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JULHO 15 1922

klaxon
REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO:
MENSARIO DE ARTE MODERNA

S. PAULO — Rua Direita, 33 - Sala 5


ASSIGNATURAS - Anno 12$000
Numero avulso — 1$000
REPRESENTAÇÃO:
RIO DE JANEIRO — Sérgio Buarque de Hollanda
Rua S. Salvador, 72-A.
FRANÇA — L. Charles Baudouin (Paris).
SNISSA — Albert Ciana (Genebra Rampe de Ia Treille, 3).
BÉLGICA — Roger Avermaete (Antuérpia —
Avenue d'Amèrique, n. 160)
A Redacção não se responsabiliza pelas idéias de seus collaboradores. Todos
os artigos devem ser assignadòs por extenso ou pelas iniciaes. E' permitti-
do o pseudonymo, uma vez que fique registrada a identidade do autor, na
redacção. Não se devolvem manuscriptos. — São nossos agentes exclusivos
para annuncios os srs. Abilio Nobre Cruz e Antônio da Costa Boucinhas.

SUMMARIO
NÓS Antônio Ferro
VOYAGE Serge Milliet
BONHEUR LYRIQUE Manoel Bandeira
INTERIOR Ronald de Carvalho
OS DISCÓBOLOS Guilherme de Almeida
L'ARBRE Henri Mugnier
NENIA Menotti dei Picchia
ORDEM E P R O G R E S S O Ribeiro Couto
CHRONICAS:
GUIOMAR NOVAES Mario de Andrade
O H O M E N S I N H O Q U E NÃO
PENSOU. . .... Mario de Andrade
PENUMBRISMO ... Motta Filho
LIVROS & R E V I S T A S
CINEMA . . . .
L U Z E S & REFRACÇÕES
EXTRA TEXTO . Alberto Cavalcanti
EU
NÓS A MULTIDÃO

OMOS os religiosos da Hora. Cada verso


Mais alto, mais alto ainda. Não

S — uma cruz, cada palavra — uma


gota de sangue. Sud-express para o
futuro — a nossa alma rápida. Um
comboio que passa é um século que
avança. Os comboios andam mais de-
pressa do que os homens. Sejamos comboios,
se ouve bem.
EU
A vida é a digestão da humanidade;
portanto! deixemos a vida em paz. Isolemo-nos, exi-
Ser de boje, Ser h o j e ! ! ! . . . Nao trazer reló- lemo-nos... E? crear universos, para uso
gio, nem perguntar que boras s ã o . . . Somos a
HOral Não ha que trazer relógios no pulso, nos próprio, como theatros de papel talhados á
próprios somos relógios que p u l s a m . . . thesoura... Sejamos rebeldes, revolucioná-
A MULTIDÃO rios . . . Proclamemos, a valer, os direitos
Não se ouve nada, não se ouve na- do homem! Em cada um de nós existe o
da. mundo todo! Façamos a volta ao nosso
EU mundo... Agitemos os braços como bandei-
Oxigenemos, com electrlcidade, os cabelos da ras!. .. Que os nossos gritos sejam aeropla-
É p o c a . . . Que a vida seja um teatro a branco e nos no espaço...
oiro.. Não olhemos para traz. Os nossos olhos
são pregos no nosso rosto. Não se dobram, não A MULTIDÃO
se torcem, não se v o l t a m . . . O passado é menti- Mas que desejam? Falem mais cla-
ra, o passado não existe, é uma calunia...
A MULTIDÃO ro.
EU
Não percebemos, não percebe-
mos. Endoideceram? Falem mais A Grande Guerra, a Grande Guer-
alto. ra na Arte!
EU Dum lado estaremos nós, com a al-
Cheira a defuntos, cheira a defuntos...
ma ao léu e o coração em berloque,
Não andamos, não andamos, trasladamo- homens livres, homens — livros, ho-
n o s . . . E' preciso gerar, crear... Os livros mens de hontem, de hoje e de ama-
são cemitérios de palavras. As letras ne-
gras são vermes. As telas dos pintores são nhã, carregadores do Infinito... Ga-
pântanos de tinta. O nosso teatro é um briel d'Anunzio — o Souteneur da
Museu Grevin. Não ha escultores, ha orto- Gloria — abraçado a Fiume — cida-
pedicos!...
Que os nossos braços, como espanado- de virgem num espasmo. Estão os
res, sacudam a poeira desta sala de visitas bailes Europeus — russos de alcu-
que é a nossa Arte.-Que as boccas dos Poe- nha — bailes em que cada corpo é um
tas sejam ventres dos seus versos!... Que
os dedos dos pintores sejam sexos na tela!... ballet, com um braço que é Nijinsky e

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uma perna — Karsavina... Está
2 Lavedan — "charmeur" profissional
Marinetti — esse boxeur de ideas; a tantos por volume; Geraldy — pa-
Picasso — uma regua com bocas; pel de carta das almas, das almi-
Cocteau — o contorcionista do Poto- nhas; Croisset, Croissant, pão de 16;
mak; Blaise Cendrars — Torre Eif- Gapus, capindó, gabão de Aveiro...
fel de azas e de versos; .Picabia — Estás tu Jacinto Benavente, ali ao
Ghristo novo, novíssimo, escanhoa- pé de Salvaterra de Magos; Linares
do; Stravinsky — maquina de escre- Kivas — amanuense do teatro hespa-
ver musica; Bakst — em cujos dedos nhol; Hoyos que não é de hoy quanto
ha marionnettes que pintam; Ber- mais de Hoyos. Está o Dantas,
nardo Schaw — dramaturgo dos bas- coiffeur das almas medíocres — e o
tidores ; Golette — o carmin da Fran- Carlos Reis, rainha, foi ao mar bus-
ça, e vá lá, estás mesmo tu, Anatole car sardinha. Está o Lopes de
— Homem de todas as idades. Es- Mendonça — barrete Phrygio ás três
tá Eamon Gomez de Ia Serna, palha- pancadas, matrona que já foi patro-
ço, saltimbanco, cujos dedos são acro- no dos cavadores da Resurreição, es-
batas na barra da sua pena, estou EU tá o Costa Mota que além de Costa
— affixador de cartazes nas paredes é Mota. Estás mesmo tu, leitor,
da Hora! orgulhoso da tua mediocridade, rin-
A MULTIDÃO do, ás escancaras, sobre esta folha de
papel que irás ler á família, á sobre-
Doidos varridos, doidos varridos... mesa, na atmosfera — menina Alice
EU — dos quadros a missanga e dos sor-
Do outro lado estão eles — nin- risos pirogravados das manas, tias e
guém a cubiçar a Terra de ninguém primas...
— embalsamados, balsemões, retar- A MULTIDÃO
datarios, tatibitates, monoculos, lu- Insolente! Insolente! Vamos ba-
netas, lorgnons, cegos em terra de ter-lhe .
reis. Está Paulo Bourget — medi- EU
co de aldeia com consultório de psico- Morram, morram vocês, ó
logia em Paris; Richepin, pauvre pin, etceteras da Vida!... Viva eu, viva
sem folhas, mil folhas, nenhumas. EU, viva a Hora que passa...
Gyp, Gypesinha, japona; Delille, Nós somos a Hora oficial do
Greville, Ardei.. „ ií. elle. o ve- Universo: meio dia em ponto
lho tema; Mareei Prevost — buraco com o sol a prumo!
da fechadura de todos os "boudoirs"; EU Antônio Ferro

IÍ I a \ o ii
3
Voyages
On découvre parfois au tournant de Ia
voie un village aux pieds d'une église.
O France des paysages inédits!
Ce village tiendrait dans ma main...

