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MONO – APLICABILIDADE DAS LEIS DE CONTRATAÇÃO EMERGENCIAL DURANTE A

PANDEMIA

- Conceito de Estado e povo;

- A origem da licitação;

- Evolução histórica;

- A licitação na Constituição Federal;

- Lei de Licitação 8.666/93

Princípios da licitação

Modalidades

Critério de Avaliação

- DISPENSA DE LICITAÇÃO (CRITÉRIOS E CARACTERISTICAS)

- EMERGENCIA E CALAMIDADE PÚBLICA

- Lei 13.979/2020; Lei 14.035/2020 e Lei 14.065/2020. (MUDANÇAS NA LEI GERAL DE


LICITAÇÕES E APLICABILIDADE NO PERÍODO EMERGENCIAL DA PANDEMIA)
1. CONCEPÇÕES ACERCA DA RELAÇÃO ENTRE ESTADO E O POVO

Apresentando uma conceituação básica, o Estado corresponde a uma


instituição que governa um povo, em determinado território, sendo também
definido como Poder Político (MARTINEZ, 2013). Assim, o Estado organiza e
governa esse povo, com os principais objetivos de gerenciar e regular a
sociedade de modo geral, proporcionando bem-estar a todos. Nesse sentido,
entende Luiz Eduardo Motta que,

O Estado, portanto, continua exercendo um papel central já que


articula os demais entes da sociedade e do mercado global/local na
criação e na execução de políticas públicas, e, assim, assegurando a
sua governabilidade e governança (MOTTA, 2008, p. 9).

Logo, o Estado possui necessidades básicas a respeito da criação e


execução de políticas públicas cuja finalidade são o bem comum, motivo no
qual, exerce esse papel central e articulador de diversas estruturas
institucionais dentro da sociedade, devendo preservar um equilíbrio nos
campos jurídico, político, econômico e moral.
Diante dessa concepção, uma vez que o Estado trabalha para garantir
as necessidades básicas do povo, e mediante a grande complicação
proporcionada pela expansão da população e a administração complexa
dessas diversas estruturas institucionais, o governo se torna obrigado a manter
um equilíbrio geral desses campos e vê a precisão de intervir através do erário
público.
Em razão da necessidade de se fazer presente entre os governados, o
Estado, que é um só poder, no Brasil, divide suas atribuições e funções entre
três poderes, com um fim em comum, otimizar as atividades essenciais do
próprio Estado. São esses poderes, o Legislativo, que possui a função
normativa, o Executivo, com a atribuição administrativa e, por fim, o Judiciário,
no exercício da jurisdição.
Assim, todas as ações realizadas pelo Estado, conforme
supramencionado, possuem um único fim, garantir as necessidades básicas do
povo que o constituiu. Nessa lógica, infere-se que o conceito de Estado e povo
estão intimamente ligados, considerando que um dá base ao outro. Nesse
sentido, Débora da Silva Roland, aponta que,

Não há povo sem organização política, assim como não há


organização política sem povo, pois ambos têm a mesma origem.
Assim, povo é a dimensão humana do Estado, e a dinâmica entre
povo e Estado é tão íntima que é possível afirmar que o povo não
subsiste sem a organização e o poder do Estado, de forma que
inexistindo um ou outro, levaria ao desaparecimento do povo. Assim,
o Estado nasce desta comunidade que irá se transformar em povo,
convertendo-se em razão de ser do Estado; (ROLAND, 2004)

Mediante essa concepção, cabe ao Estado planejar a sua organização


financeira e orçamentária para gerenciar e atender as necessidades do povo
da melhor maneira possível. Considerando as palavras de Hely Lopes
Meirelles,

A Administração Pública, por suas entidades estatais - União,


estados, territórios, Distrito Federal e municípios - e autárquicas,
realiza obras e serviços públicos, faz compras e aliena bens. Para
essas atividades precisa contratar, mas os seus contratos dependem
de um procedimento seletivo prévio, que é a licitação (MEIRELLES,
1971, p.14).

