01)00140-5. PMID: 11719023.
2. Alberts B., Johnson A., Lewis J., Raff, Roberts K., and Walter P. (2002) Molecular Biology of
the Cell. Taylor & Francis Group, New York. 4th edition. pp. 624-625.
3. Lodish H., Berk A., Matsudaira P., Kaiser C.A., Krieger M., Scott M.P., Zipursky S.L., and
Darnell J. (2004) Molecular Cell Biology. W.H. Freeman and Company, New York. 5th edition.
pp 256-257.
4. Nelson D.L., and Cox M.M. (2005). Lehninger Principles of Biochemistry. W.H. Freeman and
Company, New York. 4th edition. pp 398-400.
Introdução

A mitocôndria é um grande organelo onde ocorre o processo de oxidação fosforilativa nas células
eucarióticas. A maioria das células eucarióticas contem uma grande quantidade de mitocôndrias.
Estes organelos têm a capacidade de se fundir e dividir e ocupam cerca de 25 % do volume do
citoplasma. O número de mitocôndrias numa célula é regulado pela necessidade de produção de
ATP. É o caso de células na mucosa do estômago que necessitam de uma grande quantidade de ATP
para produzir secreções ácidas. A mitocôndria é também responsável pela biossíntese de vários
metabolitos. Ocorre transporte ativo de metabolitos e seus percursores para dentro e fora da
mitocôndria. Um deste metabolitos é o grupo heme, essencial para a função da hemoglobina. Outras
moléculas produzidas pela mitocôndria são pequenas moléculas orgânicas, como citrato, isocitrato,
malato ou ácido alfacetoglutárico, que são usadas pela célula para sintetizar NADPH e acetil CoA, ou
outros percursores para biossíntese extra mitocondrial de moléculas como glutationa, purinas,
ácidos gordos ou colesterol.

A mitocôndria tem a capacidade de se fundir com outras mitocôndrias ou de se dividir e dar origem
a novas mitocôndrias individuais. Podem também ramificar-se, extender-se ou retrair-se. Foi
demonstrado que estes fenómenos estão associados à manutenção da função mitocondrial,
adaptação às necessidades energéticas da célula e à morte celular. A mitocôndria está também ligada
ao citoesqueleto da célula e pode ser transportada para regiões da célula com maior necessidade
energética. Por fim, a célula tem a capacidade de eliminar mitocôndria através de processos de
autofagia, também chamados de mitofagia. Nesta aula iremos observar mitocôndria dentro de
células modelo usando um corante fluorescente que marca especificamente mitocôndrias.

Fig. 1 - Exemplo de mitocôndrias marcadas com Mitotracker (a vermelho) numa célula endotelial da
artéria coronária. Núcleo celular marcado a azul. Magnificação de 63 x.

O MitoTracker Vermelho CMXRos é um corante vermelho fluorescente que cora mitocôndrias em


células vivas e a sua acumulação depende do potencial da membrana. Utilizaremos também o
corante fluorescente Hoechst 33258 que marca especificamente o núcleo celular. O objectivo de usar
estas duas marcações é de ter a capacidade de delinear e contar células aos mesmo tempo que
analisamos as suas mitocôndrias. Quando forem utilizados mais do que um corante fluorescente na
mesma preparação, como iremos fazer nesta experiência, deve verificar-se previamente que os
espectros de emissão ou fluorescência destes corantes não se sobrepõe. Caso contrário o sinal
observado será um mistura da fluorescência dos dois corantes, e torna-se difícil ou até impossível de
distinguir estruturas marcadas.

Fórmula molecular: C32H32Cl2N2O


Peso Molecular: 531.5236 g/mol

Fig. 3 - Estrutura química do corante fluorescente MitoTracker CMXRos e espectro de absorção (a


azul) e fluorescência ou emissão (a vermelho) da molécula.

Fórmula molecular: C25H37Cl3N6O6


Peso molecular: 623.96 g/mol

Fig. 4 - Espectro de absorção (a vermelho) e fluorescência ou emissão (a azul) da molécula de


Hoechst 33258.
Equipamentos e soluções

Células HEK293 plaqueadas em Multi-well 24


Incubadora de células estéril
Câmara de fluxo laminar estéril
Lamelas de 18 mm de diâmetro
Lâminas de microscópio
Microscópio de fluorescência

PBS 1x
PFA 37% para diluir
Meio de cultura
Acetona
Meio de montagem Vectashield Headset

Protocolo Experimental

1. Cultivar células em lamelas dentro de uma placa de 24 poços usando os meios apropriados

2. Quando as células tiverem atingido a confluência desejada (50-80%), remover o meio de cada
poço e adicionar a solução de coloração de sonda pré-aquecida (37°C): 200 nM Mitotracker
em DMEM sem FBS (de um stock de 200 µM).