C
'est une chose dont je suis mainte- Mais le clocher me piquerait Ia paume
nant convaincu: quand on a lu comme une épine de nostalgie... Je n'en
le Baedecker il est inutile de le veux pas.
réaliser. On n'en retire que des L'éloquence facile des forêts impénétra-
désagréments. bles disparait.
Ces longues chenilles noires Immenses sapinières. Bois de Boulogne
brésiliennes digèrente mal les küomètres. em primitif.
Ohaque gare est un gros morceau qui INÉVITABLES SOUVENIES DE
s'accroche à Ia gorge et 1'irrite. UN PEU PROPEIÉTÊ PRTVÉE...
D^EAU; ÇA FAIT AVALEE. Le télégraphiste qui est poete me ra-
Le supplice d'entendre les voyageurs conte sa vie. Honnête. Insignifiante.
raconter des anecdotes. Quelconques aussi les jeunes filies na-
Ge monsieur distingue et provincial a turelles qui font Ia grande place.
demande un lit inféfieur parce qu'il le COESO DES BOULEVABDS.
croyait meilleur marche. Mais les contrai- I l y a ici une Ford qui ne marche qu'en
res s'attirênt et c'en est le cas. «première».
Appollinaire conte d'un vieux juif qui Son propriétaire l'a «ouvent faite répa-
présageait Ia mort prochaine des passants, rer. On croit qu'il va faire faillite.
parce que 1'ombre se retire du corps qui Ia Mais mon hotel est le plus beau de
projette un móis avant sa mort.- Je ne vois 1'Univers car
plus 1'ombre de mon wagon. TOUS MES BÊVES TIENNENT
Est-ce un desastre dans 30 minutes? DANS UNE SEULE CHAMBBE!
Non, elle est ou fond de 1'abime. Serge MILLIET.

Bonheur lyrique
e oeur de Phtisique,
O mon coeur lyrique
ton bonheur ne peut pas être comme celui des autres.
II faut que tu te fabriques
un bonheur unique,
— un bonheur qui soit comme le piteux lustucru en chif-
(fons d'une enfant pauvre,
fait par elle même...
MANUEL BANDEIRA.

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4
Interior
p
oeta dos trópicos, tua sala de jantar
é simples e modesta como um tranquillo pomar;
no aquário transparente, cheio de água limosa,
nadam peixes vermelhos, dourados e cor de rosa,
Entra pelas verdes venezianas uma poeira luminosa,
uma poeira de sol, tremula e silenciosa,
uma poeira de luz que augmenta a solidão...
Abre a tua janela de par em par! Lá fora, sob o céu do
(verão,
todas as arvores estão cantando... Cada folha
é uma cigarra, cada folha é um pássaro, cada folha
é um som... O ar das chácaras cheira a capim mellado,
a ervas pisadas, a baunilha, a matto quente e abafado...
Poeta dos trópicos,
dá-me no teu copo de vidro colorido um gole d'agua.
(Como é linda a paizagem no cristal de um copo d'agua!)
RONALD DE CARVALHO.

Os discóbolos
n a poeira olympica do circo,
sob o sol violento, elles lançavam o disco
que ia alto e vibrava longe
como um sol de bronze.
Os seus gestos
eram certos
e os seus pés tinham força sobre a areia movei.
E o pequeno sol rápido de c*obre
fugia dos seus braços tesos
e lustrosos de óleos,
como a flecha do arco forte.

kl axon
5 Todos os olhos
seguiam-n'o na trajectoria ephemera e aérea
e ficavam accesos
do fogo metallico do pequeno sói.
E nem viam o outro sol - o verdadeiro - porque elle era
Inattingivel e parecia menor.
GUILHERME DE ALMEIDA.

LARBRE
e me souviens d'un arbre de mon enfance
Que j'ai plante, étant petit;

1
II a poussé, poUssé en confiance,
Et puis un jour il a fleuri.

Le mur de Ia maison de mon grand-père


Le préservait
Du vent mauvais
Et le gardait à Ia lumière.

Lors, devant sa première fleur j*ai fait des rêves,


Des rêves ou je mangeais des fruits,
De bonnes pêches
A Ia peau fraiche
Au jus sucré, à Ia chair blonde et dans laquelfe
Un noyau aurait mis
Son goüt d'amande amère et sa couleur vermeille.

Je dus aller en viUe et quand je m*en revins,


Tout avait disparu de mon ancien jardim
Un blé encore en herbe et léger sous Ia brise
Lentement s*efforçait à grandir pour les hommes.

HENRI MUGNIER

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o
NENIA
eu amor é um beduino nômade

111 num deserto sem limites


e adora a sombra que se move em sua frente,
na areia ruiva,
longa como uma lança...
Elle corre atrás da sombra
como nós corremos atrás do nosso destino.
(A voz da mulher que cantava tinha a cadência
de uma nenia).
O sol arde nas suas costas
e elle vae rumo do nascente.
A sombra não pára porque elle não pára nunca
e elle ama os gestos allucinados da sombra fugitiva...
Não ha mais ninguém no deserto. Só elle
e o silencio. O silencio está cheio, tão cheio
que elle tem medo das coisas que o silencio occulta,
porque ha muitas coisas occultas no silencio...
(Na sombra a mulher parecia uma sombra.)
O beduino não pára. Parece que a sombra o chama.
Elle corre e ella foge... Elle a tem ao alcance das magras
(mãos convulsas
e não attinge nunca. O sol baixa no occidente
e a sombra se faz mais longa e mysteriosa
como se quizesse abarcar o deserto...
(A voz da cantora tinha tonalidades de crepúsculo.)
E quanto mais a sombra engrandece
mais se torna esfumada e intangivel...
E o beduino sente crescer seu amor impossível I
Elle tem os pés em sangue e a garganta abrasada
de sede e de ânsia e os olhos vermelhos de febre
e o corpo desfallecido.
E corre... e corre... E cresce o silencio

klaxon
7
e com elle o mysterio. O sol, no poente, agoniza.
A sombra é tão grande! Elle vae agarrai-a!
Cáe de borco... E* já noite. A sombra se some
noutra mais densa e sem limites!
(A voz da cantora agoniza.)
Só fica o silencio. E, na areia, invisível,
o corpo do beduino, de bruços, com os braços abertos
como uma cruz caida...
(de "O Homem e a Morte")
MENOTTI DEL PICCHIA.
Ainda são mais pittorescas as que di-
ORDEM E PROGRESSO zem: «Não concordo» e não contentes com
A Tristão de Athayde. isso escrevem nos jornaes, escrevem criticas
As pessoas cuja opinião não tem impor- de apparencia inteiramente respeitável,
tância são em geral pessoas que dizem: «Não com um desdém fraternal por tudo aquillo
concorda». que não comprehendem.
Que fazer, si é inútil explicar certas
coisas? EIBEIBO COUTO.