Portanto, nesse cenário, apresenta-se como uma das formas utilizadas


pelo Estado para controle dos seus gastos destinados à manutenção dos
programas públicos, o procedimento licitatório.

2. DEFINIÇÕES BÁSICAS: ORIGEM DA LICITAÇÃO, ASPECTO


CONCEITUAL E NATUREZA JURÍDICA.

Segundo Truran (2020, p. 1, apud PEZENTE, 2020, p.13), o processo de


licitações teve seu início na Europa Medieval, na idade média, onde se utilizava
o sistema chamado de “Vela e Prego”.
O denominado sistema, assim se chamava, pela sua característica na
qual consistia-se em apregoar a obra desejada, enquanto se acendia uma vela
e a esperava apagar. Nesse período, os interessados ofertavam lances e
quando a chama se apagava, era vencedor quem até então ofertara o menor
preço.
Assim, o objetivo do Estado era procurar outra pessoa para prestar o
serviço necessário a ele, porém com vantagens econômicas, visto à abertura
para disputa entre interessados.
Conforme preleciona Amorim (2020, p. 23), o termo “licitação” deriva da
expressão latina licitatione, que significa “arrematar em leilão”, apresentando
sinônimos como “procedimento licitatório”, “certame”, “prélio”, “disputa”, entre
outros. (apud SILVA, 2007, p. 1.075).
Vários são os doutrinadores que conceituam o termo licitação, todos
eles, claro, proporcionando entendimentos através de visões diferentes, mas
sempre considerando a necessidade principal do atendimento aos anseios do
Estado e a busca pela oferta mais vantajosa de um terceiro.
Hely Lopes Meirelles (1971, p. 16) conceitua a licitação como sendo um
procedimento administrativo através do qual a Administração Pública escolhe a
proposta mais vantajosa dentre as opções para contratar a partir de seu
interesse.
Destacando o entendimento doutrinário de Bandeira de Mello, pode-se
inferir um conceito prático de “licitação”, que se refere à forma do ente
governamental promover tratativas, através de contrato administrativo para a
aquisição de bens ou prestação de serviços por terceiros, uma vez que o
mesmo atenda todas as estipulações do ente público e se apresente como
meio mais vantajoso. Segundo suas palavras:

procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental,


pretendendo alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou
serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de
uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipuladas
previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a
fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de
parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados (MELLO,
2009, p. 519, apud AMORIM, 2017, p. 21).

Nessa mesma vertente, o autor Victor Amorim tece comentário ao


entendimento levantado por Bandeira de Mello quanto ao conceito de licitação,
demonstrando a sua concordância e adequabilidade ao propósito do
procedimento licitatório. Conforme preleciona:

Vale observar que o conceito de Bandeira de Mello é adequado, pois


contempla todas as espécies de tratativas possíveis a serem
realizadas pela Administração e formalizadas mediante contrato
administrativo: aquisição de bens, contratação de serviços, alienação
de bens móveis e imóveis, concessões de serviços públicos,
permissões de uso de bem público, entre outras pretensões
contratuais. Ou seja, sempre que a Administração pretende realizar
uma contratação (de qualquer espécie), em regra deve realizar
procedimento licitatório (AMORIM, 2017, p. 21).

Válido ressaltar o entendimento do Tribunal de Contas da União (2010,


p. 19), no qual conceitua a Licitação como procedimento formal em que a
Administração Pública convoca, por meio de condições próprias estabelecidas
em ato específico, a exemplo o edital ou convite, empresas interessadas em
oferecer bens e serviços. Ademais, afirma que, a licitação possui princípios que
devem ser observados, os fundamentos do processo licitatório devem respeitar
e se submeter aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência.