3. Enquanto os tempos de incubação variam dependendo do tipo de células e da sonda utilizada,


a incubação durante 30 minutos é geralmente suficiente.

4. Após a coloração estar completa, substituir a solução de coloração por meio fresco pré-
aquecido ou tampão e proceder à sua fixação.

5. Fixação das células. Remover cuidadosamente o meio/ tampão que cobre as células, e
substituí-lo por tampão ou meio de crescimento pré-aquecido, recentemente preparado,
contendo 4% PFA em meio de crescimento completo a 37°C durante 15 minutos.

6. Lavagem das células. Após a fixação, lavar a lamela com as células 3 vezes em tampão PBS.

7. Permeabilização. Incubar as células em acetona gelada (armazenada a 20ºC) durante 5


minutos, e depois lavá-las em PBS. Mesmo quando as células não são marcadas com um
anticorpo, esta etapa de permeabilização com acetona pode ser útil para melhorar a relação
sinal/fundo.

8. Cuidado para saber em que lado estão as células! Remover a lamela e montar numa lâmina
para observar ao microscópio. Para montar a lamela, deve ser colocado 25 uL de Vectashield
Headset sobre a lamina e com cuidado, baixar a lamela sobre a gota.

9. Observar as células utilizando um microscópio de fluorescência.


Bibliografia:

1. Alberts B., Johnson A., Lewis J., Raff, Roberts K., and Walter P. (2002) Molecular Biology of
the Cell. Taylor & Francis Group, New York. 4th edition. pp. 624-625.
2. Lodish H., Berk A., Matsudaira P., Kaiser C.A., Krieger M., Scott M.P., Zipursky S.L., and
Darnell J. (2004) Molecular Cell Biology. W.H. Freeman and Company, New York. 5th edition.
pp 256-257.
3. Nelson D.L., and Cox M.M. (2005). Lehninger Principles of Biochemistry. W.H. Freeman and
Company, New York. 4th edition. pp 398-400.
4. Galloway CA, Lee H, Yoon Y. Mitochondrial morphology-emerging role in bioenergetics. Free
Radic Biol Med. 2012;53(12):2218-2228. doi:10.1016/j.freeradbiomed.2012.09.035
Fisiologia Celular

1º semestre 2021/2022

Aula Prática 3 - Determinação da Atividade da Na+,K+-ATPase


Introdução

Neste trabalho introduz-se a técnica eletrométrica utilizada com a finalidade de estudar a actividade

da Na+,K+-ATPase em sinaptossomas isolados do cérebro de rato. A actividade da Na+,K+-ATPase é

acompanhada pela libertação de H+ no meio de reacção que se reflecte na diminuição do pH da


suspensão de sinaptossomas. A técnica electrométrica, por utilização do eléctrodo de pH conectado
a um registador apropriado, constitui um método rápido e simples que fornece o registo contínuo da
+
libertação dos H no meio. Assim, esta técnica constitui um importante método para o estudo da
+ +
actividade enzimática da Na ,K -ATPase.

A Na+,K+-ATPase

+ +
O exemplo mais clássico de transporte activo primário é a bomba de sódio e potássio (ou Na ,K -
ATPase), existente na membrana plasmática de todas as células animais. Esta ATPase transporta três
iões sódio para fora da célula ao mesmo tempo que transporta dois iões potássio para dentro da

célula (sistema antiporta Na+/K+) contra os respectivos gradientes iónicos. A enzima contém um sítio
com a capacidade para catalisar a clivagem de ATP (actividade de ATPase) voltado para o lado interno
da membrana.
Fig 1. A Na+,K+-ATPase funciona como um sistema antiporta e é electrogénica uma vez que

transporta 3 Na+ para o exterior e 2 K+ para o interior, contribuindo com cerca de 10% do potencial
eléctrico membranar evidenciado pelas células em repouso (Alberts, 2002).