Chromcas
GUIOMAR
quina ; pouca vibratilidade, ás vezes mesmo falta
de compreensão. Friedmann gostava do aplauso
público, e constantemente malabaristava.
Admiro oa malabaristas. Mas o malabarista
NOVAES de circo: ágil, belo de formas. Neste ha uma
coragem convencida, proveniente da consciência
da força. Num salto de trapésio, a 12 metros da
n altura, vejo o sorriso irônico dum ser que pensa.
(A Virtuose) O malabarista é atraente, não porquê se ria da
monte, mas porquê sabe o que pode fazer e tem

a
snha. Ouiomar Novaes não é per- confiança nos seus músculos. Nunca ultrapassa
feita como técnica. Aliás, acredito as possibilidades de seus membros. Jamais pre-
que a perfeição não seja deste judica a beleza dum salto pela vaidade de ir
m u n d o . . . Além disso: Friedmann, alem dos outros- Friedmann, lançando seus de-
por exemplo, duma habilidade té- dos numa rapidez de luz, não é um corajoso: é
cnica fenominal, como intérprete era um temerário, um sentimental que abandona a
inferior: Deslumbrou oa tolos dos inteligência e a critica, esquece-se da vida da
paulistas por atacar um estudo de Chopin numa obra, para satisfazer uma vaidade, fiuim vai-
velocidade Je 300 quilômetros por hora. Não re- dade.
param que essa correria não só contrariava o A snha. Novaes não possui essa habilidade: é
andamento relativo ao pathos do trecho, como muito mais musical porém. B é possível que
hão permittia ao executor a realização dinâmica essa menor habilidade tenha influído na sua ar-
necessária... Muito brilho, exactidâo de má- t e ; pois creio ver na pianista (mais uma cara-

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§
cterísca romântica) uma predileção pelo efeito. dusida por uma altíssima sabedoria. A Ironia de
A prova está em certas peças, que lhe vão ma- "MinsTels" então passou-lhe despercebida...
ravilhosamente para os dedos, e que repete In- E a snha. Novaes que tanto se sensibilizara com
cansavelmente em seus concertos. Não lembra- a caçoada feita a Chopin no primeiro Sarau da
rei o Hino Nacional porque tenho certeza que Semana de Arte Moderna não deveria incluir
esse fogo de artifício de festa do Divino repu- num dos seus programas a caricatura, fMta por
gna á consciência artística da grande virtuose. B' DebUssy, desses ingênuos menestreis medievais,
a estupidez patriótica de parte do seu auditório cujo cantar trovadoresco é o primeiro vagido dá
que a obriga a repetir ainda e cada vez pior música sensível.
(justifico calorosamente essa decadência) a fa- Os românticos legítimos, nascidos no decênio
migerada pirotecnla. que vai de 1803 a 1813, apresentam duas ten-
Quando porém disse que a snha. Novaes não dências que se tornaram as caracteritticas In-
tem técnica perfeita, não quis de modo algum confundíveis do grupo: a fantasia exaltada e a
adiantar que esta fosse Insuficiente. Oh, n ã o ! sensibilidade sem controle Intelectual. Será pois
Falta-lhe força, falta-lhe muitas vezes nitidez... o maior intérprete desses mestres quem milhor-
Em compensação que elasticidade, que firmeza, mente caracterizar-lhes essas duas tendências.
que qualidade de som! Não terá o perolado le A snha. Novaes tendo, num máximo impressio-
Viana da Morta, nem o planíssimo de Risler; nante, esse poder é, a meu ver, de todos os pia-
mas que pedalizaçâo exacta, que cantante! nistas que ouvi, a milhor intérprete do roman-
Mas a técnica é coisa de pouco interesse sob tismo musical.
o ponto de vista crítico. Ter ou não ter técnica Chopin, Schumann e Liszt eis o campo em
é questão de trabalho, questão de professor e que é excelsa.
dotes físicos pessoais. Tudo o que faz lembrar O próprio Liszt, cujo valor musical é pequeno,
cozinha do ofício contraria a comoção do ouvin- consegue ser ouvido com agrado quando ela o
te. A técnica é um melo que importa ao execu- executa. B' que a virtuose percebeu a Inexistên-
tante adquirir, mas indiferente para o espectador- cia ás vezes total de sentimento no qualqueris-
A snha. Novaes possui uma técnica mais que mo sonoro do abade, mas compreendeu-lhe a
suficiente. Si não tem o forte relativo neces- imensa fantasia. Só mesmo a snha. Novaes airi-
sário para os largos ambientes, consegue toda- da tem direito de executar essas gastas rapsó-
via assenções dinâmicas impressionantes e é ex- dia onde uma falsa saudade se espevita masca-
traordinária nas notas ásperas (l.o tempo, op. rada (é ler o que diz Bartok sobre os temas na-
35, Chopin). Si nas passagens excessivamente cionais húngaros correctos e aumentados por
harmonizadas é por vezes confusa, consegue co- Liszt) entre histerismos de cadências flautísti-
mo ninguém as sextas da Barcarola, as oitavas cas, trinados, tiros insultantes no grave e outras
da Jongleuse. coisas de inda menor valia. A 10.a Rapsódia é
Verificada pois a abastança técnica da ilus- rojão que só tem direito de existir quando a
tre pianista, considero-a imediatamente como célebre virtuose se incumbe de lhe realizar os
intérprete. glissandos. Mas onde a fantasia da intérprete
Como tal 2 aspectos especiais apresenta: a permite-lhe uma legítima e total criação é na
transborda em excessos sentimentais Não Dansa dos Duendes. Eu vi os elfos saírem em
transborda em excessos, sentimentais. Não girándolas esverdinhadas do negro Stetnway-
aponto defeitos. Verifico tendências. Uma ten- Formaram em torno da pianista uma ronda ver-
dência pode não ser actual, isso não implica ser tiginosa em que poisou, furtivo, um rálò de
defeituosa. l u a r . . . Sempre desejara conhecer esses elfos
A snha. Novaes ou é duma fantasia adorável pequeninos. . . Aconselharam-me a leitura de
ou duma sensibilidade sem pelas. O qüe não lhe Leoonte... Saí da lição como Jacobus Tourne-
vai bem para o temperamento é a discreção co- broche da experiência do Senhor D'Astarac, con-
movida mas serena dos clássicos e o impresslo- tada por Anatolio Franco: Incrédulo como fin-
nismo intelectual dos modernistas. (E para o trara. Um dia, ao ler shakespeare, sentira duen-
Brasil Debussy ainda é um modernista, helas!) des em redor de m i m . . . Mas quando a snha. No-
Nestes como naqueles, não encontrando campo vaes executou o trecho de Liszt eu vi os enteai*
largo para sua sensibilidade exaltada, encara-os nhos translúcidos. A ilustre pianista, pelo poder
como si fosse cada qual um outro Liszt de ra- de sua fantasia, criara o inexistente, Devo-tyHÁ
psódias em que tudo está em procurar o efeito. esta comoção linda de minha vida.
E' engano. Inegável: interpreta primorosamen- No "Carnaval" reunem-se em Igual potência
te certos* trechos de Bach ou a "Soirée dans a fantasia e a sensibilidade. Considero esse mo-
grenade"- Mas estas obras não saem vividas dos numento o trecho mais descabela4amente ro-
seus dedos. São pretextos para efeito e não pa- mântico da música. Infelizmente não me foi pos-
drões em que se limite uma sensibilidade con- sível assistir ao recente concerto em que a anha.