Licitação não será sigilosa, exceto quanto ao conteúdo das propostas


até serem conhecidas. São públicos e acessíveis aos cidadãos os
atos do respectivo processo. Será efetuada sempre no local onde se
situar a repartição interessada, salvo por motivo de interesse público,
devidamente justificado (TCU, 2010, p.19).

Por fim, cabe enfatizar também, que o sistema licitatório se desenvolveu


por várias partes do mundo durante as épocas, mediante as peculiaridades de
cada Estado, por meio de procedimentos e normas específicas, mas todas com
o mesmo fim em comum, atender os interesses do Estado por meio de
benefícios econômicos ao mesmo.
Conseguinte a este tópico, será realizada uma explanação em referência
a evolução histórica da licitação no contexto brasileiro.

3. CONTEXTO HISTÓRICO DA LICITAÇÃO NO BRASIL

No campo do direito administrativo, grande relevância possui a licitação.


Contudo, deve-se inferir que no Brasil, a utilização do procedimento licitatório
não se instaurou a partir do ano de 1988, quando na Constituição da República
Federativa, o tema das licitações e contratos administrativos foram tratados de
forma direta. Estabelece a Constituição Federal, em seu artigo 37, inciso XXI, a
obrigatoriedade da Administração Pública em licitar. A história da licitação em
terras brasileiras, remete a séculos atrás.
A evolução dos procedimentos licitatórios no Brasil decorre de muitos
períodos, nos quais, a cada um deles, as licitações se moldavam conforme as
necessidades, as atualidades e oportunidades da época.
Entende-se que no Brasil, a primeira norma de licitações foi editada na
época do Império, através do Decreto n. 2.926 de 14 de maio de 1862, que
aprovou o regulamento para as “arrematações dos serviços” que ficavam a
cargo do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.
Lima (2014), afirma que este Decreto, composto de 39 artigos e
assinado pelo então Ministro Manoel Felizardo de Souza e Mello e rubricado
pelo imperador Pedro II, é considerado a primeira norma legal sobre licitação
no Brasil.
Conforme se extrai do art. 1º do Decreto n. 2.926 de 1862, in verbis,

DO PROCESSO DAS ARREMATAÇÕES.


Art. 1º Logo que o Governo resolva mandar fazer por contracto
qualquer fornecimento, construccão ou concertos de obras cujas
despezas corrão por conta do Ministerio da Agricultura, Commercio e
Obras Publicas, o Presidente da junta, perante a qual tiver de
proceder-se á arrematação, fará publicar annuncios, convidando
concurrentes, e fixará, segundo a importancia da mesma
arrematação, o prazo de quinze dias a seis mezes para a
apresentação das propostas. (BRASIL, 1862)
:
As principais características do Decreto 2.926/1862 referem-se às
orientações quanto a exposição das amostras dos objetos e serviços aos
interessados, a necessidade da figura do fiador ou prestação de caução para
assinatura do contrato, a publicidade e prazos para apresentação das
propostas.
Terminado o prazo do anúncio, no dia e hora designado, os
concorrentes deveriam aparecer em local determinado. Ali eram inscritos em
um livro, onde participavam de um sorteio por número, estabelecendo a ordem
para ofertarem suas propostas. Ao fim do sorteio, e conforme a ordem definida,
os concorrentes em suas posições, tinha o direito de ofertar sua proposta em
voz alta, perante todos os outros, que deveriam se manter em silêncio
aguardando o seu momento, sendo que o valor ofertado era escrito no livro, no
qual era lido em voz alta e depois assinado pelo membro da junta, o
concorrente e seu fiador.
O chamado Presidente da junta, definia um tempo específico para
apresentação das propostas, que quando encerrado, passar-se-ia ao exame de
todas as propostas e documentos dos concorrentes para julgar a mais
vantajosa, sendo ao fim lavrada uma ata a partir da qual o Ministro da
Agricultura, Comércio e Obras Públicas adjudicaria ao vencedor. É válido
enfatizar que, tal procedimento licitatório, se parece muito ao Pregão
Presencial nos dias atuais.
Sobre as grandes contribuições do Decreto n. 2.926/1862 para a
construção basilar do que hoje é chamado de licitação, afirma Ana Paula Gross
Alves que,