O funcionamento da Na+,K+-ATPase contribui (em cerca de 10%) para o potencial eléctrico


transmembranar (de cerca de –70 mV) no interior da célula devido ao transporte de um número
desigual de cargas para cada um dos lados da membrana (3 cargas positivas para fora e 2 cargas de

igual sinal para dentro). Por esta razão, a Na+,K+-ATPase diz-se funcionar como uma bomba de iões
electrogénica, o que significa que contribui directamente para a separação de carga através da
membrana.

A importância biológica da bomba de Na+/K+ reflecte-se na manutenção das concentrações de K+ e

Na+ no interior da célula, importante para a manifestação do gradiente eléctrico transmembranar


que é a base para a excitabilidade das células nervosas e musculares, ou seja, a possibilidade de

transmissão dos impulsos nervosos. O gradiente de Na+ mantido pela bomba constitui, por sua vez,
uma importante fonte de energia para outros transportes activos, tais como o transporte de glicose,
aminoácidos e outros nutrientes, para o interior da célula. A manutenção do equilíbrio osmótico

proporcionado pelo funcionamento da bomba de Na+/K+ é ainda crucial para a manutenção do


volume celular, impedindo que a célula se rompa. A manutenção do pH citosólico também está

associado ao funcionamento da bomba de Na+/K+. A importância do funcionamento da Na+,K+-


ATPase é reflectida pelo consumo de cerca de 1/3 do ATP das células animais, chegando a consumir
cerca de 2/3 da energia produzida por células nervosas ou musculares. Dependendo do tipo celular,

existem cerca de 800 000 a 30 000000 unidades da Na+,K+-ATPase na superfície celular. Anomalias
+ +
no número ou no funcionamento da Na ,K -ATPase estão envolvidas em vários estados patológicos,
particularmente na doença cardíaca e na hipertensão.

O mecanismo de acção da Na+,K+-ATPase envolve um ciclo de fosforilação- desfosforilação da enzima


+ +
que alterna entre duas conformações E1 e E2 (ver Fig. 2). Na conformação E1, a Na ,K -ATPase possui

3 locais de ligação para Na+ de alta afinidade e 2 locais de ligação para K+ de baixa afinidade acessíveis
à superfície citosólica da proteína. Após a ligação do Na+ a enzima é fosforilada por ATP e sofre uma

alteração conformacional responsável pela transferência do Na+ através da membrana e sua

libertação no lado de fora. De seguida, o K+ liga-se na face exterior da enzima o que promove a sua
desfosforilação. Por sua vez, a desfosforilação promove o retorno à conformação original da enzima

e a libertação do K+ no interior da célula.

A Na+,K+-ATPase é composta de duas importantes subunidades proteicas “α” e “β”, ligadas não
covalentemente e inseridas nas membrana. A subunidade α (≈ 113 kD) contém os locais importantes
para para a actividade enzimática como o de fosforilação, de ligação de ATP e de ligação da uabaína.
A subunidade β é mais pequena (glicoproteína de ≈ 35 kD) e absolutamente necessária para a
actividade da enzima; parece ser critica para facilitar a localização na membrana plasmática e para a
activação da subunidade α.

Fig. 2. Esquema do ciclo do transporte transmembranar de iões pela Na+,K+-ATPase . O transporte


dos iões ocorre num ciclo de alterações conformacionais aparentemente accionado pela fosforolação

da bomba. Neste esquema simplificado mostra-se apenas um local de ligação para o Na+ e para o K+
(Alberts, 2002).
A Na+,K+-ATPase é inibida especificamente pela uabaína, um fármaco da classe especial dos
glicosídeos cardíacos, que impede a desfosforilação de E2-P ao ligar-se na face exterior da
membrana. A uabaína é um cardiotónico que consta de um açúcar e um esteróide unidos por uma
ligação glicosídica. Os glicosídeos cardíacos são largamente utilizados para aumentar a força de

contracção do coração. A inibição da Na+,K+-ATPase nos miócitos cardíacos promove o aumento

intracelular da concentração de Na+ que, por sua vez, leva ao aumento da concentração intracelular

de Ca++ devido à diminuição da saída do Ca++ pelo trocador Na+/Ca++. O aumento da concentração

intracelular de Ca++ é responsável pelo aumento da contractilidade cardíaca.

Fig. 3. Digitalis purpurea. Os esteróides cardiotónicos são inibidores específicos da Na+,K+-ATPase


usados na prática clínica para combater doenças cardíacas.