k I a x o ii
Novaes tornou a executar a op. 9. B, dada a
variação constante de suas interpretações (ou-
9 t 0 está a exactidão das interpretações da snha.
Novaes- Dá-nos Schumann, Chopin, não encur-
tra característica romântica), causou-me verda- ralados numa certa fôrma interpretativa, nem
léira dor essa privação. Mas me é inesquecível mesmo como existiram no espaço e no tem-
i execução anterior do " C a r n a v a l " . . . A snha. p o . . . Vai mais alem: Dá-nos o "animal" Schu-
Novais partia para os Estados Unidos. Con- mann o "animal" Chopin como teriam existido
certo de despedida. Eu estava no galinheiro. (realidades ideais) si não houvessem essas fa-
Suava, ensardinhado numa compansaria boqui- mosas circumstáneias que Taine fez a tolice de
aberta, eterna e incondicionalmente entusiasma- descobrir, e mais preconceitos de métricas mu-
la ante qualquer interpretação, boa ou má, que sicais e rés-maiores.
saísse das mãos da grande artista. Sensação de E a respeito de Chopin... Outro lugar co-
mal-estar e desprêso- Mas Guiomar sacudira os mum engraçadíssimo dos críticos consiste em
ritmos iniciais da peça com uma energia, uma dizer, a cada novo pianista que pisa estas aben-
convicção, uma verdade tnexcedíveis... O que çoadas e ignaras plagas de Paulioéa, que esse é
ri! O que ouvi! A virtuose, sob o ponto de vis- o insigne intérprete de Chopin. Nada mais er-
ta escolar, dáva-nos a interpretação mais fal- rado. Rubinstein, a não ser na valsa póstuma,
sa, mais exagerada possível. Que rubatos frené- numa ou noutra mazurca, assassinava o pola-
ticos ! Que planíssimos espamôdicos! Que ^dina- co. Talvez questão de ódio de r a ç a . . . Risler?
mismos fraseológicos estranhos! Mas foi sim- Ruinzinho, bem ruinzinho mesmo. Ainda me
plesmente sublime. Acredito que duas vezes não lembro com arrepios da execução do nocturno
tere icom essa peça a mesma comoção. Eu de- em fá sustenido... Friedmann compreendia
posito na glória da snha. Novaes a lágrima que Chopin como uma cadência de concerto, em que
nessa noite chorei. E' o presente dum homem tudo consisitia em brilhar. . . Só me satisfizeraim
que não tem pela intérprete nem simpatia, nem no romântico: Paderewski, a enra. Carreras e a
antipatia. Um homem insensível á glória que a snha. Novaes.
acompanha. Um homem isento de patriotadas
que não se orgulha da snha. Novaes ser brasilei- E esta mais que nenhum outro. Porquê?
ra porquê considera os grandes artistas, quer Chopin, sabemos, trabalhava como um La Fon-
criadores, quer intérpretes, seres de que nto im- taine, um Da Vinci, um Beethowen da última
porta conhecer a nacionalidade, mas aos quais fase. Sempre incontentado e incansável no cor-
todos nos humanos, devemos ser reconhecidos. gir. No entanto: nada mais desnorteante que o
Na minha lágrima vai a homenagem dum ser, estilo de Chopin. Baladas como Berceuse ou
não sem preconceitos (é coisa extra-humana) Barcarola, nocturnos como sonatas, prelúdios co-
mas o mais livre possível de prejuízos senti- mo estudos apresentam um caracter de inteira
mentais. improvisação, em que, no entanto, o mestre dei-
xou qualquer coisa de seu, inconfundível, mes-
Realizara pois o "Carnaval" o mais romântica - mo sob o ponto de vista da construcçâo. A for-
mente que é dado imaginar-se... Haverá nis- ma de Chopin é inatingível. Imitam-se-lhe cer-
so um erro? Não. E ' costume de criticalhos re- tos processos técnicos, o arpejado, os melismas.-.
petir o seguinte lugar-comum, com mais defi- Toda gente pode ser livre no desenvolcimento
ciência de estilo porém: "O snr. Tal interpretou constructivo dum prelúdio, como Chopin o foi. . .
Chopin sem os exageros a que nos acostumaram Mas ninguém consegue imita-lo, tal o cunho de
certos pianistas de importação. A sua execução personalidade que imprimiu ás formas musicais
sóbria deu-nos o verdadeiro C h o p i n . . . etc." de que se apossou. A snha. Novaes é justamente
Que estupidez! Qual o verdadeiro Chopin? SI é notável no autor da Berceuse porquê crea Cho-
o que a tradição nos conservou dum homem que pin. Ela é Chopin. Suas interpretações, acredito
em Viena foi apelidado "pianista de mulheres", que cuidadosamente preparadas, assumem um tal
que tinha terrores e alucinações junto da ma- caracter de inspiração, de impulsâo lírica, de
terna amante em Maiorca, que morreu t í s i c o . . . laisser«aller, que se tem a impressão duma obra
Dum homem que espantou, pela sua liberdade nova, formidável. Como que improvisa Chopin.
interpretativa, ao próprio Berlioz... Qual o ver- E o faz como nenhum outro intérprete que tenha
dadeiro Sçnumann? Si o que a tradição nos con- passado por nos. Ora, na música imitativa (em-
ta como um ser fantástico, vário, desigual, ar- pregado o termo no sentido aristotélico) essa
rebatando a mão por exagero de estudo, escre- improvisação é, não só necessária, mas impres-
vendo peças nocturnas porque sente, de longe, cindível para que a obra de arte corresponda
que um ser querido lhe morre, Carnavai3 e psicologicamente ao que pretende representar.
Rreisleriauas por excessos de entusiasmo e de D'aí assumirem as interpretações de Chopin
ódio e acaba l o u c o . . . Pois a legítima compreen- pela snha. Novaes essa força de realidade, essa
são desses homens estará em corrigi-los e trans- veemência comotiva poucas vezes por outrem
porta-los para a serenidade clássica que não ti- atingida. E é tão integral a sua compreensão
veram a energia a serenidade clássica que nlo ti- do mestre que, sendo geralmente rebuscadora

k 1a x o u
de efeitos particulares (indo ás vezes mesmo a
mudar a música escrita, alongando notas, con-
10 d a , Ia rebellione" elementos essenciais da poe-
sia. Não acha que até hoje a literatura "esaltó
trariando interpretações determinadas pelo au- 1'immobilitá pensosa, 1'estasi e 11 sonno", por-
tor) a snha. Novaes desdenha, ao executar Cho- que a própria dor como elemento estético não é
pin, particularidades e efeitos que boquiabram nada disso.
seus adoradores, para atacar directamente a rea- KLAXON admira a beleza transitória tal como
lização de conjuncto desses recontos musicais foi realizada em todas as épocas e em todos os
que o doloroso músico deixou. Por isso escrevi países, e sabe que não é so "nella lotta" que e-
atrás que "a snha. Novaes crea Chopin" xiste beleza.
E termino. Sigo com admiração e curiosidade Em formidável maioria os escriptores de KLA-
a carreira da grande artista- A' medida que suas XON são espiritualistas. Eu sou católico. Pode-
forças se concentram ela se torna inais profun- ríamos pois aceitar o 8.o parágrafo do manifesto
da e mais pessoal. Varia e cresce de concerto pa- futurista?
ra concerto. Talvez seja mesmo uma certa ânsia Pelo 9.o glorificar-se-ha, além do patriotismo,
de fazer milhor que a leve a repetir e repetir as o militarismo e a guerra. Não o faríamos.
mesmas peças. E' um erro. A snha. Novaes, mes- No lO.o manda Marinetti que se destruam mu-
mo no círculo de seus autores preferidos, podia, seus e bibliotecas. Consideramos apenas a re-
devia variar mais seus programas. construcção de obras que o tempo destroe "uma
E na linda evolução que segue acendra cada enronia sentimental". Respeitamos o passado
vez mais as propensões românticas que apon- sem o qual KLAXON hão seria KLAXON.
tei. Infelizmente para a opinião K l a x i s t a . . . Além dos temas indicados (é subentendidos)
Mas é verdade que por elas se tornou a Intérpre- no derradeiro mandamento futurista vemos mui-
te genial de iSchumann e de Chopin. tos outros. Não despresamos a mulher e canta-
mos o amor. E Guilherme de Almeida, de manei-
MARIO DB ANDRADE. ra nova, num estilo afeiçoado ao assumto reviveu
a Grécia, num momento de inspiração tão lindo
como jamais nenhum dos anônimos do Mundo
O HOMENZINHO Literário possuirá.
B saiba o pagão que não é preciso ser futuris-
QUE NÃO PENSOU ta para ser patriota.
B saiba mais que admiramos Veneza pelo que
foi, e que resta de passado, pois, além "dos cic<~
ELA revista "O Mundo Literário" um rones loquazes, da água suja e dos mosquitos a-
anônimo da redacção desesperada-