O Decreto nº 2.926/1862 foi um marco na história das licitações e


iniciou o desenvolvimento de uma gestão pública eficiente. A
sociedade se beneficiou porque diversas empresas passaram a
participar do processo, tornando-o financeiramente mais vantajoso.
Porém, o governo ainda pertencia à monarquia, e assim assegurava
todo o poder em suas mãos, dirigindo, comandando e administrando
conforme seu arbítrio (ALVES, 2020, p. 43).

Dessa feita, os primeiros moldes do procedimento licitatório no Brasil


começaram a ser estabelecidos, onde percebe-se que apesar das mudanças
proporcionadas pelas especificidades de cada época, a ideia central e o
conduzir de muitos procedimentos atuais possuem raízes nas primeiras normas
acerca da licitação.
Na era republicana, fora sancionado o Decreto 4.536/1922, pelo então
Presidente Epitácio Pessoa, por aprovação do Congresso Nacional. Trouxe
como principais características a instituição do Código de Contabilidade da
União, além de destinar vários artigos ao tratamento de licitações.
Suas novidades na área licitatória conforme Lima (2014), se referem ao
estabelecimento como condição para o empenho orçamentário da despesa a
assinatura de contrato, e a introdução ao sistema de concorrência pública.

Art. 49. Ao empenho da despesa deverá preceder contracto,


mediante concurrencia publica:
a) para fornecimentos, embora parcellados, custeados por credito
superiores a 5:000$000;
b) para execução de quaesquer obras publicas de valor superior a
10:000$000.
Art. 50. A concurrencia publica far-se-á por meio de publicação no
Diario Official, ou nos jornaes officiaes dos Estados, das condições a
serem estipuladas e com a indicação das autoridades encarregadas
da adjudicação, do dia, hora e logar desta (BRASIL, 1922).

Referente a legislação dedicada acerca do procedimento licitatório


previsto no Decreto n. 4.536/1922, Fortes Jr. escreveu o seguinte,

O Artigo 49 obrigava concorrência pública para fornecimentos acima


de determinado valor e para obras quando ultrapassasse o dobro do
valor estipulado para fornecimento.
Havia uma fase preliminar em que era julgada a idoneidade do
proponente no prazo de dez dias findo o qual seria inscrito no
certame. Havia obrigatoriedade de publicação em diário oficial com
todas as informações necessárias aos interessados. Percebe-se
neste caso o que hoje é o princípio
da vinculação ao instrumento convocatório. Nesse ordenamento há
outros dispositivos que fazem referência a contratos, mas em termo
de inovação na área de licitações não traz muitas novidades
(FORTES JR., 2017).

Como características consideráveis da norma editada, vale ressaltar a


preocupação com a publicidade dos atos, perfazendo a ideia de um edital, no
qual os interessados deveriam se ater estritamente às cláusulas definidas para
a participação, daí relacionando-se a ideia do princípio da vinculação ao
instrumento convocatório, e a fidedignidade daqueles que se propunham a
concorrer com a administração pública. Dessa maneira, a transparência das
ações públicas para a população era priorizada, proporcionando uma maior
segurança para a sociedade.
Ana Paula Gross Alves, em contrapartida, teceu acerca da efetiva
aplicabilidade do Decreto à época, onde conclui através do seguinte
entendimento,

Porém, com o patrimonialismo ainda muito presente na administração


pública, as normas descritas no Decreto serviam apenas para
formalidades, pois permanecia o favorecimento a amigos e parentes,
tornando falhas as licitações e contratos e facilitando o empreguismo
e o nepotismo, sem mencionar o alto grau de burocratização que
exigiam dos administradores públicos (ALVES, 2020, p. 44).