Procedimento Experimental

Para a realização das experiências, deve conectar-se um eléctrodo de pH a um electrómetro (pH


meter) apropriado e este a um registador, através de um cabo eléctrico adequado. O eléctrodo de
pH deve ser imerso numa câmara de reacção com manga térmica. A água do banho termostato faz-
se circular pela manga térmica, de modo a manter a temperatura do meio de reacção a 30 °C. A
solução experimental deve ser continuamente agitada por meio de uma pequena barra magnética
movida por um campo magnético giratório de um agitador magnético colocado por baixo da câmara
de reacção.

Na presença de ATP os sinaptossomas transportam Na+ e K+ por um processo dependente da

actividade da Na+,K+-ATPase. Por cada 3Na+/2K+ transportados pelos sinaptossomas, 1 ATP é


hidrolisado. A hidrólise de ATP liberta protões, segundo a equação genérica:

ATP + H2O = ADP + Pi + nH+

Este facto pode ser vantajosamente aproveitado para avaliar cineticamente as reacções de hidrólise
de ATP usando um eléctrodo de pH e registando continuamente as variações de pH do meio de
ensaio.

Para quantificar devidamente os resultados obtidos por esta técnica é, obviamente, necessário
+ +
conhecer a estequiometria H /ATP. A quantidade de H que se produz é função do sistema. A pH

7,0, a hidrólise de 1 mole de ATP corresponde à produção de 0,75 moles de H+.

EQUIPAMENTO E SOLUÇÕES

Electrómetro (pH meter)


Banho termostatizado com circulador de água
Agitador magnético e magnete
Sistema de aspiração por vácuo (para remoção de soluções) Microsseringas (tipo Hamilton)
Micropipetas (tipo Gilson)

Suspensão de sinaptossomas isolados de cérebro de rato ≈20 mg/mL (mantida em gelo)


Meio de reacção: NaCl 128 mM, KCl 5 mM, MgCl2 1,2 mM, EGTA 0,1 mM, HEPES 0,5 mM , pH 7,0.

ATP-Mg 100mM, pH 7,0

Ubaína 20 mM
ENSAIOI. Determinação da actividade enzimática da Na+,K+-ATPase

1. Adicionar 2 mL de meio de reacção à câmara. Coloque a agulha do registador a meio da escala


do papel registador (utilize a caixa compesadora de potencial, se necessário). Ponha a correr
o papel a 2 cm/min e adicione ao meio 10 μL de HCl 10 mM (100 nmoles). Escolha uma escala
(voltagem) de modo a obter uma deflexão de cerca de 20 unidades.
2. Aspire o meio, lave com água desmineralizada e coloque novamente 2 mL de meio de reacção
na câmara de reacção e deixe estabilizar a temperatura.
3. Adicione os sinaptossomas (0,5 mg de proteína), deixe estabilizar o pH.
4. Inicie o movimento do papel.
5. Espere 1 min e comece a reacção adicionando ATP-Mg 1 mM (20 μL de uma solução “stock”
de 100 mM)
6. Deixe correr cerca de 2-4 min e calibre com 2 adições de 100 nmoles de NaOH.
Alternativamente pode calibrar o sistema adicionando 100 nmoles de HCL.

ENSAIO II. Efeito da ubaína

1. Repetir a experiência adicionando previamente 1 mM de ubaína (100 μL de uma solução “stock”


de 20 mM ao meio de reacção. Após adicionar os sinaptossomas espere cerca de 2 minutos antes de
adicionar o ATP.

A DIFERENÇA ENTRE AS ACTIVIDADES MEDIDAS NA AUSÊNCIA E NA PRESENÇA DE UBAÍNA É

TOMADA COMO A ACTIVIDADE DA (Na+,K+)-ATPase.

ENSAIO III. Efeito do DDT na actividade enzimática da (Na+,K+)-ATPase

1. Repetir a experiência adicionando previamente várias concentrações de DDT aos sinaptossomas


previamente adicionados à câmara de reacção. Espere cerca de 2 minutos antes de adicionar o ATP
para iniciar a reacção.
Fig. 4. Registo contínuo da hidrólise de ATP pela fracção sinaptossomal isolada do cérebro do rato.
A diferença entre as actividades medidas na ausência e na presença de ubaína é tomada como a

actividade da (Na+,K+)-ATPase.

A Fig. 4 representa um registo típico de uma experiência em que se mediu a actividade enzimática

da Na+,K+-ATPase com ajuda do eléctrodo de pH.

BIBLIOGRAFIA

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