P
guilhoantes" ha lá um palácio Vendramini, ha lá
mente carioquiza para provar que quadros de Ticiano e Tintoretto e outras mani-
KLAXON é passadleta. festações de gênios imortaes.
Leu e não compreendeu; não
pensou e escreveu. B se em outras coisas aceitamos o manifesto
Provas: "Mau grado os seus ares futurista, não é para segui-lo, mas por com-
de modernismo extremo KLAXON mostra-se em preender o espirito de modernidade universal.
matéria de arte francamente conservadora, reac- Quando ia pelo meio das nevoas, começou a
cionaria mesmo". hesitar o homenzinho que não pensou. Do tremor
Escrevêramos: "KLAXON não se preoocupará proveio ver na extirpação das glândulas lacri-
de ser novo, mas de ser actual. Essa é a grande maes reminkencia do "velho Rlchepin" e no es-
lei da novidade. Terá também o desplante de ne- tilo do "grave artigo de fundo Snr. M. de A."
gar actualidade a KLAXON o homenzinho que' semelhanças com a dicção de certa personagem
não pensou? de Dickens.
Ainda: "A apresentação é uma repetição syn- O anônimo será outra vez covarde si não citar
thefcica do manifesto futurista de Marinettl, cou- na sua revista o conhecidissimo trecho de Riche-
sa que já vem creando bolor, ha não menos de pln (que naturalmente os leitores do Mundo Li-
quinze a n n o s . . . " E' mentira. O anônimo está na terário desconhecerão) e a frase de KLAXON.
obrigação de publicar na sua revista o manifesto Mas não citar capciosamente como lhe ordena-
de 1909 e a nossa apresentação. Provará assim o riam as tendências naturaes, mas com siceridade
seu asserto. Si o não fizer, afirmo que é covar- e nobreza: na integra. Veriam os leitores da
de, pois não concede a KLAXON as armas que grande (cento e tantas paginas) revista como a-
reclama para se defender. proveltamos "a boutade sobre as glândulas la-
Dos 11 parágrafos que formam o manifesto fu- crimaes".
turista, não aceitamos na totalidade slnão o 5.0 Quanto ao meu estilo: pertence-me. Prova?
e o 6.o. KLAXON não canta "l'amor dei peri- Diz Colombo: "artigo de fundo do Snr. M. de
colo" porque considera a temeridade um sentl- A." Ora nos poucos exemplares que ainda restam
mentalismo. Não considera "11 coraggio, l'auda- de KLAXON n.o I, procurei m i n h a assinatura

k 1a x o n
nesse artigo. Só encontrei o seguinte e modesto
11 te-americanas nas gravuras de Utamaro ou de
aviso: A Redacção. Mas o estilo de M. de A. da Shuntai.
"Pianolatria" ê "Luzes e Refracções" poude ser Quanto a 0 nosso "passadismo" é cotejar a a-
identificado pela adversário com o artigo de fun- presentação de KLAXON com a apresentação do
do. Mas o tão anônimo quanto falso articulista Mundo Literário: "A toi-qui que tu sois" com o
conhece o Ivan Goll do manifesto Zemith? Conhe- soneto "Sabiás", ~As visões de Críton" com o
ce Cocteau de "Le Coq et 1'Arlequin"? Satie dos "Vendedor de Pássaros", "Sobre a Saudade" com
"Cahiers d'un Mamifere"? e outros tantos "su- "Apparição", "Pianolatria" com "Musica", "Les
jeitos de importância em virtude e letras" mo- tendences actuelles de Ia peinture" com "A pro-
dernas? Se os conhecera veria em meu estilo pósito de uma gravura" (inéditos maus de bons
uma adaptação literária da rapidez vital contem- escritores já m o r t o s ) . . .
porânea. Pois saiba que plagio manifestamente E KLAXON inicia a critica de arte periódica
o telégrafo o telephonio, o jornal, o cinema e o do Cinema. O Mundo Literário desconhece "O
aeroplano. GAROTO" em que Carlito alcança uma altura a
B na verdade o homenzinho que não pensou é que só os grandes alcançaram...
de uma fineza única em julgar estilos. No snr. Este é o passadismo de KLAXON: coisas
Baudouin vê Samain. Em Samain vê Musset e boas ou más que ainda não perturbaram a so-
(!!!) Tibullo. Como técnica saiba o sem-batis- nolencia "leda e cega" do Brasil.
mo que Carlos Baudouin é constructor de métrica Este artigo está mais longo que a "Rasteira
própria muito curiosa. Samain uniu ás vezes em Trevas", film italiano por Za-la-Mort... E'
metros conhecidos, isso mesmo com muito me- que nele vai a resposta a todos aqueles que pelo
nos coragem e valor que La Fontaine. B preciso jornal ou no segredo nem sempre honesto das o-
que o nobre articulista de hoje em diante não relhas amigas vivem a entoar contra nos madri-
confunda suavidade com penumbrismo. B si co- gaes, sirvantes e sátiras de mal-dizer. Si não: fô
nhecera certos francezes contemporâneos, Duha- ra dar demasiada importância ás invejas activas
mel, Romalns e especialmente Vildrae (encon- dum homenzinho que não pensou.
trei edições numeradas de Vildrae e Romalns jo-
gadas por Inúteis em baixo de uma meza em li- MARIO DB ANDRADE
vraria carioca!),a elles Irmanaria com mais elo-
qüência e talvez menos fineza critica o nosso
colaborador Carlos Baudouin. No desenho de Bre-
cheret o catecumeno vê influencia fendeia! B'
enorme!, A Fenicia não teve propriamente uma
PENUMBRISMO
arte. Copiou assírios, egípcios e gregos. Quando "Mas do que ereis, e do que
não imitava ainda esculpia as pífias figurinhas sois, passemos ao que Unheis,
do museu Cagliari. Talvez também tenha quali- e ao que tendes."
ficado de fenicio o desenho para dar milhor qui- P. VIEIRA, SERMÕES
late á Ironia. Infelizmente sai-lhe deficiente a " E assignalas com chammas
clareza da graça e o espirito assemelhou-se á o caminho."
ignorância. B saiba ainda o fino descobridor de B. DA GAMA, URUQUAY
estilos que os verdadeiros esculptores modernis-
tas, quando não afastados totalmente da natu-
reza imitam resolutamente os primitivos para OM a gomma do sarcasmo, alguém no
neles encontrar a resolução dos problemas que Rio rotulou de "penumbrismo" as
ora agitam o trabalho do volume. Assim Bour-
delle (francês) assim Milles (sueco) assim Des-
•tovich (tcheco) assim Durrio (espanhol).
E termina o agora batizado homenzinho que
não pensou: "KLAXON" representa exactamen-
C tendências novas de nossa literatura.
O rotulo soffre o mal de todos os ró-
tulos e o defeito maior de abranger
a quem não deve.
Ha, evidentemente, entre nós, u-
ma literatura de penumbra, garoenta, chorona,
te aqulllo que tanto horroriza os seus talentosos
creadores: um "passadismo". Ao contrario do que reflecte, com tardio remate, a poesia deca-
que asseverava o senhor M. de A., KLAXON não dente, o symíbolismo de Verlaine, Poetas ricos
é klaxista: é c l a s s i c i t a . . . " Lindo trocadilho! B de vida, ricos de inspiração, ricos de talento, tor-
o articulista tomou o «uidado de despargir pela cem a naturalidade, forçam-n'a, para encolhe-
verrina algumas doçuras de elogio. Infelizmente rem-se jururús, dentro do roupão regional e pes-
a minha sinceridade não me permite retribui-las soal dos poetas de França.
pelo artigo. Vejo no néo- cristão um homem des- Quem conhece a nossa historia literária, sabe
peitado, invejoso, Insincero e ruim. Quando mul- que, em suas diversas épocas, houve sempre
to reconhecerei no arguto quão erudito critico uma mania, uma repetição de imagens, um ideal
sclencia bastante para descobrir Influencias nor- c o m m u m . . . Os poemas de Basilio da Gama e