De modo geral, a partir do Decreto n. 4.536/1922 o procedimento


licitatório começou a criar bases mais firmes, apresentando considerável
evolução, objetivando atribuir maior efeito às contratações públicas,
consolidando-se em âmbito federal e beirando o que hoje é chamado de
licitação, apesar dos evidentes percalços públicos que interferiam na aplicação
eficiente da norma.
Em 10 de novembro de 1964, foi sancionada a Lei n. 4.401, responsável
por estabelecer normas para licitação de serviços e obras e aquisição de
materiais no Serviço Público da União e outras providências relacionadas ao
tema (BRASIL, Lei nº 4.401, 1964).
A referida Lei trouxe a utilização do termo “licitação” pela primeira vez,
estabelecendo os preceitos gerais para a execução desse procedimento. Em
seu artigo 1º, incisos I e II, preleciona,

Art. 1º Os procedimentos referentes à contratação de serviços, ou


obras pelo regime de empreitada, bem como a aquisição de material,
equipamentos e animais destinados ao serviço público de
administração direta e de administração descentralizada, obedecerão
às seguintes normas:
I - Far-se-á licitação por concorrência pública:
a) para a execução de serviços ou obras, de montante superior a 500
vêzes o valor do maior salário-mínimo;
b) para aquisição de materiais e equipamentos de montante igual ou
superior a 500 vêzes o valor do maior salário-mínimo.
II - Será exigida a licitação por concorrência administrativa:
a) para a execução de serviços ou obras de montante igual ou inferior
a 500 vêzes o valor do maior salário-mínimo;
b) para aquisição de materiais e equipamentos de montante inferior a
500 vêzes o valor do maior salário-mínimo. (BRASIL, 1964)

Destaca-se que o aludido artigo em seus primeiros incisos apresenta


inicialmente duas formas de concorrência, pública e administrativa, divergindo
uma da outra através de parâmetros de valores definidos.
No mais, a Lei apresenta os casos de dispensa, bem como, os critérios
para realização da sessão de concorrência, onde conforme o texto redigido,
deveria ser indicado, pelo menos, dia, hora, local, condições para apresentação
das propostas, critério de julgamento, local para prestação de informações,
prazo para cumprimento do objeto, valores de caução quando for o caso, entre
outros elementos necessários.
Mais adiante, no ano de 1967, período marcado pela fase da ditadura
militar, o termo “licitação” já estava assimilado, momento que se procedeu à
uma abordagem mais minuciosa acerca do tema.
Criou-se então o Decreto-Lei n. 200/1967, baixado pelo presidente à
época, Castello Branco, dispondo sobre a Organização da Administração
Federal e estabelecendo diretrizes para a Reforma Administrativa e dando
outras providências (BRASIL, Decreto-Lei nº 200, 1967).
Vale ressaltar que, pela primeira vez, fora relacionado no ordenamento
jurídico brasileiro os princípios fundamentais aos quais a Administração Federal
deveria se ater, sejam eles:

TÍTULO II
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Art. 6º As atividades da Administração Federal obedecerão aos
seguintes princípios fundamentais:
I - Planejamento.
II - Coordenação.
III - Descentralização.
IV - Delegação de Competência.
V - Contrôle. (BRASIL, 1967)