k 1a x o n
Durão buscaram uma poesia nova, na natureza
12
ambiente da pátria. E isso fez moda. Depois, os
— "Elle creou uma poesia bem sua, uma poesia
de inspiração a 0 mesmo tempo ingênua e subtü,
poetas da escola mineira ficaram presos ás con- toda de nuançae, evocadora das mais delicadas
venções arcadicas. Nise, as pastorinhas, vinham vibrações dos nervos, dos mais fugitivos ecos do
em scena, nas rimas dos poetais de) então. Gon- coração".
çalves Dias botou fogo nas imaginações, cantan- Mas, os novos do Brasil esqueceram esse ca-
do os indios no lirismo dos "Tymbiras" e "Y- racter preponderante do poeta infeliz. Tomaram
Juca-Pirama". Castro Alves alçou o vôo condo- de Verlaine a parte pessoal, ultra exclusivista,
reiro e o "infinito" foi o delirio de sua geração. as suas visões cheias de tédio, cheias de dôr, co-
E, d'outro lado, Byron e Lamartine vinham com mo a sua vida angustiosa de Ashaverus; e aban-
Alvares de Azevedo e Fagundes Varella chorar donaram a grande lição que elle offerecla de am-
o infortúnio da vida e os casos lastimáveis da pla liberdade na arte, de espontaneidade no sen-
"mulher fatal". O parnazianismo, no verso aca- timento esthetico.
badinho cantou com Raymundo Corrêa e Bilac, Verlaine não podia ser imitado, porque sua
— os deuses do Olympo, façanhas da velha arte era restricta e, ao mesmo tempo, exagerada,
Grécia. como a de todo revolucionário. Eu leio seus ver-
Mas é diverso o caso dos penumbrístas. sos e vejo apenas sua alma, triste como seu» amo-
São perfeitamente justificáveis os primeiros res, trágica como os seus Pierrots. Agora mes-
movimentos de nossa litteratura. E'-o também, mo acabo de lêr um poeta nosso de fina sensi-
a influencia arcadica em Gonzaga que aliaz bilidade, que diz sinceramente:
soube muito bem sentir sua pátria. A pleiade
condoreira, os cantores da terra, os influencia- . . Verlaine eu bem te sinto
dos pelo romantismo europeu podiam ser perfei- Nesta terra que morre aos poucos pelo poente
tamente sinceros e serem assim grandes poetas.
Em que o jardim parece embebido em absyntho."
O mal originou-se com o parnazianismo pos-
tiço, com o hellenismo falsificado e desandou,
lamecha, em a juventude penumbrista. Mas pa- B esse o mal da phalange. Ella traduz e re-
ra os parnazianos/havia uma justificativa: — o pete o poeta fracêês.
objectivismo poético, a intenção mais descripti- O "vieux pare solitaire", "le jardin aban-
va que sentimental. donné", "1'automne", "les feuilles mortes", es-
E para os jovens poetas patrícios envenena- tão ahi, logares communs de todos os penum-
dos de "morbus" verlameano? Qual a justifica- brístas.
tiva? Ignoro. Choram desgraças alheias, pregam ideaes a-
O que caracterísou a pleiade decadente em lheios, imitam nos mínimos detalhes, o que dis-
França foi uma reacçâo fortíssima, dentro de se o pobre trovador delirante dos nostálgicos ou-
um subjectivism 0 intenso, contra a arte imposta. tomnos de França.
A obscuridade de Laforgue era a expansão sin- A guerra ao penumbrismo não é o despeito da
cera de sua individualidade; a obscuridade de velhice caduca, como querem muitos. A guerra
Verlaine era o alivio de sua alma torturada ao penumbrismo é uma guerra ao ridículo, ao
Quem os lê, como quem lê Villiers de 1'Isle Adam predomínio do espirito simiesco, ao irreflectldo
ou Saint-Pol-Roux-le Magnifique, sente uma in- papagaiar dos amigos das novidadeirices.
tensidade individual, reflectindo, por sua vez, a Todos os macaimibuisios, sob a acçâo de um
alma francesa, que assim se torna: absyntho de mentira, que passeiam em alamedas
"Plus vague et plus soluble dans 1'alr" solitárias, sob um céo de outomno, todo "gris",
C r a , nada mais despropositado do que nós, todo tédio, — precisam levar sacudidelas, para
brasileiros, tão longe pelos mares, tão diversos verem céo azul, a paizagem rica de sol e de luz, a
pela civilisação, repetirmos sensações e cantaro- vida intensa, bulhenta, enérgica, electrica, para-
lices surgidas num período de reacçâo literária. doxal . . .
Teodor Wizewa, justificando a razão porque
Tolstoi não compreendia os decadentes, dizia: — B' preciso reagir. E nesse sentido applaudo a
"Eu não conheço nada mais ridículo que a ad- classificação.
miração dos jovens esthetas Ingleses ou alle- Mas ha nella uma parte injusta. Ao lado dos
mães por tal poeta francês, Verlaine, por exem- poetas do "spleen", dos "montmartres" indígenas,
plo, ou Tsle Adam." cresce uma geração forte que, de Verlaine, tirou
uma profunda admiração por Rimbaud, poeta de
O eymbolismo revigorou a Arte, que parecia animo viril; — cresce uma geração livre que
cahir num a impassibilidade de morte. Heredia prega uma arte sã, sincera, que sabe rir a que
fez da poesia uma sciencia; do sentimento racio- sabe crer.
cínio. Verlaine reagiu. A's poesias dedilhadas de
"Les Trophées", oPPÔz ás suas, atirando a sin- S. Paulo, Maio de 1922.
ceridade contra o artificio. François Copée disse: MOTTA FILHO

k I a x o 11
LIVROS
13 Mario Pinto Serva, "A Pró-
xima Guerra", edição da Ca-
sa Editora "O Livro", São
Paulo, 1922.
& REVISTAS
Mais um livro do fecundo escriptor. Livro de
"Casa do Pavor" por M. senittaentalismo internacional. O autor commo-
Deabreu — Monteiro Lobato ve-se com bastante facilidade ante scenas pavo-
& Cio., editores — S. Paulo. rosas que imagina passarem-se lá na Europa. E'
um grito de indignação contra o martyrio du-
Curioso escritor que surge. Fantasia estranha. vidoso da Allemanha e, ao mesmo tempo, de a-
Imaginativa riquíssima. O snr. Deabreu continua larma para o "mundo clvilisado" Exaltação. Ex-
a poética alemtumulista do sec. XIX. Choca um cessos. Visões.
pouco nesta época de noções exactas. Isso não Livro de grande fé, e que por isso tem a inef-
impede que o autor tenha muito talento. "Som- favel vantagem de não boi Ir com o raciocínio do
bra de Minha Mãe" é de grande poder sugestivo. leitor. Exemplo: "A fome sô diminuirá na Eu-
Horroriza. "Os 3 cirios do Triângulo da Morte" ropa com uma renuncia geral das dividas de
é um trabalho magnífico. guerra dos aliados, com o rápido desarmamento
Como língua: Ha descuidos lamentáveis. de todas as nações, com uma attitude inteira-
Aquela "Nota" do f i m . . . nem um jornalista re- mente diversa para com a Allemanha, com o es-
digiria tão mal. Mas como em todas as páginas quecimento dos ódios e das vinganças, com um
. pululam expressões invulgares, adjectivos pres- eespirito novo de solidariedade entre rtodos os
tigiosos, não tenho dúvida em afirmar que o es- povos do Velho Cntinente, com um commerclo
treante será breve um estilista. libertado de pêas que o coarctam. Só assim se
0 snr. Deabreu não quer que Deus exista. Tem evitará a próxima g u e r r a . . . "
mesmo uma raiva infantil da Divindade. Até Taes e outras inducções prophetieas, extrahi-
escreve Deus com d pequeno! B, passeando pelas das de princípios dogmáticos e apreciações terri-
suas personagens, à todo momento afirma a velmente absolutas, denotam no autor uma can-
Inexistência do Criador. Processo de criança. — dura suavíssima.
Mamai, quero mais um chocolate... — Acabou,
meu filho. — Mas eu quero! e bate o pezinho RECEBEMOS:
no chão. O snr. Deabreu sente, sabe que Deus "Les vaincus", de Romain Rolland, edição
existe. Mas Deus é uma coisa cacete. Implica "Lumière", Anvers, Avenue d'Amerique. Publi-
certos deveres, obrigações ou r e m o r s o s . . . Si não cação tardia do primeiro drama do magnífico es-
existisse. oh! liberdade g o s t o s a ! . . . Por isso criptor- Já se percebem nessa obra o forte valor
o escritor bate o pézinho pelas páginas da "Casa literário do autor e as suas tendências socialistas
do Pavor". — Mas eu quero mais um choco- mais tarde evidenciadas. Opportunamente estu-
late ! . . . B' Inútil, snr, Deabreu. O chocolate daremos o livro como merece.
acabou e Deus existe.
M. de A. "Nouvelle Revue Française". Mais um nume-
ro dessa interessantíssima, revista, onde colla-
"Uma Viagem Movimentada" boram escrlptores de indiscutível valor, como
por Théo-Fiiho. — Livraria André Gide, André Suarés, BJaise Cendrars, Ra-
Schettino, 1922. bindranath Tagore, Valery Larbaud, Mareei
Proust, etc.
Théo-Fllho, por qualquer assumpto que pal-
milhe seu espírito irrequieto, tem o dom de en- "Lumière". Números de abril e maio. Finos
cantar. Leem-se duma assentada as trezentas artigos e bellos poemas de Róger Avermaete.
páginas do seu novo livro. "Uma Viagem Mo- Charles Baudouin, Ivan Goll, Vildrae, Mareei
vimentada" são recordações finas e leves, rapi- Millet, Bob Claessens. Gravuras sobre madeira
damente coloridas de comoção ás vezes, de ironia de Van Stratten, Joris Mine, Maaserel etc. Um
freqüentemente. Na maioria das vezes Théo-Fl-
lho borboleteia apenas sobre as flores humanas artigo de Serge Miüiet commentando com espi-
que depara, raro lhes suga o mel e o amargor e rito a Semana de Arte Moderna em São Paulo.
lhes penetra o âmago. Nem esse era o seu fim.
Qulz contar e contou, em linguagem largada mas "Fanfare". Revista ingleza de Arte' moderna.
expressiva. Mas sabe desenhar forte quando Esplendida publicação com collaboraçâo escolhi-
quer. A Impagável figura de poeta Josephus Al- da. Entre outros nomes os de Jean Cocteau, Ro-
banus o prova suficientemente. ger Avermaete, etc. Um aviso: Guilherme de Al-
meida é brasileiro, senhor redactor, e não por-
M. de A. tuguez.

k 1 a x o 11
14 ça, Rússia e Áustria, Itália e Espanha, Bélgica
CINEMAS e Estados Unidos. Na própria Inglaterra «que
de neve boreal sempre abunda" o grito de "Fan-
UMA LICÇÃO DE CARLITO fare" congraça as novas forças poéticas do país.
O snr. Pinto não deveria ser tão rico em profe-
A evolução de Charlie Chaplin demonstra
mais uma vez que por mais novas que as formas cias mortuárias sobre o que desconhece. Mande
se apresentem o fundo da humanidade será sem- buscar livros. Assine revistas. Estude. B volte.
pre um só. Carlito já se tornara grande criando
sen tipo burlesco, tipo clássico que reflectla, sob ***
a caricatura leviana, o homem do século vinte. Houve quem dissesse que copiamos Papini,
Mas Carlito, com seus exageros magníficos, com- Marinetti, C o c t e a u . . . Entre copiar e seguir a
preendera a vida como uma estesia. Estesia bur- diferença é grande. O snr. Ronald de Carvalho
lesca, naturalmente. Era um erro. Criara uma
vida fora da vida. Sofria de estetismo; por- ainda ha. pouco pelo "Jornal" de 21. de Abril
ventura o maior mal dos artistas modernistas. passado, justificava os snrs. Álvaro Moreyra,
Mas um dia o genial criador apresentou "O Va- Manoel Bandeira, Ribeiro Couto por se terem
gabundo". Pouco tempo depois "O Garoto". B
tornou-se imenso e imortal. Porquê? Porquê sob educado na escola dos franceses. Ora KLAXON
aparências novas as almas são eternas. E' ver- vai mais além. Não se educa só na escola dum
dade que pertence a todos os séculos. O genial Cocteau francês e dum Papini italiano, mas
inovador humanizava-se. Sofria. Criemos como também lê a cartilha dum Uidobro espanhol,
Carlito uma arte de alegria! Riamos ás garga-
lhadas! Mas donde vem que a gargalhada parece dum Blox russo, dum Avermaete belga, dum
terminar "numa espécie de gemido"? Da vida, Sandburg americano, dum Leigh inglês. E por-
que embora sempre nova nas suas formas, é quê não Looz um austríaco, ou Becher um ale-
monótona nos seus princípios: o bem e o mal. mão? Dizer de KLAXON que copiamos um,
Não caiamos no "estetismo" de que já falava
Brunschwig! E a grande coragem do homem- quando seguimos a muitos e querer diminuir a
seculo-20 estará em verificar desassombrada- grandeza dum vôo que persegue a rota indi-
mente a dor, sem por isso se tornar sentimental. cada pelo 1922 universal. KLAXON não copia
No entanto, sob a roupagem do mais alto cô-
mico, Charlie atingiu a eloqüência vital das mais Papini nem Cocteau, mas representando ás ve-
altas tragédias. Charlie é o professor do século zes tendências que se aparentam ás desse grande
20. KLAXON desfoíha louros sobre o homem que italiano e desse interessante francês, prega o
lhe dá tão eterna e tão nova Ucção; espírito da modernidade, que o Brasil desco-
J. M. nhecia.
»**
LUZES & Ao sr. J. Câmara, autor de um artigo sobre
futurismo, no primeiro numero da revista "Cá
REFRACÇÕES e Lá":
"11 a deux espêces d'imbéciles parmi "les
Um snr. João Pinto da Silva, pela "América connaisseurs". Ceux qui vous disent, devant un
Brasileira" de Maio, afirma: "Anullados pelo tableau: "Non, mais, avez-vous jamais vu pa-
fiasco, os cubistas, os futuristas, todos os deli- rellles couleurs ã un arbre, ou un ciei, ou un
rantes da crise poética da actualldade, cederão vlsage". Et ceux qui poussent des gloussementa
emfim o lugar aos que restabelecerão... etc." d'admiration devant des toiles qu*üs ne com-
Si o snr. Pinto soubesse o que lá vai pela Eu- prennent pas." — (Roger Avermaete — "Lu-
ropa não profetizaria essa anulação. Em vez de mière").
anulação o que ha é desenvolvimento. Cubistas * * *
e futuristas serão continuados por homens que, Antônio Orliac, acaba de publicar uma "pla-
não necessitando mais, como aqueles, de des- quefcte" que intitulou: "Metabolismo". Entre
truiçôes e exageros, lhes desenvolverão classi- outras cousas, escreve, na prefacio demasiada-
camente as inovações. E saiba o snr. Pinto que mente obscuro, que, até hoje, e com isso quer di-
a Nova Poesia cada vez tem maior número de zer até elle, os poetas foram simples traducto-
adeptos. O articulista ignora Alemanha e Fran- res. Nada crearam, Nada inventaram. Os mais