No contexto licitatório, as normas consubstanciadas no Título XII do


referido Decreto-Lei, mais especificamente nos artigos 125 ao 144, seriam
responsáveis por reger as compras, obras e serviços que deveriam observar
estritamente o princípio da licitação.
Em questão, incorporou-se no procedimento licitatório as modalidades
de concorrência, tomada de preços e convite. Havia, nos casos das tomadas
de preços, a necessidade de manter registros cadastrais de habilitação dos
interessados, já para as concorrências, a publicação deveria ser feita através
de órgão oficial e em imprensa diária. Nos editais, era obrigatório a indicação
com antecedência do dia, hora, local, descrição precisa do objeto, condições
de participação e os critérios de julgamento.
Além disto, a licitação preconizava em seus critérios de julgamento,
levando em consideração o interesse do serviço público, as melhores
condições de qualidade, rendimento, preços, condições de pagamento, prazos
e demais critérios definidos no Edital. Quando não acontecia a escolha da
proposta com o menor preço, deveria a autoridade competente
obrigatoriamente justificar por escrito a escolha de outra proposta.
Destaca-se que, por se tratar apenas do âmbito federal, somente no ano
de 1968, através da Lei n. 5.456/1968, foram estendidas a aplicação aos
Estados e Municípios das normas relativas a licitações previstas no Decreto-Lei
n. 200/1967 (BRASIL, Lei nº 5.456, 1968). Anterior a isso, Estados e
Municípios possuíam total discricionariedade para legislar sobre o assunto,
sendo que, a partir dessa obrigação, os mesmos só poderiam legislar de forma
suplementar.
Contudo, tal obrigação contribuiu para uma maior segurança nas
contratações, uma vez que os moldes do procedimento licitatório passariam a
ser padronizados por todos os entes federativos (FORTES JR., 2017). Sobre a
Lei n. 5.456/1968, Hely Lopes Meirelles preleciona,

Além das disposições normativas do Decreto-Iei n.º 200/67, o estado


e o município podem editar, por lei ou decreto, disposições
regulamentares para as suas licitações e contratações, desde que
não contrariem os princípios da Lei federal. E é natural que as
entidades menores regulamentem suas licitações e contratações,
atendendo às peculiaridades locais e à especificidade de suas obras,
serviços, compras: e alienações. O essencial é que não quebrem o
princípio da igualdade dos licitantes, nem retirem das licitações o eu
caráter seletivo das. propostas mais vantajosas para a Administração
Pública (MEIRELLES, 1971, p. 15).

Pode-se concluir que o Decreto-Lei n. 200/1967, apesar de um esboço


bastante simplificado, foi, uma das bases para a Lei n. 8.666/1993, com os
primeiros traços que conduziram e nortearam a construção da lei que até então
vigorava com Lei Geral de Licitação. Infere-se ainda que tal Decreto só vigorou
como norma regente das licitações na 6º Constituição Federal, período do
Regime Militar, nos anos de 1967 e 1986 (ALVES, 2020).
Por fim, considerando as palavras de Beatriz Marques de Sousa
Wahrlich, o Decreto-Lei n. 200/1967 foi criado com um propósito bem claro à
época para a organização da administração pública:

Foi sugerido ainda pelo Ministro do Planejamento a supressão dos


controles meramente formais, a criação de um sistema de efetivo
controle dos dispêndios públicos e de responsabilidades de seus
agentes, a instituição de sistema de acompanhamento da execução
dos programas de trabalho, a expedição de normas financeiras que
se ajustem aos objetivos visados, o incentivo à intercomunicação
administrativa e, finalmente, a valorização da função pública, com a
dignificação e profissionalização do funcionário, observância do
sistema do mérito e remuneração satisfatória. (WAHRLICH, 1974, p.
44).

Conseguinte, com a retomada da democracia no país, em 21 de


novembro de 1986, o então presidente José Sarney, no uso de suas
atribuições, baixou o Decreto-Lei n. 2.300/1986. Considerado o primeiro
Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos Administrativos referentes as
obras, serviços, compras e alienações, da Administração Federal centralizada
e autárquica (BRASIL, Decreto-Lei nº 2300, 1986). Reuniu as normas
relacionadas à matéria, sendo estimado como um grande marco da licitação no
país à época, apesar de ter recebido algumas alterações posteriores com os
Decretos-Lei n. 2.348 de 24 de julho de 1987 e n. 2.360 de 16 de setembro de
1987. Rigolin afirma que,

O antigo Estatuto Jurídico das Licitações e dos Contratos


Administrativos marcou profunda e definitivamente seu lugar na
história do direito Brasileiro, a tal ponto que, consoante se denota, até
mesmo o legislador brasileiro de 1991 a 1993 o prestigiou na mais
ampla medida, elegendo-o como fonte primordial de inspiração para a
Lei 8666/93 (RIGOLIN, 2008, p. 253).