k 1 a x o ii
15
hábeis conseguiram apenas misturar harmonio- penosa mesmo num tempo de renovação. Saca-
samente a acçáo do mundo exterior e a reacçâo dura Cabral e Gago Coutlnho desceram final-
— sensação, com artifícios eubtis. Segundo o sr. mente nas águas do Rio de Janeiro. Eis tudo.
Orllac o verdadeiro poeta é um inventor que Fizeram Uma obra bela e uma obra útil. Os kla-
constrôe sobre planos puramente mentaes. xlstas seguiram com entusiasmo a prova. Tor-
Confessamos não comprehender claramente o ceram. Os klaxlstas vibraram com a victoria.
que nos quer dizer o autor de "Métabolisme" e Aplaudem. Um bravo enérgico daqui lançamos
ainda menos o comprehendemos apôs a leitura aos dois aviadores. Mas este bravo não se ar-
de seu poema metaphysico. No entanto esse poe- reia de memórias saudosistas. Vai simples. Co-
ma contem estrepes admiráveis. B si o autor movido. Sem enfeites. Representa apenas uma
não tivesse tomado a resolução de provar um verificação singular e presente. Gago Coutlnho
eystema que se sente composto "a priori", teria e Sacadura Cabral são dois homens invulgares.
escripto bellos versos. Como tais, a humanidade se orgulha de os pos-
Não queremso perder a occasiâo de citar al- suir. Eis tudo.
guns interessantes. Quando o poeta fala dos ar- • * • *

tistas, diz: O Conservatório de Pariz acaba de conceder


*On porte o primeiro prêmio de piano ao nosso patrielo
1'effroi d'une grftce João de Souza Lima.
qui prepare presque â pleurer". Esse extrangeiro moço já o anuo passado me-
E o silencio inspira-lhe estes versos: recera aquella consagração; mas Pariz, que in-
. . "Car le silence c'est Ia voix ventou o termo "metêque", intlmidou-se um
de mille choses Inconnues pouco, teve esse receio, que é muito humano, de
que s'efforcent vere le reèl fazer justiça. Fel-a agora, e bem. KLAXON se
et jamais n'y sont parvenues.
enternece eom isso, porque KLAXON também
Assim, pois, os melhores pedaços desse poe-
ás vezes faz "patriotada". E sabe que, ao lado de
ma são justamente aquelles em que o poeta se
Souza Lima, está também em Pariz, como um
deixou levar pela inspiração commum a todos os
pedacinho de nós mesmos, esse desnorteante Bre-
predecessores que soffrem o seu quasi-desdem.
cheret, a fazer jue, com o "Templo da minha
Mas é possivel que sejam esses pedaços que o
Raça", á difflcil consagração pariziense. E ella
sr. Orliac ache menos b o n s . . .
virá: virá colmo veio para o pianista patrício.
Como qualificar essa pretenção de Ser o pri- S. Paulo, com o seu penslonato artístico, está
meiro poeta verdadeiro?! Isso depois de Baude- mantendo no estrangeiro a mais digna e nobili-
lalre, de Verlaine, de Rimbaud, de Laforgue, de tante embaixada. E esses embaixadores d 0 seu
Cendrars!
espirito e da sua cultura, porque são nósisos, por-
que são paulistas, hão de se impor gloriosamen-
te, "par droit de conquête et de nalssance"
Delxemo-nos de sentlmentalismo! Sacadura • • •
Cabral e Gago Coutlnha desceram finalmente
nas águas do Rio de Janeiro. Eis tudo. Mas não Uma das fontes imals ricas e menos explora-
será então esta uma ocasião para que nos rego- das para as artes do pensamento é a conclusão.
sijemos? Digo menos explorada porque até agora, levados
Sem duvida. Regosijemo-nos. Eis tudo. Este pela pobreza da. imaginativa, ou por encararem
regosijo porém não deve incluir em si frases sen- as artes com 0 um departamento da realidade, os
timentais, mais insultosas que verdadeiramente poetas e os prosadores, expostos os dados dum
de elogio. Todas essas comparações entre os dois problema, tiraram na grande generalidade con-
aviadores e os heróis da Lusitânia avita dos sé- clusões. Ora os problemas da vida monótona e co-
culos XV, XSF7 e XnX, incluem em si a lem- mum, são sempre tão mesmos quê o leitor, mul-
brança do longo letargo que Portugal dormiu tas vezes antes do meio da obra que folheia já
durante alguns séculos. Esta lembrança deve ser conhece por experiência própria 0 u de jornal a

k 1a x o n
16
conclusão que o artista tirará. Esta monotonia, é e brincalhona, que vamos encontrar o milhor
uma das pandémias que mais invalidam a litera- emprego dessa "surpresa da conclusão". Estude-
tura universal. Os seus dois pontos, culminantes mo-la para fortificar a verdadeira arte que é
são: o romance psicológico e o soneto de compa- brinquedo e fantasia sob o manto diáfano da rea-
ração. Resumidamente eis Bourget:. dados o ca- lidade. As quadras populares estão cheias da sur-
racter dum homem e uma situação afectiva em presa de conclusão. Uma, ao acaso:
que esse homem se vê envolvido como procederá
o protagonista? E a arte, para o autor do Discí- Batatinha quando nasce
pulo, consiste em responder é pergunta. Ora: Deita rama pelo chão;
qualquer leitor medianamente burro responde com Mulatinha quando dorme
Bota a mão no coraçlo.
a mesma firmeza do artista improvisado. Nas
" Pombas " também, depois dos dois primeiros ver- È' lindo. Expressivo e inesperado. Isto é arte.
sos do l.o terceto: "Assim do coração, onde abo- J á porém, quando não se trata de ficção, o pen-
toam, 0s sonhos, um a um, céleres _ v o a m . . . " o sador üeVè tirar conclusões certas. B é todavia
leitor já sabe, por experiência própria, que estes justàmettfce nestas obras sérias que vemos o pen-
mesmos sonhos geralmente "não voltam mais". sador chegar ás mais impagáveis conseqüências.
O que aliás nem é toda a realidade. Há sonhos Inda ha pouco um sociólogo, ou coisa que hones-
que retornam com uma constância Verdadeira- tamente valha um sociólogo, ao observar com ca-
mente patológica.. Mas, podem-se incluir com rinho ursídeo o desenvolvimento dos esportes no
justiça tais sonetos e romances entre as obras de Brasil, de alguns raciocínios acertados tirou esta
ficção? Não. O que a obra de ficção tem dê ex- conclusão surpreendente: O esporte está desedu-
plorar e pouco o fez até agora é o que estetica- cando a mocidade do Brasil. KLAXON pergunta
mente se chamaria "a surpresa da conclusão". E' agora: Como è passível deseducar uma colectivi-
na literatura popular, tão sábia como expressiva "dade que nunca teve educação?

k 1 a x o 11
BREVEMENTE
Natalika,
ou
Da Natureza
e da Arte
XJxxi -volixraie d e GVLÍ-

Edicção Klaxon
Brevemente
PAllilCEA DESVAIRADA
Mario de Andrade

OSCONDEMNfIDOS
Oswald de Andrade

(DESSIDOR, poemas de Guilherme de


Almeida, traducção de francesa de Serge
Mllliet, edicção "Lumière", ilnuers, Bélgica.






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