O referido Estatuto possuía 90 artigos divididos em seis capítulos, onde


preconizava que a contratação com terceiros deveria ser precedida de licitação,
além de que a proposta mais vantajosa para a Administração deveria ser
avaliada considerando os princípios basilares da igualdade, publicidade,
probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento
objetivo e demais pertinentes. Destaca-se a inclusão de duas novas
modalidades licitatórias na legislação, o concurso e leilão. Contudo, sobre
normas gerais de licitação e contratos o Decreto-Lei n. 2.300/1986 trouxe
apenas cinco artigos relacionados, dentre os quais os artigos 3º, 45, 48, 51 e
85, fato esse que propunha à União legislar sobre as normas gerais de
licitação, ficando aos Estado e Municípios regidos por essas normas gerais,
não podendo oporem-se a elas, adaptarem suas legislações com referência
nas realidades locais para tratarem de licitação. Conforme preleciona Fortes Jr
em referência a tal Decreto,

Denominado no primeiro Artigo de Estatuto Jurídico das Licitações e


Contratos Administrativos, o Decreto Lei 2300/86 trouxe 90 Artigos
divididos em seis capítulos, os quais eram pertinentes ao âmbito da
Administração Federal. O capítulo I subdividido em seis seções trazia
em sua primeira seção os princípios básicos da igualdade,
publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento
convocatório, julgamento objetivo e de princípios correlatos. A Lei
8666/93 adicionou a esses princípios os da isonomia, legalidade,
responsabilidade e moralidade (FORTES JR., 2017).
Não obstante ser considerado um degrau superior em comparação com
a legislação precedente que tratava das normas licitatórios, Rigolin (2008)
afirma que apesar de imensamente melhor e ter representado uma tentativa de
moralização e organização, estava longe da perfeição e acabou por possibilitar
a prática descarada de corrupção administrativa. Portanto, embora tenha
apresentado considerado avanço legislativo, o Decreto-Lei n. 2.300/1986 exibia
falhas que facilitavam à prática corruptiva administrativa no país, mesmo assim,
serviu de esboço, apesar de imperfeito, para nortear os legisladores na
construção da Lei n. 8.666/1993.
A posteriori, a promulgação da nova Constituição Federal em 05 de
outubro de 1988, merece bastante realce no quesito de organização e
democratização da Administração Pública. Sobre essa nova fase, tece
comentários Alex Cavalcante Alves,

Após período de vinte e um anos de ditadura militar ostensiva e três


anos de um governo civil que realizou a transição institucional, num
total de vinte e quatro anos sem exercício pleno das faculdades
democráticas, o advento da Constituição Federal de 1988 foi ao
encontro de anseios da sociedade por um Estado que assegurasse a
democracia e a cidadania. Especificamente quanto à Administração
Pública, deixava-se um período no qual a opinião política era
cerceada, no qual expurgos e demissões por razões políticas não
foram raras e no qual a sensação de estar vigiado era uma constante,
para então buscar-se viver novos tempos (ALVES, 2015, p.1).

O tema licitação ganhou evidência e propriedade no sentido de norma


reguladora geral, para todos os entes federativos, e passou a ser percebida
como um princípio constitucional que deveria ser seguida por toda a
Administração Pública nas compras, contratações de serviços, obras e
alienações.
Conforme o TCU (2010, p. 19), o objetivo maior da licitação é a garantia
da observância do princípio constitucional da isonomia com vistas a seleção da
proposta mais vantajosa para a Administração Pública, assegurando igualdade
na oportunidade de participação de todos aqueles interessados e possibilitando
o comparecimento do maior número de concorrentes ao certame.

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